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Teatro dos 4A cerimônia do adeus do teatro moderno

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© 2018 Daniel Schenker

Este livro segue as normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, adotado no Brasil em 2009.

Produção editorialIsadora BertholdoIsadora TravassosJoão SaboyaJulia RoveriRodrigo Fontoura

RevisãoBruno Lima

Foto de capaSergio Britto e Nathalia Timberg em A Cerimônia do Adeus (Arquivo/CPDoc JB – Foto: Guga Melgar)

2018Viveiros de Castro Editora Ltda.Rua Visconde de Pirajá 580, sobreloja 320 – IpanemaRio de Janeiro | rj | cep 22410-902Tel. (21) 2540-0076 | [email protected] | www.7letras.com.br

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃOSINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

S346t

Schenker, Daniel Teatro dos 4 : a cerimônia do adeus do teatro moderno / Daniel Schenker. - 1. ed. - Rio de Janeiro : 7 Letras, 2018. : il.

ISBN 978-85-421-0676-3

1. Teatro brasileiro (Literatura). I. Título.

18-50505 CDD: 869.2 CDU: 82-2(81)

Leandra Felix da Cruz - Bibliotecária - CRB-7/6135

As imagens reproduzidas na presente obra foram escolhidas de forma criteriosa pelo autor e têm como único objetivo ilustrar o argumento do mesmo, como forma de desenvolver a discussão informativa, crítica e acadêmica, com propósito educacional, das questões envolvendo o universo discutido no livro. Qualquer dúvida ou questionamento sobre as referidas imagens podem ser tratadas diretamente com o autor, que é o responsável pela pesquisa e edição das mesmas. Caso surjam novas informações sobre algum crédito referente às imagens publicadas nesta obra, favor informar à editora para que sejam acrescentadas nas futuras edições.Todos os esforços foram realizados no sentido de localizar e remunerar os titulares de direitos autorais e de imagem. Tais titulares, quando não localizados, terão seus direitos reservados.

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Sumário

Introdução 7

Tradição ou traição? 20

Conexão com a realidade 70

Consistência e cálculo: antigo equilíbrio em nova roupagem 135

Estabilidade na distância da cena realista 194

Novos anos turbulentos: revisitas dramatúrgicas 273

Conclusão 335

Referências bibliográficas: 338

Anexo 1: Fichas técnicas 350Anexo 2: Entrevista com Sergio Britto 362Anexo 3: Entrevista com Paulo Mamede 382Anexo 4: Cenário da montagem de Mephisto 398Anexo 5: Plantas do Teatro dos 4 (1978 e 2006) 399

Índice onomástico 404

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Introdução

A proposta do Teatro dos 4, difundida desde o início de sua implantação, consistia no investimento em montagens de textos importantes, tanto do repertório brasileiro quanto do internacional. Havia certo temor referente a uma eventual sobreposição da assinatura dos diretores em relação às dra-maturgias. Além da exaltação da qualidade das peças, o projeto era voltado para a evidenciação de um elevado padrão de produção.

Esta plataforma se torna questionável a partir de um estudo mais apu-rado do empreendimento. Não cabe considerá-la em termos absolutos, em especial porque seria apressado definir os trabalhos de direção das monta-gens do Teatro dos 4 como subservientes aos textos. Além disso, não haveria como unificar as concepções de um grupo variado e heterogêneo de ence-nadores: além de Sergio Britto e Paulo Mamede (sócios no Teatro dos 4, ao lado de Mimina Roveda), assinaram as encenações nomes como os de Luís Antônio Martinez Corrêa, Nelson Xavier, Helder Costa, Walter Schorlies, Alcione Araujo, Celso Nunes, Paulo Betti, Gerald Thomas, José Wilker e Mauro Rasi. Mas o apego ao texto se manteve nas declarações encontra-das na imprensa, especialmente nas de Sergio Britto. Com frequência, Britto assinalou: “a característica principal do Teatro dos 4 é o repertório [...] antes de tudo, o texto e seu verdadeiro sentido eterno é o mais importante”

(BRITTO, 1996, p. 182).O Teatro dos 4 foi mantido por uma sociedade ao longo de 15 anos

(entre 1978 e 1993). Britto conheceu o casal Paulo Mamede-Mimina Roveda por intermédio do ator Otávio Augusto, na época da encenação de Os Filhos de Kennedy (1976), de Robert Patrick, no Teatro Senac. O ator José Wilker também aproximou Britto de Roveda e Mamede.

