Sorria #19

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*19 abril/maio 2011 Realização: este valor, descontados os impostos, é 100% doado para os projetos do

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Reportagem para secao Cuidar sobre espacos Publicos Sorria *19 abril/maio 2011. Sorria é uma revista bimestral sobre felicidade, vendida a R$ 2,50 nas lojas Droga Raia de todo o Brasil. O valor, descontados os impostos, é 100% doado ao GRAAC (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer). A Editora MOL criou o modelo de negócio e responde pela produção editorial.

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carta do editornotícias da redação

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Lições que vêm do ninhoPARA FAZER A SEÇÃO Amar desta edição, pedimos que as pessoas nos mandassem relatos sobre princípios que elas aprende-ram observando o exemplo de alguém. Deixamos bem claro que a inspiração po-deria vir de qualquer indivíduo. Mas pelo menos metade falava sobre pais ou mães.

Fiquei pensando: não pode ser tão difícil lembrar de um valor que aprende-mos fora de casa. E aí fui tirar a prova co-migo mesmo. Bom, a verdade é que só consigo pensar em princípios que adquiri com meus pais. Recentemente, em espe-cial, com minha mãe. Há alguns anos, ela descobriu uma pedrinha no sapato que a está obrigando a enfrentar delicadas pro-vações. Quanta gente, no lugar dela, já te-ria desistido de lutar. Mas ela está lá, cheia de disposição, dando um sorriso cada vez mais aberto toda vez que a gente se en-contra. Velhinha, saiba que tenho o maior orgulho da tua força. Essa é mais uma das preciosas lições de vida que estou tendo o privilégio de aprender contigo :) Dilson Branco

EDITOR

Quando a seção Amar já estava quase pronta, chegou a mais impactante histó-ria que recebemos nesta edição. Não dava para contar num texto pequeno, como é o padrão da seção. Então ela foi parar na introdução da matéria (pág. 37). Veja lá se o David, de 11 anos, é ou não um poeta.

O que a seção Amar traz picadinho, na matéria de capa (pág. 30) você lê em profundidade. Lá estão três incríveis exem-plos de gente com princípios inabaláveis. Se você achar que está bem contado, agra-deça à nossa brilhante repórter Rita Loiola, que não se cansa de passar horas extrain-do o melhor de cada entrevista.

Outro destaque da edição é a seção Cuidar (pág. 24). Nossa mais efusiva repór-ter, Karina Sérgio Gomes, passou um mês bisbilhotando a Assembleia Legislativa, a prefeitura, associações de moradores e até um condomínio, para mostrar como po-demos participar das decisões políticas. A Carolina Franco, que coordena o RH aqui da editora, topou acompanhá-la. O texto fi cou bem bacana. A arte também. A ideia

de representar “a coisa pública” como um quebra-cabeças (que depois se revela uma série de portas acolhedoras) é do nosso estagiário de arte Ricardo Sukys.

Os estagiários de texto também mos-traram que são ponta fi rme. A Juliana Dias nos trouxe de Natal a receita de cocada da sua mãe (pág. 52). E o Flávio Carneiro co-laborou na seção Ajudar (pág. 58).

Como você pode ver, a edição está re-cheada. Espero que você goste. Boa leitura!

1. BASTIDORES DA CAPA. 2. RICARDO SUKYS E O QUEBRA-CABEÇAS POLÍTICO. 3. FOTO DA SEÇÃO DESCOBRIR NO JÁ SAUDOSO CINE BELAS ARTES, RECÉM-FECHADO, EM SÃO PAULO. 4. NOSSA NOVA EQUIPE DE PRODUÇÃO E IMAGEM: CLAUDINE LUZ, MICA TOMÉO E CARINA BARROS1

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a quem precisa

O teste de farmácia deu negativo. Aos 18 anos, namo-rando havia apenas dois meses com Diego, Samia se sentiu aliviada. Mas precisava ter certeza. Fez um exa-me de sangue. Negativo. Mais dois exames de sangue. De novo, negativos. “Quando a gravidez se confi rmou, o coração da Nicolly já estava batendo”, lembra.

