Souza, 2011 Pronação Excessiva e Varismos de Pé e Perna Relação Com o Desenvolvimento

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    Pronao excessiva e varismos de p e perna: relao com o desenvolvimento de patologias msculo-esquelticas Reviso de Literatura

    Excessive pronation and varus alignment of foot and shank: relationship with development of musculoskeletal pathologies Literature Review

    Thales Rezende de Souza1, Rafael Zambelli de Almeida Pinto2, Renato Guilherme Trede3, Priscila Albuquerque de Arajo4, Haroldo Leite Fonseca, Srgio Teixeira da Fonseca5

    1 Doutorando em Cincias da Reabilitao, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil.

    2 Doutorando no The George Institute for International Health, Sydney Medical School, University of Sydney, Sydney, Austrlia.

    3 Doutorando em Engenharia Mecnica, UFMG. Professor Mestre do Departamento de Fisioterapia, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Diamantina, MG, Brasil.

    4 Doutoranda em Engenharia Mecnica, UFMG.

    5 Professor Doutor do Departamento de Fisioterapia, UFMG.

    endereo Para CorreSPondnCia

    Departamento de Fisioterapia, UFMG.Thales Rezende de SouzaUniversidade Federal de Minas Gerais, Escola de Educao Fsica, Fisioterapia e Terapia Ocupacional.Av. Antnio Carlos 6627, Belo Horizonte, MG, Brazil.CEP [email protected]

    aPreSentaodez. 2009

    aCeito Para PubliCaojul. 2010

    reSumo: A literatura prope mecanismos biomecnicos que relacionam a pronao subtalar excessiva ao desenvolvimento de diversas patologias msculo-esquelticas. A presena dos desalinhamentos anatmicos antep varo, retrop varo e tbia vara pode levar ocorrncia da pronao subtalar excessiva. Entretanto, no existe um consenso sobre a contribuio do padro de movimento e da presena desses desalinhamentos para o desenvolvimento de patologias. O objetivo deste estudo foi realizar uma reviso da literatura para investigar a influncia de varismos aumentados de antep, retrop e tbia e da pronao subtalar excessiva no surgimento de patologias msculo-esquelticas. Foi realizada uma pesquisa bibliogrfica sistematizada nas bases Medline, ISI Web of Science, Lilacs e Scielo, tendo sido selecionados 13 estudos analticos. Do total de 13 estudos, 10 encontraram associao de patologias no membro inferior com um ou mais dos desalinhamentos anatmicos analisados ou com um ou mais parmetros cinemticos relacionadas pronao subtalar excessiva. A anlise dos estudos sugere que a pronao subtalar excessiva e/ou a presena de desalinhamentos que podem levar a esse padro de movimento so possveis fatores de risco para o desenvolvimento de patologias msculo-esquelticas no membro inferior.PalavraS-Chave: Nervo citico; Regenerao nervosa; Sndromes de compresso

    nervosa/reabilitao; Terapia a laser de baixa intensidade

    abStraCt: The literature proposes biomechanical mechanisms that link excessive subtalar joint pronation to the development of several musculoskeletal pathologies. The presence of forefoot varus, rearfoot varus and tibiofibular varum can lead to the occurrence of excessive subtalar pronation. However, there is no consensus about the contribution of the movement pattern and/or the presence of these anatomical misalignments to the development of pathologies. The aim of the present study was to conduct a literature review in order to investigate the influence of increased varus alignment of forefoot, rearfoot and shank and of excessive subtalar pronation on the development of musculoskeletal pathologies. A systematic literature search was performed in the databases Medline, ISI Web of Science, Lilacs and Scielo, and 13 analytic studies were selected. Ten studies found significant associations of lower-limb musculoskeletal pathologies with one or more of the anatomical misalignments analyzed or with one or more kinematic parameters related to excessive subtalar pronation. The analysis of the studies suggests that excessive pronation and/or the presence of these anatomical misalagniments should be regarded as possible risk factors for the development of musculoskeletal pathologies in the lower limb.Key wordS: pronation, foot, bone malalignment, pathology.

