sumários-sínteses (Sociologia)

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Universidade de Lisboa Faculdade de Belas Artes Ano lectivo 2010-2011 (2º semestre) Sociologia Sínteses de apoio para os trabalhos teóricos 2009, revisto em 2011 [licenciatura de Design de Comunicação] Fernando Paulo Rosa Dias

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  • Universidade de Lisboa Faculdade de Belas Artes Ano lectivo 2010-2011 (2 semestre)

    Sociologia Snteses de apoio para os trabalhos tericos

    2009, revisto em 2011

    [licenciatura de Design de Comunicao]

    Fernando Paulo Rosa Dias

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    Universidade de Lisboa Faculdade de Belas Artes

    Ano lectivo 2010-2011

    SOCIOLOGIA (Design de Comunicao)

    Programa:

    Este programa pretende fornecer uma travessia de diversos autores que problematizaram a

    gnese e os desenvolvimentos da cultura industrial, da reproduo tecnolgica e da cultura

    de massas, com as suas implicaes no mbito da criao artstica e do design.

    1. A cidade industrial: as origens da cultura industrial

    2. Walter Benjamin e a reprodutibilidade tcnica

    3. Adorno e a crtica cultura industrial

    4. Marcuse e o Homem unidimensional.

    5. Situacionismo: A Sociedade do Espectculo de Guy Debord.

    6. Baudrillard e a A Sociedade de Consumo.

    7. Gilles Lipovetsky e os tempos hipermodernos

    8. Paul Virilio e a dromologia como rudo

    Avaliao:

    A avaliao consistir num trabalho terico-prtico de grupo (2/3 discentes) dividido em

    duas partes: a primeira corresponde a uma investigao sobre um conceito adequado

    orientao da disciplina; o segundo ser a execuo de um trabalho prtico onde o anterior

    conceito seja problematizado (alm da apresentao no suporte prprio deste trabalho, ser

    necessrio de um texto-relatrio onde se indique como que o conceito se relaciona). Este

    trabalho requer um devido acompanhamento entre o docente e o grupo de trabalho. Entrega do

    trabalho na ltima aula do semestre.

    A segunda parte do trabalho (prtica) poder ser substituda por um teste de avaliao

    com data a definir no final do semestre.

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    BIBLIOGRAFIA

    AA.VV.

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    O centro da nossa problematizao situa-se na encruzilhada de superao da primeira era

    industrial, entre o tempo da Bauhaus, no limiar mas ainda sob o paradigma da confiana do

    momento pico e progressista da primeira etapa da revoluo industrial, e o advento da

    novos mecanismos que passam a sustentar uma capacidade de produo generalizada. Este

    o tempo dos novos cones e imaginrios da cultura industrial (noo de Adorno e

    Horkheimer em A Dialctica do iluminismo) ou da cultura tecnolgica (Marcuse em

    Eros e Civilizao e O Homem Unidimensional), noes que procuravam novos

    entendimentos do capitalismo avanado e que teriam desenvolvimentos vrios na dcada

    de 1960, sobretudo no espao francs, casos de Mithologies (1957) de Barthes, A

    sociedade do espectculo (1967) de Guy Debord, La Vie quotidienne dans le monde

    moderne (1968) de Henri Lefebvre, A Sociedade de consumo (1970) de Jean Baudrillard,

    coevas posies tericas perante o que tambm se apresentou como sociedade da

    abundncia ou neocapitalista (Salgado de Matos, A arte na sociedade industrial).

    Este era o tempo do primeiro estdio da Sociedade de Consumo, em que se manifestavam

    as primeiras dificuldades em carregar as utopias produtivas e progressistas das primeiras

    vanguardas e em que a cultura industrial perdia a sua ingenuidade, ou seja, em que as

    estruturas de produo produziam para l da necessidade, do progresso ou da utopia, onde

    tais estruturas se reestruturam para se susterem no seu prprio excesso, para alm de fins e

    de objectivos j superados. Discutir e problematizar este tempo, obriga a reflectir tanto a

    sua gnese (pelo menos, no sculo XVIII) como os seus desenvolvimentos para o que se

    chamou de situao ps-Moderna (Lyotard) ou Hiper-Moderna (Lipovetsky).

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    Utopias e Marxismo (noes para introduo Escola de Frakfurt)

    Thomas Morus apresentava em 1516 Utopia, um no lugar ou lugar nenhum, ilha

    idealizada de virtudes assentes no bem comum, no dever cvico, na tolerncia religiosa,

    numa ordem moral governada por sbios, e numa sociedade transparente em que cada um

    est ao olhar de todos evitando o egosmo e o vcio. Idealizada como estrutura agrcola

    comunitria, com apenas 6 horas de trabalho, permite libertar da servido do corpo e

    disponibilizar os indivduos para cultivar livremente o esprito. Perante o desencanto da

    realidade, a Inglaterra de Henrique VIII, uma ilha imaginria apresentava-se como fantasia

    geogrfica como lamento pela realidade imperfeita. Tommaso Campanela amplia a

    fantasia e a contestao de Morus em A Cidade do Sol (Solrios) em 1623, defendendo a

    anulao da famlia (como o fizera Plato em A Repblica), no trabalho comum no campo

    reduzido a 4 horas, a anulao da propriedade privada, a ausncia de dinheiro e a

    transparncia atravs de um sistema de confisso de pecados. Na lista de sistemas sociais

    ideais, referncia ainda Nova Atlntida de Bacon, Oceana de J. Harrington ou A

    Repblica de Jean Bodin. No sculo VVIII, Mercier substitui o espao imaginvel por um

    futuro desejado, atravs de uma Ucronia: o ideal no est em lugar nenhum, mas no

    futuro (Paris no ano de 2440). Com o iluminismo do sculo XVIII emergem as utopias

    sociais, com continuidade crtica e aguda no sculo seguinte, alimentando o desejo de

    transferncia para a realidade da utopia imaginria, caso do Conde de Saint-Simon, Charles

    Fourier ou Joseph Proudhon. [referncia, por analogia, aos arquitectos do classicismo

    utpico, casos de Boulle e Ledoux]

    Com Marx a filosofia j no deve interpretar o mundo, mas transform-lo, numa

    reconciliao entre o ideal e o real. A dialctica, revolucionria por excelncia e forma

    originria do devir, deixa de ser uma questo espiritual (da ideia), para ser social e poltica

    (da realidade emprica). Enquanto a burguesia produz a sua prpria destruio, o

    proletariado, nada tendo a perder (como humanidade que sofre e sem posses), o

    heri da revoluo to necessria como inevitvel. A propriedade privada dos principais

    obstculos a serem superados: A propriedade privada tornou-nos estpidos e unilaterais;

    A superao da propriedade privada por isso a emanciapao total de todos os sentidos

    e qualidades humanas (Marx).

    No marxismo, a infraestrutura material e econmica que passa a construir a

    superestrutura espiritual e ideolgica: o absoluto constri-se de baixo. A conscincia deixa

    de ser o produto de uma verdade absoluta que conduz as aces do homem e determina a

    sociedade (Hegel), para antes se apresentar como elemento alienado e determinado pela

    sociedade: no a conscincia dos homens que determina a sua existncia social, mas a

    sua existncia social que determina a conscincia do modo como esto em sociedade e, em

    geral, a sua conscincia de realidade (Marx). Se o que o homem pensa de si resulta da

    prtica e no de um absoluto, e se a sociedade diferente daquilo que o homem pensa de

    si, pelo que este submete-se ao poder, ento intil mudar as imagens que o homem

    concebe de si, tornando-se inevitvel a destruio do poder.

    Se a alienao do trabalho sustenta uma alienao da sensibilidade artstica (na produo e,

    sobretudo, na percepo), ento a emancipao revela-se necessria. Mas no marxismo, a

    emancipao esttica, ao contrrio das utopias romnticas (Novalis, Schiller), s pode

    surgir depois da emancipao social. Se a arte produto das condies econmicas e

    materiais ento ela tem que esperar pelo cumprimento das condies para a sua prpria

    universalidade. S depois da emancipao que todos sero artistas. Para Marx a arte da

    antiguidade clssica fascina ainda hoje, seduz como se fosse feitas para ns, pelo que

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    haver nela algo de universal, com possibilidades (nos seus melhores momentos) de

    transcender a histria, com autonomia relativamente ideologia dominante ou aos

    condicionamentos histricos e materiais. Mas no a arte que faz a revoluo para

    comunicar o universal, mas a revoluo social que se efectua para realizar o universal: a

    vanguarda no pode ser artstica (seria inutil!), mas apenas poltica (til!). O projecto

    artstico-cultural est adiado no marxismo. Se com Hegel a arte morreu depois da

    concluso dialctica de progresso do esprito, em Marx ela sustida a estar como que

    numa morte letrgica de espera, enquanto no se concretiza a dialctica de revoluo

    material e social.

