Tese - avaliacaodequalidadedosistemasuperiorbrasileiro
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7/23/2019 Tese - avaliacaodequalidadedosistemasuperiorbrasileiro
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Universidade Federal do Rio Grande do SulFaculdade de Educao
Programa de Ps-Graduao em Educao
Avaliao da Qualidade do Sistema de Educao Superior Brasileiroem Tempos de Mercantilizao Perodo 1994-2003
Tese de Doutorado
Julio Csar Godoy Bertolin
Porto Alegre2007
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Universidade Federal do Rio Grande do SulFaculdade de Educao
Programa de Ps-Graduao em Educao
Avaliao da Qualidade do Sistema de Educao Superior Brasileiroem Tempos de Mercantilizao Perodo 1994-2003
Julio Csar Godoy Bertolin
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educaocomo requisito parcial para a obteno do ttulo de Doutor emEducao na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Orientadora Dra. Denise Balarine Cavalheiro Leite
Porto Alegre2007
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Tanise e Camila, razes maiores da minhavida, pela pacincia e pela espera amorosa.
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Agradecimentos
Agradeo a oportunidade de desenvolver minha tese de doutorado na UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul, pelo seu carter pblico e de qualidade.
Universidade de Passo Fundo pela Licena Ps-Graduao e pelas oportunidadesprofissionais que vem me possibilitando.
Aos meus colegas da UPF, especialmente aos professores dos cursos de Cincia da
Computao e Anlise e Desenvolvimento de Sistemas,pelo companheirismo e fidelidade.
A toda minha famlia, meus irmos e irms, minhas sobrinhas e sobrinhos, meus cunhadose cunhada, aos familiares da Tanise, pelo
reconhecimento e incentivo.
minha me e ao meu pai, que me legaram os princpios e valores que mais dignificam oser humano: tica, humildade, solidariedade,
fraternidade, igualdade e justia. A eles, minha eternagratido.
E especiais agradecimentos
Capes e ao governo brasileiro, pelo apoio recebido para o desenvolvimento de estudos noexterior.
Ao Prof. Dr. Rui Santiago da Universidade de Aveiro, pela receptividade e orientao
durante meu estgio de doutorado em Portugal.
Profa. Dra. Denise Balarine Cavalheiro Leite pelo acompanhamento, pela orientao,e pelas oportunidades de aprendizado acadmico e de vida que me proporcionou.
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Resumo
Este estudo teve como objetivo elaborar uma proposta de indicadores para avaliaoda qualidade do sistema de educao superior brasileiro e, com base nestes indicadoreselaborados, medir e avaliar o desenvolvimento da sua qualidade no perodo 1993-2004.Considerou-se que o perodo escolhido est associado intensificao do fenmeno damercantilizao da educao superior no Brasil. Para caracterizar o fenmeno, o estudoapia-se nas perspectivas tericas de Boaventura de Sousa Santos sobre as crises dauniversidade, de Ana Maria Seixas acerca das transformaes privatistas e dos autoresDavid Dill, Pedro Teixeira, Bem Jonbloed e Alberto Amaral sobre os mercados daeducao superior. Os temas da qualidade e da avaliao da qualidade tm como refernciaprincipal os trabalhos de Ronald Barnett, Lee Harvey e Diana Green. Foram estudados osindicadores e sistemas de indicadores de educao adotados pelas agncias internacionais,
tais como Unesco e OCDE. Com essas referncias foi elaborado um sistema de indicadorespara avaliao do desenvolvimento da qualidade do Sesb, que compreende as categoriaseqidade, relevncia, diversidade e eficcia. O estudo apresenta o sistema de indicadoreselaborado e sua aplicao no perodo 1993-2004. Os resultados explicam a hiptese detrabalho, ou seja, em tempos de mercantilizao da educao superior a qualidade daeducao superior brasileira no se desenvolveu positivamente, visto que no perodo 1994-2003 no foram encontradas evidncias claras de melhorias do Sesb em termos deeqidade, relevncia, diversidade e eficcia.
Palavras-chave: educao superior, avaliao de sistema, mercantilizao da educao
superior, avaliao da qualidade em educao superior, sistema de indicadores de SES.
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Abstract
The present study was carried out with the aiming to elaborate a proposal ofindicators for assessing quality in Brazilian system for higher education and, based on thoseindicators, measure and evaluate the development of such quality in the period rangingfrom 1993 to 2004. It was considered the chosen period as associated to the increasing ofthe commodification of higher education in Brazil. In order to characterize that phenomena,the study used as grounds the theories developed by Boaventura de Sousa Santos, about theuniversity crisis; by Ana Maria Seixas, about the privatizing transformations; and by DavidDill, Pedro Teixeira, Bem Jonbloed, and Alberto Amaral, on the higher education markets.The matters involving quality and quality assessment have the main studies by RonaldBarnett, Lee Harvey, and Diana Green as references. The indicators and systems of
education indicators adopted by international agencies such as Unesco and OCDE, werealso studied. Based on those references a system of indicators for the evaluation of qualitydevelopment in Sesb was elaborated, and it includes the following categories: equity,relevance, diversity, and efficiency. This study presents that indicators system as well as itsapplication during the period 1993-2004. The results explain the hypothesis upon whichwork was developed, that is, in times of commodification of higher education, the qualityof such education in Brazil has not developed positively. That is said based on the fact thatduring the period 1993-2004 there could not be found clear evidences of improvement inSesb in what concerns equity, relevance, diversity, and efficiency.
Key words: higher education, evaluation system, commodification of higher education,
quality assessment in higher education, system-level indicators for higher education
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Lista de Ilustraes
Figura 1 - Representao do tringulo da coordenao de Burton Clark.................................... 91Figura 2 - Modelo geral dos sistemas de educao superior do Estado-Providncia.................. 106Figura 3 - Modelo geral dos sistemas de educao superior do neoliberalismo.......................... 106Figura 4 - Vises de qualidade em educao superior................................................................. 143Figura 5 - Indicadores de resultado da aprendizagem da OCDE 2002........................................ 181Figura 6 - Indicadores de recursos econmicos e humanos da OCDE 2002............................... 181Figura 7 - Indicadores de acesso educao, participao e promoo da OCDE 2002............ 181Figura 8 - Indicadores de contexto pedaggico e organizao escolar da OCDE 2002.............. 182Figura 9 - Relao entre os indicadores da OCDE e propriedades da qualidade........................ 184Figura 10 - Estrutura bsica do sistema de indicadores para o Sesb............................................. 205Figura 11 - Sistema da Unesco-Cepes para indicadores de qualidade do Sesb............................. 207Figura 12 - Avaliao da OCDE para indicadores de qualidade do Sesb...................................... 209Figura 13 - Anlise do Banco Mundial para indicadores de qualidade do Sesb........................... 211Figura 14 - Sistema de Indicadores para a qualidade do Sesb....................................................... 215Figura 15 - Etapas do procedimento de investigao de Quivy e Campenhoudt.......................... 218Figura 16 - Evoluo da quantidade de IES estatais e privadas no Sesb no perodo 1994-2003.. 220Figura 17 - Evoluo do percentual de matrculas das redes estatais e privadas no Sesb no
perodo 1994-2003...................................................................................................... 220Figura 18 - Despesas executadas pelas Ifes com recursos do Tesouro como porcentagem do
PIB no perodo 1994-2001.......................................................................................... 223Figura 19 - Estimativa comparativa do financiamento privado e do governo federal das IES do
Sistema Federal de Ensino no perodo 1994-2001...................................................... 224Figura 20 - Despesas executadas pelas Ifes com recursos do Tesouro por discente no perodo
1994-2001................................................................................................................... 225Figura 21 - Dispndio do governo federal em P&D com o MEC no perodo 1996-2002............. 226Figura 22 - Quantidade de discentes por docente com ttulo de doutor nas Ifes, nas IES
estaduais/municipais, e nas IES privadas e no Sesb no perodo 1994-2003............... 227Figura 23 - Evoluo da razo de discentes por docente com ttulo de mestre ou doutor no
Sesb no perodo 1994-2003........................................................................................ 228Figura 24 - Quantidade de discentes por docente nas privadas, nas IFES e no Sesb no perodo
1994-2003................................................................................................................... 229Figura 25 - Evoluo da porcentagem de docentes com dedicao integral e parcial do Sesb no
perodo 1994-2003...................................................................................................... 230Figura 26 - Evoluo da porcentagem de discentes por grandes reas do conhecimento do Sesb
no perodo 1994-2003................................................................................................. 231Figura 27 - Quantidade de discentes de mestrado e doutorado no Brasil para cada bolsista no
exterior no perodo 1996-2002.................................................................................... 232Figura 28 - Quantidade de cursos de graduao avaliados pelo ENC (Provo) no perodo
1996-2003................................................................................................................... 233Figura 29 - Evoluo da porcentagem de cursos com conceitos A ou B no Provonas Ifes e na
rede privada no perodo 1998-2003............................................................................ 234Figura 30 - Evoluo da porcentagem de cursos das Ifes, dos sistemas estaduais, da rede 235
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privada e do Sesb por conceitos no perodo 1998-2003.............................................Figura 31 - Evoluo da taxa de escolarizao lquida na educao superior brasileira no
perodo 1993-2003...................................................................................................... 236
Figura 32 - Evoluo da porcentagem de concluintes em relao aos discentes que ingressaram4 anos antes no Sesb no perodo 1996-2003............................................................... 237
Figura 33 - Evoluo da porcentagem da populao economicamente ativa com diplomasuperior no Brasil no perodo 1993-2003................................................................... 237
Figura 34 - Quantidade de pessoas inseridas em ocupao tcnico-cientfica por publicaointernacional no Brasil no perodo 1998-2003............................................................ 238
Figura 35 - Comparao entre as taxas de escolarizao lquida das populaes negra e brancana educao superior brasileira no perodo 1993-2003.............................................. 239
Figura 36 - Evoluo da relao entre a porcentagem de discentes da educao superior e aporcentagem da populao de cada regio do Brasil no perodo 1995-2003.............. 240
Figura 37 - Evoluo da porcentagem de cursos com conceitos A ou B no Provo por regies
do Brasil no perodo 1998-2003................................................................................. 241Figura 38 - Evoluo dos indicadores do Sesb no perodo 1994-2003......................................... 242Figura 39 - Estimativa do financiamento do Sistema Federal de Ensino por discente no
perodo 1994-2001...................................................................................................... 243
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Lista de Tabelas
Tabela 1 - Evoluo do nmero de IES por categoria administrativa - Brasil 1997-2003............ 127Tabela 2 - Estrutura condensada para o Plano de Aes Prioritrias da Unesco-Cepes............... 186Tabela 3 - Indicadores do quadro referencial que suporta as polticas e os desenhos de
