Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

download Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

of 5

Transcript of Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    1/10

    Teoria da argumentação: lógica, ética e técnicaEdvaldo Soares

    Resumo: A proposta deste artigo é apresentar alguns elementos a seremconsiderados em relação à argumentação, especialmente no tocante àargumentação jurídica. O ponto de partida dessa reflexão acerca daargumentação é de caráter ético e não simplesmente lógico. Neste contexto, atécnica é vista como instrumento para a busca da verdade.

    Palavras-chave : teoria da argumentação – lógica– técnica - ética

    Abstract: The purpose of the article is present some elements be sheconsidered in relation to the argument, especially concerning the juridical

    argument. The starting point of that reflection concerning the argument is ofethical and not simply logical character. In this context, the technique is seenas instrument for the search of the truth.

    Key words: theory of the argument – logic– technique - ética

    O ponto de partida

    O ponto de partida dessa reflexão acerca da argumentação é de caráter éticoe não simplesmente lógico. Acreditamos que uma das características da boaargumentação é o compromisso com a verdade. Por isso, insistiremos sempreque, a argumentação é uma das formas de convencimento, mas nem toda formade convencimento é argumentação ou, em outros termos, toda argumentaçãotem função diretiva; porém, nem toda linguagem diretiva é argumentação.

    O que queremos dizer com isso? Simplesmente que não se argumenta paraenganar, para ludibriar ou por simples “amor ao debate”. Argumentamos paratentar buscar a verdade. Assim, não consideramos as formas de convencimento,por exemplo, usadas na mídia e, muitas vezes pelo próprio Jornalismo e, éclaro, pelo Direito, o qual deve, por principio, ter compromisso com a verdade,verdadeira argumentação. Em relação à questão ética, Breton (2003, p. 35)realça que:

    “Toda ação está ligada a uma ética que, acima dela, fixa seus limites, a partirde critérios exteriores ao funcionamento da própria ação. Sem esta ligação, aargumentação estaria condenada a ter como único critério a eficácia.”

    Em síntese, nosso posicionamento decorre de uma concepção ética nãopragmática. Combatemos assim, a idéia de eficácia a qualquer preço. Nessesentido, optamos por demarcar o campo da argumentação a partir de trêscritérios: nem tudo é argumentável; nem todos os argumentos são válidos paradefender qualquer idéia e há limites para a ação (sedução, manipulação) que

    decorre do ato argumentativo, seja ele oral ou escrito.

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    2/10

    Além disso, é importante que, principalmente no ensino das Ciências Humanas,em especial nas áreas do Direito e da Comunicação, os professores valorizem aprática da argumentação. Não só no sentido de técnica, mas como ponto departida para uma reflexão acerca da ética da informação/argumentação.Também hoje se faz necessário que os mestres incentivem a criatividade de

    seus alunos, que os motive à busca de solução de problemas, sejam de ordemprática como de ordem teórica. Que não tomem a arte de ensinar como umamaneira de transmitir fórmulas prontas; receitas a serem aplicadas e pontofinal.

    Aos profissionais, principalmente da área do Direito, não temos muito aacrescentar por hora. Mas, como é necessário dizer alguma coisa, faço minhasduas passagens de Miguel Reale que servem tanto como ponto de partida comoponto de chegada desse nosso estudo. São longas, mas de uma sabedoriaincrível:

    “A função de julgar não se reduz a esquemas ou cálculos matemáticos, nemtampouco se desenvolve como um processo de Lógica formal, de maneira talque, postos os fatos e a lei se chegue invariavelmente a mesma conclusão. Asentença é antes de tudo um processo de estimativa do fato para situar, em

    função dele, os textos legais aplicáveis à hipótese em apreço. Nesse trabalhovariam as perspectivas dos juízes. Diante dos mesmos fatos e com base nosmesmos textos legais, pode o trabalho de coordenação normativa serdiferente. Pode um magistrado citar um texto legal em conexão com outros

    preceitos e chegar a conclusões diferentes das aceitas por outro juiz, inspiradoem critérios diversos.” ( REALE, 1995, p. 172).