O que era alívio virou susto, mas logo se transfor-mou em amor incondicional. “Quando a gente tem um fi lho, ganha garra para enfrentar tudo”, diz a mãe. Pois na época do primeiro aniversário da pequena, o casal teve de pôr essa força à prova. Nicolly foi diagnostica-da com um câncer no abdômen. Começou o tratamen-to em Campo Grande, onde a família mora, mas os pais foram aconselhados a levá-la ao GRAACC.

Nicolly passou por dez meses de tratamento. Re-cebeu alta, voltou para casa. Mas em novembro do ano passado teve de retornar ao hospital. Quando a mãe de-sanima, é a pequena, hoje com 3 anos, que lhe faz re-cobrar as forças. Logo após uma sessão de radioterapia, a menina já está correndo de um lado para o outro na brinquedoteca do hospital, mostrando a Samia e à avó os desenhos que acabou de colorir. “O carinho que mi-nha mãe tem por mim é o mesmo que tenho por minha fi lha. E sonho em vê-la continuando essa história”.

“Quando eu tiver meus fi lhos, irei a todas as reuniõesescolares deles”, prometeu a si mesma Cremilda da Sil-va, de Ribeirão Pires (SP). Órfã, ela foi criada por uma tia, que não tinha muito tempo para acompanhar sua educa-ção. “Entendo que ela precisava trabalhar para me sus-tentar. Mas isso me deixou um vazio enorme.”

Hoje, mãe dos gêmeos Thales e Thadeu, de 14 anos, e de Maria Eduarda, de 6, Cremilda faz muito mais do que prometeu. Além de nunca ter perdido uma reunião de pais, leva as crianças à escola, cobra os deveres de casa e quer saber tudo que acontece no colégio.

Quando Thales lhe contou que estava participando do projeto SuperAção Jovem, do Instituto Ayrton Senna, desenvolvendo uma pesquisa sobre o preconceito con-tra pacientes de câncer e aids, a mãe adorou a novidade. “Ele só fala em ser médico, e essa é uma ótima forma de se aproximar da profi ssão que escolheu.”

Auxiliar de enfermagem, Cremilda se desdobra para responder às inúmeras perguntas que o fi lho faz sobre o universo dos hospitais. “Às vezes, tenho de pe-dir ajuda aos ‘universitários’”, brinca, referindo-se a seus colegas de trabalho. “Faço tudo pelos meus fi lhos”, diz a mãe. E revela outra promessa: “Nunca vou deixá-los desistir de seus sonhos”.

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Samia e Cremilda dedicam-se incondicionalmente a seus fi lhos. Comprando a Sorria, você ajuda mães como elas a fazer a família crescer com mais saúde e educação

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Você acha a política um quebra-cabeça confuso, um mundo impenetrável? Karina e Carol descobriram que não é bem assim. E mostram que as portas do poder estão abertas para todo cidadão

texto K a r i n a S é r g i o G o m e s

ilustração O S i l v a

still M a r c e l o Tr a d

nosso mundo, nossa vida

24cuidar,

Carol, 27 anos, já pensou em se liar a um partido. Mas só para escapar de ser mesária nas eleições

O caderno de política do

jornal é o primeiro que

Karina, de 24 anos,

joga fora todo dia

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TENHO 24 ANOS, todos eles vivi-dos na Grande São Paulo. E con-fesso: até um mês atrás, não sa-

bia onde fi cava a Câmara de Vereadores. Meu maior lampejo de ativismo políti-co havia sido uma tentativa frustrada de criar um grêmio estudantil na época do colegial. Esbarrei na burocracia da escola e, desde então, limitei minha participa-ção na democracia ao voto obrigatório.

Com a Carolina Franco, de 27 anos, que coordena a área de RH aqui da Edito-ra MOL, onde é feita a Sorria, não é mui-to diferente. A atuação política dela se re-sumia às vezes em que trabalhou como mesária em alguns pleitos. “E fui sempre a contragosto. Cheguei a pensar em me fi liar a um partido político só para ser dis-pensada desse encargo”, conta.

Foi com esses tímidos retrospectos que recebemos o convite para passar, juntas, pelas experiências que vou relatar nesta reportagem. A ideia era vasculhar as esferas do poder público, descobrir quais eventos são abertos à população e ir lá conferi-los. Os órgãos governamen-tais muitas vezes parecem impenetráveis para cidadãos comuns. Será verdade? Ou haverá canais que permitam nossa parti-cipação? Isso é o que fomos ver.

