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    TeologiaO problema do mal e do sofrimento: uma abordagem intelectual e pastoral21/08/2015 08:57:23

    IntroduçãoHá pouco mais de dois anos, em janeiro de 2013, umincêndio acidental na boate Kiss em Santa Maria/RSmatou 242 pessoas, a maioria jovens entre 18 e 25 anos,e deixou centenas de feridos. Vivendo no mesmo estado

    deste trágico acontecimento, os jovens da minha igrejaacompanharam os fatos em primeira mão, em meio agrande comoção.

    No domingo seguinte aos acontecimentos, durante umaaula da escola dominical, começou o debate: se Deus ébom e soberano, como podemos explicar situações comoesta? Não poderia Deus ter evitado este trágicoacontecimento que ceifou a vida de tantos jovens queestavam apenas se divertindo e que não tinham culpa doque aconteceu? Aliás, diante de tantas tragédias, como oTsunami que varreu a Ásia anos atrás, terremotos terríveisem vários lugares do mundo, aparentemente sem

    nenhuma relação com a ação e pecado humanos, como explicar que servimos a um Deus todo amoroso e

    todo poderoso?

    Lembro que naquela aula apelei para a soberania e controle de Deus sobre toda a criação e nossaignorância quanto a seus planos. Mas nem todos os alunos ficaram satisfeitos. Um deles sugeriu quetalvez devêssemos rever a ideia de soberania total de Deus sobre os acontecimentos. Nem tudo o queacontece ele deseja, logo, ele talvez não controle tudo. Essas ideias não foram bem aceitas pela classe,mas semearam mais dúvida e confusão. Muitos jovens estavam realmente impactados com o sofrimentodaquelas famílias do interior do estado que perderam seus filhos, irmãos e até pais. Como lidar com tantosofrimento? Como lidar com o mal na sua forma mais dolorida e extrema?

    Foi a partir desse momento que percebi que havia uma necessidade de trabalhar o assunto na igreja, masde uma forma que respeitasse o conceito cristão de Deus (amor e soberania) e que não se restringisse ameras respostas teóricas, intelectuais ou mesmo moralistas, no estilo “amigos de Jó”.

    Este texto, portanto, se propõe a abordar o problema do mal sem ignorar as respostas intelectuais, masfocando também em uma abordagem pastoral à questão, especialmente para aqueles que tem problemasemocionais com este tema. Uma pessoa que passa por grande sofrimento (por exemplo, perder umparente num campo de concentração ou na boate Kiss) dificilmente se conformará com uma resposta de“por que o mal existe”. Aliás, vale lembrar que, intelectualmente falando, o problema do mal já temabordagens suficientes para a questão. De certa forma, pode-se dizer que Alvin Plantinga apresentou umaresposta definitiva ao problema no que diz respeito à compatibilidade entre o Deus do teísmo e aexistência do mal,1 como veremos no tópico 1, a qual é seguida de perto por Willian Lane Craig.2 Mas faz-se necessário algo mais. É importante apresentar o problema como os escritores bíblicos fariam, ou seja,para confortar, consolar e mostrar que Deus não está ausente ou alheio ao mal.

    Vivemos em uma sociedade pós-moderna onde as respostas meramente intelectuais mostram-seinsuficientes. A preocupação com o indivíduo, com o subjetivo, com o sentimento é uma característica de

    nosso tempo que muito afetou nossas igrejas. Assim, a abordagem pastoral, no capítulo 2, terá comoobjetivo ajudar os que sofrem ou se sentem muito sensibilizados com o mal alheio a confiarem em Deusem meio ao sofrimento. Argumentarei a partir de uma demonstração concreta da bondade e poder deDeus. O que era uma possibilidade lógica (a existência de um Deus amoroso e poderoso e do mal aomesmo tempo) tornou-se realidade através de Jesus Cristo. Isso não explica todas as questõesrelacionadas ao problema do mal no mundo, mas ajuda o cristão a encarar o problema de outra

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    perspectiva. Fala mais à sua existência do que a seu intelecto. Vejamos, então, as diversas abordagens aeste que é um dos maiores problemas enfrentados pelos teólogos.

