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Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/208 Comunicações Geológicas (2015) 102, 1, 91-100 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X Caracterização tecnológica e emissão de 222 Rn de gnaisses migmatíticos da região de Granja (NW Ceará, Brasil) Technological characterization and 222 Rn emission of the Granja region migmatitic gneisses (NW Ceará, Brazil) A. J. F. Silva 1* , F. D. O. Silva 2 , J. A. Nogueira Neto 2 , M. R. Azevedo 1 , J. Marques 2 , A. F. Freitas Filho 2 © 2015 LNEG Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP Resumo: O Complexo de Granja, localizado no Domínio Médio Coreaú (NW Ceará, Brasil), corresponde a um cinturão metamórfico de médio a alto grau, composto por duas sequências principais: (1) ortognaisses migmatíticos de afinidade TTG e; (2) granulitos para- e ortoderivados. A análise das características mineralógicas, texturais, tecnológicas, juntamente com a avaliação da emissão de 222 Rn de um ortognaisse TTG (Riscado Granja) e de um paragnaisse granulítico (Granizado Grey), demonstrou que ambos satisfazem os requisitos necessários para a sua exploração como rochas ornamentais. Com efeito, a maioria dos resultados obtidos situa-se no intervalo de valores recomendados pela ABNT e ASTM, indicando o seu uso para revestimento de pisos indoor com elevado tráfego e a qualidade como recurso de pedra natural. Palavras-chave: Complexo de Granja, Domínio Médio Coreaú, caracterização tecnológica, emissão de radão, rochas ornamentais. Abstract: The Granja Basement Complex, located in the Médio Coreaú Domain (NW Ceará, Brazil) corresponds to a medium to high-grade metamorphic belt consisting of two main sequences: (1) migmatitic TTG orthogneisses and; (2) metasedimentary and meta-igneous granulites. The analysis of the mineralogical, textural, technological characteristics, as well as the 222 Rn emission assessment of a TTG orthogneiss (Riscado Granja) and a granulitic paragneiss (Granizado Grey) showed that both satisfy the requirements for their exploration as dimension stones. In fact, most of the results are positioned in the scope of the recommended values by ABNT and ASTM, indicating that these materials can be used in high traffic indoor floors and attesting their quality as a natural stone resource. Keywords: Granja Basement Complex, Médio Coreaú Domain, technological characterization, radon emission, dimension stones. 1 GeoBioTec, Departamento de Geociências, Universidade de Aveiro, 3810- 193, Aveiro, Portugal. 2 Departamento de Geologia, Universidade Federal do Ceará, Campus do Pici, Bloco 912, CEP 60455-760, Fortaleza, CE, Brasil. * Autor correspondente/Corresponding author: [email protected] 1. Introdução As rochas ornamentais e de revestimento, também designadas como pedras naturais ou rochas dimensionadas, abrangem todos os tipos litológicos que podem ser extraídos em blocos ou placas, cortados e beneficiados. Os seus principais campos de aplicação incluem tanto a confecção de peças isoladas para decoração ( e.g. esculturas; balcões e pés de mesa; lápides para arte fúnebre), como a sua utilização em revestimentos internos e externos na construção civil. O Brasil detém uma posição privilegiada na produção mundial de matérias-primas de origem mineral sendo um dos maiores exportadores de "granitos" do mundo e o Estado do Ceará tem vindo a afirmar-se como um dos maiores mercados consumidores e exportadores de rochas e minerais industriais. A capacidade de extracção destes recursos no Ceará tem sido aproveitada em benefício da própria população, através da utilização de mão-de-obra local, minimizando, dessa forma, o êxodo rural (Vidal et al., 2005). As principais jazidas de rochas ornamentais estão localizadas na parte SE e NE do país. Em 2013, as regiões SE e NE responderam respectivamente por 64,5 % e 24,7 % da produção nacional (Heider e Maia, 2015). O estudo das rochas ornamentais e de revestimento baseia-se em padrões estéticos e nas suas características tecnológicas. Envolve a determinação da tipologia da ocorrência e de um vasto conjunto de propriedades físico-químicas e mineralógicas, a partir dos quais se torna possível aferir a qualidade dos materiais rochosos, tendo em vista a sua utilização como rochas ornamentais. A prospecção e pesquisa deste tipo de recursos devem ter por base um conhecimento geológico detalhado das unidades potencialmente interessantes, uma análise criteriosa das suas propriedades geomecânicas bem como um possível controlo da emissão de radiação e gases nocivos para a saúde humana. O isótopo 222 do elemento radão ( 222 Rn) é um gás que requer atenção especial e tem vindo a ser estudado mundialmente pelo facto de poder estar na origem de importantes patologias nas vias respiratórias quando são registados altos níveis no interior de residências. O 222 Rn é um produto da série de decaímento do urânio ( 238 U), e apesar deste não ficar retido nos pulmões, a sua desintegração de curta duração para os elementos polónio ( 218 Po e 214 Po), chumbo ( 214 Pb) e o bismuto ( 214 Bi), emite radiação alfa que pode promover o desenvolvimento de mutações celulares, que resultam, com frequência, em neoplasias malignas, ou seja, na manifestação do cancro do pulmão (Zeeb e Shannoun, 2009; Keith et al., 2012). Estudos direccionados para a quantificação de 222 Rn em materiais rochosos do Estado do Ceará, comercialmente exportados e utilizados como revestimento indoor, têm sido conduzidos pelo Grupo de Pesquisa em Geodinâmica e Recursos Minerais da Universidade Federal do Ceará em cooperação com a Universidade Estadual Paulista, Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará e a unidade I&D GeoBioTec da Universidade de Aveiro. Neste trabalho, apresentam-se os resultados da avaliação de parâmetros físico-mecânicos e da exalação de 222 Rn de um Artigo original Original article