    A Escola de Frankfurt (Introduo)

    Cronologia:

    1923 criao de centro de estudos sociais e culturais em Frankfurt de Main: Institut fr Sozialforschung (Instituto da Investigao Social) ps-Guerra, intelactualismo Repblica de Weimar filosofia marxista: Ernest Bloch, Georgi Lukcs, Karl Korsch, Carl Grnberg, Bertolt Brecht no ligao ao partido comunista alemo (s parcial e inicial): Carl Grnberg (1 director), Felix Weil (filho de Herman Weil, patrocinador do Instituto),

    Friedrich Pollock, Leo Lowenthal, Max Horkheimer, Karl August Wittfogel, depois Walter

    Benjamin e Theodor Wiesengrund Adorno

    1931 Max Horkheimer substitui Carl Grnberg: abertura do marxismo psicanlise (Erich Fromm, Wilhem Reich) e ao pensamento de Heidegger (Herbert Marcuse).

    1933 Hitler sobe ao poder: encerramento por actividades contrrias ao Estado devido ascendncia judia de vrios dos seus membros e s origens marxistas exlio generalizado nos Estados Unidos: Universidade de Columbia e Comit Judaico americano

    1945 retorno do Instituto Alemanha por Horkheimer e Adorno desenvolvimento de uma 2 gerao: Jnger Habermas, Alfred Schmidt, Albrecht Wellmer (com olhares

    histricos sobre os outros pensadores)

    Significados da Escola de Frankfurt

    Noo de crtica da cultura, expresso desenvolvida da crtica social, mas com a dimenso cultural com alguma independncia da social; Esttica tem autonomia no

    espao do social: scio-histrico no determinista e a arte tambm reflecte o social

    sem ser sua escrava-presa porque a crtica social no atingiu fins a crtica cultural corrige e radicaliza crtica social. A Escola de Frankfurt apresenta-se como um neo-

    marxismo.

    Mudana da tradio crtica marxista, justamente numa fase de dogmatismo doutrinrio diverge e alarga conceitos da sua ortodoxia: a Ideologia alarga-se racionalidade ideolgica (Adorno, Horkheimer); a Alienao liga-se psicanlise e s teorias de

    represso (Marcuse, Adorno, Horkheimer); o Sujeito revolucionrio aos intelectuais

    mais do que aos operrios (Marcuse); a barbrie militncia poltica acrtica (Adorno,

    Horkheimer, Benjamin).

    Estrutura econmica deixa de ser o centro e duvida-se do sujeito histrico radical e da unidade terica-prtica.

    Abertura temtica (Jazz, arte vanguarda) que leva a novos conceitos como o de cultura industrial (Adorno e Horkheimer) ou de perda da aura na era da

    reprodutibilidade tcnica (Benjamin).

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    O espao social visto como um todo, na articulao com vrias esferas e interdisciplinaridade.

    Preldio ps-moderno na tendncia hermenutica, no desespero numa utopia que no se consegue largar, na imaginao da sua dialctica ou na conscincia niilista da barbrie.

    Domnio de um pensamento negativo (Marcuse sobre Hegel) e afirmao de uma dialctica negativa (Adorno) liberdade de reflexo e de criao como recusa do existente, valorizao do momento da negao (anttese), vista como anti-ideologia, e

    desconfiana da nova sntese como ideologia.

    O proletariado j no se apresenta como sujeito da histria (papel relevado no intelectual); a luta de classes j no assegura a emancipao da humanidade.

    Adorno e a crtica cultura industrial

    Em Dialctica do Iluminismo (com Horkheimer: Amesterdo: 1947; Paris: 1974), Adorno

    crtica o conhecimento iluminista, que avalia como manifestao de um poder, que procura

    assenhorar-se e dominar a matria, espcie de imperialismo da vontade do homem apoiada

    na abstraco do real (cincia), alm de uma excessiva viso cientfica utilitria: a razo

    instrumental. V a cincia como mscara, uma mera ocultao da angstia do homem

    perante a natureza exterior - Fausto inseguro: O iluminismo angstia mtica

    radicalizada. O saber com origens no iluminismo tornou-se separao e domnio da

    natureza. Abolindo os deuses, o esprito humano passou a enfrentar a natureza com

    complexo de superioridade (Hegel), rompendo com o seu mistrio e ameaa, tornando-a

    desencantada e sem poder. Negando o mito religioso, fazia-se da tecnologia um mito: este

    domnio tecnolgico, no humanizado apresentava-se como um esprito sem finalidade

    que esquecia a finalidade humana: era um triunfo infeliz. O mito j iluminismo e o

    iluminismo recai no mito (Dialctica do Iluminismo). O mito torna-se Razo e a

    natureza pura objectividade. Os homens pagam o aumento do seu poder tornando-se

    estranhos quilo sobre o qual o exercem. A Razo comporta-se perante as coisas como um

    ditador perante os homens: ele conhece-os na medida em que os pode manipular. O

    homem da cincia conhece as coisas na medida em que as sabe fazer. Ele utiliza assim o

    seu em-si para si prprio. Nesta metamorfose, a natureza das coisas revela-se sempre a

    mesma: o substrato da dominao. esta identidade que constitui a unidade da natureza.

    Os resultados histricos do iluminismo revelaram tambm a irracionalidade da razo, caso

    tanto do Nazismo alemo e da sua barbrie, com a sua represso fsica e visvel de

    cobertura ideolgica sobre a crtica, como da cultura industrial (sobretudo dos EUA),

    como represso sem cobertura ideolgica, sem revolta social, num compromisso que

    desprezava a prpria crtica, no necessitando por isso de mscara ideolgica (o insulto ao

    esprito e a injria felicidade eram a duas faces da mesma moeda). Torna-se necessrio

    fazer ao iluminismo o que este quis fazer ao mito: uma crtica radical e total. O

    sofrimento torna-se o nico argumento contra a ausncia de racionalidade e a dialctica

    s pode ser negativa, desocultando a falta de verdade, mas j no produzindo qualquer

    verdade. Da dialctica hegeliana, Adorno prefere a antntese e por a fica como processo de

    negao; de Nietzsche prefere Dionsio a Apolo, num desiquilbrio que recusa a

    racionalidade socrtica (base da ideologia).

    Ulisses e as Sereias:

    Ulisses- humanidade [racional]

    Canto das sereias retorno unio homem-natureza

  • 11

    resistir ao canto manter o controle do homem sobre o homem, portanto, manter relaes de domnio

    astcia de Ulisses lume da razo - ordem (ptria, famlia) superao do sacrifcio falso sacrifcio a Posseidon dissimulao para fugir com engano na palavra (Ningum) a palavra liberta-se a coisa designada, liberta-se da sua espontaneidade que a liga ao real a palavra torna-se conceito-ideia que passa a enganar a prpria realidade e os deuses

    A produo da cultura industrial (outra marca e herana do iluminismo), que no

    merece o nome (autntico) de Arte (mas apenas de arte culinria), deleite puro,

    gratuito e cego. ticamente transigente, apresenta-se como mera distraco dos

    mecanismos repressivos, no os criticando nem avaliando, apenas repousando deles para

    melhor os sustentar. Confundindo o mero efeito virtuoso (truque) com o verdadeiro

    valor, repete-se numa falsa originalidade, oscilao intil de uma mesma dimenso

    homognea e tirnica. Apresenta-se como antdoto da desumanizao, a compensar (como

    blsamo) a robotizao falsa luz (luz de neon) que esconde a sua prpria escurido. A arte culinria serve-se como sobremesa do iluminismo (Cf. Merquior).

    O homem transforma-se em cliente e empregado, perseguido pela produo cultural

    industrial at sua mais intima conscincia Quanto mais cr emancipar-se do trabalho,

    tanto mais reproduz e mantm os pressupostos ao consumindo os seus bens culturais da

    mercadoria-cinema, mercadoria-televiso, mercadoria-msica.

    A mimesis e passividade comportamental so adequadas reproduo: deixa de pensar

    autonomamente substituda por automatismos de aderncia. A conscincia crtica, que seria

    a base de uma autntica cultura o que se perde: o divertimento nos tempos livres o que

    se ganha. O trabalhador orientado pela produo at aos tempos livres [Marcuse,

    Baudrillard]. A liberdade de pensamento substituda por um resumo acrtico da

    mercadoria. A arte autntica no cabe na unidade totalitria do sistema de produo

    industrial: ela s lhe pode ser exterior e radicalmente crtica.

    O iluminismo culmina na reificao do humano: O animismo deu uma alma coisa, o

    industrialismo transforma a alma do homem em coisa. a planificao total, em que o

    aparelho econmico confere valores que decidem comportamentos (em que o todo decide a

    parte), de modo que o fetiche se estende ao social: o comportamento standart estende-se ao

    social: homem tornada coisa estatstica, num processo de autoconservao e conformismo.

    Para Adorno a Arte deve apresenta-se como:

    1. Enigma (anti-hermenutico): no se exingue na compreenso no uma revelao evolutiva do sentido, mas saltos de revelaes nunca completadas: Todas as obras de arte, e a arte em geral, so enigmas; isso desde sempre irritou a teoria da arte. O facto de as obras de arte

    dizerem alguma coisa e no mesmo instante a ocultarem coloca o carcter enigmtico sob o aspecto

    da linguagem. (Teoria Esttica). A interpretao da obra no extingue a sua compreenso.

    2. Difcil (como autntica): prazer no imediato, exigindo o uso da inteligncia como

    prmio para a sensibilidade: fazer ao pblico a honra de no fazer-lhe nenhuma conceso.