Sinta-se em casaComeçamos pela Assembleia Legislati-va de São Paulo. Os congressos estadu-ais, assim como as câmaras de vereado-res, mantêm suas reuniões ordinárias abertas ao público. Ou seja, qualquer um pode entrar no plenário e acompanhar as discussões e votações. Legal, mas a par-ticipação, nesses casos, se resume a ver e ouvir. Queríamos ir a uma reunião em que os cidadãos comuns pudessem falar, dar suas opiniões. Pesquisamos no site da assembleia e descobrimos que, nos dias seguintes, haveria alguns eventos as-sim. O primeiro seria um debate sobre “cidades sustentáveis”. Lá fomos nós.

Entramos no prédio sem nenhum impedimento. Não nos olharam esqui-

sito, não pediram documentos nem fi -zeram revista. Demoramos um pouqui-nho para achar a sala certa. Quando che-gamos lá, estava quase lotada. À frente, numa bancada principal, estavam os três debatedores: uma jornalista, um profes-sor universitário e um deputado. Outros políticos ocupavam mesas menores.

Eventos desse tipo servem para ou-vir especialistas e a população em geral sobre temas de projetos de lei que serão votados em breve. “É uma forma de os parlamentares dizerem que deram aber-tura para as pessoas participarem”, ex-plica o professor de sociologia da Univer-sidade de São Paulo (USP) Bruno Konder. A abertura, no entanto, foi mínima.

Após as explanações da mesa, a pla-teia podia fazer perguntas – bastava le-vantar a mão. Mas apenas três pessoas tiveram espaço. E cada uma só pôde fa-lar por menos de cinco minutos. Além disso, nada garantia que a questão seria de fato respondida. Uma estudante inda-gou como o governo quer construir cida-des sustentáveis se aumenta o preço do transporte coletivo e diminui impostos sobre automóveis. Os especialistas limi-taram-se a uma grande enrolação.

O povo na TVDescobrimos que o cidadão que quer fa-lar na Assembléia Legislativa de São Pau-lo tem de ir até lá nas quartas-feiras ao meio-dia. É quando acontece o Assem-bleia Popular, um programa da TV As-sembleia. Qualquer pessoa pode se ins-crever, minutos antes, e subir ao púlpito.

A maioria das pessoas critica ou elogia o governo. Mas há de tudo. No dia em que estivemos lá, um senhor usou o espaço para declarar o orgulho pela sua área de formação, o direito.

Ficamos nos perguntando: quem ouve essas pessoas? No auditório, além dos participantes, havia apenas o apre-sentador e os câmeras. E é sabido que a audiência da TV Assembleia não é lá das mais altas. “Mas, se esse canal tiver 1 ponto de audiência, já signifi ca que mi-lhares de pessoas verão as reivindica-ções. A televisão ainda é uma mídia pri-vilegiada”, argumenta Bruno Konder.

Josanias Castanha, líder do Movi-mento Social da Capela do Socorro (bair-ro da Zona Sul de São Paulo), que com-parece fi elmente a todas as gravações do Assembleia Popular, acredita que o pro-grama é um canal importante, mas não sufi ciente. “Já consegui algumas vitórias, como a colocação de uma placa de trân-sito em uma curva perigosa lá do bair-ro. Mas, além de falar aqui, é necessário mandar ofícios aos deputados”, diz.

Informado e incomodadoA Assembleia Legislativa e a Câmara Mu-nicipal estão abertas à população, é ver-dade. Mas o horário não ajuda muito. Ge-ralmente, as reuniões e votações ocor-rem em período comercial, quando a maior parte das pessoas está trabalhan-do. Para o sociólogo Bruno Konder, isso não acontece à toa. Segundo ele, quanto menos gente aparecer no plenário, mais cômodo para os parlamentares, que as-sim trabalham sob menor pressão.

O jornalista Aírton Goes, que passa o dia na Câmara Municipal de São Pau-lo, produzindo notícias para o movimen-to Rede Nossa São Paulo, que estimula a participação política da população, con-corda. “O comportamento dos políticos é muito distinto quando há eleitores pre-sentes. Eles se preocupam em justifi car os votos com mais cuidado”, explica.

