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O TRABALHO NA AVIAO E AS PRTICAS DE SADE SOB
O OLHAR DO CONTROLADOR DE TRFEGO AREO
R I T A D E C S S I A S E I X A S S AM P A I O A R A UJ O
Dissertao de Mestrado apresentada
ao Departamento de Sade Ambiental da
Faculdade de Sade Pblica da Universidade de So Paulo
para obteno do ttulo de Mestre
rea de Concentrao: Sade do Trabalhador
Orientador:Prof. Dr. Ren Mendes
SO PAULO
2000
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Dedico este trabalho ao Flavio, e a todos os seres, desde a primeira forma de vida que surgiu,
que me possibilitaram nascer, viver e ser.
Aos nossos filhos, humanidade futura, razo e objetivo de nossas vidas...
A todos que sonham e trabalham por um mundo melhor.
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AGRADECIMENTOS
A realizao deste estudo no teria sido possvel sem o apoio e sem as valiosas
contribuies de muitos profissionais de vrias instituies, colegas e amigos, aos
quais expresso meus profundos agradecimentos.
Em particular, os agradecimentos vo aos trabalhadores que lutam com esperanas
por seus sonhos...
Aos amigos que ao longo destes quatro anos me incentivaram e apoiaram....
especialmente Rosilda, Laps, Luiza, Jorge, Fernando e Ana, Daniel.
Alice por ter acreditado em mim... ajudando-me a (re)significar a vida...
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Sala de Controle de Trfego Areo da Terminal So Paulo
Aeroporto de Congonhas
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RESUMO
Arajo RCSS. O Trabalho e as Prticas de Sade do Controlador de Trfego Areo. So Paulo; 2000. [Dissertao de Mestrado Faculdade de Sade Pblica da USP].
Os profissionais do controle de trfego areo desenvolvem uma funo de
importncia para a sociedade. Neste sentido, realizou-se estudo com objetivo de
analisar as representaes sociais dos controladores de trfego areo sobre sua sade
e sobre as prticas de sade desenvolvidas pelo Sistema de Sade da Aeronutica,
tendo em vista uma possvel contribuio para a adoo de prticas de promoo e
proteo da sade e segurana da aviao. Desenvolveu-se um estudo qualitativo,
utilizando-se a tcnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), por meio de
entrevistas semi-estruturadas, com 12 participantes do Controle de Aproximao da
rea Terminal So Paulo. Foi possvel caracterizar, em primeiro lugar, o
funcionamento do Controle Trfego Areo neste Terminal e, em segundo lugar,
conhecer as representaes sociais destes trabalhadores sobre o trabalho no Controle
de Trfego; a experincia com o risco no cotidiano do trabalho; as relaes do
controlador com a hierarquia militar; os rumos possveis para o trabalho no controle
de trfego areo e das prticas de sade destes trabalhadores. Pde-se observar a
existncia de dificuldades em se produzir qualquer alterao de ordem sistmica e
administrativa. O aspecto da tecnologia aparece como relevante e, em muitas
situaes, as falhas no sistema so apontadas como geradoras de risco. No entanto,
tornou-se evidente que o controle de trfego areo muito mais um problema social
e institucional, uma vez que existem interesses diversos dos diferentes atores
envolvidos: trabalhadores, aeronutica, companhias areas e usurios. A
incorporao do saber do trabalhador por meio da metodologia do DSC permitiu o
acesso a uma cultura organizacional, qualitativamente diferente da coletividade
matemtica, e que deve ser conhecida antes de qualquer interveno no campo da
Sade do Trabalhador.
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SUMMARY
Arajo RCSS. O Trabalho e as Prticas de Sade do Controlador de Trfego Areo. [The Work and Health Practices of Air Traffic Controllers] So Paulo(BR); 2000. [Dissertao de Mestrado Faculdade de Sade Pblica da USP].
Air traffic controllers develop a real important activity for society. In this sense, the
present study analyses the air traffic controllers social representations about their
health and the health practices offered by the Aeronautic Health System, aiming at
contributing for the decisions on adoption of practices for promoting and protecting
aviation health and safety. This qualitative study, based on the Collective Subject
Discourses (DSC), was carried out usure semi-structured interviews with 12
participants working at Approximation Control Area of So Paulo Terminal. The
research allowed the characterisation of the work context and of the workers social
representations about the work control, their experiences with daily risk, health
conditions and practices, relationship with the military hierarchy and possible
directions for the air traffic control. The study showed a great difficulty of
implementing any system or administrative changes. Technology is a relevant aspect
pointed as generating risk in many occurrences of system failure. Nevertheless, the
air traffic control seems to be much more a social and institutional problem. There
are several other different interests of the actors involved: workers, aeronautic, air
companies and users. The DSC methodology allowed us to approach an
organisational culture qualitatively different from other quantitative studies, and that
should be known before any intervention in the work health field.