    1. As respostas intelectuais ao problema do malNo âmbito da teologia e da filosofia, a tentativa de conciliar a existência do mal no mundo com aexistência de um Deus amoroso e todo poderoso é chamada de “teodicéia”.3 No entender de Pannenberg,essa é uma tentativa de justificação de Deus pelo mundo por Ele criado.4 É um problema, portanto, paraas religiões teístas, ou seja, para o judaísmo, cristianismo e, até certo ponto, islamismo.

    Não obstante a dificuldade de apresentar-se uma definição precisa do que seja o mal,5 bem como a

    impossibilidade de falar-se em mal sem um referencial absoluto que implicaria a existência de Deus,6 éindiscutível que as pessoas possuem uma noção prática do que seja o mal. Desastres naturais queceifam vidas não podem ser considerados “bons” para quem sofre suas consequências. Da mesma forma,exterminar grupos humanos inteiros, inclusive com o uso da tortura, tampouco é aceitável aos padrõeshumanos. Dessa forma, pouco importa a maneira como o conceituamos, é indiscutível a presença do malno mundo.

    Convencionalmente se costuma distinguir entre mal moral, causado pelos seres humanos (pelo pecado,diriam os cristãos) e mal natural, decorrente das limitações e ações da própria natureza.7 Os dois tipos demal são um problema para o cristianismo e de uma forma geral procuram ser justificados pelos teólogoscristãos desde, pelo menos, Clemente de Alexandria,8 passando por Agostinho9 e culminando, já na idademoderna, em Leibniz, criador do termo “teodicéia”.10

    Não é meu objetivo expor exaustivamente as explicações racionais para o problema do mal. Também nãome deterei no ensino bíblico sobre o assunto, que vai pressuposto na argumentação.11 Nesse sentido,vale mencionar a classificação de Sayão quanto aos diversos tipos de abordagem a essa questão, osquais se complementam e não devem ser vistos isoladamente, ainda que, em alguns casos, assim tenhaocorrido no decorrer da história do cristianismo.

    a) Teodicéia do livre arbítrioÉ a posição clássica e mais antiga na história do cristianismo. Defendida por Clemente de Alexandria eSanto Agostinho, afirma que o mal decorre do livre arbítrio das criaturas. Deus apenas permite o mal, poispreferiu criar criaturas livres, mesmo com possibilidade do mal, do que criar seres autômatos, incapazesde pecar. Assim, o mal existe para que se alcance um bem maior. Não podemos compreender as razõespelas quais Deus ainda tolera o mal, mas ele tem suas razões. O mal é a negação do bem, portanto, nãotem uma existência a parte; ele existe em função do bem, como a ferrugem em relação ao ferro.12

    Basicamente, Alvin Plantinga propõe sua argumentação sobre o problema do mal nestes termos. Usandode argumentos lógicos, ele demonstra que não há incompatibilidade entre as proposições “Deus é amor”,“Deus é todo poderoso” e “o mal existe". Sua resposta é praticamente definitiva. Não há nenhumaincongruência lógica entre a existência do mal e do Deus do teísmo cristão. De uma perspectivareformada, contudo, caberia a pergunta se Plantinga apresentou uma argumentação consistente com esseramo da teologia cristã, na medida em que sua abordagem depende da admissão do livre arbítrio dosseres humanos e espirituais. A resposta passa por descobrir em que sentido e em que momento eledefende o livre arbítrio como causa do mal. Seguindo a linha de Plantinga, Willian Lane Craig argumentanos mesmos termos, mas afirma explicitamente que o conceito de livre arbítrio não pode ser o“compatibilista”, defendido pelos reformados, mas sim o de liberdade “libertária”,13 que conferiria totalliberdade ao ser humano, contrariando a visão reformada sobre o livre arbítrio e mesmo sobre a salvaçãototalmente por graça.

    Críticas foram feitas a esta concepção, especialmente na sua forma mais básica, defendida pelosprimeiros pais da igreja. Pannenberg ressalta que ela é insuficiente para explicar a origem do mal, sendoincapaz de desonerar o Criador da responsabilidade por essa sua criação. Aliás, segundo o teólogoalemão, tentar desonerar o criador é um erro de qualquer teodicéia, na medida em que também nãocorresponde ao testemunho neotestamentário, o qual demonstra que Deus assumiu e carregou, pela mortena cruz de seu Filho, a responsabilidade pelo mundo criado.14

    Mcgrath, por sua vez, ressalta que a origem do mal não está claramente esclarecida, pois como poderiamos seres humanos optar pelo mal, se não havia mal no mundo criado por Deus? Se dissermos, como