Conheci Mimina e Paulo. Ele tinha voltado da Itália, onde havia estudado cinema. Pensamos em encenar Calígula, de (Albert) Camus, e Ivanov, de (Anton) Tchekhov. Cheguei a fazer uma tradução de Ivanov. Para tanto, fiz curso de russo durante um ano. Iria dirigir e atuar. Realizamos leituras na casa

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deles. Na mesma época, Mimina, Paulo e Sergio se encantaram com a ideia de produzir Ópera do Malandro, de Chico Buarque, e de usar o espaço do Dancin’ Days para instalar um teatro. Eu desaconselhei porque sempre achei que ter um teatro representava uma despesa absurda. Além da obrigação de manter um repertório que exige um capital que, supunha, eles não tivessem. Mas os três e mais um dos irmãos do Paulo (Dema Marques) se associaram e resolve-ram construir o teatro. Eu tentei encenar Ivanov, mas, na época, eles decidiram montar Os Veranistas, do Gorki. Achava que seria uma tolice montar o texto de mais um autor russo. Uma boa parte do meu elenco foi cooptado para Os Veranistas. Então, desisti da ideia. E eles construíram o teatro, que, excetuando os antigos, era o mais moderno do Rio de Janeiro – inteligente como arquite-tura, com plateia móvel, muito confortável.1

Paulo Mamede, porém, não confirma as informações de José Wilker em relação ao projeto de montagem de Ivanov, de Anton Tchekhov. Renée de Vielmond cogita a existência do projeto, mas destaca a intenção de Wilker encenar Tio Vânia, também de Tchekhov, em 1977. Segundo Vielmond, Wilker traduziu a peça do russo e conseguiu reunir diretor, produtor, elenco, cenógrafo e figurinista, mas não um teatro, o que inviabilizou a empreitada. Sete anos depois, o Teatro dos 4 montou Tio Vânia. Wilker foi convidado para interpretar o médico Astrov, mas não pode aceitar devido a outros compromissos profissionais.2

Seja como for, Britto, Roveda, Mamede e José Ribeiro Neto (quarto inte-grante da sociedade, anterior à entrada de Dema Marques, que se desligou ainda na fase de construção do teatro) firmaram a intenção de viabilizar o Teatro dos 4 durante um jantar no restaurante Trattoria do Mário, na Rua Constante Ramos, em Copacabana, em 1976. Sergio Britto viajou para Nova York, onde permaneceu durante três meses, e, nesse período, os sócios encon-traram um espaço, no Shopping da Gávea, recentemente inaugurado, em 1975. Nesse espaço agora vago, havia funcionado a boate Dancin’ Days,3 idealizada

1 José Wilker (Entrevista ao autor, acervo pessoal).2 Informações fornecidas por Renée de Vielmond por intermédio de sua filha e de José Wilker,

Mariana Vielmond.3 Em 5 de agosto de 1976, o compositor e produtor musical Nelson Motta inaugurou, no

Shopping da Gávea (no espaço que futuramente abrigaria o Teatro dos 4), a discoteca Dancin’ Days, que se tornaria a febre das noites cariocas. Também foram fundamentais na história da boate, Djalma Limongi, DJ Dom Pepe, Leonardo Netto e Scarlet Moon. Para servir as poucas mesas no espaço ocupado por uma pista de dança, Motta teve a ideia de contratar garçonetes que, vestidas de malhas colantes, com saltos altíssimos e maquiagem carregada, fariam o aten-dimento, mas com uma inovação: no meio da noite, subiriam de surpresa ao palco, cantariam três ou quatro músicas. Sandra Pêra, cunhada de Motta, se interessou pela colocação e trouxe