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NDICE
1 INTRODUO ...............................................................................1
1.1 Condies de risco no transporte areo ............................................1
1.2 Contexto do Trfego areo no Brasil........................................................5
1.3 Aspectos da regulamentao do controle de trfego areo ....................9
1.4 Viso sistmica do controle do espao areo no Brasil ..................11
1.5 Caracterizao do Controlador de Trfego Areo .............................13
1.6 O desgaste do Controlador de trfego areo .........................................14
1.7 Condies de risco na organizao do trabalho do controlador de trfego
areo ....................................................................................................16
1.8 Condies de Risco para a Sociedade .........................................17
2 OBJETIVOS DO ESTUDO .....................................................21 3 PRTICAS E RISCOS SADE REFERENCIAIS TERICOS...22
3.1 A Sade do Trabalhador ................................................................22
3.2 Os diversos aspectos do Risco ....................................................26
3.3 As condies de riscos sade dos controladores de vo ................28
3.4 Os agravos sade do controlador de trfego areo ............................30
4 Metodologia .......................................................................................35
4.1 Pesquisa qualitativa: justificativa da escolha ........................................35
4.2 Pesquisa Exploratria ...........................................................................37
4.3 O sujeito social da pesquisa ................................................................38
4.4 Elaborao do instrumento de pesquisa ........................................39
4.5 Local de Coleta de Dados ...............................................................39
4.6 Termo de Consentimento dos Sujeitos ........................................39
4.7 Instrumento de Coleta de Dados ....................................................40
4.8 Tcnica de Anlise de Dados ...............................................................41
4.9 Anlise dos Depoimentos ...............................................................43
5 RESULTADOS E DISCUSSO ...................................................45
6 CONSIDERAES FINAIS .................................................104
7 REFERNCIAS ........................................................................110
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ANEXOS
Anexo 1 - Transcrio de fita sobre as condies de operao no
aeroporto de Congonhas A1
Anexo 2 - Informe sobre realizao do debate na UNESP A2
Anexo 3 - Entrevista concedida ao jornal da USP A3
Anexo 4 - Informe sobre a entrevista ao jornal da USP A4
Anexo 5 - Roteiro de Entrevista A5
Anexo 6 - Termo de Consentimento A6
Anexo 7 Instrumento de anlise de discurso 1 (IAD1) A7
Anexo 8 Instrumento de anlise de discurso 2 (IAD2) A8
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QUADRO DE ACRNIMOS
Com o objetivo de facilitar a compreenso e entendimento do presente estudo, a
seguir, uma listagem com as principais abreviaturas utilizadas na operao do controle de
trfego areo:
ABM - Travs ACC - Centro de Controle de rea ACFT - Aeronave AD - Aerdromo AFIS - Servio de Informao de Vo de Aerdromo AFS - Servio Fixo Aeronutico AGL - Acima do Nvel do Solo AIP - Publicao de Informaes Aeronuticas AIREP - Aeronotificao ALS - Sistema de Luzes de Aproximao APP - Controle de Aproximao ARC - Carta de rea ARP - Aeronotificao (designador de tipo de mensagem) ARR - Chegada ARS - Aeronotificao Especial (designador de tipo de mensagem) ASC - Subindo ou Suba ASR - Radar de Vigilncia de Aeroporto ATC - Controle de Trfego Areo ATIS - Servio Automtico de Informao Terminal ATS - Servio de Trfego Areo ATZ - Zona de Trfego de Aerdromo AWY - Aerovia CCES - Centro de Controle de Emergncia e Segurana CINDACTA - Centro Integrado de Defesa Area e Controle de Trfego Areo COM - Comunicaes CopM - Centro de Operaes Militares CTA - rea de Controle CTR - Zona de Controle DA - Altitude de Deciso DES - Descendo ou Desa DEPV - Diretoria de Eletrnica e Proteo ao Vo DH - Altura de Deciso DME - Equipamento Radiotelemtrico ERC - Carta de Rota ETA - Hora Estimada de Chegada ETD - Hora Estimada de Partida ETO - Hora Estimada de Sobrevo FIR - Regio de Informao de Vo FIS - Servio de Informao de Vo FL - Nvel de Vo FPL - Mensagem de Plano de Vo Apresentado GCA - Sistema de Aproximao Controlada de Terra IAC - Carta de Aproximao e de Pouso por Instrumentos IAS - Velocidade Indicada IEMA - Impresso Especial do Ministrio da Aeronutica IEPV - Impresso Especial da Proteo ao Vo
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IFR - Regras de Vo por Instrumentos ILS - Sistema de Pouso por Instrumentos IMA - Instruo do Ministrio da Aeronutica IMC - Condies Meteorolgicas de Vo por Instrumentos KT - Ns (unidade de velocidade) MAP - Mapas e Cartas Aeronuticas MDA - Altitude Mnima de Descida MHZ - Megahertz MLS - Sistema de Pouso por Microondas NDB - Radiofarol no-Direcional NM - Milhas Nuticas OACI - Organizao de Aviao Civil Internacional OCL - Limite Livre de Obstculos PAR - Radar de Aproximao de Preciso PAPI - Indicador de Trajetria de Aproximao de Preciso PLN - Plano de Vo QFE - Presso Atmosfrica Elevao do Aerdromo QNE - Altitude fictcia de um ponto, indicada por um altmetro, ajustado para a
presso padro (1013.2hPa) QNH - Ajuste de subescala do altmetro para se obter a elevao, estando em terra RAC - Regras do Ar e Servios de Trfego Areo RCC - Centro de Coordenao de Salvamento RNAV - Navegao de rea RVR - Alcance Visual na Pista RWY - Pista SAR - Busca e Salvamento SELCAL - Sistema de Chamada Seletiva SID - Sada Padro por Instrumentos SIGMET - Informao relativa a fenmenos meteorolgicos em rota que possam afetar
a segurana operacional das aeronaves SRPV - Servio Regional de Proteo ao Vo SSR - Radar Secundrio de Vigilncia SST - Avio Supersnico de Transporte TMA - rea de Controle Terminal CCR - Centros de Controle de Rota UTA - rea Superior de Controle UTC - Tempo Universal Coordenado VASIS - Sistema Visual Indicador de Rampa de Aproximao VFR - Regras de Vo Visual VMC - Condies Meteorolgicas de Vo Visual VOR - Radiofarol Unidirecional em VHF
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APRESENTAO
Todos os dias, em todos os cantos do pas e do mundo, pessoas acordam,
tomam seu caf da manh e partem para mais um dia de trabalho.
