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Tratamento de esgoto independente em comunidade isolada: desempenho sustentável de ETE com unidade ClearTec® em condomínio da Região Metropolitana de São Paulo, Brasil Independent wastewater treatment at an isolated community: sustainable performance of a WWTP with a ClearTec® unit at a condominium in the Greater São Paulo Region, Brazil André Luiz de Lima Reda Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil Escola de Engenharia Mauá, IMT, São Caetano do Sul, SP [email protected] Adilton Douglas Schiavon Felix Catuí Engenharia Ltda. São Paulo, SP, Brasil [email protected] Lara Lessa Feijó Catuí Engenharia Ltda. São Paulo, SP, Brasil [email protected] Hannah Caroline Proença Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil [email protected] Abstract Basic sanitation encompasses wastewater collection, treatment and disposal. Isolated Brazilian communities have taken direct responsibility for sanitation, for either technical, institutional or financial government limitations – or by free option. The Tamboré wastewater treatment plant, serving an isolated community in the Greater São Paulo, is studied to allow for performance comparison between two different “biological treatment” processes: first, a UASB reactor (performing digestion by “Upflow Anaerobic Sludge Blanket”) followed by an activated sludge unit; second, an alternative system with an activated sludge tank complemented by German technology ClearTec® (here, for the first time in Brazil), which inserts in it a porous treatment medium. As a conclusion, the ClearTec® process resulted at least as efficient as UASB for organic matter removal – each one relying on an associated activated sludge unit. Because it is inside the sludge tank and, also, fastens treatment by accelerating sludge growth, ClearTec® saves space, reducing plant area. Keywords — Innovation by ClearTec®, activated sludge, wastewater treatment, private WWTP, isolated treatment plant I. INTRODUÇÃO O nível e o processo de tratamento ideais numa Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) dependem de vazão e qualidade do esgoto afluente. Dependem também do arcabouço legal que rege o controle de qualidade no corpo hídrico receptor [6] [9]. Tratamento é uma combinação de processos interligados que aplicam processos diferentes dentre os seguintes: a) operações unitárias físicas (tais como gradeamento, mistura, floculação, sedimentação, flotação, filtração e transferência de gases); b) processos unitários químicos (ex.: precipitação química, absorção por sedimentação e desinfecção química); c) processos unitários biológicos (ex.: reações bioquímicas para remover substâncias biodegradáveis e nutrientes). As fases sequenciais do tratamento são: a) preliminar: remoção de matéria que possa vir a causar problemas ou interrupção nos processos que se seguem (ex.: detritos sólidos que podem ser retidos em grades; óleos e graxas, removidos por flotação); b) primário: remoção parcial de sólidos por simples sedimentação ou peneiramento; c) remoção de DBO por combinação de processos biológicos (ex.: lodos ativados, reator de membrana ou filtro fixo, lagoa de estabilização) que levam à sedimentação do produto formado na forma de partículas suspensas, seguido de desinfecção; d) processos especiais para remover nutrientes, requeridos em casos específicos [9]; processos específicos, por exemplo: descontaminação de água sujeita a matéria tóxica; tratamento para reuso; gestão de esgoto com vazão e qualidade altamente variáveis por intrusão de água pluvial [6]. No caso estudado, as operações envolvidas são tratamento por lodos ativados, comum nas ETE do Brasil, e filtros biológicos. Considerando que cerca de 30 milhões de brasileiros ainda não são abastecidos por água tratada [8], só 48,1% contam com rede coletora de esgoto e nem 40% de tudo o que é coletado recebe tratamento, o País padece de excessiva poluição dos corpos hídricos e doenças infantis que o posicionam, quanto à saúde e o índice de desenvolvimento humano, IDH, bem aquém da maioria das nações europeias, norte americanas e algumas sul americanas. Este quadro causa prejuízos à saúde e a qualidade da vida humana, reduz o número de mananciais de qualidade, encarece o abastecimento de água e traz impactos negativos à agricultura, comércio, indústria e turismo, entre outros. O atraso nacional no saneamento também causa a carência de profissionais em postos de produção, tanto pela dificuldade de o jovem comparecer ao local de aprendizado (e preparar-se para produzir), quanto pela ausência do empregado ao trabalho por moléstia própria ou na família [4]. © 2017 SHEWC XVII Safety, Health and Environment World Congress 50 July 09-12, 2017, Vila Real, PORTUGAL DOI 10.14684/SHEWC.17.2017.50-54

