Tailândia, Pará

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O livro-reportagem conta a história de Tailândia, município no nordeste do Pará e reconhecido pólo madeireiro no estado. A cidade foi o primeiro palco da Operação Arco de Fogo, uma operação de fiscalização arquitetada pelo Governo Federal para combater o desmatamento ilegal na Amazônia. Após a passagem da Operação, praticamente todas as madeireiras e carvoarias da cidade foram fechadas, levando a população tailandense ao desemprego em massa. Até hoje, Tailândia sofre com os reflexos da Arco de Fogo.Trabalho de Conclusão de Curso de Jornalismo, apresentado em 2010, para Universidade Estadual Paulista (UNESP).

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Tailândia, ParáA história do primeiro município a receber a Operação Arco de Fogo

João Ricardo Penteado Lopes da Silva

Editado por Bruno Candeias

Projeto Experimental apresentado como exigência parcial para obtenção do título de bacharel em Comunicação Social- Habilitação em Jornalismo,

do Departamento de Comunicação Social da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, atendendo à resolução número 02/84 do Conselho

Federal de Educação, sob a orientação do Prof. Dr. Pedro Celso Campos.

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A todos aqueles que lutam por mais justiça na Amazônia.

AgradecimentosPrimeiramente, agradeço aos meus pais pelo apoio financeiro

e moral durante esta minha empreitada e, principalmente, pela paciência. Agradeço à minha octogenária vó Cida, que teve que conviver com um neto já marmanjo o tempo todo em casa durante centenas de dias a fio.

Agradeço ao meu orientador Pedro Celso Campos por ter aceito orientar um projeto não muito convencional, realizado por um orientando não muito presente.

Agradeço ao Sales por ter me oferecido estadia em Belém, ao Ericson pelas dicas sobre a capital paraense, e, sobretudo, à dona Nasinha, uma pessoa incrivelmente hospitaleira.

Agradeço ao Reginaldo e ao Jorge, funcionários da prefeitura de Tailândia e meus primeiros contatos na cidade, pela solicitude em atender um estudante de jornalismo que veio de longe e cheio de perguntas pra fazer.

E, por fim, agradeço a todos aqueles que estiveram ao meu lado durante esse desafio, me apoiando de uma forma ou de outra.

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Índice

Agradecimentos ........................................... 5Desde Belém ............................................... 7A Vila ........................................................12A Cidade Só Cresce .....................................18Primeiras Impressões ...................................26Madeira Matéria-Prima ................................33O Poder Público .......................................... 41Floresta e Ocupação ....................................52Arco de Fogo ..............................................61Prejuízos ...................................................68Posfácio .................................................... 74Fotos ........................................................78Bibliografia ................................................85

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Desde Belém

A rodovia conhecida como Alça Viária, no Pará, é fruto de um projeto ambicioso. Sua construção teve como objetivo principal ligar a região metropolitana de Belém a rodovias que percorrem as regiões sul e sudeste do estado. A obra também foi importante para estabelecer uma integração mais rápida com o pólo industrial de Barcarena, cidade onde estão duas das maiores produtoras de alumínio do mundo: a Albrás e a Alunorte.

Como parte da execução do projeto, foram construídas quatro grandes pontes e 70 quilômetros de rodovia floresta amazônica adentro. Até 2001, quando a Alça Viária foi finalmente concluída, sob a tutela do então governador Almir Gabriel, chegar a alguns municípios paraenses ao sul de Belém só era possível fazendo uso de balsas nos diversos rios que correm na região. Trajetos que hoje são superados em algumas horas demandavam quase um dia inteiro de viagem.

Apesar de ser uma rodovia construída para ligar a capital ao sul do estado, quem sai de Belém para alcançar a Alça Viária segue primeiro para o norte, mais precisamente para o nordeste. É pela BR-316 que o viajante desfruta seus primeiros minutos de translado, cruzando por Ananindeua e Marituba, situadas ainda na região

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do estado parecem apresentar os mesmos problemas. Estatísticas do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) confirmam essa suspeita. De acordo com o órgão, em 2007, o Pará registrou o segundo maior número de mortes em rodovias no Brasil, com 1.007 vidas perdidas, atrás apenas do Paraná, com 1.672. Assim, é mais do que natural que alguém que esteja em sua primeira viagem pela malha viária paraense expresse, além de curiosidade pela paisagem, apreensão.

Próximo ao rio Guamá, o primeiro dos três grandes rios sobre os quais a Alça Viária passa, surge no horizonte uma grande ponte suspensa. É a ponte Almir Gabriel, nome em homenagem ao governador que a inaugurou. Possui dois quilômetros de extensão, a maior de todas da rodovia, e segue o modelo de ponte estaiada, com cabos de sustentação saindo dos mastros diretamente até a base. O curioso é que, assim como as demais pontes adiante, seu trecho inicial é percorrido em uma subida consideravelmente íngreme, lembrando verdadeiras rampas gigantes. Impossível não pensar na hipótese de um ônibus em alta velocidade decolar pelos ares e cair no rio que corre abaixo. Felizmente, em quase uma década de existência, parece que não houve nenhum caso como esse no local.

Menos de 50 km adiante, depois de experienciar semelhantes sensações nas pontes-rampas dos rios Moju e Acará e ter deixado a Alça Viária e passado pela PA-151, o ônibus está agora no quilômetro zero da PA-150, estratégica rodovia estadual que percorre o sul do Pará, também conhecida como Belém-Marabá. Batizada de rodovia Paulo Fonteles, em homenagem a um ex-deputado estadual assassinado, a PA-150 se estende por 762 km, passando por doze

metropolitana. Como é típico de áreas conurbadas, os limites entre uma cidade e outra passariam despercebidos aos olhos de um forasteiro, não fossem pelas placas que acusam a mudança.

Na altura do km 10 da BR-316, em Marituba, está o trecho de acesso à Alça Viária. É aí que o rumo da viagem é ajustado em direção ao sul. A paisagem na janela do ônibus muda. O cenário urbano formado por casas, passarelas e ruas sai de cena, dando lugar à floresta. Dos dois lados, o que se vê é só mata fechada. No meio, uma estrada de pista simples, que se afunila no horizonte entre retas e curvas. Parece sufocada pelo infinito verde que a cerca por todos os lados.

Vez ou outra, à beira da rodovia, surgem povoados e vilarejos isolados no meio do mato. Há também alguns ribeirinhos na margem dos rios sobre os quais a Alça Viária passa com pontes. Postes de energia elétrica de cerca de cinco metros de altura acompanham a estrada praticamente por toda sua extensão.

A falta de manutenção faz com que, em certos trechos, o mato invada o restinho de pista que poderia ser chamado de acostamento. Há trechos em que simplesmente ele não existe. A qualidade do asfalto é razoável até certo ponto – quanto mais pra trás Belém, mais o pavimento se torna problemático. A tremedeira do ônibus começa a ficar mais constante com o passar do tempo, potencializada por um motorista que gosta de velocidade. Até os mais incrédulos passageiros, subitamente, se pegam adorando um deus nos momentos mais críticos.

Infelizmente, enfrentar tais condições de estrada não é só privilégio de quem viaja pela Alça Viária; todas as demais rodovias

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municípios no total. Começa na cidade de Moju e só vai parar em Redenção, onde começa a estrada federal BR-158.

A PA-150 também é o principal acesso à rodovia que vai até Tucuruí, cidade onde está a segunda maior usina hidrelétrica do Brasil. Por toda a viagem é possível ver ao lado da pista os linhões de energia que saem da usina em direção ao norte do estado.

Por cortar o Pará de um extremo ao outro e por ligar Tucuruí a Belém e Barcarena, a PA-150 é bastante conhecida entre os paraenses. Seu tráfego é intenso, principalmente de caminhões, e suas condições são semelhantes à da Alça Viária: pista simples, trechos de pavimentação ruim, ausência de acostamento. Desse modo, a sensação de insegurança segue a mesma.

Quase cinco horas e 270 km depois do início da viagem em Belém, o ônibus se prepara para aportar em mais uma cidade. Será a antepenúltima rodoviária antes de Goianésia e Tucuruí. O cenário fora da janela começa a mudar. Plantações de palma de dendê, matéria-prima bastante utilizada nesses dias para a produção de biodiesel, transformam radicalmente a vista exterior. Seguem por quilômetros e quilômetros de extensão, em terras da Agropalma, maior produtora de óleo de dendê da América Latina. Pouco a pouco, outros sintomáticos elementos passam a fazer parte da paisagem. São as serrarias. Caminhões, carregados de toras de árvores, e bicicletas, levando os encarregados de cortá-las, cruzam a todo instante por seus portões. Montanhas de pó de madeira de mais de cinco metros de altura se espalham pelos seus pátios.

Passados mais alguns metros, uma cidade aponta logo adiante. Casas, supermercados, hotéis e lojas de autopeças marcam presença

nos dois lados da rodovia. Não há prédios à vista. A poeira, vinda das vicinais da região e das ruas de terra do perímetro urbano, toma totalmente conta do ar, dando-lhe um aspecto esbegeado. Para um forasteiro vindo de um grande centro urbano, a sensação, imbuída de todos os tipos de preconceitos, é a de se estar chegando ao faroeste. O ônibus toma a avenida Belém, bem ao lado da PA-150, e para na rodoviária. É a rodoviária de Tailândia.

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A Vila

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Tailândia é uma cidade jovem do nordeste paraense, emancipada politicamente apenas em 1988, por meio de lei estadual sancionada pelo governador Hélio da Mota Gueiros. Até aquele ano, era apenas uma vila que se assentava em áreas pertencentes aos municípios de Acará e de Moju. Apesar do pouco tempo de existência, a cidade possui uma população considerável para a região: são 64 mil pessoas, de acordo com o censo do IBGE de 2007. Mas há funcionários da administração local que afirmam que existem pelo menos dez mil a mais.

A formação do que viria a ser a “Vila de Tailândia” se deu no bojo do plano de integração nacional arquitetado pelos militares que comandavam o Brasil na década de 70. A Amazônia era o principal foco das atenções. Sob o lema de “integrar para não entregar”, foi criado o I Plano de Desenvolvimento da Amazônia, o PDA, que traçava metas e ações para os anos de 1972 a 1974. Seu objetivo principal era criar ações integratórias entre a região amazônica e o centro sul do país. Para isso foram planejadas várias rodovias de grande extensão como a Santarém-Cuiába e a Transamazônica. É importante lembrar que o PDA estava inserido no I Plano Nacional de Desenvolvimento, o PND.

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Em 1973, é elaborado o II PND, e dentro dele um novo PDA, com o planejamento voltado para os anos de 1975 a 1979. Esse segundo Plano de Desenvolvimento para a Amazônia fazia uma investigação minuciosa das potencialidades econômicas que a região possuía. Uma de suas principais metas era buscar alternativas energéticas para o país, em meio à forte crise do petróleo que impactava o mundo. Foi nessa época que tiveram início as construções das duas maiores hidrelétricas do Brasil: as usinas de Itaipu e de Tucuruí. Esta última, erguida no meio da floresta amazônica, no Pará, bem às margens do rio Tocantins.

Com a construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, localizada numa região mais próxima ao centro do estado, surgiu então a necessidade de estabelecer uma conexão entre aquela área e o nordeste paraense, onde estavam Belém e o pólo industrial de Barcarena. Desse modo, em 1977, são derrubadas as primeiras árvores para dar espaço à PA-150, uma rodovia que cortaria o Pará de norte a sul.

Assim como em outros processos de abertura de estradas no estado, o início da construção da PA-150 logo atraiu muitos migrantes para a localidade. Foi mediante esse fenômeno que chegaram os primeiros moradores na área onde é hoje Tailândia. Era gente que vinha de cidades do próprio Pará e do vizinho Maranhão. Alguns eram de estados mais ao sul, como Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Espírito Santo. A maioria estava atrás de terras ainda sem donos, na esperança de conseguir trabalho e sustento para a

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família. Outros, entretanto, tinham o objetivo de formar grandes fazendas e enriquecer.

Com tantos colonos chegando em um curto prazo de tempo, não tardaram para que os primeiros conflitos fundiários acontecessem. As disputas se concentravam principalmente em torno das terras próximas da PA-150, já que eram as melhores áreas em razão da facilidade logística que produzir à beira de uma rodovia proporcionava. A violência começou então a se disseminar, e muitas pessoas perderam suas vidas.

Foi para apaziguar a tensão cada vez mais crescente que, ainda em 1977, chegou o primeiro grupo do Instituto Nacional de Terras do Pará, o Iterpa1 , com o objetivo oficial de estabelecer um assentamento dirigido no povoado. Nessa primeira visita, a equipe chefiada por José Clarindo Pinheiro Lopes, o Tenente Pinheiro, registrou 117 posseiros na região.

À época, o vilarejo ainda não possuía um nome, e foi o próprio Tenente Pinheiro o responsável por batizá-lo de “Tailândia”. Era uma analogia entre a violência que acontecia no país asiático de mesmo nome, que na época passava por sérios conflitos armados em suas fronteiras, e a violência decorrente das disputas por terras naquele povoado do Pará. Os moradores locais gostaram da sugestão dada pelo tenente, e o lugar passou a ficar conhecido como “Vila de Tailândia”.

