Stuart Hall

15

Click here to load reader

Transcript of Stuart Hall

Page 1: Stuart Hall

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIA

STUART HALL

Eliane Abel de Oliveira

Disciplina: Fundamentos em Interação

Professora Doutora Luciana Martha Silveira

Professor Doutor Luis Ernesto Merkle

Curitiba

Abril/2009

Page 2: Stuart Hall

1 INTRODUÇÃO

O presente ensaio tem a intenção de relacionar as questões de

identidade cultural apontadas por Stuart Hall com as questões de identidade

cultural de professores de escolas públicas. Para isso buscou nos livros “A

identidade cultural da pós- modernidade” e “Da Diáspora: Identidades e

mediações culturais” de Stuart Hall; “Identidade e diferença” de Tomaz Tadeu

da Silva e nos artigos “Os professores e a fabricação de identidades” de Martin

Law e “Uma escola com muitas culturas: Educação e identidade, um desafio

global” de Moacir Gadotti um embasamento teórico a respeito do assunto.

2 BREVE BIOGRAFIA DE STUART HALL

Nascido em Kingston, na Jamaica em 3 de fevereiro de 1932, Hall viveu

sua infância e adolescência cercado pelas contradições impostas pela

condição de pertencer a um país colonizado. Outro aspecto marcante em sua

formação foi o fato de pertencer a uma família de classe média, uma vez que a

posição social e o estilo de vida de sua família estavam condicionados pelas

diferentes formas de classificação e de reconhecimento existentes entre as

frações de classe e de cor das quais seus pais vieram (Hall, 2003: 407).

O pai de Hall pertencia a uma família de classe média baixa e mista

etnicamente, composta por africanos, indianos, portugueses e judeus. Já sua

mãe tinha origem familiar na classe média mais próxima culturalmente e

economicamente dos colonizadores, tanto a pele clara quanto as origens

ligadas aos antigos engenhos e valores culturais a aproximavam mais de uma

cultura inglesa. Hall era o mais escuro entre seus irmãos, sendo que no seu

ambiente social a pele escura estava associada a pessoas que ocupavam

posições subalternas, inferiores socialmente. Hall foi sempre identificado em

sua família como o patinho feio. Em um de seus livros, Hall afirma: que seus

amigos da escola, muitos dos quais oriundos de famílias de classe média

respeitáveis, porém mais escuros que ele, não eram aceitos em sua casa.

(Hall, 2003: 408).

Page 3: Stuart Hall

Nos anos 1950, após ter trabalhado na Universities and Left Review, Hall

juntou-se a E. P. Thompson, Raymond Williams e outros para fundar a revista

New Left Review. Sua carreira deslanchou após co-autorar com Paddy

Whannel “The popular arts” em 1964. O convite feito por Richard Hoggart para

que Hall entrasse no Birmingham Center for Cultural Studies foi um resultado

direto dessa publicação.

Em 1951 Hall mudou-se para Bristol, aonde viveu antes de ir para

Oxford. Estudou como bolsista na Universidade de Oxford, onde obteve o seu

mestrado. Trabalhou na Universidade de Birmingham e entre 1979 e 1997, Hall

foi professor na Open University.

Em 1968 Hall tornou-se o diretor dessa unidade situada na Universidade

de Birmingham. Ele escreveu muitos artigos influentes nos anos que seguiram,

incluindo: Situating Marx: Evaluations and Departures (1972), Encoding and

Decoding in the Television Discourse (1973). Ele contribuiu também para o livro

Policing the Crisis (1978).

Após ser nomeado professor de Sociologia na Open University em 1979,

Hall publicou uma série de livros influentes, incluindo: The Hard Road to

Renewal (1988), Resistance Through Rituals (1989), The Formation of

Modernity (1992), Questions of Cultural Identity

O trabalho de Hall é centrado principalmente nas questões de

hegemonia e de estudos culturais. Hall concebe o uso da linguagem como

determinado por uma moldura de poderes, instituições, política e economia.

Essa visão apresenta as pessoas como “produtores” e “consumidores” de

cultura ao mesmo tempo.

Seus trabalhos – como os estudos sobre preconceito racial e mídia –

são considerados muito influentes e fundadores dos contemporâneos estudos

culturais como no livro “A identidade cultural da pós modernidade”, em que Hall

busca avaliar se estaria havendo uma crise de identidade cultural, o que

consiste tal crise e quais as consequências da mesma no mundo pós moderno.