“O comportamento dos políticos é muito distinto quando há eleitores presentes na Câmara. Eles se preocupam em justifi car os votos com mais cuidado”

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TENHO 24 ANOS, todos eles vivi-dos na Grande São Paulo. E con-fesso: até um mês atrás, não sa-

bia onde fi cava a Câmara de Vereadores. Meu maior lampejo de ativismo políti-co havia sido uma tentativa frustrada de criar um grêmio estudantil na época do colegial. Esbarrei na burocracia da escola e, desde então, limitei minha participa-ção na democracia ao voto obrigatório.

Com a Carolina Franco, de 27 anos, que coordena a área de RH aqui da Edito-ra MOL, onde é feita a Sorria, não é mui-to diferente. A atuação política dela se re-sumia às vezes em que trabalhou como mesária em alguns pleitos. “E fui sempre a contragosto. Cheguei a pensar em me fi liar a um partido político só para ser dis-pensada desse encargo”, conta.

Foi com esses tímidos retrospectos que recebemos o convite para passar, juntas, pelas experiências que vou relatar nesta reportagem. A ideia era vasculhar as esferas do poder público, descobrir quais eventos são abertos à população e ir lá conferi-los. Os órgãos governamen-tais muitas vezes parecem impenetráveis para cidadãos comuns. Será verdade? Ou haverá canais que permitam nossa parti-cipação? Isso é o que fomos ver.

Sinta-se em casaComeçamos pela Assembleia Legislati-va de São Paulo. Os congressos estadu-ais, assim como as câmaras de vereado-res, mantêm suas reuniões ordinárias abertas ao público. Ou seja, qualquer um pode entrar no plenário e acompanhar as discussões e votações. Legal, mas a par-ticipação, nesses casos, se resume a ver e ouvir. Queríamos ir a uma reunião em que os cidadãos comuns pudessem falar, dar suas opiniões. Pesquisamos no site da assembleia e descobrimos que, nos dias seguintes, haveria alguns eventos as-sim. O primeiro seria um debate sobre “cidades sustentáveis”. Lá fomos nós.

Entramos no prédio sem nenhum impedimento. Não nos olharam esqui-

sito, não pediram documentos nem fi -zeram revista. Demoramos um pouqui-nho para achar a sala certa. Quando che-gamos lá, estava quase lotada. À frente, numa bancada principal, estavam os três debatedores: uma jornalista, um profes-sor universitário e um deputado. Outros políticos ocupavam mesas menores.

Eventos desse tipo servem para ou-vir especialistas e a população em geral sobre temas de projetos de lei que serão votados em breve. “É uma forma de os parlamentares dizerem que deram aber-tura para as pessoas participarem”, ex-plica o professor de sociologia da Univer-sidade de São Paulo (USP) Bruno Konder. A abertura, no entanto, foi mínima.

Após as explanações da mesa, a pla-teia podia fazer perguntas – bastava le-vantar a mão. Mas apenas três pessoas tiveram espaço. E cada uma só pôde fa-lar por menos de cinco minutos. Além disso, nada garantia que a questão seria de fato respondida. Uma estudante inda-gou como o governo quer construir cida-des sustentáveis se aumenta o preço do transporte coletivo e diminui impostos sobre automóveis. Os especialistas limi-taram-se a uma grande enrolação.

O povo na TVDescobrimos que o cidadão que quer fa-lar na Assembléia Legislativa de São Pau-lo tem de ir até lá nas quartas-feiras ao meio-dia. É quando acontece o Assem-bleia Popular, um programa da TV As-sembleia. Qualquer pessoa pode se ins-crever, minutos antes, e subir ao púlpito.

A maioria das pessoas critica ou elogia o governo. Mas há de tudo. No dia em que estivemos lá, um senhor usou o espaço para declarar o orgulho pela sua área de formação, o direito.

Ficamos nos perguntando: quem ouve essas pessoas? No auditório, além dos participantes, havia apenas o apre-sentador e os câmeras. E é sabido que a audiência da TV Assembleia não é lá das mais altas. “Mas, se esse canal tiver 1 ponto de audiência, já signifi ca que mi-lhares de pessoas verão as reivindica-ções. A televisão ainda é uma mídia pri-vilegiada”, argumenta Bruno Konder.