Em 1978, as visitas do Iterpa ficaram mais frequentes e uma base do instituto foi estabelecida no local. Em 1980, por meio de um decreto, o povoado foi alçado ao posto de Colônia de Tailândia2 . 1 O Iterpa era uma espécie de paralelo estadual ao Incra, ambos criados para resolver impasses relacionados a questões fundiárias e responsáveis por lotear as terras e entregá-las aos colonos.2 “Colônia” é um termo de classificação utilizado pelo Iterpa à época e não substituiu o termo “Vila”, empre-

Este decreto especificava a criação de uma colônia às margens da PA-150, que teria como principal objetivo a “absorção racional de fluxo migratório na região”, conforme aponta o periódico do Iterpa da época , o Interação.

A partir desse momento, o número de imigrantes na Vila de Tailândia alcançou níveis estratosféricos em um período muito curto de tempo. Esse fenômeno se deu graças ao status de Terra Prometida que o Iterpa propagava da colônia. A notícia que corria pelas estradas do Pará era de que Tailândia era um lugar ideal para quem quisesse ter prosperidade com a agricultura, a extração da madeira e a pecuária.

As disputas violentas por terras não cessaram e eram ainda mais inflamadas pelo desejo de alguns de formar latifúndios. Muitos migrantes recém-chegados se assentavam em terras que supostamente já tinham dono e, pouco tempo depois, se viam ameaçados para abandonar o local. Em alguns casos, aquele que se negava em acatar a intimidação tinha sua casa incendiada, sua roça destruída, e, em último caso, era morto.

No início da década de 80, o fluxo migratório que até então estava em franca ascensão deu lugar a uma emigração em massa. Estimativas feitas pelo Iterpa diziam que em 1979 a população da Vila de Tailândia girava em torno de 6 mil pessoas. Um ano depois, em 1980, o número atingiu cerca de 15 mil. Já em 1984, de acordo com um periódico do mesmo instituto, noticiava-se a existência de pouco mais de 2.600 pessoas. À primeira vista, essa oscilação nos números, de tão absurda, acaba por sugerir que houve alguma falha na contagem da população. Apesar disso, esses mesmos gado popularmente para se referir à Tailândia.

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números dão um esboço do fenômeno que estava acontecendo na localidade.

Essa explosão na taxa de emigração pode muito bem ser explicada pelo que os migrantes, movidos pelo sonho de obter prosperidade na Vila de Tailândia, de fato encontravam quando chegavam ao seu destino. Quase todos ganhavam um pedaço de terra do Iterpa, mas, como não recebiam um único incentivo de ninguém, não conseguiam estabelecer uma vida de trabalho produtivo. Pouco tempo depois de haver chegado, já se viam migrando novamente para outra região. A precária condição da PA-150 e das vicinais, que dificultava o escoamento da produção, também agravava o cenário.

Matéria publicada no jornal paraense O Liberal, em 12 de fevereiro de 1984, dava uma ideia de como se encontravam os colonos da Vila de Tailândia naquele ano. O texto discorria sobre a má condição das pontes que davam acesso à vila, da estrada esburacada e cheia de lama que era a PA-150, e do estado lastimável de seus habitantes, que estavam “esquecidos de Deus e dos homens”. O acesso a remédios e a certos gêneros alimentícios pela população era bastante restrito. Ônibus vindos de Marabá e que seguiam para Belém costumavam demorar três dias para passar, e, não raro, chegavam já lotados. Segundo a autora da reportagem, “a Vila de Tailândia nessa época expressava o lado mais cruel de promessas não cumpridas, responsáveis pela migração de centenas de famílias atraídas pelo programa oficial de colonização”.

A matéria ainda falava sobre as mortes ocasionadas por doenças como a malária ou por contaminação pelo agente laranja, um veneno pulverizado pela Eletronorte para diminuir a vegetação ao

redor dos linhões de transmissão de energia, que vinham desde Tucuruí e rumavam para o pólo industrial de Barcarena. Detalhe: apesar dos linhões passarem por dentro da vila, Tailândia não desfrutava de eletricidade.

Mas por volta de 1985/86, a realidade local começou a se modificar. Foi nessa época que a PA-150 recebeu sua primeira camada de asfalto. E junto com a melhoria, chegava à Vila um novo agente: o madeireiro. A era das madeireiras estava começando em Tailândia.

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A Cidade Só Cresce

A Cidade Só Cresce

Vindos de outras cidades do Pará, como Paragominas, Jacundá, Tomé-Açu e Breu Branco, ou ainda de estados mais ao sul do país, como Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Espírito Santo, os madeireiros começaram a fincar as primeiras raízes em Tailândia em meados da década de 80. Seu surgimento ali se condicionava a dois principais motivos: o primeiro deles era a então recente camada de asfalto da PA-150, que havia facilitado bastante o tráfego de veículos pelo local e possibilitado, assim, um maior escoamento de mercadorias; o segundo motivo era a grande quantidade de árvores de madeira de lei existentes na região e que ainda não haviam sido exploradas.

O grande objetivo desses recém-chegados era o de enriquecer em uma atividade econômica cuja matéria prima estava por todos os lados – além de ser relativamente fácil de ser extraída. As serrarias foram estabelecidas no entorno da PA-150, rodovia chave para o escoamento da produção rumo ao Sul-Sudeste do país. São essas regiões as maiores consumidoras de madeira amazônica do mundo.

A partir daí, a população de Tailândia voltou a crescer vertiginosamente. A imigração, que nos primeiros anos da formação da Vila aconteceu em alta escala, calcada no boato que corria as

A Cidade Só Cresce

estradas estaduais de que Tailândia seria um lugar de prosperidade, acabou arrefecendo tempos depois, dando espaço até para o fenômeno contrário, o da emigração. Mas, novamente, em razão de mais uma benfeitoria na infra-estrutura – o asfaltamento da PA-150 e a consequente chegada das madeireiras –, a cidade passou a receber um novo surto de imigrantes.

Os trabalhadores vinham de outros estados do nordeste, sobretudo do Maranhão. Boa parte da população tailandense até hoje é formada por maranhenses, que chegavam e ainda chegam para oferecer sua força de trabalho na derrubada de árvores e nas serrarias.

Com a chegada de imigrantes sulistas e capixabas para empreender na exploração da madeira, seguida de uma leva de imigrantes maranhenses que vinham atrás de trabalho, a divisão social em Tailândia começava a ganhar rosto. De um lado, uma massa de gente parda, empregada no trabalho braçal, que chegava à Vila fugindo da miséria da suas cidades de origem. De outro, um pequeno grupo de pessoas de pele branca, olhos claros, proprietárias de serrarias e componentes da elite que ascendia no local.

Foi o papel exercido por essa elite emergente que fez com que Tailândia se transformasse nos anos seguintes. Em meados de 86, surgiram as primeiras mobilizações de moradores com intuito de reivindicar melhorias para a Vila, que até então possuía sua maior parte vinculada ao município de Acará e outra menor parte ao município de Moju. Associações começaram a se formar. Nasceram a ACITA (Associação do Comércio e Indústria de Tailândia), a AMATA

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(Associação dos Madeireiros de Tailândia), a AMOTA (Associação dos Moradores de Tailândia) e uma rival desta última, a AMUTA (Associação dos Moradores Unidos por Tailândia).

Lideranças locais passaram a se reunir com diversos políticos do Pará. Em um dos encontros, reivindicaram mais segurança policial, a construção de uma delegacia, a regularização da energia elétrica (já que o gerador que sustentava parte das casas estava em Moju e funcionava precariamente), e a criação de um posto médico (pois o problema na área de saúde era bastante grave, com falta de medicamentos e ambulâncias para a remoção de enfermos) 3 .

Ainda em 1986, os representantes das associações se reuniram em Belém com o então governador do Pará, Hélio da Mota Gueiros. O tema em discussão era a possível emancipação política de Tailândia. Depois do encontro, ficou acertada a realização de um censo demográfico na Vila, já visando ao cumprimento do desejo das lideranças tailandenses.

Dois anos mais tarde, após ainda a organização de um plebiscito local sobre a emancipação, um decreto de 10 de maio de 1988 finalmente alçava Tailândia ao posto de município paraense, medida também aplicada a outros 17 novos municípios do estado.

É importante citar que, por trás do lobby para que Tailândia fosse emancipada, ato que até certo ponto se justificava diante das proporções que a vila vinha ganhando, havia o interesse de membros das associações tailandenses em se aproveitar dos benefícios que o status de município proporcionaria, como a criação de diversos cargos públicos e do aporte de verbas estaduais e federais. 3 Documentos da AMOTA: Relatório de pedidos ao Sr. Governador do Estado do Pará, 23/09/1987. Arquivo pessoal da família Gouvêa. IN: PRADO, Francisca Ramos. O mito da cidade provisória: natureza, migração e conflito social em Tailândia (1977-2000). Belém, pág 95

Já emancipada, Tailândia passou a ver cada vez mais dinheiro circular dentro de seu perímetro com a intensificação da exploração econômica da madeira. A geração de renda aumentava. A elite madeireira, que já estava consolidada, e a nova classe média, oriunda dos empregos públicos e do comércio crescente, passaram a demandar mais melhorias e serviços da modernidade. Foi assim que, em 1990, chegou à Tailândia a telefonia privada. Também se realizaram na cidade, como fruto de reivindicações, a abertura de uma agência do Banco do Brasil, a iluminação da Avenida Belém, a instalação de telefones públicos, incrementos no posto de saúde e a ampliação do setor energético.

Em 1994, Tailândia, já com cerca de 20 mil habitantes, contava com apenas um gerador elétrico. Funcionários da unidade da Centrais Elétricas do Pará (CELPA) instalada na cidade realizavam um rodízio entre os seis bairros que até então existiam: a cada quatro horas, apenas um deles recebia energia. Essa medida gerava uma insatisfação muito grande entre a população, e, posteriormente, foi origem de uma grande revolta popular.

A questão era que os linhões de transmissão de energia da Eletronorte, que saíam da usina de Tucuruí, passavam por dentro de Tailândia, mas ainda assim a cidade não era abastecida por energia elétrica. Enquanto isso, o racionamento de energia, em razão da existência de um único gerador, criava um obstáculo tremendo para o bem estar da população e para o desenvolvimento econômico local.

O comércio era seriamente afetado, principalmente os estabelecimentos que dependiam de equipamentos que funcionavam por eletricidade, como freezers. Escolas também

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constantemente tinham suas atividades prejudicadas pelos cortes abruptos de energia nos momentos do rodízio. Na merenda escolar só era servida carne fresca. A diversidade alimentar na mesa dos tailandenses também era pequena, pois não havia modo de conservação. Nas serrarias, cada uma tinha que possuir seu próprio gerador a diesel.

Grande beneficiária do desenvolvimento econômico, a elite madeireira tailandense queria desfrutar de aparelhos eletroeletrônicos, como televisão, ferro, geladeira e ventilador, em uma região marcada pelo clima quente. E, somado a tudo isso, 1994 era ano de Copa do Mundo. Todos queriam assistir à seleção em campo, muitos até adquiriram antenas parabólicas para isso, mas com o rodízio de energia ficava tudo muito difícil.

É assim que as cobranças em cima dos funcionários responsáveis pela administração do gerador da cidade ficavam cada vez maiores. No dia 5 de junho de 94, com a interrupção de energia em um dos bairros por causa do racionamento, impedindo assim a transmissão de um amistoso do Brasil contra o Canadá, quatro moradores locais foram até a CELPA tirar satisfações. Como saldo dessa visita nada amistosa, o gerente responsável pela usina da cidade acabou espancado.

As ameaças de derrubar os linhões, que interromperia toda a energia da região metropolitana de Belém, começavam a circular pelo boca-a-boca. Algumas reuniões entre lideranças da cidade eram marcadas, com o objetivo de elaborar ações que chamassem a atenção do estado para o problema local de energia. Por duas vezes, a PA-150 foi fechada em manifestações organizadas. Como fruto dessa mobilização, a cidade recebeu novos motores para geração

de energia, mas que mesmo assim ainda eram insuficientes.Então, em outubro de 94, um novo bloqueio na PA-150 foi

planejado. Diversos personagens conhecidos da cidade estavam envolvidos, como o pároco local, o presidente do sindicato dos trabalhadores rurais, empresários e funcionários da Prefeitura. A manifestação estava marcada para uma quinta-feira, dia 27, mas logo na segunda-feira, três dias antes do previsto, um inesperado episódio pegou os tailandenses de surpresa: a ponte que atravessava o igarapé da cidade amanhecera pegando fogo.

Aquele acontecimento, fruto de uma ação unilateral de algum indivíduo ou grupo desconhecido, representou a primeira faísca em um barril de pólvora prestes a explodir. Logo a cidade se viu envolta em um transtorno generalizado que iria crescer ao longo do dia. Para conseguir superar o igarapé, os trabalhadores das serrarias, que iam para o trabalho de bicicleta, atravessavam pela parte baixa da ribanceira, bem próxima ao riacho. Quem passava por ali de carro ou de moto precisava pegar um desvio a 17 km da cidade, por meio de vicinais. Já os caminhões não tiveram muito o que fazer a não ser ficarem parados, formando uma enorme fila ao longo da pista. Boa parte do trânsito de mercadorias na PA-150 foi interrompido naquele 24 de outubro de 1994.

Parte da população começou a se aglomerar no local, e, com o passar do tempo, os ânimos ficaram mais exaltados. Instigadas pela insatisfação com o problema da energia elétrica e pelo crescente clima de protesto – que ganhou ainda mais tensão com a distribuição de bebidas alcoólicas feita por anônimos com intenções escusas –, algumas pessoas deram início a uma espécie de revolta popular.