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Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/208 Comunicações Geológicas (2015) 102, 1, 91-100 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X

Caracterização tecnológica e emissão de 222

Rn de gnaisses

migmatíticos da região de Granja (NW Ceará, Brasil)

Technological characterization and 222

Rn emission of the Granja

region migmatitic gneisses (NW Ceará, Brazil)

A. J. F. Silva1*, F. D. O. Silva2, J. A. Nogueira Neto2,

M. R. Azevedo1, J. Marques 2, A. F. Freitas Filho2

© 2015 LNEG – Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP

Resumo: O Complexo de Granja, localizado no Domínio Médio Coreaú

(NW Ceará, Brasil), corresponde a um cinturão metamórfico de médio a

alto grau, composto por duas sequências principais: (1) ortognaisses

migmatíticos de afinidade TTG e; (2) granulitos para- e ortoderivados. A

análise das características mineralógicas, texturais, tecnológicas,

juntamente com a avaliação da emissão de 222

Rn de um ortognaisse TTG

(Riscado Granja) e de um paragnaisse granulítico (Granizado Grey),

demonstrou que ambos satisfazem os requisitos necessários para a sua

exploração como rochas ornamentais. Com efeito, a maioria dos

resultados obtidos situa-se no intervalo de valores recomendados pela

ABNT e ASTM, indicando o seu uso para revestimento de pisos indoor

com elevado tráfego e a qualidade como recurso de pedra natural.

Palavras-chave: Complexo de Granja, Domínio Médio Coreaú,

caracterização tecnológica, emissão de radão, rochas ornamentais.

Abstract: The Granja Basement Complex, located in the Médio Coreaú

Domain (NW Ceará, Brazil) corresponds to a medium to high-grade

metamorphic belt consisting of two main sequences: (1) migmatitic TTG

orthogneisses and; (2) metasedimentary and meta-igneous granulites. The

analysis of the mineralogical, textural, technological characteristics, as

well as the 222

Rn emission assessment of a TTG orthogneiss (Riscado

Granja) and a granulitic paragneiss (Granizado Grey) showed that both

satisfy the requirements for their exploration as dimension stones. In fact,

most of the results are positioned in the scope of the recommended values

by ABNT and ASTM, indicating that these materials can be used in high

traffic indoor floors and attesting their quality as a natural stone resource.

Keywords: Granja Basement Complex, Médio Coreaú Domain,

technological characterization, radon emission, dimension stones.

1 GeoBioTec, Departamento de Geociências, Universidade de Aveiro, 3810-

193, Aveiro, Portugal. 2 Departamento de Geologia, Universidade Federal do Ceará, Campus do Pici,

Bloco 912, CEP 60455-760, Fortaleza, CE, Brasil. * Autor correspondente/Corresponding author: [email protected]

1. Introdução

As rochas ornamentais e de revestimento, também designadas como pedras naturais ou rochas dimensionadas, abrangem todos os tipos litológicos que podem ser extraídos em blocos ou placas, cortados e beneficiados. Os seus principais campos de aplicação

incluem tanto a confecção de peças isoladas para decoração (e.g. esculturas; balcões e pés de mesa; lápides para arte fúnebre), como a sua utilização em revestimentos internos e externos na construção civil. O Brasil detém uma posição privilegiada na

produção mundial de matérias-primas de origem mineral sendo

um dos maiores exportadores de "granitos" do mundo e o Estado do Ceará tem vindo a afirmar-se como um dos maiores mercados consumidores e exportadores de rochas e minerais industriais. A capacidade de extracção destes recursos no Ceará tem sido aproveitada em benefício da própria população, através da utilização de mão-de-obra local, minimizando, dessa forma, o êxodo rural (Vidal et al., 2005). As principais jazidas de rochas ornamentais estão localizadas na parte SE e NE do país. Em 2013, as regiões SE e NE responderam respectivamente por 64,5

% e 24,7 % da produção nacional (Heider e Maia, 2015). O estudo das rochas ornamentais e de revestimento baseia-se

em padrões estéticos e nas suas características tecnológicas. Envolve a determinação da tipologia da ocorrência e de um vasto conjunto de propriedades físico-químicas e mineralógicas, a partir dos quais se torna possível aferir a qualidade dos materiais rochosos, tendo em vista a sua utilização como rochas ornamentais. A prospecção e pesquisa deste tipo de recursos

devem ter por base um conhecimento geológico detalhado das unidades potencialmente interessantes, uma análise criteriosa das suas propriedades geomecânicas bem como um possível controlo da emissão de radiação e gases nocivos para a saúde humana.