    “O juiz é autônomo na interpretação e aplicação da lei, não sendo obrigado arespeitar, em suas sentenças, o que os tribunais inferiores ou superiores hajamconsagrado como sendo de direito. Nem tampoucoos advogados devem exercera sua profissão com os olhos postos exclusivamente no que os tribunaisdecidem. Há advogados, cuja sabedoria consiste em fazer fichas de decisõesdos tribunais, para seguirem, pari passu e passivamente, tudo aquilo que no

    foro se dite ou se declare como sendo Direito. Muitas vezes, a grandeza de umadvogado consiste exatamente em descobrir uma falha na jurisprudênciatradicional, abrindo caminhos novos na interpretação e aplicação do Direito. Overdadeiro advogado é aquele que, convencido do valor jurídico de uma tese,leva-a a debate perante o pretório e a sustenta contra a torrente das sentençase dos acórdãos, procurando fazer prevalecer o seu ponto de vista, pela clarezado raciocínio e a dedicação à causa que aceitou. É nesse momento que se revelao advogad o por excelência, que se transforma em jurisconsulto.” (REALE, 1995,

    p. 174).

    Desenvolvimento da Teoria da Argumentação

    Aristóteles, noOrganon distinguia entre analítica e dialética. A analítica era aparte da lógica[i] que estudava o raciocínio científico, o raciocínio que se impõecomo verdadeiro; certo e de alguma forma evidente. Assim,raciocíniosanalíticos são aqueles que, partindo de premissas necessárias derivam,mediante um processo de inferência válido, conclusões necessárias e válidas.

    http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_edn1http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_edn1

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    3/10

    Como se sabe, na teoria acerca dos silogismos categóricos, considerados comoraciocínios analíticos, é impossível que a conclusão seja falsa, a partir depremissas corretas e, de uma estrutura correta.

    Ao contrário da analítica, a dialética tinha por objeto os raciocínios prováveis,

    que, partem de premissas prováveis e geram, não a certeza, mas a opinião, acrença. Os raciocínios dialéticos foram examinados por Aristótelesnos Tópicos,na Retórica e nas Refutações Sofísticas.Nesse sentido, segundoPerelman (2000, p. 2):

    “Referem -se não às demonstrações científicas, mas às deliberações e àscontrovérsias. Dizem respeito aos meios de persuadir e de convencer pelodiscurso, de criticar as teses dos adversários, de defender e justificar as suas

    próprias, valendo-se de argumentos mais ou menos fortes.”

    Porém, é importante frisar que Aristóteles não concebia o raciocínio dialéticocomo simples retórica guiada com o objetivo de, a qualquer preço, obter vitóriaem debates (políticos ou forenses). Esses argumentos, que tinham por únicoobjetivo convencer a qualquer custo, recebiam, o nome deerísticos, e estavamalicerçados em premissas apenas aparentemente prováveis. Segundo atradição, tais tipos de argumentos eram comuns entre os sofistas.

    O interessante é que, ainda hoje, quando alguém se refere à argumentação,normalmente se pensa em retórica, no sentido erístico, o que não écompletamente incorreto, dado os desdobramentos posteriores.

    É importante esclarecer que, tal concepção, decorre em parte pelo própriodesenvolvimento da dialética (retórica) depois de Aristóteles. Antes de tudo,devemos observar que, na verdade, há várias Retóricas, com suascaracterísticas próprias em cada época. Podemos, em termos didáticos, dividira retórica em: Retórica Antiga; Retórica Clássica; Retórica dasFiguras; Retórica Nova e Retórica Semiótica.

    Por retórica antiga, Tringali (1984, p. 13) designa o que ele chama de “averdadeira retórica”. Essa seria a retórica grega e latina, referenciada porAristóteles, Cícero, Quintiliano, entre outros e, se caracterizava,essencialmente comoretórica do discurso persuasivo[ii] .