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Quando a noite chegou, o movimento ganhou contornos de violência. Embriagados e bastante agressivos, os manifestantes rumaram incontroláveis para o supermercado do então prefeito de Tailândia, Francisco Alves Vasconcellos, popularmente conhecido como Chico Baratão. Lá, saquearam mercadorias. Na sequência, se deslocaram em direção ao hotel que também era de propriedade do prefeito, onde fizeram alguns hóspedes correr de medo. O comerciante Ibanês Brandão da Silva, conhecido como IBS, presente no local, tentou dispersar a multidão fazendo disparos para o alto. O resultado não poderia ser pior. A horda de revoltosos partiu então para a loja de eletrodomésticos do comerciante, onde promoveu saques e depredação. O prejuízo sequer pode ser contabilizado pelo seu dono: no dia seguinte, IBS foi assassinado por um manifestante contrariado pelos disparos no hotel.

Tailândia naquela noite ainda testemunhou mais destruição. A Prefeitura e a Câmara Municipal, que se encontram lado a lado, também foram alvejadas pela fúria dos revoltosos. Um poste e um relógio de energia do local foram danificados, deixando os dois prédios às escuras. O carro com o motorista do prefeito, que tentava dispersar a multidão acelerando em sua direção, foi amassado. A polícia em nenhum momento conseguiu conter aquele levante popular, mesmo tendo prendido 30 pessoas ao longo do dia.

Após esse protesto, bastante noticiado pela imprensa paraense e que marcou a história de Tailândia, o estado inteiro do Pará tomou conhecimento da situação da cidade. Mesmo assim, a questão energética continuou problemática, sendo solucionada apenas quatro anos mais tarde, em 1998, com a construção de uma subestação da CELPA no município.

A década de 90 também marcou a ascensão de um novo ramo econômico ligado à madeira na cidade. Foram as carvoarias. Surgiram depois que as siderúrgicas de ferro-gusa foram construídas em Marabá, no fim da década de 80 e início de 90. Era nesse município, a 300 km ao sul de Tailândia, que o carvão vegetal produzido pelos carvoeiros tailandenses chegava pela PA-150 para ser vendido e posteriormente usado na forja do ferro-gusa.

Assim, a produção de carvão vegetal aparecia como mais uma opção econômica para pequenos, médios e grandes produtores de Tailândia. Sua matéria prima é a lenha, que pode ser oriunda tanto das sobras das serrarias como diretamente de árvores da floresta.

Mas, diferentemente da prática de madeireiros que só derrubam árvores com uma espessura mais grossa, quem desmata para o uso em carvoarias o faz com árvores de espessura muito menor, sendo que estas representam boa parte da cobertura vegetal da floresta. Desse modo, seu efeito para o meio ambiente é extremamente devastador. Não é raro que áreas desmatadas para uso na carvoaria se tornem pastos logo em seguida.

É, portanto, em cima da extração da madeira, seja para elaboração nas serrarias ou para a produção do carvão vegetal, que Tailândia vai se forjar ao longo da história, dentro dos mais variados aspectos. Seja na formação da sua paisagem, do seu povo e de seus acontecimentos.

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Primeiras Impressões

Primeiras ImpressõesNo trecho urbano de Tailândia por onde passa a PA-150, duas

avenidas marginais ladeiam a rodovia. Ambas são conhecidas pelo nome de Avenida Belém, que conta com cerca de 1 km de extensão e cobre todo o vetor latitudinal da cidade, do início ao fim. Por ela se espalham diversos estabelecimentos comerciais, como supermercados, padarias, restaurantes, hotéis, lojas de construção, e, principalmente, lojas de autopeças.

De longe, são as autopeças as lojas existentes em maior número pela Avenida Belém. A razão reside na alta demanda da indústria madeireira local. Rolamentos, óleos, parafusos, fitas para serras elétricas e maquinários de serrarias são os bens mais requisitados. Também há nos arredores lojas especializadas apenas em moto serras, como uma chamada Chiquinho Motoserra. O número de hotéis distribuídos pela avenida é igualmente grande. Numa rápida caminhada de reconhecimento, é possível contar mais de dez. Muitos levam nomes que fazem alusão à imigração, como o Hotel da Mineira e o Hotel Sulista.

Ainda na avenida, é possível encontrar pontos de parada de vans, que viajam de uma cidade a outra. São dois pontos, um logo ao lado da rodoviária, o outro mais próximo do hospital. As vans

Primeiras Impressões

que chegam a Tailândia vêm de Belém e têm como destino final o município de Goianésia. Fazem também o caminho inverso. Trata-se de uma alternativa mais barata aos ônibus de linha para quem quer viajar.

Cortando a PA-150 pelo alto, duas grandes passarelas de pedestres marcam os limites do trecho urbano da rodovia. Ambas saúdam aqueles que cruzam o município com faixas que dizem: “Tailândia, 20 anos de progresso”. Apesar de bem iluminadas, elas só estão lá pra inglês ver: praticamente ninguém as usa. A população costuma fazer a travessia de um lado para o outro da cidade pela própria estrada, mesmo com o risco que o constante trânsito de carros, motos e caminhões oferece.

Quem chega de Belém a Tailândia vê logo à direita um grande posto de gasolina, o maior da localidade, com vários caminhões estacionados. Típico lugar para que viajantes façam refeições e descansem. Logo a seguir, há o prédio da Delegacia da Polícia Civil, onde também ficam os presos, seguido pelo prédio da CELPA, que já foi palco de muitas confusões no passado. Um pouco mais adiante, está Dona Lordes.

Residente da casa de número 88, de paredes vermelhas em tom pastel, Lordes Faria Nascimento varre a onipresente poeira de sua calçada. Senhora já idosa, de pele alva, contrastando com a maioria dos tailandenses de cor mulata, ela faz questão de dizer que seu nome se pronuncia “Lordes” e não “Lurdes”, como é chamada por todos. Duas crianças chegam e a cortejam como mãe. Logo fica evidente, pela tenra idade e traços físicos, que não são filhos biológicos.

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Dona Lordes diz abrigar em sua casa 32 pessoas, entre crianças, adolescentes e jovens. Todos seus filhos adotivos. Ela diz saber o nome de cada um, mas que nem sempre acerta logo de primeira quando chama algum deles. O mais velho tem 23 anos, o mais novo, oito meses. Este último é filho de uma menina também considerada filha adotiva, que foi expulsa da casa da mãe biológica por haver engravidado precocemente. Assim, o filho da filha também virou seu filho. Há também outros seis filhos biológicos, já bem mais velhos. Todos moram em Tailândia e possuem comércio próprio. Um deles é dono da Danyslar, conhecida loja de material de construção local, e que conta com várias unidades na cidade.

Sua casa é grande. Tem por volta de oito espaçosos cômodos e é circundada por uma cerca de madeira, bem ao estilo daquelas desenhadas por crianças. A atual residência foi um presente de Paulo Jasper, o “Macarrão”, o último e mais popular prefeito que a cidade já teve. Antes, vivia em uma casa menor – que hoje é a sede do Conselho Tutelar –, mas desde sempre já tinha o costume de tomar pra si crianças abandonadas. Sua fama em Tailândia é tanta que o próprio Conselho Tutelar, sempre que encontra um menor vagando sem rumo pelas ruas, o encaminha diretamente para Dona Lordes. Ela então se encarrega de dar abrigo, até que os pais apareçam para buscá-lo. Se ninguém aparece, ele acaba ficando.

Dona Lordes está na cidade há cerca de 30 anos, desde o início da formação da Vila de Tailândia. Veio com o marido de Capanema, outra cidade do Pará. Criavam gado.

Para o sustento de todas as crianças, ela diz receber leite da Prefeitura. Enquanto fala, um rapaz que vinha pela calçada a interrompe. Veste roupas sujas, um boné torto na cabeça, dois

chinelos maltrapilhos. Seu corpo exibe desnutrição, seu peso deve ser algo próximo a 50 quilos e um olho parece cego. Aparenta uma vida bastante maltratada. Pede justamente por leite a Dona Lordes. Ela imediatamente chama uma de suas filhas, e ordena que traga dois litros congelados. Questionada se costuma fazer isso sempre, diz que algumas pessoas têm o hábito de ir até sua casa pedir pelo laticínio. Se sobra algo do mês, ela dá. A filha chega com o leite. Na falta de sacola plástica, o homem vai embora, carregando os dois saquinhos congelados com as próprias mãos.

A temperatura é alta. O calor urge um copo de água. Na sala, vários objetos contam um pouco sobre Dona Lordes. Há uma estátua de santa, um retrato de Jesus, várias fotos de seus filhos biológicos pendurados na parede, além de um quadro em homenagem a ela própria. Uma mulher de pele morena, mais velha, que não aparenta ser sua filha, assiste à TV sentada no sofá.

O copo d´água é trazido por uma de suas filhas em um prato, como se fosse um serviço de mordomia. Água gelada, das boas, daquelas que revigoram as energias. A conversa em sua casa continua até as perguntas irem ficando escassas. Silêncios passam a ser mais frequentes. Dona Lordes retorna então às suas tarefas domésticas.

O verão, para os habitantes de Tailândia e do resto do Pará, começa em setembro. Estende-se até dezembro, para então começar o inverno, que vai de janeiro a agosto. A diferenciação de uma estação e outra, que prescinde de outonos e primaveras, se dá por questões pluviais: enquanto no verão as chuvas são escassas, no inverno elas são praticamente diárias. Daí que vem o costume no estado, estranho pra quem vem de fora, de se marcar compromissos para “depois da chuva”.

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A alternância das duas estações afeta Tailândia econômica e socialmente. Os agricultores precisam organizar suas semeações até dezembro, último mês antes do inverno e do início das chuvas, o que implica na realização da queima de sua área para plantio, técnica conhecida como coivara.

É também durante o inverno que o setor madeireiro funciona em um ritmo mais lento. Isso porque, no tempo chuvoso, a extração de madeira de dentro da floresta se torna mais difícil e perigosa. Com o forte vento, é comum que galhos caiam em cima dos operadores de motosserra ou de seus ajudantes durante a derrubada de árvores. Desse modo, não são raras as mortes durante o trabalho.

A chuva também torna mais difícil o processo de puxar as toras já derrubadas para o caminhão. O transporte, feito em vicinais de terra batida, fica bastante comprometido. Por isso, durante o inverno, as serrarias têm menos madeira para trabalhar, e o número de empregados diminui.

Outro problema que aparece em Tailândia juntamente com as chuvas diárias acontece na região da Avenida Belém. É o mau cheiro. Isso porque, entre a avenida e a PA-150, de ambos os lados, dois canais de esgoto correm a céu aberto. Em dia de chuva, dizem os moradores, os canais transbordam e o resultado é possível de se imaginar.

Urubus são outros elementos que também abundam no trecho urbano da PA-150. Estão em vários lugares, principalmente vasculhando as caçambas espalhadas em vários pontos, que, ao que parece, são depósitos de lixo doméstico. As aves se encontram sempre em grupos de pelo menos cinco, buscando incessantemente

por comida. Vez ou outra, têm a sorte de encontrar algum animal atropelado na estrada.

Cachorros abandonados também vagam por todas as partes. Mas, diferentemente dos urubus, esses não possuem a vantagem do vôo. Restam-lhes, assim, perambular atrás de alimentos em lixos ou esperar por alguma boa alma que lhes dê alimento, como tripas jogadas pelo dono de um açougue.

Um traço bastante característico de Tailândia é o número de motos que circulam pelas ruas e vicinais. São elas o principal meio de transporte motorizado local. Praticamente nenhum motociclista faz uso de capacete e todos garantem que não há problema com fiscalização. Os únicos a usarem capacetes são os moto-taxistas, que existem em um bom número e possuem vários pontos espalhados pela Avenida Belém. Estão sempre devidamente uniformizados e contam com uma associação própria na cidade. Em Tailândia, são bastante respeitados, muito em razão do forte senso de união existente entre os membros da categoria, assim como acontece nos demais estados do país. O preço da corrida sai por três reais, a qualquer hora do dia, para qualquer destino. Há capacetes para os passageiros, mas que, na maioria das vezes, acabam carregados pelo braço.

Talvez a marca mais surpreendente para um viajante recém-chegado em Tailândia seja o grande número de caminhonetes importadas que trafegam pela cidade. A todo o momento, estão circulando pela PA-150 ou cruzando pela Avenida Belém, muitas vezes sujas das estradas de terra. Dentro delas, estão os médicos do hospital, o juiz do Fórum local, e principalmente, os donos de

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serrarias e carvoarias da região. São com elas que seus donos dirigem vicinais adentro, enfrentando terrenos irregulares que só são vencidos por carros de tração nas quatro rodas. São Pajeros Mitsubish, Hilux, Land Rovers e Ford Rangers, todas avaliadas em mais de 100 mil reais e munidas com equipamento de ultima geração, como aparelhos de GPS.

Outro meio de transporte bastante usado, talvez o mais popular, em total contraste com as caminhonetes importadas, é a bicicleta. Como Tailândia não possui um sistema público de transporte coletivo, é com elas que boa parte da população se desloca para os locais de trabalho. A vantagem para esses ciclistas é que o terreno da cidade é praticamente plano. Logo pela manhã, por volta das sete e meia, é notório o aumento do tráfego de bicicletas nas ruas, principalmente sobre a ponte que passa sobre o córrego. É por esse caminho que se alcança as serrarias espalhadas pela PA-150, no lado sul.