O isótopo 222 do elemento radão (222Rn) é um gás que requer atenção especial e tem vindo a ser estudado mundialmente pelo facto de poder estar na origem de importantes patologias nas vias respiratórias quando são registados altos níveis no interior de

residências. O 222Rn é um produto da série de decaímento do urânio (238U), e apesar deste não ficar retido nos pulmões, a sua desintegração de curta duração para os elementos polónio (218Po e 214Po), chumbo (214Pb) e o bismuto (214Bi), emite radiação alfa que pode promover o desenvolvimento de mutações celulares, que resultam, com frequência, em neoplasias malignas, ou seja, na manifestação do cancro do pulmão (Zeeb e Shannoun, 2009; Keith et al., 2012).

Estudos direccionados para a quantificação de 222Rn em materiais rochosos do Estado do Ceará, comercialmente exportados e utilizados como revestimento indoor, têm sido conduzidos pelo Grupo de Pesquisa em Geodinâmica e Recursos Minerais da Universidade Federal do Ceará em cooperação com a Universidade Estadual Paulista, Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará e a unidade I&D GeoBioTec da Universidade de Aveiro. Neste trabalho, apresentam-se os resultados da avaliação de parâmetros físico-mecânicos e da exalação de 222Rn de um

Artigo original Original article

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ortognaisse milonítico TTG (Tonalito-Trondhjemito-Granodiorito) - Riscado Granja e de um paragnaisse granulítico - Granizado Grey do Complexo de Granja, efectuada no âmbito do

projecto "Caracterização Físico-Mecânica e Radiométrica de Rochas Ornamentais Silicáticas do Ceará”.

2. Enquadramento geológico

A região de Granja situa-se no sector NE do Brasil, mais precisamente no NW do Estado do Ceará. Do ponto de vista geológico, a região de Granja insere-se no Complexo de Granja, uma das unidades em que é subdividido o Domínio do Médio Coreaú (DMC), na parte setentrional da Província Borborema (Fig. 1). A Província Borborema corresponde a um cinturão móvel formado durante o evento orogénico Brasiliano / Pan-

Africano, no Neoproterozóico (ca. 600 Ma), que envolveu a convergência das massas cratónicas Congo-São Francisco e São Luís-Oeste Africano e culminou com a aglutinação do Gondwana Ocidental (Brito Neves e Cordani, 1991).

Com uma área de aproximadamente 10 000 km2, o DMC apresenta uma forma em cunha triangular sendo constituído por terrenos com origens e idades distintas, afectados por deformação

intensa e heterogénea durante o evento Brasiliano (Torquato e Nogueira Neto, 1996). A partir de dados de campo, petrográficos, estruturais e geocronológicos foram individualizadas sete unidades litoestratigráficas principais, da base para o topo, no DMC: (1) Complexo de Granja, (2) Corpo Vulcânico do

Saquinho, (3) Grupo Martinópole, (4) Grupo Ubajara, (5) Granitóides Brasilianos, (6) Grupos Jaibaras/Sairi e (7) Cobertura Sedimentar (Figs. 1, 2) (Santos, 1999).

As rochas mais antigas expostas no DMC têm idade paleoproterozóica e constituem o denominado Complexo de Granja (Nascimento et al., 1981). Este complexo inclui as seguintes unidades principais: (a) uma sequência de ortognaisses TTG, afectados por migmatização intensa e (b) uma sequência granulítica, composta essencialmente por paragnaisses migmatíticos com corpos lenticulares intercalados, de dimensões métricas a decamétricas, de granulitos ortoderivados máficos e

enderbíticos. A sequência TTG aflora no sector SE da área estudada e é

constituída essencialmente por tonalitos, trondhjemitos e granodioritos, aos quais se podem associar termos com composições dioríticas. No campo, é possível reconhecer nestas rochas uma foliação gnáissica muito penetrativa, conferida pela alternância de bandas félsicas (quartzo-feldspáticas) e máficas

(ricas em anfíbola e biotite). A foliação, com orientação NE-SW

e inclinações variáveis (35 - 80 SE), adquire um carácter

fortemente milonítico e pendores mais elevados na área de influência da Zona de Cisalhamento dextra de Granja (Fig. 3a).

Adicionalmente, o facto dos ortognaisses TTG exibirem um complexo padrão de estruturas migmatíticas (e.g. estromáticas, ptigmáticas, flebíticas, dictioníticas, nebulíticas e schlieren) sugere que estas litologias tenham sido afectadas por processos

Fig. 1. (a) Reconstrução do Gondwana Ocidental segundo De Wit et al. (2008). (b) Domínios geotectónicos principais e respectivos limites da parte setentrional da Província

Borborema (modicado de Santos et al., 2008). (c) Mapa geológico simplificado do sector norte da Província Borborema onde se destacam as principais sequências do

Domínio Médio Coreaú e área de estudo (extraído e modificado de Ancelmi et al., 2015; Arthaud et al., 2015).

Fig. 1. (a) Western Gondwana reconstruction according to De Wit et al. (2008). (b) Major geotectonic domains and respective boundaries of the Borborema Province

northern block (modified from Santos et al., 2008). (c) Simplified geological map of the Borborema Province northern block showing the main sequences of the Médio

Coreaú Domain and the study area (modified from Ancelmi et al., 2015; Arthaud et al., 2015).

Gnaisses do Complexo de Granja como Recurso Geológico 93

de fusão parcial, de intensidade variável, durante o evento Brasiliano (Caby et al., 1991; Santos, 1999).