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por Nelson Motta. “Na época, o shopping tinha poucas lojas. Ganhei aquele espaço de graça da Sociedade Imobiliária Santa Isabel Ltda. para promover o shopping. Sabia que o espaço seria transformado em teatro. Por isto, a boate, que funcionou sem alvará, já começou com data para encerrar as atividades”, conta Motta.4 A primeira a se interessar pela compra do espaço foi a atriz Tônia Carrero, que, porém, acabou declinando da empreitada.

Mimina Roveda, Paulo Mamede, Sergio Britto e Dema Marques: os sócios do Teatro dos 4 (CEDOC/Funarte)

José Ribeiro Neto logo se desligou da sociedade. “Durante a construção, faltou dinheiro. Eu, Mimina e Paulo colocamos do nosso bolso. José furou. Ele tinha quadros na casa dele que não quis vender. Paulo não o quis mais como sócio”, justifica Sergio Britto.5 A vaga de quarto integrante foi preen-chida por Waldemar (Dema) Marques, irmão de criação de Paulo Mamede, que também se distanciou poucos anos depois, conforme evoca Britto.

para o grupo, identificado como As Frenéticas, Regina Chaves, Leiloca, Lidoka e Dhu Moraes. Completou o sexteto, Edyr de Castro. Foi selecionado um repertório de cinco músicas e o grupo ensaiou com Roberto de Carvalho. O sucesso das Frenéticas foi tão grande que pas-saram a fazer shows de mais de uma hora e deixaram de ser garçonetes. A boate funcionou durante quatro meses.

4 Nelson Motta (Entrevista ao autor, acervo pessoal).5 Sergio Britto (Entrevista ao autor em anexo 2).

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Discordamos de Dema em relação ao pagamento de uma atriz. Ele pensava como ator; eu, não, pensava na importância do teatro. Tanto que montamos Papa Highirte, primeira peça liberada pela censura. Disse: “Dema, se eu não posso pensar na minha carreira como ator, como posso pensar na sua?” Achei que Dema deveria sair. A construção de um teatro e a responsabilidade de se implantar um repertório são empreitadas muito sérias.6

O empreendimento ficou a cargo de Sergio Britto, Mimina Roveda e Paulo Mamede (que comprou a parte de Dema Marques). “A sociedade tinha que ser formada por três pessoas. Mesmo quando havia um quarto integrante, éramos, de certo modo, três porque eu entrei representando Mimina, que ainda não estava legalmente separada de seu primeiro marido (Adriano Maria Roveda). Tudo ficava complicado por causa da distância. Afinal, ele era suíço”, relata Paulo Mamede,7 que, juntamente com Mimina, formava uma única pessoa jurídica.

Sergio Britto começou a carreira no Teatro Universitário (TU), moti-vado por Jerusa Camões, na metade da década de 1940, integrou o Teatro do Estudante do Brasil (TEB), conduzido por Paschoal Carlos Magno, grupo marcado por uma montagem emblemática de Hamlet (1948), de William Shakespeare, a cargo do alemão Hoffmann Harnisch, também presente na rápida experiência do Teatro dos Doze. Britto pertenceu aos quadros do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), do Teatro Popular de Arte (TPA) e do Teatro de Arena, foi um dos fundadores do Teatro dos Sete, deu continui-dade à parceria com Fernando Torres e Fernanda Montenegro na Torres e Britto Diversões Ltda. E implantou uma programação no Teatro Senac.