    Agostinho, que o mal já exis tia antes da queda por causa de Satanás, mesmo ass im não teremos umasolução, pois de onde teria vindo Satanás, se o mundo foi criado sem mal? A explicação tradicionalmentedada pelos cristãos, de que Satanás era um anjo bom que por orgulho se rebelou contra Deus e levouvários outros anjos com ele, espalhando o mal pelo universo também é insuficiente, pois como um anjobom teria se tornado mau? Como ele faria a opção pelo mal?15

    Da mesma forma, esta explicação serve para o mal moral (decorrente do pecado), mas talvez não seja tãosuficiente para explicar o mal natural (catástrofes naturais, por exemplo). Plantinga recorre à ideia de queseres sobrenaturais com livre arbítrio poderiam causar essas catástrofes. 16 Novamente, não há nenhumproblema lógico aqui. Mas a questão é: será essa explicação razoável e suficiente? Catástrofes sãocausadas por Deus como castigo ou por demônios por ódio à humanidade? Nesse sentido, talvez a

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    sugestão de Pannenberg seja mais razoável, na medida em que explica o mal (incluindo o mal físico)também em virtude da natureza finita da criação (que ainda não seria um mal em si) e da rebeldia dascriaturas contra essa condição de finitude (rebeldia que só é possível por causa da autonomia dada por Deus), na qual, buscando a autonomização radical, gera todo tipo de males morais e físicos.17

    b) Teodicéia pedagógica Aqui o mal é visto como um benefício indispensável para o desenvolvimento da humanidade e para queela não permaneça eternamente na infância. O sofrimento pode desenvolver nosso caráter e compaixão.De certa forma, essa concepção se identifica com a explicação de Eliú ao sofrimento de Jó. O sofrimentoe o mal, portanto, tem por objetivo nos ensinar a viver melhor, e na perspectiva cristã, nos aproximar deDeus.

    Essa abordagem é unilateral e insuficiente, devendo ser conjugada com outros argumentos. Do contrário,vários problemas surgem: como explicar o mal que aparentemente não produz nenhum crescimento oudesenvolvimento, como a morte sofrida e lenta de crianças inocentes ou milhões de mortos em camposde concentração em uma guerra? Além disso, muitas vezes o sofrimento não leva ao aprendizado, masao ódio, retraimento e amargura. Por fim, para muitas coisas boas não é necessário prévio sofrimento paraque possamos desfrutá-las. 18

    c) Teodicéia escatológicaFundamental para o cristianismo é a perspectiva escatológica na teodicéia, como bem ressaltouPannenberg:

    Formulando com mais exatidão, é exclusivamente o próprio Deus que pode dar uma respostalibertadora a essa pergunta [da teodicéia], e ele o faz por meio da história de seu agir no mundo,eem especial por sua consumação pelo estabelecimento do seu reino na criação . Enquanto omundo é visto, por um lado, isoladamente com vistas a seu presente não consumado e nãoredimido, e sob o ponto de vista de sua processão inicial das mãos do Criador, por outro lado, ofato do mal e da desgraça na criação permanecem um mistério e um escândalo sem saída. Omais grave defeito do tradicional tratamento que se dá ao problema da teodicéia, justamentetambém na forma que Leibniz lhe deu e que se tornou clássica, consiste no fato de se ter acreditado poder comprovar a justiça de Deus em suas obras exclusivamente sob o ponto devista da origem do mundo e de sua ordem do agir criador de Deus no princípio em vez de tomar também em vista a história do agir salvífico divino e sua consumação escatológica já irrompidaem Jesus Cristo. 19 (grifos nossos).

    Na perspectiva escatológica, espera-se que com a consumação do Reino de Deus na criação o mal seráeliminado e a justiça e injustiça receberão sua recompensa. No dizer de Sayão, “o futuro tem a resposta ea solução do que acontece no presente”.20

    A crença na c riação sem a esperança da superação escatológica da realidade do mal, somada à nossafinitude, não poderá dar uma resposta adequada à questão da teodicéia. Qualquer resposta só é possívelse vislumbrarmos a unidade entre criação e reconciliação, que começou na cruz e aguarda a consumação.