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Tratamento de esgoto independente em comunidade isolada: desempenho sustentável de ETE com unidade

ClearTec® em condomínio da Região Metropolitana de São Paulo, Brasil

Independent wastewater treatment at an isolated community: sustainable performance of a WWTP with a ClearTec® unit at a condominium in the Greater São Paulo Region, Brazil

André Luiz de Lima Reda Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana

Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil Escola de Engenharia Mauá, IMT, São Caetano do Sul, SP

[email protected]

Adilton Douglas Schiavon Felix Catuí Engenharia Ltda. São Paulo, SP, Brasil

[email protected]

Lara Lessa Feijó Catuí Engenharia Ltda. São Paulo, SP, Brasil

[email protected]

Hannah Caroline Proença Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana

Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil [email protected]

Abstract — Basic sanitation encompasses wastewater collection, treatment and disposal. Isolated Brazilian communities have taken direct responsibility for sanitation, for either technical, institutional or financial government limitations – or by free option. The Tamboré wastewater treatment plant, serving an isolated community in the Greater São Paulo, is studied to allow for performance comparison between two different “biological treatment” processes: first, a UASB reactor (performing digestion by “Upflow Anaerobic Sludge Blanket”) followed by an activated sludge unit; second, an alternative system with an activated sludge tank complemented by German technology ClearTec® (here, for the first time in Brazil), which inserts in it a porous treatment medium. As a conclusion, the ClearTec® process resulted at least as efficient as UASB for organic matter removal – each one relying on an associated activated sludge unit. Because it is inside the sludge tank and, also, fastens treatment by accelerating sludge growth, ClearTec® saves space, reducing plant area.

Keywords — Innovation by ClearTec®, activated sludge, wastewater treatment, private WWTP, isolated treatment plant

I. INTRODUÇÃO

O nível e o processo de tratamento ideais numa Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) dependem de vazão e qualidade do esgoto afluente. Dependem também do arcabouço legal que rege o controle de qualidade no corpo hídrico receptor [6] [9]. Tratamento é uma combinação de processos interligados que aplicam processos diferentes dentre os seguintes: a) operações unitárias físicas (tais como gradeamento, mistura, floculação, sedimentação, flotação, filtração e transferência de gases); b) processos unitários químicos (ex.: precipitação química, absorção por sedimentação e desinfecção química); c) processos unitários biológicos (ex.: reações bioquímicas para

remover substâncias biodegradáveis e nutrientes). As fases sequenciais do tratamento são: a) preliminar: remoção de matéria que possa vir a causar problemas ou interrupção nos processos que se seguem (ex.: detritos sólidos que podem ser retidos em grades; óleos e graxas, removidos por flotação); b) primário: remoção parcial de sólidos por simples sedimentação ou peneiramento; c) remoção de DBO por combinação de processos biológicos (ex.: lodos ativados, reator de membrana ou filtro fixo, lagoa de estabilização) que levam à sedimentação do produto formado na forma de partículas suspensas, seguido de desinfecção; d) processos especiais para remover nutrientes, requeridos em casos específicos [9]; processos específicos, por exemplo: descontaminação de água sujeita a matéria tóxica; tratamento para reuso; gestão de esgoto com vazão e qualidade altamente variáveis por intrusão de água pluvial [6]. No caso estudado, as operações envolvidas são tratamento por lodos ativados, comum nas ETE do Brasil, e filtros biológicos.

Considerando que cerca de 30 milhões de brasileiros ainda não são abastecidos por água tratada [8], só 48,1% contam com rede coletora de esgoto e nem 40% de tudo o que é coletado recebe tratamento, o País padece de excessiva poluição dos corpos hídricos e doenças infantis que o posicionam, quanto à saúde e o índice de desenvolvimento humano, IDH, bem aquém da maioria das nações europeias, norte americanas e algumas sul americanas. Este quadro causa prejuízos à saúde e a qualidade da vida humana, reduz o número de mananciais de qualidade, encarece o abastecimento de água e traz impactos negativos à agricultura, comércio, indústria e turismo, entre outros. O atraso nacional no saneamento também causa a carência de profissionais em postos de produção, tanto pela dificuldade de o jovem comparecer ao local de aprendizado (e preparar-se para produzir), quanto pela ausência do empregado ao trabalho por moléstia própria ou na família [4].