Alguns no voltam... Os meios de transporte que os conduzem podem variar:
trem, nibus, carro, metr, avio.
Mas qualquer que seja ele, parte-se do princpio de que todas as providncias
tenham sido tomadas para o bom funcionamento destes equipamentos e que os
trabalhadores tenham condies de vida satisfatrias, que lhes possibilitem executar
seu trabalho com eficincia e responsabilidade.
O risco no transporte no pode ser atribudo a uma ao essencialmente
individual. Existem ambientes de risco que afetam coletivamente grandes massas de
indivduos. Existe a uma relao direta entre a segurana dos meios de transporte e a
Sade do Trabalhador que opera estes sistemas.
Inserida na rea de Sade do Trabalhador h mais de uma dcada, venho
almejando, em minha trajetria profissional, compreender o processo sade-doena e
trabalho e suas determinaes sociais. Os trabalhadores da aviao: comissrios de
bordo, comandantes, controladores de vos tm manifestado preocupao com as
condies em que trabalham e suas possveis conseqncias. So personagens que
vivem o risco em ambientes de trabalho que no podem prescindir da imagem da
impecabilidade.
Este estudo tem por finalidade verificar se as prticas de sade preconizadas
para os trabalhadores da aviao civil brasileira esto sendo eficazes para a
preveno de agravos sade do controlador de trfego areo.
A escolha pelo controlador de trfego areo, para a presente pesquisa,
decorrente de uma longa trajetria de aproximao com o universo representacional
dos riscos no cu... dos traos de morte... das ameaas vida... Neste cenrio, os
controladores so aqueles que tm o dever e a responsabilidade permanente de tudo
controlar no sistema. So trabalhadores invisveis para a sociedade. Mas, de seu
autocontrole e auto-exigncia dependem a tomada de decises corretas.... E a vida de
muitas pessoas.
No seu cotidiano de trabalho, o controla-a-dor o trabalhador que tudo
controla, at a prpria dor. A auto-exigncia parece contribuir para que os prprios
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controladores participem da invisibilizao de seus males e do desgaste acarretado
pelo trabalho. Deste modo, pode-se perceber que, ao longo do tempo, esta exigncia
de autocontrole interage com o seu ser e na forma como se expressa ao mundo. Seres
insensveis? Frios? Duros?
Uma das categorias profissionais mais implicadas na segurana area,
respondem pela coordenao e separao dos vos no espao; com equipes
reduzidas, sem contar com um programa de reciclagem ou requalificao
permanente; lidam com uma complexa e frgil gesto do trfego areo... Essa
fragilidade do controle de trfego areo representa a multiplicao do potencial de
risco dos atuais sistemas da aviao civil, colocando em perigo a vida dos
passageiros e aeronautas a bordo. Sem contar os riscos populao residente no
entorno dos aeroportos.
O presente estudo ser realizado com os operadores do Centro de Controle de
Trfego, localizado no Aeroporto de Congonhas em So Paulo.
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1 INTRODUO
1.1 CONDIES DE RISCO NO TRANSPORTE AREO
Neste estudo, pretende-se trazer para o mbito da sade pblica, particularmente
para o campo da sade do trabalhador, o contexto geral das condies de vida e sade
dos trabalhadores que atuam nos centros de controle de trfego areo Centro de
Controle de Aproximao, denominado APP, nome derivado da palavra approach.
Procura-se, ainda, compreender as prticas em sade e entender suas aes como
processos de interveno tcnica e social na realidade de sade, buscando inspirar-se em
instrumentos da pesquisa qualitativa (SCHRAIBER e MENDES-GONALVES 1996).
Sero priorizadas as possibilidades de reiterar, nos distintos planos das prticas
de sade, a influncia do trabalho na sade do indivduo. Para analisar a relao
trabalho-sade, preciso compreend-la como forma de interao produtiva entre o ser
humano, a natureza e a sociedade (BRAVERMAN 1987).
