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Revista Virtual Direito Brasil – Volume 6 – nº 1 - 2012 1 Sociedade de Propósito Específico (Spe): Aspectos Societários, Contábeis, Fiscais e as Incorporações Imobiliárias Haroldo Guilherme Vieira Fazano 1 I – Introdução Na atualidade, as pessoas, em virtude do caráter ilimitado do Direito das Obrigações, procuram ultimar associações empresárias objetivando obter resultados societários mais sólidos com o menor custo possível, inclusive de âmbito tributário. Portanto, faremos neste parecer breves comentários a respeito das diversas formas associativas existentes no Brasil, como as sociedades de propósito específico, consórcios, sociedade em contra de participação e joint venture, levando em consideração, diversos aspectos estudados por Sheila Felix de Oliveira, em artigo publicado pela FISCOSoft em 13/04/2004, por Francisco Maia Neto, por Gabriel Luiz de Carvalho e Anais do XIV Congresso Brasileiro de Custos, realizado em João Pessoa (PB) de 5 a 7 de dezembro de 2007. Abordaremos, também, o regime das incorporações imobiliárias e sua tributação. II – Do contrato 2.1. Natureza jurídica A Sociedade de Propósito Específico teve avanço com a edição da Lei que previu a realização de parcerias públicos privadas, porque não expressamente previsto nos códigos civis brasileiros (atual e anterior). Na verdade, tal tipo de sociedade tem relação com o consórcio ou com uma joint venture, isto é, duas ou mais pessoas físicas e/ou jurídicas vertem suas habilidades, recursos financeiros, tecnológicos e industriais, entre outros, para executar objetivos específicos e determinados. Logo, tais tipos de sociedade não é uma sociedade específica com regras próprias, razão pela qual, deverá adotar uma das formas societárias previstas no Código Civil (sociedade anônima, limitada, etc.). 1 Mestrado e Doutorado em Direito das Relações sociais, sub-área Direito Civil, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor de Direito Civil na Universidade de Sorocaba, Uniso; professor de Direito Imobiliário do curso de pós-graduação na Faculdade de Direito de Itu, Faditu; Procurador do Município de Sorocaba e advogado militante.

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Sociedade de Propósito Específico (Spe): Aspectos Societários, Contábeis, Fiscais e as Incorporações Imobiliárias

Haroldo Guilherme Vieira Fazano 1

I – Introdução

Na atualidade, as pessoas, em virtude do caráter ilimitado do Direito das

Obrigações, procuram ultimar associações empresárias objetivando obter resultados

societários mais sólidos com o menor custo possível, inclusive de âmbito tributário.

Portanto, faremos neste parecer breves comentários a respeito das diversas

formas associativas existentes no Brasil, como as sociedades de propósito específico,

consórcios, sociedade em contra de participação e joint venture, levando em

consideração, diversos aspectos estudados por Sheila Felix de Oliveira, em artigo

publicado pela FISCOSoft em 13/04/2004, por Francisco Maia Neto, por Gabriel Luiz

de Carvalho e Anais do XIV Congresso Brasileiro de Custos, realizado em João Pessoa

(PB) de 5 a 7 de dezembro de 2007.

Abordaremos, também, o regime das incorporações imobiliárias e sua tributação.

II – Do contrato

2.1. Natureza jurídica

A Sociedade de Propósito Específico teve avanço com a edição da Lei que

previu a realização de parcerias públicos privadas, porque não expressamente previsto

nos códigos civis brasileiros (atual e anterior).

Na verdade, tal tipo de sociedade tem relação com o consórcio ou com uma joint

venture, isto é, duas ou mais pessoas físicas e/ou jurídicas vertem suas habilidades,

recursos financeiros, tecnológicos e industriais, entre outros, para executar objetivos

específicos e determinados.

Logo, tais tipos de sociedade não é uma sociedade específica com regras

próprias, razão pela qual, deverá adotar uma das formas societárias previstas no Código

Civil (sociedade anônima, limitada, etc.). 1 Mestrado e Doutorado em Direito das Relações sociais, sub-área Direito Civil, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor de Direito Civil na Universidade de Sorocaba, Uniso; professor de Direito Imobiliário do curso de pós-graduação na Faculdade de Direito de Itu, Faditu; Procurador do Município de Sorocaba e advogado militante.

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Assim, o tipo societário escolhido para amparar a SPE definirá as suas

características básicas, já que deverão ser respeitadas as disposições legais de

constituição e funcionamento do referido tipo societário, se sociedade limitada (Código

Civil brasileiro) e se sociedade anônima, Lei 6.404/76.

Uma vez constituída, a SPE adquire personalidade jurídica própria e, portanto,

estrutura destacada das sociedades que a constituíram, diferentemente de uma

Sociedade em Conta de Participação (SCP) que se fundamenta na relação jurídica em

que um empreendedor (denominado sócio ostensivo) associa-se a investidores (sócios

participantes) para a exploração de certa atividade econômica, na qual ao sócio

ostensivo caberá a realização - em nome próprio - dos negócios objeto da SCP e,

conseqüentemente, a responsabilidade direta por eles.

Nessa linha de raciocínio, podemos dizer que uma vez provida de personalidade

jurídica, a SPE, sob uma das formas societárias previstas na legislação brasileira, passa

a responder pelos direitos e obrigações decorrentes da realização do empreendimento

para o qual foi constituída, podendo, inclusive, ser acionada em juízo.

2.2. Formação do capital social

O capital social da SPE pode ser integralizado pelos sócios com dinheiro, bens

móveis e imóveis e, ainda, com direitos, desde que a estes possam ser atribuído valor

econômico e, uma vez integralizado o capital, as contribuições dos sócios passam a

compor o patrimônio da SPE torando-se legítimos proprietários.

Todavia, em regra, não é o que ocorre na SCP em que a corrente doutrinária

majoritária no direito brasileiro sustenta que os fundos, ou parte deles, que ficam em

poder do sócio ostensivo e sob sua gerência para a realização do empreendimento

passam à sua exclusiva propriedade.

Além disso, a SPE tem uma contabilidade própria e sem qualquer peculiaridade

em relação aos demais tipos societários personificados previstos na legislação, ao

contrário da SCP onde se abre uma "conta" nos livros do sócio ostensivo, na qual são

anotadas as entradas de cada sócio, inclusive a do próprio sócio ostensivo, se for o caso,

e lançadas sucessivamente às diversas operações realizadas em proveito comum.

2.3. Relações internas e externas na SPE

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Na SPE as relações internas e externas serão disciplinadas no seu ato

constitutivo (Estatuto ou Contrato Social) e na legislação que regula o tipo societário

escolhido.

2.4. Da constituição da SPE

O instrumento de constituição da SPE é o Contrato ou Estatuto Social celebrado

entre os sócios, cujas cláusulas essenciais deverão seguir a legislação que regulamenta o

tipo societário com o qual a ela revestir-se-á devidamente arquivado nas juntas

comerciais como já referido (limitada, sociedade anônima, etc.).

2.5. Distribuição de lucros aos sócios

Vamos admitir que a SPE adote a forma societária do tipo limitada. Neste caso,

a distribuição de lucros aos sócios seguirá as disposições e as regras previstas no

Contrato Social da SPE que digam respeito à referida distribuição de lucros, porque a

legislação que regula as sociedades limitadas, o Código Civil, não estabelece uma regra

específica para a destinação dos resultados da sociedade, ao contrário da lei das

sociedades anônimas que prevê o pagamento de dividendos nos termos dos artigos 201

a 205.

Assim, se o contrato social da SPE constituída sob a forma de sociedade limitada

estabelecer que a destinação dos lucros será decidida pelos sócios, sem fixar nenhum

percentual mínimo para os dividendos, a distribuição dos lucros será decidida pela

maioria dos sócios.

Do mesmo modo, poderão os sócios deliberar a periodicidade do levantamento

de balanço patrimonial para a distribuição dos lucros o que, também, por falta de regra

específica, poderá ser efetuado em períodos inferiores há um ano, a livre arbítrio dos

sócios.