Com esse cenário, entre caminhonetes importadas, bicicletas de trabalhadores, motociclistas sem capacete, urubus e cachorros famintos, o forasteiro rabisca suas primeiras impressões de Tailândia. Impressões, é claro, que vão mudando ao longo do tempo.

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As primeiras madeireiras chegaram ao Pará nos anos 70, mas foi só na década seguinte que esse processo realmente se intensificou, dando origem aos primeiros pólos madeireiros do estado. Um deles se formou em Tailândia.

Em 1998, um ranking4 apontava a cidade como o quarto maior pólo madeireiro paraense, com 44 madeireiras, atrás apenas de Paragominas (155), Tomé-Açu (52) e Jacundá (50). Não foi à toa que o município ficou conhecido como “a capital da madeira”, alcunha também emprestada a outras localidades da região.

Normalmente, a exploração da madeira para beneficiamento (aquelas que irão ser serradas) acontece em fazendas próprias para essa finalidade, cujo proprietário negocia a exploração de determinada área com os donos das serrarias. Trabalhadores contratados adentram a mata pertencente à fazenda, munidos de motosserras. Um trator tem o trabalho de puxar as toras derrubadas do meio da floresta até um espaço mais aberto e um caminhão se encarrega de fazer o transporte até as serrarias. O corte é seletivo, ou seja, apenas as árvores de valor comercial é que são postas abaixo. Elas se distinguem das demais pelo maior diâmetro de seus 4 Pólos Madeireiros do Estado do Pará. A. Veríssimo, E.Lima e M. Lentini; Belém: Imazon 2002

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valores, a tora de uma árvore adulta chega a ser vendida por 10 mil reais, sendo que é possível a derrubada diária de 10 a 12 toras se o tempo estiver bom. Fazendo as contas, dá para perceber o porquê que tanta gente busca ingressar nesse ramo.

Além das serrarias, outro tipo de atividade ligada à madeira é a carvoaria. Essa atividade, como já dito, começou a despontar em Tailândia na década de 90, impulsionada principalmente pelas siderúrgicas de Marabá, a 290 km ao sul.

As siderúrgicas apareceram naquela cidade no fim da década de 80, em decorrência da introdução do Projeto Grande Carajás. Tratava-se de um projeto que visava explorar as jazidas de minérios na região e que contou com forte incentivo do Governo Federal à época. São as siderúrgicas as responsáveis por produzir o chamado ferro-gusa, um produto gerado da redução do minério de ferro em fornos industriais. O ferro-gusa também é o principal elemento primário para a elaboração do aço, sendo assim bastante importado pelos Estados Unidos, Europa, China e outros países.

O combustível utilizado nos fornos das siderúrgicas de Marabá é o carvão vegetal, que tem a madeira como matéria prima. Diferentemente do carvão mineral, encontrado em jazidas e cuja oferta no Brasil é bem pequena, o carvão vegetal existe em abundância por motivos óbvios: basta haver árvores para que ele seja produzido.

A primeira etapa da produção do carvão vegetal é o desmate da vegetação para o acúmulo de lenha. Em seguida, a lenha é levada para um forno conhecido como “rabo-quente”. Feito de tijolos e

troncos.Uma serraria, basicamente, tem a função de transformar toras

de madeira em partes menores, como tábuas e pranchas, que posteriormente serão comercializadas. A maior parte tem como destino final fábricas do Sul e Sudeste do país.

São vários os tipos e tamanhos de serrarias, mas as mais comuns existentes no Brasil costumam ter o seguinte maquinário: uma serra de fita para desdobro (corta a tora em fatias), uma canteadeira multiserras (corta a prancha do desdobro em peças mais estreitas e retilíneas), uma resserra de fita (divide as pranchas canteadas em peças mais finas), uma serra destopadeira ou de pêndulo (para cortar as peças no comprimento desejado), e uma plaina multiface (para alisar as peças que já passaram pelos processos anteriores). Há ainda uma oficina de manutenção, que tem a tarefa de manter as serras sempre afiadas e em bom funcionamento.

Em seguida, a madeira dita “beneficiada”, sobretudo a que tem como destino o mercado externo, normalmente é mergulhada em um tanque com solução fungicida, buscando assim evitar o aparecimento de parasitas. A secagem da madeira em geral se dá em varais ao ar livre, mas algumas usam estufas para acelerar o processo. As sobras (casca, serragem e outros pedaços), quando não reaproveitadas para outras atividades, costumam ser queimadas e transformadas em cinzas.

Para se ter uma ideia dos lucros que esse negócio pode gerar, o metro cúbico de Ipê, uma das árvores mais valiosas, é vendido pelo fazendeiro ao dono da serraria por 400 reais. O metro cúbico da Maçaranduba, outra árvore bem cotada, sai a 270 reais. Com esses

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estão sempre à beira da rodovia. Desse modo, elas evitam que a grande quantidade de fumaça da queima da lenha lançada no ar cause transtornos para a população caso estivessem próximas à cidade. A legislação5 determina uma distância mínima para a localização das carvoarias em relação à área urbana. Alguns fornos de carvão também são achados junto aos pátios das serrarias. Estão lá para aproveitar as sobras de madeira, descartadas durante o processo de serragem.

Diariamente, várias carretas partem de Tailândia carregadas de centenas de quilos de carvão vegetal rumo a Marabá. A demanda pelo produto é consideravelmente alta. Assim como a serragem de madeira, as carvoarias também se apresentam como um negócio bastante rentável para seus proprietários.

No Pará, a atividade madeireira acontece de forma quase que totalmente irregular. Estatísticas6 do ano de 2009 mostram que 89% da madeira extraída do estado têm origem ilegal. As fraudes com licenças de exploração e a corrupção dos órgãos públicos responsáveis pela fiscalização são extremamente comuns. De acordo com o Código Florestal Brasileiro, fazendas que estão dentro do bioma da Amazônia precisam manter 80% de sua área intacta, podendo explorar apenas 20% (para efeito de comparação, na Mata Atlântica a reserva legal protege apenas 20%). Para se desmatar seguindo os parâmetros da lei, é necessário que o proprietário realize o Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS). Trata-se de um procedimento que busca fazer da exploração da madeira uma atividade racional e sustentável, normalmente elaborado por um técnico florestal. Basicamente, esse plano vai definir as áreas da 5 RESOLUÇÃO/COEMA Nº 025, de 13 de DEZEMBRO DE 20026 “Madeira tem origem 89% ilegal” 08/11/2009 Folha de S.Paulo

com o formato que lembra o de um iglu, esse forno tem sua parte interna completamente preenchida pela lenha antes desta começar a ser queimada. Esse processo é mantido por aproximadamente 24 horas. A entrada é tampada com barro e alguns orifícios no teto permitem que a fumaça saia. A lenha, depois de queimada, resulta no chamado carvão vegetal, detentor de um alto teor calórico e que será usado nos fornos industriais das siderúrgicas. Existem tanto grandes carvoarias, com homens trabalhando para uma única pessoa, quanto carvoarias pequenas, cujos donos são quem executam o trabalho.

O grande problema que reside neste tipo de atividade está no fato de que praticamente qualquer árvore pode ser destinada à produção de carvão vegetal, já que o tronco para a lenha não precisa ser tão espesso. Dessa forma, o desmatamento causado pelas carvoarias é muito mais predatório que aquele causado pelas serrarias, pois estas últimas praticam o corte seletivo, preservando as árvores de troncos de menor espessura. A destruição por causa do carvão vegetal é tão grande que não é raro que uma área que foi desmatada para o acúmulo de lenha se torne em seguida pasto para gado.

Outro grave malefício que a atividade do carvoejamento gera é a deterioração da saúde de quem trabalha nos fornos. Esses trabalhadores, responsáveis pelo manuseio da lenha e do carvão vegetal, tendem a respirar bastante fumaça tóxica que se dissemina durante o processo da queima. Também impressionam pela aparência imunda por conta da sujeira do carvão.

Geralmente, as carvoarias se encontram mais para o interior da zona rural, em meio a vicinais, diferentemente das serrarias que

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propriedade que podem e não podem ser exploradas, conter um levantamento das características do lugar (fauna, flora, hidrografia, topografia) e um inventário com diversas informações de todas as árvores que serão derrubadas (espécie, diâmetro, altura), além de um cronograma de exploração e de um plano de reposição florestal. É com base no PMFS que o Ibama ou o órgão ambiental responsável concede um número determinado de créditos florestais para o interessado na exploração da madeira. A cada árvore derrubada, esses créditos diminuem. Depois de terminados, é necessária uma nova aprovação para que se continue a desmatar.

Entretanto, há algumas formas corriqueiras para se fraudar esse sistema. Uma delas é apresentar uma PMFS de uma área já desmatada. Se conseguida a aprovação, o madeireiro então retira madeira de outra área, de forma ilegal, mas alega que as toras saíram da área aprovada. Outro modo de driblar a lei é conseguir a aprovação de exploração para uma determinada área, mas desmatar outra. Isso costuma acontecer quando a área desmatada ilegalmente está numa localização melhor do que aquela que foi aprovada. E há ainda os casos em que a ilegalidade opera com a corrupção dos agentes públicos mediante propina.

Outro grande problema da atividade madeireira que acontece tanto nas serrarias quanto em carvoarias reside nas relações de trabalho. Não é raro que se encontrem trabalhadores sem carteira assinada, operando em condições de segurança bastante precárias. Acidentes de trabalho não são raros. No caso das carvoarias, regularmente casos de trabalho infantil e/ou escravo são flagrados pela fiscalização. Apesar de algumas empresas do ramo da madeira funcionar dentro das normas exigidas pela legislação trabalhista,

infelizmente a maioria não o faz.A madeira também já foi e ainda é uma grande fonte de violência.

Desprovidas de terras e bens e ávidas por qualquer tipo de trabalho, algumas pessoas são pagas por um madeireiro para penetrar áreas de terceiros, derrubar as árvores locais e em seguida repassá-las à serraria de seu financiador. Esses indivíduos são chamados de “sem-tora” e se encontram numa atividade extremamente perigosa. Perigosa porque podem ser vítimas a qualquer momento de pistoleiros de aluguel. Como as fazendas de extração de madeira são estabelecidas em áreas enormes, essas invasões podem demorar a serem descobertas por seu proprietário formal. Mas quando isso acontece, pistoleiros são então contratados com o objetivo de intimidar os invasores para que deixem o local, de forma muitas vezes aterrorizante. Nesses casos, a ocorrência de assassinatos é comum.

Em Tailândia, os conflitos sempre foram presentes. No início, as disputas aconteciam pelas terras de melhor localização em relação à PA-150. Mas, com a ascensão da indústria madeireira, elas também passaram a ocorrer por causa das áreas com madeira comercial. Foram disputas que geraram muitas mortes, pobreza e corrupção.

Era muito comum, de acordo com alguns trabalhos históricos realizados sobre a cidade, o assassinato de forma banal, fruto de brigas por terra. Não tinham hora nem local apropriado para ocorrer: às vezes, aconteciam à luz do dia, na cidade, como em bares e vias públicas, outras vezes, na zona rural. E, de uns tempos pra cá, os acampamentos de sem-tora também vêm sendo palco para homicídios.

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Toda essa cultura do uso da violência para resolver desavenças pessoais parece ter criado raízes em Tailândia. Um forte indício dessa constatação é o resultado de um estudo de 20087 , que traz uma lista dos municípios mais violentos do Brasil, entre os anos de 2004 e 2006. Tailândia aparece nessa lista como o sexto município brasileiro de maior taxa de homicídios, com 96,2 assassinatos a cada 100 mil habitantes. Trata-se de uma estatística bastante significativa. Para o cemitério local já se planeja uma segunda ampliação de sua área, pois o número de covas já está atingindo o limite. Em grande parte delas, é possível ler nas lápides improvisadas que vários dos mortos enterrados eram jovens.

7 Julio Jacobo Waiselfisz - Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros 2008

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Na margem esquerda da avenida Belém, no sentido sul, próximo ao fim da cidade, fica a Praça do Povo, grande cartão postal de Tailândia. Lugar bastante agradável, com bancos, coretos e árvores bem cuidadas. Há ainda uma quadra de vôlei de areia e uma cesta de basquete pra quem gosta de praticar esportes. Aos domingos e sábados à noite, o movimento no local se intensifica. Vendedores de CDs e DVDs espalham suas banquinhas e vendem seus produtos a cinco reais a unidade. Carrinhos de cachorro quente, de espetinhos e de outros quitutes também estão lá em bom número.

Uma TV com o volume alto mostra a pregação de um pastor evangélico. Logo adiante, o sermão é tragado pelo som de uma música brega que sai de autofalantes mais potentes. Ao fundo da praça, cruzando a rua, fica uma movimentada churrascaria, onde é oferecida comida por quilo. Funciona no horário do almoço e jantar, todos os dias, com exceção da quarta-feira. Uma ótima saída para viajantes hospedados em hotéis próximos.

A quadra de vôlei de areia, como sempre, está cheia. Meninos jogam basquete na única tabela existente. Os bancos abrigam casais de jovens paquerando uns aos outros. A boa iluminação torna o lugar bastante agradável para que famílias passem a noite

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de Tailândia, onde estão presentes o presidente do Tribunal de Justiça do Pará e outras autoridades, além da imprensa, ele se veste a caráter, com direito a paletó e gravata. Durante o horário do expediente, muita vezes se encontra ocupado com reuniões com secretários, com despaches, ou ainda tentando resolver impasses relacionados a concursos públicos.

