Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e natural ou atentado à dignidade...

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Agrupamento de Escolas de Penacova Trabalho realizado no âmbito da disciplina de Filosofia: Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e natural ou atentado à dignidade humana? Autores: David Alves, nº 1, 10º A Diogo Silva, nº 2, 10º A Diogo Gomes, nº 3, 10º A Professores Orientadores: Adelaide Claro Filosofia Lurdes Dias Professora Bibliotecária Penacova Ano Letivo 2013/2014

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Um dos trabalhos vencedores do Concurso PORDATA/RBE 2013-14. Autores: David Alves, Diogo Silva e Diogo Gomes (alunos do 10º ano) Professoras orientadoras: Adelaide Claro (Filosofia) e Lurdes Dias (Professora Bibliotecária) Escola Básica e Secundária de Penacova

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Agrupamento de Escolas de Penacova

Trabalho realizado no âmbito da disciplina de Filosofia:

Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e

natural ou atentado à dignidade humana?

Autores:

David Alves, nº 1, 10º A

Diogo Silva, nº 2, 10º A

Diogo Gomes, nº 3, 10º A

Professores Orientadores:

Adelaide Claro – Filosofia

Lurdes Dias – Professora Bibliotecária

Penacova

Ano Letivo 2013/2014

Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e natural ou atentado à dignidade humana?

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ÍNDICE DE ASSUNTOS

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 4

2. ENVELHECIMENTO E SOLIDÃO .......................................................................................... 6

2.1. Conceitos de envelhecimento .......................................................................................... 6

2.2. Envelhecimento a nível mundial. ...................................................................................... 6

2.3. Evolução dos indicadores de envelhecimento em Portugal. Comparação com a união

europeia .................................................................................................................................. 7

2.3.1. Índice de envelhecimento .......................................................................................... 7

2.3.2 Índice de longevidade ................................................................................................. 8

2.3.3 Esperança de vida à nascença (comparação com os outros indicadores) .................. 8

2.4. Conceito de solidão. Principais focos em Portugal ........................................................... 9

3. POSIÇÕES RELATIVAS A ATOS HUMANOS PROVOCADORES DA SOLIDÃO................ 10

3.1. Legislação portuguesa e internacional relativamente à solidão ...................................... 11

4. IDENTIFICAÇÃO DE CAUSAS DA SOLIDÃO NOS IDOSOS. RELAÇÃO ESTATÍSTICA

COM OS PRINCIPAIS FOCOS/ZONAS DE SOLIDÃO EM PORTUGAL. ................................. 12

4.1 – Famílias unipessoais segundo os Censos – 65 e mais anos ........................................ 12

4.2 – Densidade populacional segundo os Censos – Nº médio de indivíduos por km2 .......... 13

4.3 – Taxa de inatividade total segundo o Censos: ............................................................... 14

5 – SALDO MIGRATÓRIO INTERNO SEGUNDO OS CENSOS .............................................. 15

6. CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 17

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 18

ANEXOS .................................................................................................................................. 20

ÍNDICE DE IMAGENS:

Gráfico 1 – Índice de envelhecimento em Portugal (1970-2011) …………………………………..7

Gráfico 2 - Índice de Longevidade em Portugal (1970-2011) ……………………………………….8

Gráfico 3 - Comparação entre os índices de envelhecimento e de longevidade e a esperança

de vida à nascença em Portugal (1970-2011) ………………………………………………………..8

Imagem 1 - Famílias clássicas unipessoais com 65 ou mais anos segundo o Censos em

Portugal (ano de 2011) ……………………………………………………………………………….13

Imagem 2 - Densidade populacional segundo os Censos – Nº médio de indivíduos por km2 em

Portugal (ano de 2011) ……………………………………………………………………………….14

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Imagem 3 - Taxa de inatividade total segundo o Censos em Portugal (ano de 2011) ………...15

Imagem 4 - Saldo migratório interno segundo os Censos em Portugal (ano de 2001) ………..16

ÍNDICE DE ANEXOS:

Anexo 1 – Média das idades dos indivíduos residentes num determinado país, a nível mundial

(mapa) …………………………………………………………………………………………………20

Anexo 2 - Esperança de vida à nascença a nível mundial ………………………………………..20

Nota: O tipo de letra imposto para a realização do trabalho impede, em certas circunstâncias, a

colocação de acentos em certas letras maiúsculas, pelo que se pede algum grau de

compreensão relativamente a essa situação. O texto apresentado no presente trabalho

segue as normas do Novo Acordo Ortográfico.