Registramos, de outro lado, que se o contrato social da SPE constituída sob a

forma de sociedade limitada não estabelecer regras para pagamento de dividendos e

eleger a Lei das Sociedades Anônimas como diploma de regência supletiva, valerão as

disposições dessa última para o assunto e, consequentemente, pelo menos metade do

lucro líquido ajustado deverá ser distribuída entre os sócios, no fim do exercício, nos

termos do artigo 202 da lei das sociedades anônimas.

3. Dos sócios (da SPE) e das suas respectivas responsabilidades

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Do mesmo modo, a responsabilidade dos sócios da SPE será determinada pelo

tipo societário escolhido: se constituída sob a forma de limitada, a responsabilidade de

cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas, todos respondem solidariamente pela

integralização do capital social, nos termos do artigo 1.052 do Código Civil.

Na hipótese da SPE ser constituída sob a forma de uma sociedade anônima, a

responsabilidade dos sócios ou acionistas será limitada ao preço de emissão das ações

subscritas ou adquiridas, conforme prevê o artigo 1º da lei das sociedades anônimas.

Nas sociedades em conta de participação (SPC), segue o mesmo raciocínio,

porque nela, o sócio ostensivo, empresário (sociedade empresária ou empresário pessoa

física) que aparece nos negócios com terceiros, contrata em seu nome e assume

exclusivamente as responsabilidades inerentes a atividade desenvolvida e o sócio

participante, obriga-se exclusivamente ao sócio ostensivo nos termos do Contrato

Social, conforme previsto no artigo 991 e parágrafo único do Código Civil.

4. Do regime contábil e fiscal das SPE

4.1. Intróito

Como já dissemos, a SPE é uma sociedade autônoma, cujo tipo societário é

escolhido pelos sócios, e da mesma forma pode adotar o mesmo regime tributário de

qualquer outra pessoa jurídica, inclusive cumprindo todas as obrigações acessórias

previstas na legislação pertinente.

Desse modo, além das particularidades contábeis e de reconhecimento de

receitas e despesas, a SPE poderá adotar a sistemática do Lucro Real ou então do Lucro

Presumido, desde que a receita bruta anual não ultrapasse o limite de R$ 48 milhões e

que a atividade a ser desenvolvida possibilite tal opção, consoante estatuído no artigo 13

da Lei n. 9.718/98, com a redação dada pela Lei n. 10.637/2002.

Cumpre mencionar que a base de cálculo, quando a empresa está no Lucro

Presumido, para fins de IRPJ e CSL, é obtida pela aplicação de percentuais legais de

presunção de lucro (entre 8% e 32% para IRPJ e 12% ou 32% para CSL), incidentes

sobre a receita operacional da empresa. Para as demais receitas, financeiras e não

operacionais, a base de cálculo equivale ao seu próprio valor.

Para as empresas que estão no Lucro Real, vale estudar a margem de lucro

atribuída à atividade, na medida em que esse percentual deve nortear o cálculo do IRPJ

e da CSL devidos pela SPE. O artigo 15 da Lei n. 9.249/95 estabelece os percentuais de

presunção a serem aplicados.

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Ademais, no que tange a Contribuição ao PIS, somente as empresas optantes

pelo Lucro Real devem adotar a sistemática da não-cumulatividade prevista na Lei n.

10.637/2002, recolhendo 1,65% do total de suas receitas e descontando créditos

legalmente previstos. Caso a SPE adote a sistemática do Lucro Presumido, não estará

sujeita à sistemática da não-cumulatividade do PIS e deverá recolher, a título de

Contribuição, 0,65% incidente sobre sua receita bruta, mensalmente.

A mesma regra deve ser aplicada para a COFINS, de acordo com as disposições

constantes da Lei n. 10.833/2003. Nesse caso, para os optantes pelo Lucro Real, a

alíquota será de 7,6%, descontados os créditos previstos na legislação. Para os optantes

pelo Lucro Presumido, o recolhimento será de 3,0% sobre a receita bruta.

Assim, vejamos abaixo, quando a escolha recair entre o lucro real e o presumido,

levando em conta: Lucratividade, Receitas Financeiras e Outras Receitas, Periodicidade

do Pagamento e Controles Contábeis.

4.2. Lucratividade

4.2.1. Lucro Real

No Lucro Real a lucratividade tributada pelo IRPJ e pela a CSLL é a efetiva

(desconsiderando-se, obviamente, os ajustes fiscais determinados pela legislação de

regência, como, por exemplo, o que determina oferecer à tributação provisão para

contingência).

Como a base de cálculo desses tributos é determinada à parte do lucro líquido

contábil, todas as receitas, custos e despesas são considerados na apuração do IRPJ e da

CSLL.

4.2.2. Lucro Presumido

As regras do Lucro Presumido presumem margens de lucros para as atividades

desenvolvidas pela empresa.

Assim, o imposto de renda - IRPJ (alíquota de 15% + adicional de 10% sobre o

que ultrapassar R$ 60.000,00 trimestrais) e a Contribuição Social sobre o Lucro -

CSLL (alíquota de 9%) incidem sobre o faturamento (líquido dos descontos

incondicionais, das vendas canceladas e das devoluções de vendas) depois da aplicação

dos percentuais presumidos de lucratividade de cada atividade.

Para o IRPJ os percentuais são:

a) 8% (oito por cento) sobre a receita bruta mensal proveniente:

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a1) da venda de produtos de fabricação própria;

a2) da venda de mercadorias adquiridas para revenda;

a3) da industrialização de produtos em que a matéria-prima, ou o produto

intermediário ou o material de embalagem tenham sido fornecidos por quem

encomendou a industrialização;

a4) de outras atividades não caracterizadas como prestação de serviços;

b) 32% (trinta e dois por cento) sobre a receita bruta mensal auferida com as

atividades de:

b1) intermediação de negócios (as atividades de corretagem - seguros, imóveis,

etc. - e as de representação comercial são consideradas atividades de intermediação de

negócios)

b2) administração, locação ou cessão de bens imóveis, móveis ou direitos de

qualquer natureza;

b3) prestação de qualquer outra espécie de serviço não mencionada

anteriormente, excluídos os de natureza hospitalar.

Caso a sociedade tenha atividades diversificadas, será aplicado o percentual

correspondente sobre a receita proveniente de cada atividade.

Primeira hipótese: atividade industrial 8% x 25% = 2% (alíquota efetiva de

tributação de IRPJ sobre o faturamento).

Para a CSLL o percentual de lucratividade da atividade industrial e comercial

será de 12%, sendo que a partir de setembro de 2003 os prestadores de serviços tiveram

percentual elevado para 32%.

Segunda hipótese: atividade industrial 12% x 9% = 1,08% (alíquota efetiva de

tributação de CSLL sobre o faturamento).

Terceira hipótese: hipótese 1 e 2: atividade industrial 2,0% (IRPJ) + 1,08%

(CSLL) = 3,08% (alíquota efetiva de tributação de IRPJ e CSLL sobre o faturamento)

As receitas financeiras e outras receitas são tributadas sem uso dos percentuais

de presunção de lucratividade atribuídos à atividade, mediante a aplicação direta das

alíquotas dos tributos (IRPJ -15% e adicional de 10% - e CSLL - 9%).

4.2.3. O Lucro Real e o Lucro Presumido

Em regra, o Lucro Presumido é uma alternativa mais vantajosa para as empresas

que tenham índices de lucratividade superiores aos previstos pela legislação para cada

atividade.

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Nas empresas que apresentam elevados montantes de custos/despesas

administrativas (que reduzem a lucratividade do negócio como um todo) e/ou muitas

receitas não operacionais e financeiras, o Lucro Presumido não costuma ser vantajoso.

4.2.3. Receitas Financeiras (Outras Receitas)

4.2.3.1. Lucro Real

Na sistemática do Lucro Real, as receitas financeiras estão sujeitas à mesma

carga tributária que as demais receitas, ou seja, ambas integram a base de cálculo do

lucro real, sobre a qual incide 15% = adicional de 10% de IRPJ e 9% de CSLL.

Assim, o fato de a sociedade não contabilizar de forma segregada as receitas

financeiras das demais não implica qualquer efeito fiscal e exige menores controles

contábeis.