polticas da Unesco-Cepes........................................................................................... 187Tabela 4 - Indicadores de financiamento da Unesco-Cepes.......................................................... 188Tabela 5 - Indicadores de nveis apropriados de participao, acesso e reteno da Unesco-
Cepes........................................................................................................................... 188Tabela 6 - Indicadores de resultados econmicos e sociais da Unesco-
Cepes........................................................................................................................... 189
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Lista de Siglas
ACE Avaliao das condies de ensino
Andifes Associao Nacional dos Dirigentes das Instituies Federais de Ensino Superior
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BM Banco Mundial
Capes Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
Cefet - Centro Federal de Educao Tecnolgica
Cepes - European Centre for Higher Education da Unesco
Ceri - Centre for Educational Research and Innovation da OCDE
C&T Cincia & Tecnologia
Cipes - Centro de Investigao de Polticas do Ensino Superior
CNE - Conselho Nacional de Educao
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
Conaes - Comisso Nacional de Avaliao da Educao Superior
Creduc - Programa de crdito educativo
Enade - Exame nacional de desempenho de estudantes do Sinaes
ENC Exame nacional de cursos
ENQA European Network for Quality Assurance in Higher Education da UE
ES Educao superior
EUA Estados Unidos da Amrica
Fapesp - Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo
Fatec Faculdade de Tecnologia
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FEA - Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da USP
Fies - Programa de financiamento estudantil
FMI - Fundo Monetrio Internacional
G8 - Grupo dos sete pases mais desenvolvidos do Mundo e a Rssia
Gats Acordo Geral sobre Comrcio de Servios da OMC
Gatt Acordo Geral sobre Tarifas e Comrcio
Geres - Grupo Executivo para a Reformulao do Ensino Superior
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IES Instituio de educao superior
IFC International Finance Corporation
Ifes - Instituies federais de ensino superior
Ince Institut Nacional de Calidad y Evaluacin do Ministrio de Educao, Cultura eDesporto da Espanha
Ines - International Indicators of Education Systems do Ceri
Inep - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira
INPC - ndice Nacional de Preos ao Consumidor do IBGE
Ipib Internet produto interno bruto
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional
MBA - Master of Business Administration
MCT - Ministrio da Cincia e Tecnologia do Brasil
MEC Ministrio da Educao do Brasil
Nafta - Acordo de Livre Comrcio da Amrica do Norte
OCDE - Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico
OECD - Organization for Economic Co-operation and Development
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OEI - Organizao dos Estados Ibero-americanos
OIT - Organizao Internacional do Trabalho
OMC - Organizao Mundial do Comrcio
PAE Programa de ajustes estruturais do Consenso de Washington
Paiub - Programa de Avaliao Institucional das Universidades Brasileiras
Paru - Programa de Avaliao da Reforma Universitria
PEA - Populao economicamente ativa
P&D Pesquisa & Desenvolvimento
PIB - Produto interno bruto
Pisa - Programme for International Student Assessment da OCDE
Pnad - Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios do IBGE
PPC - Paridade de poder de compra da OCDE
SFE Sistema Federal de Ensino
SES - Sistema de educao superior
Sesb Sistema de educao superior brasileiro
Sidra - Sistema IBGE de Recuperao Automtica
Sinaes - Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior
Seppir - Secretaria Especial de Polticas de Promoo da Igualdade Racial do Brasil
TIC Tecnologias de informao e comunicao
TQM Total quality management
UE Unio Europia
UFGRS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
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UnB Universidade de Braslia
Unesco - Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura
UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas
Unicef - Fundo das Naes Unidas para a Infncia
UPF Universidade de Passo Fundo
URSS - Unio das Repblicas Socialistas Soviticas
USP Universidade de So Paulo
WEI World Education Indicators da Unesco
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Sumrio
Resumo..................................................................................................................................... 4Abstract..................................................................................................................................... 5Lista de Ilustraes................................................................................................................. 6Lista de Tabelas...................................................................................................................... 8Lista de Siglas.......................................................................................................................... 9Prlogo..................................................................................................................................... 15Introduo............................................................................................................................... 16
O problema.......................................................................................................................... 16O objetivo............................................................................................................................ 18A justificativa....................................................................................................................... 19
Definies tericas............................................................................................................... 23Abordagem metodolgica.................................................................................................... 25Estrutura do texto................................................................................................................. 27
Captulo 1 - A Histria e a Misso da Educao Superior.................................................. 301.1 A Trajetria da Universidade: do Feudalismo ao Neoliberalismo................................. 31
1.1.1 O surgimento da universidade durante o feudalismo.............................................. 311.1.2 A primeira grande crise da universidade durante o mercantilismo......................... 321.1.3 A consolidao da universidade moderna durante o liberalismo............................ 341.1.4 A massificao da universidade durante o welfare statekeynesiano..................... 371.1.5 Uma nova grande crise da universidade na emergncia do neoliberalismo........... 39
1.2 Concepes e Transformaes da Educao Superior Contempornea......................... 411.2.1 As concepes de universidade no sculo XX....................................................... 421.2.2 O Estado, o mercado e as transformaes da educao superior contempornea.. 46
1.3 A Misso da Educao Superior no Sculo XXI............................................................ 511.3.1 A Unesco, o Banco Mundial e as funes da educao superior.......................... 521.3.2 As misses socioculturais e econmicas da educao superior no sculo XXI.... 55
Captulo 2 - A Mercantilizao da Educao Superior: o fenmeno mundial e o casobrasileiro................................................................................................................................. 62
2.1 Uma Introduo ao Estudo da Economia e dos Mercados............................................. 642.1.1 As teorias econmicas, o Estado e o mercado....................................................... 64
2.1.2 O estudo do mercado: mecanismo de formao de preo ou estrutura social? .... 692.1.3 As experincias de mercados livres de controle poltico e social.......................... 732.1.4 O mercado e seus termos bsicos.......................................................................... 75
2.2 As Origens e as Caractersticas da Mercantilizao da Educao Superior................... 772.2.1 A viso da educao superior como servio comercial: de Adam Smith ao BM
e a OMC.................................................................................................................................... 792.2.2 A mercantilizao dos meios e dos fins da educao superior.............................. 892.2.3 Mercados em educao superior: do quase-mercado s falhas de mercado.......... 108
2.3 A Mercantilizao da Educao Superior Brasileira...................................................... 1162.3.1 A avaliao do Provo: rankinge competio de mercado .................................. 1182.3.2 A grande expanso das instituies privadas......................................................... 123
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Captulo 3 - A Qualidade da Educao Superior: das concepes aos sistemas deindicadores............................................................................................................................... 133
3.1 As Concepes de Qualidade em Educao Superior.................................................... 1343.1.1 As propostas de taxionomia para a qualidade em ES............................................ 1353.1.2 Novos termos e tendncias de qualidade em ES: economicismo, pluralismo e
equidade.................................................................................................................................... 1423.1.3 A inexorvel relatividade do conceito de qualidade em ES................................. 153
3.2 A Qualidade dos Sistemas de Educao Superior.......................................................... 1563.2.1 As caractersticas dos sistemas de educao superior........................................... 1573.2.2 O entendimento de qualidade no mbito de SES................................................... 1633.2.3 A avaliao e a medio de sistemas de educao superior.................................. 167
3.3 Os Sistemas Internacionais de Indicadores de SES........................................................ 1723.3.1 Indicadores de qualidade para SES........................................................................ 173
3.3.2 Avaliaes e medies internacionais de SES....................................................... 179
Captulo 4 - O Desenvolvimento da Qualidade do Sesb no perodo 1994-2003................ 1964.1 Uma proposta de Sistema de Indicadores para o Sesb................................................... 198
4.1.1 O sistema de educao superior brasileiro Sesb.............................................. 1994.1.2 Um sistema de indicadores para avaliar e medir a qualidade do Sesb.................. 201
4.2 Avaliao e Medio do Desenvolvimento da Qualidade do Sesb - Perodo 1994-2003........................................................................................................................................... 216
4.2.1 Fundamentao metodolgica da avaliao e medio do Sesb........................... 2164.2.2 Levantamento do desenvolvimento do Sesb no perodo 1994-2003..................... 2194.2.3 Anlise geral do desenvolvimento da qualidade do Sesb - perodo 1994-2003.... 241
Concluso................................................................................................................................ 256Bibliografia............................................................................................................................. 264Anexos..................................................................................................................................... 278
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Prlogo
No obstante desenvolver a docncia e possuir ttulo de mestre no campo dascincias exatas, desde os tempos de estudante me interesso por e me envolvo com questes
polticas e sociais. Meu prprio mestrado, apesar de ser em Cincia da Computao,
abordou o envolvimento de questes humanas como uma das principais tarefas de um
analista de sistemas: superar a resistncia dos utentes aos processos de informatizao.