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July 09-12, 2017, Vila Real, PORTUGALDOI 10.14684/SHEWC.17.2017.50-54

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A produção contínua de esgoto sanitário por comunidades urbanas varia em quantidade e qualidade pelo aumento e pela diminuição de suas atividades, seja em grandes conglomerados ou em pequenos agrupamentos isolados da infraestrutura urbana principal. Assim, medições temporais de vazão e concentração de poluente no esgoto são uma base para corretamente planejar os processos de tratamento numa ETE no dia a dia.

Os órgãos públicos têm sido, no Brasil, os que primeiro realizaram o tratamento do esgoto sanitário. De modo crescente, a iniciativa privada tem assumido a implantação e a operação de sistemas de tratamento, começando por situações em que o poder público não assume sua responsabilidade sanitária de fato (seja por limitação financeira, dificuldades técnicas, razões institucionais ou opção da comunidade). Apesar de esse tratamento ser atribuição primária municipal, comumente repassada a concessionárias, o próprio gerador do esgoto de certo porte (comércio, indústria, empreendimentos residenciais ou outras economias privadas) pode instalar sistema de tratamento isolado que responda à necessidade local. Sistema isolado de esgoto sanitário é um conjunto formado por rede coletora e ETE, separado de sistema de maior porte, usualmente de gestão municipal ou concedido. É solução geralmente adotada em zona de difícil acesso à qual o grande sistema integrado municipal não chegue ou, talvez, numa situação em que deva haver independência na gestão do esgoto. Tal é o caso no exemplo real aqui mostrado, em que o licenciamento ambiental de condomínios exige isto.

O objetivo específico do trabalho é comparar dois tipos de sistemas de tratamento biológico, como segue:

a) Reator UASB: digestão por Upflow Anaerobic Sludge Blanket, seguida por unidade de lodos ativados – metodologia comum no Brasil, aqui chamada “processo convencional”;

b) Processo alternativo com um filtro biológico pela técnica alemã denominada “tecnologia ClearTec®” instalado dentro de uma unidade de lodos ativados. Usado pela primeira vez no País na estação de tratamento aqui estudada, produz alto rendimento.

É fundamental analisar a viabilidade técnico-econômica de um processo de tratamento antes de adotá-lo num sistema isolado, considerando limites econômicos, salubridade da população, necessidade de tratamento e impactos ambientais. Esta preocupação está presente na análise feita neste artigo.

II. DESCRIÇÃO DA ETE BOSQUES DE TAMBORÉ A ETE aqui estudada se chama Bosques de Tamboré. Fica

na Região Administrativa do Alto Tietê, estado de São Paulo, município de Santana de Parnaíba. A empresa alemã Jäger Umwelt-Technik criou a tecnologia ClearTec®. É representada no Brasil por B&F Dias, que introduziu a tecnologia na ETE Bosques de Tamboré em junho de 2015, em parceria com Catuí Eng., atuante na área de saneamento básico com soluções para água, esgoto e drenagem. A Tabela 1 exibe vazões e cargas nos condomínios que ela serve para contribuição de 54gDBO/hab/dia, coeficiente de retorno de 0,8 e consumo médio de 300L/hab/dia nos condomínios horizontais e 220L/hab/dia nos verticais.