4.2.3.2. Lucro Presumido

Na sistemática do Lucro Presumido, as receitas financeiras, por exemplo, são

tributadas de forma efetiva e normalmente maior do que se consideradas na sistemática

do Lucro Real.

Isso porque, as receitas de vendas integram a base de cálculo sobre a qual incide

o percentual da atividade, e, somente sobre este resultado, será aplicada a alíquota do

IRPJ e da CSLL, ao passo que as receitas financeiras estão sujeitas diretamente às

alíquotas dos tributos.

Assim, enquanto as receitas de vendas são tributadas a 3,08%, as financeiras são

tributadas a 34% (efeito conjunto IRPJ e CSLL - receitas acima de R$ 60.000

trimestrais).

4.2.3.3. Confronto entre o Lucro Real e o Lucro Presumido

A sistemática do lucro presumido será mais vantajosa caso a sociedade não

apresente elevados montantes de receitas financeiras, uma vez que a carga tributária

incidente é muito superior àquela aplicada às receitas da atividade.

Entretanto, a opção pelo Lucro Presumido exigirá controle em separado das

receitas financeiras, não apenas para a justa aplicação das alíquotas na sociedade, como

também para efeito de transferência das receitas aos investidores, que, caso optem pelo

Lucro Presumido, poderão apurar corretamente os tributos devidos.

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4.3. Periodicidade do pagamento

4.3.1. Lucro Real

No Lucro Real, há duas sistemáticas de apuração: anual (mais comum) e

trimestral.

No Lucro Real anual o contribuinte deve antecipar todo mês os tributos (IRPJ e

CSLL), para, somente ao término do exercício (31/12), realizar o ajuste final e apurar

definitivamente o quantum é devido.

Não há possibilidade de se parcelar as estimativas em quotas. Somente na

apuração definitiva, em 31/12, é que se torna possível parcelar o ajuste em três quotas

mensais e sucessivas, corrigidas pelos Juros SELIC.

No Lucro Real trimestral as apurações são definitivas e o pagamento dos tributos

(IRPJ e CSLL) também deve ser realizado no último dia útil do mês subseqüente ao

encerramento do trimestre.

Assim, no primeiro trimestre (janeiro, fevereiro e março), o recolhimento

ocorrerá no último dia útil de abril.

No Lucro Real trimestral, também existe a possibilidade de se parcelar o

pagamento dos tributos em três quotas.

A primeira quota será paga no último dia do mês subseqüente ao encerramento

do trimestre e a segunda e a terceira nos meses subseqüentes, acrescidas de Juros

SELIC.

A desvantagem da apuração trimestral é que os resultados (lucro ou prejuízo)

são fechados por trimestre.

Assim, na hipótese de se apurar prejuízo num determinado trimestre, somente

será possível compensar 30% do lucro gerado no trimestre subseqüente.

4.3.2. Lucro Presumido

No Lucro Presumido, as apurações são trimestrais e o pagamento dos tributos

(IRPJ e CSLL) deve ser realizado no último dia útil do mês subseqüente ao

encerramento do trimestre.

No caso do primeiro trimestre (janeiro, fevereiro e março) o recolhimento será

no ultimo dia útil de abril.

Nessa sistemática, a forma de tributação pode se der pelo regime de caixa, vale

dizer, a tributação à medida do recebimento, e há ainda a possibilidade de se parcelar o

pagamento dos tributos em três quotas.

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A primeira quota será no último dia do mês subseqüente ao encerramento do

trimestre e a segunda e a terceira nos meses subseqüentes, acrescidas da taxa SELIC.

4.3.3. Lucro Real e Lucro Presumido

Considerando que o Lucro Real trimestral é uma opção de risco, porque

impossibilita a sociedade de aproveitar integralmente seus próprios prejuízos dentro do

mesmo exercício fiscal, normalmente as sociedades costumam optar entre o Lucro Real

Anual e o Lucro Presumido.

Por hipótese, e considerando que seja devido o mesmo valor de tributos no ano,

tanto no Lucro Presumido quanto no Lucro Real, deve-se observar que a periodicidade

de recolhimento do Lucro Presumido é bem maior (de três em três meses) e com

possibilidade de parcelamento com juros SELIC.

No Lucro Real a periodicidade é mensal e não há possibilidade de parcelamento

no decorrer do exercício.

4.4. Controles Contábeis

4.1. Lucro Real

Na sistemática do Lucro Real as pessoas jurídicas devem apresentar

contabilidade regular, conforme determinação da legislação comercial.

Ademais, as pessoas jurídicas também estão sujeitas a outras formalidades

como, por exemplo, a escrituração do LALUR e Registro de Inventário.

É necessário, ainda, controlar rigorosamente os documentos comprobatórios de

seus custos e despesas visando garantir a dedutibilidade dos mesmos.

4.4.2. Lucro Presumido

A sistemática do Lucro Presumido não exige maiores formalidades contábeis.

A rigor, sequer é necessário ter contabilidade regular, sendo necessária somente

a regularidade do Livro Caixa.

Como tal lucro tem por base apenas receitas, a sociedade não precisa se

preocupar em controlar as formalidades que envolvem a dedutibilidade das despesas.

Todavia, para efeito de transferência dos lucros efetivamente apurados aos

sócios investidores, será sempre necessário atender às formalidades contábeis exigidas

pela legislação comercial.

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Em conclusão, o Lucro Presumido, sob este aspecto, é mais benéfico para as

empresas, na medida em que seus controles são menos rigorosos dos que os aplicáveis

ao Lucro Real.

Esse benefício é, em princípio, meramente operacional, mas vale lembrar que

algumas exigências formais exigidas pela sistemática do Lucro Real acabam por

sobrecarregar de tarefas burocráticas a controladoria das empresas.

5. Algumas considerações acerca das SPE no mercado imobiliário

Algumas pessoas que realizaram recentemente aquisições de novas unidades

imobiliárias, têm se mostrado surpresas com uma nova modalidade de estruturação do

empreendimento, que atende pelo nome de Sociedade de Propósito Específico, ou

simplesmente SPE.

Como dissemos tais sociedades, são conhecidas como special purpose entity,

SPE, SPC, special purpose company, e é uma sociedade que tem atividade restrita,

podendo ter prazo de duração determinado e sua principal utilidade é de isolar o risco

financeiro da atividade a que se destina.

No caso do mercado imobiliário brasileiro ela surgiu na esteira da famigerada

falência da Construtora Encol, que deixou nada menos do que 42 mil famílias lesadas,

que deflagrou uma política de proteção aos mutuários configurada, sobretudo, na

criação das SPE e do patrimônio de afetação.

O raciocínio é simples, porque não faz sentido que o adquirente de um imóvel

seja afetado e veja frustrados seus sonhos por uma administração empresarial que

transfira os recursos de uma obra para outra, comprometendo a conclusão de um

empreendimento.

Este mesmo raciocínio vale para os investidores institucionais, que alocam seus

recursos em determinado edifício e precisam ter garantias de retorno do capital com

entrega da unidade, que poderia ser contaminado em decorrência de má gestão de

recursos por parte de um incorporador.

Ao ser adotada a aplicação de uma SPE no empreendimento todos os agentes

envolvidos, desde o comprador até a instituição financeira, passam a ter a tranqüilidade

de que o único risco que irão correr é aquele decorrente da própria obra.

A operacionalização dessa medida é feita de forma simples, criando-se um CNPJ

próprio para a nova entidade, que passará a ter todos os registros próprios de uma

empresa comercial, cuja única diferença reside no objeto social, específico pra o

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desenvolvimento daquela empreitada, devendo se extinguir após sua conclusão, ou for

renovada para um novo negócio.

Não existe um consenso no mercado sobre qual das modalidades de segregação

do empreendimento é a mais adequada, se a SPE ou o patrimônio de afetação (PA), uma

vez que os dois são bastante semelhantes e a melhor escolha será aquela que atenda a

conveniência dos objetivos a serem atingidos.

Normalmente, de uma forma simplista, os praticantes dessas modalidades

indicam que a SPE facilita o arranjo societário, com a entrada e saída de sócios,

enquanto o patrimônio de afetação protege o anonimato de investidor.