    No prazer nem dimenso ldica imediata, mas desdobrar da verdade. O hermetismo

    afirma-se como modo de emancipao, numa compreenso diferida da arte, cujo dizer

    ocultar.

    3. Autonomia da Arte: a arte material irredutvel.

    4. Fragmento: anti-unidade/totalidade e anti-ideolgico como recusa de compromisso: a

    misso da arte hoje introduzir o caos na ordem (Minima Moralia). Ao emancipar-se, o

  • 12

    detalhe torna-se rebelde e, do romantismo ao expressionismo, ele afirma-se como o veiculo da

    revolta contra a organizao. (). A industria cultural, enquanto totalidade, ps fim a tudo isto. No conhecendo mais nada para alm dos efeitos, ela quebra a sua insubordinao e submete-os

    formula que toma o lugar da obra. (Max Horkheimer; Theodor W. Adorno, A Dialctica do

    Iluminismo) 5. Heterognea: a relao com o contrrio, e absorvendo a dvida sobre si, como recusa de

    compromisso e de harmonia (pacificao alienao e cedncia ordem). Tal como a

    filosofia a verdade frgil e no duradoura, altervel e no perene nem absoluta, pelo que

    a procura da diferena como tica ou do no idntico como princpio, sustenta a sua fora

    de subverso e negao, na exigncia continua de actividade crtica.

    6. Solitria: resistncia e liberdade na subjectividade radical: a solido como estilo.

    7. Intil: a funo da arte a sua ausncia de funo.

    8. Subjectividade radical: a Arte como oposio ao social o universal d-se atravs da linguagem pessoal e o individual universal.

    9. Sofrimento: cicatrizes do mundo: a cicatriz deixada pela expresso numa linguagem

    que no est mais em condies de realizar uma expresso (Adorno). Realidade do

    material como fragmento e cicatriz. A deformao, a falha e o fragmento so o verdadeiro

    realismo. necessria a linguagem do sofrimento como conscincia das misrias

    (Teoria Esttica). A arte s pode ser sofrimento tal como a dialctica s pode ser negativa.

    10. Negatividade: recuperao de uma praxis na recusa; no se aprisiona nas verdades

    estticas absolutas e repressivas: a negatividade sustem a fragilidade da verdade.

    11. Desdialectizao de Nietzsche (j no o equilbrio dinmico entre apolneo e

    diniosaco): mas apenas dionsiaco por negatividade, cuja harmonia com o mundo no se

    concretiza, e se revela na cicatriz, por sofrimento ou expressiva apatia.

    12. Alternativa e compensao da razo tecnolgica, no desejo de uma autenticidade

    ontolgica: a crtica negativa como diferena inovadora: a verdade o outro, brecha que

    contesta pela diferena, na elaborao da ruptura do estilo e de um estilo de ruptura, numa

    estratgia de subverso (guerrilha) e intransigente resistncia.

    13. tica como esttica: para alm de uma esttica a arte deve assumir uma posio tica

    (como arte autntica) perante a histria e perante o poder. Impossibilidade e mentira do

    ideal: torna-se necessrio desmascarar o ideal e mostrar a misria do presente.

    14. Cultura como ruptura e redeno (negao). Afirmao e pacificao o fim da arte.

    Marcuse e o Homem unidimensional.

    Psicanlise e Marxismo articulam-se e complementam-se, de modo que a dimenso social

    do marxismo se preenche e complementa com a ateno a uma dimenso individual que a

    psicanlise sublinha A psicanlise deixa de ser questo individual e abstracta para ser

    tambm social e histrica. As obras tericas Eros e Revoluo (1955) e O Homem

    Unidimensional (1964) tiveram sucesso na renovao crtica da sociedade capitalista e

    inspiraram a nova esquerda. O homem unidimensional representa a escravido

    voluntria como fatalidade do bem-estar, espcie de negao do Super-Homem de

    Nietszche.

    No capitalismo a vida choca contra a mercadoria: o excesso de produo no resolve as

    necessidades do sujeito, aliena-o no trabalho e reprime-o na satisfao dos seus impulsos

    vitais. Numa leitura psicanaltica, as pulses internas do princpio do prazer (Eros) chocam

    contra o princpio da realidade (civilizao) exterior. Esta opresso do lbido individual,

  • 13

    que a mesma sociedade capitalista podia satisfazer mas adia, possibilita uma represso que

    sustenta a sua prpria continuidade ou progresso tecnolgico.

    O instinto do Id (isso), como liberdade radical em busca da sua satisfao,

    anatemizado como demonaco e caos rivalizando com a razo tecnolgica. o controlo

    gerido pelo Ego (executivo da personalidade), que processa a sufocao necessria desses

    instintos para garantia da paz social, determinando na conduta o real e o possvel como

    mscara do princpio de eficincia (Marcuse). O Princpio de Prazer e o Princpio da

    Realidade vivem uma histrica separao sustentada pela represso efectuada pela razo

    tecnolgica. Na cultura tecnolgica e de massas o Super-Ego (coero moral sobre o Ego)

    cresceu ao ponto de adquirir autonomia e prescindir do Ego, actuando directamente no

    inconsciente sobre o Id. O Ego enfraquece-se e o princpio da realidade impe-se

    facilmente (escravido voluntria), num controle impessoal (sociedade sem pai) tornava-se necessrio um Super-Id para equilbrio da aco do prprio Ego. A limitao de

    Eros reduz tempo livre e permite a disponibilidade para o trabalho, pelo que a prpria

    negao cultural do princpio de prazer que alimenta o pathos do trabalho. O mal-estar

    duplo, com duas represses a provocarem uma espcie de neurose de 2 grau.

    A utopia em Marcuse uma sociedade que deixa de ser produto da represso, para ser

    libertao do lbido e reactivao do ertico um reino de Eros (erotismo), com Orfeu (gozo e jogo) e Narciso (o corpo como resistncia mecanizao) que se subsitui ao

    activo Prometeu ligado ao progresso (tecnolgico). O homo-faber deve ser subsituido

    pelo homem ldico (da sbia preguia). No mais uma tecnologia ao servio da

    tecnologia, mas uma tecnologia em funo das necessidades humanas e ao servio de uma

    sociedade ldica, em que o trabalho seja substituido pela expanso da fantasia e do jogo.

    Recusa da tcnica pela tcnica ao encontro de uma estetizao da existncia em que a vida

    no se separa da arte e em que a barbrie se subsitui por uma dimenso esttica. Para l

    do reino da necessidade, a utopia a criao do reino da liberdade, dando resposta a

    necessidades vitais esttico-erticas.

    Depois de reivindicar a necessidade do reino ideal esttico-ertico, ao mesmo tempo que

    via dificuldades da sua concretizao por falta de actores (o proletariado desapareceu

    deixando um vazio), Marcuse explorou, em A Dimenso Esttica (1979), a possibilidade

    da arte como agente de desalienao e revoluo. Com marcaes de Adorno, e mantendo

    a articulao entre a psicanlise e o marxismo, rebate a ortodoxa viso do marxiamo dando

    ateno ao papel da arte como ruptura e aco no espao do social. A arte por isso, no

    espao das superestruturas, o elemento menos dependente das infraestruturas, e agente de

    revoluo no tecido social e poltico. No seu espao de autonomia e irredutibilidade, a arte

    o momento da superestrutura que pode efectuar (apelar e incitar conscincia de) a

    revoluo sem dependncia prvia de mudanas nessas infraestruturas. A arte pode ser

    sublimao, mas tambm dessublimao, uma fora dissidente que subverte experincias

    levando a situaes extremas e criando mundo. Como emergncia de outras sensibilidades

    e novos sentidos desafia o estado institucional e social dominante sendo promessa de

    felicidade. Para Marcuse a arte resistncia alienao e promessa de felicidade; ou seja,

    meio e destino da revoluo: como revoluo da existncia e como estetizao da

    existncia.

    Ideias defendidas em A Dimenso Esttica:

    Existe autonomia da arte (espao de diferena e ruptura) Arte transcede bases da estrutura econmica. Existe potencial poltico na obra de arte (na forma esttica) Forma e contedo no se opem.

  • 14

    Arte cria mundo no muda mundo, mas pode mudar conscincias. Arte fala do que existe contra o que existe (re-presenta e denuncia realidade; coisas parecem o que so e o que parecem ser): dialctica e contradio da arte: extrema

    afirmao e extrema negao.

    A Arte representa o objectivo derradeiro de todas as revolues: a liberdade e a felicidade do indivduo.