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1. INTRODUÇÃO

Podendo ser considerada como uma “dádiva”, a vida segue a lei natural e encontra-se,

consequentemente, subdividida em três principais fases: a infância, a fase adulta e a velhice.

Deste modo, estamos inevitavelmente sujeitos a um processo de envelhecimento biológico,

caracterizado pela diminuição contínua da capacidade funcional das células somáticas do

nosso organismo. Associado ao mesmo, é geralmente percetível uma perda das capacidades

motoras e cognitivas do indivíduo, devido à destruição celular que ocorre no seu organismo.

No entanto, os problemas associados ao envelhecimento não apresentam um término

nas consequências suprarreferidas, podendo atingir talvez um dos maiores flagelos da

sociedade atual, visado na realização do presente trabalho: a solidão. Embora seja um

conceito subjetivo, esta pode ser globalmente definida pela falta de contacto com terceiros, o

que origina um estado profundo de isolamento.

Enquanto seres humanos, faz parte da nossa natureza a relação com a comunidade em

que nos inserimos (somos seres sociáveis). Deste modo, a nossa própria autorrealização e

autoconstrução são sustentadas pelo convívio com o “outro”, dado que é impossível não

termos a sociedade como referência e exemplo ao longo do desenvolvimento da nossa

capacidade cognitiva.

A solidão nos idosos tem vindo a aumentar no nosso país (Ribeiro, João Miguel; 2012),

aliada à intensificação de diversos indicadores de envelhecimento mas também a causas

humanas, onde o altruísmo é completamente desprezado, valorizando-se a atrocidade do

egoísmo. Apesar de este sentimento poder estar associado a origens unicamente humanas, é

inconcebível negar a existência de causas naturais, também elas determinantes para que este

fenómeno se desencadeie.

Talvez pensemos que o facto de ainda não sermos idosos justifique o facto de não

necessitarmos de ter uma posição fundamentada relativamente a este problema ou, de pelo

menos, reconhecermos as causas e principais consequências do mesmo. No entanto, este

argumento é completamente incorreto: todos iremos passar por essa fase (sentindo ou não

solidão) e enquanto seres sociais, temos o dever cívico de intervir nos problemas da nossa

sociedade, procurando contribuir para a sua atenuação.

Com a realização deste trabalho, pretende-se a identificação dos fenómenos de solidão e

envelhecimento em Portugal, bem como os respetivos focos, a tentativa de identificação de

causas decisivas para o despoletar destes sentimentos e a relação estatística entre essas

causas e as áreas onde os focos de solidão se encontram em maior número, de modo a

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caracterizar a secção da população que mais sofre com um dos fenómenos mais emergentes

nas sociedades contemporâneas.

Deste modo, surge-nos uma pergunta que irá certamente fazer com que a nossa

capacidade reflexiva a estude: será a solidão uma mera situação natural e, consequentemente,

inevitável ou será esta causada por atos atrozes que põem em causa a dignidade humana?

Pedimos-vos que entrem connosco neste percurso de aprendizagem na tentativa de

responder a esta pergunta, evidenciando os diferentes pontos de vista que sustentem de forma

coerente as duas possibilidades presentes na pergunta.

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2. ENVELHECIMENTO E SOLIDÃO

2.1. Conceitos de envelhecimento

O envelhecimento humano pode ser traduzido globalmente através dos processos de

desgaste do corpo a partir do momento em que é atingida a fase adulta. É na velhice que o

mesmo atinge o seu expoente máximo, desencadeando a perda das capacidades orgânicas e

funcionais do organismo.

Apesar de possuir um significado global, o envelhecimento pode subdividir-se em

diferentes tipos. Salientam-se os seguintes:

a) envelhecimento biológico: destruição contínua das células somáticas (não envolvidas

na reprodução) do organismo, diminuindo a sua capacidade funcional e facilitando o

desenvolvimento de doenças associadas à velhice.

b) envelhecimento cronológico: define a mera consequência da passagem do tempo,

sendo o processo pelo qual um indivíduo se torna mais velho.

c) envelhecimento patológico: danos na saúde de um indivíduo causados pelo passar

do tempo, originados por maus hábitos de saúde e não propriamente pelo processo de

envelhecimento.

d) envelhecimento populacional: aumento geral da média de idades da população de

um determinado país causado por vários fatores e potenciador de consequências

negativas para a sociedade (maiores gastos com assistência social,…).