Do ponto de vista prático, existe a questão fiscal que leva a SPE à adoção dos

regimes tributários conhecidos, lucro real ou presumido, enquanto no PA pode adotar o

RET (Regime Especial de Tributação), além do que existe a possibilidade de adesão em

qualquer fase da obra, enquanto na SPE existe uma dificuldade de constituição após o

início do empreendimento.

6. Da SPE e outros tipos societários

A SPE mantém, a saber, profunda relação com institutos há muito conhecida

dentro e fora do Brasil.

Trata-se, por exemplo, e, sobretudo da chamada joint venture.

Portanto, como dissemos, a SPE pode ser conceituada como uma estrutura de

negócios que reúnem interesse e recursos de duas ou mais pessoas para a consecução de

empreendimento de objeto específico e determinado, mediante a constituição de uma

nova sociedade com personalidade jurídica distinta da de seus integrantes.

6.1. Do consórcio

De início, pode-se dizer que a estrutura de uma SPE não é inteiramente nova na

experiência jurídica brasileira e internacional.

Neste aspecto, a Portaria de n. 107, de 1967, do Instituto Brasileiro de

Desenvolvimento Florestal (IBDF), que determinava a criação de um "consórcio-

societário", de modo que a conjugação empresarial ali elencada se fizesse mediante a

constituição de um ente dotado de personalidade jurídica e revestido sob uma das

formas de sociedade comercial existentes.

Para que haja um entendimento satisfatório da passagem legislativa citada

acima, sabe-se que um consórcio, em si, tem duas características fundamentais: carência

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de personalidade jurídica distinta da de seus consorciados e união de interesses, recursos

e capacitações técnicas visando à consecução de empreendimento específico.

Além disso, constata-se que as consorciadas se obrigam nos estritos limites

contratuais, ou seja, a responsabilidade de cada uma está previamente delimitada no

contrato consorcial, situação essa que refletirá na exigência por estruturas negociais do

tipo de uma SPE.

E, apesar de não possuir personalidade jurídica, o consórcio está munido de

capacidade negocial e judicial, conforme disposição prévia.

Há, por fim, consórcios de duas modalidades, quais sejam: (a) os operacionais,

quando o consórcio visa à agregação de meios para a realização de uma finalidade

própria, e (b) os instrumentais, nos casos em que o consórcio serve precipuamente para

contratar obras e serviços com terceiros.

Assim, pode-se afirmar que um consórcio-societário, referido na Portaria de n.

107 do IBDF, nada mais é do que um consórcio revestido de personalidade jurídica. E

uma das conseqüências dessa personalização é a responsabilização patrimonial.

Tal observação terá muita importância, mormente no campo da segurança

jurídico-contratual, ponto que será mais bem debatido nas próximas linhas.

Em 1993, com a promulgação da Lei n. 8.666, que trata basicamente das

licitações com a Administração Pública, passou a permitir que os licitantes criassem um

consórcio entre si, ou melhor, o Estado passou a se contentar com a promessa, por parte

dos licitantes, de constituição de um consórcio empresarial de propósito específico, com

a destinação da liderança a uma das consorciadas, mas sem a formação de um ente com

personalidade jurídica separada da das consorciadas, isto é, um consórcio de

características comuns.

A intenção dessa medida, na época, era potencializar a concorrência e exigir, por

extensão, melhor preparo dos licitantes que eventualmente participassem dessa esfera

concorrencial.

Entretanto, esse cenário ainda representava grande risco, principalmente para a

Administração Pública, pois, no caso de ocorrência de qualquer descumprimento das

cláusulas contratuais ou de qualquer incidente que envolvesse responsabilidade civil,

por exemplo, o Poder Público poderia acionar, em princípio e diretamente, somente a

líder do consórcio, com quem efetivamente celebrou o contrato.

Em relação às demais consorciadas, havia certa dificuldade em responsabilizá-

las, visto que a responsabilidade das mesmas estava, por sinal, restrita pelas linhas

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contratuais. Percebe-se aí a insegurança decorrente da falta de personalidade jurídica do

ente consorcial, pois a possibilidade de responsabilização patrimonial das consorciadas

apresentava-se, em regra, fortemente reduzida.

Dessa forma, surgiu a Lei n. 9.074, de 1995, posterior e complementar à referida

Lei de licitações e à Lei n. 8.987, também de 1995, sendo que o conteúdo desta última

faz alusão à prestação e concessão de serviços públicos.

De acordo com a Lei n. 9.074, deve haver, no âmbito das operações de licitação,

a constituição de um consórcio de natureza instrumental, ou seja, de um consórcio que

servirá de meio para estabelecer contato com terceiros (que, no caso, compreendem a

Administração Pública), sendo que (e é aqui que se encontra a inovação!), uma vez

vencedor, o consórcio extinguir-se-á a fim de que se constitua, em seu lugar, uma SPE.

Enfim, o consórcio vencedor será transformado numa sociedade personalizada e de

objetivo determinado.

Conclui-se, do exposto, que a Administração Pública brasileira caminha

ultimamente na busca por maior credibilidade no tocante à celebração de seus contratos.

Diante dos problemas trazidos pela ausência de personalidade jurídica dos consórcios, o

Estado passou a determinar a criação de entes personalizados, a fim de maior segurança

e transparência quanto à execução do negócio contratado, cuja extensão deve ser

específica. Vê-se, portanto, uma postura que se volta para a implantação definitiva das

SPEs no cenário brasileiro.

6.2 Da joint venture

A joint venture, de origem norte-americana, corresponde a uma reunião de

pessoas que combinam seu patrimônio (dinheiro, imóveis, etc.), esforços, habilidades e

conhecimentos com o propósito de executar uma única operação de negócios, de forma

lucrativa, em regra, de curta duração ou com prazo determinado.

Existem duas espécies de joint venture: a agreement e a corporation. Esta, ao

contrário daquela, realiza seu empreendimento mediante a constituição de nova pessoa

jurídica, de objetivo específico.

Seria o chamado consórcio-societário, referido anteriormente. Pode-se adiantar

que é com a joint venture corporation que a SPE guarda profunda conexão e similitude.

A joint venture não compreende uma forma legal de associação societária

prevista na legislação nacional.

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Sendo assim, a sua constituição dar-se-á sob o manto de qualquer um dos

modelos societários personificáveis, caso de uma sociedade anônima (S/A) ou de uma

limitada (Ltda.).

E é justamente esse revestimento que fornecerá à joint venture corporation

personalidade jurídica. Isso porque tal instituto, em si, é despersonalizado.

Segundo a doutrina, o controle da joint venture, seja ele representado por ações

ou por quotas, deverá ser distribuído da maneira mais equilibrada possível entre os seus

integrantes.

O mesmo não se observa com a sua administração, que poderá ser exercida por

grupo de membros, de forma mais individualizada.

Em se tratando do controle, ou melhor, de sua distribuição, há sensível diferença

em relação à SPE, pois, no caso das parcerias públicas privadas (PPPs), o controle

societário deverá ser exercido, salvo raras exceções, pelo parceiro privado, e não pelo

setor público.

O número mínimo de participantes de uma joint venture é, obviamente, dois, não

havendo, por outro lado, uma fixação quanto ao número máximo.

Porém, é comum observar que esse instituto não comporta grande número de

membros.

Estes, por sua vez, podem ser tanto pessoas jurídicas como pessoas físicas, isto

é, o contrato poderá ser estabelecido entre pessoas jurídicas ou entre uma pessoa

jurídica e uma física (ou mais de uma).

A participação de pessoas físicas não é usual, porém, não existem impedimentos

plausíveis.

De outro lado, é comum observar a aplicação de uma joint venture

especialmente em três operações, a saber:

a) expansão em novos mercados não-domésticos, em que, por exemplo, o

investidor estrangeiro se alia a um parceiro local, aproveitando-se dos recursos e da

experiência deste;

b) exploração de novos produtos, quando, por exemplo, empresas que possuem

know-how suficiente para fabricar certo produto estabelecem parceria com outras que

dominam a técnica publicitária;

c) execução de contrato de propósito específico, a fim de dividir não só a

responsabilidade pelo empreendimento, mas também, e principalmente, o seu custo. Na

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seara deste último empreendimento, surgiram as bases da SPE (também conhecida, em

outros países, por special purpose company).