    Walter Benjamin e a reprodutibilidade tcnica

    Nas Teses da Histria, Benjamin sugere que o passado caucionado como um poder sobre a

    memria, a Histria poder do mundo, as marcas da Histria so paixo do mundo e

    a Histria ainda dolorosa e inacabada, como runas. A histria construo, no

    sendo nem curiosidade do passado nem mtodo que reflecte fielmente o passado, mas a

    urgncia do presente em dominar o passado. O facto histrico preconceito e despojo do

    vencedor, sendo a objectividade a manipulao do discurso dos vencedores, que ganham

    no s os bens materiais como os culturais e simblicos, pelo que no s participar nos

    factos histricos como os escrevem e re-escrevem. Por isso, a histria nunca deve estar

    feita, havendo que refaze-la, fazendo da histria um acto de redeno. A revoluo essa

    re-escrita efectuada por parte dos vencidos, que redime e redimido. A noo de Salto

    do Tigre insere a obra no seu tempo para alm do que ela julgara ser, surpreendendo-a

    no que foi no seu tempo, provocando assim um enriquecimento da actualidade que

    interpreta, como gesto sbito criador que releva, com inocncia e surpresa, o

    passado/tradio. O presente deve ver o passado para alm dele prprio, como expresso

    diferente daquilo que se quis exprimir no seu tempo (relacionando-se com as suas teses da

    alegoria). O objecto cultural histrico deve procurar um significado actual: O problema

    no apresentar as obras literrias em conexo com seu tempo, mas sim tornar evidente,

    no tempo que as viu nascer, o tempo que as conhece e julga, ou seja, o nosso. O Angelus

    Novus (quadro de Paul Klee) o anjo da histria, com o seu rosto virado para o passado,

    de onde v runas (No h nenhum documento de cultura que no seja tambm

    documento de barbrie), ao mesmo tempo que arrastado pela tempestade do progresso

    (atrs de si), que o impede de socorrer catstrofe, suspendendo-o num estado de horror e

    piedade perante a runa que provocou. O progresso um ideal iluminista assente num

    tempo homogneo e vazio, cujo xito est fora das obras e dos acontecimento: a

    desvalorizao do acontecimento e da revoluo; ou a desvalorizao do pontual em

    favor do linear. Contra o presente como passagem, mvel e contnuo, necessrio fazer

    do passado uma experincia nica, fazer saltar o contedo da histria e fazer explodir a

    continuidade histrica atravs de um presente que deixa de ser passagem e se apresenta

    imvel. O momento como messinico agora, condensa resumo da histria como sua

    promessa de redeno. [As Teses da Histria foram analisadas na aula e so um dos textos

    de apoio a acompanhar estas sinopses]

    Na Teoria da origem de Walter Benjamin, a histria apresenta-se como uma estrutura

    heterognea, feita de cortes e rupturas, em que o presente no mera passagem, mas

    deteno e experincia nica. Afirmando-se como um tempo-agora no-transitivo, o

    presente apresenta-se como tempo em ponto, sendo fundao e, ao mesmo tempo,

    originrio (origem) e revoluo (diferena). S este tempo pontual, que tanto

    labirinto como fenda, possibilita a realizao do passado como redeno. [Relao com

    a violncia divina (pura) de Benjamin (diferenciada da violncia mtica como

    fundadora de poder e que requere a violncia conservadora), que violncia destruidora

  • 15

    do direito e sem aviso, como sacrifcio e abertura, que abre para uma nova era histrica,

    sendo um verdadeiro momento de revoluo e redeno segundo o mito de Niobe apresentado em Prolegmenos a uma crtica da violncia]

    As Teorias da Alegoria de Benjamin ajudam a entender as suas posies sobre a tica, a

    esttica e a histria. Se o Smbolo de dimenso Plstica, sendo uma condensao

    imediata da ideia na forma adequada, a Alegoria Temporal, exprimindo sempre algo

    diferente daquilo que se pretendia exprimir com ela, escapando inteno com cifras de

    um passado esquecido. A alegoria desvaloriza a dimenso do concreto e do particular, de

    modo que os elementos valem uns pelos outros: Cada objecto pode representar um outro,

    pelo que nada fixo e tudo aluso, magia e atraco, sendo o sentido dado por enigma e

    possibilidade. Pronunciando um mundo indiferenciado como tesouro de sentidos, a

    alegoria permite a abertura radical possibilidade indiferenciada de sentido sem mergulhar

    no caos. Se o smbolo se apresenta como mediao universal, na pretenso de uma viso

    imediata da totalidade, na inteno de um antingimento directo da universalidade (ou da

    totalidade no particular) e procurando quebrar qualquer distncia ou equvoco entre o

    significante e o referente, a alegoria estabelece-se na afirmao da prpria distncia entre o

    Significante (o que est dito) e o Significado (o que se quer dizer), num jogo dominado por

    um movimento de aluso que procura o Plural (no aluso monista) e o Outro (no o

    todo). Evitando a relao directa entre o Particular e o Universal, a maneira de reportar-

    se ao todo consiste em aludir incessantemente ao outro, numa estratgia de alteridade e

    diversidade.

    Se o smbolo plstico e imediato (sem tempo), a alegoria histrica, sendo provisria e

    com o seu sentido no futuro. A alegoria no facto (consumado) de significao imediata

    e definitiva (de um s tempo), porque a sua temporalidade representa mais que um tempo,

    sendo a sua primeira significao apenas uma compreenso que se adianta, mas cuja

    iluminao est no porvir. O seu sentido depende de futuro, no no sentido evolucionista,

    recusando ser uma mera fase de uma progresso linear (que a comprometeria com o

    passado), mas na afirmao da sua dimenso provisria como elucidao vertical e

    destacada. A anacronia da alegoria est comprometida com o futuro e no com passado,

    no sendo resultado de causas que a antecedem, mas desse sentido do porvir que a

    legitimar e aclar. A sua abertura e polissemia coincidem na espera do significado, de

    modo que, comprometido e prometido no futuro, recusa estar comprometido com o

    passado.

    As teorias sobre o Ensaio do continuidade s que se formularam em torno da alegoria. No

    ensaio, como reflexo filosfica, a descrio (noo de Husserl) torna-se crtica.

    Numa liberdade reflexiva e anti-totalitria, o ensaio evita a sistematizao (que se fecha

    por si e que impe teorias ao objecto), tal como evita a relao s coisas como mera

    reduo a frmula, e como disponibilidade para a correco (e redeno), numa auto-

    reflexo infinita de abertura a uma reviso constante de si. Os temas so as obras, que se

    abrem reflexo infinita porque a obra-objecto repele a teoria e o sistema.

    Dando-se como fragmento, o ensaio no deve revelar-se perfeito e consumado na teoria,

    mas como variedade, mltiplo, fiel realidade e mvel como o esprito: o ensaio tem que

    conseguir que a totalidade brilhe por um momento num trao parcial escolhido ou

    alcanado, porm, sem afirmar que essa mesma totalidade est presente (Benjamin). A

    totalidade ilumina-se mas no se afirma: apenas claro e intermitncia. Recusando a

    explicao do todo, utiliza o especfico como relao, procurando a verdade de cada

    objecto nas suas fronteiras com o outro, no limite do objecto revelado atravs do que nele

    diferente. No o indiferenciado, mas o no-ser como base progresso, ou como hteron

  • 16

    (diferente) e fundamento de um progresso. A totalidade surge apenas como abertura e

    diferena em sugestivo anti-idealismo. A tcnica da montagem utiliza a justaposio de

    citaes: o material justaposto fala por si na renncia a toda interpretao explcita exterior

    (Benjamin sonha com o ensaio perfeito feito apenas de citaes): as citaes so como

    bandidos que saltam na estrada para roubar ao leitor as suas convices. Atravs da

    citao, Benjamin como que d razo razo para a desmascarar.

    A perda da aura na era da reprodutibilidade tcnica a crise da obra de arte tradicional

    como identidade nica e irrepetvel. A aura, como experincia pensada, ntima,

    demorada e longnqua, que ope presena expositiva, ao nico (como aqui e agora

    irredutvel) e tradio, sendo a reproduo uma destabilizao da tradio, est em

    crise com a reproduo tcnica. A perda da aura a perda do valor cultual (ritual) em

    relao ao valor expositivo. Mas o no reconhecimento da tradio do valor expositivo,

    tambm pode ser emancipao, e as artes que dissolvem o nico na multiplicidade de

    cpias sem original (fotografia; cinema) mudam percepes e permitem novas

    possibilidades de experincia, mesmo que sem conscincia.

    Bibliografia especfica de apoio:

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    TAFALA, Marta Tafala, Theodor W. Adorno. Una filosofa de la memoria, Barcelona: Herder Editorial, 2003.

    Albrecth Wellmer, Sobre la dialctica de modernidad y postmodernidad. La crtica de la razn despus de Adorno, Madrid: Visor, 1993 (1985, edio original).

    Os Situacionistas

    A Internacional Situacionista nasceu da juno de trs agrupamentos de artistas em

    dissidncia: o Comit Psicogeogrfico de Londres, a Internacional Letrista e o Movimento

    por uma Bauhaus Imaginista. Foi fundada em 1957 em Cosio dArroscia (aldeia da Ligria, Itlia) e dissolveu-se em Paris no ano de 1972. Nos seus membros destacam-se

    Guy Debord (francs), Gianfranco Sangunetti (italiano), Victor Martin, Raoul Vaneigem,

    Asger Jorn (pintor) ou Constant (arquitecto-urbanista). Os situacionistas criticam a

    Sociedade Industrial avanada e consideram o capitalismo um desastre estrutural de poder

  • 18

    mortfero. O Situacionismo prope uma crtica ao urbanismo, uma despintura e uma

    subverso do cinema. Nas suas orientaes destaque-se:

    A Situao (unidade de comportamento temporal) como dialctica das realidades parciais passageiras, na defesa do instante presente e vitalista: o tempo e o acontecimento existem

    tal como o mundo. a vida vivida: a situao para se vivida.