    A criação, a ordem atual, encontra seu sentido na consumação, e assim podemos ver Deus como nossoaliado na luta contra o mal e o sofrimento. A consumação escatológica demonstrará definitivamente a

    justiça de Deus na sua divindade e no seu agir criacional.21

    Ainda que a perspectiva escatológica seja fundamental, e se somada às perspectivas de livre-arbítrio epedagógicas possa dar uma explicação melhor ao problema do mal, as dificuldades permanecem. Comefeito, por que Deus tolera o mal até o presente momento, e com tanta intensidade? Não poderia aconsumação ser adiantada? Não seria possível menos mal no mundo? Não poderia o mundo ter sido

    criado sem sofrimento e mal?

    d) Teodicéia proteladaBastante semelhante à teodicéia escatológica, com a diferença que, neste caso, o enfoque não é tanto aretribuição do bem e do mal, mas acompreensão do porquê da existência do mal e do sofrimentoaparentemente sem motivo. Enfatiza-se a necessidade de uma atitude de confiança e fé na bondade esoberania do criador e a admissão de que a compreensão plena do problema do mal aguarda umaresposta final na consumação dos tempos. 22

    e) Teodicéia de comunhãoO enfoque não está tanto em entender a origem ou o porque da existência do mal, mas partindo dopressuposto que ele existe, enfatiza o fato de que Deus é percebido e conhecido no sofrimento, porque elemesmo sofreu, por meio da encarnação. Ele se compadece de nossos sofrimentos e está conosco, sendoaté certo ponto, também vítima do mal. Nessa situação, há uma nova perspectiva do sofrimento, que étranscendido e permite que o homem e Deus entrem em colaboração e comunhão mais profunda. Parafins pastorais, essa é uma das mais interessantes abordagens ao problema do mal e será melhor delineada no próximo capítulo.

    Essas são, portanto, as principais abordagens ao problema do mal. Como já foi mencionado, nenhumadelas, sozinha, é suficiente para uma visão mais ampla do problema do mal. Uma explicação plausível

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    deve unir todas as perspectivas: por um lado, as más escolhas de criaturas livres ou a rebeldia contracondição de finitude, na forma de busca indevida de autonomia (usando as palavras de Pannenberg)ajudam a entender a origem do mal. O uso pedagógico do sofrimento por Deus não está descartado. Damesma forma, a perspectiva de uma melhor compreensão e compensação futura é fundamental. Ocristianismo, de qualquer forma, também apresenta uma argumentação importantíssima ao apresentar umDeus que se compadece, sofre e luta contra o mal na pessoa de seu filho Jesus, e que, portanto, não estáindiferente, tampouco se omite. 2. Uma abordagem pastoral e cristocêntrica ao problema do mal e do sofrimento

    Na primavera de 1518, em Heidelberg, Lutero conduziu um debate23 no qual apresentou teses que

    confrontaram a teologia e filosofia escolástica medieval. Surgia ali a chamada “teologia da cruz”, de umaprofundidade e riqueza impressionante. Retomando os ensinamentos do apóstolo Paulo sobre amensagem da cruz, o reformador alemão fundamentou seu método teológico na cruz. Duas teses, 19 e20, apresentam a forma pela qual se pode conhecer a Deus, relacionando este conhecimento com osofrimento:

    19. Não se pode designar condignamente de teólogo quem enxerga as coisas invisíveis de Deuscompreendendo-as por intermédio daquelas que estão feitas;20. mas sim quem compreende as coisas visíveis e posteriores de Deus enxergando-as pelossofrimentos e pela cruz.24

    Com estas teses, Lutero rejeita o que ele chama de “teologia da glória”, uma espécie de teologia naturalque se baseia na natureza e na sabedoria humana, em nome da “teologia da cruz”, a qual enxerga todasas coisas pelas lentes da cruz de Cristo. Não é a natureza ou a razão ou o “bom senso” que nos mostram

    quem é Deus, mas o escândalo da cruz. Um Deus que revela seu poder paradoxalmente na fraqueza, nahumildade, na tolice, no sofrimento e na morte humilhante como criminoso.

    O reformador chega a afirmar que “Deus somente pode ser encontrado no sofrimento e na cruz”. Assim,cruz e sofrimento significam em primeiro plano cruz e sofrimentos de Cristo, mas também, em certosentido, cruz e sofrimento do cristão.25

    Percebe-se, portanto, que a teologia da cruz de Lutero é fundamental para a compreensão da mensagemdo evangelho,26 mas também é útil para a abordagem do problema do mal em uma perspectiva pastoral,pois apresenta um Deus que não é alienado ou desinteressado em relação à sua criação, mas um Deusque sofre e que se revela por meio do sofrimento, o que aponta para o fato de que o mal pode ser transcendido por algo maior.