7. A SPE e sua aplicação

Atualmente, sobretudo após o advento da Lei n. 11.079/04, é comum a aplicação

de uma SPE no âmbito das PPPs.

Entretanto, a sua colocação não se resume a isso, de sorte que uma SPE pode

servir também de instrumento nas operações de recuperação judicial de empresas e de

securitização de créditos.

A formação de uma SPE pode ter por finalidade a execução de variados

negócios.

Destes, destacam-se dois, de modo que uma SPE pode ser instaurada não só

para:

a) implantar e gerir negócio relativo às PPPs, como também para;

b) servir de meio na recuperação judicial de empresas que se encontram em

crise, ou ainda para a consecução de um negócio, como um empreendimento

imobiliário.

7.1 A SPE e as Parcerias Públicas Privadas (PPPs)

7.1.1 Breves comentários sobre as PPPs

Houve a conjugação de, no mínimo, três fatores no contexto de adoção das

PPPs, quais sejam:

(a) sobrecarga do Estado;

b) necessidade de recursos para dar continuidade a investimentos;

c) crença de que a gestão privada é a mais eficiente

O modelo brasileiro se inspirou, assim como a maioria dos países que adotaram

esse regime de parcerias, na experiência inglesa, que, em 1992, criou a chamada Private

Finance Iniciative (PFI). Esta foi transformada, em 1997, na atual Public-Private

Partnership, cujo objetivo é o de possibilitar a expansão dos investimentos públicos

sem que o orçamento e o volume da dívida do governo sejam direta e imediatamente

afetados, já que os recursos iniciais necessários à consecução do serviço público provêm

dos cofres do parceiro privado.

Todavia, a idéia de que as PPPs representam uma superação definitiva da

restrição fiscal, dentro de uma política de contenção de gastos públicos, é enganosa,

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pois, obviamente, há o comprometimento de receitas futuras, isto é, é apenas postergada

a contraprestação devida à iniciativa privada. Por isso, as PPPs devem ser utilizadas

principalmente por razões de eficiência na prestação do serviço e no manejo dos

recursos públicos, e não pela aparente solução de problemas financeiros.

Não podemos confundir as PPPs com as privatizações. Estas, ao contrário

daquelas, envolvem a alienação dos ativos públicos ao setor privado.

Em outras palavras, o Estado vende o que é seu à iniciativa particular, enquanto

que, nas PPPs, a infra-estrutura realizada é devolvida ao parceiro público ao final do

contrato.

Houve também consideráveis mudanças no sistema brasileiro de concessões de

serviços públicos com a instituição das PPPs.

Isso porque as concessões comuns (ou tradicionais) são remuneradas

exclusivamente por tarifas, ou seja, os próprios usuários do serviço pagam à concedente.

Já no caso das PPPs, a contraprestação é paga parcial ou totalmente pelo

parceiro público, pois, conforme o artigo 2° da Lei n. 11079/04, as PPPs são espécies de

contratos administrativos de concessão, nas modalidades patrocinadas e administrativas.

Sabe-se que a concessão patrocinada aparece quando, além das tarifas cobradas

dos usuários, há a complementação de receita pelo Poder Público, enquanto que, na

concessão administrativa, todo pagamento à iniciativa privada é feito pelo Estado.

Então, no Brasil, têm-se três tipos de concessões: as comuns, as patrocinadas e as

administrativas, sendo que o que as diferencia, em síntese, é a forma de remuneração da

concedente.

Uma das inovações trazidas pela Lei n. 11.079/04 é a de que o pagamento

poderá ser variável e associado ao desempenho e à disponibilização do serviço

contratado (artigos 6º e 7°).

Outra inovação diz respeito à alocação de riscos.

Houve, a saber, verdadeira transferência para o particular de riscos que

tradicionalmente estavam sob a responsabilidade da Administração Pública.

Dessa forma, os riscos derivados do projeto, construção e operação ficarão, em

regra, nas mãos do ente privado. Já os decorrentes da demanda e da álea serão

repartidos. E este é um ponto interessante: a divisão de parte dos riscos será feita

mediante disposição contratual (artigo 4º, VI).

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As SPEs estão previstas no artigo 9° da Lei n. 11.079, sendo importante salientar

que estruturas semelhantes à SPE já haviam sido previstas no sistema de parcerias

utilizado pela União Européia.

Tal situação pode ser deduzida da leitura do Livro Verde que trata das PPPs,

segundo o qual:

“53. as operações de PPP de tipo institucionalizado implicam a criação de uma

entidade detida conjuntamente pelo parceiro público e o parceiro privado. À entidade

comum incumbe, então, garantir a entrega de uma obra ou a prestação de um serviço

em benefício do público.

54. A cooperação directa entre o parceiro público e o parceiro privado no

quadro de uma entidade dotada de personalidade jurídica permite ao parceiro público

manter um nível de controlo relativamente elevado sobre o desenrolar das operações”.

As PPPs representam, enfim, no Brasil e no mundo, mais um instrumento

destinado a viabilizar os investimentos de que tanto se tem necessidade.

7.1.2. Do regime jurídico atribuído às SPEs (artigo 9º, da Lei n. 11.079/04)

O caput do artigo 9° da Lei n. 11.079/04 estabelece que, antes da celebração do

contrato, deverá ser constituída uma SPE, cuja função será implantar e gerir o objeto da

parceria. Ou seja, a SPE será formada entre a entrega do objeto do certame ao vencedor

e a assinatura do contrato, sendo que ela, e aqui está um dado importante, figurará como

parte. O parceiro privado em si, vencedor da licitação, não aparecerá como parte

contratual, mas, sim, a SPE.

Ao contrário do disposto no art. 20 da Lei 8.987/95, que previa a faculdade de a

Administração Pública determinar que o licitante vencedor se constituísse em empresa

antes da celebração do contrato percebe-se que, nas PPPs, não existe mais essa opção,

de modo que uma SPE deverá ser necessariamente criada.

O §1° do art. 9° da citada lei dispõe que a transferência do controle da SPE

estará condicionada à autorização expressa por parte do Poder Público, conforme o

edital e o contrato estabelecidos, e de acordo com o parágrafo único do art. 27 da Lei n.

8.987/95 (tal parágrafo foi alterado pela 11.196/05).

Dessa forma, o Estado poderá analisar previamente se o terceiro interessado em

assumir a posição da concedente tem condições para "atender às exigências de

capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à

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assunção do serviço" e se está comprometido a cumprir "todas as cláusulas do contrato

em vigor".

Entretanto, em vista do §2° do art. 5° da Lei das PPPs, os financiadores da SPE

poderão assumir o seu controle sem demonstrar os requisitos anteriormente citados (a

saber, capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídico-fiscal), já que o

objetivo desta medida é promover a reestruturação financeira da sociedade e assegurar a

continuidade da prestação dos serviços. Trata-se, portanto, de uma exceção de eficiência

notadamente duvidosa em relação às determinações do §1° do art. 9°.

A par do entendimento de que a SPE deverá ser constituída sob um dos tipos

societários existentes, a própria Lei n. 11.079/04 prescreve a possibilidade de adoção da

forma de companhia aberta (S/A aberta), com a admissão de negociação em mercado de

seus valores mobiliários (§2° do art. 9°).

Em regra, essa medida tem por fim garantir condições para a obtenção de

refinanciamentos futuros do projeto.

A maioria do capital votante nas SPEs não pode estar nas mãos da

Administração Pública, pois, se estiver, ter-se-á uma sociedade de economia mista, e

não uma SPE, conforme dispõe o § 4° do art. 9° já referido.

Porém, em caso de inadimplemento de contratos de financiamento, a maioria do

capital votante da SPE poderá ser adquirida por instituição financeira controlada pelo

Estado (§ 5º do artigo 9º), tratando, pois de exceção à vedação prevista no § 4º.

O §3º do artigo 9º, por sua vez, além determinar a adoção de contabilidade e

demonstrações financeiras padronizadas, estabelece que a SPE deva obedecer a padrões

de governança corporativa.