    Fisioterapia e Pesquisa, So Paulo, v.18, n.1, p. 92-8, jan/mar. 2011 ISSN 1809-2950

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    INTRODUOA pronao excessiva da articulao

    subtalar, presente durante a marcha, a corrida e outras atividades realizadas em cadeia cintica fechada, um padro alterado de movimento que tem sido, terica e clinicamente, relacionado a di-versos processos patolgicos do sistema msculo-esqueltico e alvo de interven-o teraputica por meio da prescrio de rteses e cinesioterapia1,2. O padro de pronao subtalar considerado ideal permite adaptao do p superfcie de apoio, absoro de choque e dissipao da rotao dos membros inferiores1. Um aumento na magnitude, velocidade e durao desse movimento, em relao ao movimento considerado ideal, defi-nido como pronao subtalar excessiva1. Esse padro de movimento pode levar tambm a um aumento na magnitude, velocidade e durao da rotao inter-na dos membros inferiores (joelho e/ou quadril), por meio da interdependncia mecnica entre as rotaes do talus e da perna, na articulao talocrural1,3. A ocorrncia desse padro de movimento altera os torques articulares3, reduz a rigidez e o comprimento apresentados pelo membro inferior5-7 em atividades realizadas em cadeia cintica fechada e, consequentemente, pode alterar os estresses impostos sobre estruturas dos membros inferiores e complexo lombo--plvico1,6. Dessa forma, a pronao excessiva da articulao subtalar pode levar leso de vrias estruturas articu-lares e msculo-tendneas no complexo tornozelo-p, joelho, quadril e complexo lombo-plvico1,6-8.

    Os movimentos da articulao sub-talar e do membro inferior, no plano transverso, sofrem influncia de foras proximais e distais, seja na interao entre pelve e coxa, dependendo da rigidez do quadril, seja na interao entre as estru-turas do p com a superfcie de apoio1,9. Assim, a ocorrncia da pronao subtalar excessiva, durante atividades em cadeia cintica fechada, tem carter multifatorial e pode estar relacionada a fatores como rigidez reduzida dos msculos rotadores externos do quadril e desalinhamentos anatmicos do p e da tbia9. Na literatura cientfica, os fatores distais mais frequen-temente citados so os desalinhamentos anatmicos: varismo de tbia, varismo de retrop e varismo de antep1,10.

    No contexto da prtica baseada em evidncias cientficas necessrio fundamentar os modelos tericos e o raciocnio clnico, que associam a ocorrncia de pronao excessiva da articulao subtalar com patologias do sistema msculo-esqueltico, por meio de estudos que investigaram a relao entre estas variveis. Para isto, o presente estudo tem como objetivo realizar uma reviso da literatura para investigar a pos-svel contribuio da pronao excessiva da articulao subtalar e da presena de desalinhamentos anatmicos para o surgimento de processos patolgicos.

    METODOLOGIAFoi realizada uma pesquisa biblio-

    grfica nas bases de dados Medline, ISI Web of Science, Lilacs e Scielo, sem restries de data de publicao, idioma ou caractersticas descritivas dos participantes. Os artigos foram identificados pelos termos isolados e combinados: subtalar, pronao, retrop varo, calcneo varo, antep varo, tbia vara, pronation, rearfoot varus, hindfoot varus, forefoot varus, tibiofibular varum, varus alignment.

    Os critrios de incluso para os es-tudos foram: (a) constituir estudo ana-ltico, transversal ou longitudinal, que investigou associaes das presenas de pronao excessiva da articulao subtalar, varismo de antep, de retrop ou de tbia com a ocorrncia de sintomas msculo-esquelticos no relacionados a condies reumticas; (b) descrever os instrumentos ou procedimentos utiliza-dos para realizar as medidas das variveis desfecho; (c) utilizar medidas cuja con-fiabilidade foi investigada e relatada; (d) para os estudos que realizaram medidas cinemticas, t-las realizado em ativida-des dinmicas (como marcha e corrida) e no em atividades estticas (como a manuteno da posio ortosttica).

    O processo de seleo dos artigos foi constitudo de duas etapas. Na primeira etapa, dois avaliadores realizaram a busca nas bases de dados com o uso dos descritores, e a seleo dos estudos se-guiu os critrios de incluso. Na segunda etapa, os avaliadores realizaram a leitura dos textos completos para confirmar a adequao dos estudos aos critrios de incluso. Ambas as etapas foram

    realizadas por cada avaliador de forma independente.