Os paragnaisses granulíticos migmatizados encontram-se sobretudo expostos na zona NNE e NE da área estudada. Estas rochas exibem uma foliação bem marcada e, tal como a série TTG, podem mostrar sinais de migmatização intensa (Fig. 3b). A íntima interpenetração de bandas pelíticas e níveis quartzo-feldspáticos constitui um bandado estromático característico que

é frequentemente acompanhado pela obliteração quase total dos fabrics metamórficos originais.

3. Caracterização tecnológica

Os provetes necessários foram obtidos a partir de blocos extraídos em dois afloramentos (Figs. 3a-b) seleccionados na área de estudo para posterior caracterização no Instituto de Geociências da Universidade Estadual Paulista em Rio Claro (São Paulo) e no Núcleo de Tecnologia Industrial em Fortaleza (Ceará), segundo as normas técnicas ABNT NBR 15845-1-2-5-6:2015, ABNT NBR 12042:2012 e ASTM D2845:2008. No total,

foram extraídos 12 blocos, com dimensões de 40 x 30 x 20 cm, de forma a permitirem a realização dos ensaios tecnológicos em duas orientações diferentes e perpendiculares entre si, ou seja, com provetes orientados normal e paralelamente à foliação principal.

Os ensaios tecnológicos incluíram estudos petrográficos, a avaliação de parâmetros físicos (massa específica aparente seca e húmida, porosidade aparente e absorção de água), a determinação da resistência à compressão uniaxial simples, flexão em 3 pontos

e desgaste abrasivo culminando com a análise da velocidade de

propagação de ondas ultra-sónicas. Para efeitos de comparação com os resultados obtidos, indicam-se valores recomendados pela ABNT (2015b) e ASTM C615 (2011) para os diferentes parâmetros e, igualmente, valores relativos a litologias petrograficamente análogas às estudadas que se encontram catalogadas no Atlas de Rochas Ornamentais do Estado do Espírito Santo (Sardou Filho et al., 2013) e em Vidal et al. (1999).

3.1 Petrografia

Tendo em atenção que a mineralogia das rochas controla grande parte das suas propriedades físico-mecânicas, bem como a sua susceptibilidade à alteração, o conhecimento detalhado da composição mineralógica é fundamental para estabelecer padrões de alterabilidade e resistência em potenciais recursos de pedra natural. Para efeitos de caracterização petrográfica, de acordo com a norma NBR 15845-1, foram confeccionadas duas lâminas polidas orientadas perpendicularmente à foliação para cada um

dos litótipos. As proporções das diferentes fases minerais presentes foram estimadas através de ábacos ilustrados de análise modal e determinou-se também o grau de alteração e o índice de microfracturação, calculado a partir da média aritmética de microfracturas inter e intragranulares por mm² (Tab. 1).

Petrograficamente, a amostra de ortognaisse TTG (Riscado Granja) é composta por plagioclase (42 %), quartzo (18,5 %), anfíbola (24,5 %), biotite (11 %) e fases acessórias (4 %).

Predominam texturas grano-lepido-nematoblásticas e observam-se fabrics miloníticos em que ocorreu uma redução considerável do tamanho de grão (Figs. 4a, b). O volume estimado de quartzo

Fig. 2. Mapa geológico simplificado da região de Granja mostrando a localização da área de estudo e das amostras analisadas (extraído e modificado de Cavalcante et al., 2003).

Fig. 2. Simplified geological map of the Granja region showing the location of the study area and of the analysed samples (modified from Cavalcante et al., 2003).

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+ plagioclase é de cerca de 60,5 % e o seu índice de minerais escuros corresponde, neste caso, aos restantes 39,5 %. Como consequência de processos de alteração hidrotermal tardios

(saussuritização), os porfiroclastos de plagioclase são, por vezes, substituídos por agregados granoblásticos de sericite e epídoto, particularmente nos contactos com grãos de quartzo e ao longo de diaclases e outras fracturas. Deste modo, classifica-se a susceptibilidade da rocha à alteração como moderada.

Fig. 3. Fotografias dos afloramentos de onde foram amostrados os blocos utilizados nos

ensaios tecnológicos. (a) Ortognaisse TTG exibindo deformação dúctil de carácter

milonítico (Riscado Granja). (b) Paragnaisse granulítico migmatizado e milonitizado

(Granizado Grey).

Fig. 3. Field appearance of the sampled outcrops meant for the technological

characterization. (a) TTG orthogneiss showing a mylonitic fabric (Riscado Granja). (b)

Migmatitic paragneiss showing a mylonitic structure (Granizado Grey).

O paragnaisse granulítico migmatizado (Granizado Grey) é constituído por quartzo (42,5 %), plagioclase (22 %), granada (18 %), silimanite (8 %), biotite (8 %), feldspato potássico (5 %) e minerais acessórios (3 %). Os paragnaisses apresentam texturas anisotrópicas planares e plano-lineares porfiro-grano-lepidoblásticas decorrentes dos processos de anatexia, responsáveis pela formação de um bandado estromático, que é

definido por intercalações de leucossomas quartzo-feldspáticos nos mesossomas hospedeiros (Figs. 4c, d). O seu índice de minerais escuros é inferior ao do Riscado Granja e as faixas

quartzo-feldspáticas totalizam quase 70% da moda. A granada é a fase mineral que apresenta mais sinais de alteração conferindo à rocha uma susceptibilidade igualmente moderada, no entanto, menos evidente que no ortognaisse TTG.