    A chamadaRetórica Clássicaconsolidou-se durante o período do Renascimento,principalmente com a obra de Petrus Ramusmando (1515-1572), adversário deAristóteles. Porém, há indícios de que ela já vinha se formando duranteAntigüidade e a Idade Média. A característica principal seria a redução daretórica antiga ao domínio da elocução. Nesse sentido, se caracterizava muitomais como uma teoria da composição e do estilo, ou seja, como arte de escrevere falar bem. Durante o século XIX ela desapareceu com o surgimentoda Estilística, ainda mais reducionista que aRetórica Clássica.

    AEstilística, ou Retórica das Figuras reduzia a elocução apenas às figuras, àschamadas figuras de estilo ou figuras retóricas como, por exemplo, a metáfora,aliteração, ironia, etc. Tal tendência manifesta-se novamente, em nossos dias,

    http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_edn2http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_edn2http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_edn2

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    4/10

    sob o nome de Retórica Geral. Parece que a decadência da retórica teve seuinício bem antes do século XIX. Para Roland Barthes (1970, p. 192):

    “Este descrédito foi trazido pela promoção de um novo valor, a evidência (dos fatos, das idéias, dos sentimentos) que se basta a si mesma e não necessita da

    linguagem (ou pensa não necessitar dela), ou ao menos pretende não maisservir desta linguagem como um instrumento, como uma mediação, como umaexpressão. A partir do século XVI esta“evidência” toma três direções: umaevidência pessoal (no protestantismo), uma evidência racional (nocartesianismo), uma evidência sensível (no empirismo).”

    Barthes e outros, como Perelman, vêem no cartesianismo e em sua rejeição ao“verossímil” (ao possível) a origem da dificuldade que a retórica teve paraconservar um lugar central nos sistemas de pensamento modernos. (BRETON,2003, p. 17).

    A Retórica Novaou Nova Retórica foi proposta por Chaïm Perelman e seuscolaboradores. Denomina-senovaporque renova, porque se volta de novo paraa dialética de Aristóteles que tinha sido abandonada pela filosofia ocidental,ou seja, tenta aliar os principais elementos da Retórica de Aristóteles a umavisão atualizada do assunto. Segundo Koch (2004, p. 19), “os trabalhos dePerelman deram novo impulso aos estudos sobre a argumentação”. O projetode Perelman, conforme Breton (2003, p. 18-19), era romper com umaconcepção da razão e do racionalismo vinda de Descartes. Segundo aconcepção de Perelman, um raciocínio pode ser rigoroso sem sernecessariamente científico. Nesse sentido, para a Nova Retórica,trabalha a

    argumentação como técnica discursiva que permite provocar ou aumentar aadesão das pessoas às teses que são apresentadas para seu assentimento.

    Em verdade não temos na Retórica Semiótica uma escola que procuradesenvolver técnicas de argumentação ou de estilo. Podemos dizer que ela émais um campo de investigação que se dedica a aplicar o métodosemiótico(método estruturalista) a fim de estudar o discurso, o qual éentendido uma fala completa, um texto autônomo e, nesse ponto, difere dalingüística, que estuda a frase. A análise da Retórica Semiótica se aplica tantoà retórica como a qualquer discurso e em qualquer linguagem (cinematográfica,teatral, jornalística, etc.).

    A semiótica compreende dois grandes ramos: asemiótica da significação ea semiótica da comunicação. Ateoria da significação estuda os signos enquantoexpressão individual do pensamento, como suporte de vida mental. Ateoria dacomunicação estuda os signos enquanto instrumento de comunicação entreindivíduos. Os temas mais importantes da teoria da comunicação são: os fatoresda comunicação e os meios de comunicação, sobretudo os meios decomunicação de massa.

    Porém, vocês devem estar se perguntando: E a retórica? Qual a relação entresemiótica e retórica?

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    5/10

    A retórica é um meio de comunicação, e, nas épocas anteriores à imprensa, umdos mais relevantes. Os meios de comunicação são, na atualidade, como vimos,os mais retóricos, inclusive e, principalmente, no sentido de persuadir. Assim aretórica se oferece como objeto de estudo da semiótica, como também ofereceà semiótica um instrumento de análise.