O desenvolvimento de anlises voltadas preocupao perante a vida, a sade e a
segurana do ser humano no tem respondido s exigncias das novas formas do
trabalho. Existe a uma correlao desigual de foras que, historicamente, tem se
mostrado desfavorvel aos trabalhadores (FERRETI e col. 1994). Da sociedade
primitiva contempornea, as formas de trabalho sofreram profundas modificaes,
principalmente com a incorporao de novas tecnologias e sistemas automatizados. A
sociedade ainda no consegue garantir, como resultado do embate entre a ansiedade
coletiva de absorver novos benefcios do desenvolvimento e a necessidade da
preservao dos indivduos que o promovem, uma relao justa e humana (BRUNO
1996).
O conhecimento das experincias que so vividas pelos trabalhadores dos
servios de transporte, no contexto da Sade do Trabalhador, pode ser ampliado por
meio do uso de metodologia qualitativa, que permite conhecer os processos de sade-
doena destes profissionais. Estes processos so delimitados pelos modos cotidianos de
viver a vida social desta populao, que se constitui como grupos homogneos do ponto
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de vista societrio, conformando-se, em parte, com base nos padres epidemiolgicos
que podem ser tambm detectados (SCHRAIBER e MENDES-GONALVES 1996).
Os novos modelos de organizao do trabalho no setor do transporte vm
submetendo os trabalhadores a situaes crticas. Os operadores destes servios esto
cada vez mais expostos a condies de trabalho em que nem sempre os riscos sade
so facilmente identificveis. ITANI (1998 p. 112) afirma que (...) trabalhar na
produo do servio de deslocamento de pessoas com os atuais sistemas de informao
trabalhar com a velocidade e tambm viver o tempo em dimenses diferenciadas. A
autora observa que, associada a essa vivncia de dimenses de tempo, o operador precisa
estar sempre pronto a viver tais dimenses com ateno permanente, pois dele exigida
uma necessria prontido, para fazer frente a uma possibilidade sempre presente da
reversibilidade da oscilante situao de normalidade-anormalidade.
No setor do transporte areo, a imprevisibilidade aumenta a necessidade de
ateno permanente do trabalhador, situao que se torna mais crtica diante do
crescimento deste importante segmento da economia. Este setor, beneficiando-se do
desenvolvimento das inovaes tecnolgicas dos sistemas de informao e de
comunicao, vem conseguindo deslocar progressivamente maior quantidade de
passageiros por viagem. Alm do crescimento da quantidade de passageiros por vo, a
modernizao acelerada da aviao civil ocasionou o aumento da velocidade das
aeronaves, o que se acentua com as tecnologias automatizadas.
Outro aspecto a ser considerado refere-se ao aumento do nmero de aeronaves que
circulam anualmente no espao areo. Apesar da melhora contnua no desempenho dos
equipamentos, demonstrando uma segurana duas a trs vezes superior da gerao
precedente, preocupante a constatao de que o nmero bruto de acidentes tem
aumentado proporcionalmente ao crescimento do volume de vos. Esta constatao
chamada assntota de segurana - a taxa de segurana no consegue aumentar h vrios
anos. De fato, na Aviao Civil Internacional, o nvel de segurana se mantm estvel,
como mostra a Figura 1.
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Figura l - Comportamento da taxa de acidentes areos no mundo. em 1999.
Fonte:Dados dos relatrios de pesquisas ergonmicas realizadas no controle de trfego areo do Rio
de Janeiro, Como o nvel de segurana calculado em funo do nmero de acidentes por
milho de vos realizados, e o volume de vos tem crescido sempre, segundo a anlise
de VIDAL e MOREIRA (1999), se o Sistema de Transporte Areo Internacional tem
permanecido com uma taxa de acidentes estabilizada, isto s pode se dever a um
aumento no nmero bruto de acidentes anuais, o que pode ser constatado na Figura 2. Figura 2 - Nmero de acidentes areos no mundo
Fonte:Dados dos relatrios de pesquisas ergonmicas realizadas no controle de trfego areo do Rio
de Janeiro, em 1999.
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Segundo se observa na Figura 1, a taxa de acidentes vem se mantendo constante
desde 1970. Concorda-se com a hiptese de VIDAL e MOREIRA (1999), que atribui
enorme sofisticao do sistema esta estabilidade. Talvez, o sistema j tenha atingido o
seu ndice mximo possvel em termos de segurana, uma vez que s h duas maneiras
de aprimorar esta taxa reduzindo-se o nmero de vos ou reduzindo-se o total bruto de
acidentes. Figura 3 - Previso da evoluo dos acidentes areos no mundo
Fonte: Dados dos relatrios de pesquisas ergonmicas realizadas no controle de trfego areo do
Rio de Janeiro, em 1999.
Conforme a anlise dos dados contidos na Figura 3, prev-se que o crescimento
do transporte areo seja constante nos prximos anos, uma condio necessria
sobrevivncia do atual modelo da aviao comercial. Objetivamente, isto significa um
aumento de 100% do trfego at o ano de 2010. Portanto, se hoje o nmero absoluto de
acidentes graves se situa na faixa de 25 a 30 por ano, prev-se que dever ultrapassar 50
por ano em 10 anos, o que tambm pode ser observado na Figura 3.