Nos ltimos tempos, como ator do mundo acadmico, primeiro como discente e
depois como docente, tenho desenvolvido diversas atividades relacionadas com as mais
importantes dimenses da universidade e da educao superior. Mais recentemente,desempenhando as funes de coordenador de curso de graduao, membro do Conselho
Universitrio da Universidade de Passo Fundo e como avaliador e consultor do Ministrio
da Educao, ampliei meu interesse pelo assunto avaliao e qualidade da educao
superior.
No mbito intra-institucional tenho dedicado especial ateno s questes de
eqidade e acesso como, por exemplo, ao idealizar e coordenar o projeto Informtica para
todos, que propicia o aprendizado bsico do uso do computador e do acesso internet paracrianas carentes. No mbito interinstitucional minhas atividades esto relacionadas
principalmente com a avaliao de instituies e cursos de educao superior. No ano de
2003, participei da comisso formada pelo ento ministro da Educao para propor um
novo sistema de avaliao para a educao superior brasileira, o que resultou na proposta
do Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior - Sinaes.
Atualmente, a educao superior faz parte dos meus projetos de vida pessoal e
profissional. Acredito que a qualidade em educao superior essencial para odesenvolvimento do pas. Ao apresentar esta tese de doutorado, espero estar contribuindo
com dados e evidncias sobre o desenvolvimento da qualidade da educao superior
brasileira. Hoje, mais do que nunca, tenho a convico de que trabalhar num projeto que
valoriza a idia de educao como bem pblico e de educao superior comprometida com
qualidade como eqidade e relevncia social tambm estar trabalhando para o
desenvolvimento de uma sociedade mais justa, humana e solidria.
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Introduo
Este captulo inicial tem o objetivo de apresentar a problematizao do tema objeto
de estudo. Alm dos objetivos, so apresentadas a justificativa e a importncia do tema, as
definies tericas necessrias para a sua compreenso, a abordagem metodolgica e a
forma como est estruturado o trabalho. Ao introduzir a problemtica, anuncia-se o
caminho da construo intelectual realizada.
O problema
Com uma histria de quase mil anos, as instituies de educao superior e as
universidades passaram por grandes desafios e profundas transformaes, como, por
exemplo, na Renascena e na consolidao dos Estados nacionais. Pode-se dizer que foram
reinventadas algumas vezes, tanto por meio de processos radicais como por lentos
processos evolutivos (MORHY, 2003). Assim, a educao superior sempre demonstrou
uma grande capacidade de adaptao e, medida que a sociedade e o Estado se
transformavam, tambm adquiria novas formas e funes. Nesta virada de sculo, quando o
mundo sofre novamente profundas transformaes sociais e econmicas, tais como a
emergncia da globalizao, a predominncia do princpio do mercado (neoliberalismo) e
as inovaes das tecnologias de informao e comunicao, novamente a universidade e as
instituies de educao superior deparam-se com imensos desafios. Por conseguinte, nas
ltimas dcadas esto ocorrendo mudanas na educao superior de vrios pases: os
sistemas passaram de um modelo de elite para um modelo de massas, as IES multiplicaram-
se e expandiram-se gerando uma grande diversificao de formas de organizaes
acadmicas e administrativas, e, sobretudo, emergiu o fenmeno chamado de
mercantilizao ou mercadorizao da educao superior.
A existncia de instituies privadas e a cobrana de taxas dos alunos na educao
superior no so fenmenos essencialmente modernos. As primeiras universidades da
Europa eram associaes de direo privada e os sistemas educacionais superiores
nacionais se estabeleceram nos sculos XIX e XX, seja pela fundao de novas instituies,
seja pela proviso de recursos estatais para as j existentes. Nos ltimos anos, porm,
mudanas mais profundas sobre a natureza privada dos meios e dos fins da educao
superior foram observadas em quase todo o mundo. Segundo Tristan McCowan, uma nova
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estrutura tem sido caracterizada por duas formas de privatizao: o crescimento de
universidades particulares e a crescente proporo de financiamento privado para as
universidades pblicas. (2005, p. 1). Entretanto, as recentes mudanas vo muito alm da
simples ampliao de instituies e financiamento privado. O surgimento de avaliaes
geradoras de rankings, o estabelecimento de mecanismos de mercado como forma de
regulao e a emergncia de modelos gerenciais empresariais nas IES estatais
(managerialismo) so alguns outros exemplos de fenmenos com vis mercantil que vm
emergindo no mbito dos sistemas nacionais de educao superior.
Essas mudanas podem ser pouco surpreendentes no contexto das reformas
neoliberais e da crise estrutural de hegemonia, de legitimidade e institucional (SANTOS,1994) que a educao superior vem passando nas ltimas dcadas. No entanto, a questo
mais complexa visto que o processo de mercantilizao pode gerar impactos significativos
sobre a qualidade, a eqidade e a relevncia de um sistema de educao superior e, por
conseguinte, na misso e no papel que historicamente a educao superior vem
desempenhando no desenvolvimento sociocultural e econmico dos pases. Alguns
organismos multilaterias financeiros tm sustentado que as instituies privadas e o status
de servio comercial da educao superior contribuem no apenas para a eficincia e o
crescimento econmico, mas tambm para o desenvolvimento igualitrio da sociedade. Por
outro lado, diversos e reconhecidos investigadores defendem o princpio da educao
superior como bem pblico, apresentando, entre outros argumentos, a importncia
estratgica que a educao superior e a universidade tm na construo de um projeto de
pas e que o mercantil, ao contrrio das caractersticas da universidade, possui interesses de
curto prazo.
Entretanto, os estudos desenvolvidos at o momento sobre as recentes mudanas de
tendncia mercantil na educao superior ainda no permitem concluses definitivas sobre
os impactos nos sistemas nacionais de educao. Portanto, estudar, investigar e descobrir as
complexidades e conseqncias do fenmeno da mercantilizao da educao superior de
fundamental importncia para as instituies, os sistemas e a sociedade, bem como para o
prprio futuro dos pases. Diante disso, o problema que move esta tese de doutorado est
diretamente relacionado com a urgente necessidade de se aprofundar o conhecimento
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acerca do prprio fenmeno da mercantilizao da educao superior e dos seus impactos
sobre a educao superior.
O Objetivo
Diante do contexto atual de crise e de transformaes, surgem diversas questes
importantes para os destinos e rumos da educao superior neste incio de sculo XXI:
Como manter padres de qualidade de um sistema de elite diante da emergncia de
sistemas de massas? Como manter valores acadmicos e a pesquisa desinteressada em
tempos de mercados competitivos e de crescente dependncia do financiamento privado?
Como desenvolver e ampliar a eqidade e a relevncia social da educao superior num
contexto de ampliao de instituies com fins lucrativos e da viso economicista da
educao? Enfim, diante das novas polticas de carter mercantil e das prprias
transformaes sociais surgem importantes questionamentos acerca dos rumos que a
educao superior est a tomar.
Nesse contexto, de fundamental importncia saber em que medida a
mercantilizao da educao superior est trazendo os resultados positivos preditos pelos
organismos multilaterais financeiros e pelos governos neoliberais. Mais especificamente,
acerca dos SES, o que precisa ser efetivamente respondido se a mercantilizao da
educao superior eficaz em relao melhoria da qualidade, eqidade e relevncia dos
sistemas? O desenvolvimento do presente trabalho procura exatamente contribuir na
construo de conhecimento para responder a tais questes. Em sntese, o objetivo principal
desta tese investigar o comportamento e o nvel de desenvolvimento da qualidade da
educao superior brasileira em tempos de mercantilizao.
Para alcanar tal objetivo o presente trabalho prope-se, inicialmente, revisar a
literatura especializada e realizar anlises interpretativas acerca de dois assuntos
prioritrios: (i) o fenmeno da mercantilizao da educao superior em nvel mundial e no
caso brasileiro e (ii) a qualidade na educao superior em nvel de concepes e
operacionalizao para a avaliao de SES. Para melhor fundamentar essas duas
abordagens apresentam-se estudos acerca da histria e da misso da educao superior.
Posteriormente, com base nos resultados das pesquisas bibliogrficas e revises da
literatura, prope-se um modelo de qualidade e implementa-se sua operacionalizao para
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avaliar o desenvolvimento da qualidade do Sesb no perodo em que surgiram e se
consolidaram as polticas de mercantilizao no Brasil (1994-2003). Com o estudo sobre a
histria e misso da educao superior pretende-se recuperar toda a trajetria desse nvel de
educao, desde o surgimento das universidades na Europa medieval, passando pela
consolidao dos modelos modernos de universidades, pelas crises de legitimidade,
hegemonia e institucional surgidas nas dcadas de 1980 e 1990, e apontar as tendncias de
concepes e misses para a educao superior no sculo XXI. Por meio de reviso da
literatura e de anlises interpretativas acerca das recentes polticas e tendncias mercantis
observadas nos meios e fins da educao superior, pretende-se compreender melhor os
conceitos bsicos da economia e do mercado, bem como embasar a investigao dasorigens, das causas e das caractersticas prprias do fenmeno da mercantilizao da
educao em nvel mundial e do caso brasileiro. Por fim, com o estudo sobre as concepes
e vises de qualidade em ES, as formas de avaliaes dos SES e sobre os sistemas
internacionais de indicadores pretende-se fundamentar um modelo de qualidade para um
SES, bem como embasar a operacionalizao da avaliao e medio do desenvolvimento
da qualidade do Sesb no perodo 1994-2003.