    Uma arquitectura e urbanismo unitrios, que rompa com a diviso, por um lado do trabalho e habitao e, por outro, da vida.

    O desvio como princpio: um princpio esquivo ao pr-determinado e ao prvio. Por isso, no h obra situacionista, mas sim utilizaes situacionistas. No construir obras, mas

    situaes.

    A deriva como valorizao de um presente irredutvel ordem. Em 1953, Ivan Chtcheglov iniciou derivas, que consistia em andar deriva pela cidade, explorando

    passagens bruscas atravs de ambientes variados: deste modo procurava-se a libertao de

    um urbanismo ordenador e constrangedor experincia e aco.

    Crise da expresso da Arte ou naufrgio da expresso: a arte como reduo a nada, como nadificao: a reduo a zero do artstico e uma beleza da dissoluo.

    A Sociedade do Espectculo de Guy Debord.

    Em A Sociedade do Espectculo, Guy Debord comea por problematizar a separao

    acabada: Tudo o que era vivido directamente tornou-se representao. Deste modo o

    vivido torna-se representao, sendo apenas imagem e, portanto, no vivido. A relao

    entre as pessoas passa a ser mediatizada por imagens. Toda a escolha feita na produo,

    visto que toda a linguagem do espectculo so signos de produo. Entre o Real e o

    Espectculo h uma alienao recproca: a realidade surge no espectculo e o espectculo

    real; o verdadeiro um momento do falso.

    O Espectculo negao da vida na afirmao da aparncia organizada (mesmo as

    diversidades e contrastes so aparncia). Quer chegar a si sendo sem fim, portanto, uma

    tautologia em que o meio fim. Tal leva a uma aceitao passiva, a um repouso na

    industria: espectaculista.A Economia submete os homens e desenvolve-se a si prpria.

    o domnio da economia sobre o social: SER=TER=PARECER o mundo real converte-se em simples imagem e as imagens tornam-se reais.

    O espectculo o contrrio de dilogo, porque uma actividade especializada que fala

    pelo conjunto, uma forma que escolhe o seu prprio contedo tcnico, um discurso de

    ordem presente sobre si que recai constantemente num monlogo elogioso: tal aparncia

    fetichista da pura objectividade esconde a relao entre classes. Ele unilateral, vive do

    desequilbrio, numa abundncia (objectos) da despossesso (inacessibilidade do

    trabalhador): : a separao o alfa e o omega do espectculo. A alienao do

    espectador em proveito do objecto contemplado: quanto mais ele contempla menos vive;

    quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens dominantes da necessidade, menos ele

    compreende a sua prpria existncia e o seu prprio desejo : O espectculo o capital a

    um tal grau de acumulao que se torna imagem.

    A mercadoria apresenta subtilezas metafsicas, uma dimenso supra sensvel (embora

    sensvel) que sustenta um principio de fetichismo da mercadoria no espectculo o mundo sensvel encontra-se substitudo por uma seleco de imagens que existem acima dele.

    A economia transforma o mundo, mas transforma-o somente em mundo da economia.

    Na 2 revoluo industrial o consumo alienado torna-se para as massas um dever

    suplementar produo alienada. todo o trabalho vendido. Na sociedade espectculo,

  • 19

    em que a mercadoria se contempla a si mesma num mundo que ela criou, passa-se a

    confundir bem com mercadoria (tese 44)

    O Espectculo ao mesmo tempo unido e dividido, uma unidade e diviso na aparncia:

    O espectculo, como a sociedade moderna est ao mesmo tempo unido e dividido. Como

    esta, ele edifica a sua unidade sobre o dilaceramento. A contradio, quando emerge no

    espectculo, por sua vez contradita por uma reinverso do seu sentido; de modo que a

    diviso mostrada unitria enquanto a unidade mostrada est dividida.

    Na unificao feliz pelo consumo, a diviso real est suspensa at prxima no-realizao

    no consumvel. Cada produto surge como atalho nico felicidade, como singularidade

    decisiva, mas vulgariza-se logo que entra em cena tarde demais revela a sua pobreza essencial. Deste modo, morre o objecto e continua o sistema (espectculo). O seu

    funcionamento o da impostura da satisfao: Cada nova mentira da publicidade

    tambm a confisso da sua mentira precedente; em cada derrocada revela-se a iluso da

    aprovao unnime: O que o espectculo apresenta como perptuo fundado sobre a

    mudana. A unidade que falta vida devolvida na imagem, escamoteando a

    fragmentao do vivido.

    Depois do tempo imvel inicial, do tempo cclico do Mito, e da Histria que cria o tempo

    irreversvel, nasce o tempo econmico que recusa outro, resultando numa histria

    reificada, uma nova imobilizao na recusa intra-histria dessa histria tempo irreversvel

    das mercadorias [medida das mercadorias como tempo mundial de que o espectculo

    imagem]. A histria luta para ser histria. Consagra-se o tempo espectacular que o tempo

    consumvel, de produo irreversvel e abstracto (permutvel): o tempo tudo e o

    homem nada: O tempo pseudo-cclico consumvel o tempo espectacular, ao mesmo

    tempo como tempo do consumo das imagens, no sentido restrito, e como imagem do

    consumo, em toda a sua extenso. A realidade do tempo feita publicidade do tempo

    pseudo-cclico porque sem acordo com trabalho real, mas por vivncia ilusria; o

    espectculo abandona a histria sendo falsa conscincia do tempo.

    A produo capitalista o unificou espao, modificado e reconstrudo constantemente para

    se tornar igual a si prprio. o urbanismo da separao, que salvaguarda poder classe e

    mantm a ordem na rua a supresso da rua, o isolamento e controle da distncia que reintegra indivduo segundo as necessidade de consumo. A auto-estrada disperso da

    cidade; o supermercado efeito centrfugo em fuga processos de autodestruio do meio urbano (cidade): o fim da histria local s histria econmica. A vitria da cidade sobre o campo consagra-se anulando cidade e campo. Nas novas cidades no acontece nada. as

    foras da ausncia histrica comeam a compor a sua prpria e exclusiva paisagem. Se a

    histria ameaa e fora que submete o espao ao tempo vivido ento necessrio

    devolver o reconhecimento de si prprio no e ao territrio.

    A cultura a nova vedeta do consumo, ento: A negao real da cultura a nica a

    conservar-lhe o sentido. Ela j no pode ser cultural.

    Valor de troca Valor de uso

    (autnomo)

    dirige o uso

    (identificou-se a todo o uso)

    Baixa valor de uso

    Aprisionado na riqueza ilusria

    da sobrevivncia aumentada

    Consumo de iluses

    (espectculo)

  • 20

    Bibliografia especfica de apoio:

    Internacional Situacisonista. Antologia (organizao, traduo, notas e prefcio de Jlio Henriques, a partir da edio de Van Gennep, Amesterdo, 1970), Lisboa: Antgona, 1997.

    Guy Debord, A Sociedade do Espectculo, Lisboa: Edies Afrodite, 1972 (1967, edio original).

    Guy Debord, Comentrio sobre a Sociedade do Espectculo; Prefcio quarta edio italiana de A Sociedade do Espectculo, Lisboa: Edies Mobilis in Mobile, 1995.

    Raoul Vaneigen, A Economia Parasitria, Lisboa: Lisboa: Edies Antgona, 1999.

    Baudrillard e a A Sociedade de Consumo

    Em A Sociedade de Consumo, Baudrillard separa o valor de uso do objecto, perante o qual

    todos os homens so iguais, e o valor simblico, que rege diferenas inter-sociais. Se a

    primeira se esgota no consumo (levando este ao colapso), a segunda alimentada pelo

    consumo (e apela ao consumo). A cultura industrial est claramente dominada pelo valor

    simblico. A cultura do excesso de produo necessita do consumo: o mais difcil j no

    produzir, mas fazer consumir a produo. O tempo de vida do objecto, da produo

    (nascimento) destruio (morte) precisa de ser acelarada: o consumo contemporneo

    (morte simblica anunciada do objecto) reduz cada vez mais o tempo de vida do objecto tempo que mais do que um ciclo, um mecanismo funcional dessa produo excessiva. Se

    nas culturas pr-industriais os objectos sobreviviam aos homens, agora o homem que

    assiste ao processo de vida (cada vez mais curto) dos objectos.

    A revoluo do bem estar actua como felicidade abstracta, que supe a democracia para

    impulsionar o consumo regido pela diferenciao social. A abundncia no a

    distribuio, como direito universal felicidade, mas o excesso do que se pode ter, como

    direito individual ao consumo. O consumo torna-se essa linguagem de diferenciao social

    (como tambm de manipulao e controlo): o que se consome so significados [sobre as

    relaes entre o consumo e as diferenas sociais, e como estas apelam ao consumo das

    classes em transio, ver Para uma crtica da economia poltica do Signo]. aqui que

    actua a moda, que regula a novidade e a entropia dos signos, determinando a brevidade do

    tempo de vida do objecto [sobre a moda, ver tambm A Troca simblica e a morte]. A

    publicidade o primeiro objecto de consumo: nem verdadeiro nem falso, faz da verdade

    uma mera adeso. Tudo se decide na produo do desejo: a seduo. A sociedade de

    consumo no produz mitos: ela prpria mito! Fecha-se ao abrigo dos signos, na recusa do

    real.