Josanias Castanha, líder do Movi-mento Social da Capela do Socorro (bair-ro da Zona Sul de São Paulo), que com-parece fi elmente a todas as gravações do Assembleia Popular, acredita que o pro-grama é um canal importante, mas não sufi ciente. “Já consegui algumas vitórias, como a colocação de uma placa de trân-sito em uma curva perigosa lá do bair-ro. Mas, além de falar aqui, é necessário mandar ofícios aos deputados”, diz.

Informado e incomodadoA Assembleia Legislativa e a Câmara Mu-nicipal estão abertas à população, é ver-dade. Mas o horário não ajuda muito. Ge-ralmente, as reuniões e votações ocor-rem em período comercial, quando a maior parte das pessoas está trabalhan-do. Para o sociólogo Bruno Konder, isso não acontece à toa. Segundo ele, quanto menos gente aparecer no plenário, mais cômodo para os parlamentares, que as-sim trabalham sob menor pressão.

O jornalista Aírton Goes, que passa o dia na Câmara Municipal de São Pau-lo, produzindo notícias para o movimen-to Rede Nossa São Paulo, que estimula a participação política da população, con-corda. “O comportamento dos políticos é muito distinto quando há eleitores pre-sentes. Eles se preocupam em justifi car os votos com mais cuidado”, explica.

“O comportamento dos políticos é muito distinto quando há eleitores presentes na Câmara. Eles se preocupam em justifi car os votos com mais cuidado”

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Outra questão sobre a qual eu e a Ca-rol fi camos refl etindo é que é preciso es-tar bem informado para entender o que está sendo discutido nesses lugares e po-der contribuir. E nós duas nem sequer sa-bíamos o nome dos parlamentares... Foi aí que percebi como faz falta ler o cader-no de política do jornal – o primeiro que eu sempre descartava toda manhã.

“Aquelas pessoas que dizem que não gostam de política, no fundo são umas conservadoras. Elas devem estar satisfei-tas e não querem que nada mude.” No momento da entrevista em que Bruno Konder me disse essa frase, senti a ca-rapuça servindo. De fato, tanto eu quan-to a Carol vivemos mais acomodadas do que deveríamos. O recente aumento da tarifa de ônibus em São Paulo, por exem-plo, é algo que me deixou bastante indig-nada. Mas no sábado ensolarado em que houve uma audiência pública na Câmara Municipal, na qual centenas de estudan-tes foram criticar o reajuste, eu preferi ir ao litoral curtir um dia de praia...

Soube depois que, durante a audiên-cia, o secretário de Transportes cogitou tornar a passagem gratuita para estudan-tes. “Ora, mas por que só para eles?”, pensei, intrigada. O coordenador da Rede Nossa São Paulo, Maurício Broini-zi, deu a resposta óbvia: “Porque eram eles que estavam pressionando”. É claro. Só quem está realmente incomodado é que age. E só quem age pode ser ouvido.

Juntar-se aos iguaisO exemplo serviu também para enten-dermos que é mais fácil pressionar o go-verno quando nos unimos a outras pes-soas com o mesmo interesse. “A melhor maneira de conseguir voz é participando de conselhos, associações, movimentos de bairro e ONGs”, diz Maurício.

A própria Rede Nossa São Paulo é um exemplo. Uma das vitórias da organi-zação foi aprovar na prefeitura um plano de metas com 223 pontos que devem ser cumpridos até 2012. Um deles é zerar o número de crianças fora das creches, por

exemplo. Para isso, além de muito diá-logo com os parlamentares, a instituição mobilizou cerca de 300 pessoas para ir à Câmara no dia da votação.

Estar engajado num movimento também é um caminho para participar de outra instância: os conselhos munici-pais e estaduais. Eles funcionam como órgãos consultivos, fi scalizadores e deli-berativos das secretarias.

O Conselho Municipal de Habitação (CMH) de São Paulo, por exemplo, traba-lha junto à Secretaria Municipal de Habi-tação, decidindo sobre questões como a destinação de recursos para a construção de conjuntos habitacionais e a urbaniza-ção de favelas. Ele é composto de 48 pes-soas, que representam entidades popula-res de moradia, universidades e sindica-tos, além de membros do poder público. As eleições, abertas a quem quiser votar, acontecem a cada dois anos.

Nos conselhos, apenas os membros têm direito de voto, mas pessoas em geral podem participar das reuniões.