A conjuno de diversos fatores vem potencializando a possibilidade de
ocorrncia de acidentes e desastres de grandes propores e aumentando, por
conseguinte, o patamar de riscos a que ficam expostas as tripulaes a bordo,
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passageiros das aeronaves, comunidades das cercanias de rotas e aeroportos e o meio
ambiente.
Deve ser ressaltado que, no caso brasileiro, tomando-se para anlise o perodo de
1979 a 1999, os dados divulgados mostram uma reduo no nmero de acidentes areos,
conforme se pode observar na Figura 4. No entanto, o nmero de mortes nesse tipo de
acidentes tem aumentado, encontrando-se um coeficiente de fatalidade de 0.495 em
1979; de 0.603 em 1989 e de 1.26 em 1999, segundo dados do Departamento de
Aviao Civil, Brasil, 2000. Destaca-se o ano de 1996, em que este coeficiente atingiu
2.16, principalmente em razo dos acidentes areos de grande repercusso que
ocorreram naquele ano vitimando mais de uma centena de pessoas.
Figura 4 Acidentes Aeronuticos na Aviao Civil /1979 2000
Fonte: Departamento de Aviao Civil.[on line] www.gov.br
Dados registrados at 07 de janeiro de 2000.
1.2 CONTEXTO DO TRFEGO AREO NO BRASIL
Sobre o espao areo brasileiro, na rea delimitada acima do territrio e mar
territorial nacional, transitam atualmente, por via area, cerca de 50 milhes de
passageiros/ano, dos quais mais de 26 milhes de pessoas so embarcadas anualmente
no Brasil. Nesta categoria de transporte, o ramo que mais se desenvolveu foi o do
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trfego areo regional, no segmento de vo domstico, que cresceu 600% nos ltimos
oito anos (considera-se vo domstico todo transporte em que os pontos de partida,
intermedirios e de destino estejam situados em territrio nacional).
No incio dos anos noventa, os vos areos domsticos transportavam por ano
1,5 milhes de passageiros, atravs de cinco empresas, cinco anos depois (em 1996),
esse nmero chegava a quase 6 milhes de passageiros. Nesse total, tambm deve ser
contabilizado cerca de 1,6 milho de pessoas transportadas atravs da ponte area So
Paulo/Rio de Janeiro/ So Paulo, onde ocorre o maior movimento, tanto em nmero de
passageiros transportados, como em nmero de deslocamentos de aeronaves/ dia1.
Muito embora se possa observar uma perda de passageiros nos vos domsticos
brasileiros, ocorreu uma reorganizao do processo produtivo no setor, com o
surgimento do ramo areo regional e o aumento da procura de vos internacionais,
possibilitado especialmente pelo aspecto custo. Isso sem contar o crescimento de
empresas de txi areo2.
fato que o crescimento desse setor vem junto com o aumento da capacidade
dos equipamentos em transportar uma maior quantidade de passageiros. Atualmente,
alguns avies chegam a transportar 400 passageiros, como o caso do Boeing 747-400.
H tambm o MD-11, que comporta mais de 300 passageiros. No transporte regional,
vem sendo utilizado tanto o Boeing 737 como o Fokker 100, que transportam mais de
100 passageiros. Isso significa que houve um aumento de assentos passageiros/km, de
cerca de 200% nos ltimos 15 anos (ITANI 1998).
O transporte areo tambm se beneficiou do aumento da velocidade, privilegiado
pelos novos sistemas e equipamentos, a partir dos anos 60, com a introduo do jato.
Nos ltimos seis anos, a velocidade mdia registrada na aviao passou de 680 para 723
quilmetros por hora no trfego nacional, e de 320 para 405 no regional. Paralelamente,
houve uma mudana total da frota nos ltimos 20 anos. No trfego nacional, em 1986,
1Dados do Departamento de Aviao Civil , 1990.
2 Dados extrados dos Anurios Estatsticos- Departamento de Aviao Civil, 1990.
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10% da frota utilizava turbolice; atualmente, ela composta por jatos. Tambm, no
trfego regional, os txis areos a jato vm ocupando espao (ITANI 1998).
Apesar da perspectiva de crescimento neste setor, em funo do processo de
desregulamentao do transporte areo mundial, h de um lado, uma presso das
grandes empresas internacionais na quebra das reservas de mercados nacionais. De outro
lado, as empresas nacionais, para tentar responder a essa presso, vm reduzindo as
tarifas areas, de maneira a atender uma demanda reprimida interna e, ao mesmo tempo,
enfrentar a concorrncia internacional no mercado interno. Aps um perodo de aparente
estabilidade econmica, em funo de medidas adotadas pelo governo no ltimo Plano
de Estabilizao Econmica (Plano Real), a aviao civil no Brasil, vem apresentando
sinais de crise.