    RESULTADOSA busca inicial identificou 3523 ar-

    tigos, dentre os quais 19 estudos foram pr-selecionados na primeira etapa, de acordo com os critrios de incluso. Dentre os estudos no-selecionados nesta etapa, a maioria havia investigado os efeitos de intervenes cirrgicas, uso de rteses e medicamentos na mecnica da articulao subtalar e na sintomato-logia de problemas relacionados a essa articulao. Na segunda etapa, seis dos 19 estudos foram descartados da seleo, por no estar de acordo com o critrio de incluso d. Assim, o resultado do presente estudo foi constitudo de 13 estudos que estavam de acordo com os critrios de incluso determinados11-23. Onze desses estudos constituem estudos transversais11-18,21-23 e dois constituem es-tudos longitudinais19,20. As patologias, as caractersticas das amostras, as variveis desfecho e os resultados dos estudos includos esto apresentados na Tabela 1.

    DISCUSSOO presente estudo investigou pos-

    sveis relaes de varismos de antep, retrop e tbia e de parmetros cinem-ticos relacionados pronao subtalar com o desenvolvimento de patologias msculo-esquelticas. Treze estudos que estavam de acordo com os critrios de incluso foram encontrados na literatura. Onze deles incluram medidas de varis-mo12,14-19,21-24 e quatro incluram medidas cinemticas dinmicas do movimento subtalar13,19-21, sendo que resultados variados foram encontrados para asso-ciaes com patologias.

    Dos estudos selecionados, 77% encontraram associao da patologia estudada com variveis anatmicas e cinemticas analisadas, o que chama a ateno para o possvel papel patolgi-co dessas variveis. Existem resultados contraditrios entre estudos que inves-tigaram uma mesma patologia. Nove estudos11,12,15-17,19-22 identificaram, em conjunto, a sndrome do estresse tibial medial (SETM), a dor patelofemoral, a tendinopatia patelar crnica, a leso do ligamento cruzado anterior no joelho

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    Tabela 1 Caractersticas e resultados dos estudos includos.

    PATOLOGIAAMOSTRA VARIVEIS

    DESFECHORESULTADOS

    NMERO E SEXO IDADE ATIVIDADE FSICA

    Sndrome do Estresse Tibial Medial (SETM)*(12)

    n=25

    homens (n=5)

    mulheres (n=20)

    16 a 25 anos

    Danarinos amadores.

    - Varismo de antep;

    - Varismo de retrop;

    - Combinao de varismos de antep e retrop.

    Associao entre presena de SETM e combinao de antep varo e retrop varo.

    SETM(13)n=48

    homens

    14 a 38 anos

    Atletas que corriam longas distncias com grande freqncia.

    - Magnitude e momento do ngulo mximo de pronao subtalar durante a corrida.

    Associao entre maiores ngulos de pronao mxima e atraso da ocorrncia desse ngulo com a presena de SETM.

    SETM(15)

    n=36

    homens (n=15)

    mulheres (n=21)

    14,2 a 17,2 anos

    Corredores amadores.

    - Varismo de tbia.Ausncia de associao.

    SETM(20)

    n=400

    homens (n=241)

    mulheres (n=159)

    mdia de 18,4 anos

    Praticantes de atividade fsica regular.

    - Excurso da pronao subtalar nos 3 eixos de movimento, durante a corrida;

    - Rotao interna do joelho durante a corrida;

    - Velocidade de pronao subtalar durante a corrida.

    Associao de maiores excurses de everso (pronao no plano frontal) e de abduo (pronao no plano transverso) do retrop e de maiores valores de velocidade de pronao subtalar com a ocorrncia de SETM.

    SETM(21)

    n=400

    homens (n=241)

    mulheres (n=159)

    mdia de 18,4 anos

    Praticantes de atividade fsica regular.

    - Varismo de retrop;

    - ngulo mximo de pronao subtalar durante a corrida;

    - Velocidade de pronao subtalar durante a corrida.

    Associao entre maiores valores de ngulo mximo e velocidade de pronao subtalar e a ocorrncia de SETM. No foi encontrada associao com a outra varivel.

    Ruptura Fechada do Tendo de Aquiles(14)

    n=101

    homens (n=86)

    mulheres (n=15)

    19 a 71 anos

    Sujeitos com nvel de atividade fsica variada

    - Varismo de antep.Ausncia de associao.

    (continua)

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    Tabela 1 Caractersticas e resultados dos estudos includos.