É importante salientar que a microfracturação intragranular é mais evidente do que o intergranular em ambos os litótipos, verificando-se ainda que o Granizado Grey apresenta um índice de microfracturação superior ao do Riscado Granja.

Fig. 4. Microfotografias dos principais aspectos texturais dos litótipos analisados. (a)

Textura milonítica no Riscado Granja, nicóis paralelos. (b) Porfiroclastos de

plagioclase bordejados por bandas de quartzo e por faixas de anfíbola e biotite, nicóis

paralelos. (c) Leitos lepidoblásticos orientados de biotite e silimanite prismática

envolvidos por faixas quartzo-feldspáticas no Granizado Grey, nicóis paralelos. (d)

Nível quartzo-feldspático que apresenta recristalização dinâmica intensa em nicóis

cruzados.

Fig. 4. Microphotographs of the main textural features of the analysed rocks. (a)

Mylonitic fabric in the Riscado Granja sample, plane polarized light. (b) Plagioclase

porphyroclasts mantled by quartz bands and by strips of amphibole and biotite, plane

polarized light. (c) Oriented lepidoblastic beds of biotite and prismatic sillimanite

bounded by quartzo-feldspathic layers in the Granizado Grey sample, plane polarized

light. (d) Quartzo-feldspathic sheet showing an intense dynamic recystallization in

crossed polarized light.

c

d

Gnaisses do Complexo de Granja como Recurso Geológico 95

Tabela 1. Resumo das análises petrográficas do Riscado Granja e do Granizado Grey

de acordo com a norma técnica NBR 15845-1:2015 (ABNT, 2015a).

Table 1. Summary of the Riscado Granja and Granizado Grey petrographic analysis

according to the NBR 15845-1:2015 standard specification (ABNT, 2015a).

PARÂMETROS Riscado Granja Granizado Grey

Cor estado seco Cinzento Cinzento-claro

Cor estado húmido

Cinzento-escuro Cinzento-escuro

Estrutura Bandado gnáissico; Foliação milonítica

Bandado estromático

Textura Nemato-lepido-granoblástica

Lepido-porfiro-granoblástica

Granularidade Média-fina a Média

(>1 – 7 mm) Média-fina a Média

(>1 – 7 mm)

Natureza da rocha

Metamórfica | ortoderivada

Metamórfica | paraderivada

Classificação Ortognaisse TTG

milonítico Paragnaisse Granulítico

Minerais essenciais

Plagioclase, anfíbola, quartzo e biotite (96%)

Plagioclase, quartzo, granada, biotite,

silimanite e feldspato potássico (97 %)

Minerais acessórios

Zircão, apatite, sericite, esfena, calcite, epídoto e

opacos (4 %)

Zircão, apatite, monazite e opacos

(3 %)

IME (Índice Minerais

Escuros; Bt, Grt, Amp,

Acess)

39,5 % 29 %

Moda (Plg + Qz + Kfs)

60,5 % 69,5 %

Susceptibilidad

e à Alteração Moderada Moderada

Microfracturas/mm²

Intergranulares 0,92 2,23

Intragranulares 3,33 5,73

3.2 Índices físicos

Segundo a norma aplicada NBR 15845-2, os índices físicos para caracterização tecnológica de rochas ornamentais incluem a

massa específica aparente seca e húmida, a porosidade aparente e a absorção de água. A sua determinação permite diagnosticar e avaliar o estado físico dos materiais, ou seja, o seu estado de alteração, o que condiciona a sua resistência e susceptibilidade a novas condições e ambientes.

Os dados obtidos para os índices físicos do Riscado Granja e do Granizado Grey estão compilados na tabela 2. Os resultados demonstram que qualquer dos dois litótipos satisfaz os requisitos necessários para utilização como rocha de revestimento segundo

as exigências da ABNT (2015b) e ASTM C615 (2011). Ambas as rochas apresentam elevadas densidades (2,704 e 2,830 g/cm3), baixas porosidades aparentes (0,58 e 0,33 %) e baixos índices de absorção de água (0,22 e 0,12 %), embora o Riscado Granja tenda a exibir valores ligeiramente mais baixos de massa específica aparente e mais altos de porosidade aparente e de absorção de água do que o Granizado Grey (Figs. 5, 6).

As diferenças de massa específica aparente deverão estar

relacionadas com a composição mineralógica, em particular com a presença de granada no Granizado Grey, pois a massa específica da almandina é claramente superior à dos restantes constituintes minerais. Já as variações na porosidade aparente e na absorção de água poderão estar a reflectir diferenças no estado de alteração das rochas, que é nitidamente mais pronunciado no Riscado Granja.

Por outro lado, a representação gráfica conjunta da massa

específica aparente e do número de microfracturas/mm2 parece

Fig. 5. Representação gráfica da massa específica aparente seca e saturada, expressa em

g/cm3, no Riscado Granja e no Granizado Grey. Projectam-se ainda os dados de

microfracturação.

Fig. 5. Dry and saturated bulk specific gravity chart, expressed in g/cm3, for the

Riscado Granja and Granizado Grey samples. The microfracturing data are also

projected.

Fig. 6. Projecção da porosidade aparente e absorção de água (%) para o Riscado

Granja e o Granizado Grey juntamente com os índices de microfracturação.

Fig. 6. Apparent porosity and water absorption plots (%) for the Riscado Granja and

Granizado Grey together with the microfracturing data.