    Nessa perspectiva, sofrimento não é somente castigo ou destruição, tampouco algo sem sentido, massim graça e purificação. No sofrimento Deus vem ao nosso encontro, por isso ele pode ser consideradoum santuário que santifica a pessoa. Lutero chega a considerar que os sofrimentos são sinal da graça deDeus, prova de nossa filiação divina.27

    Dessa forma, o sofrimento deve ser compreendido a partir do evento revelador de Deus na história, nãoantropologicamente. O seu significado se explica no fato de que a revelação de Deus na história seresumiu na cruz.28

    O cristianismo, portanto, ensina que Deus sofreu em Cristo. Esse é o cerne da mensagem cristã. Comodiz Mcgrath, “Deus sabe o que é sofrer”, o que torna o sofrimento mais tolerável para nós.29 A ideiafundamental aqui é: Deus sofreu primeiro o nosso sofrimento. Ele, por meio da encarnação e morte nacruz, entrou em nosso mundo como um salvador comprometido. Não enviou um representante, mas veiopessoalmente por meio do seu filho, experimentando pessoalmente a dor e sofrimento. Como bemressaltou Pannenberg:

    Deus também não se subtraiu a essa responsabilidade [pelo surgimento do mal na sua criação],antes a assumiu pelo envio e entrega do seu filho na cruz. Assim Deus confirma suaresponsabilidade como Criador pelo mundo por ele criado. E nisso o mal é real e suficientementeoneroso não só para as criaturas, mas também para o próprio Deus. Isso o mostra a morte de seufilho na cruz. A nulidade do mal perante a vontade criadora de Deus será selada somente pelasuperação no evento da reconciliação e na consumação escatológica da criação. 30

    Deus escolheu sofrer. Não se trata de uma imperfeição ou de uma limitação de sua soberania. Tendosofrido nossos sofrimentos, ele demonstra mais do que empatia por nós, pois ele é solidário no sentidoliteral do termo,31 pois sofre ao nosso lado nos piores momentos. E escolheu nos redimir por meio dacruz. Sem “bagatelizar” a presença do mal no mundo, a teologia da cruz nos apresenta um Deus que sofreconosco e que se revela pelo sofrimento, o que nos dá, portanto, outra perspectiva para a questão. Deus

    não nos deixou sós.32 Ele nos conduz pelo sofrimento à glória.33

    Nas palavras de Peter Kreeft:

    Jesus está lá, sentado ao nosso lado nos lugares mais humildes – exclamou. – Estamos partidos? Ele foi partido, como pão, por nós. Somos desprezados? Ele foi desprezado e rejeitado pelos homens. Bradamos que não aguentamos mais? Ele foi um homem de dores e

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    experimentado no sofrimento. As pessoas nos traem? Ele mesmo foi vendido pelo traidor.Nossos relacionamentos mais caros estão partidos? Ele também amou e foi rejeitado. As

    pessoas se afastam de nós? Esconderam o rosto dele como o de um leproso. Desceria a todosos nossos infernos? Sim, ele o fez. Das profundezas de um campo de morte nazista, Corrie tenBoom escreveu: “não importa quão profundas sejam as nossas trevas, ele é ainda mais

    profundo”. Ele não somente ressurgiu dos mortos, mas mudou o significado da morte e, portanto,de todas as pequenas mortes – os sofrimentos que antecipam a morte e fazem parte dela. Ele foi morto a gás em Auschwitz. Escarnecido em Soweto. Injuriado na Irlanda do Norte. Escravizadono Sudão. É aquele que gostaríamos de odiar e que escolheu nos devolver amor. Toda lágrimaque derramamos se torna uma lágrima dele. Ele pode não enxugá-las já, mas o fará.34

    ConclusãoO problema do mal não permite uma resposta racional definitiva. No entanto, é dever do cristão refletir minimamente sobre esta questão para auxiliar os que tem sérias dúvidas sobre o assunto e aqueles quesofrem ou se sentem tocados profundamente pelo mal que há no mundo.