    Koch (2004, p. 18) salienta que foi com o surgimento daPragmática que oestudo do discurso e, em decorrência, o da argumentação ou retórica passou aocupar lugar central nas pesquisas acerca da linguagem. Essa preocupação teveinício, teve início no momento em que se passou a incorporar a enunciação aosestudos dos enunciados lingüísticos, o que deu origem à chamadaTeoria daenunciação.

    Também de fundamental importância foram os estudos dos filósofos analíticosde Oxford, em especial Austin e Searle, nos EUA, entre outros. Tais pensadoresse dedicaram ao estudo dos chamadosatos de linguagem, ou seja, aquilo quese faz quando se fala. Ao fazerem a distinção entre atos ilocutórios (queencerram a “força” com que os enunciados são produzidos), e atos

    perlocutórios (que dizem respeito aos efeitos visados pelo uso da linguagem,entre os quais os de convencer e persuadir), também dão inestimávelcontribuição à teoria da argumentação e da análise do discurso (SEARLE, 2000).

    Assim, com esses desenvolvimentos, entre outros, o discurso tornou-se temacentral de diversas tendências, como, por exemplo, da Análise do discurso,da Teoria do Texto e da Semântica Argumentativa.

    Bem, antes de iniciarmos o estudo do processo argumentativo em si, énecessário ainda fazer a distinção entre três termos usuais:Retórica, Oratóriae Eloqüência.

    Normalmente encontramos nos textos dedicados à “arte da argumentação”,três denominações diferentes:retórica, oratória e eloqüência. As três palavrasderivam de diferentes raízes, mas todas significam falar. Assim,etimologicamente se sublinha a idéia de falar em oposição a escrever. Emborasinônimas, elas não se sobrepõem, em certos contextos se substituem, emoutros, não. O termo eloqüência é a mais fácil compreensão. Pode significar:1) teoria do discurso persuasivo– nesse sentido, é sinônimo de retórica antiga;2) prática dos discursos– significa o conjunto dos discursos produzidos. Porexemplo, quando se diz eloqüência jurídica brasileira, isto é, o conjunto dosdiscursos judiciais produzidos na cultura brasileira; 3) dons naturais,espontâneos no sentido de fazer um discurso 4) juízo de valor - indica aqualidade positiva de um discurso.

    A palavra“oratória” é de origem latina que traduz a palavra grega retórica.Significa: 1) teoria do discurso persuasivo; 2) prática do discurso. Já, otermo retórica significa apenas teoria do discurso persuasivo e aplica-se,porém, não só à retórica antiga como também as demais.

    Fundamentos da teoria da argumentação

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    6/10

    A primeira pergunta que devemos fazer, antes de apresentar qualquer técnicaou estratégia, é: o que é argumentação e quais seus limites.

    A origem do termo “argumentar” vem do latim argumentum, que tem comotema argu, cujo sentido principal é “fazer brilhar”, “iluminar”. Pela sua

    origem, então, podemos, num primeiro momento, dizer que argumento é tudoaquilo que ilumina.

    Segundo Penteado (1980, p. 233), “argumentar é discutir, mas principalmente,é raciocinar, é deduzir e concluir. A argumentação deve ser construtiva nafinalidade, cooperativa em espírito e socialmente útil”.

    Podemos dizer que a argumentação é, de certa forma, uma técnica de emitiropiniões, de defender uma determinada posição. Portanto, se dá mediante ouso da razão, entendida aqui como “a faculdade por intermédio da qualconcebemos, julgamos, isto é, refletimos, pensamos”. (COSTA, 1980, p. 2).

    Alguns autores definem a argumentação comoarte. Faulstich (2003, p. 63),por exemplo, diz que a argumentação é a “arte de influenciar os outros pormeio da evidência e da lógica”. Outros, já colocam em evidência mais ométodo, o procedimento argumentativo. Por exemplo, Koch (2004, p. 17)entende o ato de argumentar como a orientação do discurso “no sentido dedeterminadas conclusões”. Nolt e Rohatyn (1991, p. 1) definem o argumentocomo “uma seqüência de enunciados na qual um dos enunciados é a conclusãoe os demais são premissas, as quais servem para provar ou, pelo menos,fornecer alguma evidência para a conclusão”. Outros, ainda, tomam como

    ponto central o objetivo do ato argumentativo. Por exemplo, a argumentação,conforme Breton (2003, p. 7), pertence à família das ações humanas que temcomo objetivo convencer. Porém, devemos nos lembrar que, nem todo tipo deconvencimento é argumentação. Podemos dizer que a argumentação é tudoisso. Enfocaremos aqui a argumentação como linguagem diretiva, comoprocesso de convencimento, o qual envolve métodos, procedimentos,contextos, linguagem, etc.

    Ora, os meios de convencimentosão extremamente variados, podendo utilizar-se de procedimentos simples, até procedimentos mais complexos, que, porexemplo, utilizam informações acerca do comportamento humano.

    Nesse sentido, por exemplo, há uma enorme variedade de publicações e estudosacerca do comportamento do consumidor. Tais estudos envolvem várias áreasda psicologia comportamental, da psicanálise, da psicobiologia (cronobiologia,por exemplo), das neurociências entre outras. Pode-se dizer, a partir disso que,muitas vezes, o ato de convencer se apresenta como uma alternativa ao uso daviolência física. Joule e Beavois (1995), por exemplo relatam como muitas vezesas técnicas de venda exercem certa dose de violência sobre as pessoas,mediante a manipulação psicológica.

    Outros meios, como vimos no estudo acerca das funções de linguagem, sãomenos agressivos. Exemplo disso é asedução, que, como vimos, éfreqüentemente utilizada para levar o outro, ou até públicos inteiros, a

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    7/10

    partilhar determinado ponto de vista, a consumir determinado produto ouserviço, etc.

    Já, outros meios apelam mais para a razão. Trata-se, por exemplo,da demonstração, concebida aqui como um conjunto de meios que permitem

    transformar uma afirmação ou um enunciado em um “fato estabelecido”, amenos que se oponha a ele um outro enunciado, mais bem demonstrado.(BRETON, 2003, p. 9-10). Ou seja, temosdiferentes maneiras de convencer ,como podemos observar no esquema seguinte:

    Porém, é importante salientar que a separação dos diferentes meios utilizados

    para convencer é mais didática do que real. Na prática, a exemplo das funçõesde linguagem, raramente encontramos situações puras de sedução, dedemonstração ou de outro tipo qualquer.

    O que nos desperta especial interesse, nessa obra, é a argumentação comoinstrumento para fazer partilhar uma opinião e, que pode ter comoconseqüência uma ação. Ou seja, não nos interessam nessa obra, analisarexaustivamente os meios de convencimento, a utilização da violênciapersuasiva, do recurso à sedução ou à demonstração científica propriamentedita.

    Pode-se dizer que, o tipo de argumentação que nos interessa, trata-se de umgênero particular, próximo à idéia de dialética em Aristóteles ou, daRetórica Antiga e, de certa forma, com algumas restrições, à teoria da argumentação dePerelman, cuja especificidade procuremos procuraremos explorar na parte emque tratamos especificamente acerca da argumentação ou da lógicajurídica. Porém, isso não significa que abriremos mão dos recursos da lógicacomo instrumento de análise.

    No processo argumentativo (oral ou escrito), entendido como um dos elementosda teoria da comunicação, se deve distinguir alguns elementos imprescindíveis,sem os quais não há argumentação. São eles:

    - Opinião ou a tese

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    8/10

    - Orador ou escritor

    - Argumento

    - Auditório ou público

    A partir desses elementos, podemos montar um esquema geral e extremamentesimplificado do processo de argumentação:

    Se observarmos com cuidado, tal esquema é semelhante ao esquema propostopela chamada Teoria da Informaçãoou Teoria Matemática da Comunicação,conforme denominação de Shannon (1975), o qual, podemos assim representarde forma simplificada:

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    9/10

    Porém, nosso esquema, em relação ao esquema original proposto pelaTeoriada Informação apresenta outros elementos essenciais, como por exemplo,o referente/contexto e o ruído. Voltaremos a esses elementos mais adiante.