    A teoria do simulacro (desenvolvida sobretudo em Simulacros e Simulao e em O Crime

    Perfeito) desenvolveu-se na sequncia da crtica perda do valor de uso, como perda do

    referente e da realidade. O simulacro anula a representao como relao a uma origem

    que o preceda: o real como referente. J no h real, mas o hiper-real, mais real que o real.

    Sem origem (real referencial) para se provar como verdade, aceitando vrias verdades

    simultaneamente, portanto nem verdadeiro nem falso, o simulacro permite a troca

    (permuta) generalizada dos sentidos, uma encenao dos signos por detrs dos quais se

    torna impossvel (re-)encontrar o real: levando saturao de signos, que no se negam

    entre si, numa transparncia total (sem confronto com a opacidade do real), anulando

    qualquer contradio (sem anti-tese) e portanto qualquer dialtica, o simulacro o curto-

    circuito da realidade e a imploso da verdade. [foi dada ateno alegoria da

    simulao de Baudrillard atravs do conto sobre o mapa de Borges; foram apresentados

  • 21

    exemplos de Baudrillard, sobretudo das cidades americanas como simulacros de cidade

    (embora meros cenrios de cidade sem densidade arquitectnica e urbana) e da

    Disneylndia (que dissimula a cidade americana como simulao de cidade); exemplo da

    famlia Loud (1971), como aniquilao do real e da reduo da mensagem ao medium

    (relaes com MacLuhan) o real como acontecimento reduzido a mero efeito] A entropia metafsica (da ps-modernidade) coloca todo o valor sob o signo da entropia,

    anulando a diferena pela indiferena generalizada, pela reversibilidade e metamorfose de

    todo o valor. Se Nietzsche falava de transmutao de todos os valores, Baudrillard fala

    de uma permuta generalizada de todos os valores. Neste universo indiferenciado, da

    troca e reabilitao de todos os valores, sem diferena nem ruptura, est-se perante a crise

    dos valores universais, permitindo-se a afirmao de uma situao mundial, operacional e

    sem valores, assente na simples circulao de permutas e no esbatimento das diferenas. A

    esttica perdeu categorias mergulhando num hiper-sincretismo. O simulacro levou ao fim

    da iluso esttica: o verdadeiro diluiu-se no mais verdadeiro que o verdadeiro, no

    demasiado verdadeiro para ser verdadeiro (). O falso desaparece no demasiado falso para ser falso (Baudrillard, O Paroxista Indiferente). O mistrio da arte no est por isso

    no seu desaparecimento, mas na sua sobrevivncia: A Arte no morre por ter deixado de

    existir, morre porque existe em demasia (Baudrillard, in Le Monde, 1996).

    Em A Iluso do Fim ou a Greve dos Acontecimentos (1992), Baudrillard constata o

    desaparecimento da Histria, sem velocidade de libertao nem emancipao, e dominada

    por uma noo de acontecimento que j no produz informao, sendo virtual e viral,

    sem corpo nem aura.

    O excesso de histria anula a aco histrica, tornando tudo histria e diluindo o exemplo.

    O instante anula a continuidade: j no existe tempo para a histria em si mesma. O desenvolvimento um conceito falhado, feroz e arrogante na imposio do seu

    modelo.

    A musealizao do acontecimento o branqueamento da histria, sua racionalizao e rectificao: J no fazemos histria, reconcilimo-nos com ela e protegemo-la como

    se fosse uma obra-prima em perigo.

    Depois do tempo cclico e do tempo linear que deixou rastos, runas e lixeiras, chegou o tempo reciclvel, de reviso, apagamento e arrependimento (branqueamento).

    A Histria um luxo do ocidente (e a sua histria) em oposio s culturas sem histria mas com destino.

    A Iluso do Fim tambm o fim da iluso, um para alm do fim e da utopia: sem

    encontramos qualquer fim realizado, tambem j o ultrapassmos: estamos perante a

    nostalgia e o vazio de finalidades e de perspectivas - estamos na desiluso total

    (Baudrillard, Au-del de la fin, entrevista in Les Humains Associs).

    Baudrillard tente encontrar um modo de pensar crtico que possa sobreviver ao poder

    aglutinador e anulador da cultura contempornea. A Histria deve ser substituda pelo

    destino, que no permutvel nem se branqueia, mas antes se afirma como singular,

    irrompendo como anomalia. O acontecimento deve ser fatal e sem causas (que so

    alibis). O pensamento deve ser criminoso, contra o crime perfeito, numa negatividade

    radical que deve substituir a positividade racional, e paroxstico, colocando-se no limiar

    do seu fim, num limite onde nada mais haver para dizer. Em O Paroxista Indiferente,

    Baudrillard defende um niilismo como sentimento profundo, ou pensamento do nada,

    na recusa radical da troca: o nada no pode permutar-se com coisa nenhuma, pelo que

    deixa algo sobrevivente (resduo) hipertrofia de signos e sua troca indiferenciada. A

  • 22

    aco do pensamento deve surgir como lapso, paradoxo e enigma. Indiferente ao

    poder de seduo da cultura dos simulacros, o pensamento do nada o niilismo possvel

    na cultura contempornea. [sobre posicionamento e atitude do pensamento de Baudrillard

    foram trabalhados com especial ateno os textos finais dos livros Simulacros e Simulao

    (Sobre o niilismo) e O Crime Perfeito (A desforra dos povos dos espelhos)].

    Bibliografia especfica de apoio:

    Internacional Situacisonista. Antologia (organizao, traduo, notas e prefcio de Jlio Henriques, a partir da edio de Van Gennep, Amesterdo, 1970), Lisboa: Antgona, 1997.

    Jean Baudrilard; Jean Nouvel, Los objetos singulares. Arquitectura y filosofia, Buenos Aires: Fondo de Cultura Econmica, 2001 (Calmann-Lvy, 2000).

    Jean Baudrillard, A Sociedade de Consumo, Lisboa: Edies 70, 1991 (1970, edio original).

    Jean Baudrillard, Para uma crtica da economia poltica do Signo, Lisboa: Edies 70, 1981 (1972, edio original).

    Jean Baudrillard, A Troca simblica e a morte I, Lisboa: Edies 70, 1996 (1976, edio original).

    Jean Baudrillard, A Troca simblica e a morte II, Lisboa: Edies 70, 1997 (1976, edio original).

    Jean Baudrillard, Amrique, Paris: ditions Grasset et Fasquelle, 1986.

    Jean Baudrillard, Simulacros e Simulao, Lisboa: Relgio dgua, 1991 (1971, edio original).

    Jean Baudrillard, As Estratgias Fatais, Lisboa: Editorial Estampa, 1991 (1983, edio original)

    Jean Baudrillard; A Iluso do fim ou a greve dos acontecimentos, Lisboa: Terramar, 1995 (1992, edio original)

    Jean Baudrillard; O Crime Perfeito (Traduo e prefcio de Silvina Rodrigues Lopes), Lisboa: Relgio dgua Editores, 1996 (1995, edio original)

    Jean Baudrillard, O Paroxista Indiferente. Conversas com Philippe Petit, Lisboa: Edies 70, 1998 (1997, edio original).

    Jean Baudrillard, Palavras de Ordem, Porto: Campo das Letras, 2001 (2000, edio original).

    Jean Baudrillard, De la seduccin, Madrid: Ediciones Ctedra, 2005 (10 edio; 1 edio: 1981).

    Jean Baudrillard, Le Complot de lArt. Illusion et dsillusion esthtiques, Paris: Sens&Tonka, 2005 (1 edio: 1997).

    Jean Baudrillard, propos dUtopie. Entretiens avec Jean-Louis Violeau, Paris: Sens&Tonka, 2005 (prcd de Larchitecture dans la critique radicale, par Jean-Louis Violeau).

    Pierre Bourdieu; O Poder Simblico, Algs: Difel, 2001 (4 edio).

    Guy Debord, A Sociedade do Espectculo, Lisboa: Edies Afrodite, 1972 (1967, edio original).

    Christopher Horrocks, Baudrillard y el Milenio, Barcelona: Editorial Gedisa, 2004 (Cambridg: Icon Books, 2000).

    Henri-Pierre Jeudy, A Sociedade Transbordante (Prefcio de Adriano Duarte Rodrigues), Lisboa: Edies Sculo XXI, 1995.

    Ludovi Leonelli; La Sduction Baudrillard, Paris : dole Suprieure des Beaux-Arts, 2007.

    Neil Leach, La an-esttica de la arquitectua, Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2001 (1999, edio original)

    Carlos Machado, Entre a Utopia e o Apocalipse. Augusto Abelaira e o fim da Histria, Coimbra: Angelus Novus, 2003.

    Peter Sloterdjik, Ensaio sobre a intoxicao voluntria. Um dilogo com Carlos Oliveira, Lisboa: Fenda Edies, 1999. Paul Virilio, Esthtique de la disparition, Paris: Galile, 1989.