Gilbertinho, como muitos ali na cidade, é sulista. Ostenta pele e olhos bem claros, cabelos grisalhos e 56 anos de idade. Natural do interior do Rio Grande do Sul, cresceu em Santa Catarina e já morou no Paraguai, antes de se mudar para o Pará. Possui as características do típico aventureiro, aquele que vaga por vários lugares atrás de prosperidade. É dele uma das maiores serrarias locais, a GM Sufredini Industrial. Gilbertinho também é pioneiro em um projeto de reflorestamento, que envolve espécies nativas, exóticas e frutíferas de vegetação. Iniciativa que começou em 1995 e logo foi seguida por outros madeireiros. Hoje já existe a Associação Reflorestadora de Tailândia, que diz plantar em uma área de mais de mil hectares.

Na antiga gestão municipal de Tailândia, Gilbertinho ocupava a chefia de uma das secretarias municipais. Era subordinado do homem que de longe é a figura mais popular de Tailândia, o ex-prefeito Paulo Jasper “Macarrão”, cuja popularidade é tão alta que até um bairro batizado com o seu apelido foi criado: a Vila Macarrão, o mais populoso da cidade. Gilbertinho foi indicação de Macarrão para as eleições municipais de 2008. Ganhou com 40% dos votos.

Na ante-sala do gabinete do prefeito, estão Reginaldo e Jorge, chefe e assessor de gabinete, respectivamente. Parecem estar sempre ocupados com telefonemas ou tarefas no computador,

juntamente com as crianças, que brincam sobre uma cama gigante de ar. No verão, quando não há chuva, sentar na praça para curtir a brisa noturna que corre no local é uma excelente alternativa pra se refrescar do calor.

Outra função que a Praça do Povo exerce é a de dormitório. Muitos que não têm um teto pra dormir procuram o abrigo do coreto à noite. Durante o dia, em uma dos cantos, alguns desamparados tentam esquecer o tempo na bebida alcoólica. Em Tailândia, eles são chamados de “pés-inchados”.

No alto do mesmo coreto, está instalada uma antena que gera acesso gratuito à Internet, por meio de conexão em rede sem fio. Trata-se de um projeto pioneiro na cidade. A área de abrangência da rede, entretanto, se reduz apenas às redondezas da praça, e só quem está na região central pode fazer uso desse benefício.

Bem em frente à Praça do Povo, no sentido oposto à Avenida Belém, está a Prefeitura Municipal de Tailândia. É lá que todos os dias pela manhã o prefeito Gilberto Sufredini dá seu expediente, num horário em que o prédio costuma estar cheio de moradores atrás de algum auxílio. O período matutino é o único aberto ao público.

Sufredini é conhecido por todos como Gilbertinho. Dono de um jeito extremamente simples, de um bom humor e de um leque de piadas que lança uso a qualquer momento. Costuma chegar ao trabalho com sua Pajero logo cedo, por volta das oito da manhã. Não gosta de se ater muito às formalidades, por isso tem o hábito de ir trabalhar de bermuda, chinelo e barba por fazer. Mas quando a situação pede, como a solenidade da reinauguração do Fórum

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uma festa de casamento. Com ele, chegaram em Tailândia no fim da década de 1980, para, assim como muitos, também empreender na exploração de madeira.

Logo quando chegou, Mary diz que não queria ficar de jeito algum. Àquela época, a cidade contava com mínima infra-estrutura, prescindindo inclusive de energia elétrica em tempo integral. Mas o tempo foi passando, e a ideia de viver ali naquela região da Amazônia foi aos poucos sendo aceita.

Tanto sua graduação como mestrado foram em artes e educação. Desde sua chegada na cidade, sempre trabalhou nas questões relacionadas ao ensino. Diz que não queria ficar parada sem exercer nenhuma atividade, e foi aí que começou a se envolver com a educação de Tailândia. Viu e auxiliou no crescimento do número de escolas na aérea urbana e rural. Foi por muito tempo diretora pedagógica do ensino médio. Sua fama pelo trabalho que sempre exerceu não é pouca: tanto é que mesmo seus colegas de trabalho continuam tratando-a por “professora”.

O ano de 2009 foi difícil para a Prefeitura de Tailândia, financeiramente falando. Como outros municípios pequenos do Brasil, seu orçamento depende quase tão somente dos repasses dos diversos fundos nacionais geridos pela União. Há repasses oriundos do Fundeb (voltado para a educação), do FNS (Fundo Nacional de Saúde) e, principalmente, do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), que é de onde a Prefeitura tira o grosso do seu dinheiro para pagar despesas com pessoal e serviços.

Outro meio para se arrecadar verbas é com obras do PAC (Programa

principalmente na parte da manhã, quando o movimento interno é maior. São eles que recebem todos aqueles que desejam conversar com Gilbertinho. O entra e sai na sala costuma ser constante.

Reginaldo, o chefe de gabinete, diz ter chegado em Tailândia bem no seu início, em 1978, quando ainda era bebê. É natural do Pará mesmo e veio junto com seu avô, que chegou para trabalhar com agricultura, e, “graças a Deus, não com madeira”. Tem cerca de trinta anos. Inteligente, articulado e dono de opiniões bastante convictas sobre certos temas, Reginaldo trabalhava até 2008 na unidade local da Cosanpa (Companhia de Saneamento do Pará), e diz que só soube que assumiria o cargo atual na Prefeitura apenas um dia antes da nova gestão tomar posse.

Jorge, seu fiel escudeiro, ocupa a mesa logo ao lado. É ele o responsável por atender aos telefonemas do gabinete, que não costumam ser poucos. Vascaíno, de apenas 23 anos, já residiu em Paragominas, e costuma ser bastante solícito com aqueles que o requisitam.

Vira e mexe, quem entra na sala de acesso ao gabinete é a secretária de administração municipal, Mary Elisa, considerada a cabeça da Prefeitura. Praticamente todas as informações da gestão estão centralizadas nela. Certas perguntas a respeito do funcionamento da Prefeitura é só Mary que sabe responder. Desde a gestão anterior que ela ocupa o mesmo cargo, fator que contribui para todo conhecimento acumulado.

Mary é outra imigrante sulista. Natural de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, cursou universidade na cidade paranaense de Maringá. Foi naquele estado que conheceu seu atual marido, em

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escolar de crianças da zona rural. Também é de sua alçada arcar com todos os gastos dos postos de saúde espalhados pelos bairros, além do hospital da cidade, que conta com 15 a 20 médicos, mais estagiários e enfermeiros.

O hospital, uma edificação de andar único, situado bem em frente à Prefeitura, mas do outro lado da PA-150, também faz atendimento de emergência. E todo o dia é a mesma situação. Como quase todos os hospitais da rede pública no Brasil, logo pela manhã, por volta das seis e meia, ele já se encontra lotado. Praticamente todas as pessoas amontoadas à espera de serem atendidas são mulheres, sentadas ao longo de compridos bancos de madeira, muitas vezes trazendo o filho pequeno no colo. Só uma minoria é composta por homens. Tailândia já tem pronto um prédio que abrigará um novo hospital, estadual, bem maior que o único existente. Sua inauguração, que prescinde de apenas alguns detalhes para que aconteça, é bastante aguardada pelos tailandenses.

Como a ampla maioria dos municípios brasileiros, os problemas estruturais urbanos de Tailândia não são poucos. Apenas as ruas da região central e de parte do bairro Aeroporto são asfaltadas. Já a Avenida Belém é feita de bloquetes. Todas as demais vias públicas são de terra batida com pedra, arranjo também conhecido como “piçarra”. Isso explica a alta quantidade de poeira que circula pelos ares da cidade, dificultando a vida de quem é alérgico. Nas casas mais distantes do centro, não há cobertura de rede de esgoto. Longe de ser privilégio da cidade, essa constatação só confirma a estatística8 que diz que mais da metade dos brasileiros não contam com saneamento básico.8 Trata Brasil: A Falta que o Saneamento Faz/ Coordenação Marcelo Côrtes Neri. - Rio de Janeiro: FGV/IBRE, CPS, 2009.

de Aceleração do Crescimento). O IPTU, que costuma ser o imposto municipal de maior arrecadação das cidades, inexiste. Desde 2001, os tailandenses estão isentos de pagá-lo, numa tentativa de incentivar a regularização fundiária urbana. Segundo dados da administração, já existem cerca de seis mil títulos de propriedade, mas a ampla maioria dos terrenos de Tailândia ainda não está regularizada.

No intuito de amenizar os efeitos do impacto da crise econômica global na economia brasileira, o Governo Federal, em 2009, reduziu e até isentou o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de alguns setores da indústria nacional – como a indústria automobilística, que mesmo tendo batido recordes de lucro nos anos anteriores, ainda assim foi contemplada com o benefício – com o objetivo de manter os níveis de produção estáveis. Essa redução do IPI resultou também na redução do valor arrecadado no FPM, pois este fundo é composto majoritariamente pelo dinheiro arrecadado daquele imposto. Deste modo, os repasses para os mais de 90% de municípios brasileiros, que dependem do FPM, minguaram. Tailândia também sofreu o golpe.

Assim, com esse déficit inesperado em seu orçamento, havia até a dúvida sobre se os salários dos funcionários públicos municipais conseguiriam ser pagos. Para agravar a situação, há ainda uma herança “maldita” da gestão anterior, que foi um concurso público realizado para contratar mais servidores. A convocação ficou para a nova gestão, o que significou mais despesas. Mesmo assim, a Prefeitura tenta se virar como pode. Um exemplo foi uma parceria fechada com o governo estadual para fazer o recapeamento da PA-150 no trecho urbano, que está bastante debilitado.

É a Prefeitura responsável pela coleta de lixo e pelo transporte

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do Bolsa Família. Trata-se de exigências para que a família continue cadastrada no programa. O índice mínimo de comparecimento às aulas é de 85% para crianças de 6 a 15 anos e 75% para adolescentes de 16 a 17 anos. No caso das gestantes, também é obrigatório que façam o pré-natal.

Todos os dados são então repassados aos funcionários do Bolsa Família, que ficam responsáveis por fazer o controle e atualizar os cadastros. De acordo com Osvaldo, é graças às exigências do programa que grande parte das famílias mantém seus filhos na escola e segue o calendário de vacinas de forma adequada.

Além das famílias, os funcionários do Bolsa Família também precisam seguir exigências. Eles devem acompanhar periodicamente 88% dos beneficiários, na tentativa de manter um nível mínimo de eficiência do programa. O responsável por fiscalizá-os é o Tribunal de Contas da União (TCU).

Osvaldo também conta que a maior parte dos casos que atende em sua sala é de gente que tem problema com o bloqueio dos cartões. Mas isso, segundo ele, se deve à desinformação ou à falta de atenção desses beneficiários, que, na maioria das vezes, não comparecem para realizar o recadastramento dentro do prazo ou no momento em que mudam de cidade. Diferentemente das gestões passadas, que sempre foi muito centrada no assistencialismo acirrado, para o coordenador do Bolsa Família de Tailândia, a nova administração municipal preconiza medidas de inclusão social, como as de geração de renda e as voltadas para a educação. Assim, projetos como o EJA (Educação de Jovens e Adultos), o PROJOVEM (Programa Nacional de Inclusão de Jovens) e os de inclusão digital tem tido uma atenção diferenciada. O que não impede que se pratiquem políticas

Um dos departamentos mais importantes da Prefeitura é o do Bolsa Família. Localizado junto à secretaria de Ação Social, onde também são feitos atendimentos odontológicos, o Bolsa Família é uma referência para muitos tailandenses. Lá está Osvaldo, um dos coordenadores do programa. Na sala onde trabalha, estão mais cerca de cinco funcionários, todos bastante empenhados na causa, segundo ele. Do lado de fora, bem em frente à sala de trabalho, mais de uma dezena de mulheres, muitas carregando os filhos, esperam para serem atendidas. Conversam em tom de lamento sobre o fato de seus cartões do Bolsa Família estarem bloqueados.

Com sua voz de barítono, Osvaldo conta que em Tailândia são cerca de 5.500 famílias beneficiadas pelo programa, o que representa cerca de 13.800 pessoas. Em termos de valores, em agosto de 2009, os contemplados do Bolsa Família receberam 478 mil reais na soma total. Em setembro foram 525 mil reais.

Em abril de 2009, o programa passou por um reajuste nos valores que delimitam as duas categorias de famílias que recebem os benefícios. A primeira categoria passou a abranger famílias com renda mensal de até 70 reais por pessoa (antes do reajuste, era até 60 reais). A segunda passou a abranger famílias com renda mensal entre 70 e 140 reais (antes era entre 60 e 120 reais). Com esse reajuste, mais gente pode ser contemplada pelo Bolsa Família. No caso de Tailândia, em setembro, existiam mais de 7.600 pessoas cadastradas que se enquadravam nos critérios exigidos para ganhar o benefício mensal, mas que ainda não o recebiam.

Funcionários da secretaria de Ação Social são responsáveis por monitorar, junto às escolas e postos de saúde, o desempenho escolar e o recebimento adequado de vacinas dos filhos dos beneficiários

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está inserido no programa estadual “Um Bilhão de Árvores para a Amazônia”, lançado em 2008, que pretende plantar esse número de árvores em um prazo de cinco anos.

