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Tema III Política Fiscal e a Crise Econômica Internacional

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Tema IIIPolítica Fiscal e a Crise Econômica Internacional

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Multiplicadores Fiscais no Brasil: uma contribuição ao debate sobre

políticas fiscais anticíclicas

Política Fiscal e a Crise Econômica Internacional – Terceiro Lugar

Manoel Carlos de Castro Pires*

* Doutor em Economia pela Universidade de Brasília (UnB). Técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pes-quisa Econômica Aplicada (Ipea).

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Resumo

A crise financeira internacional que se instaurou na economia brasileira no final do terceiro trimestre de 2008 demandou várias respostas de política econômica. A política fiscal não foi uma exceção, e várias formas de estímulo foram sendo gradativamente adotadas. O debate em torno da necessidade de estímulo e de sua eficácia foi travado nos mesmos moldes do período anterior à crise, enfatizando a problemática das despesas correntes crescentes e seus malefícios sobre o crescimento de longo prazo. Nesse sentido, ainda que essa interpretação possa conter elementos de verdade, é importante qualificar duas questões estruturais. A primeira qualificação é que a maior parte das despesas correntes se refere ao crescimento das transferências de renda, responsável pela manutenção da demanda agregada, combate à pobreza e redução da desigualdade de renda. A segunda qualificação é que esse modelo tem sido consistente com o aumento da poupança pública observado nos últimos dois anos, principal fator responsável pela adoção das políticas anticíclicas durante o período de crise. Nesse sentido, o governo federal adotou várias medidas de estímulo fiscal que visavam a arrefecer os efeitos da crise. Tais medidas culminaram com a redução da meta de superávit primário. Em relação a essa medida, a mudança mais importante foi a exclusão das empresas do Grupo Petrobras. Isso possibilitou a expansão dos investimentos de maneira efetiva e com elevados efeitos multiplicadores. O objetivo desta monografia é analisar como a política fiscal contribuiu para amenizar os efeitos internos da crise financeira internacional. Assim, discute-se como a atual estrutura da política fiscal possibilitou a adoção de medidas anticíclicas enfatizando as medidas de estímulo fiscal e o papel que as empresas estatais cumpriram em acomodar as flutuações dos investimentos. Nesse sentido, a monografia estimou os efeitos multiplicadores dos investimentos das empresas estatais. Os resultados apontam que os efeitos multiplicadores são elevados e foram capazes de amenizar substancialmente a queda dos investimentos da economia, contribuindo de maneira decisiva para a rápida recuperação da economia brasileira.

Palavras-chave: empresas estatais; investimentos; política fiscal.

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Sumário

1 Introdução, 6

2 um breve panorama do orçamento do governo federal: dIstrIbuIção de renda, ajuste fIscal e InvestImentos públIcos, 7

3 a consIstêncIa macroeconômIca da polítIca fIscal, 12

4 uma breve dIscussão sobre as prIncIpaIs medIdas de estímulo fIscal, 17

5 uma estImatIva do efeIto dos InvestImentos estataIs sobre a formação bruta de capItal fIxo, 20

6 estImatIvas prelImInares do Impacto dos InvestImentos das empresas estataIs na fbcf no 1o trImestre de 2009, 31

7 conclusões, 32

referêncIas, 33

anexo 1. dados utIlIzados no modelo de consIstêncIa macroeconômIca, 36

anexo 2. dados utIlIzados no modelo de InvestImento, 37

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Lista de figurafIgura 1. evolução das varIáveIs no período de 1995-2008, 24

Lista de gráficosgráfIco 1. evolução dos programas de transferêncIa condIcIonada de renda, 10

gráfIco 2. evolução do salárIo mínImo real, 11

gráfIco 3. poupança do governo federal (em % do pIb acumulado em 12 meses), 15

gráfIco 4. esforço de consIstêncIa requerIdo para “fechar a IdentIdade” – capacIdade de fInancIamento do setor prIvado – (saldo acumulado em 12 meses como % do pIb), 16

Lista de tabelas

tabela 1. orçamento do governo federal por categorIa de uso (% do pIb), 9

tabela 2. estímulo fIscal com as desonerações trIbutárIas, 18

tabela 3. estímulo fIscal com aumento das despesas, 19

tabela 4. ImportâncIa das empresas estataIs na fbcf (em r$ mIlhões), 20

tabela 5. testes de raIz unItárIa, 25

tabela 6. resultados baseados na aplIcação de testes de coIntegração unIequacIonaIs, 26

tabela 7. resultado do teste gregory-hansen na subamostra a partIr de 2003:1, 28

tabela 8. resultados baseados na aplIcação do teste de johansen, 30

tabela 9. resultados do teste de johansen na subamostra a partIr de 2003:1, 30

tabela 10. projeções alternatIvas dos efeItos dos InvestImentos estataIs sobre a fbcf, 32

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1 Introdução

A crise financeira internacional que se instaurou na economia brasileira no final do terceiro trimestre de 2008 demandou várias respostas de política econô-mica. O consenso em relação à necessidade destas não significou, no entanto, consenso sobre quais políticas deveriam ser adotadas.

Embora os países industrializados se tenham engajado em políticas fiscais expansionistas e muitas vezes não convencionais, como a compra de ativos po-dres de bancos ou ajuda financeira direta para as empresas, não foram poucos os economistas brasileiros a defender que o correto manejo da política monetária por si só seria suficiente para lidar com a crise no Brasil. De acordo com esses econo-mistas, os países que adotaram políticas fiscais expansionistas somente o teriam feito por já terem atingido o limite inferior para a taxa nominal de juros, e o caso brasileiro estaria muito distante dessa realidade, tendo em vista o fato de a taxa de juros nominal básica no Brasil se manter em níveis relativamente elevados (PARNES; GOLDFAJN, 2008).1

Chamou-se a atenção, ainda, para o efeito que uma eventual política fiscal anticíclica teria sobre a taxa de câmbio de equilíbrio. Uma eventual expansão fiscal estimularia o nível de atividade, argumentava-se, e dessa forma contribui-ria para depreciar ainda mais a taxa de câmbio (BACHA, 2008). Conquanto se admitisse que a continuidade do processo de desvalorização cambial poderia con-tribuir para aumentar a competitividade da economia brasileira, foi posta ênfase no fato de a economia brasileira já ter passado (no segundo semestre de 2008) por um forte ajuste no mercado de câmbio, de forma que desvalorizações adicionais poderiam acelerar a taxa de inflação e/ou desestimular ainda mais o investimento privado dependente das importações.

Argumentou-se, finalmente, que – ainda que se admitisse a necessidade do recurso à política fiscal naquele momento – a capacidade de resposta desta última seria pequena e insustentável. Isso ocorreria por conta de problemas crô-nicos da política fiscal brasileira, quais sejam: i) o excesso de vinculações que criaria rigidezes (e, portanto, ineficiências) na execução do orçamento; e ii) o excesso de despesas obrigatórias que dominam o orçamento, elevando o custeio da máquina pública e reduzindo, consequentemente, o espaço para as despesas

1 Sobre a visão convencional de que políticas fiscais só devem ser usadas em contexto de limite inferior para a política monetária, ver Blinder (2006). No caso brasileiro, é importante destacar que o limite inferior para atuação da política monetária é bem diferente de zero em razão da fixação da remuneração dos depósitos de poupança. Uma eventual queda da taxa Selic abaixo da remuneração da poupança pode gerar uma migração dos fundos de investimentos, causando problemas potencialmente sérios na estrutura de financiamento da economia brasileira em virtude da vinculação de parte significativa dos recursos de poupança ao financiamento da construção civil.

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discricionárias (sobretudo investimentos públicos) exercerem um papel verda-deiramente anticíclico.

Nesse sentido, argumentava-se que enquanto os investimentos públicos per-manecessem baixos, a política fiscal “expansionista” concentraria seus efeitos na elevação das despesas de custeio que possuem efeitos multiplicadores baixos e caráter permanente, não se constituindo, portanto, em uma política verdadeira-mente anticíclica.

Esta monografia tem por objetivo apresentar uma visão alternativa sobre a eficiência da política fiscal no Brasil com base no estudo da consistência macro-econômica e dos seus efeitos multiplicadores. Argumenta-se, em particular, que a atual política fiscal, tida por muitos como rígida e ineficiente, é uma política estrutural de distribuição de renda com elevados efeitos multiplicadores sobre a economia. Trata-se, portanto, de uma política fiscal anticíclica legítima que visa, por um lado, a assegurar um patamar mínimo de demanda agregada e, por outro lado, a gerar estímulos para a iniciativa privada, complementando a formação bruta de capital fixo na economia brasileira.2

A monografia está dividida em seis seções além desta introdução. A próxi-ma seção apresenta as principais tendências da política fiscal no período recente. A terceira seção enfatiza a consistência macroeconômica da atual política fiscal. A quarta seção descreve as principais medidas de política fiscal tomadas para estimular a economia brasileira. A quinta seção apresenta uma análise dos efei-tos multiplicadores dos investimentos das empresas estatais sobre o investimento privado. A sexta seção discute, com base nas estimativas obtidas, os efeitos espe-rados sobre a formação bruta de capital fixo no primeiro trimestre de 2009. Por último, são apresentadas as principais conclusões da monografia.

2 Um breve panorama do orçamento do governo federal: distribuição de renda, ajuste fiscal e investimentos públicos

O debate sobre a política fiscal brasileira nos últimos anos tem enfatizado a problemática do crescimento das despesas públicas. Argumenta-se, em particular, que as despesas consideradas rígidas absorvem a maior parte desse crescimento

2 Uma alternativa importante de medida fiscal foram as desonerações tributárias que estimularam a demanda de setores específicos. Esse tipo de medida não será objeto de apreciação, porque o principal objetivo do artigo é fazer uma avaliação da política fiscal pelo lado das despesas.

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e, consequentemente, reduz a participação relativa das despesas discricionárias (REZENDE; OLIVEIRA; ARAÚJO, 2007). Segundo esses autores, essa dinâmi-ca simultaneamente suscitaria dúvidas sobre a possibilidade do cumprimento de metas fiscais no médio prazo e impediria a atuação verdadeiramente anticíclica da política fiscal no curto prazo.

Conquanto essa interpretação contenha elementos de verdade, é importante notar que os impactos macroeconômicos dessa dinâmica estão longe de ser ple-namente compreendidos. Uma possível razão para essa falta de compreensão é a imprecisa caracterização de que as despesas obrigatórias representam o custeio da máquina, e as despesas discricionárias representam os investimentos públicos.

A classificação entre despesas obrigatórias e discricionárias são conceitos oriundos do orçamento e que pouca relação têm com os efeitos econômicos de cada tipo de despesa. O objetivo dessa classificação é simplesmente identificar ou facilitar a apuração do resultado primário (ALBUQUERQUE; MEDEIROS; FEIJÓ, 2008). Para entender o efeito econômico das despesas públicas, a Tabela 1 apresenta a evolução das despesas públicas federais no período 2000-2008, con-forme a categoria de uso divulgado pela SOF/MP, e evidencia que estas cresceram 3,5% do PIB. É importante destacar, entretanto, que esse crescimento foi bastante desigual entre as categorias de uso.

Das categorias de uso que cresceram, as transferências de renda às famílias se destacam, apresentando crescimento de 2,15% do PIB no período. As transfe-rências a entes subnacionais cresceram 1,8% do PIB. Por último, pode-se destacar os investimentos públicos. Ao contrário do que se poderia imaginar, o consumo do governo (basicamente salários do funcionalismo público) cai 0,59% do PIB no período.

Note-se que enquanto as transferências de renda às famílias cresceram ano a ano, as demais despesas sofreram um forte processo de ajuste no período de 2003 a 2005, quando o consumo do governo, os investimentos e as transferências a entes subnacionais apresentam reduções significativas, para somente nos anos seguintes apresentarem moderado crescimento.

O ajuste ocorrido no período de 2003-2005 deveu-se à necessidade de ele-var o esforço fiscal com o objetivo de estabilizar a dívida pública. Nesse sentido, é importante destacar que o objetivo de manter a sustentabilidade da política fis-cal, ao menos no nível federal, não entrou em conflito com a tarefa de distribuir renda por meio dos programas de transferências de renda do governo federal.

No referido processo de ajuste das contas públicas, o item de despesa que mais sentiu os impactos da restrição fiscal foi o investimento público. Com efei-to, somadas as inversões financeiras, esse componente da despesa atingiu o valor mais baixo no ano de 2003, crescendo sensivelmente no período até retornar ao

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patamar anterior ao do ajuste fiscal. Assim, é possível afirmar que, pelo lado das despesas, o processo de ajuste fiscal ocorreu sobre o consumo do governo e sobre os investimentos públicos do governo federal e que as transferências de renda foram preservadas. Esse aspecto permite inferir que a política de transferência de renda do governo federal foi o principal alicerce da política fiscal no período e o único objetivo não sacrificado quando entrou em conflito com os demais.

Tabela 1 OrçamenTO dO gOvernO federal pOr caTegOria de usO (% dO pib)

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Transferências a entes subnacionais

4,64% 4,86% 5,25% 4,99% 5,03% 5,74% 5,64% 5,86% 6,44%

Transferências de renda às famílias

8,41% 8,88% 9,12% 9,50% 9,65% 10,08% 10,42% 10,56% 10,56%

Transferências ao setor privado

0,22% 0,28% 0,24% 0,24% 0,21% 0,28% 0,29% 0,29% 0,17%

Consumo do governo 4,34% 4,29% 4,24% 3,72% 3,65% 3,51% 3,59% 3,75% 3,75%

Investimentos e inversões financeiras

0,74% 0,81% 0,89% 0,35% 0,53% 0,58% 0,73% 0,85% 0,96%

Demais 0,17% 0,17% 0,27% 0,24% 0,24% 0,32% 0,32% 0,24% 0,26%

Total 18,52% 19,28% 20,01% 19,03% 19,31% 20,51% 20,97% 21,55% 22,14%

Fonte: elaborado pelo autor com dados da SOF e do Siga Brasil/SenadoNota: Valores liquidados, exceto investimentos e inversões financeiras (conceito caixa).

É importante destacar que enquanto se pode afirmar que a maior parte das transferências de renda se refere às despesas previdenciárias e que pode ser tida como rígida e com dinâmica própria, deve-se ressaltar que vários outros progra-mas de transferência de renda surgiram ou cresceram bastante exatamente a partir do ano de 2004, quando a restrição fiscal ainda era prioritária.

Para ilustrar esse ponto, é importante observar o comportamento das trans-ferências condicionadas de renda no período. Utilizando dados do Siga Brasil do Senado Federal, pode-se observar o crescimento expressivo desse programa orçamentário desde seu início em 2001 (Gráfico 1).

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gráficO 1 evOluçãO dOs prOgramas de Transferência cOndiciOnada de renda*

Fonte: Siga Brasil/Senado FederalNota: * Até 2004, as transferências de renda condicionadas compõem as ações bolsa escola, bolsa alimentação e criança cidadã. A partir de 2004, essas ações foram consolidadas no programa bolsa família.

Outro aspecto importante na dinâmica das transferências de renda é a po-lítica de valorização do salário mínimo. Após alguns anos de aumentos reais, o Projeto de Lei n. 1/2007, atualmente em discussão no Congresso Nacional, esti-pula que o aumento do salário mínimo seja igual à variação do INPC no período acrescida da variação do PIB de dois anos anteriores até 2023. Na Medida Provi-sória n. 421, de 29 de fevereiro de 2008, o governo federal antecipou essa regra para o orçamento de 2009.

A evolução do salário mínimo real (deflacionado pelo INPC) pode ser ob-servada no Gráfico 2. Analisando a série desde 1944, percebe-se que durante o período de 1992-2008 o salário mínimo aumentou consistentemente, até alcançar em 2008 níveis equivalentes aos observados nos anos 1950. Com a aprovação do PL n. 1/2007, pode-se esperar pela manutenção dessa tendência, ainda que de forma bem mais moderada do que a ocorrida no período de 2005-2008, que repre-sentou o principal “salto” no período.

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gráficO 2 evOluçãO dO saláriO mínimO real

Fonte: Ipeadata

Assim, ao caracterizar as transferências de renda simplesmente como uma despesa de custeio, perde-se seu efeito principal, que se dá sobre o combate à pobre-za e à desigualdade de renda, gerando renda para as famílias (BARBOSA-FILHO, 2008). Com efeito, os programas de transferência de renda do governo federal têm reduzido de forma considerável a desigualdade do Brasil (SOARES, 2006).

Mesmo o receio de que nos próximos anos as despesas com o consumo do governo ou de que as transferências de renda vinculadas ao salário mínimo pos-sam crescer de forma que tomem ainda mais espaço ou “engessem” o orçamento, é importante considerar que é totalmente factível imaginar que esse crescimento pode ter vida curta. Nesses dois casos, o governo federal tem o poder de influen-ciar diretamente duas variáveis decisivas: i) a política de contratação e remunera-ção do funcionalismo público; e ii) o valor do reajuste do salário mínimo. À épo-ca do lançamento do Programa de Aceleração Econômica (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2007), as propostas fiscais de longo prazo eram no sentido de criar limites a esses dois tipos de despesa: i) criando limites rígidos, por órgão, para despesas com pessoal;3 e ii) estipulando uma regra de reajuste real para o salário mínimo que o situasse aquém do crescimento nominal do PIB no médio prazo. A adoção dessas duas regras permitiria que esses dois itens de despesa caíssem

3 O PLP 1 de 2007 estipula que a expansão da folha de pessoal esteja limitada à variação do IPCA no período acrescido de 1,5% por poder.

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como proporção do PIB e, ao mesmo tempo, se consolidassem os ganhos econô-micos já alcançados. Portanto, o modelo de “gastos públicos correntes crescentes”, tal como caracterizado por Velloso, Mendes e Caetano (2009), parece reversível em poucos anos, da mesma forma como ocorreu no período de 2003-2005 (Tabela 1).

3 A consistência macroeconômica da política fiscal

Ainda que a atual tendência da política fiscal possa ser considerada reversí-vel, é importante analisar se ela padece de inconsistência do ponto de vista macro-econômico. A linha de raciocínio dos autores citados no parágrafo anterior é que o crescimento das despesas rígidas compromete a poupança pública, limitando o crescimento de longo prazo, pois limitaria os investimentos à captação de poupança externa. Assim, para que a economia possa elevar seu crescimento potencial seria necessário reduzir as despesas rígidas para aumentar a poupança pública.

É fato que o arranjo macroeconômico que depende muito da absorção de poupança externa tem apresentado resultados negativos na economia brasileira (BRESSER-PEREIRA; NAKANO, 2002). No entanto, há de se considerar que é possível o ajuste ocorrer na economia nacional por meio do aumento da pou-pança privada. Como discutido, o item de despesa pública que mais aumentou no período foram as transferências de renda ao setor privado. Além de estimular o consumo, é perfeitamente factível imaginar que parte das transferências de renda é utilizada para aumentar a poupança privada nacional. Portanto, para realizar a referida análise de consistência é importante calcular a poupança do governo fe-deral e o esforço de poupança requerido do setor privado para que a consistência macroeconômica seja mantida.

Das contas nacionais, segue que a poupança agregada da economia (S) deve igualar-se ao investimento agregado (I):

S=I (1)

Ademais, a poupança pode ser desagregada entre a poupança externa (ext) e a poupança interna (int):

S = Sext + Sint (2)

A poupança interna, por sua vez, pode ser desagregada entre a poupança privada (priv), a poupança do governo federal (gf) e a poupança dos demais go-vernos regionais (demais):

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Sint = Spriv + Sgf + Sdemais (3)

Paralelamente, o investimento pode ser desagregado entre investimento pri-vado, investimento do governo federal e investimento dos demais governos:

I = Ipriv + Igf + Idemais (4)

Utilizando as desagregações apresentadas na identidade (1) e rearranjando para a poupança do governo federal tem-se a seguinte relação:

Sgf = Ipriv + Igf + Idemais - Sdemais - Sext - Spriv (5)

A equação (5) mostra que uma queda da poupança do governo federal deve vir acompanhada de uma compensação em alguns dos demais fluxos: i) ou de uma redução dos investimentos ii) ou de uma elevação da poupança dos demais setores institucionais. É importante, contudo, perceber que essa compensação não deve ser confundida com causalidade. A equação (5) pode ser rearranjada para qualquer um dos seus componentes para realizar a análise de consistência.4

Outra questão importante é como calcular a poupança do governo federal considerando que o IBGE o faz com muita defasagem e que as estatísticas fiscais coletadas pelos órgãos responsáveis (Tesouro Nacional e BCB) não representam uma tradução perfeita das estatísticas produzidas pelo IBGE. Dois exemplos cla-ros das diferenças no tratamento estatístico entre as duas bases e que compro-metem a comparação se referem ao tratamento dado às contribuições sociais dos funcionários públicos e ao consumo de capital fixo do governo, duas variáveis calculadas para compor o consumo do governo. A primeira refere-se ao paga-mento de contribuições previdenciárias do funcionalismo público pelo empre-gador (que na prática não existe, constituindo-se em uma convenção contábil), e a segunda refere-se ao desgaste do estoque de capital fixo, que também não é calculado pelas estatísticas fiscais por não representar um desembolso financeiro.

Dadas essas duas discrepâncias no que irá compor o cálculo da poupança do governo, preferiu-se trabalhar com a metodologia a partir da conta de capital das contas nacionais utilizando-se o método “abaixo da linha”. A conta de capital nas contas nacionais reflete como as transferências de capital resultantes das va-riações de patrimônio líquido impactam a necessidade ou a capacidade de finan-ciamento de um respectivo setor institucional (FEIJÓ et al., 2008).

Na conta de capital existem cinco contas que ligam a poupança bruta à ne-cessidade de financiamento. Além das duas contas citadas, agregam-se à conta de

4 Mesmo tendo feito essa consideração, é importante ressaltar que é muito comum entre os analistas o uso de certas relações causais nas relações anteriormente discutidas. Nesse caso, é importante ter claro que tipo de hipótese está sendo aventada e quais variáveis estão sendo tratadas de forma endógena ou exógena. A definição do que pode ser tratado como endógeno ou exógeno depende do que o analista considera ser o “fechamento” (closure) adequado para o modelo em questão. De todo modo, é importante ressaltar que, dependendo da situação, um “fechamento” pode ser mais adequado do que outro, mas isso não deve ser encarado como a única forma de se fazer a análise.

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capital a formação bruta de capital fixo (FBKF), a variação de estoques (VE) e o saldo da conta de transferências líquidas de capital (TK). Por convenção, assume-se que a variação de estoques do setor público é zero.5

Após tecer essas considerações, pode-se definir a relação proveniente das contas nacionais que liga o déficit nominal (Dgf) à capacidade de financiamento (Fgf) do governo federal como:

Fgf = -Dgf = Sgf - Igf + TKgf (6)

Ao considerar a definição do déficit nominal no BCB com a conta de capital das contas nacionais, pode-se perceber que o ajuste patrimonial representa uma proxy para as transferências líquidas de capital. Ao definir o déficit nominal como a soma do déficit primário (DP), dos juros nominais (JN) e dos ajustes patrimo-niais (AP), tem-se a seguinte relação:

Dgf = JNgf + DPgf + APgf (7)

Para simplificar, define-se a soma entre os juros nominais e o déficit pri-mário como a diferença entre o investimento e a poupança do governo federal (JNgf + DPgf = Igf - Sgf ), sendo, portanto, possível constatar que os ajustes patrimo-niais podem representar uma aproximação para as transferências de capital.6

Para efeitos de simplificação, desconsideram-se os ajustes patrimoniais, e a poupança pública pode ser definida da seguinte maneira:

-Dgf = Sgf - Igf (8)

sendo, portanto, possível calcular a poupança pública considerando a soma do déficit nominal e do investimento. Seguindo essa lógica, se o cálculo da poupança for negativo, existe uma necessidade de captação de recursos dos demais setores institucionais da economia.

A poupança do governo federal foi calculada considerando os dados do déficit nominal disponíveis no sítio do Banco Central do Brasil para o governo federal e os dados de investimento referem-se ao Grupo Natureza de Despesa 4 que foram extraídos do sistema Siga Brasil/Senado Federal.

5 Cumpre observar que a apuração do déficit pelo método “abaixo da linha” deve oferecer os mesmos resultados que o método “acima da linha”, porém com sinais trocados. Pelo método “abaixo da linha” obtém-se a informação sobre como financiar o déficit, e pelo método “acima da linha”, como este foi provocado.

6 É importante destacar que a relação não é perfeita, pois, como já discutido, existem algumas convenções metodológicas que fazem com que as contas nacionais se diferenciem das estatísticas fiscais, como é o caso do consumo de capital fixo e das contribuições sociais imputadas. Outra fonte de distorção se dá pela diferença entre os conceitos de arrecadação. Nas contas nacionais, trabalha-se com alguns grupos específicos de receita do governo, tais como contribuições sociais, impostos sobre produção, impostos sobre riqueza e impostos sobre capital. Existem vários tributos que compreendem a receita do governo, mas que não são tratados pelas contas nacionais, criando algumas distorções sobre a igualdade proposta.

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O Gráfico 3 mostra a evolução da poupança do governo federal desde janei-ro de 2003, quando os dados de investimento acumulados em 12 meses estão dis-poníveis. O primeiro fato importante a ser notado é que na maior parte do período a poupança do governo federal foi negativa. O segundo fato importante é que a poupança se tornou positiva no segundo semestre de 2008 e se deteriorou desde o início da crise. No entanto, cumpre notar que a poupança pública melhorou con-sistentemente desde o início de 2006, o que sugere a consistência de médio prazo das contas públicas.

gráficO 3 pOupança dO gOvernO federal (em % dO pib acumuladO em 12 meses)

Fonte: elaborado pelo autor

Tendo calculado a poupança do governo federal, é importante calcular tam-bém o quanto essa poupança, dado os demais fluxos, exige de esforço de consis-tência macroeconômica. Em outras palavras, contabilizando a poupança externa (que é definida pelo saldo das transações correntes) e a NFSP dos governos sub-nacionais, pode-se obter por resíduo o esforço requerido do setor privado para fechar a identidade.

O Gráfico 4 apresenta a evolução do esforço de consistência requerido pelo modelo junto ao setor privado. Pode-se notar que o esforço tem caído gradati-vamente até atingir o equilíbrio no final de 2008. A partir daí, observa-se uma deterioração da capacidade de financiamento do setor privado.7

7 Os dados referentes a essas estimativas encontram-se no Anexo 1.

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gráficO 4 esfOrçO de cOnsisTência requeridO para “fechar a idenTidade”

capacidade de financiamenTO dO seTOr privadO*(saldO acumuladO em 12 meses cOmO % dO pib)

Fonte: elaborado pelo autorNota:* Valores positivos indicam capacidade de financiamento e valores negativos indicam necessidade de financiamento.

A análise de consistência indica que o modelo atual de política fiscal pode ser considerado consistente do ponto de vista macroeconômico. Com efeito, na medida em que a poupança pública apresentou clara melhoria, o esforço exigido junto ao setor privado foi sendo reduzido fortemente. Tal consistência foi direta-mente responsável pela mudança de comportamento da política fiscal em relação ao ciclo econômico, pois enquanto a evidência empírica disponível mostra evi-dências de que a política fiscal no Brasil foi pró-cíclica no passado recente (tal como sugerido por Ilzetzki e Végh (2008) e De Mello e Moccero (2006), durante essa crise foi possível adotar medidas de caráter anticíclico.8

8 Uma segunda razão que possibilitou a adoção de medidas anticíclicas foi a obtenção da posição de credor em moeda internacional. Como crises econômicas no Brasil são associadas a fortes ajustes na taxa de câmbio, essa posição permitiu que a dívida líquida se reduzisse no auge da crise, flexibilizando a meta de superávit primário. Para maiores detalhes, ver Mendonça, Medrano e Pires (2008).

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4 Uma breve discussão sobre as principais medidas de estímulo fiscal

A velocidade com a qual a crise se instaurou no Brasil a partir do fim do terceiro trimestre de 2008 demandou reações distintas entre os vários instrumen-tos de política econômica. Enquanto em um primeiro momento não estava claro o comportamento futuro da taxa de inflação que condicionava as decisões de po-lítica monetária, a política fiscal possibilitou as primeiras medidas de estímulo da demanda agregada.9

Em dezembro de 2008, o Ministério da Fazenda anunciou três medidas de desoneração fiscal: i) redução da alíquota do IRPF para 2009 (estimada em R$ 4,9 bilhões), que objetivava estimular a demanda agregada; ii) redução da alíquota do IPI sobre automóveis até março (estimada em R$ 1 bilhão), que visava a reduzir os estoques desse setor que cresceram rapidamente em virtude da queda expressi-va da demanda; e iii) desoneração do IOF sobre crédito ao consumidor (estimada em R$ 2,5 bilhões) com vistas ao restabelecimento do crédito privado.

Ao final de março, o Ministério da Fazenda anunciou a manutenção da de-soneração do IPI sobre automóveis e ampliou a medida para motocicletas, in-cluindo, nesse caso, a Cofins também. Para compensar a perda de arrecadação com essa medida, o ministério elevou o IPI-fumo. A perda de receita líquida dessa medida foi estimada em R$ 700 milhões.

Em abril, foram anunciadas outras duas medidas de desoneração tributária. A redução do IPI para eletrodomésticos da linha branca (estimada em R$ 170 mi-lhões) e a redução do IPI para alguns itens da construção civil (estimada em R$ 90 milhões), ambas com o objetivo de reativar a demanda agregada.

Em junho foram anunciadas a manutenção das atuais desonerações (sobre automóveis, construção civil, eletrodomésticos e motocicletas) bem como a am-pliação das desonerações para bens de capital em mais de setenta itens, além de outras medidas financeiras, como equalização de juros. A estimativa é que o estí-mulo fiscal tenha alcançado R$ 12,5 bilhões (Tabela 2).10

9 Os primeiros reflexos da crise refletiram-se em problemas de liquidez no sistema interbancário e em operações cambiais com derivativos de várias empresas. Ainda que a discussão sobre a taxa de juros estivesse contaminada pelos riscos inflacionários, é importante notar que o Banco Central do Brasil recorreu ao expediente de políticas não convencionais, como o uso de reservas internacionais para financiar empresas com dificuldades e redução dos compulsórios para aliviar os problemas de liquidez no sistema interbancário.

10 Em apresentação no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou que as desonerações atingem R$ 13,6 bilhões. O cálculo apresentado refere-se às estimativas feitas na época de anúncio de cada medida. A diferença deve ser devida a novas estimativas realizadas pelos técnicos.

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Tabela 2 esTímulO fiscal cOm as desOnerações TribuTárias

Medidas fiscais Estímulo em 2009 (em R$ bilhões)

Desonerações de dezembro/2008

IRPF 4,90

IPI – automóveis 1,00

IOF – crédito ao consumidor 2,50

Total 8,40

Desonerações de março/2009

Postergação do IPI automóveis 1,00

Cofins das motocicletas 0,15

IPI – construção civil 0,35

Recomposição da receita com IPI – fumo -0,80

Total 0,70

Desonerações de abril/2009

IPI – construção civil 0,09

IPI – linha branca 0,17

Total 0,26

Desonerações de junho/2009

IPI – bens de capital 0,41

Postergação do IPI automóveis 1,79

Postergação do IPI linha branca 0,20

Postergarção do Cofins das motocicletas 0,05

Postergação do IPI da construção civil 0,69

Total 3,15

Total geral 12,51

Fonte: elaborado pelo autor

Do ponto de vista das medidas de expansão das despesas, assim que ficou clara a extensão da crise, o governo federal adotou um discurso de elevação dos investimentos como medida anticíclica. O governo federal retirou as empresas do grupo Petrobras do cálculo do superávit primário, o que significa a possibilidade

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de expansão de seus investimentos em até R$ 15 bilhões, e antecipou em um mês o aumento do salário mínimo como medida de estímulo à demanda agregada (es-timada no ano de 2009 em R$ 8,7 bilhões). O pacote de habitação (estimado em R$ 6 bilhões) visava a criar estímulos ainda maiores para o setor de construção civil, além de expansões nos programas de seguro desemprego e bolsa família. O total dessas medidas está estimado em R$ 30,93 bilhões (Tabela 3).11

Tabela 3 esTímulO fiscal cOm aumenTO das despesas

Medidas fiscais Estímulo em 2009 (em R$ bilhões)

Aumento de despesas

Investimentos da Petrobras 15,00

Salário mínimo 8,70

Pacote habitação 6,00

Seguro desemprego 0,23

Bolsa família 1,00

Total geral 30,93

Fonte: elaborado pelo autor

Em decorrência dessa série de medidas, o governo federal anunciou em abril a redução da meta de superávit primário para o ano de 2009 de 3,8% do PIB para 2,5% do PIB, podendo, ainda, utilizar o espaço fiscal permitido pelo PPI. Da redução da meta convém assinalar a exclusão das empresas do grupo Petrobras do cálculo estimado em 0,5% do PIB. A parcela do governo federal foi reduzida de 2,15% do PIB para 1,4% do PIB, e a de estados e municípios reduzida de 0,95% do PIB para 0,90% do PIB. As demais empresas estatais tiveram a meta definida para 0,2% do PIB. Assim, a retirada das empresas do grupo Petrobras do cálculo do superávit primário constitui-se na principal ação no sentido de contrapor a queda dos investimentos privados, que foi o componente da demanda agregada que, em decorrência da crise, sofreu a queda mais pronunciada.12

11 É importante considerar que é difícil caracterizar perfeitamente as medidas tomadas por conta da crise de medidas que já seriam tomadas de qualquer forma. O caso do aumento do salário mínimo, por exemplo, foi incluído nessa conta porque, apesar de já ser uma decisão tomada anteriormente, é uma importante medida de estímulo à geração de renda. Além disso, há de serem considerados os elementos anticíclicos implícitos que existem na regra atual, pois em 2011, quando possivelmente a economia tiver retornado à normalidade, o reajuste deverá ser bem menor, em decorrência do menor crescimento do PIB a ser observado em 2009.

12 Posteriormente, foi incluído o Programa Minha Casa Minha Vida no PAC, com possibilidade de abatimento integral da meta de superávit primário. Atualmente, a meta é de 2,5% do PIB, podendo chegar até 1,56% do PIB.

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5 Uma estimativa do efeito dos investimentos estatais sobre a formação bruta de capital fixo

A importância das empresas estatais na política econômica brasileira não é recente e se tem destacado desde meados dos anos 1970, quando essas empresas foram importante instrumento para a obtenção de financiamento externo (CRUZ, 1984), ou nos anos 1980, quando foram utilizadas com propósito de estabilização de preços, seja por meio de política de administração direta de preços ou como forma de contenção da demanda agregada (WERNECK, 1987). Esse papel per-maneceu ainda importante no período mais recente, com a forte contribuição das empresas estatais, seja direta ou indireta, para a política de geração de superávit primário (GOBETTI, 2009).

A crise financeira internacional não mudou esse panorama geral, ainda que tenha mudado explicitamente a forma pela qual as empresas estatais estão sendo utilizadas como instrumento de política econômica. Com efeito, a retirada das empresas do grupo Petrobras do cômputo da meta de superávit primário signifi-cou maior grau de liberdade para a referida estatal alocar investimentos estratégi-cos em um ano em que a formação bruta de capital fixo (FBCF) deverá cair.

Para entender, portanto, a importância das empresas estatais como instru-mento de estabilização dos investimentos da economia brasileira, é necessário verificar sua importância no total da FBCF. A Tabela 4 apresenta a participação relativa dos investimentos das empresas estatais. Enquanto no período de 1995-1998 as empresas estatais contribuíram em média com quase 9% da FBCF total, no período de 1999-2002 elas contribuíram com 5,48% da FBCF total da econo-mia.13 A partir de então, os investimentos das empresas estatais situaram-se em torno de 6% da FBCF total e para o biênio 2007-2008 mostram forte aceleração até alcançar 7,8% do total da FBCF.

Tabela 4 impOrTância das empresas esTaTais na fbcf (em r$ milhões)

1995-1998* 1999-2002* 2003 2004 2005 2006 2007 2008

FBCF das estatais 54,038 45,451 18,665 19,695 21,827 23,371 29,518 42,851

FBCF 600,986 828,831 259,714 312,516 342,237 389,328 455,213 548,757

Participação % 8,99% 5,48% 7,19% 6,30% 6,38% 6,00% 6,48% 7,81%

Fonte: IBGE e DEST/MPOGNota: Total no período.

13 Muito da queda observada entre 1995-1998 e 1999-2002 deve-se à privatização do setor energético.

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A análise do impacto dos investimentos das empresas estatais sobre a FBCF da economia deve levar em consideração, portanto, sua importância relativa no total da FBCF, tal como apresentado na Tabela 4, mas também seu efeito indireto no restante da FBCF. Na medida em que o restante da FBCF é afetado pelos inves-timentos estatais, por meio de externalidades positivas ou negativas, o efeito total dos investimentos estatais sobre a FBCF deve levar em consideração tal efeito.

É importante considerar, de todo modo, que o interesse do artigo não está centrado nas externalidades em si dos investimentos estatais sobre os demais in-vestimentos da economia, sejam elas positivas ou negativas, mas na capacidade que os investimentos estatais possuem em acomodar as flutuações da FBCF. Des-sa forma, mesmo um efeito indireto negativo, porém pequeno, dos investimentos estatais sobre o restante da FBCF pode ser interpretado como evidência favorável ao papel das estatais como instrumento anticíclico.

De maneira formal, o efeito total dos investimentos estatais sobre a FBCF é dado por:

FBCFt = IEST, t + IDEMAIS, t γFBCF = θγEST, t + (1 – θ)γDEMAIS, t (9)

onde θ representa o peso dos investimentos das estatais no total da FBCF e γ denota a taxa de crescimento dos investimentos. Os índices EST e DEMAIS representam as estatais e os demais investimentos da economia, respectivamente. É importante destacar, ainda, que os demais investimentos representam uma função dos inves-timentos estatais. Desse modo, considerando um modelo formulado em termos de logaritmos, temos que:

ln(IDEMAIS, t) = βln(Xt) + αln(IEST, t) + εt (10)

onde a é a externalidade dos investimentos estatais sobre os demais investimen-tos da economia, εt tem média zero e variância constante, β é um vetor de parâme-tros e X é uma matriz que contém as variáveis de controle usualmente utilizadas nas estimações de funções investimento.

Considerando, portanto, que a função investimento formulada em termos de logaritmos implica que a taxa de crescimento do investimento é igual à taxa de crescimento das variáveis explicativas ponderadas pelas elasticidades, e tem-se que o efeito total do aumento em 1% dos investimentos estatais sobre a taxa de crescimento da FBCF total é aproximadamente igual a θ + (1 – θ)α.

Enquanto o efeito direto do aumento dos investimentos das empresas esta-tais sobre a FBCF é contábil e igual à unidade (ponderado por seu peso no total da FBCF), o efeito indireto (α) precisa ser estimado. Uma forma de avaliar esse efei-to é por meio das tradicionais funções de investimento keynesianas, estimadas

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utilizando técnicas de cointegração. De acordo com esses modelos, o investimen-to é função: i) da demanda agregada, usualmente medida pelo próprio PIB; ii) do custo do capital, aproximado pela razão entre o IPA-DI máquinas e equipamentos e o IGP-M; iii) da carga tributária bruta tal como aplicado por Dos Santos e Pires (2007); e iv) uma medida de investimentos públicos ou investimentos em infraes-trutura para captar possíveis externalidades positivas ou negativas.

No caso dos investimentos em infraestrutura, utilizam-se os investimentos das empresas estatais, conforme divulgado pelo Dest/MPOG. A variável depen-dente é a FBCF divulgada pelo IBGE, sendo excluídos do total da FBCF os inves-timentos das empresas estatais (Iest) para evitar problemas de multicolinearidade (Idemais). Os dados de FBCF e de investimentos das estatais foram deflacionados por uma média ponderada entre INCC e IPA-DI máquinas e equipamentos (com pesos iguais a 2/3 e 1/3, respectivamente).

A Figura 1 apresenta a evolução das séries trimestrais no período 1995:1-2008:4 dessazonalizados pelo método X12-Arima. Em primeiro lugar, é impor-tante destacar que é comum observar quebras estruturais ou observações aberran-tes nas séries FBCF excluídas as empresas estatais na série de investimentos das empresas estatais e no preço relativo do capital (PK). As séries de PIB e de carga tributária bruta (CTB) parecem se comportar de maneira regular.

No caso da FBCF excluídas as estatais, por exemplo, é importante destacar a mudança de comportamento da série a partir de 2005, que aparenta uma forte tendência, além do choque aberrante, ao final de 2002, podendo induzir a percep-ção de que existe reversão para a média nesse processo e, portanto, poderia levar à conclusão de que a série é estacionária. Tendo em vista essas considerações, o teste de Zivot e Andrews (1992), que modela de forma endógena a quebra estru-tural, não rejeitou a hipótese nula de que a série é não estacionária. Com efeito, o teste indicou a existência de uma quebra estrutural na tendência no quarto trimes-tre de 2005. No caso de testes que não levam em conta a quebra estrutural, o teste ADF rejeitou a hipótese alternativa ao nível de 10%, enquanto o teste Ng-Perron (2001) rejeitou também ao nível de 10%.

No comportamento dos investimentos das empresas estatais, pode-se obser-var a ocorrência de um choque negativo em 1997, e apenas a partir de 2001 um processo de recuperação, que se acelera em 2005. A série parece exibir tendên-cia declinante no início do período, e a partir de 2001 apresenta uma tendência ascendente. O teste de Zivot e Andrews modelado com quebra na tendência não rejeita a hipótese nula ao nível de 5%, tendo acusado a quebra estrutural no pri-meiro trimestre de 2000. O teste ADF rejeitou a hipótese alternativa apenas ao nível de 1%, e o teste Ng-Perron não rejeitou a hipótese nula aos níveis usais de significância.

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A evolução do preço relativo do capital apresenta um comportamento com uma tendência declinante até o ano de 2002, quando, a partir daí, aparenta se comportar mais como um passeio aleatório ou mesmo como uma variável que sofreu uma nova quebra de tendência em 2006. A evolução da série pode levar a concluir por uma quebra na tendência bem como adicionada de uma mudança de nível. O teste de Zivot e Andrews modelado com quebra na tendência indicou pela rejeição da hipótese alternativa, acusando uma quebra estrutural no quarto trimestre de 2006. Ao aplicar o teste de Zivot e Andrews modelando a quebra na tendência e na constante, conclui-se pela rejeição de hipótese alternativa, mas com a quebra definida no primeiro trimestre de 2004. Os testes ADF e Ng-Perron apenas confirmam as conclusões obtidas.

O PIB pode ser considerado não estacionário conforme os testes ADF e Ng-Perron. No caso da carga tributária bruta, o teste ADF rejeita a hipótese alternati-va apenas ao nível de 1%. No entanto, o teste Ng-Perron o faz dentro dos níveis usuais de confiança, atestando que esta variável pode ser tratada como variável não estacionária. A Tabela 5 apresenta os resultados dos testes de raiz unitária.

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3.1

3.2

3.3

3.4

3.5

3.6

3.7

3.8

95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

I_DEMAIS

4.5

4.6

4.7

4.8

4.9

5.0

5.1

95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

PIB

-0.4

0.0

0.4

0.8

1.2

1.6

95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

I_EST

-.25

-.20

-.15

-.10

-.05

.00

.05

95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

PK

.24

.26

.28

.30

.32

.34

.36

.38

95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

CTB

figura 1 evOluçãO das variáveis nO períOdO de 1995-2008

Fonte: elaborado pelo autor

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Tabela 5 TesTes de raiz uniTária

ADF Ng-Perron Zivot e Andrews

Idemais

O teste com constante não rejeita a hipótese nula ao nível de 10%. A estatística de teste obtida foi -1,33.

O teste com constante não rejeita a hipótese nula apenas ao nível de 10%. A estatística de teste MZa obtida foi -4,66. O mesmo padrão é obtido nas de-mais estatísticas de teste.

Não rejeita a hipótese nula ao nível de 1%. Acusou quebra estrutural na tendência em 2005:4. A estatística de teste obtida foi -4,75.

Iest

O teste com constante e tendência rejeita a hipótese nula ao nível de 1%. A estatística de teste obtida foi -3,92.

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula aos níveis usuais. A estatística de tes-te MZa obtida foi -14,11. O mesmo padrão é obtido nas demais estatísticas de teste.

No teste com quebra na tendência a hipótese nula não é rejeitada aos níveis usuais e a quebra foi encon-trada em 2000:1. A estatística de teste foi -3,08.

PIB

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula aos ní-veis usuais de confian-ça. A estatística de tes-te obtida foi de -2,19.

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula aos níveis usuais de confiança. A es-tatística de teste MZa ob-tida foi de -4,31. O mesmo padrão é obtido nas de-mais estatísticas de teste.

Não aplicado.

PK

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula ao ní-vel de 10%. A estatís-tica de teste foi -2,64.

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula aos níveis usuais de confiança. A es-tatística de teste MZa ob-tida foi de -0,64. O mesmo padrão é obtido nas de-mais estatísticas de teste.

Não rejeita a hipótese nula ao nível de 5% tanto no teste com quebra na tendência quanto no teste com que-bra na constante e na tendência (as estatísticas de teste obtidas foram -2,62 e -3,54, e as quebras foram datadas em 2006:4 e 2004:1, res-pectivamente).

CTB

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula ape-nas ao nível de 1%. A estatística de teste foi -3,50.

O teste com constante e tendência não rejeita a hipótese nula aos níveis de confiança usuais. A es-tatística MZa foi -11,40. O mesmo padrão é obtido nas demais estatísticas de teste.

Não aplicado.

Fonte: elaborado pelo autor com base nos resultados reportados pelos softwares E-views e rats

Os resultados apontam, em geral, para a existência de relação de cointe-gração entre as variáveis no caso dos testes sem quebra estrutural, conforme os

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resultados do teste de Engle-Granger (1987). Ademais, pode-se considerar que a elasticidade do investimento estatal é relativamente robusta e negativa em torno de -0,02 a -0,04.

No caso de testes com quebras estruturais, os resultados com os investimen-tos das empresas estatais indicam que a quebra ocorreu em 2002, mas a relação de longo prazo é pouco robusta, conforme os resultados do teste Gregory-Hansen (1996). Basicamente, a inclusão da variável preço do capital faz desaparecer a relação de longo prazo entre as variáveis. Nota-se, no entanto, que nos casos em que a relação de longo prazo não é rejeitada, observa-se a existência de quebra es-trutural no quarto trimestre de 2008. No entanto, a relação entre os investimentos estatais e os demais investimentos, que é negativa na primeira parte da amostra, torna-se positiva a partir do primeiro trimestre de 2003.

Tabela 6 resulTadOs baseadOs na aplicaçãO de TesTes de cOinTegraçãO uniequaciOnais

Teste Especificação Resultado Relação de Cointegração

Engle-Granger Idemais = f(Pib, Iest)

Estatística de teste -3,35 não rejeita hipó-tese nula em 10%.

Idemais =-0,47+ 0,81Pib-0,02 Iest

Engle-Granger Idemais = f(Pib, Iest, PK)

Estatística de teste -3,60 não rejeita hipó-tese nula em 10%.

Idemais =-0,31+ 0,77Pib-0,02 Iest -0,21PK

Engle-Granger Idemais = f(Pib, Iest, CT)

Estatística de teste -2,86 não rejeita hipó-tese nula em 10%.

Idemais =-2,16+1,29Pib-0,04 Iest -1,84CT

Engle-Granger Idemais = f(Pib, Iest, CT, PK)

Estatística de teste -3,20 não rejeita hipó-tese nula em 10%.

Idemais =-2,24+ 1,33Pib-0,04 Iest -2,18CT-0,31PK

Gregory- Hansen Idemais = f(Pib, Iest)

Estatística de teste -3,96 não rejeita hipó-tese nula em 5% com quebra em 2002:4.

Até 2002:4

Idemais =-0,89+ 0,91Pib-0,06 Iest

Após 2003:1

Idemais =-3,75+ 1,46Pib+0,10 Iest

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Teste Especificação Resultado Relação de Cointegração

Gregory-Hansen Idemais = f(Pib, Iest, PK)

Estatística de teste -7,68 rejeita hipóte-se nula em 1% com quebra estimada em 2002:4.

Até 2002:4

Idemais =-0,19+ 0,76Pib-0,06 Iest -0,13PK

Após 2003:1

Idemais =-5,04+ 1,73Pib-0,04 Iest -0,57Pk

Gregory-Hansen Idemais = f(Pib, Iest, CT)

Estatística de teste -3,90 não rejeita hipó-tese nula em 5% com quebra estimada em 2003:1.

Até 2003:1

Idemais =-2,91+ 1,45Pib-0,08 Iest -1,68CT

Após 2003:2

Idemais =-4,90+ 7,78Pib+0,07 Iest -1,07CT

Gregory Gregory-Hansen

Idemais = f(Pib, Iest, PK, CT)

Estatística de teste -7,75 rejeita hipóte-se nula em 1% com quebra estimada em 2002:4.

Até 2002:4

Idemais =-4,35+ 1,77Pib-0,08 Iest +0,15PK-1,77CT

Após 2003:1

Idemais =-5,15+ 1,77Pib-0,03 Iest -0,56PK-0,24CT

Gregory- Hansen Idemais = f(Pib, PK)

Estatística de teste -8,12 rejeita hipóte-se nula em 1% com quebra estimada em 2002:4

Até 2002:4

Idemais =-1,55+ 1,04Pib-0,02PK

Após 2003:1

Idemais =-4,69+ 1,66Pib-0,49PK

Gregory- Hansen Idemais = f(Pib, CT)

Estatística de teste -4,66 não rejeita hipó-tese nula em 5% com quebra estimada em 2002:4.

Até 2002:4

Idemais =-2,84+ 1,36Pib-0,73CT

Após 2003:1

Idemais =-4,92+ 1,75PIB-0,53CT

Gregory- Hansen Idemais = f(Pib, PK, CT)

Estatística de teste -8,17 rejeita hipóte-se nula em 1% com quebra estimada em 2002:4.

Após 1997:3

Idemais =-3,72+ 1,57Pib-0,85CT + 0,13PK

Fonte: elaborado pelo autor

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Finanças Públicas – XIV Prêmio Tesouro Nacional – 200928

Tendo observado a mudança na relação entre os investimentos a partir de 2003, além da fraca robustez em torno da existência da relação de cointegração no caso de existir a referida quebra estrutural, procedeu-se investigação da rela-ção de cointegração nessa subamostra. Os resultados do teste de Gregory-Hansen indicam que a relação de longo prazo entre as variáveis é fortemente rejeitada em todas as especificações, no caso de ter havido uma quebra estrutural no quarto trimestre de 2004.

É importante, contudo, entender que os resultados desse teste podem sofrer de baixo poder caso i) exista, nesse período, mais de uma relação de longo prazo; e ii) caso não tenha ocorrido uma quebra estrutural nessa subamostra (PATTER-SON, 2000). Ambas as possibilidades podem ser avaliadas utilizando-se testes vetoriais de cointegração.

Tabela 7 resulTadO dO TesTe gregOry-hansen na subamOsTra a parTir de 2003:1

Gregory-Hansen Idemais = f(Pib, Iest)

Estatística de teste -7,60 rejeita hipótese nula em 1% com quebra estimada em 2004:4.

Após 2005:1

Idemais = -7,63 + 2,27Pib-0,05 Iest

Gregory-Hansen Idemais = f(Pib, Iest, PK)

Estatística de teste -6,25 rejeita hipótese nula em 1% com quebra estimada em 2004:4.

Após 2005:1

Idemais = -7,61+2,27Pib-0,06 Iest

-0,01PK

Gregory-Hansen Idemais = f(Pib, Iest, CT)

Estatística de teste -7,95 rejeita hipótese nula em 1% com quebra estimada em 2004:4.

Após 2005:1

Idemais = -7,50 + 2,22Pib-0,06 Iest

+0,45CT

Gregory-Hansen Idemais = f(Pib, Iest, PK, CT)

Estatística de teste -6,42 rejeita hipótese nula em 1% com quebra estimada em 2004:4.

Até 2005:1

Idemais = -7,50+2,22Pib-0,06 Iest

+0,001PK+0,45CT

Fonte: elaborado pelo autor

A análise baseada em testes vetoriais (JOHANSEN, 1991) enriquece con-sideravelmente os resultados até então obtidos (Tabela 8). Em primeiro lugar, ao considerar o período inteiro, a constatação é favorável à existência de relação de longo prazo entre as variáveis. Em segundo lugar, as evidências continuam apontando para uma relação negativa entre os investimentos públicos e os demais investimentos, assim como os testes uniequacionais. Em terceiro lugar, na espe-cificação com todas as variáveis encontra-se evidência favorável à existência de

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Finanças Públicas – XIV Prêmio Tesouro Nacional – 2009 29

duas relações de cointegração. Tal como em Dos Santos e Pires (2007), a segunda relação de cointegração é interpretada como uma relação entre o preço do capital e a carga tributária, de modo que elevações da carga tributária aumentam o preço do capital, afetando indiretamente os investimentos.

Considerando a possível existência de quebra estrutural em 2003, tal como aferido em testes anteriores, procedeu-se à estimação da relação de longo prazo utilizando os testes vetoriais para esse subperíodo (Tabela 9). Desse modo, em todas as combinações a relação de longo prazo não foi rejeitada, e na maioria dos casos foi encontrada mais de uma relação de cointegração, de forma que parece possível que os testes univariados na amostra reduzida padeçam de problemas relacionados ao baixo poder do teste.

Contudo, em todas as especificações o efeito dos investimentos das empre-sas estatais sobre o restante dos investimentos é positivo e aparentemente estável, situando-se no intervalo 0,22-0,35. Para reforçar a robustez dessas estimativas, adotaram-se critérios de identificação alternativos nos casos em que mais de um vetor de cointegração foi encontrado. No primeiro caso, ao incluir na especifi-cação mais simples (com PIB e Iest) a carga tributária, identificou-se na segunda relação de cointegração a elasticidade PIB da carga tributária. No segundo caso, em que o preço do capital foi incluído, estimou-se uma função dos determinantes dos investimentos das empresas estatais. Por último, no caso em que todas as va-riáveis são modeladas, o segundo vetor de cointegração é interpretado como uma função de reação dos investimentos estatais, e o terceiro é interpretado como a elasticidade da carga tributária em relação ao PIB.14

Em suma, a análise empírica para o período inteiro sugere a existência de uma relação de cointegração e indica que o efeito dos investimentos estatais so-bre o restante dos investimentos é negativo. De forma alternativa, a análise que foca o período mais recente mostra a existência de mais de uma relação de longo prazo entre as variáveis. Nesse caso, as estimativas obtidas com base em critérios distintos de identificação desses vetores levaram à conclusão de que no período recente o efeito dos investimentos estatais sobre o restante dos investimentos é positivo em torno de 0,22-0,35.

14 A identificação alternativa em que o preço do capital é afetado pela carga tributária é rejeitada pelo teste de identificação nesse caso. Além disso, é importante notar que as estimativas obtidas para a elasticidade da carga tributária em relação ao PIB são muito baixas, pois é comum que essa elasticidade seja maior que a unidade. No entanto, o uso de modelos de parâmetros variáveis tem recentemente encontrado elasticidades baixas para essa relação (MENDONÇA; MEDRANO; DOS SANTOS, 2009).

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Finanças Públicas – XIV Prêmio Tesouro Nacional – 200930

Tabela 8 resulTadOs baseadOs na aplicaçãO dO TesTe de JOhansen

Var com 3 lags com resíduos normais, não autocorrelacionados e com evidência de heterocedasticidade.

Vec com 2 lags, resíduos normais, não autocorrelacionados e com evidência de heterocedasticidade.

Idemais = f(Pib, Iest)

Uma relação de cointegra-

ção ao nível de 5%.

Idemais = -1,11+0,99Pib-

0,01 Iest

Var com 3 lags com resíduos não normais,

não autocorrelacionados e com evidência de heterocedasticidade.

Vec com 2 lags, resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest, CT)

Uma relação de cointegra-

ção ao nível de 10%.

Idemais = 6,54-1,19Pib+0,15

Iest +8,70CT

Var com 3 lags, resíduos normais, não autocorrelacionados e com evidência de heterocedasticidade.

Vec com 2 lags, resíduos normais, não autocorrelacionados e

heterocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest, PK)

Uma relação de cointegra-

ção ao nível de 1%.

Idemais = -0,90+0,90Pib-

0,27 Iest -0,65PK

Var com 3 lags, resíduos não normais, não

autocorrelacionados e homocedásticos.

Vec com 2 lags, resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest, PK, CT)

Duas relações de cointe-

gração ao nível de 5%.

Idemais =-5,44+2,13Pib-0,15

Iest -3,21CT-1,99PK

PK=-0,14+1,27CT

Fonte: elaborado pelo autor

Tabela 9 resulTadOs dO TesTe de JOhansen na subamOsTra a parTir de 2003:1

Var com 2 lags com resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Vec com 1 lag, resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest)

Uma relação de cointegra-

ção ao nível de 1%.

Idemais = -2,20 +

1,11Pib+0,28 Iest

Var com 1 lag com resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Vec sem lags, resíduos não normais, não

autocorrelacionados e homocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest, CT)

Duas relações de cointegra-

ção ao nível de 1%.

Idemais = -0,80 +

0,75PIB+0,35 Iest +0,90CT

CT= -0,74+0,22Pib

Var com 2 lags, resíduos não normais, não

autocorrelacionados e heterocedásticos.

Vec com 1 lag, resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest, PK)

Duas relações de cointegra-

ção ao nível de 1%.

Idemais = -2,24 +

1,13PIB+0,22 Iest

Iest = -6,97+1,54Pib-1,94PK

Var com 1 lag, resíduos não normais, não

autocorrelacionados e homocedásticos.

Vec sem lags, resíduos normais, não autocorrelacionados e

homocedásticos.

Idemais = f(Pib, Iest, PK, CT)

Três relações de cointegra-

ção ao nível de 1%.

Idemais = -1,00 +

0,86PIB+0,29 Iest

Iest = -8,63+1,88Pib-1,79PK

CTB= -0,77+0,23Pib

Fonte: elaborado pelo autor

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Finanças Públicas – XIV Prêmio Tesouro Nacional – 2009 31

A fim de obter a elasticidade total dos investimentos estatais sobre a FBCF, é importante calcular sua participação relativa no total. Considerando que no últi-mo trimestre de 2008 a relação entre os investimentos estatais e o total da FBCF foi igual a 0,12, pode-se calcular que a elasticidade dos investimentos estatais so-bre a FBCF se situa em torno de 0,31-0,49, caso tenha ocorrido a referida quebra estrutural em 2002:4, tal como os dados fortemente têm sugerido.

6 Estimativas preliminares do impacto dos investimentos das empresas estatais na

FBCF no 1o trimestre de 2009

Os dados divulgados pelo Dest/MPOG referentes aos investimentos das empresas estatais no primeiro trimestre de 2009 indicam uma forte tentativa de recomposição da formação bruta de capital fixo. Enquanto em igual trimestre do ano anterior as empresas estatais haviam despendido R$ 7,1 bilhões, no primeiro trimestre de 2009 o desembolso havia sido de R$ 10,9 bilhões, um crescimento nominal de 54%. Utilizando-se o IGP-DI para deflacionar a formação bruta de capital fixo, conclui-se por um crescimento real nos investimentos das empresas estatais de 46,6% no período.15 Portanto, além de a elasticidade dos investimentos estatais sobre a FBCF ser elevada, o crescimento dos investimentos estatais no período também é substancial.

Em contrapartida, é importante destacar que no primeiro trimestre de 2009, segundo o IBGE, a formação bruta de capital fixo caiu 14% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Assim, considerando as elasticidades obtidas, pode-se calcular que os investimentos estatais compensaram a queda da formação bruta de capital fixo em aproximadamente +14,6%+19,9%, de forma que a queda reportada pelas contas nacionais foi razoavelmente amortizada pelos investimentos das empre-sas estatais, pois sem estes a FBCF apresentaria um desempenho sensivelmente pior.

Ainda que sejam considerados elevados os resultados obtidos, é importante considerar como estes podem afetar as conclusões. Nesse sentido, é importante simular o impacto de externalidades menores dos investimentos estatais sobre o restante da FBCF. Com efeito, projetaram-se novamente essas contas com exter-nalidades iguais a 0,2; 0,1 e 0.

15 Nesse caso, utilizou-se o deflator da formação bruta porque a FGV descontinuou a série de IPA-DI máquinas e equipamentos. Optou-se por não utilizar também o deflator da formação bruta de capital fixo divulgado pelo IBGE. Para os problemas relacionados ao uso do deflator da formação bruta, ver Dos Santos e Pires (2007).

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Finanças Públicas – XIV Prêmio Tesouro Nacional – 200932

A Tabela 10 apresenta estimativas alternativas para a recomposição da FBCF considerando os investimentos estatais. Apenas no caso em que não exis-tem externalidades se pode considerar que o esforço das empresas estatais na recomposição da FBCF não é recompensado. Nesse caso, o aumento de 46% dos investimentos estatais geraria acréscimo de apenas 5,6% na FBCF.

Tabela 10 prOJeções alTernaTivas dOs efeiTOs dOs invesTimenTOs esTaTais sObre a fbcf

Iest/FBCF (θ) Externalidades (α) Elasticidade (θ+(1- θ)α) Efeito sobre FBCF

0,12 0,2 0,296 0,138

0,12 0,1 0,208 0,097

0,12 0 0,12 0,056

Fonte: elaborado pelo autor

7 Conclusões

A chegada da crise financeira internacional demandou respostas de polí-tica econômica dos tipos mais variados. Do ponto de vista da política fiscal, os críticos questionaram sua necessidade e mesmo sua efetividade. Em relação à sua necessidade, argumentou-se que o uso anticíclico da política fiscal criaria constrangimentos para a política monetária. Em relação à efetividade, a crítica corriqueira é que as despesas correntes não são flexíveis e, portanto, o aumento dos investimentos públicos seria insuficiente para compensar a queda da forma-ção bruta de capital fixo.

Este artigo teve como objetivo apresentar uma visão alternativa ao que se chamou de modelo de “despesas correntes crescentes” (VELLOSO; MENDES; CAETANO, 2009). Em primeiro lugar, argumentou-se que a política de trans-ferências de renda, um componente importante das despesas correntes, possui impactos benéficos sobre o consumo das famílias mais pobres, constituindo-se em uma política estrutural de distribuição de renda com manutenção da demanda agregada. Em segundo lugar, é importante observar que a estratégia atual foi ca-paz de elevar a poupança pública, criando as condições adequadas para o ajuste anticíclico. Em terceiro lugar, apesar de o investimento público do governo fede-ral ser pequeno e seu crescimento ser baixo, há de se notar a estratégia alternativa de estimular as empresas estatais a acelerarem seus investimentos para atenuar a queda da formação bruta de capital fixo. Com efeito, a exclusão das empresas do

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Finanças Públicas – XIV Prêmio Tesouro Nacional – 2009 33

grupo Petrobras do cálculo da meta do superávit primário eleva os graus de liber-dade da referida estatal em alocar mais investimentos, constituindo uma política que deverá atuar de forma anticíclica.

Esse aspecto, muito pouco explorado ou mesmo percebido pelos economis-tas, parece ter sido o principal instrumento de estímulo fiscal do ponto de vista das despesas. Este artigo estimou o impacto que o aumento dos investimentos estatais teria sobre a formação bruta de capital fixo. Os resultados indicaram efeitos mul-tiplicadores elevados em torno de 0,31 a 0,49, principalmente porque os investi-mentos das empresas estatais cresceram 46% em termos reais no primeiro trimes-tre de 2009. Mesmo considerando os multiplicadores obtidos elevados, conclui-se por resultados significativos se os multiplicadores fossem mais modestos.

Dessa forma, pode-se deduzir que a política fiscal brasileira adotou instru-mentos bastante efetivos para lidar com a crise financeira. Por um lado, aumen-tou a rede de proteção social que mantém o consumo das famílias e, por outro lado, elevou os investimentos das empresas estatais com o objetivo de acomodar a queda da formação bruta de capital fixo, o agregado mais atingido pela crise financeira. Em suma, a estratégia fiscal anticíclica adotada pelo governo federal, de acordo com os resultados obtidos, pode ser considerada extremamente eficaz e deverá acomodar de maneira satisfatória os impactos internos da crise financeira.

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Anexo 1Dados utilizados no Modelo de Consistência Macroeconômica

Fonte: Elaborado pelo autor.

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Anexo 2Dados utilizados no Modelo de Investimento

Fonte: Elaborado pelo autor.