    Diante da realidade do mal, nos resta confiar na bondade de Deus testemunhada nas Escrituras por meiodo relato da criação e reconciliação. Também podemos ter a certeza de que não há incompatibilidadelógica entre a existência do mal e a bondade e soberania essenciais do Criador.

    Tão importante quanto essa certeza e aquela esperança é compreender que Deus não se exime daresponsabilidade pelo mal que existe na criação, tanto que assumiu essa responsabilidade por meio daencarnação e da cruz. A teologia da cruz coloca o problema do mal em um outro patamar. O sofrimento emorte do Filho revelam um Deus que não é indiferente à realidade do mal, mas que se importa conosco,está conosco no sofrimento, querendo ser encontrado ali, e que derrotou o mal na sua aparente derrota eaniquilação. Com ele podemos transcender o mal, que não é a resposta final para o mundo por ele criado.

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    CRAIG, William Lane. Apologética para questões difíceis da vida. São Paulo: Vida Nova, 2010, 191 p. ______. Em Guarda: defenda a fé cristã com razão e precisão. São Paulo: Vida Nova, 2011, 317 p.FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan.Teologia Sistemática. 1a Ed. Revisada. São Paulo: Vida Nova, 2008,1218 p.GRUDEM, Wayne.Teologia Sistemática atual e exaustiva.. São Paulo: Vida Nova, 1999, 1046 p.LOEWENICH, Walther. A Teologia da Cruz de Lutero. São Leopoldo: Sinodal, 1988, 183 p.LUTERO, Martinho.Martinho Lutero: obras selecionadas, vol. 1, 2. ed. São Leopoldo: Sinodal, Porto

    Alegre: Concórdia, Canoas: Ulbra, 2004, 470 p.MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd publicações, 2005,659 p.

    ______. Apologética pura e simples. São Paulo: Vida Nova, 2013, 189 p.PANNENBERG, Wolfhart.Teologia Sistemática, vol. II. Santo André, São Paulo: Editora Academia Cristã,Paulus, 2009, 685 p.PLANTINGA, Alvin.Deus, a Liberdade e o Mal. São Paulo: Vida Nova, 2012, 140 p.ROMERO, Paulo.Decepcionados com a Graça. São Paulo: Mundo Cristão, 2005, 250 p.SAYÃO, Luiz.O Problema do Mal no Antigo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2012, 160 p.

    ______. Agora Sim! Teologia na prática do começo ao fim. São Paulo: Hagnos, 2012, 188 p.STROBEL, Lee.Em Defesa da Fé. São Paulo: Editora Vida, 2002, 363 p.VAN TIL, Cornelius. Apologética Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, 160 p.

    ___________________________________ 1PLANTINGA, Alvin.Deus, a Liberdade e o Mal . São Paulo: Vida Nova, 2012.2CRAIG, William Lane. Apologética para questões difíceis da vida. São Paulo: Vida Nova, 2010.3SAYÃO, Luiz.O Problema do Mal no Antigo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2012, p. 26.4PANNENBERG, Wolfhart.Teologia Sistemática, vol. II. Santo André, São Paulo: Editora AcademiaCristã, Paulus, 2009 p. 243.5Sobre isso, vide as observações de SAYÃO, 2010, p. 23-25.6Nesse sentido, Willian Lane Craig entende que a existência do mal é uma prova da existência de Deus,pois só podemos saber o que é o mal se houver valores morais objetivos para julgamento entre o que é“bom” e “mal”, e estes valores seriam estabelecidos pelo próprio Deus. Se temos noção de bem e mal,portanto, é porque algo nos foi dado para discernir entre uma coisa e outra. CRAIG, 2010, p. 116.7PLANTINGA, 2012, p. 20.8PANNENBERG, 2009, p. 245 e 248.9MCGRATH, Alister E.Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd publicações, 2005, p.345, 346.10SAYÃO, 2012, p. 26.11Um bom resumo do ensino bíblico sobre o problema do mal pode ser encontrado em GRUDEM, Wayne.Teologia Sistemática, p. 254-260. O autor sintetiza suas conclusões sobre os diversos textos bíblicos nosseguintes pontos: a) Deus usa todas as coisas para cumprir os seus desígnios e usa até o mal para asua glória e para o nosso bem; b) Porém, Deus jamais faz o mal e jamais deve ser culpado pelo mal; c)Deus culpa e julga justamente as criaturas morais pelo mal que fazem; d) O mal é real, não é ilusão, e