    PATOLOGIAAMOSTRA VARIVEIS

    DESFECHORESULTADOS

    NMERO E SEXO IDADE ATIVIDADE FSICA

    Dor Patelofemoral(16)

    n=30

    mulheres

    18 a 40 anos

    No relatado. - Varismo de retrop.

    Associao entre maiores valores de varismo de retrop e a presena de dor patelofemoral.

    Dor Patelofemoral(23)

    n=20

    homens (n=8)

    mulheres (n=12)

    18 a 35 anos

    No relatado. - Varismo de retrop.

    Associao entre maiores valores de varismo de retrop e a presena de dor patelofemoral.

    Tendinopatia Patelar Crnica(22)

    n=28

    homens (n=16)

    mulheres (n=12)

    20 a 35 anos

    Atletas de futebol ou voleibol e participantes de atividade fsica regular em pelo menos 4 vezes por semana.

    - Varismo de retrop;

    - Varismo de antep.

    Associao entre maiores valores de varismo de antep e a presena de tendinopatia patelar crnica.

    Leso de ligamento cruzado anterior(17)

    n=20

    mulheres

    mdia de 26,5 anos

    Atletas de vrias modalidades.

    - Varismo de retrop.

    Associao entre maiores valores de varismo de retrop e a presena de leso do ligamento cruzado anterior no mesmo membro.

    Leses por sobrecarga, em membros inferiores(18)

    n=20

    homens (n=6)

    mulheres (n=14)

    mdia de 25,75 anos

    Participantes de atividades com caminhada ou corrida.

    - Varismo de tbia.

    Associao entre maiores valores de varismo de tbia e a presena das leses por overuse no mesmo membro.

    Leses por sobrecarga em membros inferiores(19)

    n=74

    homens

    mdia de 23,3 anos

    Jogadores profissionais de baseball.

    - Varismo de antep;

    - Varismo de retrop;

    - Varismo de tbia;

    - ngulo mximo de pronao subtalar durante a marcha.

    Ausncia de associao.

    Dor no quadril associada a processos degenerativos(24)

    n=385

    mulheres (n=210) homens (n=175)

    mdia de 63,1

    No relatado.(Idosos com capacidade de deambulao).

    - Varismo de antep;

    - Varismo de retrop.

    Associao entre maiores valores de varismo de antep e a presena de dores no quadril.

    *As patologias e as variveis desfecho apresentadas em negrito so aquelas cuja associao foi estatisticamente significativa. n: nmero de participantes.

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    e leses por sobrecarga de membros inferiores como patologias e leses associadas pronao excessiva da ar-ticulao subtalar e/ou a alteraes de alinhamento anatmico relacionadas a esse movimento. Em contraste, Bennett et al.13 e Donatelli et al.18 no encontra-ram associaes com a SETM e leses por sobrecarga dos membros inferiores. Alm disso, Leppilahti et al.14 estudaram a ruptura fechada do tendo de Aquiles e no encontraram associao de varis-mo de antep com a ocorrncia dessa leso.

    Patologias msculo-esquelticas possuem carter multifatorial e, dessa forma, sua ocorrncia pode ser influen-ciada pela presena e interao de inmeros fatores internos, como idade, sexo e caractersticas anatmicas, e externos, como calados e caracters-ticas mecnicas da superfcie em que uma atividade realizada24,25. Assim, a associao existente entre cada fator isolado e a patologia estudada geral-mente fraca25. Por exemplo, indivduos diferentes que possuem uma mesma caracterstica, suposta como fator de risco para um processo patolgico espe-cfico, apresentam outras caractersticas individuais que tambm interferem na probabilidade desse processo ocorrer. Este fato pode enfraquecer a relao entre o fator estudado e a patologia25,26. Dessa forma, em termos estatsticos, difcil revelar essas relaes, mesmo que elas sejam existentes. Isso pode explicar os resultados contraditrios encontrados por alguns dos estudos includos nesta reviso. Estudos que investigam a relao entre fatores de risco e essas patologias geralmente precisam de um nmero muito grande de participantes e de casos da patologia estudada para demonstrar relaes estatisticamente significativas25. Por exemplo, um estudo que lida com uma associao considerada fraca ou moderada, mesmo que utilize anlises estatsticas multivariadas (tidas como mais apropriadas para investigar associa-es entre mltiplas variveis), necessita de um nmero aproximado de 200 casos da patologia estudada para identificar uma associao25. Todos os estudos sele-cionados incluram nmeros de casos da patologia bem inferiores a esta estimati-va. Dessa forma, estes estudos possivel-mente apresentaram baixa capacidade de identificar associaes estatisticamente