NO MUNICÍPIOA Câmara de Vereadores é onde se discutem e votam as leis da sua cidade. E essas seções são livres. Basta

informar-se sobre os horários e aparecer lá. A presença de eleitores pressiona os parlamentares a não faltar

e justifi car melhor seus votos. Você também pode visitar os gabinetes dos políticos e encaminhar a eles propostas

de leis que você gostaria que fossem aprovadas.

NO ESTADOA Assembleia Legislativa é o órgão equivalente à Câmara de Vereadores, no âmbito estadual. Você pode visitar as

seções e os gabinetes dos deputados. Informe-se, também, sobre debates e audiências públicas. Outra forma de

participar são os conselhos (que também existem no nível municipal), os quais auxiliam e fi scalizam as secretarias.

Você pode eleger os membros e até se candidatar.

SEJA BEM-VINDOVeja como participar das decisões políticas nas diferentes instâncias do poder

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Outra questão sobre a qual eu e a Ca-rol fi camos refl etindo é que é preciso es-tar bem informado para entender o que está sendo discutido nesses lugares e po-der contribuir. E nós duas nem sequer sa-bíamos o nome dos parlamentares... Foi aí que percebi como faz falta ler o cader-no de política do jornal – o primeiro que eu sempre descartava toda manhã.

“Aquelas pessoas que dizem que não gostam de política, no fundo são umas conservadoras. Elas devem estar satisfei-tas e não querem que nada mude.” No momento da entrevista em que Bruno Konder me disse essa frase, senti a ca-rapuça servindo. De fato, tanto eu quan-to a Carol vivemos mais acomodadas do que deveríamos. O recente aumento da tarifa de ônibus em São Paulo, por exem-plo, é algo que me deixou bastante indig-nada. Mas no sábado ensolarado em que houve uma audiência pública na Câmara Municipal, na qual centenas de estudan-tes foram criticar o reajuste, eu preferi ir ao litoral curtir um dia de praia...

Soube depois que, durante a audiên-cia, o secretário de Transportes cogitou tornar a passagem gratuita para estudan-tes. “Ora, mas por que só para eles?”, pensei, intrigada. O coordenador da Rede Nossa São Paulo, Maurício Broini-zi, deu a resposta óbvia: “Porque eram eles que estavam pressionando”. É claro. Só quem está realmente incomodado é que age. E só quem age pode ser ouvido.

Juntar-se aos iguaisO exemplo serviu também para enten-dermos que é mais fácil pressionar o go-verno quando nos unimos a outras pes-soas com o mesmo interesse. “A melhor maneira de conseguir voz é participando de conselhos, associações, movimentos de bairro e ONGs”, diz Maurício.

A própria Rede Nossa São Paulo é um exemplo. Uma das vitórias da organi-zação foi aprovar na prefeitura um plano de metas com 223 pontos que devem ser cumpridos até 2012. Um deles é zerar o número de crianças fora das creches, por

exemplo. Para isso, além de muito diá-logo com os parlamentares, a instituição mobilizou cerca de 300 pessoas para ir à Câmara no dia da votação.

Estar engajado num movimento também é um caminho para participar de outra instância: os conselhos munici-pais e estaduais. Eles funcionam como órgãos consultivos, fi scalizadores e deli-berativos das secretarias.

O Conselho Municipal de Habitação (CMH) de São Paulo, por exemplo, traba-lha junto à Secretaria Municipal de Habi-tação, decidindo sobre questões como a destinação de recursos para a construção de conjuntos habitacionais e a urbaniza-ção de favelas. Ele é composto de 48 pes-soas, que representam entidades popula-res de moradia, universidades e sindica-tos, além de membros do poder público. As eleições, abertas a quem quiser votar, acontecem a cada dois anos.

Nos conselhos, apenas os membros têm direito de voto, mas pessoas em geral podem participar das reuniões.

NO MUNICÍPIOA Câmara de Vereadores é onde se discutem e votam as leis da sua cidade. E essas seções são livres. Basta

informar-se sobre os horários e aparecer lá. A presença de eleitores pressiona os parlamentares a não faltar

e justifi car melhor seus votos. Você também pode visitar os gabinetes dos políticos e encaminhar a eles propostas

de leis que você gostaria que fossem aprovadas.