    De forma resumida, podemos, a partir dos elementos apresentados até agora,

    delimitar o campo da argumentação, a partir de três elementos:1) Argumentar é comunicar.

    2) Argumentar não é convencer a qualquer preço.

    3) Argumentar é raciocinar.

    4) Argumentar é propor e dar aos outros razões para aderir à proposta.

    Voltando à questão dos elementos (opinião/tese; orador/escritor; argumento eauditório/público), existentes em um processo comunicacional, argumentativo,devemos ainda e, talvez principalmente, levar em conta o contexto derecepção, o qual pode ser entendido como o conjunto de valores, opiniões, ouseja, da visão de mundo dos receptores.

    A visão de mundo existe previamente ao ato da argumentação e,conseqüentemente desempenha papel fundamental na recepção do argumento,ou seja, na sua aceitação ou recusa ou ainda na adesão variável parcial. Porisso, é um erro considerar o(s) receptor(es) como ente(s) passivo(s). Narealidade, mesmo em um auditório, ocorre, muitas vezes em silêncio, um

    processo dialético, no qual os receptores avaliam e confrontam as idéiasapresentadas com seus próprios “pré-conceitos”.

    O que vimos até agora nos autoriza a dizer apenas que, argumentar é um atocomplexo; é mais do que simplesmente conceber um argumento. É também,mais globalmente, comunicar, dirigir-se ao outro, propor-lhe boas razões paraser convencido a partilhar de uma opinião. Porém, tal processo precede umamplo conhecimento das “razões” do outro, do público, doadversário e,principalmente, das “nossas razões”. É um ato que requer ética.

    Referências BARTHES, R. L’ ancienne rhétorique. Communications. Paris: Seuil, 1970(Recherches rhétoriques, n. 16).BRETON, P. Argumentação na comunicação.2 ed. Bauru: EDUSC, 2003.COSTA, N. C. A. da.Ensaio sobre os fundamentos da lógica.HUCITEC- Edusp,1980.FARIA, E.Dicionário escolar latino-português. 4 ed. Rio de Janeiro:Departamento Nacional de Educação do Ministério da Educação e Cultura, 1967.FAULSTICH, E. L. de.Como ler, entender e redigir um texto. 16 ed. São Paulo:Vozes, 2003.JOULE, R-V; BEAVOUIS, J-L.Petit traité de manipulation a l’usage dês genshonnêtes. Grenoble: PUG, 1995.KOCH, I. G. V. Argumentação e linguagem.9 ed. São Paulo: Cortez, 2004.

  • 8/20/2019 Teoria da argumentação: lógica, ética e técnica

    10/10

    LALANDE, A.Vocabulário técncico e crítico da filosofia. São Paulo: MartinsFontes, 1998.NOLT, J.; ROHATYN, D.Lógica. São Paulo: Mc Graw-Hill, 1991.PENTENADO, J.R.W. A técnica da comunicação humana.São Paulo: Pioneira,1980.

    PERELMAN, C.Lógica jurídica. São Paulo: Martins Fontes, 2000.PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA.Tratado da argumentação. São Paulo:Martins Fontes, 1996.REALE, M.Lições preliminares de direito.22 ed. São Paulo: Saraiva, 1995.SEARLE, J.R.Mente, linguagem e sociedade:filosofia no mundo real. Rio deJaneiro: Rocco, 2000.SHANNON, C.; WEAVER, W. A.Teoria matemática da comunicação. Rio deJaneiro: Difel, 1975.SOARES, E.Fundamentos de lógica:elementos de lógica formal e teoria daargumentação. São Paulo: Atlas, 2003a.TRINGALI, D. Introdução às retóricas.Cadernos de Teoria crítica literária, n.14. Araraquara: Universidade Estadual Paulista, 1984.

    Notas: [i] Aristóteles não utilizava a expressão “dialética”. [ii] Para Tringali (1984), o fato de ser denominada de antiga não significa quenão tem utilidade hoje. Para ele, tal retórica continua sendo atual.

    http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_ednref1http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_ednref2http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_ednref2http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861#_ednref1