Artista plástica desde o início dos anos 1960, voltada para a vertente naif, Luciana (apelidada de Mimina, termo que remete a mignon, pelo pai) expôs em cidades brasileiras e no exterior (Roma e Milão, além de parti-cipar da Bienal da Suíça, em 1977). A família de Mimina ajudava judeus a fugirem para a Suíça. Quando a situação se tornou mais perigosa, a família seguiu para o Cairo e a África do Sul. Mimina morou durante um período na África, mas, inconformada com o apartheid, veio para o Brasil. Ao se deparar com situação de desigualdade social e econômica, retornou para a África, mas regressou ao Brasil, onde acabou se estabelecendo ao lado do primeiro marido.

6 Sergio Britto (Entrevista ao autor em anexo 2).7 Paulo Mamede (Entrevista ao autor em anexo 3).

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Já o vínculo de Paulo Mamede era com o cinema. Aos 16 anos saiu do colégio Andrews no meio do segundo ano do científico. Inscrito no pro-grama American Field Service, passou um ano nos Estados Unidos. Na volta, desembarcou em São Paulo e cursou administração de empresas na Fundação Getúlio Vargas, concluindo, já no Rio de Janeiro, na Escola Brasileira de Administração Pública (Ebap). Migrou para Londres, onde fez pós-graduação em administração. Enveredou pelo cinema a partir de 1968, quando desembarcou em Roma para cursar o Centro Experimental de Cinema, dirigido por Roberto Rossellini, e trabalhou como assistente de direção no filme Esplendor e Miséria de Madame Royale (1970), de Vittorio Caprioli. Na volta para o Brasil travou contato com Luís Sérgio Person, tornando-se seu assistente em Cassy Jones – O Magnífico Sedutor (1972), e Flávio Tambellini em Relatório de um Homem Casado (1974) e A Extorsão (1975). Em teatro trabalhou como assistente de direção de Cecil Thiré na montagem de Check-up (1972). O contato com Mimina se deu através das artes plásticas, manifestação da qual também era próximo (foi aluno de Ivan Serpa): ambos se conheceram numa exposição organizada por Carlos Scliar (com colaboração de Mimina) no Museu de Arte Moderna (MAM).

Sergio Britto comenta sobre a cumplicidade que estabeleceu com Mimina Roveda e Paulo Mamede e como a parceria enfrentou objeções.

A imagem do Paulo e da Mimina sempre foi muito discutida, vista como anti-pática. Até um amigo meu, como Fabio Sabag, um dos maiores da minha vida, não me perdoou por não tê-lo chamado para fazer parte do Teatro dos 4. Mas Paulo e Mimina vieram a mim. E tinham ideias parecidas com as minhas. Sabag achava que tinha ideias parecidas com as minhas. Não tinha. Ele montava Pedro Bloch, Disque M para Matar, um repertório buscando o sucesso de público. A própria imprensa também implicou um pouco com Paulo e Mimina. Tinham uma pose antipática? Não, não era isto. Eles acreditavam tanto no teatro que queriam fazer que eram determinados. Isto pareceu muitas vezes como uma atitude de gente socialmente bem. Mas eles não eram milionários. Tinham algum dinheiro e colocaram no teatro. Quando estreamos o teatro, nós está-vamos apertados economicamente. Nós três tínhamos investido tudo e ainda emprestado dinheiro. Diziam algo como “Sergio Britto se ligou a uns milioná-rios que não são de teatro para fazer o Teatro dos 4”. Isto é uma injustiça total.8

Sergio Britto conheceu Fabio Sabag em 1951 e reencontrou-o na efer-vescência teatral de São Paulo. Sabag participou das montagens de A Ilha

8 Sergio Britto (Entrevista ao autor em anexo 2).

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dos Papagaios (1955), de Sergio Tofano, na Companhia Maria Della Costa (CMDC), e de A Casa de Chá do Luar de Agosto (1956), de John Patrick, no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Fez Os Espectros (1957), de Henrik Ibsen, no Grande Teatro Tupi. Britto ensaiou, muito brevemente, com Sabag um projeto de companhia, juntamente com Roberto Barker, em 1975 e 1976. E dirigiu-o, mais tarde, em Casamento Branco (1990), de Tadeusz Rosewicz.