À luz da exposição de motivos n. 355/03, presente no Projeto de Lei n. 2.546/03,

que discute a inserção das PPPs no contexto brasileiro, constata-se que a SPE foi

instituída com a finalidade básica de oferecer à Administração Pública garantias para a

adequada conclusão do negócio a ser executado, tendo em vista o esforço e recursos

necessários à conclusão do processo de contratação e o prazo geralmente estendido de

vigência do contrato (que pode chegar a 35 anos).

7.1.3. As SPE e as recuperações judiciais de empresas

Com é sabido, quando uma sociedade empresária está em crise, há duas

alternativas: busca-se a falência ou a recuperação de sua empresa, sendo que esta última

opção pode ocorrer em âmbito judicial ou extrajudicial. E a criação desses institutos de

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recuperação representa, a saber, uma das grandes inovações, senão a maior, trazidas

pela Lei n. 11.101, de 2005.

Igualmente, sabemos que a recuperação, seja ela judicial ou extrajudicial, tem

por objetivo genérico o soerguimento da atividade empresarial.

Contudo, observamos dois planos de intenções: em primeiro lugar, a

recuperação deseja manter a fonte produtora, o emprego dos trabalhadores e proteger os

interesses dos credores; e em segundo plano, ou mediatamente, há a intenção de

preservar a empresa e a sua função social e de estimular a atividade econômica,

consoante previsto no artigo 47 da Lei n. 11.101/05.

Para que um empresário ou uma sociedade empresária possa requerer a

recuperação judicial, é necessária a comprovação de, no mínimo, 2 anos de exercício

regular de suas atividades (artigo 48).

Além disso, o devedor não pode: (I) ser falido; (II) ter obtido concessão de

recuperação judicial há menos de 5 anos; (III) ter obtido concessão e recuperação

judicial com base no plano especial há menos de 8 anos; e (IV) não ter sido condenado.

Sabe-se que todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que vencidos,

estarão sujeitos à recuperação judicial (artigo 49).

O art. 50 da Lei n. 11.101/05, por sua vez, trouxe uma lista exemplificativa, e

não taxativa, dos meios que poderão ser eventualmente utilizados nos processos de

recuperação judicial de empresas, tais como: reestruturação da administração e do

capital, transferência do estabelecimento, renegociação das obrigações trabalhistas,

dação em pagamento, realização parcial do ativo, SPE etc. (ao todo são discriminadas

dezesseis formas). Todavia, é importante perceber que haverá normalmente combinação

de dois ou mais meios.

Assim, no âmbito da recuperação das empresas, o inciso XVI do já referido

artigo 50 introduz a SPE como um meio de recuperação de empresa, afirmando que sua

constituição terá por finalidade "adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do

devedor".

Assim, os créditos titularizados perante a sociedade empresária devedora serão

pagos, ao menos parcialmente, mediante a entrega de seus ativos, desde que estes

tenham sido previamente transferidos a título de integralização de capital social ou

venda. Seria, na verdade, um desdobramento do meio representado pela dação em

pagamento (inc. IX do art. 50), só que com a intermediação de uma SPE, constituída

especialmente para servir à adjudicação.

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A SPE está também diretamente relacionada com a alienação parcial dos bens da

devedora , conforme previsto no inciso XI do artigo 50, porque tal venda poderá servir

de instrumento de redução ou mesmo de liquidação de dívidas.

No Brasil, a crise sofrida pela Varig (Viação Aérea Rio-Grandense S/A) é bem

elucidativa para esta análise. Diante do processo de recuperação judicial envolvendo tal

companhia aérea, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)

propôs a criação de uma SPE cuja finalidade seria adquirir as ações representativas das

empresas VarigLog (Varig Logística S/A) e VEM (Varig Engenharia e Manutenções

S/A), subsidiárias da Varig, ou seja, tem-se aqui a reunião de parte do ativo da devedora

numa SPE.

Depois disso, houve a entrega do valor obtido com a venda dessas ações a certos

credores da Varig, de modo que esta superou parcialmente sua crise patrimonial. Vê-se,

nessa etapa, a realização parcial do ativo da devedora, sendo que o resultado dessa

venda foi, por meio da SPE criada, necessariamente adjudicado em pagamento de

credores da Varig.

Assim, percebe-se que o patrimônio da sociedade em recuperação é cindido, de

forma que a parcela correspondente ao somatório dos bens sujeitos à alienação (ou, em

outras palavras, os ativos da devedora) é destacada para constituir a SPE. Assim, o

capital social da sociedade em crise será reduzido na mesma proporção dessa retirada.

8. Conclusões parciais

A SPE parece ter um horizonte de aplicação muito promissor na experiência

jurídico-nacional.

A celebração de qualquer contrato de PPP em âmbito federal e, em alguns casos,

estadual, pressupõe a constituição de uma SPE que deverá implantar e gerir o objeto do

negócio.

Além disso, tem-se a presença do instituto nas recuperações judiciais de

empresas, recuperação essa que vem recebendo considerações positivas no ambiente

doutrinário e que, provavelmente, será utilizada em larga escala pelos devedores em

crise.

A SPE, igualmente, pode ser criada para qualquer negócio, inclusive imobiliário

como visto.

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9. Da tributação no mercado imobiliário

9.1. Do imposto de renda

A Constituição Federal no seu artigo 153, III, estabelece que compita à União

instituir imposto de renda sobre a renda e os proventos de qualquer natural.

Por usa vez, os artigos 43 e 44 do Código Tributário Nacional estabelecem que o

imposto de renda tenha como fato gerado a aquisição da disponibilidade econômica ou

jurídica de renda e de proventos.

9.2. Da sistemática para a determinação do lucro

O lucro pode ser apurado: a) real; b) presumido: c) arbitrado; d) RET.

9.3. Do lucro real

A base de cálculo do lucro real pelo lucro contábil da empresa, isto é, pelas

receitas e pelas despesas, ajustados pelas adições, exclusões e compensações previstas

pela legislação tributária.

Assim, o IRPJ terá alíquota de 15% e adicional de 10% sobre o que exceder de

R$ 20.000,00 por mês no período de apuração.

A CSLL tem alíquota de 9%.

O período de apuração é trimestral ou anual e o regime de apuração é por

competência.

Para as empresas do setor imobiliário é possível utilizar o custo orçado.

9.4. Do reconhecimento da receita

Neste aspecto o regime de competência significa que a receita é considerada no

momento do nascimento do direito do contribuinte de recebê-la.

O regime de caixa significa que a receita é contabilizada quando efetivamente

recebida ou paga em dinheiro.

Portanto, as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real devem

reconhecer os resultados das receitas pelo regime de competência.

9.5. Lucro real (REF)

No lucro real haverá diferimento da tributação:

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Nas vendas a prazo ou a prestações com previsão contratual de recebimento

(total ou parcial) para depois do período base da venda, o lucro poderá ser reconhecido

proporcionalmente à receita da venda recebida.

O lucro bruto será na conta resultados de exercício futuros.

9.6. Conceito de patrimônio

Segundo a Lei n. 11.638, a demonstração contábil e fiscal, devem atender a fins

diferentes: transparência da situação econômica da empresa e a situação das relações

jurídicas a respeito do patrimônio, o que vem ocorrendo no setor imobiliário.

A Lei das sociedades anônimas no seu artigo 177, § 7º prevê que os lançamentos

de ajuste efetuados exclusivamente para a harmonização de normas contábeis, nos

termos do § 2º, e as demonstrações e apurações com eles elaboradas não poderão ter

base de incidência de impostos e contribuições e nem ter quaisquer outros efeitos

tributários.

9.7. Normas para a construção civil

As normas a serem seguidas e recomendas devem considerar as receitas e as

despesas contábeis, dependendo da confiabilidade da estimativa do desfecho do

contrato, considerando ainda:

a) Se os dados forem confiáveis, reconhecidos como receitas e despesas na

proporção da medição da execução da obra ao final do período-base;

b) Se os dados não forem confiáveis, as receitas serão reconhecidas até o

ponto em que os custos sejam recuperáveis e, os custos serão considerados despesas no

período em que incorridos;

c) Em todo o caso, a perda esperada nos contratos em que o custo exceder a

receita, será automaticamente reconhecida como despesa.