TABELA I. EVOLUÇÃO NA VAZÃO E CARGA AFLUENTES (FONTE: [3])

A ETE Bosques de Tamboré atende cerca de 13.000 habitantes na atualidade (mais que o dobro do planejado para 2007 – Tabela 1) após receber mais 10 regiões contribuintes com esgoto, entre dezembro de 2007 e 2015, a saber: as escolas Castanheiras e Ursinho Branco; os condomínios Green Tamboré, Terraços de Tamboré, Quintas de Tamboré, Jardins de Tamboré, Penthouses, Premium Tamboré e Paisagem, e o supermercado Pão de Açúcar. É projetada para operar com até oito módulos de tratamento, cada um com cerca de 25m³/h – o que atende cerca de 22.500 pessoas. A princípio, cada módulo teria uma unidade UASB seguida de uma de Lodos Ativados, o que aqui se denomina “módulo convencional”. Seis dos oito operam atualmente, um com unidade de Lodos Ativados complementada pela tecnologia ClearTec® no seu interior – primeira do tipo adotada no Brasil. Cinco usam, hoje, o processo convencional e outros dois ainda estão inoperantes.

O efluente inicia seu caminho pelo processo primário, com grades manuais, caixa de areia, calha Parshall e caixa de gordura. Até esta etapa, removem-se sólidos mais grosseiros, provenientes do esgoto bruto. Depois o efluente é encaminhado para tratamento bioquímico (secundário), que remove matéria orgânica por biodigestão, sendo o processo de Lodos Ativados o mais tradicional nesta fase (descrição detalhada em [10]).

Fig. 1. Disposição dos módulos de tratamento na ETE (Fonte: [10]).

O funcionamento da tecnologia ClearTec® se baseia no processo IFAS, “Integrated Fixed Film Activated Sludge”, que conta com aderência de biomassa suspensa a uma base de biomassa já aderida a uma trama tecida com material sintético, na qual cresce a cultura bacteriana, colocada dentro do aerador para ser atravessada pelo fluxo em tratamento. Comparando este processo com o de Lodos Ativados tradicional, constata-se permitir mais concentração de biomassa e mais idade de lodo. Segundo [2], essa tecnologia aumenta em até 100% a capacidade de tratamento biológico nas ETE industriais e sanitárias, sem acréscimos de obra civil ou potência elétrica.

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O equipamento ClearTec® consiste numa gaiola em aço inoxidável e um conjunto de mídias têxteis instalados dentro do reator aeróbio. Para funcionar, deve haver difusores de ar no fundo do reator, posicionados sob a barreira formada pelo ClearTec®. Aplicado como tratamento biológico adicional, traz melhoria ao processo usual e aumenta a capacidade de tratamento. São vantagens dele: ser fácil de manusear e aplicar; sua eficiente eliminação de nitrogênio; resistência a raios UV; manutenção barata; aderência da biomassa elevada; resistência a choques; quase não entupir, obstruir-se ou incrustar-se; fluxo ideal no leito fixo; rápida nitrificação; estabilidade operacional; melhoria na sedimentação do lodo no decantador; excelência na oxigenação da biomassa; resistência das mídias têxteis a influências químicas e mecânicas e versatilidade de dimensões. Ou seja, essa tecnologia acelera a oxidação de orgânicos e, uma vez inserida na unidade de Lodos Ativados, traz vantagens ao seu processo normal. Sua maior desvantagem é a dificuldade de remover a grade para eventual conserto do aerador, sob ela.

Por outro lado, o reator UASB operando sozinho pode apresentar boa eficiência de tratamento, é considerado processo simples e não demanda muita energia. Pode ser operado facilmente, mas suas taxas de remoção costumam não atender as exigências legais. Assim, precisa ser complementado para remover carga orgânica remanescente. Apesar de não promover nitrificação, sua complementação por Lodos Ativados consegue nitrificar satisfatoriamente o nitrogênio amoniacal e reduz mais ainda a matéria carbonácea remanescente. Sistemas de tratamento conjuntos como os considerados aqui permitem dispensar a unidade de decantação primária, que geralmente antecede outros sistemas de Lodos Ativados. De fato, além da decantação primária, o UASB realiza digestão e adensamento do lodo satisfatórios – seu efluente chega ao reator aeróbio com o dobro da remoção de DBO obtida por decantação primária.

Com processos assim combinados, pode-se reduzir bastante o tamanho do tanque aeróbio, comparado ao convencional. Como recebe esgoto já consideravelmente tratado pelo UASB, reduz-se muito a matéria orgânica restante a biodegradar. Diminuem, consequentemente, as dimensões do decantador secundário, pois o dimensionamento da decantação depende do dimensionamento da aeração. O esquema da Figura 2 ilustra o processo de tratamento por UASB seguido de Lodos Ativados.