No tratamento dos objetivos pretendidos com a realização deste trabalho, são

essencialmente importantes os conceitos de envelhecimento biológico e de envelhecimento

populacional, de modo a ser possível estudar a evolução da idade média da população e as

consequências que a mesma tem na sociedade. Consideramos o fenómeno do envelhecimento

um fator também ele decisivo para a perceção e interpretação dos fenómenos de solidão que

ocorrem na população idosa.

2.2. Envelhecimento a nível mundial.

A partir da consulta do Anexo 1, é possível inferir acerca das áreas geográficas onde a

média das idades da população é maior e, consequentemente, constatar as zonas onde o

envelhecimento populacional é mais intenso. Comparando a imagem com o Anexo 2, onde se

retrata a esperança média de vida a nível mundial, é facilmente detetável uma relação entre

estes dois indicadores: uma menor esperança média de vida gera inevitavelmente uma morte

mais prematura e, como resultado, uma menor quantidade da população atinge idades mais

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avançadas. A situação inverte-se quando observamos países com maior esperança média de

vida: apresentam uma maior média de idades, denunciadora de um maior envelhecimento.

2.3. Evolução dos indicadores de envelhecimento em Portugal. Comparação com a união

europeia

De modo a avaliar a evolução do envelhecimento no nosso país é importante seguir

certos indicadores que revelem essa mesma evolução. Consideremos então três fatores:

a) Índice de envelhecimento: relação entre a população idosa e a população jovem,

definida habitualmente como o quociente entre o número de pessoas com 65 ou mais

anos e o número de pessoas com idades compreendidas entre os 0 e os 14 anos;

b) Índice de longevidade:relação entre a população mais idosa e a população idosa,

definida habitualmente como o quociente entre o número de pessoas com 75 ou mais

anos e o número de pessoas com 65 ou mais anos;

c) Esperança de vida à nascença:número médio de anos que uma pessoa à nascença

pode esperar viver, mantendo-se as taxas de mortalidade por idades observadas no

momento de referência.

2.3.1. Índice de envelhecimento

Gráfico 1 – Índice de Envelhecimento (de 1970 a 2011) expresso em percentagem, sendo o rácio o tipo de

valor. (Fontes: INE, PORDATA)

Em 1970, por cada 100 jovens verificava-se a existência de 34 idosos. Este rácio foi

aumentando ao longo dos anos, registando-se em 2011 (último registo) a existência de,

aproximadamente, 128 idosos por cada 100 jovens. É, deste modo, percetível o aumento

súbito deste índice, justificando-se o envelhecimento da população na sociedade atual.

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2.3.2 Índice de longevidade

Gráfico 2 – Índice de Longevidade (de 1970 a 2011) expresso em percentagem, sendo a proporção o tipo de

valor. (Fontes: INE, PORDATA)

Em 1970, 32,8% da população idosa (com 65 ou mais anos) apresentava uma idade igual

ou superior a 75 anos. Ao longo dos anos em estudo no gráfico, verifica-se um aumento

contínuo do índice, atingindo um valor máximo no último registo, em 2011, com uma proporção

de 47,9%. É novamente percetível o envelhecimento da população, sendo atingidas idades

cada vez mais superiores à medida que nos vamos aproximando da época atual.

2.3.3 Esperança de vida à nascença (comparação com os outros indicadores)

Gráfico 3 – Comparação entre os índices de envelhecimento e de longevidade e a esperança de vida à

nascença (1970-2011). Índices de envelhecimento e longevidade expressos em percentagem e esperança

média de vida expressa em anos. O tipo de valor é, respetivamente, rácio, proporção e valor médio. (Fontes:

INE, PORDATA).

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Através da observação deste gráfico, é facilmente visível o envelhecimento da população

portuguesa e a influência da esperança de vida à nascença na evolução destes indicadores. À

medida que o tempo se desenrolou, todos estes fatores (denunciadores de um envelhecimento

da população) foram aumentando. A existência de um aumento da esperança média de vida,

implica um prolongamento da média de idades da população portuguesa (devido ao facto de,

em média, serem vividos mais anos), gerando assim um inevitável envelhecimento. De

salientar que, a partir do ano de 2001, o registo da esperança de vida passou a incidir numa

conjugação trienal, dando lugar a uma quebra de série.