Alguns quilômetros adiante do viveiro municipal, seguindo pela PA-150, está uma fábrica de laticínios com oito empregados, outro empreendimento sob tutela da gestão municipal. Todos os dias a Prefeitura compra leite de cerca de 70 produtores da região, para então transformá-lo em derivados e, posteriormente, distribuí-los nas escolas de Tailândia. Funcionários da Secretaria do Meio Ambiente, cuja sede fica ao lado da fábrica, dizem que a arrecadação gira em torno de 4.500 litros de leite por dia. A Prefeitura paga 70 centavos por cada litro. Para quem planta grãos, há ainda no local um silo, também da Prefeitura, usado para a secagem de cereais.

Talvez o fenômeno mais marcante que tem ocorrido recentemente na agenda política dos administradores de Tailândia seja a crescente preocupação com as questões ambientais. Símbolo disso foi a criação em agosto de 2008 da Secretaria do Meio Ambiente, assunto que até então era tratado com menor prioridade em outra pasta. Em uma cidade que, assim como o resto do Pará, sempre seguiu a tônica do desmatamento inconsequente e da degradação ambiental ao longo de sua história, é bastante sintomático constatar essa mudança de postura de seus dirigentes.

Não se pode ignorar, entretanto, um acontecimento de grandes proporções ocorrido no município e que foi responsável direto por essa nova mentalidade. Acontecimento esse que pegou Tailândia desprevenida, deixando marcas profundas em seus moradores.

assistencialistas, necessárias, como a realizada por funcionários da Ação Social, que distribuem sopa gratuitamente em três pontos distintos da cidade.

A Prefeitura também mantém alguns projetos próprios. Um deles é uma confecção que produz uniformes escolares e enxovais de bebê para famílias mais necessitadas. Há outra iniciativa, ligada ao setor madeireiro, que é uma fábrica de briquete, responsável por reaproveitar resíduos de madeira que não teriam mais utilidade. O funcionamento se dá da seguinte forma: o pó de madeira gerado dentro das serrarias é coletado pelos funcionários da Prefeitura. Posteriormente, ele é peneirado, secado com ar-quente e então destinado a uma briquetadeira, onde será exposto a uma forte pressão para ser compactado. O resultado é o briquete, uma espécie de lenha utilizada para produção de energia, como em caldeiras industriais.

Existe ainda um projeto ligado à questão ambiental, que é o viveiro municipal de mudas, localizado às margens da PA-150 ao sul da cidade. Lá, são cultivadas várias espécies de árvores exóticas e nativas, frutíferas e não frutíferas. São mudas de Açaí, Freijó, Copaíba, Jatobá, Comaru, Ipê e muitas outras, todas distribuídas para colonos da região que estejam interessados. A maioria deseja apenas as espécies de madeira de lei, mas os técnicos agrícolas costumam incentivar que também sejam levados outros tipos.

Segundo o conteúdo de um folheto que explica o projeto, a meta do viveiro é que, até 2013, sejam produzidas 50 milhões de mudas, para que, assim, Tailândia passe a produzir carvão vegetal com 100% de madeira advinda do reflorestamento. Só em 2009 mais de 400 mil mudas foram distribuídas para os colonos locais. O município

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Desconsiderando os indígenas que sempre viveram na região, a história da ocupação9 humana da Amazônia teve início em meados do século XVII. Foi nessa época que colonizadores portugueses organizaram as primeiras expedições pela floresta com o objetivo de escravizar índios e de fazer a coleta das chamadas drogas do sertão.

As drogas do sertão eram especiarias características da região amazônica, como a castanha, o cacau, a baunilha, além de outras. Depois de coletadas, eram remetidas para a Europa, onde possuíam um alto valor comercial. Durante muitos anos esse tipo de extrativismo esteve em voga.

Já no século XIX, a Amazônia conheceu uma era de prosperidade econômica sem precedentes. Com a expansão da revolução industrial no mundo, a demanda por algumas matérias primas cresceu de forma meteórica – uma delas era o látex, a partir do qual se produz a borracha. O látex é extraído de árvores chamadas seringueiras, existentes em abundância na floresta amazônica.

Desta forma, a busca pelas seringueiras se intensificou

9 HISTÓRIA da Ocupação da Amazônia. Disponível em: <http://www.tomdamazonia.org.br>. Acesso em: 10 fev. 2010.

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drasticamente na região. Surgiram os seringalistas, donos de extensos seringais (áreas com numerosas seringueiras), e os seringueiros, responsáveis pelo trabalho bruto de todo o processo: a extração do látex direto das árvores.

A grande maioria dos seringueiros era composta por imigrantes do Nordeste, que fugiam de uma grande seca que assolou a região no fim da década de 1870. Calcula-se que mais de 300 mil trabalhadores nordestinos migraram para a Amazônia a fim de trabalhar nos seringais antes do término do século XIX.

Esse período de grande extração de látex nos seringais amazônicos ficou conhecido como o “Ciclo da Borracha”. Foi uma época em que a região produziu muita riqueza, de uma forma que jamais havia sido vista até então. Belém se desenvolvia a pleno vapor. Durante o início do século XX era considerada por muitos a metrópole mais próspera do Brasil. Igualmente podia-se dizer de Manaus, outra cidade que gerou muitos dividendos com a demanda mundial de borracha.

A pujança pela qual Manaus e Belém passaram entre 1890 e 1920, período da duração do Ciclo da Borracha, podia ser constatada em termos materiais. Ainda que com restrição, ambas possuíam luz elétrica, sistema de água encanada e esgoto e bondes elétricos. Sediavam também edifícios imponentes e requintados. Em Manaus, foram erguidos o Teatro Amazonas e o Palácio do Governo e, em Belém, o Teatro da Paz e o Cinema Olympia.

Entretanto, nem tudo eram flores. Toda essa riqueza adquirida por conta da extração do látex só era possível em razão de um sistema perverso no qual os seringueiros eram profundamente explorados.

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Viviam em regime de semi-escravidão, em que eram obrigados a se lançar no meio da floresta fechada atrás das seringueiras. Lá, só podiam comprar mercadorias fornecidas pelos seringalistas, a preços bem acima do normal, fato que os fazia contrair dívidas enormes. Dessa forma, ficavam sempre presos aos seringalistas, pois tudo o que ganhavam na extração do látex era usado para abater parte da dívida, sem nunca conseguir de fato zerá-la. Esse sistema ficou conhecido como “sistema de aviamento”, já que as mercadorias vendidas aos seringueiros vinham das chamadas casas de aviamento, localizadas em Belém e Manaus.

Por volta de 1920, o ciclo da borracha na Amazônia se aproximava do fim, depois que passou a enfrentar um forte concorrente do além-mar. Milhares de sementes de seringueiras amazônicas foram levadas por ingleses para colônias do sudeste asiático, onde foram reproduzidas. Constatou-se então que ali aquelas espécies de árvores podiam ser cultivadas de uma forma mais eficiente.

A borracha da Amazônia logo se viu desvalorizada no mercado internacional, em razão da competitividade da borracha asiática. Era o fim do ciclo próspero que começara na década de 1870. Manaus e Belém, os dois grandes centros da Amazônia, mergulharam em um período de débâcle econômica. Os ricos de outrora perdiam tudo, mansões eram abandonadas e milhares de desempregados dos seringais migravam para as periferias das cidades.

Duas décadas mais tarde, com o advento da Segunda Guerra Mundial, a economia da borracha amazônica ganhou novo fôlego. A rota para o sudeste asiático estava fechada pelo Japão, um dos países do Eixo, o que interrompeu o fornecimento de borracha para os Países Aliados. Foi então que o governo brasileiro, sob a

liderança de Getúlio Vargas, fechou um pacto com o governo norte-americano, se comprometendo a restabelecer a produção de borracha.

Com isso, o início da década de 40 foi marcado pelo processo de alistamento dos chamados “soldados da borracha”. Milhares de nordestinos foram selecionados para, uma vez mais, repetir o processo migratório para o interior da Amazônia, tal qual havia acontecido no século anterior. Mas desta vez, o objetivo era o de garantir o suprimento de borracha aos Aliados na Segunda Guerra. Esse novo ciclo perdurou de 1942 até 1945. Com o fim do conflito, a produção de borracha na Amazônia também se encerrou.

O Ciclo da Borracha foi um período que sem dúvida gerou uma riqueza nunca antes vista na região amazônica. Mas, como de costume, foi uma riqueza que se concentrou na mão de bem poucos. A grande e explícita maioria era explorada nos seringais, pouco se beneficiava da riqueza gerada e tinha sua vida consumida impiedosamente no meio da floresta.

Algumas décadas depois, a Amazônia novamente foi palco de transformações econômicas. Nos anos 70, sob a inspiração do lema “integrar para não entregar”, a Ditadura Militar instaurada no país começou a implantar os grandes projetos de ocupação da região. Foi nessa época que tiveram início as construções da Usina de Tucuruí e da rodovia Transamazônica, além dos primeiros trabalhos de exploração das jazidas de minérios na região dos Carajás. No plano dos incentivos creditícios, foi criada a SUDAM (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), em substituição à antiga SPVEA, com o intuito de financiar aqueles que quisessem empreender em

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ramos como o a pecuária e a agricultura.Contudo, essa nova fase de ocupação deu gênese a um grave

problema que passaria a afligir a região de forma crônica nos anos seguintes: o desmatamento predatório. Atraídos pelas linhas de créditos fáceis, agricultores e pecuaristas passaram a derrubar árvores de forma intensa e irracional, abrindo espaço para suas plantações e pastos. O resultado dessa política expansionista foi a formação de uma das maiores fronteiras pioneiras da história da humanidade, que abrangeu uma extensão superior a 200 milhões de hectares em apenas 40 anos. Essa região é hoje conhecida como o Arco de Desmatamento e envolve mais de 100 municípios. Mais de 90% de toda a destruição da floresta amazônica aconteceram nessa área.

Tida como a atividade que mais causa desmatamento entre todas, a pecuária não costuma ter dificuldades em se instalar na Amazônia, apesar da ausência de infra-estrutura e da distância em relação aos grandes centros consumidores. É justamente por esses motivos que o valor das terras na região é baixo, condição essencial para uma cultura fundamentalmente extensiva como é a criação de bois. Até mesmo a dificuldade de acesso a certos pastos não se constitui em grande problema, já que os animais podem caminhar com as próprias pernas para seu destino. E há ainda a vantagem decorrente do alto índice pluviométrico local, fator que garante um capim constantemente verde para o gado amazônico.

Nos anos 70 e 80, a ocupação da Amazônia era tão desejada que, aos olhos da Ditadura Militar, aquele que desmatasse uma área era tido como seu legítimo proprietário. Foi diante desse cenário que a pecuária avançou ferozmente em direção à floresta – muito

em razão de se tratar de uma atividade que prescinde de ajuda do poder público para se expandir, diferentemente do agronegócio, por exemplo.

Outro ramo que teve grande impulso na Amazônia durante os anos 70 foi a mineração. A extração de recursos minerais na região já acontecia desde a década de 50, com o manganês da Serra do Navio, no Amapá, mas é sob o regime dos militares que os grandes projetos vão se concretizar.

Em 1974, é lançado o Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia, conhecido como Polamazônia. Tratava-se de planos federais que projetavam a implantação de diversos pólos de desenvolvimento econômico na Amazônia, com destaque para a produção mineral. Entre esses pólos, estavam Amapá, Trombetas e Carajás.

No Amapá, além da exploração do manganês, que já acontecia anteriormente, também recebeu incentivos do estado o Projeto Jari, um mega-empreendimento idealizado pelo milionário norte-americano Daniel Ludwig e que tinha o objetivo de realizar a extração do caulim10 . Ainda na década de 70, a Alcan, uma gigante da mineração do Canadá, começou a extração da bauxita em Oriximiná, município paraense às margens do Rio Trombetas. Esse negócio contou com um grande auxílio de capitalização da empresa estatal Companhia Vale do Rio Doce.

Em 1980, o governo criou o Programa Grande Carajás, uma tentativa de reunir todos os projetos ligados à mineração e metalurgia em uma única coordenação. Durante a década, foram construídas duas plantas industriais (Albras e Alunorte) em Barcarena, no Pará, 10 Caulim é um minério que pode ser utilizado na fabricação de papel, cerâmica, tintas, entre outros.

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e outra (Alumar) em São Luís, no Maranhão, todas voltadas para a produção de alumina e alumínio e impulsionadas por empresas estrangeiras – mas sempre com auxílio econômico do estado brasileiro. Na região, a Vale do Rio do Doce ainda deu início a exploração do minério de ferro na Serra dos Carajás, localizada no município paraense de Paraupebas.

Ainda durante os anos 80, a Amazônia testemunhou outra atividade mineral de forte impacto econômico: o garimpo do ouro. Com a alta valorização do ouro no mercado internacional, uma onda de migrantes chegou à região atrás do metal precioso. Esse fenômeno gerou cenários visualmente incríveis – com o famoso garimpo de Serra Pelada – além também de sérios conflitos entre empresas de garimpo e garimpeiros autônomos.

Quem também passou a bater às portas da Amazônia em decorrência da política de incentivos estatais foram as lavouras de soja. A partir da década de 70, muitas famílias sulistas, que já tinham o hábito de plantar o grão em suas terras de origem, migraram para o estado do Mato Grosso onde introduziram a cultura sojeira.