Fig. 2. Sistema convencional: reatores UASB e Lodos Ativados (Fonte: [10]).

Nesta ETE, a disposição de processos unitários é vantajosa com relação a outras porque reduz a produção de lodo, o consumo de energia, as dimensões das unidades de tratamento, o gasto com produtos químicos envolvidos no tratamento final do lodo e a necessidade de equipamentos eletromecânicos – além de ter mais facilidade operacional. Acima de cada reator UASB há um canal de distribuição, que recebe o esgoto bruto de uma caixa de distribuição. Cada canal alimenta 16 tubos com esgoto que o conduzem até a base do reator, onde se inicia o fluxo ascendente dentro deste, levando o esgoto às várias fases do processo. No reator UASB, além do lodo internamente

gerado, pode haver eventual introdução, para recirculação, de excesso de lodo aeróbio removido do decantador secundário equipado com ClearTec®. Assim recirculado para o UASB (Figura 2), esse lodo sai mais bem estabilizado, junto ao lodo anaeróbio, além de ter seu volume reduzido cerca de 20%. Depois de distribuído pelos tubos saindo do reator UASB, o efluente desce para o tanque de aeração e, daí, vai para o tratamento exclusivamente por Lodos Ativados. As fotografias na Figura 3 mostram uma vista externa do sistema compacto ClearTec® e uma vista superior do seu sistema de aeração.

Fig. 3. Fotografias da unidade ClearTec® (Fontes da esq. para a dir.: [2]; [10]).

III. METODOLOGIA DE COLETA E ANÁLISE DE AMOSTRAS Avalia-se a eficiência dos processos nos módulos 5 e 6 da

ETE, respectivamente do sistema de Lodos Ativados associado ao ClearTec® e do convencional (UASB+Lodos Ativados), determinando a Demanda Química de Oxigênio (DQO) em três diferentes pontos do fluxo do esgoto [10] a saber: caixa de distribuição, correspondente à entrada que alimenta os módulos 5 e 6; saída do tanque de contato do sistema de lodos ativados equipado com ClearTec®, e saída do sistema UASB + Lodos Ativados. Em cada momento da campanha, coletou-se amostras nos três pontos. Entre 30/08 às 8 horas e 31/08/16 às 6 horas, 23 amostras horárias foram coletadas seguindo a NBR 9898 (1987). Analisaram-se 69 amostras para DQO. Durante a coleta, as temperaturas variaram de 20 a 29ºC. A determinação foi pelo ensaio de refluxo fechado colorimétrico, segundo a NBR 10357 (1988), que avalia DQO por quantidade de oxigênio necessária para oxidar quimicamente a matéria orgânica com um forte oxidante químico, dicromato de potássio. Essas determinações foram realizadas no Laboratório da Catuí Engenharia, nos próprios dias de coleta.

Para representar no tempo a DQO afluente e as efluentes nos dois processos, tomou-se duas medidas adicionais ao preparar a Figura 4, para permitir comparação mais detalhada: a) Dada a grande defasagem entre as séries de DQO à entrada e à saída do processo convencional (a última termina ao se passar só um terço da primeira), repete-se no gráfico a série à saída do tratamento convencional nas 24 horas seguintes ao período real de coleta. Resulta uma série de quase 48 horas, quase contínua (falta a amostra das 7h00). Portanto, a segunda metade da série é de ‘valores típicos estimados a cada hora’, não reais; b) Providenciou-se três escalas de horário de coleta na Figura 4, cada uma com cor e tipo de linha correspondendo ao respectivo ponto de coleta – medida fundamental para permitir análise completa das relações entre as três séries temporais. A seguir, analisam-se os resultados.

TRATAMENTO PRIMÁRIO

Tecnologia ClearTec® Sistema de Aeração por Ar DifusoTecnologia ClearTec® Sistema de Aeração por Ar Difuso

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As concentrações à entrada do tratamento biológico resultaram bem baixas na madrugada, exceto pelo aumento atípico às 5h00, pela incorporação ao tratamento de certa quantidade de esgoto reservada anteriormente, esperando ser tratada na madrugada. Com efeito, a operação deste sistema tem capacidade para equalizar vazões à entrada da ETE, compensando variações na produção de esgoto ao longo do dia.