    significativas entre os fatores analisados e as patologias estudadas, quando essas associaes eram fracas ou moderadas. Assim, os estudos que no encontraram associaes significativas no podem afirmar que estas associaes realmente no existem, nas amostras estudadas. Existe sempre a possibilidade de outros fatores (fatores de confuso), no consi-derados no estudo, terem influenciado na ocorrncia ou no da leso e, assim, no resultado encontrado24-26. Entretanto, vale lembrar que uma associao esta-tisticamente significativa demonstra que a relao especfica observada forte suficiente para ser revelada com o n-mero de participantes estudados. Assim, as relaes significativas encontradas nos estudos no so duvidosas26.

    As limitaes metodolgicas apresen-tadas dificultam uma concluso definitiva sobre o papel da presena de pronao subtalar excessiva e dos desalinhamentos anatmicos avaliados na ocorrncia de patologias. Entretanto, a grande por-centagem de estudos que encontraram associaes significativas sugere que esse padro de movimento seja um fa-tor predisponente, dentre outros, para a ocorrncia das patologias estudadas. As limitaes apresentadas apontam para a necessidade do desenvolvimento de estudos com nmeros grandes de partici-pantes e de casos da patologia estudada, apropriados para o desenho metodolgi-co e anlise estatstica a serem utilizados.

    Nenhum dos estudos investigou interaes da presena da pronao subtalar excessiva e dos desalinhamentos anatmicos estudados com outros fato-res como idade, sexo ou alguma outra caracterstica fsica dos participantes. A presena desse padro de movimento ou desses desalinhamentos anatmicos pode ter impactos diferentes em indivdu-os que possuem caractersticas distintas. Gross et al.23, por exemplo, discute como a presena de antep varo, ao longo da vida de indivduos idosos, pode acarretar em processos degenerativos na articula-o do quadril, o que seria menos pro-vvel em indivduos jovens e saudveis. Vale destacar que os participantes de sete dos dez estudos que encontraram associaes significativas eram atletas profissionais e amadores ou indivduos que praticavam atividades fsicas regu-lares12,13,17,18,20-22. Este fato sugere que a

    susceptibilidade para o desenvolvimento de patologias pode estar relacionada com a interao entre os aumentos de estresse mecnico causados pela prona-o excessiva e pela prtica de atividade fsica regular9.

    O aumento da pronao subtalar interfere na mecnica do quadril e do complexo lombo-plvico3,6. Souza et al.3 demonstraram que o aumento da prona-o subtalar durante a marcha gera uma aumento da rotao interna do quadril. Alm disso, existem, na literatura, rela-tos de observaes clnicas sobre uma relao da ocorrncia de patologias no quadril e no complexo lombo-plvico com a presena de pronao excessiva da articulao subtalar27,28. Entretanto, apenas um estudo investigou a relao entre desalinhamentos anatmicos do p e condies patolgicas no quadril23. Este estudo encontrou que dores no quadril relacionadas a processos degenerativos esto associadas a maiores valores de varismo de antep, em idosos. No fo-ram encontrados estudos que abordaram leses ou patologias em tecidos ou arti-culaes do complexo lombo-plvico. necessrio o desenvolvimento de maior nmero de estudos que investiguem pos-sveis relaes de condies patolgicas no quadril e no complexo lombo-plvico com desalinhamentos de p e tbia e com a pronao subtalar.

    Dos estudos selecionados, 11 inves-tigaram a associao de varismos de p e tbia com a ocorrncia de patologias msculo-esquelticas11,13-19,21-23. Das 17 relaes investigadas, sete foram signifi-cativas11,15-17,21-23 e nove no foram con-firmadas11,13,14,18,20,21,23. Esses resultados dificultam concluir sobre uma associao direta entre os desalinhamentos anatmi-cos avaliados e as patologias estudadas. Os movimentos de um segmento ou articulao so multifatoriais29,30. Estes movimentos so gerados pela interao de mltiplas foras, originadas de vrias estruturas do corpo, sejam elas anato-micamente prximas ou distantes desse segmento ou articulao30. Essas interde-pendncias complexas so possibilitadas pelo fluxo de energia mecnica existente no sistema msculo-esqueltico9,30. Os movimentos da articulao subtalar durante a marcha e a corrida, por exem-plo, podem ser influenciados por vrios fatores intrnsecos, como alinhamento