Tabela 2. Índices físicos para o ortognaisse TTG milonítico (Riscado Granja) e para o

paragnaisse granulítico (Granizado Grey) juntamente com os valores recomendados

pela ABNT (2015b) e ASTM C615 (2011); n.e - não especificado.

Table 2. Dry and saturated bulk specific gravity, apparent porosity and water

absorption test methods results for both Riscado Granja and Granizado Grey adding up

the recommended values by ABNT (2015b) and ASTM C615 standard specifications;

n.e. - non specified.

PARÂMETROS ABNT

(2015b)

ASTM

C615 (2011)

Riscado

Granja Granizado Grey

Massa específica aparente seca

(g/cm³) >2,550 >2,560 2,704 2,830

Massa específica aparente saturada

(g/cm³) n.e. n.e. 2,709 2,833

Porosidade aparente (%)

<1,0 n.e. 0,58 0,33

Absorção de água (%)

<0,4 <0,4 0,22 0,12

96 A. J. F. Silva et al. / Comunicações Geológicas (2015) 102, 1, 91-100

revelar a existência de uma correlação positiva entre os dois parâmetros (Fig. 5), o que pode novamente ser atribuído a factores litológicos, uma vez que o Granizado Grey contém

proporções significativas de minerais (quartzo e granada) com elevados índices de microfracturação. Em contraste, tanto a porosidade aparente como a absorção de água definem relações inversas com o número de microfracturas/mm2, sugerindo que estes parâmetros não dependem do grau de fracturação das rochas e devem ser essencialmente controlados pelo estado de alteração dos minerais e pelo tipo de contactos entre os grãos (Fig. 6). De qualquer forma, os resultados obtidos não parecem configurar

situações que ponham em risco a aplicação destes materiais como rochas ornamentais, mesmo em locais onde a humidade seja elevada ou ocorra circulação abundante de fluidos aquosos.

As rochas denominadas comercialmente de Icaraí Light e Índigo (similares ao paragnaisse granulítico), com proveniência no Estado do Espírito Santo, apresentam respectivamente, massas específicas aparentes secas de 2,637 e 2,678 g/cm3, porosidades aparentes de 0,83 e 0,77 % e valores de absorção água de 0,32 e

0,29 %. Igualmente aceitáveis, os litótipos Coral Irauçuba e Juparaná Brasil (comparáveis ao ortognaisse migmatítico), extraídos e comercializados no Estado do Ceará, exibem valores respectivos de massa específica aparente seca de 2,622 e 2,583 g/cm3, porosidades aparentes de 0,23 e 0,50 % e absorção de água de 0,34 e 0,33 %.

3.3 Resistência à Compressão Uniaxial

A resistência à compressão de uma rocha exprime a sua

resistência à ruptura, quando submetida a uma carga vertical contínua e depende fortemente da sua composição mineralógica, textura, estado de alteração e porosidade. O ensaio de compressão uniaxial simples aplicado permitiu quantificar o esforço (carga / unidade de superfície) requerido para causar a ruptura do provete cumprindo os requisitos da norma NBR 15845-5.

Os valores médios calculados são de 82,7 MPa no Riscado Granja e de 130,3 MPa no Granizado Grey (Tab. 3), estando

abaixo dos limites propostos pela ASTM C615 (2011). Contudo, os resultados obtidos no Granizado Grey satisfazem os requisitos da ABNT (2015b). Ambos os litótipos podem classificar-se como resistentes ou muito resistentes (ISRM, 1977) e, considerando os elevados teores de quartzo e o baixo conteúdo em minerais máficos no Granizado Grey, é expectável que esta última rocha se comporte de forma mais favorável. Para além disso, o facto do Riscado de Granja possuir uma foliação milonítica bem marcada

também deverá ter influenciado os resultados, prevendo-se que a aplicação da compressão perpendicularmente à anisotropia da rocha origine valores de resistência mais altos (131,9), do que quando a carga é exercida paralelamente a esta (61,7-69,4).

Na figura 7, pode verificar-se que os valores da porosidade aparente estão inversamente correlacionados com os valores da resistência à compressão uniaxial simples, sendo sugestivo de que, quanto menor é a porosidade das rochas, maior é a sua

resistência à compressão uniaxial. As rochas seleccionadas para comparação com o Granizado

Grey mostram valores favoráveis segundo a ABNT (2015b), de 102,7 e 164,3 MPa (Icaraí Light e Índigo), enquanto as equivalentes ao Riscado Granja apresentam valores ainda mais elevados de 155,0 e 166,0 MPa (Coral Irauçuba e Juparaná Brasil).

Fig. 7. Gráfico que mostra os valores obtidos nos ensaios de compressão uniaxial

(MPa) para o Riscado Granja e no Granizado Grey e sua comparação com os valores

de porosidade aparente (%).

Fig. 7. Uniaxial compressive strength graph (MPa) for the Riscado Granja and

Granizado Grey and their comparison with the apparent porosity results (%).

Tabela 3. Resultados dos ensaios de resistência à compressão uniaxial (MPa) no

Riscado Granja e no Granizado Grey (norma técnica NBR 15845-5:2015; ABNT,

2015a); = direcção de aplicação da compressão paralelamente à anisotropia planar; +

direcção de aplicação da compressão perpendicularmente à anisotropia planar.