9.8. Das demonstrações contábeis das empresas do setor imobiliário (lucro real)

Segundo dispõe o item 7.1. do ofício circular CVM/SNC/SEP 01, de 14 de

fevereiro de 2007, a Comissão de Valores Imobiliários dispôs que as “Companhias que

atuam no setor imobiliário têm a opção de registrar as vendas dos seus

empreendimentos com base em orientação contábil fixada na legislação fiscal, que

pressupõe, basicamente, o reconhecimento das receitas na medida em que a mesma é

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recebida, caracterizando a utilização do regime de caixa em detrimento do regime de

competência de exercícios preconizado no artigo 177 da lei societária”.

Todavia, fica reconhecido a opção do contribuinte de adotar o regime contábil de

caixa para verificar ou reconhecer as receitas.

No caso de venda a prazo da unidade não concluída, o resultado na venda deverá

ser apropriado ao longo da obra, da mesma forma em que são apropriados os contratos

de fornecimentos de bens, obras e serviços de longo prazo, com base no progresso físico

ou nos custos incorridos.

Todavia, podem existir situações em que um determinado fato dependa de uma

condição suspensiva, isto é, o direito fica na dependência da ocorrência do fato.

Assim, é suspensiva a condição que subordine a aquisição do direito à

verificação ou ocorrência do fato nela previsto, tal como a cláusula que faça a eficácia

da operação de compra e venda dependente de financiamento do saldo devedor do

preço, ou a que sujeita essa eficácia à liberação de hipoteca que esteja gravando o bem

negociado.

Ocorrendo tal hipótese, os valores recebidos são contabilizados no Passivo

Circulante e somente serão oferecidos à tributação quando da execução da cláusula

(evento futuro e incerto).

9.9. Do custo orçado

O contribuinte poderá computar como custo do imóvel vendido, se a venda for

contratada antes de concluído o empreendimento, além dos custos pagos, incorridos ou

contratados, os custos orçados que estivermos obrigados contratualmente a realizar.

Tal custo será baseado nos custos usuais no tipo de empreendimento imobiliário

a preços correntes de mercado na data que o contribuinte optar por ele, e corresponderá

à diferença entre o custo total previsto e os custos pagos incorridos ou contratos nos

termos das Instruções Normativas n. 84/79 e 23/83 da Secretaria da Receita Federal e

artigo 412 do Regulamento do Imposto de Renda.

9.10. Do custo orçado e do período de apuração da venda

O artigo 412, § 2º, do Regulamento do Imposto de Renda prevê que se a

execução da obra a que se obrigou o contribuinte se estender além do período de

apuração da venda e o custo efetivamente realizado for inferior, em mais de 15%, ao

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custo orçado, o contribuinte fica obrigado a pagar juros de mora sobre o valor do

imposto postergado pela dedução de custo orçado excedente ao realizado.

9.11. Do PIS e da COFINS

Pela Lei n. 9.718/98 o regime cumulativo incide sobre todas as etapas da cadeia;

sobre a totalidade das receitas, excluindo-se da base de cálculo porque não são receitas,

as receitas decorrentes das vendas canceladas, descontos incondicionais, a receita

decorrente da venda de bens do ativo permanente, etc.

O PIS tem alíquota de 0,65% e o COFINS 3%, tendo como base de cálculo: o

faturamento, a receita bruta e a totalidade de receitas.

9.12. PIS e COFINS: regime não cumulativo

Pelo regime não cumulativo previstos nas Leis n. 10.637/02 e 10.833/03, a

incidência é somente sobre o valor agregado (economicamente) em cada etapa da cadeia

produtiva, havendo incidência sobre todas as receitas, com desconto de créditos

previstos na lei.

A alíquota do PIS é de 1,65% e do COFINS é de 7,6%, tendo por base de

cálculo: faturamento, receita bruta de bens e serviços e demais receitas auferidas pela

pessoa jurídica.

Neste sistema, as receitas são multiplicadas por 9,25% menos créditos

(multiplicados no mesmo percentual de 9,25%) obtendo o PIS e a COFINS a ser paga.

São considerados créditos: bens para revenda, insumos, energia elétrica

(consumida no estabelecimento da pessoa jurídica), aluguéis de prédios, máquinas e

equipamentos, leasing, máquinas, depreciação.

Não dão direito a credito: mão de obra, pessoa física, despesas financeiras,

despesas a não residentes, depreciação de bens adquiridos antes de 30 de abril e 2004,

aluguel de bens que já pertenceram à empresa, insumos de pessoas físicas.

Quanto às receitas financeiras, aplica-se o disposto no Decreto n. 5.442/2005,

que dispõe no seu artigo 1º, que ficam reduzidas a zero as alíquotas da contribuição para

o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras, inclusive

decorrentes de operações realizadas para fins de hedge, auferidas pelas pessoas jurídicas

sujeitas ao regime de incidência não cumulativa das referidas contribuições.

O parágrafo único do referido decreto, dispõe ainda que o disposto no caput não

se aplique: aos juros sobre o capital próprio e aplica-se às pessoas jurídicas que tenham

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apenas parte de suas receitas submetidas ao regime de incidência não cumulativa do PIS

e da COFINS.

9.13. Da receita da atividade imobiliária

A lei n. 10.833/03 excluiu as receitas decorrentes da construção civil da

sistemática não-cumulativa, enquanto a Instrução Normativa n. 458/04 submeteu à

sistemática não cumulativa as receitas de incorporação civil, desconsiderando a

amplitude do termo construção civil.

Entretanto, essa sistemática normativa está sendo questionada judicialmente pelo

Sindicato da Construção Civil.

9.14. Do Lucro presumido

O lucro presumido não se estende a todas as empresas e algumas delas estão

submetidas ao lucro real.

A empresa poderá subtrair de sua receita bruta os valores relativos a vendas

canceladas, descontos concedidos incondicionalmente e aos impostos não cumulativos

incidentes sobre a venda, cobrados destacadamente (IPI e ICMS em substituição).

O ICMS está excluído da base de cálculo do lucro presumido nos termos de uma

decisão judicial proferida pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso extraordinário n.

240.785.

As empresas estão obrigadas à apuração pelo lucro real e impedidas de

utilizarem o lucro presumido nas seguintes hipóteses:

1) Cuja receita bruta no ano-calendário anterior seja superior ao limite de 48

milhões de reais ou proporcionais ao número de meses do período, quando inferior a

doze meses;

2) cujas atividades sejam de instituições financeiras, inclusive sociedades de

crédito imobiliário;

3) que tiveram lucros, rendimentos ou ganhos de capitais oriundos do exterior;

4) que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais

relativos à isenção ou redução do imposto;

5) que, no decorrer do ano-calendário, tenham efetuado pagamento mensal pelo

regime de estimativa, na forma do artigo 2º da Lei n. 9.430/1996;

6) cuja atividade seja de factoring.

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Registramos, igualmente, que o custo orçado no lucro presumido, para a pessoa

jurídica que se dedica à compra e à venda de loteamentos, desmembramentos,

incorporação, construção de imóveis, está impedida de optar pelo lucro presumido

enquanto não concluídas as operações imobiliárias para as quais haja registrado orçado,

nos termos das Consultas n. 32/04, 25/99 e 31/01 da Secretaria da Receita Federal.

Contudo, existe uma decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no

Recurso Especial n. 665.880, de 14 de fevereiro de 2006, que afasta a aplicabilidade da

Instrução Normativa n. 25/99 da Secretaria da Receita Federal por afrontar o princípio

da legalidade.

O lucro presumido tem duas etapas: a) apuração da base de cálculo mediante a

aplicação de coeficiente específico sobre a receita operacional da empresa; b) cálculo do

imposto pela multiplicação do valor encontrado na primeira etapa pela alíquota

estipulada pela legislação.

Na apuração da base de cálculo levam em consideração os seguintes percentuais

de presunção (coeficientes):

1,6% - para revenda de combustível a consumidor final;

8% - para indústria, comércio, transporte de carga e serviços hospitalares, setor

de construção civil por empreitada com emprego de materiais;

16% - para os serviços de transportes;

32% - para a prestação de serviços em geral, intermediação de negócio e

administração e locação de bens móveis e imóveis e direitos de qualquer natureza.