A Justificativa
Pode-se dizer que atualmente existe um consenso sobre a centralidade decisiva da
educao para o desenvolvimento social e econmico das naes. O capital humano tem
sido enfatizado por diversos organismos multilaterias, tais como Organizao das Naes
Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura, Organizao para a Cooperao e
Desenvolvimento Econmico, Banco Mundial e Comisso Europia, como
determinantemente crtico para o crescimento econmico. Indiscutivelmente, os
investimentos realizados em educao refletem em bem-estar para as sociedades, e uma
populao mais escolarizada resulta em maior capacitao, mais especializao, melhores
retornos econmicos em bens e servios, e facilita a absoro de alta tecnologia. Alm
disso, a qualidade e a eqidade nos sistemas de educao causam fortes impactos em
indicadores sociais como mortalidade infantil, fecundidade e distribuio de renda.
Portanto, a educao vista como um meio tanto para reduzir as desigualdades e
desenvolver o social quanto para melhorar a produtividade e fazer crescer a economia. Tais
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afirmaes valem para todos os nveis educacionais: educao infantil, ensino fundamental,
ensino mdio e educao superior. Segundo Boaventura de Souza Santos,
a universidade no sculo XXI ser certamente menos hegemnica, mas nomenos necessria que o foi em sculos anteriores. A sua especificidade enquanto
bem pblico reside em ser ela a instituio que liga o presente ao mdio e longoprazo pelos conhecimentos e pela formao que produz e pelo espao pblicoprivilegiado de discusso aberta e crtica que constitui (2004, p. 114).
De acordo com Jos Dias Sobrinho, em alguns sentidos, o futuro da humanidade
ser o que da educao superior vier a ser feito. E reciprocamente. Mais do que nunca os
destinos do homem sobre a terra se vinculam aos conhecimentos e s tcnicas. (DIAS,
2005, p. 226). Assim, no obstante as recentes transformaes sociais, polticas e
econmicas ocorridas em escala global, a educao superior continua neste incio de sculo
XXI - e muito provavelmente ainda continuar por muito tempo - desempenhando papel
fundamental no desenvolvimento das sociedades e dos pases. Porm, para que a educao
superior possa continuar contribuindo com o desenvolvimento social e econmico dos
pases fazem-se necessrias a avaliao e a garantia da qualidade em nvel de instituio e
de SES, ou seja, a qualidade requisito bsico para que a educao superior possa cumprirsua misso neste incio de sculo XXI.
Segundo Maria J. Lemaitre (2001), o desafio que se enfrenta em relao qualidade
precisamente a redefinio dos seus modelos. Para tanto, faz-se necessrio identificar os
elementos que so essenciais em termos da educao superior. Temas como a condio
atual da educao superior, os limites e alcance de seu papel na sociedade moderna, as
caractersticas da investigao, a necessidade de desenvolvimento acadmico e as
demandas dos diversos stakeholders externos precisam ser colocados na agenda depesquisa e da anlise acadmica e poltica. De acordo com a autora, especialmente no caso
dos pases em desenvolvimento, essa uma tarefa urgente.
O documento da Unesco "Os quatro pilares da educao", ao rejeitar uma viso
meramente instrumental e produtivista para a educao, afirma que a educao do homem
dever ser organizada em torno de quatro aprendizagens fundamentais: aprender a
aprender, aprender a fazer, aprender a conviver juntos e aprender a ser. Segundo Jorge
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Werthein (2005), esses quatro pilares devem estar presentes na poltica de melhoria da
qualidade de educao, pois eles abrangem o ser em sua totalidade, do cognitivo ao tico,
do esttico ao tcnico, do imediato ao transcendente. A viso de totalidade da pessoa
integra a moderna concepo de qualidade em educao. No obstante a existncia de
algumas variaes de vises acerca do assunto, um dos grandes desafios da educao
superior neste incio de sculo , sem dvida, a garantia e melhoria da qualidade dos
sistemas de educao.
O debate sobre a qualidade da educao superior no Brasil ganhou maior
visibilidade a partir de 1995, quando foi criado um sistema de avaliao que gerava ranking
(Provo) e aumentava a competio entre as instituies e cursos do Sesb. Alm disso, apartir da segunda metade da dcada de 1990 a educao superior brasileira comeou a
experimentar um crescimento significativo de instituies privadas com fins lucrativos. O
Banco Mundial apoiou essas iniciativas argumentando que as instituies privadas possuem
capacidade de assegurar um rpido aumento das taxas de atendimento (matrculas) e que a
competio entre as instituies melhora a qualidade e traz benefcios sociedade a um
custo pblico baixo.
Entretanto, tais justificativas so fortemente questionadas por diversospesquisadores e parcela significativa da comunidade acadmica; so questionamentos que
possuem sentido visto que a rede privada no Brasil possui, historicamente, o corpo docente
com menor titulao e a menor produo cientfica, bem como apresenta restries para
desenvolver aes sociais ou comunitrias, visto que depende de financiamento privado
para obter sustentabilidade. Segundo o recente informe publicado pela Unesco Hacia las
sociedades del conocimiento:
Devido diminuio das subvenes pblicas, as instituies de educaosuperior tm que recorrer ao setor privado para ampliar suas margens demanobra. Os riscos de uma mercantilizaodos servios da educao superiorso reais. Ainda que no haja em todos os pases uma situao idntica nessesaspecto. Os Estados que possuem uma larga tradio universitria no se vemto ameaados por esta diversificao da oferta da educao superior. O casomais preocupante o dos pases carentes dessa tradio, j que neles a aparioda sociedade do conhecimento pode vir junto com a emergncia de autnticosmercados da educao superior. Isto tem levado alguns comentaristas aqualificar esse processo de macdonaldizao do conhecimento. necessrio
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cuidar para que essas tendncias no terminem por desvirtuar a missoprimognita da educao superior.Ainda que no exista um modelo nico de organizao, importante garantir
que os sistemas de educao superior emergentes possuam um nvel dequalidade e pertinncia e um grau de cooperao internacional suficientes, a fimde que possam desempenhar plenamente seu papel de pilares na edificao dassociedades do conhecimento (UNESCO, 2005, p. 95).
Portanto, a expanso privada, as polticas de mercantilizao e a emergncia de
competio de mercados so fatores crticos para o desenvolvimento e evoluo da
qualidade da educao superior em pases em desenvolvimento como o Brasil. Enfim,
como a qualidade requisito bsico para a educao superior cumprir sua misso e a
educao superior essencial para o desenvolvimento social e econmico, especialmenteno caso brasileiro, estudar os impactos da mercantilizao na qualidade da educao
superior tornou-se fundamental tanto do ponto de vista acadmico, como do poltico e
estratgico para o pas.
Alm disso, diversos e reconhecidos autores tm alertado para a necessidade de se
desenvolverem pesquisas acerca dos impactos resultantes da expanso de instituies
privadas, ampliao do financiamento privado e surgimento de quase-mercados e mercados
competitivos no mbito da educao superior. Na obra Markets in higher education:
rhetoric or reality? os organizadores observam que
talvez o que seja mais necessrio [no momento atual] so estudosconceitualmente claros e rigorosamente empricos do impacto da eficinciaalocativa sobre diferentes polticas de educao superior, nacionais einternacionais. Estudos desse tipo enfrentariam srios problemas de mensuraona tentativa de avaliar corretamente os resultados e os benefcios sociais daeducao de nvel superior. Mas, dada a crescente influncia da freqncia aoscursos universitrios na vida de nossos cidados e o rpido aumento do custo
social dos sistemas de educao superior de massa, esses estudos so muitonecessrios (TEIXEIRA et al., 2004, p. 349).
Os autores Sandra Souza e Romualdo Oliveira alertam que estudos que visem
identificar os impactos j produzidos pelas avaliaes nos sistemas e instituies de ensino,
no Brasil, so ainda escassos, portanto fazem-se necessrias investigaes que busquem
apreciar como vem sendo assimilada, por gestores e clientes dos sistemas educacionais,
a lgica do mercado. (2003, p. 879). Um dos mais conhecidos pesquisadores sobre
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qualidade em educao, Lee Harvey, no artigo The end of quality?, publicado na revista
cientfica Quality in Higher Education, tambm aborda a carncia de definies e de
estudos sobre o mercado na educao superior (HARVEY, 2002). Portanto, investigaes
acerca do fenmeno da mercantilizao da educao superior e da qualidade em educao
superior so plenamente justificveis visto que informaes e dados sobre o
desenvolvimento e a evoluo da qualidade em ES em tempos de mercantilizao so raros
e, at o momento, inconclusos, tanto em nvel mundial como em termos de Brasil.
Desta forma, a partir de estudos e pesquisas sobre as recentes transformaes da
educao superior, sobre a sua mercantilizao e dos sistemas de avaliao de SES, o
presente trabalho prope-se a investigar a hiptese de que em tempos de mercantilizaono ocorreram avanos significativos no desenvolvimento da qualidade do sistema de
educao superior brasileiro no perodo 1994-2003. Por conseguinte, tambm se busca
investigar a extenso da validade da argumentao de alguns governos e organismos
multilaterais financeiros de que mecanismos e competio de mercado provocam eficincia
e eficcia, melhores resultados sociais e desenvolvem a eqidade na educao superior.