NO ESTADOA Assembleia Legislativa é o órgão equivalente à Câmara de Vereadores, no âmbito estadual. Você pode visitar as

seções e os gabinetes dos deputados. Informe-se, também, sobre debates e audiências públicas. Outra forma de

participar são os conselhos (que também existem no nível municipal), os quais auxiliam e fi scalizam as secretarias.

Você pode eleger os membros e até se candidatar.

SEJA BEM-VINDOVeja como participar das decisões políticas nas diferentes instâncias do poder

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Eu e a Carol fomos a um encontro do CMH para ver como é. Na pauta estava a apresentação de um projeto de obras no centro de São Paulo. A sala do pré-dio da Secretaria de Justiça, onde o en-contro aconteceu, estava cheia. E a par-ticipação do público foi bastante ativa e bem recebida: todas as pessoas que levantavam a mão eram ouvidas e ti-nham suas perguntas respondidas.

Um grande condomínioJá havíamos comparecido a encontros na esfera estadual e municipal. Decidi-mos então buscar instâncias mais restri-tas. Durante todo o mês de fevereiro, pro-curei por associações de moradores em que pudéssemos participar de uma reu-nião. No meu bairro não há uma institui-ção desse tipo. No da Carol tem, mas não havia nenhuma assembleia marcada.

Liguei para várias associações de outras partes da cidade, e a resposta era quase sempre a mesma: como a maio-ria dos moradores não costuma parti-

cipar dos encontros, a panelinha enga-jada acaba desistindo de convocar reu-niões, tomando as decisões por si. Um sinal claro de que a existência dos fó-runs democráticos depende do interes-se das pessoas em criá-los e mantê-los. Se não há vontade de fazer valer a de-mocracia, há menos democracia.

Decidimos partir então para algo ainda mais local: uma reunião de con-domínio. Nem eu nem a Carol havíamos participado de uma em nossa vida. Eu moro em uma casa. E no prédio da Ca-rol não tinha nada agendado. Então fala-mos com um amigo que trabalha numa administradora predial, e ele nos deixou acompanhá-lo em uma assembleia de um edifício ao qual ele atende.

Havia apenas sete condôminos pre-sentes. Um senhor defendia a troca do maquinário do elevador, já antigo. No embalo, duas senhoras propuseram uma reforma estética nas cabines. Se aprova-da, a mudança custaria cerca de 400 reaismensais para cada morador. Ficamos

chocadas. Como assim, meia dúzia de pessoas vai decidir algo tão impactante em nome de um prédio inteiro?

Foi aí que caiu a fi cha. O que há de diferente entre uma reunião de condomí-nio e uma votação na Assembleia Legis-lativa? O conceito é o mesmo: represen-tantes se reúnem para decidir questões que afetarão a todos. Quem não participa tem de aceitar o que foi defi nido.

Essa foi a grande lição que eu e a Ca-rol tiramos dessa experiência: inteirar-se da política é fazer com que o lugar em que moramos fi que do jeito que quere-mos. A coisa pública – signifi cado da ex-pressão em latim res publica, de onde vem a palavra “república” – é, muitas ve-zes, vista como distante e complicada, por causa da burocracia e dos protoco-los do poder. Mas é próxima e palpável, e nos oferece canais para participar da sua gestão. Depende de nós sermos atuantes ou omissos. Responsáveis ou indiferen-tes. Parte da turma que decide ou da que apenas paga a conta no fi m do mês.

NO PAÍSIr até Brasília participar do Senado ou da Câmara dos

Deputados é inviável para a maior parte dos brasileiros. Mas dá para colaborar sem sair de casa. Alguns ministérios,

como o da Saúde (http://migre.me/45BQV) e agências reguladoras, como a Ancine (http://migre.me/42dBw),

realizam consultas públicas on-line, nas quais você pode opinar sobre as normas criadas por esses órgãos.

MOVIMENTOS SOCIAISO que você deseja para sua cidade, seu estado, seu país?

Certamente há um grupo de pessoas que pensa igual. Pode ser uma organização não governamental (procure em www.abong.org.br a que mais combina com você). Ou o sindicato

da sua classe. Quem sabe um partido político (www.tse.gov.br/internet/partidos)? Junto a outras pessoas alinhadas

com suas posições, fi ca mais fácil defendê-las.

Mais aventuras das meninas em: www.revistasorria.com.br

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