A alíquota do imposto de renda incidente sobre o lucro das pessoas jurídicas é de

15%, independente da forma de apuração.

Há, também, o adicional do imposto de renda, isto é, a parcela do lucro da

pessoa jurídica que exceder ao montante de vinte mil reais por mês do período de

apuração, em qualquer forma de apuração, está sujeita a incidência do referido

adicional, a razão de 10%.

Por fim, a alíquota da CSLL é de 9%.

Quanto ao período de apuração, observamos o que segue.

A apuração do IRPJ pelo lucro presumido deve ser realizada trimestralmente,

podendo o imposto ser recolhido em quota única, ou em até três parcelas iguais e

sucessivas.

O regime de apuração das receitas ou é de caixa ou é de competência.

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O PIS e a COFINS são cumulativas no percentual de 3,65% sobre a receita

bruta, incluindo as financeiras.

Caso haja opção pelo lucro presumido deverá ser observado: a) o pagamento da

primeira ou única quota do imposto no primeiro período de apuração do ano-calendário

(abril), nos termos do artigo 26, § 1º da Lei n. 9.430/96; b) tal opção será definitiva para

todo o ano-calendário, nos termos do artig0 13, § 1º, da Lei n. 9.178/98; c) será

indeferido o pedido para retificação de DARF que pretenda alterar o regime de

tributação do IRPJ nos termos do artigo 11, da Instrução Normativa n. 672/06 da

Secretaria da Receita Federal.

O lucro presumido na construção civil observará: a) o emprego de materiais no

percentual de 8%; b) a prestação de serviço geral no percentual de 32%.

9.15. Da segregação do empreendimento

Nesta hipótese, encontramos as seguintes vantagens: a) diminuição de riscos; b)

apuração de forma individualizada do lucro de cada empreendimento; c) possibilidade

de economia tributária.

9.16. Da tributação nas diversas espécies de sociedades

9.16.1. Em conta de participação (SCP)

Como já mencionamos, elas são constituídas sem maiores formalidades,

podendo ser provada por qualquer forma admitida em direito, não havendo

obrigatoriedade de registro comercial e nem inscrição no cadastro nacional de pessoas

jurídicas. Logo, não tem personalidade jurídica.

O sócio ostensivo é responsável pelo recolhimento dos tributos utilizando seu

próprio CNPJ.

São vantagens: pode apurar o IR de forma diferente do sócio ostensivo.

São desvantagens: eventuais prejuízos não podem ser compensados com o lucro

de outras SCPs ou do sócio ostensivo.

Na criação de tais sociedades deve levar em consideração: a) os sócios

investidores (pessoas físicas ou jurídicas); b) quanto aos sócios estrangeiros se estão

regulares junto ao Banco Central; c) se houver opção pelo lucro presumido, há

necessidade de verificar como está a situação do sócio ostensivo, porque em algumas

oportunidades ela poderá estar impedida.

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9.16.2. Das sociedades de propósitos específicos (SPE)

Nesse modelo societário existem vantagens e desvantagens.

Quanto as primeiras arrolamos as seguintes: a) pode ter o regime de qualquer

sociedade (limitada, sociedade anônima, etc.); b) pode apurar o imposto de renda de

forma diferente dos sócios; c) os lucros podem ser distribuídos como dividendos,

isentos de imposto de renda.

Em contrapartida, são desvantagens: a) eventuais prejuízos não podem ser

compensados com o lucro dos sócios; b) há solidariedade entre os sócios no limite do

capital social do empreendimento.

9.17. Do regime especial de tributação

9.17.1. Disposições gerais

Uma das finalidades desse regime é o de adequar à tributação do patrimônio de

afetação a necessidade do setor.

No nosso Curso de Direito Civil Brasileiro (LEX-CS, 2006, p. 342) tratamos

desse patrimônio que foi instituído pela Lei n. 10.931/2004, objetivando criar maior

estabilidade nas relações jurídicas do mercado imobiliário, especialmente, à obtenção de

crédito junto às instituições financeiras.

Além disso, criou o regime especial tributário, pelo qual o incorporador

imobiliário pode optar por uma tributação incidente sobre a receita da atividade.

Pode ser objeto desse regime as incorporações imobiliárias (terrenos, acessões e

demais bens e direitos), ficando os mesmos apartados do patrimônio da incorporadora.

A alíquota dos impostos é unifica em 7%, nos termos do artigo 4º, da Lei n.

10.931/04, sendo:

IRPJ – 2,2%;

PIS – 0,65%;

CSLL – 1,5%;

COFINS – 3%.

Nesse regime especial, há uma fórmula de apuração da base de cálculo, que

abrange as receitas operacionais mais as receitas financeiras mais a variação cambial.

Assim, a base de cálculo dos tributos, nos termos do artigo 4º, da Lei n.

10.931/04, é a receita mensal de vendas de unidades imobiliária do empreendimento

cujo patrimônio foi afetado, bem como as respectivas receitas financeiras e as variações

monetárias.

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Além disso: a) o regime de reconhecimento de receitas é único para todos os

tributos; b) o pagamento é unificado e deverá ocorrer até o décimo dia útil do mês

subseqüente àquele em que recebidas as receitas; c) os créditos tributários devidos pela

incorporadora não poderão ser objeto de parcelamento.

É um regime de opção, e acaso a incorporadora opte pelo RET, deverá solicitar

um novo número de CNPJ para o empreendimento, nos termos do inciso III, do artigo

12, da Instrução Normativa n. 568/05 da Secretaria da Receita Federal.

Se compararmos o RET com o sistema do Lucro Presumido obterá o seguinte.

Lucro presumido:

Tributo Alíquota e apuração alíquota efetiva

IRPJ lucro presumido – presunção 2%

De 8% e alíquota de 25%

(15% + 10%)

CSLL lucro presumido – presunção 1,08%

De 12% e alíquota de 9%

PIS alíquota sobre a receita 0,65%

COFINS alíquota sobre a receita 3,00%

CARGA

TRIBUTÁRIA 6,73%

Observamos que em não ocorrendo à opção pelo referido regime, os resultados

do empreendimento serão tributados em conjunto com os demais resultados da

incorporadora.

No RET obtemos a seguinte carga tributária:

TRIBUTO ALÍQUOTA E APURAÇÃO ALÍQUOTA EFETIVA

IRPJ alíquota sobre a receita 2,20%

CSLL alíquota sobre a receita 1,15%

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PIS alíquota sobre a receita 0,65%

COFINS alíquota sobre a receita 3,00%

CARGA

TRIBUTÁRIA 7,00%

Comparando um sistema com o outro obtemos os seguintes resultados:

A Carga tributária no Lucro Presumido é de 6,73% enquanto no RET, 7%.

A opção pelo regime deve ser feita no ano-calendário e não pode ser alterada.

No RET poderá ocorrer a alteração.

No Lucro Presumido há um limite de 48 milhões para opção enquanto no RET

não existe.

No Lucro Presumido o risco de interpretação tributária é baixo, e no RET é

inexistente.

9.17.2 Dos regimes de tributação nas incorporações imobiliárias

Do que vimos até agora, verificamos que existem três regimes tributários para as

incorporações imobiliárias:

a) Lucro Real cuja tributação é de 9,25% (IR + CSLL + PIS + COFINS);

b) Lucro Presumido cuja tributação é de 6,73%;

c) RET cuja tributação é de 7% da receita total.

Considerações Finais

Pelo exposto, podemos dizer que a opção por uma das formas societárias

referidas acima, está mais condicionada à maneira como as consorciadas pretendem

gerir a parceria, tendo em vista o objeto, o prazo de duração e também em função da

situação contábil de cada consorciada.

Para efeitos tributários, conforme já exposto, optando-se pelo consórcio, cada

consorciada deverá apurar o seu lucro tributável, apropriando-se individualmente suas

receitas e despesas.

No caso de SPE, por se constituir numa empresa, está deverá apurar o lucro em

função da exploração da obra ou serviço contratado.

Ressaltamos que, na SPE, não se individualiza mais esta ou aquela consorciada,

mas sim, trata-se de uma nova sociedade que administrará, num bloco só, a nova

sociedade.