    Gilles Lipovetsky e os tempos hipermodernos

    Em A Era do Vazio, Lipovetsky fala de uma situao contempornea centrada num novo

    individualismo, ou uma nova revoluo do individualismo, agora hedonista e

    descomprometida: O nosso tempo s logrou evacuar a escatologia revolucionria levando

    a cabo uma revoluo permanente do quotidiano e do prprio indivduo: privatizao

    alargada, eroso das identidades sociais, desafectao ideolgica e poltica, destabilizao

  • 23

    acelerada das personalidades, eis-nos vivendo uma segunda revoluo individualista; O

    processo de personalizao procede de uma perspectiva comparativa e histrica, designa a

    linha directriz, o sentido do que novo, o tipo de organizao e de controlo social que nos

    arranca ordem disciplinar-revolvucionria-convencional que predominou at aos anos

    cinquenta. Ruptura com a fase inaugural das sociedades modernas, democrticas-

    disciplinares, universalistas-rigoristas, ideolgicas-coerrcivas, tal o sentido do processo

    de personalizao, (); assim que opera o processo de personalizao, novo modo de a sociedade se organizar e se orientar, novo modo de gerir os comportamentos, j no

    atravs da tirania dos pormenores, mas com o mnimo possvel de coaco e o mximo

    possvel de opes, como o mnimo de austeridade e o mximo de desejo, com o mnimo

    de constrangimento e o mximo de compreenso.

    E sintetiza as novas orientaes de uma situao neo-moderna: Os grandes eixos

    modernos, a revoluo, as disciplinas, o laicismo, a vanguarda, foram desafectados fora

    de personalizao hedonista; o optimismo tecnolgico e cientfico desmoronou-se,

    enquanto as inmeras descobertas eram acompanhadas pelo envelhecimento dos blocos,

    pela degradao do meio ambiente, pelo apagamento progressivo dos indivduos; j

    nenhuma ideologia poltica capaz de inflamar as multides, a sociedade ps-moderna j

    no tem dolos nem tabus, j no possui qualquer imagem gloriosa de si prpria ou

    projecto histrico mobilizador; doravante o vazio que nos governa, um vazio sem trgico

    nem apocalipse; portanto, fim da modernidade dura e pica, progressista e revolucionria:

    () estratgias [ps-modernas] que trabalham no sentido de destruir os efeitos do modernismo monoltico, do gigantismo, do centralismo, das ideologias duras, da

    vanguarda; A poca moderna foi assombrada pela produo e pela revoluo; a poca

    ps-moderna, pela informao e pela expresso; Toda a vida das sociedades

    contemporneas doravante governada por uma nova estratgia que destrona o primado

    das relaes de produo em proveito de uma apoteose das relaes de seduo;

    Enquanto o modernismo era exclusivo, o ps-modernismo inclusivo. Enquanto o

    movimento moderno assentava nos mitos de Prometeu, Fausto ou Ssifo, a

    contemporaneidade (ps-moderno) prefere Narciso e Eros.

    A mesma ordem de ideias desenvolve-se na obra que chamar O Imprio do Efmero, onde

    o individualismo hedonista se articula com a efemeridade e contingncia generalizada: A

    produo industrial prossegue o seu trabalho democrtico de igualizao de condies na

    esfera dos objectos: em vez de um sistema feito de elementos heterogneos, desenrola-se

    num sistema gradativo constitudo por desvios e pequenos cambiantes. O fenmeno da

    moda, surgido em finais da idade mdia (meados do sc.XV), reformulou-se num

    dispositivo social de temporalidade e transformao, como tambm antropocntrico, em

    que o homem reconhece o poder de organizar a sua organizao social: Poder social dos

    sinais ntimos da moda a aristocracia. No vontade de mudana mas de emancipao do passado, de uma certa tradio. Nasce portanto de um desejo de diferenciao.

    Descontinuidade nos costumes e tradies, portanto nas formas de sociabilizao. Finais da

    idade mdia: dignidade do singular/indivduo; aparece auto-biografia e o retrato e auto-

    retrato. O efmero (variao, temporalizao) e a Fantasia (esttica) sustentam esse

    movimento de uma artificialidade teatral e ldica. No sculo XX, a estticada moda liga-se

    ao conforto.

    Na fase actual, a da moda total (anos 60), domina a circulao continua de coisas e

    sentidos. Lipovetsky tenta compensar, embora aceitando teorias, mas no posicionamentos

    negativos, dos pensadores crticos anteriores (Marcuse, Adorno, Baudrillard, situacionistas,

    Lefevbre.), cujo esprito crtico estaria ainda vinculado a uma perspectiva moderna e

  • 24

    revolucionria. Para Lipovetsky, a Moda no leva nem ao melhor nem ao pior dos

    mundos.

    Em Os Tempos Hipermodernos, Lipovetsky considera a ps-modernidade uma fase de

    transio para a Hiper-modernidade. Esta seria uma modernidade superlativa, sem vias

    alternativas, global e desregulada. Nela o hedonismo ps-moderno recuava perante o vazio

    ideolgico e sua ansiedade. A confiana (no futuro e no progresso) retrai-se exigindo um

    estado de vigilncia e preveno que no aceita a despreocupao ps-moderna. O

    mergulho no presente do ps-modernismo, passa a um presente que se abre preocupado ao

    passado e ao futuro.

    Bibliografia especfica de apoio:

    Gilles Lipovetsky, A Era do Vazio. Ensaio sobre o individualismo contemporneo, Lisboa. Relgio dgua Editores, 1989.

    Gilles Lipovetsky, O Imprio do Efmero. A moda e o seu destino nas sociedades modernas, Lisboa. Relgio dgua Editores, 1990.

    Gilles Lipovetsky, O Crepsculo do Dever. A tica indolor dos novos tempos democrticos, Lisboa. Relgio dgua Editores, 1992.

    Gilles Lipovetsky, A Felicidade Paradoxal. Ensaio sobre a sociedade do hiperconsumo, Lisboa: Edies 70, 2010.

    Gilles Lipovetsky, Les Temps Hypermodernes, Paris: ditions Grasset & Fasquelle, 1994 (Lindividualisme paradoxal. Introduction la pense de Gilles Lipovetsky par Sbastien Charles; Jalons dun Itinraire Intellectuel. Entretien avec Gilles Lipovetsky, porpos recuilles par Sbastien Charles)..[Edio portuguesa: Os Tempos Hipermodernos, Lisboa: Edies 70, 2011]

    Gilles Lipovetsky, Jean Serroy; O Ecr Global, Lisboa: Edies 70, 2010.

    Paul Virilio: a poluio da velocidade.

    Na sua ingenuidade de progresso, o sculo XIX assumiu a velocidade de deslocao e

    descobriu o acidente local e histrico (o naufrgio ou o descarrilamento). Com as novas

    tecnologias, o sculo XX descobre o acidente geral, sem referncia e sem

    responsabilidades, apenas integral e instantneo. Para Virilio, o tempo local e histrico

    tornara-se mundial, nico, instantneo e imediato.

    A cidade (polis) era o lugar do teatro, da gora do forum ou do trio, marcas do urbano e

    forma da cidade, no seio da qual o trajecto e a histria se instalava como deslocao e

    extenso. Espao de contacto (de encontro) e de organizao, a cidade constituiu o espao

    pblico por excelncia, assente na proximidade com o outro e na conscincia de um ns

    identitrio e unitrio. A cidade era o palco do poltico (da represso ou da revoluo), do

    trajecto e da narrao A cidade apresentava uma conscincia da profundidade do seu aqui,

    como vivncia territorial, de instalao e integrao do corpo individual e social: no h

    corpo prprio sem situao (Virilio). A net-cidade (cyber-citt) urbanizou o tempo

    real, numa forma sem lugar, sem conscincia de extenso e com perda de territrio,

    sustentando-se num agora sem profundidade histrica nem dimenso geogrfica, e que est

    (sem se situar) num algures sem persistncia de lugar. a perda do corpo prprio e do

    mundo prprio, de uma comunicao sem encontro com o outro, porque de um outro sem

    corpo e longnquo (sem presena fenomenolgica). Sem trajecto nem narrao, a net-

    cidade impede a discusso pblica e a revoluo no seu seio. A polis desaparece, sem local

    nem poltica, substituda pela cidade global e instantnea onde o cidado se dissemina e

    se perde a memria do lugar. A cidade j no metrpole nem cidade industrial, j no

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    tem passeio pblico nem encontro pblico, para se neutralizar tornando-se mera zona de

    passagem instantnea, at perda da sua dimenso, localizao e fronteiras no espao, para

    se tornar uma cidade virtual, uma mega-cidade (e meta-cidade) que est em todo o lado e

    em lado nenhum - porque sem limites (fronteiras: paredes, muros, muralhas) j no pode

    haver cidade. Poder-se-ia falar de uma crise do conceito heideggeriano de dasein, como

    palco da meditao e compreenso do ser.

    Se o sculo XIX descobria a velocidade de deslocao como economia, procurando a

    reduo de tempo de ligao entre dois pontos, pela travessia fsica veloz no espao

    geogrfico, as novas tecnologias de finais do sculo XX criam a velocidade como instante,

    sem deslocao nem geografia. A rapidez de deslocao como smbolo de progresso,

    substituda pelo instante da luz da transmisso imediata.

