Solidariedade é Incompatível Com Imposição

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Solidariedade e tributação: solidariedade é incompatível com imposição. Ou: Solidariedade é ato gracioso, e não imposto (tributação como dever de manutenção de estruturas estatais mínimas). Começa-se o presente excerto com uma premissa fundamental: a solidariedade ou o princípio da solidariedade esculpido na Constituição Federal é incompatível com qualquer forma de imposição ou coerção. É lugar comum na doutrina jurídica abalizada considerar que o dever de pagar tributos deriva substancialmente do corolário da solidariedade, de um dever para com o próximo, imposto verticalmente como substancialmente fundante de “uma sociedade fraterna”. Entretanto se esquecem tais doutrinadores que a solidariedade é ato gracioso, de liberalidade, o qual incompatível com qualquer forma de submissão de uma vontade a outra. Embora o intento seja nobre, de garantir Justiça Social numa sociedade nitidamente marcada por desigualdades de todos os níveis, não deixa de ser verdade que as pessoas não podem e não devem arcar com as mazelas pelas quais o próprio Estado é responsável. Segundo ROSSO, “Solidariedade, (...) define-se como “sentimento que leva os homens a ajudarem-se mutuamente”; outro vocábulo, bastante próximo e por vezes utilizado como sinônimo é “fraternidade”, definível como “parentesco de irmãos, convivência como de irmãos, amor ao próximo” 1 . Considerando-se tais premissas, percebe-se que a solidariedade se consubstancia como situação de graciosidade, como auxílio gracioso, independente de coação, de imposição de uma vontade a outra. A solidariedade independe de imposição, é independente de qualquer ação tendente a submeter a vontade de um à vontade de outrem, mormente porque tal submissão implicaria na desconstrução de seu conceito. Percebe-se que o intento de garantir Justiça Social por meio da solidariedade é nobre, mas contraditório. O dever de pagar tributos não se alicerça em tal dever, pois se assim 1 ROSSO, Paulo Sergio. SOLIDARIEDADE E DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. Revista Argumenta, Jacarezinho - PR, n. 9, p. 27-42, Fev. 2013. ISSN 2317-3882. Disponível em: <http://seer.uenp.edu.br/index.php/argumenta/article/view/110/110>. Acesso em: 15 Set. 2015.

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Solidariedade e tributação: solidariedade é incompatível com imposição. Ou: Solidariedade é ato gracioso, e não imposto (tributação como dever de manutenção de estruturas estatais mínimas).

Começa-se o presente excerto com uma premissa fundamental: a solidariedade ou o princípio da solidariedade esculpido na Constituição Federal é incompatível com qualquer forma de imposição ou coerção.

É lugar comum na doutrina jurídica abalizada considerar que o dever de pagar tributos deriva substancialmente do corolário da solidariedade, de um dever para com o próximo, imposto verticalmente como substancialmente fundante de “uma sociedade fraterna”.

Entretanto se esquecem tais doutrinadores que a solidariedade é ato gracioso, de liberalidade, o qual incompatível com qualquer forma de submissão de uma vontade a outra. Embora o intento seja nobre, de garantir Justiça Social numa sociedade nitidamente marcada por desigualdades de todos os níveis, não deixa de ser verdade que as pessoas não podem e não devem arcar com as mazelas pelas quais o próprio Estado é responsável.

Segundo ROSSO, “Solidariedade, (...) define-se como “sentimento que leva os homens a ajudarem-se mutuamente”; outro vocábulo, bastante próximo e por vezes utilizado como sinônimo é “fraternidade”, definível como “parentesco de irmãos, convivência como de irmãos, amor ao próximo”1.

Considerando-se tais premissas, percebe-se que a solidariedade se consubstancia como situação de graciosidade, como auxílio gracioso, independente de coação, de imposição de uma vontade a outra. A solidariedade independe de imposição, é independente de qualquer ação tendente a submeter a vontade de um à vontade de outrem, mormente porque tal submissão implicaria na desconstrução de seu conceito.

Percebe-se que o intento de garantir Justiça Social por meio da solidariedade é nobre, mas contraditório. O dever de pagar tributos não se alicerça em tal dever, pois se assim fosse, careceria de legitimidade, ao criar condições impositivas legalmente previstas como estruturas fundantes de um dever que não é dever.

Na tributação, tal premissa é notória. Colocar a solidariedade social como fundamento para a tributação é o mesmo que colocar a fraternidade como dever do ser humano. E não é. Atos graciosos derivam de ações espontâneas. O indivíduo entende por si mesmo que determinada ação é nobre. Não há em nenhum momento um dever para que pratique a ação. Ao contrário, ele é livre para decidir em que grau deve ser solidário. Solidariedade e liberdade, neste sentido, estão intrinsecamente ligadas, mormente por se tratarem de faces de uma mesma moeda.

1 ROSSO, Paulo Sergio. SOLIDARIEDADE E DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. Revista Argumenta, Jacarezinho - PR, n. 9, p. 27-42, Fev. 2013. ISSN 2317-3882. Disponível em: <http://seer.uenp.edu.br/index.php/argumenta/article/view/110/110>. Acesso em: 15 Set. 2015.

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Com base em tais fundamentos, reputa-se que a tributação tem seu fundamento último no dever fundamental de manutenção do Estado. Sendo um mal necessário, o Estado necessita de um mínimo de recurso para subsidiar suas atividades essenciais. O grande problema é elencar quais são as atividades estatais que devem ser consideradas como essenciais.

Adota-se a posição de que o Estado deve estar presente de forma mínima, atendendo especificamente às necessidades primárias da sociedade, aqui consideradas a justiça, a segurança pública e o aparato governamental mínimo.

Não se justifica a intervenção estatal em campos nos quais predominam intrinsecamente interesses privados. Não cabe ao Estado gerir os interesses de indivíduos, com o predomínio da ingerência em assuntos que são de interesse eminentemente privado. A fiscalização também não pode transbordar ao âmbito da intervenção.

A Constituição Federal elenca em seu art. 170 princípios estruturantes da atividade econômica, especificamente os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência.