Tensões e rebeliões: a nobreza da terra à sombra do Novo Mundo · A colonização ultramarina na...

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Tensões e rebeliões: a nobreza da terra à sombra do Novo Mundo Luciano Figueiredo Universidade Federal Fluminense A colonização ultramarina na América portuguesa desafiou solenemente os princípios de equilíbrio do Antigo Regime uma vez que, diante da exploração comercial, fiscalidade e preços extorsivos, somados às dificuldades materiais, desproteção militar e injustiça praticada pela metrópole, tornava-se inexeqüível ali o respeito aos princípios gerais que regulavam a relação entre súditos e soberano. Isto, em linhas muito gerais, explica as condições de permanente tensão e a eclosão de movimentos de protestos em várias áreas do Brasil colonial por parte das elites locais constrangidas. As situações de instabilidade não paravam por aí. As batalhas pela conquista territorial e as confrontações com invasores estrangeiros completavam o quadro de desassossego que marcava as condições da vida política na América. A dinâmica política do governo à distância do soberano inaugurou novos e recorrentes modos de acomodação social dos protagonistas locais, que alcançavam nobilitação amparada no empenho em batalhas e conflitos. Parece relevante considerar que a experiência ultramarina de certa forma ampliou as oportunidades do mercado de mercês na medida em que expôs os súditos aos riscos, com isso favorecendo as oportunidades de recompensa. A concessão de títulos de nobreza foi também uma moeda forte na intenção de estabilizar o controle régio sobre regiões coloniais. Neste sentido esta comunicação examina, em especial, processos de instrumentalização, por parte da administração portuguesa, da concessão de privilégios aos agentes sociais que se dedicam a combater rebeldes. A aquisição do estatuto de nobreza decorreu da capacidade dos moradores do ultramar de se aproveitar do constante quadro de tensão que aí se instaurou, assim como de instrumentalizar o tradicional protocolo discursivo estabelecido para a nobreza. Essa comunicação quer examinar alguns processos através dos quais a elite local e a administração central negociam a concessão de títulos de nobreza como esforço costumeiro para estabilizar as condições de governo sobre as populações ultramarinas. Analisaremos processos de três tipos: guerras com invasores estrangeiros; repressão à resistências de grupos ameríndios ou escravos; e recompensa pela participação em motins ou na sua repressão. Palavras chave: Revoltas; Brasil colônia; nobreza da terra.

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Tensões e rebeliões:

a nobreza da terra à sombra do Novo Mundo

Luciano Figueiredo

Universidade Federal Fluminense

A colonização ultramarina na América portuguesa desafiou solenemente os princípios de

equilíbrio do Antigo Regime uma vez que, diante da exploração comercial, fiscalidade e preços

extorsivos, somados às dificuldades materiais, desproteção militar e injustiça praticada pela

metrópole, tornava-se inexeqüível ali o respeito aos princípios gerais que regulavam a relação

entre súditos e soberano. Isto, em linhas muito gerais, explica as condições de permanente

tensão e a eclosão de movimentos de protestos em várias áreas do Brasil colonial por parte das

elites locais constrangidas. As situações de instabilidade não paravam por aí. As batalhas pela

conquista territorial e as confrontações com invasores estrangeiros completavam o quadro de

desassossego que marcava as condições da vida política na América.

A dinâmica política do governo à distância do soberano inaugurou novos e recorrentes

modos de acomodação social dos protagonistas locais, que alcançavam nobilitação amparada no

empenho em batalhas e conflitos.

Parece relevante considerar que a experiência ultramarina de certa forma ampliou as

oportunidades do mercado de mercês na medida em que expôs os súditos aos riscos, com isso

favorecendo as oportunidades de recompensa. A concessão de títulos de nobreza foi também

uma moeda forte na intenção de estabilizar o controle régio sobre regiões coloniais. Neste

sentido esta comunicação examina, em especial, processos de instrumentalização, por parte da

administração portuguesa, da concessão de privilégios aos agentes sociais que se dedicam a

combater rebeldes.

A aquisição do estatuto de nobreza decorreu da capacidade dos moradores do ultramar

de se aproveitar do constante quadro de tensão que aí se instaurou, assim como de

instrumentalizar o tradicional protocolo discursivo estabelecido para a nobreza.

Essa comunicação quer examinar alguns processos através dos quais a elite local e a

administração central negociam a concessão de títulos de nobreza como esforço costumeiro para

estabilizar as condições de governo sobre as populações ultramarinas. Analisaremos processos

de três tipos: guerras com invasores estrangeiros; repressão à resistências de grupos ameríndios

ou escravos; e recompensa pela participação em motins ou na sua repressão.

Palavras chave: Revoltas; Brasil colônia; nobreza da terra.