    O intervalo de tempo da histria e o intervalo de espao da geografia sustentavam o

    trajecto e a viagem, uma deslocao a descobrir e que experincia fsica e psicolgica

    vivida entre uma partida e uma chegada. O intervalo de luz polui a distncia, numa

    chegada generalizada sem paisagens nem acontecimentos: viajar j nada ensina, porque

    j no passa por lado nenhum. No j generalizado no h partida nem trajecto, mas

    apenas chegada generalizada sem tempo de narrao nem de liberdade: onde falecem os

    mapas (a geografia) e as memrias (a histria).

    Na relao com a polis e a domus, o corpo era referncia, espao em que me situo em

    vivncia fenomenolgica. Solos e limites estabelecem fronteiras e posies do corpo,

    sendo a possibilidade e afirmao de um corpo prprio. As novas tecnologias evitam

    deslocar, criando a casa automtica e o invlido equipado que j no precisa de se

    deslocar porque tem tudo ao alcance dos dedos atravs do zapping vivencial: o presente

    vivo inventa o homem sentado, homem deitado, estado vegetativo, como

    habitvel, ou invlido motor, que est na posio zero, sem lugar e em toda a parte.

    O invlido motor o heri do fim da arquitectura, do urbano e da poltica; como

    tambm da ergonomia e do corpo fenomenolgico e vivido. O corpo prprio desaparece

    com o fim das escalas do mundo: Mas o corpo prprio s tem existncia num mundo

    prprio. No h corpo prprio em si (Cibermundo: a poltica do pior). O espao j no se estende, o momento de inrcia sucede deslocao contnua (A Inrcia Polar).

    A cronologia, com as suas trs dimenses (passado, presente e futuro), que volume e

    profundidade de sentido, substituda pela presentificao, que o fim dessa cronologia,

    absorvida num tempo mundial nico que aniquila a multiplicidade dos tempos locais em

    prejuzo da geografia e da histria: o j-instantneo-generalizado. Nesta tirania do

    tempo real a histria perde profundidade, tornando-se histria sem histria, ou seja,

    hiperconcentrando-se no ponto monolgico do instante. O tempo extensivo da Histria,

    que passa e sucede, dominado pelo tempo intensivo do instante, auto-referenciado num

    aqui e agora de um tempo que se expe na instantaneidade sem histria, sem espera nem

    reflexo. O tempo de sucesso, do escoar implacvel de cronos, substitui-se pelo tempo de

    exposio, em superfcie e repentino, de um presente dilatado sem substncia nem relevo e

    que s luz. A profundidade do trajecto, com partida, deslocao (viagem) e chegada, que

    vai de um (aqui) a outro (ali) lugar, que tem narrativa e implica conhecimento,

    devorada pela hiperconcentrao do tempo, que reduz a nada todos os trajectos: s resta

    o estar-l. O aqui e agora da presena, como deslocao (que localizao no trajecto)

    de um corpo vivo, substitudo pelo lugar nenhum da intermitncia do corpo virtual. a

    perda do sujeito e do objecto, a atrofia do trajecto e a desagregao das condies da

    experincia sensvel. A dromos (corrida) da modernidade culmina na dromologia

    (poluio da velocidade) da ps-modernidade.

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    [Diaporama sobre a cidade como trajecto urbano e como poltica, e as suas contradies

    ampliadas com o advento da velocidade; relaes entre trajecto, memria e narrao na

    cultura pictrica dos aborgenes australianos; relao do pensamento de Virilio com obras

    da exposio de Nam June Paik: A Auto-Estrada Electrnica (Lisboa: Culturgest, 1996)].

    Bibliografia especfica de apoio:

    Fernando Dias; A dromologia de Paul Virilio e a arquitectura contempornea: reflexes sobre a crise da polis e da domus, in Arte Teoria, Lisboa: Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, n7,

    2005, pp.234-248.

    Edward T. Hall, A Dimenso Oculta, Lisboa: Relgio dgua Editores, 1986.

    Peter Sloterdjik, Ensaio sobre a intoxicao voluntria. Um dilogo com Carlos Oliveira, Lisboa: Fenda Edies, 1999.

    Santiago Rial Ungaro, Paul Virilio y los lmites de la velocidade, Madrid: Campo de Ideias, 2003.

    Paul Virilio, Esthtique de la disparition, Paris: Galile, 1989.

    Paul Virilio, El ltimo vehculo, in Videoculturas de Fin de Siglo, Madrid: Ediciones Ctedra, 1989, pp.37-45.

    Paul Virilio, A Inrcia Polar, Lisboa: Publicaes Dom Quixote, 1993 (1990, edio original).

    Paul Virilio, Linscurit du territoire, Paris: ditions Galile, 1993.

    Paul Virilio, O Espao Crtico e as perspectivas do tempo real, So Paulo: Editora 34, 1993.

    Paul Virilio, A Velocidade de Libertao, Lisboa: Relgio dgua Editores, 2000 (1995, edio original).

    Paul Virilio, Cibermundo: A Poltica do Pior (Conversa dirigida por Philippe Petit), Lisboa: Teorema, 2000.

    Paul Virilio, Voyage dHiver Entretiens (Conversa com Marianne Brausch), Marseille : ditions Paranthses, 1997.

    Merleau-Ponty: o corpo e o esprito: uma filosofia do sensvel

    [apoio ao entendimento de Paul Virilio]

    Radicalizando o pensamento fenomenolgico de Husserl, Merleau-Ponty considera a

    percepo como conhecimento primordial. Posicionando-se nos antpodas do

    racionalismo, assume a percepo como modalidade original da conscincia, atravs da

    qual se funda a ligao do sujeito ao mundo: imediata (primordial) e estruturada (com

    sentido pr-conceitual). Critica a cincia considerando que esta manipula as coisas, mas

    recusa-se a habit-las, obtendo apenas modelos prprios e no se confrontando com a

    actualidade do mundo. Para Ponty, o saber no um patrimnio estvel mas uma

    actividade de pesquisa estranha a qualquer dogmatismo: a verdade provisria e

    momentnea. Ponty recusa a cincia, considerando que esta seca a explicao do mundo,

    defendendo antes o encontro com os fenmenos em estado emergente: o sentido no

    prvio ao vivido, antes d-se com a experincia, d-se com o espanto e a estranheza. O

    mundo dos fenmenos no a explicao de um ser prvio, mas a sua fundao. O

    pensador no um sujeito transcendental, mas um sujeito mergulhado no-mundo, na

    textura do mundo que habita na experincia primordial. Para Ponty tudo se d num acto original onde se do as coisas, o corpo e a conscincia:

    toda a a conscincia conscincia perceptiva. No se pode separar o sujeito pensante do

    eu corporal, porque o corpo no uma massa material inerte ou instrumento exterior, mas

    antes o invlucro vivo das actividades do sujeito, modo deste habitar o mundo. O esprito

    no utiliza o corpo porque faz-se atravs dele: O esprito passa no corpo tal como,

    inversamente, o corpo passa no esptito. O meu corpo o meu ponto de vista sobre o

    mundo e um dos objectos desse mundo, de modo que, estar-no-mundo estar preso ao tecido do mundo, num mundo contguo ao corpo. Eu sinto (estou) no instante do meu

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    corpo, e s o posso tocar tocando com ele. O corpo habita sempre o espao em que toma

    posio ( o corpo que espacializa): o que interessa a experincia imediata do espao,

    como vivido, e no o espao geomtrico. O corpo v e v-se, vidente e visvel, porque a

    viso faz-se como corpo no meio das coisas: vejo o mundo pelo interior vivido, porque

    nele sou. O corpo funda o compromisso e o projecto no mundo. No existe a dicotomia

    entre o em-si e o para-si, mas a totalidade de um comportamento. A conscincia no

    um eu-sou irredutvel (porque pensa, portanto cartesiano), mas um eu-posso, um centro de

    organizao e tenso para o mundo que se dissolve no corpo: sou o meu corpo: O corpo

    prprio est no mundo assim como o corao est no organismo; ele mantm o espectculo

    visvel continuamente em vida, anima-o e alimenta-o interiormente, forma com ele um

    sistema (A Fenomenologia da Percepo, p.273). O importante o sujeito comprometido

    no mundo, sem o qual o corpo agente e vivo desmorona-se e torna-se objecto, e sem a qual

    se perde a correlao ntima das coisas com o corpo.

    No h verdade do objecto em si, como seu significado absoluto, porque a coisa e o

    mundo apenas existem vividos por mim e por sujeitos como eu, porque so o

    encadeamento das nossas perspectivas, mas transcedem todas as perspectivas porque esse

    encadeamento temporal e irrealizado; O mundo uma unidade aberta e indefinida

    onde eu estou situado (A Fenomenologia da Percepo). O acto perceptivo implica uma coexistncia entre sujeito e objecto, pelo que no h a conscincia e a realidade,

    como plos opostos de uma relao, mas a imediata conscincia da realidade fundada

    numa ntima correlao s um acto abstracto e no vivido as poder ulteriormente separar.

    [ver importncia da psicologia da Gestalt no pensamento de Ponty atravs dos exemplos

    do membro fantasma, da bengala do cego e das experincias de Stratton de inclinao

    e inverso do olhar].

    Segundo Ponty, na linguagem, o corpo expresso originria e o gesto antecipa-