Page 4: Stuart Hall

3 CONCEPÇÕES DE IDENTIDADE

Para o estudo das identidades, Hall aponta 3 concepções muito

diferentes de identidades:

a) Sujeito do Iluminismo: esta concepção está baseada no sujeito como

sendo totalmente centrado, cujo centro consiste num centro interior que

surge no nascimento e se desenvolve ao longo de sua vida, porém sua

essência permanece a mesma. O sujeito do Iluminismo era descrito

como masculino.

b) Sujeito Sociológico: com a crescente complexidade do mundo moderno,

cresce também a consciência de que o núcleo interior do sujeito não é

autônomo e auto-suficiente, mas formado pela interação com outras

pessoas, mediando seus valores, sentidos e símbolos. Nesta

concepção, já aparece a noção masculino e feminino. Nesta concepção

a identidade é formada pela interação entre o eu e a sociedade onde o

eu é modificado a partir dos mundos culturais exteriores.

c) Sujeito pós-moderno: com o processo de mudança dos mundos

culturais, surge o sujeito pós-moderno conceituado como não tendo uma

identidade fixa. Sua identidade é transformada continuamente em

relação aos sistemas culturais que nos rodeiam.

4 MODERNIDADE TARDIA

Hall utiliza o termo “modernidade tardia” para se referenciar ao período

pós anos 60. Para ele, este é um marco na mudança estrutural da sociedade e,

por conseguinte, uma mudança na identidade cultural das sociedades. Para

isso aponta cinco grandes avanços ou descentramentos na teoria social:

O primeiro avanço foi o pensamento marxista: nos escritos de Karl Marx

encontramos afirmações que nos levam a interpretar que “os indivíduos não

poderiam de nenhuma forma ser os autores ou os agentes da história, uma vez

que eles podiam agir apenas com base em condições históricas criadas por

outros e sob as quais eles nasceram, utilizando os recursos materiais e de

cultura que lhes foram fornecidos por gerações anteriores” (Hall, 2002: 34-5).

Page 5: Stuart Hall

O segundo grande avanço foi a descoberta do inconsciente por Freud,

onde ele afirma que a identidade é formada ao longo do tempo através de

processos inconscientes e não é algo inato. Para Freud a identidade é sempre

incompleta e por isso está sempre em processo, sendo formada

constantemente. O termo mais correto seria identificação ao invés de

identidade, pois é um processo em andamento.

O terceiro descentramento é associado ao trabalho de Ferdinand de

Saussure. Para este autor, nós não somos autores de nossas afirmações uma

vez que a língua é um sistema social e não um sistema individual. Para

Saussure, a língua pré-existe a nós.

O quarto descentramento ocorre no trabalho do filósofo e historiador

Michel Foucault. Em seus estudos, Foucault produziu uma espécie de

genealogia do sujeito moderno, atribuindo ao poder disciplinar uma identidade

cultural onde o sujeito torna-se dócil e maleável. O filósofo também aponta um

paradoxo: “quanto mais coletiva e organizada a natureza das instituições da

modernidade tardia, maior o isolamento, a vigilância e a individualização do

sujeito individual” (Hall, 2002: 43).

O quinto grande avanço está no impacto do feminismo que surge tanto

como uma crítica teórica como um movimento social. O movimento feminista

trouxe à luz da sociedade o que é conhecido como política da identidade, ou

seja, uma identidade para cada movimento.

5 HALL, AS CULTURAS NACIONAIS E A IDENTIDADE DO DOCENTE

Quando nos definimos, procuramos dizer que somos brasileiros,

italianos, ingleses ou mexicanos. Quando nos posicionamos desta forma,

estamos falando através de metáforas, pois estas identidades não fazem parte

de nosso gene, nossa identidade, neste caso, é formada por representações

culturais.

Vivemos hoje uma explosão das diferenças: étnicas, sexuais, culturais,

nacionais, etc. que coloca a questão do resgate da identidade. Na verdade,

Page 6: Stuart Hall

identidade é a resposta que damos à pergunta: quem somos nós? No nosso

caso, de brasileiros, somos uma mistura de afroamericanos, índios e brancos.

Mas não é só isso. Essa mistura nos proporcionou uma identidade cultural ou

identidades culturais.