Com o intenso processo de mecanização dos anos 80, a abertura econômica do país nos anos 90 e o consequente fortalecimento do agronegócio exportador, as plantações de soja em solo brasileiro praticamente dobraram de área num período de 15 anos. Para se ter uma ideia, a soja responde nos dias atuais por cerca de metade das lavouras brasileiras de grãos. É a partir dela que são feitos óleos de cozinha, rações de animais e, mais recentemente, combustíveis.

A despeito do alegado desenvolvimento econômico gerado na região, todas essas atividades – pecuária, mineração, plantio

de soja, além da própria extração comercial da madeira, citada anteriormente – trouxeram impactos ambientais e sociais bastante significativos para a Amazônia. Devastação da floresta, contaminação de rios, expulsão de comunidades tradicionais e ocorrências de trabalho escravo são os principais deles. No caso deste último, a fiscalização tem flagrado trabalhadores nessas condições com uma frequência cada vez maior, principalmente em áreas que passam pelo processo de limpeza de terreno para a abertura de pastos e lavouras de soja.

Em razão desse específico problema, grandes conglomerados ligados à indústria de carne e à produção de derivados de soja, por meio de pressão da sociedade civil organizada e do poder público, têm nos últimos anos fechado acordos para combater o trabalho escravo na cadeia produtiva. Símbolo disso é o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, criado em 2005, e que já conta com mais de 160 empresas e associações comerciais que se comprometem a riscar da lista de fornecedores aqueles que em cujas propriedades houver flagrante desse crime.

Já no que diz respeito à conservação da floresta, as cobranças são bem mais antigas e vieram inclusive de fora do País. A crescente preocupação mundial acerca do meio ambiente ao longo do século XX culminou na primeira Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente Humano, ocorrida em 1972, em Estocolmo, e organizada pela ONU. Em 1988, foi a vez de Toronto, no Canadá, ser sede da primeira Conferência Mundial sobre o Clima. Posteriormente, ainda houve outras conferências da ONU sobre o meio ambiente no Rio de Janeiro em 92, em Johanesburgo em 2002, e em Copenhague em 2009.

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Com isso, o futuro da Amazônia entrou na pauta das discussões e o governo brasileiro foi impelido a intensificar a fiscalização contra o desmatamento ilegal. Assim, em 1989, no fim do Governo Sarney, foi criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, o Ibama.

Principal órgão federal de fiscalização das atividades que envolvem questões ambientais, o Ibama tem um papel preponderante na Amazônia. Além da fiscalização, é também, juntamente com secretarias estaduais de meio ambiente, o responsável por conceder autorizações de instalação e funcionamento a diversas atividades com fins econômicos.

Auxiliados pelos dados dos satélites do SIVAM – Sistema de Vigilância da Amazônia – equipes inteiras de fiscais costumam percorrer diversas localidades da floresta amazônica durante o processo de fiscalização, que pode durar até meses. Em todas as vezes, seguem escoltados por homens armados, incumbidos de fazer a segurança. No caso do Pará, há um destacamento específico para isso, que é o Batalhão da Polícia Militar Ambiental.

Em 2008, o governo federal inaugurou uma nova composição nos grupos de fiscalização. Homens da Polícia Federal, de forma inédita, integraram uma operação ao lado dos fiscais do Ibama e dos responsáveis pela escolta. O debute aconteceu na chamada Operação Arco de Fogo. Tailândia foi a primeira cidade a recebê-la.

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Arco de Fogo

A Operação Arco de Fogo é uma operação de fiscalização que envolve o Ibama, a Polícia Federal e a Força Nacional de Segurança. Foi arquitetada no âmbito dos ministérios da Casa Civil, do Meio Ambiente e da Justiça, diretamente em Brasília. Sua área de atuação abrange todos os estados da Amazônia Legal11 , dentro dos quais são realizadas vistorias em serrarias, carvoarias, garimpos e qualquer outra atividade que possa estar ligada a crimes ambientais.

O grande diferencial dessa operação em relação às demais é a presença pioneira da Polícia Federal, que cumpre o papel de polícia judiciária no momento da fiscalização. Novidade que contribui para agilizar o processo de autuação no caso de flagrantes de delitos. Em resumo, o Ibama é quem aponta as irregularidades, a Polícia Federal se incumbe de abrir inquéritos e realizar prisões, e a Força Nacional de Segurança faz a proteção de todos.

Lançada em fevereiro de 2008, a Arco de Fogo tinha como primeiro destino a cidade de Altamira, no centro-sul do Pará, outro grande pólo de devastação florestal do estado. Mas o advento de um episódio inesperado fez com que os planos mudassem.

11 Nome dado à região que engloba a bacia amazônica. Fazem parte dela todos os estados do Norte, mais o Mato Grosso e a metade ocidental do Maranhão.

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trabalho. O medo do desemprego começou então a se alastrar entre os operários da indústria madeireira, um ramo cuja informalidade é extremamente alta. Era o germe de um acontecimento que tomaria enormes dimensões mais tarde.

No dia 18 de fevereiro, de 2008, uma segunda-feira, um boato começou a correr pelo boca-a-boca em Tailândia. Dizia-se que uma manifestação aconteceria no dia seguinte, em protesto contra a fiscalização na cidade. Segundo relatos, os mentores da manifestação seriam alguns madeireiros.

Na terça-feira 19, o boato se confirmou, e a ponte que cruza o igarapé local amanhecia bloqueada por pneus e toras de madeira em chamas. Trabalhadores das serrarias interrompiam o tráfego da rodovia PA-150, remontando o cenário de 14 anos antes quando do protesto pela energia elétrica.

A concentração de pessoas nas imediações do bloqueio não parava de crescer ainda durante a manhã. Homens temerosos pela falta de trabalho se aglomeravam em um clima até então relativamente pacífico. Mas a indignação era grande.

O movimento começou a ganhar contornos mais agressivos com a chegada da notícia sobre o paradeiro de um grupo de fiscais. Faziam apreensão de madeira em uma serraria próxima, na Taiplac, de propriedade de Gilbertinho, que à época ainda não era prefeito.

Parte do protesto, que àquela altura já contava com várias centenas de pessoas, se deslocou para os arredores da serraria, cercando os fiscais. O nível de hostilidade era alto e o risco de invasão, iminente. Acuados, os funcionários do Ibama e da SEMA foram obrigados a improvisar uma rota de fuga pelos fundos, com o auxílio de

No dia 13 de fevereiro daquele ano, o Ibama divulgava via imprensa a apreensão, em Tailândia, de 10 mil metros cúbicos de toras e peças serradas de madeira, durante uma outra operação de combate ao desmatamento – em meio às diversas existentes – chamada de Guardiões da Amazônia. Segundo o instituto, 130 pessoas do próprio Ibama, da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA) e das Polícia Civil e Militar faziam-se presentes na cidade para a fiscalização.

Relatos sugerem que essa megaoperação, de proporções maiores do que o normal, teria sido uma demanda vinda diretamente de Ana Júlia Carepa, governadora do Pará. Ana Julia estaria sendo pressionada para apresentar resultados positivos em relação aos números sobre a derrubada ilegal de árvores no estado, uns dos maiores do País. Desta forma, teria exigido dos órgãos responsáveis pelo meio ambiente que mostrassem serviço.

E mostraram. Para se ter uma ideia, os dez mil metros cúbicos de madeira apreendidos dos pátios das serrarias de Tailândia são suficientes para encher as caçambas de cerca de 500 caminhões. Também foram aplicadas multas que ultrapassaram um milhão e meio de reais. Mais de cem fornos de carvão vegetal foram destruídos e um grande número de máquinas foi lacrado, impossibilitando de vez qualquer atividade de beneficiamento de madeira.

Entretanto, o mais estranho dessa operação é o fato de que, segundo moradores, Tailândia era regularmente destino de fiscalizações por parte do Ibama e da SEMA. Se isso é verdade, por que nunca se constatou essa onda de ilegalidades antes?

Com as serrarias interditadas e as madeiras confiscadas, não havia

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Gilbertinho e os demais que acompanhavam a fiscalização. Fugiram de carro em meio a uma plantação de milho.

A polícia naquele momento já estava na rua, monitorando o desenrolar da manifestação. De acordo com um relato, homens do batalhão da tropa de choque, vindos de fora, se encontravam presentes na cidade desde o dia anterior – fato que leva a crer que sabiam de antemão da realização do protesto.

Nas imediações do bloqueio da estrada, um morador chega com um carro de som, colocando-o à disposição do público. Alguns passam a se aventurar no microfone e um homem começa a imitar Sílvio Santos, para a risada geral de todos. Momentos mais tarde, um elemento surge para incendiar de vez o protesto. Duas caixas de aguardente são distribuídas entre os manifestantes, que disputam cada garrafa a tapa. A bebida é passada de mão em mão e virada a goles largos. Rapidamente, a multidão vai ficando embriagada.

O álcool gratuito cumpre seu papel e o teor de agressividade na manifestação aumenta. Um manifestante se lembra do carro de som da Prefeitura, maior e mais potente que o que está sendo usado, e raciocina que se é de propriedade da Prefeitura, o povo também tem direito a usá-lo. A maioria lhe dá razão e começa a marcha em direção ao automóvel almejado.

Os manifestantes chegam ao pátio da Prefeitura e se aglomeram em frente ao portão. Irredutíveis e agressivos, exigem o carro de som. A tropa de choque, a poucos metros de distância, se prepara para intervir. Diante da intransigência da multidão em recuar, alguém dispara a primeira bala de borracha. É nesse exato momento que a tensão latente desde o início do dia explode, dando início às cenas

de batalha campal em Tailândia.O alvoroço é total e todos fogem o mais depressa que podem. Mas

logo a resposta é dada sob forma de pedras lançadas em direção à tropa de choque. As balas de borracha seguem sendo disparadas, mas a multidão não se dispersa, ao contrário, parte pra cima dos policiais, que em alguns momentos chegam a ser encurralados.

Uma bala de borracha acerta o olho de um manifestante. O ferimento é irreversível.

Os confrontos não dão sinais de fim e o medo se dissemina entre os tailandenses. O Fórum é invadido. Janelas, portas, grades e computadores são totalmente destruídos. Alguns manifestantes tentam colocar fogo no prédio, mas policiais conseguem expulsá-los a tempo. A devastação, entretanto, é grande.

Lojas do centro fecham as portas, as escolas municipais suspendem as aulas. Moradores se trancam em casa ou se refugiam onde podem. Bombas de gás lacrimogêneo são lançadas pela polícia contra os manifestantes e a fumaça de uma delas invade o saguão de espera do hospital, lotado naquele momento. A irritação nos olhos e a dificuldade de respirar tomam conta de pacientes e acompanhantes. O tumulto no prédio é generalizado.

Um policial é acertado por um coco jogado por um manifestante. Enraivecido, ele agarra a fruta do chão e a arremessa de volta contra a multidão. Outros policiais, visivelmente exaltados, disparam para o alto e em direção ao solo. Os tiros são de munição letal.

Mais tarde, um batalhão da polícia com 25 homens chega de Belém para dar apoio aos que já estavam em ação. Bem à tempo: a munição não-letal estava se esgotando e uma tragédia maior

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poderia acontecer. A rodovia PA-150 continuou bloqueada até o fim da tarde, quando

então os manifestantes voltaram para suas casas. À noite, um toque de recolher imposto pela polícia deixou as ruas da cidade vazias. No dia seguinte, a Operação Guardiões da Amazônia foi suspensa e os fiscais do Ibama e da SEMA bateram em retirada de Tailândia.

Inconformados com o acontecido e decididos a afirmar autoridade, o Ibama, por meio de seu chefe de fiscalização, Leandro Aranha, solicitou à Brasília a alteração do primeiro destino da Operação Arco de Fogo: no lugar de Altamira, que fosse Tailândia. O objetivo desta forma era o de dar uma resposta rápida e intensa ao levante que expulsou os fiscais da Guardiões da Amazônia.

A solicitação foi acatada. Seis dias depois da revolta popular, no dia 25 de fevereiro de 2008, Tailândia recebeu uma das maiores operações de combate ao desmatamento já realizadas pelo governo brasileiro. Nada menos que 220 homens da Força Nacional de Segurança, do Ibama e da Polícia Federal chegaram à cidade em um mega comboio de carros, inaugurando a Operação Arco de Fogo.

Tailândia foi então ocupada por um aparato militar nunca antes visto. Incursões com helicóptero e homens da Força Nacional de Segurança, portando armas de grosso calibre, passaram a fazer parte do cotidiano daqueles dias. Grupos de carros levando fiscais, policiais federais e militares cruzavam a PA-150 e vicinais a todo momento, atrás de madeiras de origem ilegal. Todas as serrarias e carvoarias foram vistoriadas. Com os vários casos de ilegalidade existentes e a intenção de mostrar serviço para o País, a fiscalização foi severa e praticamente paralisou a atividade madeireira na cidade.

O medo das consequências da Arco de Fogo estava presente em todos. À época, o secretário de Administração do município, Cristóvão Vieira, profetizou: “Se os setores madeireiros fecharem, Tailândia se inviabilizará”.