Definies tericas
A anlise das recentes transformaes que a educao superior vem sofrendo para e
de acordo com a lgica do mercado precisa ser contextualizada segundo uma perspectiva
histrica e das polticas que lhes do origem. Tais polticas, por sua vez, para serem
compreendidas necessitam de uma abordagem acerca das mudanas globais em curso.
Do ponto de vista da anlise histrica, as noes de educao superior como bem
pblico ou servio comercial so importantes para a compreenso do momento atual. Ainda
no sculo XVIII, Adam Smith talvez tenha sido o primeiro a abordar a questo da natureza
pblica ou privada da educao superior. De forma contraditria, o autor, ao mesmo tempo
em que enfatiza a competitividade entre homens, organizaes e instituies de toda
natureza, inclusive as educacionais, como princpio fundamental do progresso, tambm
alerta para a necessidade da ateno do poder pblico ao afirmar que, se no houvesse
instituies pblicas destinadas educao, s seria ensinado as coisas teis no curto prazo.
Assim, Adam Smith defendeu a idia de que o ensino deveria ser pago, ainda que a baixo
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custo, pela famlia e o mestre deveria receber apenas em parte do poder pblico para no
negligenciar sua atividade.
De maneira geral, nos sculo XIX e XX o estatuto da educao superior como bem
pblico ou privado no esteve em questo visto que a poltica de financiamento baseava-se
no modelo europeu, que incumbia de tal tarefa, sobretudo, o Estado. Somente em meados
da dcada de 1980 o debate sobre a natureza de bem pblico ou servio comercial da
educao superior adquiriu proeminncia. No ano de 1986, no documento Financing
education in developing countries an exploration of policy options, o Banco Mundial
defendeu a tese de que os investimentos em educao bsica propiciam maiores retornos
sociais e individuais que os investimentos em educao superior.
A partir de ento, progressivamente e em escala mundial, as polticas dos
organismos multilaterais financeiros e governos nacionais passaram a fragilizar as
instituies pblicas, a expandir as redes de instituies privadas e, inclusive, a defender a
liberalizao comercial dos servios educacionais na agenda do Acordo Geral sobre
Comrcio de Servios da Organizao Mundial do Comrcio. Assim, durante a dcada
1990, o debate acerca do estatuto da educao superior como bem pblico ou como servio
comercial passou a ocupar espaos na produo documental dos organismos multilateriasfinanceiros - BM, Banco Interamericano de Desenvolvimento, OMC - e educacionais
Unesco -, bem como nas agendas e discursos governamentais nacionais e multinacionais -
OCDE, Unio Europia, Acordo de Livre Comrcio da Amrica do Norte (SGUISSARDI,
2005).
Em relao s recentes transformaes econmicas em escala global, para melhor se
compreender o fenmeno da mercantilizao da educao superior faz-se necessrio
referenciar a emergncia do neoliberalismo. Segundo Boaventura de Souza Santos (1994;2004), a mercantilizao da educao superior est diretamente relacionada com o processo
extremado pelo credo neoliberal no qual o mercado, ao adquirir pujana indita, extravasa o
econmico e tenta dominar o Estado e a comunidade. Quando o modelo intervencionista de
bem-estar social comeou a entrar em crise (recesso, inflao, baixas taxas de
crescimento), por volta de 1973, os princpios neoliberais contidos no livro O caminho da
servido, de Friedrich von Hayek, e nas idias monetrias de Milton Friedman comearam
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a ganhar fora e alguns governos, principalmente os de direita, implementaram um
conjunto de polticas baseadas nos pressupostos de que:
o Estado tornou-se demasiado caro para ser sustentado e demasiado intrusivo para
ser tolerado;
os mercados sem restries reguladoras geram riqueza e prosperidade em mbitos
local e global;
a riqueza e a prosperidade so condies necessrias (e aparentemente suficientes)
para a democracia e o bem-estar social.
Assim, polticas neoliberais como a reduo dos investimentos pblicos no campo
social, o fim da interveno econmica por parte do Estado, a fragilizao dos sindicatos,
reformas fiscais para reduzir impostos sobre rendas, disciplina oramentria e formao de
uma desigualdade para dinamizar a economia e retomar o crescimento (MACHADO, 2002)
comearam a ser implementadas estrategicamente em alguns pases-chaves. No bojo dessas
orientaes encontravam-se tambm medidas para reformar os sistemas nacionais de
educao, as quais reorientaram os meios e os fins da educao superior em diversos pases.
De acordo com Pablo Gentilli (1996), na viso neoliberal a educao estava passando por
uma crise que se explica, em grande medida, pela ineficincia do Estado para gerenciar aspolticas pblicas. Na perspectiva neoliberal, a educao superior funciona mal e no tem
eficincia produtiva, quando profundamente estatizada. A ausncia de um verdadeiro
mercado educacional permitiria compreender a falta de qualidade das instituies escolares.
Abordagem metodolgica
Na obra Manual de investigao em cincias sociais, Raymond Quivy e Luc Van
Campenhoudt (1998) observam que o fato cientfico conquistado sobre os preconceitos,
construdo pela razo e verificado nos fatos. Tais princpios so apresentados pelos autorescomo sete etapas que devem ser percorridas em trs atos de uma pea de teatro: a ruptura
com preconceitos e falsas evidncias, a construo de um sistema conceitual organizado
e susceptvel de exprimir a lgica suposta na base do fenmeno e a verificao dos fatos.
Os trs atos no so independentes, constituem-se mutuamente e so realizados ao longo de
uma sucesso de operaes agrupadas em sete etapas em permanente interao:
- Etapa 1: a pergunta de partida;
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- Etapa 2: a explorao: leituras; as entrevistas exploratrias;
- Etapa 3: a problemtica;
- Etapa 4: a construo do modelo de anlise;
- Etapa 5: a observao;
- Etapa 6: a anlise das informaes;
- Etapa 7: as concluses.
Por meio da pergunta de partida o pesquisador deve exprimir o mais exatamente
possvel o que procura saber, elucidar e compreender melhor. Uma boa pergunta deve
possuir as qualidades de clareza, exeqibilidade e pertinncia. A pergunta definida como de
partida para esta tese de doutorado Como se desenvolveu a qualidade do sistema deeducao superior brasileiro em tempos de mercantilizao da educao superior?, ou seja,
o que se procura elucidar e compreender melhor o desenvolvimento da qualidade do Sesb
em tempos de polticas de mercado no mbito da educao superior e, por conseguinte,
contribuir na importante e fundamental investigao acerca dos impactos da
mercantilizao da educao superior.
Para Raymond Quivy e Luc Van Campenhoudt (1998), a etapa de explorao
comporta operaes de leitura, entrevistas ou outros mtodos de explorao
complementares e tem como objetivo principal assegurar a qualidade da problematizao.
As leituras e estudos desenvolvidos com vistas elaborao da problemtica desta tese
esto relacionados, fundamentalmente, com a misso da educao superior e o fenmeno da
mercantilizao da educao superior em nvel mundial e no caso brasileiro. A
problemtica, por sua vez, a abordagem ou a perspectiva terica que se adota para tratar o
problema formulado pela pergunta de partida. Construir a problemtica equivale a formular
os principais pontos de referncia terica da investigao: a pergunta que estruturar
finalmente o trabalho, os conceitos fundamentais e as idias gerais que inspiraro a anlise.
A concepo da problemtica apresenta dois momentos possveis: (i) fazer o balano e
elucidar as problemticas possveis; (ii) atribuir-se uma problemtica.
O trabalho exploratrio gera perspectivas e idias que precisam ser traduzidas numa
linguagem e formas que permitam o trabalho sistemtico de anlise e recolha de dados de
observao ou experimentao, pois pela construo de um modelo de anlise que se
torna possvel o desenvolvimento do trabalho de elucidao sobre um campo de anlise
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restrito e preciso. Com vistas verificao da hiptese desta tese de doutorado de que a
qualidade do Sesb no se desenvolveu em tempos de mercantilizao da educao superior,
inicialmente se define uma concepo de qualidade em educao superior e de avaliao e
medio do desenvolvimento da qualidade de Sesb no perodo 1994-2003. Posteriormente,
constri-se um modelo de qualidade para, finalmente, avaliar e medir o desenvolvimento da
qualidade do Sesb. Estas duas ltimas atividades possibilitam a implementao das etapas
de observao, a anlise das informaes e, por fim, as concluses.
A etapa de observao deste estudo operacionaliza-se pela coleta de dados da base
de dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira,
principalmente dos dados do Censo da Educao Superior, das informaes do Provo,abrangendo tambm documentos oficiais, tcnicos e estatsticos, tais como informaes da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatstica; informaes e dados disponibilizados pela Coordenao de Aperfeioamento de
Pessoal de Nvel Superior, Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e
Tecnolgico e Ministrio de Cincia e Tecnologia. A maior parte dos dados e informaes
refere-se ao perodo compreendido entre 1994 e 2003. Os levantamentos so
predominantemente censitrios combinados com algumas amostragens, conforme a
disponibilidade dos dados, e estruturados de acordo com o modelo de qualidade construdo
na etapa de construo do modelo de anlise. Assim, orientando-se por Raymond Quivy e
Luc Van Campenhoudt (1998), este estudo se caracteriza como uma pesquisa aplicada,
Expost-facto, e a sua operacionalizao tem enfoque predominantemente quantitativo, com
delineamento emprico-analtico, baseado em anlise de documentos e estudo de base de
dados.