A cultura é dinâmica e, no contato com outras culturas, ela se

transforma. Por isso, é preferível falar-se em "identidades culturais" e não

"identidade cultural", para evidenciar, desde logo, a pluralidade e o dinamismo

da identidade cultural.

Para Gadotti (1995: 17), “o mundo está se tornando mestiço e é neste

contexto que devemos colocar a questão da identidade. Idêntico é aquele que

é perfeitamente igual. Na identidade existe uma relação de igualdade que

cimenta um grupo, igualdade válida para todos os que a ele pertencem”.

Essa identificação é dada como uma cultura nacional. É através da

cultura nacional que se mantém instituições culturais nacionais como o sistema

de educação nacional. Neste sentido a gestão da identidade dos professores é

importantíssima para se compreender esse sistema.

Para o autor Martin Law (2001: 119), a identidade do professor deve ser

gerida porque esta deve se ajustar à imagem do próprio projeto educativo da

nação e também porque é uma das formas mais eficientes de gerir eficazmente

os professores e criar sua identidade é através do discurso oficial.

Geralmente, os professores aparecem invisíveis nas descrições dos

sistemas educacionais, e quando aparecem, surgem como elementos neutros,

sendo destacados somente quando há um pânico moral acerca da sociedade e

das suas crianças. Neste caso, o professor aparece como responsável pelo

pânico moral, sendo então reprovados pela sociedade. Sua identidade aparece

como inadequada devendo sofrer alteração.

Ora, o professor sendo parte de uma nação, com seus saberes e

experiências, nada mais é que um símbolo do sistema e nação que o criou.

Reflete a comunidade imaginada da nação que para Hall, é constituída por:

“memórias do passado, o desejo de viver em conjunto e a perpetuação da

herança” (Hall, 2002: 58).

Page 7: Stuart Hall

Segundo Law (2001: 120), a identidade do professor tem não só o poder

de refletir o sistema como também pode ser manipulada para arquitetar

mudanças. Esta tentativa de manipular a identidade do docente é um sinal de

reestruturação do sistema de ensino, pois “as identidades nacionais não estão

livres do jogo de poder, de divisões e contradições internas” (Hall, 2002: 64).

6 GLOBALIZAÇÃO E IDENTIDADE DO PROFESSOR

Em seu sentido literal professor quer dizer aquele que professa, isto é,

aquele que diz a verdade publicamente, que expõe corretamente. Assim, o

professor é aquele que torna público, que socializa algum conhecimento. Assim

como toda profissão, o professor passou por uma construção identitária.

Com o avanço das sociedades modernas, as velhas identidades,

inclusive a do professor, “estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e

fragmentando o indivíduo moderno” (Hall, 2002: 7). Isso traz uma crise de

identidade. O professor, até então visto como o detentor da verdade, como

fonte de informação (muitas vezes a única fonte de informação do aluno),

agora divide espaço com a tecnologia, com o mundo da comunicação e

informação e este talvez seja um dos fatores para a crise de identidade da

profissão.

Crise de identidade no sentido de que as sociedades pós-modernas

estão descentradas e fragmentadas. Essa descentração dos indivíduos “tanto

de seu lugar no mundo social e cultural, quanto de si mesmos, constitui uma

crise de identidade” (Hall, 2002: 9).

Nas últimas décadas do século XX assistimos grandes mudanças, tanto

no campo sócio-econômico e político, quanto no campo da cultura, da ciência e

da tecnologia e, por conseguinte também no campo da Educação. Vimos

grandes movimentos sociais, como o feminismo. Para Hall (2002: 44) o ano de

1968 foi um marco na construção das identidades culturais, nas mudanças

políticas e sociais, considerado por ele o “grande marco da modernidade

tardia”, pois esse ano foi marcado por movimentos estudantis e juvenis de

contracultura, por lutas pelos direitos civis além de movimentos pela paz.

Page 8: Stuart Hall

Com a expectativa da chegada de um novo milênio, criou-se um tempo

de expectativas, de perplexidade e da crise de concepções e paradigmas, não

apenas pelo início de um novo milênio, época de balanço e de reflexão, época

em que o imaginário parece ter um peso maior, mas também pelas

expectativas de um mundo pós-moderno. E é “dentro desse cenário da pós-

modernidade que a escola precisa atuar, um cenário que coloca novos desafios

para os educadores” (Gadotti, 1995: 13).