Table 3. Uniaxial compressive strength test method results (MPa) for the Riscado

Granja and Granizado Grey (NBR 15845-6:2015 standard specification; ABNT,

2015a); = compression direction parallel to the rock planar anisotropy; + compression

direction perpendicular to the rock planar anisotropy.

ABNT

(2015b)

ASTM

C615 (2011) Riscado Granja

(MPa)

Granizado Grey

(MPa) >100 >131

Provetes

1 131,9 + 114,8 =

2 61,7 = 144,6 +

3 67,9 = 138,9 +

4 69,4 = 122,9 +

Média 82,7 130,3

3.4 Resistência à Flexão em 3 Pontos

A flexibilidade de um corpo exprime a sua resistência a esforços flectores (compressão e tracção), produzidos pela aplicação de uma carga na sua superfície. A resposta do material a este tipo de ensaio (NBR 15845-6) é fundamental para estimar a espessura com que devem ser cortadas as placas para transporte ou utilização final em fachadas e revestimentos exteriores. Ambas as amostras cumprem os requisitos exigidos pela ABNT (2015b) e

ASTM C615 (2011), exibindo valores superiores a 10 e 10,3 MPa respectivamente (Tab. 4), sendo muito provável que as diferenças de comportamento estejam relacionadas com o arranjo estrutural / textural, em particular com o tipo de anisotropias planares que apresentam. Deste modo, a presença de uma forte foliação milonítica no Riscado Granja poderá explicar a diferença no desempenho desta rocha comparativamente ao Granizado Grey onde o bandado migmatítico é a estrutura mais

penetrativa.

Gnaisses do Complexo de Granja como Recurso Geológico 97

Os resultados da resistência à flexão em três pontos referentes ao Icaraí Light (8,65 MPa) revela-se inferior aos limites recomendados pela ABNT (2015b) e ASTM C615 (2011),

enquanto os restantes tipos, apresentam valores muito razoáveis (Índigo – 12,76 MPa; Coral Irauçuba – 16,50 MPa; Juparaná Brasil – 14,50 MPa) sendo contudo inferiores aos obtidos para o Riscado Granja e Granizado Grey.

Tabela 4. Resultados dos ensaios de resistência à flexão em 3 pontos (MPa) para o

Riscado Granja e o Granizado Grey (norma técnica NBR 15845-6:2015; ABNT,

2015a); = direcção de aplicação da compressão paralelamente à anisotropia planar; +

direcção de aplicação da compressão perpendicularmente à anisotropia planar.

Table 4. 3 point flexural strength test method results (MPa) for the Riscado Granja

and Granizado Grey (NBR 15845-6:2015 standard specification; ABNT, 2015a); =

compression direction parallel to the rock planar anisotropy; + compression

direction perpendicular to the rock planar anisotropy.

ABNT (2015b)

ASTM C615 (2011) Riscado Granja

(Mpa)

Granizado Grey

(Mpa) >10 >10,3

Provetes

1 25,5 = 22,2 =

2 22,8 = 18,6 =

3 21,5 = 18,1 =

4 27,7 + 17,9 +

5 22,9 + 20,0 +

6 25,4 + 16,6 +

Média 24,30 18,9

3.5 Desgaste Abrasivo Amsler

Os resultados obtidos nos ensaios de desgaste abrasivo, segunda a norma NBR 12042, autenticam a utilização destes materiais para aplicação em revestimento de pisos com elevado tráfego pedonal (<1 mm; ABNT, 2015b) e mostram que o Riscado Granja (0,75 mm) é ligeiramente menos resistente do que o Granizado Grey (0,72 mm), o que deverá estar relacionado com o facto deste último conter maiores proporções de quartzo. Devido à elevada dureza do quartzo, os materiais ricos nesta fase mineral apresentam, em geral, maior resistência ao desgaste

abrasivo.

3.6 Velocidade de Propagação de Ondas Ultra-Sónicas

A determinação da velocidade de propagação de ondas ultra-sónicas (ASTM D2845) constitui um meio de investigação complementar aos ensaios de resistência mecânica e tem a grande vantagem de ser um método não destrutivo. Ambos os provetes analisados apresentam resultados satisfatórios acima do valor limite recomendável de 4000 m/s (ABNT, 2015b). É muito

provável que as diferenças de comportamento entre as duas rochas (5173 m/s – Riscado Granja e 5693 m/s – Granizado Grey) estejam directamente relacionadas com as suas densidades, pois a velocidade de propagação das ondas ultra-sónicas tende a aumentar com a densidade.

4. Emissão de radão (222

Rn)

4.1 Transporte e exalação de 222

Rn

O gás ²²²Rn formado nas rochas e solos é mais móvel do que os demais elementos formados na série de decaímento do 238U e

pode escapar através de fracturas e/ou através dos poros das rochas ou solos por fluxos advectivos ou convectivos e por difusão. Quando um núcleo de rádio (226Ra) decai pela emissão de uma partícula alfa para formar um novo núcleo de 222Rn, este é projectado em direção oposta ao impulso da partícula alfa (Otton et al., 1992). Este é o principal factor que faz com que o novo átomo de 222Rn possa ausentar-se do grão mineral em que o 226Ra que lhe deu origem estava (Fig. 8). A localização do 226Ra no cristal e a direcção de lançamento do 222Rn irá determinar se