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    anatmico e rigidez da articulao do quadril e do complexo tornozelo-p1,9, e extrnsecos, como calado e superfcie de apoio1. Assim, a presena isolada de varismo aumentado de tbia, retrop ou antep aumenta a probabilidade de ocor-rncia de pronao subtalar excessiva, porm no garante que ela ocorra18. Isto pode ser exemplificado no estudo de Wil-lems et al.20 que, apesar de ter encontrado associao de maiores valores de ngulo mximo e velocidade de pronao subta-lar durante a corrida com a ocorrncia de SETM, no observou associao de maio-res valores de varismo de retrop com essa patologia. Este exemplo demonstra que a pronao subtalar excessiva en-contrada foi causada por outros fatores que no o varismo de retrop conside-rado de maneira isolada. Dessa forma, a investigao de uma associao entre desalinhamentos anatmicos e patologias no investiga, necessariamente, a relao entre a pronao subtalar excessiva e es-sas patologias. Esses achados chamam a ateno para a necessidade de associar a avaliao de mltiplos fatores mecnicos no membro inferior avaliao do movi-mento, durante a prtica clnica, para que no sejam tomadas decises teraputicas equivocadas.

    Sommer e Vallentyne11 utilizaram a estratgia de investigar a associao da presena combinada de antep varo e retrop varo com a ocorrncia de SETM. Estes autores tambm investigaram a

    REFERNCIAS1 Michaud TC. Foot orthoses: and other forms of conserva-

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    possvel associao dessa patologia com a presena de cada um desses fatores, considerados de forma isolada. Foi en-contrada uma associao significativa entre a ocorrncia da SETM com a pre-sena combinada dos desalinhamentos anatmicos estudados. Indivduos que apresentavam apenas varismo excessivo de antep ou de retrop, de maneira iso-lada, no apresentaram maior frequncia da ocorrncia da SETM. possvel que, na amostra estudada, apenas a interao entre o antep varo e o retrop varo tenha sido suficiente para causar um movimen-to excessivo de pronao subtalar e, as-sim, para resultar na ocorrncia de SETM.

    Quatro dos estudos includos realiza-ram anlise cinemtica do movimento de pronao da articulao subtalar durante a marcha e a corrida e investigaram a sua associao com a ocorrncia de patolo-gias nos membros inferiores12,18-20. Desses estudos, trs encontraram associao entre pronao subtalar aumentada e o desenvolvimento de uma patologia12,19,20 e um no encontrou esta relao18. Os estudos que encontraram associaes significativas estudaram a SETM, o que refora a uma possvel concluso sobre o papel importante da presena da pro-nao subtalar excessiva na ocorrncia dessa patologia. Donatelli et al.18 no observaram associao entre a presena de maiores ngulos mximos de prona-o subtalar durante a marcha com a ocorrncia de leses por sobrecarga nos

    membros inferiores. Entretanto, estes autores no relataram quais patologias foram consideradas como leses por sobrecarga, o que dificulta concluir sobre o papel especfico da pronao subtalar excessiva na ocorrncia das leses estudadas.

    CONCLUSOA partir das evidncias disponveis,

    pode-se sugerir que a pronao excessi-va da articulao subtalar e a presena de desalinhamentos anatmicos no p e perna, que levam a esse padro alterado de movimento, sejam fatores que podem aumentar a susceptibilidade para o desenvolvimento de patologias msculo-esquelticas nos membros inferiores; especialmente em atletas e praticantes de atividade fsica regular. A sndrome do estresse tibial medial foi identificada como a patologia que possui mais evidncias relacionando-a com a pronao excessiva e os desalinhamentos anatmicos estudados. Considerando-se que a maioria dos estudos includos nesta reviso encontrou associaes significati-vas de patologias msculos-esquelticas com a pronao subtalar excessiva e varismos de retrop, antep e perna, sugere-se que o padro de movimento e os desalinhamentos anatmicos estuda-dos sejam considerados em abordagens clnicas de preveno e tratamento das patologias identificadas.

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