Na curva da DQO à entrada, vê-se ainda sensível aumento nas concentrações ao chegar o pico do almoço (poucas horas depois, por vir defasado), gerando vazão afluente à ETE com crescentes concentrações de orgânicos. Os aumentos na DQO seguindo os horários do café da manhã e do jantar não são tão notáveis, provavelmente pelo fato de a geração local de esgoto não ser só doméstica, mas também fortemente comercial.

Ao comparar a qualidade do afluente com a do efluente nos dois processos de tratamento biológico alternativos, considere-se a defasagem devida ao Tempo de Detenção Hidráulica (TDH) em cada um. Ao traçar gráficos de qualidade à entrada e às saídas do tratamento biológico para analisá-los em conjunto, considere-se a informação, do operador da ETE, de que o processo UASB+Lodos Ativados (convencional) tem seu TDH entre 16,5 e 18,5h, enquanto o de Lodos Ativados+ClearTec® teria TDH de 6,5 a 8,5h. Analisando-se as oscilações dos três gráficos de concentração da Figura 4 em conjunto, identificou-se os valores de defasagem seguintes: próximo às 18h para o processo convencional; cerca de 6,5h para o alternativo. Mesmo sabendo que o TDH pode variar ligeiramente ao longo do dia, usou-se essas defasagens para traçar gráficos das séries temporais de concentrações na Figura 4, para esta análise ainda preliminar – visto ser esta a primeira campanha realizada nessa ETE para avaliar aspectos a estudar melhor no futuro e ‘mapear o terreno’ para planejar metodologias de amostragem e análise.

Com base na escala de tempo relativa à série efluente do sistema com ClearTec® (pontilhada), percebe-se apenas no período de coleta das 15h00 às 17h00 concentrações à sua saída sensivelmente superiores aos respectivos valores à saída do tratamento convencional. Todo o resto do período comum das séries mostra uma oscilação compensatória entre essas duas curvas de efluentes (sempre com mesma ordem de grandeza). Segundo o operador, exatamente a partir das 15h00 daquele dia houve limpeza das paredes acima do nível de líquido, no reator e no decantador (processo usual diário para retirar lodo aderido às paredes). Essa parte do lodo estabilizado pode, pois, continuar no processo de tratamento adiante, junto ao efluente líquido da unidade. Assim, o tratamento típico promovido pelo sistema alternativo Lodos Ativados+ClearTec®, apesar de bem mais rápido e simples de operar que o convencional, parece produzir efluente final de qualidade comparável à dele. Com base em levantamentos mais precisos, sabe-se que o sistema de Lodos Ativados+ClearTec® tem eficiência de remoção de DQO de 87% e o sistema com UASB, apenas 85%. Portanto, o primeiro parece mais eficiente que o segundo ao remover DQO.

Em tese, dada a grande diferença de TDH entre os dois sistemas, parece que, em casos de perturbação eventual no tratamento por excesso de matéria orgânica ou transitório de vazão afluente em dia chuvoso por intrusão indesejável de água pluvial (ligações clandestinas à rede em imóveis contribuintes [7]), o sistema dotado de ClearTec® pode se reestabilizar mais rápido que o convencional (tem TDH menor).

IV. ANÁLISE TÉCNICO-ECONÔMICA

Instalar a tecnologia ClearTec® nesta ETE custou cerca de R$ 100.000,00 e permitiu eliminar a unidade UASB da linha de tratamento que combina Lodos Ativados e ClearTec®. Para estimar o custo de implantar este processo, somou-se seu custo (acima) àquele do sistema convencional e depois se subtraiu o do reator UASB. Com base nesta estimativa, pode-se cotejar os custos de implantação dos dois tipos de sistemas comparados consultando valores na Tabela 2. Nela se pode calcular a diferença de custos entre os dois tipos de sistemas cotados (representados pela primeira e quarta linhas): cerca de R$ 14.512,00. Sendo estes valores sujeitos a erros de estimativa, a diferença acima é irrelevante, na prática. Assim, conclui-se que os dois sistemas possuem custos de implantação semelhantes.