Estrutura do texto
Este estudo est dividido em quatro captulos. O primeiro recupera toda a trajetria
da universidade desde o seu surgimento na Europa medieval, passando pela primeira
grande crise universitria ocorrida durante o mercantilismo, a consolidao dos modelos de
universidades modernas e chegando at as grandes transformaes da educao superior
ocorridas no sculo XX, tais como a massificao durante a fase do welfare state e a
emergncia das crises de hegemonia, legitimidade e institucional. Na concluso do primeiro
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captulo so abordadas questes relativas misso da educao superior no sculo XXI e as
posies da Unesco e do BM acerca do assunto.
O segundo captulo est dividido em trs partes: uma introduo ao estudo da
economia e dos mercados, as origens e as caractersticas do fenmeno da mercantilizao
da educao superior e a ocorrncia de tal fenmeno no Brasil. Durante a apresentao do
estudo sobre economia e mercado so trabalhadas as teorias econmicas, as diferentes
vises de mercado, as experincias de mercados livres j ocorridas e os conceitos bsicos
relacionados aos mercados. No texto sobre as origens e caractersticas da mercantilizao
da educao superior abordada a viso da educao como servio comercial desde Adam
Smith at os documentos do Banco Mundial; tambm so apresentados os principaisfenmenos relacionados com a mercantilizao da educao superior e relatam-se os mais
recentes estudos sobre os mercados em educao superior, seus quase-mercados e suas
falhas. Por fim, dentro do captulo dois realizada uma reviso acerca do fenmeno da
mercantilizao da educao superior brasileira. Nesse sentido so abordados dois
principais fenmenos: o surgimento da avaliao do Provo; que gerou ranking e
competio de mercado e a grande expanso de instituies privadas.
No terceiro captulo apresentado um detalhado estudo sobre qualidade emeducao superior. Inicialmente, so abordadas as propostas de taxionomias para qualidade
em ES surgidas durante a dcada de 1990 e os mais recentes termos utilizados para
designar qualidade em ES e apresenta-se uma sntese acerca das concepes de qualidade
em ES. Logo aps, o tema da qualidade em ES trabalhado no contexto de sistema
nacional de educao superior. As caractersticas de um SES e uma viso de avaliao e
medio de um SES so apresentadas. No final do terceiro captulo so abordados os mais
conhecidos sistemas de indicadores para sistemas de educao da atualidade: OCDE e
European Centre for Higher Education da Unesco. Tambm so abordados os indicadores
de qualidade existentes para SES e as estruturas de avaliaes e medies utilizadas por
organismos internacionais para avaliar e medir sistemas de educao.
Por fim, no quarto captulo implementada a avaliao do desenvolvimento da
qualidade do Sesb no perodo 1994-2004. Para tanto, no incio do captulo realizado um
estudo sobre as instituies e rgos da educao superior brasileira configurando o Sesb e
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elaborada uma proposta de sistema de indicadores para a qualidade do Sesb baseando-se
nas experincias internacionais e na realidade brasileira. Finalmente, com base no sistema
de indicadores proposto e considerando os dados disponveis da educao superior do
perodo 1994-2003, realizado um levantamento do desenvolvimento dos indicadores para
o Sesb e apresentada uma anlise geral acerca do desenvolvimento da qualidade do sistema.
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1 A Histria e a Misso da Educao Superior
No so as espcies mais fortes nem as mais inteligentes, as que sobrevivem,so as que melhor se adaptam as mudanas.
Charles Darwin.
Educao a chave da liberdade.
Simon Bolvar.
O surgimento da educao superior e, mais especificamente, da instituio
universidade remonta ao incio do segundo milnio no continente europeu. As
universidades surgiram sob a tutela e a servio da Igreja, gozavam de autonomia perante os
poderes locais, ofereciam ensino gratuito e eram subsidiadas pela prpria Igreja. A
universidade medieval atendia os filhos dos nobres e dedicava-se especialmente ao ensino
da cultura geral da poca, ou seja, teologia, filosofia e artes (ORTEGA Y GASSET,
1999).
Ao longo de sua histria de quase mil anos, as universidades passaram por grandes e
profundas transformaes. Pode-se dizer que foram reinventadas algumas vezes, tanto por
meio de processos radicais como por lentos processos evolutivos (MORHY, 2003). As
significativas transformaes sociais, culturais, polticas e econmicas que o mundo sofreu
nos ltimos nove sculos, tais como a Renascena e a consolidao dos Estados nacionais,
impactaram e geraram crises no seio das instituies. No entanto, a universidade
demonstrou uma grande capacidade de adaptao e, medida que a sociedade e o Estado se
transformavam, ela tambm adquiria novas formas e novas funes (ROSSATO, 1998).
Neste incio do sculo XXI, quando o mundo sofre novamente profundas transformaessocioculturais e econmicas, a diversidade de modelos de universidade e de instituies
muito grande. As IES multiplicaram-se e expandiram-se gerando novas formas de
organizaes acadmicas e administrativas, que, independentemente da natureza
institucional, podem apresentar diferentes e, por vezes, divergentes misses.
Neste captulo, inicialmente, so relembradas as transformaes ocorridas na
universidade tendo como referncia temporal as polticas econmicas vigentes na Europa
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ocidental nos ltimos nove sculos; posteriormente so abordadas as grandes questes da
sociedade contempornea que esto inter-relacionadas com o papel e a misso da educao
superior, principalmente as relativas ao Estado e ao mercado; por fim, desenvolve-se uma
anlise acerca da misso da educao superior considerando-se as transformaes e
reformas presentes nas sociedades no incio do terceiro milnio.
1.1 A Trajetria da Universidade: do Feudalismo ao Neoliberalismo
A universidade sofreu muitas transformaes e crises desde o surgimento das
instituies durante o feudalismo, quando a Igreja detinha grande poder poltico. Desde
aquela poca at o incio do sculo XIX, as principais polticas econmicas que vigoraram
na Europa ocidental foram o prprio feudalismo, o mercantilismo, o liberalismo, o
keynesianismo e o recente fenmeno denominado neoliberalismo. Nesse perodo, a
universidade passou por modificaes e crises que estiveram intimamente ligadas s
transformaes sociais, culturais, polticas e, tambm, s mudanas das polticas
econmicas, nas quais a Igreja, o Estado e o mercado alternaram diferenciados nveis de
influncia sobre a sociedade e as instituies educacionais. A seguir, so relembradas as
transformaes ocorridas na universidade tendo como referncia temporal as polticas
econmicas vigentes na Europa ocidental nos ltimos nove sculos.
1.1.1 O surgimento da universidade durante o feudalismo
O surgimento da instituio universidade ocorreu no continente europeu durante a
Idade Mdia. Pode-se considerar que existiram instituies precursoras e de grande
importncia, como a Academia de Plato, por volta dos anos 380 a.C., na Grcia, e as
escolas cornicas (islmicas) criadas, durante o apogeu do mundo rabe, em locais como
El-Ahzar, Damasco e Crdoba. Entretanto, atualmente existe quase consenso de que as
primeiras instituies que atingiram plenamente o estatuto de universidade foram
constitudas em Bolonha, durante o sculo XI, e em Paris, no transcorrer do sculo XII
(ROSSATO, 1998). A Universidade de Bolonha nasceu como comunidade de estudantes
que contratava a cada ano os professores para ensinar o que se considerava a formao
bsica; os estudantes governavam a instituio e o reitor era um estudante; e entre os
discentes de destaque de Bolonha figuram Dante Alighieri e Petrarca. A Universidade de
Paris, ao contrrio, surgiu como comunidade de professores, com a mesma funo de
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Bolonha, porm sendo governada pelos docentes e tendo como reitor um professor; e entre
os mais importantes docentes de Paris esto Abelardo e Santo Toms de Aquino. As
instituies de Bolonha e de Paris transformaram-se em modelos de universidade para as
novas instituies que surgiram na Europa medieval. Para ser considerada uma
universidade plenamente constituda eram necessrias quatro faculdades: Teologia, Direito,
Medicina e Artes (TOBO; PREZ, 2005).
O sistema socioeconmico que predominava na Europa durante o surgimento da
universidade era o feudalismo. A sociedade era composta por trs grupos sociais: os
clrigos, os senhores feudais e os servos. Os senhores feudais tinham como principal
funo guerrear; os servos, por sua vez, eram explorados, obrigados a prestar servios e apagar diversos tributos. O modo de produo era tpico de sociedades agrrias, com escassa
circulao monetria, de subsistncia, pouca atividade comercial e de relaes de servido
do trabalhador ao proprietrio da terra. A propriedade feudal pertencia a uma camada
privilegiada, composta pelos senhores feudais e por altos dignitrios da Igreja - o clero. A
idia de separao entre religio e poltica era desconhecida, portanto os clrigos e a Igreja,
alm da funo religiosa, exerciam grande poder poltico (HUNT; SHERMAN, 1977;
WIKIPDIA, 2005).