Apesar das mudanas observadas no perfil da aviao civil brasileira nos ltimos
anos, atualmente, h sinais de dificuldades no equilbrio financeiro do setor. As
perspectivas apontam reduo do nmero de companhias areas, com propostas de
fuso entre empresas ou, ainda, reduo do tamanho. As tendncias verificadas em
relao ao transporte areo na atualidade so, entre outras, a de flexibilizao e
globalizao deste servio, com crescimento do setor, principalmente por meio do
aumento da participao de capital estrangeiro (Folha de So Paulo 2000).
Neste contexto, ampliam-se as exigncias na implementao de diretrizes de
planejamento que minimizem os impactos do crescimento deste setor, especialmente em
sistemas de controle de trfego areo.
Numa anlise retrospectiva do trfego do ano de 1996, observa-se que o sistema
de transporte areo civil transportou, nos trfegos domstico e internacional, cerca de 61
bilhes de passageiros/km (passageiros transportados x etapa mdia) e 2,5 bilhes de
toneladas/km de carga (toneladas de carga e mala postal transportadas x etapa mdia).
As previses para o incio do prximo sculo esto em torno de 82 bilhes de
passageiros/km/ano e 4 bilhes de toneladas/km de carga/ano. Se o crescimento da
demanda mantiver este ritmo, o sistema estar transportando 331 bilhes de
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passageiros/km e 18 bilhes de toneladas/km de carga no ano 2020, ou seja, 8 vezes o
volume de trfego atual 3.
Pode-se prever que este crescimento do sistema de transporte areo causar um
grande impacto neste ramo de servio, que envolver vrias categorias de trabalhadores
da aviao civil, sejam aeronautas (profissionais que trabalham nas aeronaves),
aerovirios (pessoal que trabalham em terra) e controladores de trfego areo. H uma
preocupao com a reorganizao dos servios dos aeroportos decorrente da presso dos
passageiros por atendimento mais eficiente de balco e servios de terra, o que no
ocorre com as demais atividades. Uma destas condies e, provavelmente, a mais
crucial, a do controle de trfego areo, que deve estar dimensionado para atender a
esse volume de trfego futuro.
A infra-estrutura deste servio, entretanto, no tem conseguido acompanhar esse
crescimento. Segundo VIDAL e MOREIRA (1999), o controle de trfego areo do Rio
de Janeiro tem se deparado, por vezes, com sintomas de saturao do espao areo, nas
proximidades dos aeroportos da rea Terminal do RJ. A mesma situao pode ser
apontada com relao rea Terminal So Paulo. Ou seja, a segurana nas
proximidades dos aeroportos que servem a ponte area crtica em termos de riscos
de acidentes. A ocorrncia de atrasos nos vos freqente. Esta situao pode tornar-se
insuportvel para as empresas areas, pois o custo dos atrasos pesa no balano financeiro
das companhias. Por outro lado, deve-se considerar os inconvenientes para os
passageiros e demais envolvidos, como trabalhadores da aviao e at mesmo dos
moradores de regies sob rotas nas proximidades dos aeroportos.
H algum tempo algumas categorias profissionais do transporte areo vm
discutindo os problemas de segurana de vo em funo da poltica de minimizao de
recursos que vem sendo praticada no setor, at com situaes crticas, com
descumprimento de Normas e Regulamentos. A transcrio da fita relativa matria
jornalstica realizada pela rdio Jovem Pan, em 09/04/96, sobre as condies de
3 Cf. Dados do Plano de Desenvolvimento da Aviao Civil, PDSAC, 1997. [on line] www.gov.br Disponvel em abril 2000.
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operao no Aeroporto de Congonhas, flagrante (ANEXO 1). Como desdobramento
deste episdio, o Ministro da Aeronutica e o Diretor de Eletrnica e Proteo ao Vo
(DEPV) foram convocados pela Comisso de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e
Minorias da Cmara Federal, em junho de 1996, para, em Audincia Pblica, discutir a
proteo ao vo no Pas e esclarecer os problemas decorrentes da falta de segurana
diante do congestionamento do trfego areo, particularmente no Aeroporto de
Congonhas, em So Paulo.
1.3 ASPECTOS DA REGULAMENTAO DO CONTROLE DE TRFEGO AREO
A regulamentao da navegao area no Brasil adota basicamente a legislao
internacional editada pela Organizao Internacional da Aviao Civil (OACI),
procurando ajustar normas e mtodos utilizados pelos pases componentes da regio
CAR-SAM (Caribe-South Amrica), da qual faz parte.
O Conselho da OACI o responsvel pela aprovao dos padres, prticas e
procedimentos recomendados, estudados e propostos pelas Comisses Tcnicas que
compem a estrutura executiva dessa organizao. Aps a aprovao do Conselho, os
Estados contratantes so consultados para se manifestarem, sendo ento obrigados pelos
termos da Conveno, a apresentar todas as modificaes e suas razes, assim como a
publicao na AIP Nacional (Publicao de Informaes Aeronuticas), das diferenas
por eles adotadas.
O trfego areo, a infra-estrutura aeronutica e os servios direta e indiretamente
relacionados ao vo, no Brasil, esto dispostos na Lei n 7565, de 19 de dezembro de 1986, que dispe sobre o Cdigo Brasileiro de Aeronutica. Para fins dos servios de
trfego areo, adotam-se as Normas e Mtodos recomendados pela (OACI), ressalvadas
as restries ou modificaes apresentadas pelo Governo Brasileiro.