TABELA II. Custos de implantação dos sistemas (Fonte: [10])

(1) Custo do sistema UASB+Lodos Ativados, subtraindo custo UASB. (2) Custo só de Lodos Ativados somado ao da incorporação de ClearTec®.

V. CONCLUSÃO Conclui-se acima que o sistema ClearTec® parece tão

eficiente em termos de remoção de matéria orgânica quanto o UASB, ambos convenientemente associados a uma unidade de Lodos Ativados. O primeiro é uma associação em sequência: primeiro o reator UASB, depois Lodos Ativados. O segundo economiza espaço na ETE por ser instalado dentro do reator de Lodos Ativados e potencializa a formação de colônias de bactérias formadoras do lodo a ser removido. Ademais, o segundo tipo parece superar o primeiro quanto à duração necessária do processo, numa relação aproximada de pelo menos 7 para 14h, podendo chegar a uma relação de 6 para 18h, o que representa uma economia de tempo de 33% a 50% com relação ao processo convencional. Este tipo de ETE pode deter parte do efluente para tratar depois, requerendo então menos reatores. Sob outro ângulo, como o tratamento biológico ocorre mais rápido, pode-se recorrer a reatores menores, menos caros. Como não se pode admitir uma relação simples entre tamanho e custo, uma vez que fatores de escala do reator podem resultar redução ou aumento no tempo de reação que não são função linear das dimensões, aqui se delineia uma área para futura pesquisa, a ser detalhada, para permitir escolhas otimizadas de processos de tratamento para comunidades isoladas.

Neste caso da instalação pioneira de ClearTec® no Brasil, vale ressaltar outra vantagem da redução no tempo de processo supracitada. Com a explosão urbana, intensa construção e reforma de edificações – nem sempre por um profissional habilitado – a vazão de esgoto na rede coletora e, por consequência, à entrada das ETE pode sofrer sensível aumento e vir a ‘lavar’ o meio de tratamento quando chuvas torrenciais forçam a intrusão de água pluvial à ETE. Isto não deveria ocorrer, visto que o sistema coletor no Brasil é separador, mas o fato é que ocorrem cada vez mais ligações clandestinas da drenagem a coletores de esgoto [7]. Uma solução para este crescente problema pode ser a de deter os volumes acima da capacidade de tratamento num reservatório de amortecimento

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UASB = Lodos AtivadosUASBLodos Ativados (1)Lodos Ativados + Clear Tec® (2)(2)

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UASB = Lodos AtivadosUASBLodos Ativados (1)Lodos Ativados + Clear Tec® (2)

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de transitórios (“piscininha”) à entrada da ETE [6], tratando-o depois no módulo de Lodos Ativados+ClearTec®, durante um período de ‘folga’.

No caso de ocorrer o problema de transitório de vazão após uma tormenta, acima citado, outra vantagem do sistema combinado com ClearTec® é o fato de, por ter menor TDH, apresentar menor inércia ao responder a variações excessivas na vazão recebida que tragam excesso de carga; portanto, ao sofrer as consequências desse problema, consegue se reestabilizar mais rápido do que o convencional.

Outra consequência decorrente do menor TDH do sistema de Lodos Ativados com ClearTec® é que, em caso de perturbação do tratamento por excessivo aporte de orgânicos, o sistema contendo Lodos Ativados e ClearTec® é vantajoso economicamente devido à sua maior velocidade de tratamento, que poderia ser de duas a três vezes a do módulo convencional, pelo menos no caso aqui estudado (enquanto se espera novos estudos comparativos).

Portanto, neste estudo ficou claro que a associação do processo de Lodos Ativados com a tecnologia ClearTec® pode

oferecer mais segurança (dada sua ‘folga’ de tempo) e economia no caso da ETE Bosques de Tamboré, conclusão esta que poderia ser comprovada em muitas situações semelhantes.