este será lançado para o espaço intergranular ou o seu contrário. Se a projecção do 222Rn direccionar a superfície do grão, o mesmo poderá escapar para o espaço poroso, no entanto, como o ressalto de 222Rn é amplificado, este poderá sair do cristal onde inicialmente se formou, atravessar o espaço poroso e alojar-se num outro (Otton et al., 1992). De outro modo, a presença de água preenchendo espaços porosos intergranulares (no caso dos solos) ou fracturas nas rochas promove a absorção da energia

cinética dos átomos de 222Rn neoformados e, consequentemente, a sua retenção nesses espaços (Tanner, 1980). Para além da concentração e distribuição de 226Ra nas rochas e solos, a emissão de 222Rn é condicionada por variações na pressão atmosférica, humidade, temperatura do ar e do solo, mas principalmente pela sua porosidade e permeabilidade (Gundersen et al., 1992).

Fig. 8. Diagrama esquemático que ilustra o decaimento alfa de 226Ra para 222Rn e

respectiva mobilidade num grão mineral (extraído e modificado de Tanner, 1980).

Fig. 8. Schematic diagram showing the 226Ra alpha decay to 222Rn and their respective

mobility within a mineral grain (modified from Tanner, 1980).

98 A. J. F. Silva et al. / Comunicações Geológicas (2015) 102, 1, 91-100

4.2. Metodologia e resultados

O método utilizado para avaliar a actividade de 222Rn foi baseado na proposta de Al-Jarallah (2001). Foram concebidos 4 provetes de

cada amostra com dimensões de 30 x 4,5 x 2 cm e procedeu-se à sua secagem numa estufa a 70 ºC por um período de 24 horas. Após arrefecimento à temperatura ambiente, foram colocados em contentores de 19 litros devidamente lacrados e acondicionados em vácuo a uma pressão de aproximadamente 400 mmHg. A concentração de 222Rn emitido de cada amostra foi obtida através da sua acumulação no monitor AlphaGUARD medido em 3 ciclos contínuos de 10 minutos, suficientes para detectar cerca de 90% da

totalidade do novo sinal como função de resposta transitória. O monitor usado é um sensor de amostragem activa e contínua de radão que possui uma câmara de ionização, utiliza espectroscopia alfa para o detectar e apresenta um limite de detecção de 2 Bq/m3 (Artur et al., 2013; Fig. 9).

Fig. 9. Sistema utilizado no laboratório para a medição da actividade de 222Rn nas

amostras do Riscado Granja e Granizado Grey (extraído de Artur et al., 2013).

Fig. 9. Laboratory equipment set for the 222Rn exhalation measurements in both

Riscado Granja and Granizado Grey samples (Artur et al., 2013).

Os valores registados no monitor, após os 30 minutos de exposição, para o Granizado Grey e para o Riscado Granja, foram respectivamente de 4 e 6 Bq/m3, correspondendo a 0,108 e 0,162 pCi/L. As baixas taxas de emissão de 222Rn em ambas as amostras reflectem as respectivas composições mineralógicas,

quimicamente empobrecidas em U (0,80 ppm – Riscado Granja e 1,56 ppm – Granizado Grey) e muito provavelmente em 226Ra e, consequentemente, as baixas porosidades e microfracturação intergranular/mm². A reduzida rede de fracturas e comunicabilidade entre grãos, juntamente com a inexistência de processos de metamictização em minerais que incorporam urânio na sua estrutura, promove o decréscimo dos valores de emissão de radão nestas rochas, contrariamente a outras litologias, mais porosas e permeáveis, em que o radão pode ser mais facilmente

difundido e libertado. Comparativamente, os resultados da exalação de 222Rn para o

Riscado Granja e Granizado Grey estão consideravelmente abaixo dos valores obtidos por Artur et al. (2013), segundo a mesma metodologia, em ciclos de 5 dias, para o granulito Icaraí Light (16,3 Bq/m3) e para um ortognaisse biotítico migmatizado (330,0 Bq/m3).

5. Conclusões

Num quadro comparativo com outras rochas já estudadas, o Riscado Granja e o Granizado Grey satisfazem os requisitos necessários para exploração como rochas ornamentais. A maioria

dos resultados obtidos nos ensaios tecnológicos situa-se no intervalo de valores recomendados pela ASTM C615 (2011) e ABNT (2015b), indicando a boa qualidade destes materiais.

Adicionalmente, as rochas analisadas exibem valores muito baixos para a emissão de 222Rn, não afastando, no entanto, a futura necessidade de simulações seguras para a sua avaliação sistemática, caso a sua extracção e comercialização seja iniciada.

Agradecimentos

O autor A. J. F. Silva agradece à FCT a bolsa concedida (SFRH/BD/85292/2012) e à Unidade de Investigação GeoBioTec

(UID/GEO/04035/2013). Agradecimento à CAPES pelo financiamento do projecto “Caracterização Físico-Mecânica e Radiométrica de Rochas Ornamentais Silicáticas do Ceará” (AUX-PE-PROCAD-2417/2008) e CPRM pelo apoio ao Departamento de Geologia da UFC através do Programa Geologia do Brasil 1:100.000 Folha Granja. Reconhece-se ainda o convite efectuado pela Comissão Organizadora do VIII Seminário RecGeo UTAD e as apreciações efectuadas pelos

Professores Elisa Preto Gomes, Alcides Pereira e Luís Sousa.

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