Em comparação com a UE, o índice de envelhecimento português apenas foi inferior à

média europeia nos três primeiros anos em que se registou a contagem a nível da União

Europeia (1990-1992). Nos anos seguintes, os dois índices foram subindo, registando-se, no

entanto, uma maior variação no caso português. Em 2011, a média europeia localizava-se em

113,2%, enquanto a portuguesa situava-se nos 127,8%. (Fonte: PORDATA).

2.4. Conceito de solidão. Principais focos em Portugal

Embora se apresente como um conceito altamente complexo e subjetivo, a solidão pode

ser globalmente definida pela falta de companhia ou apoio social, escassez de contacto com

outras pessoas e criação de um estado de isolamento social. Nas palavras de Norbert Elias,

“se uma pessoa sentir quando está morrendo que, embora ainda viva, deixou de ter significado

para os outros, essa pessoa está verdadeiramente só.” (2007).

É nos idosos que a solidão apresenta uma característica mais intensa, dado que é nesta

fase etária que a perceção da solidão atinge níveis mais dizimadores das capacidades

biológicas, cognitivas, morais e motoras do idoso.

Em Portugal, o problema da solidão tem sido cada vez mais alvo de discussão, através

da perceção das situações de certos idosos a viverem vidas completamente atrozes. No

entanto, o fenómeno que aqui tratamos continua a afetar cada vez mais indivíduos e nem

sempre é promovida a devida assistência social.

Os principais focos de solidão em Portugal são, segundo os “Censos Sénior” do ano de

2014, Viseu (2945 registos de casos), Beja (2793), Guarda (2713), Évora (2418), Portalegre

(2116) e Santarém (2076). Sublinhe-se também a existência de taxas elevadas em Lisboa e no

Algarve, segundo os “Censos” de 2011 (Fonte: INE).

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3. POSIÇÕES RELATIVAS A ATOS HUMANOS PROVOCADORES DA SOLIDÃO

Como referido na Introdução, a solidão nos idosos pode ter como origem causas naturais

(viuvez, doença, perda dos entes queridos,…) que, inevitavelmente, são causadoras deste

flagelo das sociedades contemporâneas. No entanto, possivelmente, a grande parte destas

situações é causada por ações humanas, principalmente no que diz respeito a atos de

familiares das vítimas de solidão que, passivos relativamente ao possível sofrimento do idoso,

não têm qualquer remorso em abandoná-lo, promovendo o isolamento do mesmo e o cessar

da sua experiência social.

Certas pessoas justificam que estes atos acabam por ser compreensíveis dado que

resultam da ambição dos descendentes mais próximos do idoso em alcançar melhores

condições de vida, algo que não pode ser atingido com tanta facilidade em zonas rurais, a título

de exemplo. A posse mais facilitada de bens e a conquista de um estatuto social serão também

possíveis finalidades destes atos (Barroso, V. L & Tapadinhas, A. R.; 2006). A maior densidade

populacional do litoral português e a sua modernização, com a introdução de maiores

oportunidades de trabalho e de melhores infraestruturas, a diversos níveis (saúde, educação,

comércio,…) tem cativado os residentes nas zonas interiores do nosso país a deslocarem-se

para o litoral, relegando a família para papéis inferiores, ficando a mesma isolada na

estagnação do Interior.

Existem, sem dúvida, poucos argumentos que sustentem que estes atos são realizados

de forma positiva, sem qualquer sentimento de malícia e não interferindo diretamente na

promoção da solidão. Se partirmos da outra posição, teremos certamente muito que opinar.

Encontra-se provado que os idosos que têm uma perceção de maior preocupação por

parte dos seus familiares estão sujeitos a menores probabilidades de virem a sofrer de solidão

(Barroso, V. L & Tapadinhas, A. R.; 2006). Tudo isto acontece porque o idoso possui um apoio

familiar que o sustenta nos momentos difíceis que o possam afetar. É extremamente incómodo

para um idoso verificar que já não tem qualquer significado para os outros. A partir do momento

em que ocorre uma separação relativamente aos seus familiares, há uma perda completa da

relação com os mesmos (ainda mais dizimadora se associada a uma diminuição das

capacidades físicas), o que gera a quebra de qualquer esperança ou propósito de vida, levando

à solidão e, em casos extremos mas comprovados, ao suicídio.