A Constituio da Repblica Federativa do Brasil a fonte de origem para o
estabelecimento das regulamentaes especficas sobre o funcionamento do Sistema de
Controle do Espao Areo Brasileiro (SISCEAB).
Este sistema tambm regulado por uma srie de regras editadas pela Diretoria
de Eletrnica e Proteo ao Vo (DEPV), responsvel pela defesa area, sendo o trfego
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areo civil e militar operado conjuntamente atravs do Sistema Integrado de Defesa
Area e Controle de Trfego areo (SISDACTA).
O SISDACTA atua no espao areo brasileiro e nas regies sob responsabilidade
do pas, decorrentes de tratados internacionais, na rea de 8.511.965 Km2 de territrio
nacional e numa rea ocenica que se estende at o meridiano 10W, totalizando cerca
de 22 milhes de Km2.
No que concerne s atividades de trfego areo, o rgo responsvel pelos
estudos e elaborao dos diversos documentos afins a Diviso de Gerenciamento do
Trfego Areo (D-ATM). Pautada na documentao e nas peculiaridades brasileiras, a
D-ATM elabora e submete apreciao da direo da DEPV os diversos manuais,
instrues e folhetos que definem e tratam das variadas normas e procedimentos a serem
adotados pelos rgos que prestam os Servios de Trfego Areo e de Busca e
Salvamento no Pas.
A DEPV, atravs da D-ATM, legisla, em mbito nacional, sobre atividades
relativas prestao dos servios de trfego areo. Para isso, conta com uma srie de
Instrues do Ministrio da Aeronutica (IMA), Manuais (MMA), Folhetos (FMA) e
demais impressos em completa obedincia s normas e procedimentos internacionais
estabelecidos e cujos principais constam na seguinte listagem:
IMA 100-12 - Regras do Ar e Servios de Trfego areo. IMA 100-4 - Plano de Vo. IMA 100-15 - Regras Especiais de Trfego areo para Helicpteros. IMA 100-18 - Licenas e Certificados de Habilitao Tcnica para CTA. MMA 100-31 - Manual do Controlador de Trfego Areo. CIRTRAF 100-2 - Classificao dos Espaos Areos Condicionados. CIRTRAF 100-4 - Procedimentos para Processamento de Infraes de Trfego
areo.
AIP Brasil - Generalidades, Comunicaes, Meteorologia, Regras e Servios de Trfego areo, etc.
AIP- MAP - Cartas de Decolagem e Aproximao por Instrumentos, Diagramas de Aerdromos, etc. (Este documento componente obrigatrio do conjunto de navegao area que todas as aeronaves nacionais devem portar, e as internacionais conhecer, quando em vo em territrio brasileiro.)
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1.4 VISO SISTMICA DO CONTROLE DO ESPAO AREO NO BRASIL
O Sistema de Controle do Espao Areo Brasileiro (SISCEAB) responsvel pelo
controle da navegao area no espao areo sob jurisdio do Brasil de forma
integrada. O SISCEAB abrange todas as aes para atender s duas vertentes usurias do
Sistema, a civil e a militar, no que concerne s funes operacionais de
Telecomunicaes, Trfego Areo, Meteorologia Aeronutica, Cartografia e
Informaes Aeronuticas e Busca e Salvamento.
Naquilo que diz respeito s atividades especficas das operaes militares, o
SISCEAB norteia-se pelas diretrizes estabelecidas pelo comando da Aeronutica e pela
DEPV.
O comando da Aeronutica vem implementando o Plano de Desenvolvimento do
Sistema de Controle do Espao Areo (PDSCEA) - um plano de longo prazo, que tem
por objetivo direcionar as aes da Diretoria de Eletrnica e Proteo ao Vo (DEPV) e
de outros segmentos inter-relacionados do setor 4,5. De acordo com as declaraes na
imprensa e com base em informaes do Departamento de Aviao Civil, o PDSCEA
tem tomado como base os seguintes indicadores: crescimento do movimento do trfego
areo domstico e internacional, com suas origens e destinos; projeo da demanda
qualitativa e quantitativa destes movimentos; evoluo tecnolgica das aeronaves e dos
meios de controle de trfego areo e de comunicaes; planos governamentais; planos
da Organizao de Aviao Civil Internacional (OACI); e planos de desenvolvimento
deste segmento de outros pases.
A seguir, com o objetivo de facilitar o entendimento sistmico sobre o
funcionamento do controle do trfego areo brasileiro, toma-se, a ttulo de ilustrao, o
depoimento de um operador:
a melhor imagem deste sistema a de uma colcha de retalhos, onde, o cu dividido em setores, que so monitorados, normalmente por dois controladores, o principal, que faz a fonia com os pilotos, e o auxiliar, que o abastece de dados.
4 CF.DAC [on line] www.dac.gov Disponvel em abril de 2000. 5 Cf. DAC - DEPV [on line] www.dac.gov Disponvel em abril de 2000.