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Prejuízos

Prejuízos

No dia 4 de abril de 2008, a Operação Arco de Fogo foi concluída oficialmente em Tailândia. Durante os quase 40 dias que estiveram na cidade, os fiscais do Ibama e da SEMA passaram por cerca de 50 serrarias e carvoarias. De acordo com o órgão, foram lavradas multas no valor de 23 milhões de reais. Quatro serrarias foram desmontadas e 13, embargadas. Um total de 23 mil metros cúbicos de madeira foi apreendido e mais de 1.100 fornos de carvão vegetal, postos abaixo. No decorrer desse período nenhum novo distúrbio ocorreu.

Em agosto do mesmo ano, a Promotoria de Justiça de Tailândia denunciou onze pessoas sob a acusação de insuflar e liderar os protestos do dia 19 de fevereiro. Os denunciados foram enquadrados pelo Ministério Público Estadual nos crimes de formação de quadrilha, dano qualificado, constrangimento ilegal, poluição atmosférica, supressão de documento e incitação ao crime.

Já os temores de cidadãos e funcionários da Prefeitura se confirmaram. Com a interrupção das atividades no setor madeireiro, Tailândia mergulhou num declínio econômico inédito. Serrarias e carvoarias demitiram em massa. Por tabela, a crise chegou ao comércio local, que viu suas vendas desmoronarem e seu quadro de

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empregados diminuir. Apenas um mês após a Arco de Fogo, o SINE (Sistema Nacional de Emprego) registrou cerca de 4.400 pedidos de desemprego na cidade. Estimativas dão conta que cerca de onze a doze mil tailandenses perderam o trabalho em decorrência da débâcle do setor madeireiro.

Com isso, as consequências sociais foram catastróficas. Centenas de famílias inteiras, de uma hora para outra, se viram sem dinheiro para poder suprir necessidades básicas como se alimentar. Na tentativa de amenizar a gravidade da situação, o prefeito da época, Paulo Jasper “Macarrão”, decretou estado de emergência no município e criou uma frente de trabalho – que ficou conhecida como “Frente de Emergência” – para fazer a limpeza de vias públicas e terrenos. O objetivo com a medida era o de absorver parte dos desempregados das madeireiras.

Foram abertas 600 vagas com salários de 100 reais por semana. Uma fila gigantesca e repleta de desesperados se formou no local de inscrição para os candidatos, mas a oferta estava muito aquém da demanda. A grande maioria teve que voltar pra casa carregando consigo apenas a frustração e a falta de perspectiva de trabalho.

Já aqueles que tiveram a sorte de serem contratados passaram a se reunir diariamente às sete horas da manhã em frente à Prefeitura. Lá, vestidos com uniforme laranja e de mão colada ao peito, entoavam o hino nacional diante das bandeiras do Brasil, do Pará e de Tailândia, todos os dias. Só então é que partiam para o trabalho.

A Frente de Emergência foi apenas uma ação paliativa diante de um oceano de problemas. A desesperança na população era

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generalizada, e Tailândia começou a assistir ao fenômeno da emigração. Muitos moradores abandonavam a cidade em busca de trabalho em outros lugares. As placas de “vende-se” penduradas em frente às casas de madeira não pararam de proliferar pelos bairros.

Com a cidade bastante visada após a forte repressão, muitas serrarias também se mudaram. Algumas foram para cidades da região, outras partiram para novos estados. Mas várias ainda continuaram em Tailândia, e um ano e meio depois da Operação Arco de Fogo, boa parte daquelas que foram paralisadas pela fiscalização já havia voltado a operar normalmente.

Diante do colapso socioeconômico decorrente de uma operação de sua autoria, e da grande repercussão nacional do caso, o Governo Federal também tentou fazer alguma coisa. Ainda em março de 2008, a pedido do presidente Lula, o Ministério do Meio Ambiente, em articulação com outros ministérios, começou a conceber o projeto da chamada Operação Arco Verde. A ideia da operação é auxiliar as cidades da Amazônia Legal com alto índice de desmatamento a realizar a transição de um modelo de produção predatória para um modelo sustentável.

Para isso, funcionários de órgãos estaduais e federais começaram a rodar por 43 municípios em esquema de mutirão, organizando eventos abertos à população juntamente com as administrações locais. Nesses eventos, são praticadas diversas atividades, como palestras de capacitação e orientação a produtores rurais, plantio de mudas, emissão de documentos e regularização fundiária. O Ministério do Meio Ambiente também anunciou a criação de linhas de créditos para proprietários que desejem recompor áreas de reserva legal e de preservação permanentes.

A Operação Arco Verde foi lançada oficialmente no dia 19 de Junho de 2009, nas cidades de Marabá (PA), Alta Floresta (MT) e Porto Velho (RO). Em Tailândia, o mutirão chegou no dia 25 de junho, exatos um ano e quatro meses depois do início da Operação Arco de Fogo no município. Mesmo assim, a sensação dentro da Prefeitura é de certa insatisfação. Isso porque, se comparada aos danos ocasionados pela Arco de Fogo, os benefícios da Arco Verde foram de certa irrelevância.

Em frente ao hospital municipal, montado em uma bicicleta azul com uma estufa de vidro acoplada na dianteira, Elton é um dos que perderam o emprego após a Arco de Fogo. Ele tenta faturar algum dinheiro vendendo salgados e sucos em saquinhos. Cobra por cada um R$1,50 e R$0,50, respectivamente.

Homem baixo, de cerca de 1 metro e 60 de altura, jovem e articulado. Cursou a escola até a sétima série. Está em Tailândia há nove anos, vindo de Ourém, cidadezinha no extremo nordeste paraense. Veio pra trabalhar com madeira junto ao pai e os irmãos, que já deixaram a cidade. Elton vive com a mulher e o filho de oito anos. Revela que também tem vontade de ir embora.

Com a onda de demissões na indústria madeireira no início de 2008, perdeu a carteira assinada e dinheiro. Diz que seu ex-patrão deve a ele cerca de dois mil reais, entre férias e décimo terceiro não pagos. Já foi diversas vezes cobrá-lo, todas em vão. “Tinha amigos na mesma situação que só receberam depois de fazerem ameaças. Mas não quero brutalizar, isso não é do meu feitio”, afirma. Numa loja de eletrodomésticos da cidade, ele deve 70 reais por duas prestações atrasadas de um fogão que comprou. Dívida que admite incomodar.

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Desde a perda do trabalho, Elton se desdobra pra sustentar a família. Chegou a fazer alguns serviços em madeireiras e diz que não foi pago. Partiu então sozinho para produção de carvão vegetal, vendendo pequenas quantidades na rua. Às vezes, conseguia produzir o suficiente para que fosse vendido para Marabá. Com o pouco dinheiro que entrava, comprava feijão e lata de óleo. “No início, só não passamos fome por causa da aposentadoria dos meus sogros”, confessa.

No lançamento da Frente de Emergência, ele também encarou a enorme fila de inscrição para candidatos. Mas não teve sorte. Sua mulher já recebeu dinheiro do Bolsa Família, só que em outra cidade, e, recentemente, o benefício foi cancelado.

Perguntado sobre a Arco de Fogo, Elton é taxativo em condená-la. “Antes, quem ia buscar cestas básicas na Prefeitura eram as mulheres. Depois da Arco de Fogo, os homens também começaram a ir, muitos chorando”. No dia da “revolução”, que é como se refere ao confronto entre população e policiais, estava na farmácia com a mulher quando tiros de borracha começaram a ser disparados bem ao lado. Ela começou a chorar e os dois partiram assustados em retirada.

Passado mais de um ano, ele agora conseguiu comprar uma bicicleta e vende salgados e sucos em frente ao hospital. Elton conhece praticamente todos os médicos dali, além de pacientes e seus problemas. Sabe dizer também quem é quem entre motoristas e passageiros das caminhonetes importadas que saem do Fórum, logo ao lado.

Durante a conversa, uma manhã quente de quinta-feira, compro

um suco de maracujá, por sede. No fim, sensibilizado com sua história, compro mais outro, por compaixão.

12 de Março de 2010

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Depois de tantas desventuras, infortúnios e procrastinação, finalmente esse livro se torna realidade. Dois anos se passaram desde o nascimento da ideia, em alguma noite de pensamentos utópicos do início de 2008, até a colocação do último ponto final, nos derradeiros dias do Verão de 2010. Foi suado, foi penoso, mas foi bonito.

A decisão em rumar para uma cidade do interior do Pará, uma região idealizada por minha mente paulistacêntrica como parte dos confins do mundo, se baseou exatamente no desejo, comum a muitos jovens de minha geração e círculo social, de viajar por aí. De sair do eixo das cidades turísticas e percorrer lugares ermos, desconhecidos da maioria, mas que ainda assim tenham uma história pra contar. Dentro dessa linha de raciocínio, poucos destinos teriam sido melhores que Tailândia.

Descobri a cidade em 2008, pela mídia, durante a forte repercussão dos protestos do dia 19 de fevereiro. Era justamente a época em que precisava definir o que faria de meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Pesquisando um pouco mais a fundo sobre o evento, vi ali a chance de abordar uma temática de caráter social e de grande interesse nacional, como é o caso do desmatamento da Amazônia.

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Diferentemente de como pensava de início, essa questão traz consigo não só o debate sobre a preservação do meio-ambiente, mas também toda uma história que envolve miséria humana, migração em massa, expansão econômica e Ditadura Militar.

E foi aí, em meio a uma série de ponderações internas, que me fiz a fatídica pergunta: por quê não? Além do mais, era também uma oportunidade de escrever um livro-reportagem, algo até então inédito para mim.

Assim, inspirado nessa tríade de motivos (viagem, temática social e nacional, livro-reportagem) e em um projeto semelhante de um amigo, aceitei o desafio de tentar retratar a história e a atualidade de Tailândia em meu TCC.

Desembarquei na cidade no dia 16 de setembro de 2009, uma quarta-feira, e lá fiquei por seis dias. Pouco antes, havia passado uma semana em Belém, onde entrevistei funcionários da Secretaria do Estado do Meio Ambiente e do Ibama, além de ter aproveitado pra conhecer um pouco da capital paraense.

Posso afirmar, com grande grau de convicção, que Tailândia me proporcionou uma das maiores experiências jornalísticas e pessoais que já tive. Foram dias singulares e marcantes, ainda que cansativos. Conheci o migrante rico, que saiu do Sul pra empreender na Amazônia, e conheci o migrante pobre, que fugiu da miséria do Maranhão pra tentar vender sua força de trabalho e sobreviver. Cacei depoimentos, reconstrui eventos, andei por cemitério, conversei com o major da cidade. Ouvi histórias dramáticas, dignas de livros, andei de caminhonete importada, bebi água direto do rio, visitei um canal de TV. Tive indisposição intestinal, inalei

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fumaça de carvão, matei barata, caminhei pelo interior da floresta. Constatei o quanto o Estado é importante para a vida de pessoas completamente desamparadas. Plantei uma árvore. E encontrei muita gente empenhada em tentar buscar soluções em meio a um mar de problemas. De fato, Tailândia não está nada fácil depois da Arco de Fogo.

Uma das aprendizagens mais significativas obtida dessa jornada foi ter compreendido, com certa propriedade, como se dão as relações entre a indústria madeireira, o desmatamento da floresta e o quadro socioeconômico da população. Descobri que madeira é algo que dá muito dinheiro, muito mais do que sequer imaginava. Pude testemunhar com meus próprios olhos a pujança material dos beneficiados do ramo. Isso me deixou bastante claro o porquê da violência na disputa por terras, o porquê de tantos migrantes pobres em Tailândia e o porquê de tantos relatos de corrupção generalizada de agentes públicos. A derrubada predatória de árvores é um negócio altamente lucrativo.

Alguns trechos ficaram incompletos, com informações importantes faltando. Isso se deveu ao fato de que algumas fontes não foram ouvidas ou checadas como deveriam ter sido, seja por carência de tempo hábil ou por omissão deliberada. Por esse motivo, tenho consciência que para aqueles que leram essa história muitas perguntas podem ter ficado sem respostas.

Já sobre as informações que entraram nessas páginas, o leitor pode ter a certeza que tive o cuidado em tentar apurá-las o máximo que pude. Sei que isso é um pressuposto básico do jornalismo e nem precisaria ser ressaltado. Entretanto, se por ventura alguém perceber algum absurdo escrito, saiba que foi por pura incompetência deste

que vos escreve, jamais por má fé ou desleixo.Muitas das dificuldades que me acometeram no decorrer do

trabalho foram devidas a certa falta de familiaridade com o tema Amazônia. Não sabia praticamente nada sobre sua história de ocupação, nem sobre a lógica de exploração da madeira, e de repente tive que aprender. Algumas dúvidas surgiram também em relação a questões mais técnicas, como legislação ambiental, detalhes de engenharia florestal e funcionamento das operações do Ibama.

Mas, no final das contas, acho que até que me saí bem para um escritor de primeira viagem. A despeito dos pontos negativos, procuro ver este TCC mais como um laboratório para os próximos projetos que eu venha realizar no futuro. Aí, já não serei mais um estudante de graduação, e sim um jornalista formado. A responsabilidade será indubitavelmente maior.

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Fotos

FotosFotos

Passarela que corta a rodovia PA-150

Trecho da PA-150 que corta Tailândia

Prefeitura de Tailândia

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Prefeito Gilberto Sufredini (ao centro)

Linhão de energia vindo de Tucuruí que passa por Tailândia

Viveiro Municipal

Cemitério

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Área de reflorestamento com eucalipto

Fornos de carvão vegetal

Carvão vegetal

Lenha preparada para virar carvão vegetal

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Toras de árvores sendo transportadas

Casas colocadas para venda ou para troca

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