Numa comparação econômica entre os dois sistemas, aquele com ClearTec® apresenta custo de implantação e manutenção próximo ao do UASB, com ligeira tendência de ser mais barato. Mas, apesar dessa equivalência, o sistema contendo Lodos Ativados é vantajoso economicamente por ser um tratamento mais rápido, com o dobro ou triplo da velocidade do módulo convencional – o que lhe traz mais folga de tempo, portanto maior segurança. Portanto, neste estudo fica claro que aquela associação de processos pode oferecer mais segurança e economia no caso da ETE Bosques de Tamboré – conclusão extensível a muitas situações semelhantes

AGRADECIMENTOS À equipe da Catuí Engenharia, que trabalhou no campo e

nas análises laboratoriais, os agradecimentos dos autores.

Fig. 4. DQO à entrada do tratamento biológico e às saídas dos sistemas alternativos – séries defasadas pelos TDH estimados.

REFERÊNCIAS [1] AISSE, M.M.; LOBATO, M.B.; JURGENSEN, D.; PENHA, R.C.R.;

ALÉM, SOBRINHO, P.. 2002. Estudo econômico comparativo de sistemas de tratamento de efluentes anaeróbios no Estado do Paraná (Brasil). Disponível em: <http://www.bvsde.paho.org/bvsaidis/mexico 26/ii-004.pdf>. Acesso em: 11 nov. 2015.

[2] B&F DIAS.. Cleartec®: 2015. Tecnologia para aumento da capacidade de tratamento. Disp.em: <http://bfdias.com.br/site/wp-content/ uploads/ 2015/04/catalogo-cleartec_bf_dias_site.pdf>. Acesso: 20 jul. 2015.

[3] CATUÍ ENGENHARIA. 2015. “Projeto Básico da Estação de Tratamento de Esgoto Sanitário. Tamboré S.A. Item 2 da Descrição do Projeto”. Documento cedido na forma eletrônica por solicitação dos autores. São Paulo. Disponível em arquivo digital.

[4] EX ANTE CONSULTORIA ECONÔMICA. 2014. Benefícios econômicos da expansão do saneamento: Qualidade de vida, produtividade e educação. Valorização ambiental. [S. l.: s. n.], 2014. 72p. Dispon.em: http://www.tratabrasil.org.br/ datafiles/uploads/estudos/ expansao/Beneficios-Economicos-do-Saneamento.pdf>.Aces:10/jul/2014.

[5] INSTITUTO TRATA BRASIL. Ranking do Saneamento 2015: Avanço tímido do saneamento básico nas maiores cidades compromete universalização em duas décadas. 2015. Disp. em: http://www. tratabrasil. org.br/ranking-do-saneamento-2015> Acesso: 10 jul. 2015.

[6] REDA, A.L.L. Simulation and control of stormwater impacts on river water quality. Tese (PhD): Imperial College, University of London. Londres. 512p. 1996.

[7] REDA, A.L.L.; FERREIRA, P.; MENDES, P., M. BECK, M.B. Combined sewer overflows in Brazil: a 2014 situation report. Anais: SHEW’C2014 - XIV Safety, Health and Environment World Congress. Cubatão, SP, Brazil, 20-23 jul. 2014, v.14 n.1, ISSN 2317-3173. Disponível em: http://www.copec.org.br/shewc2014.

[8] SISTEMA NACIONAL DE INFORMAÇÕES SOBRE O SANEAMENTO. 2011. Saneamento: Cada R$ 1 investido em saneamento gera economia de R$ 4 na área de saúde. [S.l.]. Dispon. em: http://www.altos estudos.com.br/?p=51833. Acesso em: 13 out. 2014.

[9] TCHOBANOGLOUS, G.; STENSEL, H.D.; TSUCHIHASHY, R.; BURTON, F.; AU-ORF, M.; BOWDEN, G.; PFRANG, W. Wastewater Engineering. Treatment and resource recovery. 5. ed. Nova Iorque: McGraw-Hill Education. 2014. 2048p.

[10] TOLEDO,.Fo., E.T.L.; PROENÇA, H.C.; SOUZA, L.H.P., JARDIM, W. 2015. Análise de viabilidade técnico-econômica de tratamento de esgoto em sistema isolado. Dissertação (Graduação), Engenharia Civil, Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo, 2015.

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