Quando um idoso se encontra nestas situações, a solidão passa a estabelecer certas

limitações na sua vida, o que origina uma diminuição da preocupação do idoso consigo

mesmo, levando à diminuição ainda mais acelerada das suas capacidades biológicas,

cognitivas e motoras.

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Parecem-nos inconcebíveis as atitudes egoístas de alguns familiares, ao desprezarem de

forma voluntária as pessoas que os criaram e com os quais partilham o seu material genético.

De salientar uma intensificação de um individualismo social, onde cada pessoa tenta beneficiar

ao máximo os seus interesses pessoais, alheando-se dos interesses de terceiros e ignorando o

bem comum. Com a solidão, é quebrado todo um princípio de relacionamento social que o ser

humano necessita indubitavelmente para que a sua vida seja vivida de forma regrada e com

princípios.

No mundo capitalista em que vivemos, muitas vezes não encontramos suporte e

assistência às vítimas de solidão: valoriza-se o capital a todo o custo e ignora-se qualquer

perspetiva de bem coletivo e de maximização da felicidade e bem-estar (Neves, Pedro; 2011).

O altruísmo é absolutamente inexistente! Urge uma consciência cidadã sobre a importância de

todas as faixas etárias para o desenvolvimento das sociedades humanas. Como afirma Carlos

Esteves (2011), “um país que não respeita as suas crianças ou os seus idosos é um país que

não tem respeito por si próprio. E que não merece respeito”.

3.1. Legislação portuguesa e internacional relativamente à solidão

A legislação portuguesa condena qualquer ato humano que possa levar à solidão,

baseando-se essencialmente nos princípios de que estes atos põem em causa a dignidade, a

integridade moral e as aspirações do idoso.

Observemos excertos de dois documentos reguladores de códigos morais: a Constituição

da República Portuguesa e os Princípios das Nações Unidas para o Idoso:

Artigo 1º (República Portuguesa) Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana (…) construção de uma sociedade livre, justa e solidária.” (…) Artigo 24º (Direito à vida) 1. A vida humana é inviolável. (…) Artigo 25º (Direito à integridade pessoal) 1. A integridade moral e física das pessoas é inviolável. (Assembleia da República, 2005)

A partir da leitura destes excertos pertencentes à Constituição da República Portuguesa,

é categoricamente defendida a dignidade de qualquer indivíduo, devendo uma sociedade ser

construída de forma livre, justa e solidária, algo que é extremamente dificultado com a

existência de casos de solidão, reveladores de uma falta incompreensível de altruísmo e de um

sentido de solidariedade.

É também salvaguardada a inviolabilidade da integridade moral e física das pessoas,

novamente posta em causa através da prática de atos que originem a solidão no idoso.

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A mesma preocupação é visível nos Princípios das Nações Unidas para o Idoso (1991)

onde é defendida, a um nível mundial (e não só nacional), a garantia da dignidade, sendo

condenável qualquer ato que possa pôr em causa a integridade física e mental do idoso,

beneficiário incondicional da proteção da sua família e comunidade:

(…) 10. Beneficiar da assistência e proteção da família e da comunidade, de acordo com os seus valores culturais. 17. Poder viver com dignidade e segurança, sem ser objeto de exploração e maus-tratos físicos

e/ou mentais. (ONU, 1991)

É, deste modo, visível a oposição destas entidades a qualquer ato que possa provocar

solidão nos idosos (e, inclusive, em todos os indivíduos). Apesar de estes princípios estarem

consagrados nestes documentos, não existe ainda em Portugal, qualquer lei que puna um

indivíduo causador destes atos atrozes.

4. IDENTIFICAÇÃO DE CAUSAS DA SOLIDÃO NOS IDOSOS. RELAÇÃO

ESTATÍSTICA COM OS PRINCIPAIS FOCOS/ZONAS DE SOLIDÃO EM PORTUGAL.