Em relação ao Teatro dos 4, a primeira proposta foi de nomeá-lo Teatro Sergio Britto, aproveitando a sua projeção como ator e diretor. Mas o pró-prio Britto foi contra, preferindo o numeral, denominação frequente em sua carreira, a julgar por sua presença nas companhias Teatro dos Doze e Teatro dos Sete. Especificamente sobre Paulo Mamede, Britto relata:

Nós nos conhecemos em 1975, e fiquei amigo mais rápido de Mimina Roveda. Do Paulo a primeira impressão que ficou foi a de um homem bonito, fechado, meio difícil, que escondia nesses primeiros encontros todo um mundo pessoal, uma série de coisas não ditas, tudo na macieza de um sorriso até quase juvenil, quase doce, para um homem tão grande. Aos poucos fui conhecendo melhor, devagar, passo a passo. Hoje, 11 anos depois, Paulo é meu irmão mais moço. Assim o vejo na minha afetividade. Mas, na verdade, dentro do teatro ele é nosso pai. É ele que vem sempre com a palavra mais tranquila, o pensamento mais pronto, mais longamente elaborado. Paulo possui, acho eu, um pudor muito grande com suas emoções, não as abre, não vê necessidade nesse exercício de se revelar a toda hora, que é um pouco a caricatura vivencial do homem moderno.9

Antes de fundarem o Teatro dos 4, Sergio Britto, Mimina Roveda e Paulo Mamede ensaiaram um princípio de parceria ao produzirem, ainda no Senac, a montagem de Entre Quatro Paredes (1977), de Jean-Paul Sartre, e, posterior-mente, no Teatro Ginástico, A Infidelidade ao Alcance de Todos (1977), monta-gem de Antonio Pedro para a peça de Lauro César Muniz. Ainda no período à frente do Ginástico, foram procurados por Elis Regina e Cesar Camargo Mariano para a realização de um show da cantora no espaço, que acabou acon-tecendo. “Não havia um pensamento por trás da programação no Ginástico. A experiência serviu para afinarmos os gostos”, diz Paulo Mamede.10 Quando se confirmou que Tônia Carrero não arrendaria o Teatro dos 4, o espaço foi destinado pelo dono, Luiz Paulo Abreu Nogueira, a eles.

No início de 1977, os sócios procuraram a Caixa Econômica Federal, que oferecia apoio cultural, através de financiamento reembolsável, para

9 Sergio Britto, entrevista a Susana Schild, “A arte de ir à luta”, Jornal do Brasil, 16 dez. 1989.10 Paulo Mamede (Entrevista ao autor em anexo 3).

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obras de valor social – o Fundo de Apoio Social (FAS). Os sócios contaram com a ajuda do ministro Ney Braga, que já tinha auxiliado Sergio Britto com a ampliação do Teatro Senac na época da montagem de Os Filhos de Kennedy, e do diretor presidente do Banco do Brasil, Karlos Richbietter. Mas a aprovação só sairia dois anos depois. A solução veio com o BD-Rio, que, na gestão do governador Faria Lima, viabilizou a construção de teatros. O empréstimo previa um período de carência, que se esgotaria em 1982. Os sócios, porém, perceberam que a correção monetária elevou muito o valor das prestações. Só conseguiram ressarcir o BD-Rio graças ao apoio de Tancredo Neves Filho, presidente do banco.

Nos anos iniciais do Teatro dos 4, os sócios enfrentaram dificuldades econômicas, tanto nos custos da reforma – que ficou a cargo da Sociedade Construtora e Incorporadora Mamede Ltda., do pai de Paulo Mamede (Hugo Mamede), e contou com projeto de Fernando Pamplona e Thompson Motta, responsáveis pela concepção de um espaço de configuração inten-cionalmente móvel, marcado por várias possibilidades de disposição palco/plateia (italiano, arena, elisabetano), podendo reunir entre 420 e 460 espec-tadores – quanto na sustentação do teatro a partir de saldos econômicos nem sempre favoráveis.