Portanto, as primeiras universidades surgiram sob a tutela da Igreja, gozavam de
autonomia perante os poderes locais e possuam caractersticas de grande unidade e
homogeneidade; atendiam principalmente aos filhos dos nobres e estavam, notadamente, a
servio da Igreja Catlica (ROSSATO, 1998). No obstante serem subsidiadas pela Igreja
e, num segundo momento, pelas cidades e reinados, eram instituies formalmente privadas
e autnomas. Dessa forma, ofereciam ensino gratuito, ainda que a cobrana de taxas por
parte dos mestres junto aos aprendizes fosse permitida (TOBO; PREZ, 2005). A
universidade medieval no fazia pesquisa nem se dedicava especialmente preparao
profissional; sua abordagem era principalmente voltada para a cultura geral da poca, ou
seja, teologia, filosofia e artes (ORTEGA Y GASSET, 1999).
1.1.2 A primeira grande crise da universidade durante o mercantilismo
No transcorrer do sculo XIV surgiu um movimento cultural, inicialmente na Itlia,
chamado de Renascena, considerado marcante em relao ao fim da Idade Mdia e incio
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da Idade Moderna. A Renascena estava associada ao humanismo, ao interesse dos
acadmicos pelos textos clssicos gregos e de desprezo Idade Mdia e ao feudalismo. A
partir de ento, a vida cultural deixou de ser controlada pela Igreja Catlica e passou a ser
influenciada por estudiosos da Antiguidade greco-romana chamados de humanistas. A
partir da crise do feudalismo emergiu o sistema de governo absolutista, no qual o poder
centralizado na figura do rei. Foi nesse momento que a burocracia foi criada, que ocorreu a
padronizao monetria e fiscal e que as fronteiras das naes europias comearam a ser
estabelecidas. A economia tambm era controlada pelo rei atravs do mercantilismo, que
foi o pensamento econmico predominante na Europa entre o sculo XV e o fim do sculo
XVIII. A economia mercantilista era fortemente regulamentada, pois a riqueza de umamonarquia residia na acumulao de metais preciosos (ouro e prata); a colonizao de
novos territrios era promovida e as exportaes, ao contrrio das importaes, eram
incentivadas (HUNT; SHERMAN, 1977; WIKIPDIA, 2005).
No sculo XVI ocorreu a chamada Reforma Protestante, que na tentativa de
moralizar e reformar a Igreja Catlica, gerou as guerras de religio, as quais se
espalharam pela Europa e, por fim, estabeleceram vrias novas Igrejas crists. Como
resultado desse conjunto de movimentos culturais e transformaes socioeconmicas
(Renascena, Reforma Protestante, Absolutismo etc.) ocorrem uma sensvel diminuio do
poder da Igreja Catlica sobre a regulao e legitimao da universidade; por conseguinte,
observa-se tambm a ampliao da influncia dos soberanos, dos prncipes e das comunas,
ou seja o Estado da poca, sobre as instituies.
Assim, a universidade em tempos de mercantilismo e absolutismo, ao mesmo tempo
em que encaminhou a sua laicizao, pela autonomia que obteve em relao Igreja,
tambm passou a viver uma profunda crise, a ponto de as instituies serem desprezadas e
vistas como decadentes. A libertao de Roma acarretou perda da autonomia da
universidade, visto que reis e prncipes reforaram a autoridade sobre ela. Os professores,
que at ento viviam dos benefcios eclesisticos, de doaes e dos direitos cobrados sobre
os exames, passaram a ser controlados pelas autoridades locais. Ao rejeitar o humanismo,
que veio no bojo da Renascena, a maior parte das universidades, que continuavam
conservadoras e fechadas como no perodo feudal, ainda separadas da investigao,
comearam a sofrer um grande desgaste. Por conseguinte, tal cenrio permitiu aos colgios
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ganharem importncia e disputarem o mesmo perfil do estudante universitrio: jovens de
famlia nobre ou rica denominada elite.
No sculo XVIII muitas instituies tinham professores desocupados, que
ensinavam um currculo medieval desprezado pelos intelectuais herdeiros do renascimento
e do humanismo. Algumas universidades recorriam, inclusive, comercializao e venda
de diplomas para garantir a sobrevivncia institucional (ROSSATO, 1998). Assim, durante
e Idade Moderna a universidade, envolta numa crise de legitimidade, passou pela extino
de muitas instituies, deixando inclusive de existir em alguns pases e reformulando-se
noutros locais para se adaptar s mudanas em curso. Seria razovel, portanto, admitir que
a Idade Moderna representou um momento de transio no apenas para a sociedade e aeconomia, mas tambm para a instituio universidade, que, em crise, deixou de ter na
Igreja feudal sua principal razo de ser e comeou a voltar-se para o Estado, abrindo
espaos para novos padres institucionais.
1.1.3 A consolidao da universidade moderna durante o liberalismo
No final do sculo XVIII ocorreram profundas mudanas sociais, polticas e
econmicas, as quais convergiram para o surgimento da chamada Modernidade, que
supe o estabelecimento de uma srie de princpios de organizao da realidade cuja
influncia chega aos dias atuais (TOBO; PREZ, 2005). O movimento intelectual
conhecido por iluminismo, de certo modo herdeiro do renascimento e do humanismo, ao
enfatizar a razo e a cincia para explicar o universo e defender a valorizao do homem,
impulsionou o desenvolvimento do capitalismo e da sociedade moderna. A Revoluo
Francesa, considerada o evento que marca o incio da Idade Contempornea, extinguiu a
servido e os direitos feudais na Frana, proclamou os direitos universais de Liberdade,
Igualdade e Fraternidade, divulgou a primeira Declarao dos Direitos do Homem e doCidado e, ao extinguir a Monarquia, em 1792, realizou a proclamao da Repblica.
A Revoluo Industrial, marcada pela passagem da energia humana para motriz, foi
o ponto culminante de uma evoluo tecnolgica, social e econmica que vinha se
engendrando h tempos na Europa. Inicialmente, com particular incidncia nas naes onde
a reforma Protestante tinha destronado a Igreja Catlica, a Revoluo Industrial alterou
profundamente as condies de vida do trabalhador, provocou um intenso deslocamento da
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populao rural para as cidades e alterou os padres de consumo conforme novas
mercadorias foram sendo produzidas. No entanto, pode-se dizer que a Revoluo Industrial
tambm iniciou um processo ininterrupto de produo coletiva em massa, gerao de lucro
e acmulo de capital. Nesse momento surgiu ainda o liberalismo clssico, um movimento
intelectual que se desenvolveu em fins do sculo XVIII e incio do sculo XIX e apoiou o
laissez-faire(deixe fazer) internamente como uma forma de reduzir o papel do Estado nos
assuntos econmicos e o mercado livre no exterior como um modo de unir as naes do
mundo.
O liberalismo clssico enfatiza a liberdade como objetivo ltimo e o indivduo como
a entidade principal da sociedade. Por conseguinte, apareceram s primeiras teoriaseconmicas modernas: a Economia Poltica, com a sua correspondente ideolgica, o
Liberalismo. Na Inglaterra, Adam Smith, defensor do laissez-fair, publicou o livro Uma
investigao sobre a natureza e causas da riqueza das naes (1776), que se tornaria um
manifesto contra o mercantilismo (que pregava um forte controle do Estado sobre a
economia) e termina por tornar-se uma obra de referncia para geraes de economistas. O
liberalismo econmico e o laissez-fairetransformaram-se no sistema econmico dominante
no incio da Idade Contempornea, principalmente, nos Estados Unidos e nas naes mais
desenvolvidas da Europa no perodo compreendido entre o incio do sculo XIX e o incio
do sculo XX (HUNT; SHERMAN, 1977; WIKIPDIA, 2005).
Nesse contexto de transformaes e de novas estruturas socioeconmicas, no
mesmo momento em que se estabelecia a primazia dos Estados-nao, a vanguarda da
cultura da Modernidade e o incio da hegemonia econmica do capitalismo, tambm
comearam a surgir novos modelos de instituies que constituram a universidade
moderna. Segundo Hlgio Trindade (1999, p. 15), o contexto societrio que engendra a
universidade moderna se faz sob forte impulso das cincias, do iluminismo e do
enciclopedismo, e as instituies, em que pese no seguirem um modelo nico, caminham
em direo de estatizao e nacionalizao, iniciando o que pode ser chamado de papel
social das universidades. Em quase toda a Europa, com o objetivo de libertar as
universidades para coloc-las a servio do Estado liberal e de suas necessidades
econmicas, os novos Estados nacionais passam a se apropriar das instituies que ainda
eram formalmente entidades privadas. O principal objetivo na universidade passou a ser
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no mais formar bons cristos, como no perodo feudal, mas formar bons cidados, capazes
de cumprir as funes que o Estado e a sociedade passam a exigir. Dessa forma, no incio
do sculo XIX a universidade renasceu segundo trs modelos diferentes para se adaptar s
novas necessidades econmicas e culturais da modernidade e da industrializao (TOBO;
PREZ, 2005). Tais modelos, dos quais ainda hoje derivam muitas instituies,
desenvolvidos sob a tutela do Estado, so:
o modelo alemo (Universidade Humboldtiana), inspirado por Von
Humboldt e criado em 1809, que se dedica pesquisa;
o modelo francs (Universidade Napolenica), criado por Napolelo em
1808, que se centra na formao profissional;
o modelo anglo-saxo, que favorece o desenvolvimento das disciplinas que
apiam o processo de industrializao.
O modelo alemo surgiu no bojo das reformas administrativas e econmicas
realizadas aps a guerra prussiana frente Frana, quando parcela de culpa da derrota foi
atribuda ao atraso na educao cientfica. Assim, o modelo tem como pressupostos a
unidade do ensino e da pesquisa, a investigao realizada sem preocupaes utilitaristas e a
idia de formao por meio da investigao cientfica. As universidades alems
converteram-se ento, em centros cientficos que eram controlados pelo Estado funcional e
economicamente, porm com grande liberdade acadmica, ou seja, o professor possua
liberdade na busca do conhecimento ao passo que a instituio carecia de autonomia. As
instituies eram relativamente elitistas e os professores gozavam de emprego vitalcio. O
modelo humboldtiano de instituio de pesquisa foi adotado por parte da Europa e logo
depois se expandiu, especialmente para Rssia e Japo.