Toda essa aceleração de mudanças sociais e culturais culminou com a

globalização e, por conseguinte, algumas conseqüências para as identidades

culturais como a desintegração das identidades culturais nacionais e novas

identidades híbridas tomando seu lugar (Hall, 2002: 69). E por isso, segundo

Gadotti (1995: 14-6)

“A escola precisa preparar o cidadão para participar desta sociedade

planetária. A escola tem que ser local como ponto de partida, mas tem

que ser internacional e intercultural como ponto de chegada. Avaliar a

identidade cultural, sobretudo para as camadas populares, pode

representar a grande diferença na extensão ou não da educação para

todos e de qualidade, nos próximos anos. Só uma educação multicultural

pode dar conta dessa tarefa. A educação multicultural se propõe a

analisar criticamente os "curricula" monoculturais atuais e procura formar

criticamente os professores, para que mudem suas atitudes diante dos

alunos mais pobres e elaborem estratégias instrucionais próprias para a

educação das camadas populares, procurando, antes de mais nada,

compreendê-las na totalidade de sua cultura e de sua visão de

mundo(...) A diversidade cultural é a riqueza da humanidade. Para

cumprir sua tarefa humanista, a escola precisa mostrar aos alunos que

existem outras culturas além da sua. A autonomia da escola não significa

isolamento, fechamento numa cultura particular. Escola autônoma

significa escola curiosa, ousada, buscando dialogar com todas as

culturas e concepções de mundo”.

Negar o desenvolvimento científico tecnológico em tempos de

globalização é impensável, seus avanços são sentidos até mesmo nas ações

mais corriqueiras do nosso cotidiano, como por exemplo, na utilização de um

caixa eletrônico de banco. Os impactos da tecnologia avançam em ambientes

formais e grupos sociais diversos perpassando por todos os aspectos, em

Page 9: Stuart Hall

especial no ambiente escolar, enquanto processo formador de cultura, fazendo-

se necessário discutir a presença ou ausência da tecnologia no mundo escolar.

Com o avanço da ciência e da tecnologia, as informações nos chegam

cada vez com mais velocidade, o currículo escolar torna-se descabido diante

desta realidade. É preciso repensar a estrutura curricular que molda a estrutura

de ensino, quiçá uma ressignificação nos estudos identitários do professor.

7 O GLOBAL E O LOCAL

O processo de globalização difundiu o consumismo contribuindo para o

que Hall denomina supermercado cultural e formando uma homogeneização

cultural. O que nos leva a refletir: as identidades culturais estão sendo

homogeneizadas? Responder afirmativamente esta pergunta nos leva a um

resultado simplista e unilateral.

Em relação a este assunto, Hall (2002: 77-8) aponta para três contra-

tendências principais:

a) Juntamente com o impacto global um novo interesse pelo local: é

improvável que a globalização acabe com o local, o mais correto é

afirmar que a partir dela, se construam novas identidades globais e

novas identidades locais;

b) A globalização é desigualmente distribuída ao redor do mundo: a

chamada geometria do poder;

c) Para se criticar a homogeneização cultural deve-se saber o que é

afetado por ela: apesar de se chamar globalização ainda há uma

diferença entre as relações de poder oriental e ocidental, podendo-se

inclusive afirmar que a globalização é essencialmente um fenômeno

ocidental.

Page 10: Stuart Hall

8 CONCLUSÃO

Conhecer os estudos de Stuart Hall faz-se necessário para quem se

aventure a estudar o campo dos estudos culturais. Por sua experiência tanto

acadêmica quanto de vida, a contribuição do autor para os estudos neste

campo, imprime sua marca nos campos teórico e político. Hall se mostra

relevante a partir de seu engajamento com a sociedade contemporânea

promovendo debates como a globalização, o multiculturalismo, a participação

negra e sua inserção na sociedade.

Page 11: Stuart Hall

9 REFERÊNCIAS

GADOTTI, Moacir. Uma escola com muitas culturas: Educação e identidade,

um desafio global. In: Revista FAEEBA, Salvador, n. 4, p. 15-21, jul./dez.

1995.

HALL, Stuart. A identidade cultural da pós-modernidade. Rio de Janeiro:

DP&A, 2002.

__________. Da Diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG: Representações da UNESCO no Brasil, 2003.

LAW, Martin. Os professores e a fabricação de identidades. In: Revista Currículo sem Fronteiras, vol. 1, n.2, p. 117-130, jul./dez. 2001.

SILVA, Tomaz Tadeu da (org); HALL, Stuart; WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.