Jorginho de Carvalho, que assinaria a iluminação dos primeiros espetá-culos – Os Veranistas (1978), Ópera do Malandro (1978) e Papa Highirte (1979) – lembra dos ajustes feitos no quadro de luz para viabilizar uma espacialidade diversificada. “Sergio Britto me mostrou o projeto de luz e percebi que não contemplava múltiplas configurações espaciais, conforme o desejado, mas apenas a disposição italiana. Conversei com Pamplona, fiz algumas mudan-ças e, anos depois, refiz a distribuição das tomadas e dos pontos de luz”.11

Os cuidados com o projeto e as instalações do Teatro dos 4 são evidentes. O palco (que tem 11,65 m de largura por 6,8 m de profundidade) foi dimen-sionado em altura que fornece ao ator uma sensação de proximidade em rela-ção ao público, surpreendente em se tratando de um espaço de médio porte. Além disso, a abertura do palco possibilita aos atores visão total dos espec-tadores, mesmo dos acomodados nas laterais. No corredor central do andar de baixo, por onde o público necessariamente passa para chegar à plateia, há cinco alçapões que avançam por baixo das cadeiras da sala de apresentação

11 Jorginho de Carvalho (Entrevista ao autor, acervo pessoal).

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onde as produções podem guardar materiais diversos. No andar de cima há quatro camarins – três existentes no projeto original e o último aberto nos últimos anos. Dois camarins são consideravelmente espaçosos, o outro é menor e o novo, ainda mais reduzido. No corredor central do andar de cima há uma cabine telefônica, simpática relíquia, fotos de algumas montagens do Teatro dos 4 – Os Veranistas e Assim é (se lhe Parece) (1985) –, a cabine de luz e som, projetada em frente ao palco, as salas de gerência e dois corredores laterais que desembocam no palco (sendo o da esquerda munido de cinco armários de porta dupla onde antes ficavam guardados os figurinos das pro-duções). Todas as paredes do Teatro dos 4 são revestidas de madeira com concreto, garantindo o isolamento acústico.

No período de inauguração do Teatro dos 4 foi organizado um curso gratuito (para proporcionar o acesso a interessados em teatro que não tinham como ingressar em outros cursos), com duração de dez meses (entre julho de 1978 e maio de 1979) e patrocínio do Ponto Frio Bonzão, que tal-vez jogue luzes sobre os possíveis elos a serem traçados entre essa inicia-tiva e outras, anteriores e posteriores ao seu surgimento. Os professores que ministraram o curso, além do próprio Sergio Britto, foram Amir Haddad, encenador importante no início da trajetória do Teatro Oficina com quem Britto estabeleceu elo no período à frente do Teatro Senac, Hamilton Vaz Pereira, diretor do grupo Asdrúbal Trouxe o Trombone, iniciado poucos anos antes (em 1974), Eric Nielsen, que seria um dos fundadores, poucos anos depois (em 1982), da Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), e Glorinha Beutenmüller, com o crítico Yan Michalski já próximo da gestação do Teatro dos 4. Deste curso participaram integrantes do futuro Grupo Tapa, que, dirigido por Eduardo Tolentino de Araújo, se notabilizaria justamente pela proposta de montar grandes textos brasileiros e estrangeiros, em especial, a partir da mudança para São Paulo, em 1985, durante a temporada de O Tempo e os Conways, de J.B. Priestley.

No momento da fundação do Teatro dos 4, alguns projetos norteavam os sócios: a realização de seminários de dramaturgia com leituras de textos inéditos seguidos de debates e de ciclos de cinema e a implantação de um sistema anual de assinaturas para os espetáculos e as atividades extras por-ventura realizadas no teatro. Havia a ambição de fazer com que o empreen-dimento ganhasse a amplitude de um centro cultural, como evidencia Sergio Britto, algo que efetivamente nunca chegou a acontecer.

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