O modelo francs foi concebido fundamentalmente como um servio mantido pelo
Estado para, em primeiro lugar, responder s demandas por servidores do prprio Estado e,
em segundo lugar, para promover o desenvolvimento econmico da sociedade, formando as
elites imprescindveis. Nas instituies francesas a autonomia institucional era praticamente
inexistente, visto que os objetivos dos professores de ensino e educao pblica eram bem
definidos pelo Estado. O modelo de universidade napolenica estendeu-se aos pases baixos
e Itlia.
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O terceiro modelo de universidade, o anglo-saxo, tinha duas vertentes, com
algumas distines: a britnica e a americana. No Reino Unido no ocorreu uma
interveno do Estado e as instituies continuaram formalmente sendo de natureza
privada. A universidade britnica no perdeu a autonomia e tinha como objetivo principal
responder s necessidades da Revoluo Industrial. Nos Estados Unidos, a universidade era
criada por iniciativa da comunidade e as instituies tinham como caracterstica uma maior
ateno s demandas sociais e uma organizao empresarial nas estruturas internas.
Os modelos de universidades humboldtiana, napolenica e anglo-saxnica, com
algumas adaptaes conforme as especificidades regionais, continuaram balizando as
instituies no transcorrer dos sculos XIX e XX. Segundo Ricardo Rossato (1998, p. 175),desenvolve-se uma universidade pluralista, heterognica e voltada para a pesquisa,
paralelamente ao desenvolvimento daquilo que se denominou Revoluo Industrial. Para
Boaventura de Souza Santos (1994, p. 183), a universidade moderna propunha-se produzir
um conhecimento superior, elitista, para o ministrar a uma pequena minoria, igualmente
superior e elitista, de jovens, num contexto institucional classista pontificando do alto do
seu isolamento sobre a sociedade. Na secunda metade do sculo XX quase todos os pases
do mundo tinham universidades e novos desafios estavam comeando a surgir como, por
exemplo, a demanda por acesso de outras classes sociais que no a da elite.
1.1.4 A massificao da universidade durante o welfare statekeynesiano
Nos anos que seguiram ao final da II Guerra Mundial, os pases avanados adotaram
polticas keynesianas e socialdemocratas que reforaram o investimento estatal na educao
superior e engendraram o chamado Estado do bem-estar. O momento ficou conhecido
como o perodo de expanso do ps-guerra e, segundo Marilena Chau (1999), a
economia poltica que sustentava o Estado do bem-estar tinha como caractersticasprincipais o fordismo na produo, a incluso crescente dos indivduos no mercado de
trabalho com vistas ao pleno emprego e monoplios e oligoplios que, embora
transnacionais e multinacionais, tinham o Estado nacional como referncia reguladora. O
pensamento dominante da poca que norteou a formao do Estado do bem-estar ou
welfare state keynesiano apoiava-se na idia de que os mercados falham e que o setor
pblico deve atuar para corrigir tais erros. Em decorrncia disso, os governos investiam em
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setores como transporte e equipamentos pblicos para gerar crescimento da produo e do
consumo de massa, bem como buscavam fornecer complemento ao salrio social com
gastos em seguridade social, assistncia mdica, educao, habitao etc. O poder estatal
era exercido inclusive nos acordos salariais e direitos dos trabalhadores na produo
(SOUZA, 1997).
O perodo das polticas de bem-estar social foi marcado por um desenvolvimento
econmico sem precedentes que gerou prosperidade em diversos segmentos da sociedade.
Durante a dcada de 1950, por exemplo, o ensino secundrio ou mdio sofreu uma forte
expanso, resultado do enriquecimento das famlias e de uma demanda crescente da
economia por pessoal mais qualificado, visto que setores tradicionais, como minas decarvo, por exemplo, perdiam espao para novos setores. Por conseguinte, na dcada de
1960 deu-se incio ao processo de massificao da educao superior e de expanso
universitria, por meio, sobretudo, do financiamento com fundos pblicos (TOBO;
PREZ, 2005).
Os governos tambm foram influenciados a ampliar o investimento pblico em
educao por dois outros motivos: (a) a necessidade de responder aos movimentos dos
estudantes universitrios, que teve pice na Frana em 1968, os quais questionavam deforma radicalizada o sistema universitrio elitista; (b) pela divulgao da teoria do capital
humano, que via na formao um meio para incrementar a produtividade dos
trabalhadores e desenvolver o crescimento econmico dos pases. Segundo a Unesco (apud
ROSSATO, 1998), em 1950 havia seis milhes e setecentos mil estudantes na educao
superior em todo o mundo; em 1960, eram aproximadamente onze milhes e duzentos mil
e, em 1970, entre vinte e seis e vinte e sete milhes, ou seja, um crescimento no nmero de
estudantes de aproximadamente 2,4 vezes em apenas vinte anos. Alm da expanso do
ensino secundrio, outros fatores, como a chegada da classe mdia e da mulher
universidade, tambm contriburam com o crescimento e a massificao na educao
superior na dcada de 1960. Enfim, o Estado do bem-estar, que propiciou a ascenso da
classe mdia e a expanso do nvel educacional secundrio, tambm proporcionou as
condies de transformao da universidade de uma instituio de elite para uma instituio
de massa.
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Dessa forma, pode-se dizer que a universidade, que mesmo durante o perodo do
laissez-faireestava muito atrelada ao Estado econmica e administrativamente, teve as suas
estruturas reforadas pelo investimento estatal do welfare state keynesiano. Entretanto,
durante a dcada de 1970 o Estado do bem-estar entrou em crise e uma nova ordem
econmica e social reverteu completamente o quadro de forte investimento pblico em
educao superior e estabeleceu novas funes para as universidades, ligadas
principalmente aos interesses do chamado mercado.
1.1.5 Uma nova grande crise da universidade na emergncia do neoliberalismo
A expanso do ps-guerra e as polticas do Estado do bem-estar comearam a
perder mpeto no incio da dcada de 1970. Nesse perodo, as taxas de crescimento da
economia caram pela metade, o desemprego comeou a subir e surgiram as presses sobre
as finanas pblicas. Segundo Marilena Chau (1999, p. 212), na primeira metade da
dcada de 1970 o capitalismo conheceu, pela primeira vez, um tipo de situao
imprevisvel, isto , baixas taxas de crescimento econmico e altas taxas de inflao
(estagflao). Para Manoel Tibrio Alves de Souza,
a profunda recesso de 1973, exacerbada pelo choque do Petrleo, retirou omundo capitalista do sufocante torpor da estagflaoe ps em movimento umconjunto de processo que solapou o compromisso fordista. Em conseqncia, asdcadas de 70 e 80 apresentam-se como um conturbado perodo dereestruturao econmica e reajustamento social e poltico, configurando umnovo modelo de acumulao de carter mais flexvel (1997, p. 3).
Nesse contexto, no mesmo momento em que as polticas keynesianas comeavam a
sofrer fortes crticas, as idias monetaristas de Milton Friedman e os princpios poltico-
ideolgicos de Friederich von Hayek, da escola econmica neoclssica, comearam a
ganhar fora. Tais autores propugnam, entre outras coisas, que o mercado um agente
econmico perfeito, imune crise; que as crises econmicas se devem a um desequilbrio
entre oferta e procura que rapidamente sanado pelo mercado; que toda forma de
interveno estatal, excetuando-se os casos de defesa da liberdade e da segurana um
desequilbrio e que o gasto pblico na rea social, especialmente na previdenciria, fonte
de dficitpblico, da criao de indivduos moralmente fracos, pouco afeitos ao trabalho, e
de ser uma injusta fonte de distribuio de renda (apud ALVES, 2004). Dessa forma, com a
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ascenso dos governos conservadores de Thatcher na Inglaterra, em 1979, e de Reagan nos
Estados Unidos da Amrica, em 1980, estabeleceram-se as condies polticas e
ideolgicas para o abandono do iderio keynesiano e a ascenso das polticas neoliberais, as
quais estabelecem uma receita que inclui a reduo do tamanho do Estado, privatizaes,
monetarismo, reduo de impostos e de benefcios sociais (TOBO; PREZ, 2005) e, por
conseguinte, a reduo do compromisso pblico do Estado com as universidades e a
educao em geral.
Segundo Boaventura de Souza Santos (1994), no final do sculo XX a universidade
defrontava-se com trs crises: a crise de hegemonia, originada pela contradio entre a alta
cultura e a produo de padres culturais mdios e de conhecimentos instrumentais; a crisede legitimidade, provocada pela contradio entre a hierarquizao dos saberes
especializados atravs das restries de acesso e as exigncias sociais e polticas da
democratizao da universidade; e, finalmente, a crise institucional, resultante da
contradio entre a reinveno da autonomia na definio dos valores e objetivos da
universidade e a presso crescente para submeter as instituies a critrios de eficcia e de
produtividade de natureza empresarial ou de responsabilidade social. Entretanto, dez anos
mais tarde, Boaventura de Souza Santos (2004), afirmaria que a crise institucional, o elo
mais fraco da universidade porque a autonomia cientfica e pedaggica assenta-se na
dependncia econ