Praticamente todos os problemas existentes numa sociedade possuem causas e origem

em determinados fatores ou situações. A solidão não é exceção. De modo a enumerarmos

essas possíveis causas iremos estabelecer uma correspondência entre indicadores que

possam denunciar uma possível influência na promoção da solidão na fase idosa e as zonas

onde esses mesmos indicadores estão mais presentes. Se for verificada uma correlação entre

essas zonas e os principais focos de solidão em Portugal (c.f. pág. 8) poderemos assim estar

na presença de uma causa da solidão nos idosos, originada por esse indicador.

4.1 – Famílias unipessoais segundo os Censos – 65 e mais anos

A própria definição de solidão baseia-se no facto de alguém viver sozinho e/ou isolado da

sociedade onde vive. Por essa razão, parece-nos correto verificar quais as áreas de Portugal

com maior quantidade de famílias unipessoais (o alojamento é apenas habitado por uma

pessoa).

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Imagem 1 – Famílias clássicas unipessoais com 65 ou mais anos segundo o Censos em Portugal (ano de

2011). Tipo de Valor: Valor Absoluto. Unidade: Família (Fontes: INE)

A partir da análise da imagem acima apresentada são percetíveis algumas semelhanças

relativamente às zonas correspondentes aos principais focos de solidão: o número de famílias

unipessoais regista valores relativamente elevados em Lisboa, Algarve, Guarda e Beja, zonas

estas correspondentes a registos também elevados de solidão em idosos. Embora na imagem

apresentada seja dada também um grande destaque à região Centro e ao Porto (zonas pouco

afetadas pela solidão nos idosos), o facto de os idosos viverem sozinhos parece constituir um

fator importante para o aparecimento da solidão. A viuvez, a perda de entes-queridos e o

afastamento dos seus familiares podem ser causas desse mesmo facto, pelo que também

serão potenciais causas da solidão (Barroso, V. L & Tapadinhas, A. R.; 2006).

4.2 – Densidade populacional segundo os Censos – Nº médio de indivíduos por km2

Estando também de acordo com a informação apresentada no primeiro indicador, áreas

com menor população poderão ser também zonas potenciais do desenvolvimento da solidão,

dado que não é estabelecida uma rede social na vida do idoso.

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Imagem 2 - Densidade populacional segundo os Censos – Nº médio de indivíduos por km2 em Portugal (ano

de 2011). Tipo de Valor: Média. Unidade: Indivíduo (Fontes: INE)

Após a análise do mapa e da sua respetiva legenda é ainda mais evidente a influência da

fraca densidade populacional na promoção da solidão nos idosos. As zonas em que é

registada fraca densidade populacional (Alentejo, Santarém, Guarda,…) correspondem a

muitas das zonas em que se registam elevados valores de solidão, dando a ideia de que a falta

de contacto com outros indivíduos (causada pela baixa população da localidade onde vive)

prejudica imenso a vida do idoso, gerando um estado de isolamento característico da solidão.

4.3 – Taxa de inatividade total1 segundo o Censos:

Uma das formas de combater o isolamento social passa pelo emprego ou por uma

determinada ocupação. Embora na fase da velhice, não se registem grandes taxas de

emprego, o que comprometeria o estudo deste indicador, consideramos importante o estudo do

mesmo, de modo a avaliar a influência de certos fatores (como por exemplo, a reforma) na

origem de sentimentos de solidão.

1Entenda-se por taxa de inatividade total, a taxa que permite definir a relação entre a

população inativa em idade ativa (com 15 ou mais anos de idade) e a população total em idade

ativa.

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Imagem 3 –Taxa de inatividade total segundo o Censos em Portugal (ano de 2011).Tipo de Valor: Taxa.

Escala: % (percentagem) (Fontes: INE, PORDATA)

É possível observar que, mais uma vez, as zonas onde se regista uma maior taxa de

inatividade (Alentejo, Beira Interior,…) relacionam-se com as zonas correspondentes aos

principais focos de solidão. O surgimento deste sentimento pode ser explicado devido ao

cessar de relações profissionais e sociais com os colegas de trabalho e devido à quebra da

utilidade do idoso no seio do mundo de trabalho.

5 – SALDO MIGRATÓRIO INTERNO SEGUNDO OS CENSOS

Para que não ocorram sentimentos de solidão na população idosa é necessário que os

idosos possuam um suporte e apoio familiar bem enraizado. A migração interna de pessoas de

áreas do interior português (mais suscetíveis a fenómenos de solidão) para as áreas do litoral

pode ser também decisiva para a dizimação desse suporte relacional, extremamente

importante para o idoso.

Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e natural ou atentado à dignidade humana?

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Imagem 4 – Saldo migratório interno segundo os Censos em Portugal (ano de 2001). Tipo de Valor: Valor

Absoluto. Unidade de Medida: Indivíduo. (Fontes: INE, PORDATA)

Através da análise é percetível um saldo migratório interno negativo (mais saídas dessa

localidade do que entradas) em zonas mais suscetíveis à ocorrência de fenómenos de solidão

(Alentejo, Beira Interior,…) e um saldo altamente positivo em zonas do litoral português.

Podemos assim inferir que as migrações internas podem ser uma causa direta da solidão nos

idosos.

Através das correlações observadas pela análise dos mapas acima apresentados

podemos agora enumerar algumas das possíveis causas da solidão na fase idosa:

a) o facto de o idoso viver sozinho (potencialmente causado por viuvez, morte de entes-

queridos ou afastamento dos familiares mais próximos);

b) baixa densidade populacional na área em que vive, potenciando um isolamento social;

c) inatividade ao atingir a idade da reforma;

d) migrações internas ou externas dos familiares mais próximos, quebrando o apoio

familiar e relacional do idoso.

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6. CONCLUSÃO

O grupo acolheu com interesse a proposta da realização de um trabalho que

posteriormente seria submetido a um concurso a nível nacional. Salienta-se, na fase de

preparação do mesmo, alguma indecisão relativamente ao tema principal do trabalho. No

entanto, esse contratempo foi ultrapassado com sucesso, dado que nos consideramos

satisfeitos com o tema escolhido e aqui tratado, bem como com o desenvolvimento dessa

mesma temática. A formação acerca da PORDATA realizada na escola que frequentamos foi,

sem dúvida, um bom método de reconhecer as funcionalidades principais do website,

facilitando as atividades que visaram a recolha de dados estatísticos.

Após o desenvolvimento do tema a que nos propusemos, pensamos agora estar aptos

para responder à questão-problema formulada na Introdução: será a solidão uma mera

situação natural e, consequentemente, inevitável ou será esta causada por atos atrozes que

põem em causa a dignidade humana?

É inegável a existência de causas naturais que originem a solidão no idoso e, nesse

caso, a solidão é quase um imperativo, algo inevitável. Podemos também defender que certos

atos humanos que levam à solidão nos idosos buscam apenas melhores condições de vida,

não interferindo direta e voluntariamente na promoção da solidão na fase idosa. No entanto,

será esta uma situação completamente natural e inevitável ao alcançarmos a fase adulta? A

resposta será certamente negativa. Como é possível sujeitar um idoso a um isolamento tal que

o impeça de possuir um objetivo de vida e que ponha em causa a sua dignidade, retirando-lhe

o prazer de “viver”, direito que nos é incondicionalmente oferecido?

Infelizmente assistimos cada vez mais a situações de um profundo individualismo radical

onde as pessoas parecem criar “universos estanques”, completamente alheados da realidade e

interesses das outras pessoas com quem convivem. De modo a garantir o normal

funcionamento de uma sociedade, é essencial que todos os indivíduos possuam um dos

critérios trans-subjetivos de valoração (que se estendem a um nível intersubjetivo): a dignidade.

Enquanto seres humanos temos consagrado o direito de viver de modo digno dado que

só aí a nossa vida é realmente proveitosa. E, independentemente das condições em que nos

encontramos temos o direito absoluto e inviolável de sermos felizes: ainda mais numa fase em

que a vida escasseia, segundo a segundo… Então, por que razão é necessário adicionar a

solidão a essa difícil fase?

Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e natural ou atentado à dignidade humana?

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BIBLIOGRAFIA

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2010_UN_WPP_2006.PNG>

Solidão inerente ao envelhecimento: situação inevitável e natural ou atentado à dignidade humana?

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ANEXOS

Anexo 1 – Média das idades dos indivíduos residentes num determinado país a nível

mundial. (in <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0a/Median_age.png>).

Anexo 2 – Esperança de vida à nascença a nível mundial. (in <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/75/Life_Expectancy_2005-2010_UN_WPP_2006.PNG>)