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Sempre que uma aeronave sai de um setor e entra em outro, o piloto muda a freqncia do rdio e passa a responsabilidade para outro controlador, responsvel por aquele outro setor. 6
Na prtica, o SISCEAB operacionalizado por meio dos Centros Integrados de
Defesa Area e Controle de Trfego areo-Cindacta I , II, III e Amaznia, que, para
efeito prtico, divide o pas em quatro grandes reas:
Cindacta I localizado em Braslia, responsvel por uma rea equivalente a 1,5 milho de km2, abrangendo os estados de So Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Esprito Santo, Gois, Distrito Federal e Mato Grosso. o mais movimentado do pas, sendo que oito radares fazem a monitorao destas reas.
Cindacta II - com sede em Curitiba, controla a regio Sul, estados de Santa Catarina, Paran e Rio Grande do Sul.
Cindacta III - localizado em Recife, monitora a regio Nordeste, estados da Bahia, Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Piau e Cear.
Regio Amaznica - s ser rastreada aps a implantao do Sistema de Vigilncia da Amaznia (Sivam).
Nos Cindactas esto localizados os Centros de Controle de rea (ACC), que
respondem pelo monitoramento do sistema a partir das reas de Controle Terminal
(TMA), depois que a aeronave em deslocamento atinja uma altitude de 19.500 ps em
rota.
Na rea de abrangncia dos Cindactas, as altitudes dos vos devem ser superiores
a 19.500 ps. O espao areo compreendido acima desta altitude denominado de
aerovia superior.
Na Zona de Controle (CTR), o espao areo controlado compreende as aerovias
inferiores e outras partes do espao areo inferior, onde se presta o servio de Controle
de Trfego Areo (ATC). O Controle de Trfego Areo se d por meio do
estabelecimento de reas de controle definidas como aerovias. Estas so dispostas em
forma de corredores e providas de auxlios-rdios navegao.
6 Cf. Diretoria do Sinprovo, Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Proteo ao Vo.
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Administrativamente, o Destacamento Regional de Proteo ao Vo (DRPV), o
setor responsvel pelo trabalho realizado tanto na Sala de Controle de Trfego areo
(APP), como na Torre de Controle Visual (TWR). O trabalho na Torre de Controle
Visual ou simplesmente no controle visual se restringe rea interna do aeroporto, onde
a partir de uma distncia em torno de cinco milhas da cabeceira da pista, o vetoramento
das aeronaves passa a ser operado visualmente, at o alinhamento final para pouso/
decolagem. As funes do APP e da Torre Visual so distintas, mas interdependentes.
Os Servios Regionais de Proteo ao Vo (SRPV) esto sediados no Rio de
Janeiro, Braslia, So Paulo, Recife e Curitiba, sendo responsveis pelo controle
descentralizado do trfego areo das reas terminais nas regies leste, centro-oeste,
sudeste, nordeste e sul.
A partir de uma distncia de at 100 quilmetros dos aeroportos, num nvel de
195 ps, as aeronaves passam a ser vetoradas, ou seja, o controle de separao passa a
ser realizado pelo Controle de Aproximao (APP). Este procedimento se d por meio
de informaes obtidas de radares. Neste local de trabalho foi desenvolvida a presente
pesquisa.
1.5 CARACTERIZAO DO CONTROLADOR DE TRFEGO AREO
Atualmente, no Centro de Controle de Aproximao de So Paulo (APP-SP)
atuam 100 operadores. Do ponto de vista funcional-administrativo, coexistem 86
controladores militares e 14 civis (9 homens e 5 mulheres). Aparentemente, essas
diferentes formas de vnculos com a instituio parecem no gerar conflitos explcitos.
No entanto, a falta de regulamentao profissional da carreira do controlador de trfego
areo reduz um trabalho especializado a uma atividade de menor importncia, como
expressam os trabalhadores.
O trabalho no controle de trfego areo desconhecido para a maioria das
pessoas, muitas vezes, at pelos prprios usurios do transporte areo. O controlador de
trfego areo tem uma enorme responsabilidade, pois seu trabalho consiste em vetorar
uma zona do espao areo, de tamanho varivel, denominada setor. Ela pode conter
vrios segmentos de rotas areas e/ou uma parte da rea prxima aos grandes aeroportos,
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sendo supervisionada por pelo menos dois controladores, que orientam as aeronaves que
nela se encontram. Para VIDAL e MOREIRA (1999), na Europa, o controle de vos
referido como um "artesanato intelectual".
No Brasil, o trabalhador civil admitido por meio de concurso especfico,
ingressando a seguir no curso de formao e treinamento. H exigncia do segundo grau
para os candidatos civis. De outro lado, a formao para os militares inicia-se com
concurso para Sargento da Aeronutica e h exigncia do primeiro grau.
A diferena de salrio entre militares e civis parece no ser significativa,
conforme comentado pelos prprios trabalhadores. H, no entanto, diferenas de
benefcios, como licena-prmio, etapa alimentao, alm do uso exclusivo pelos
militares do servio mdico do Hospital da Aeronutica de So Paulo (HASP). Mesmo
nos casos em que h necessidade de afastamento da funo por doenas relacionadas ao
trabalho, o seguimento clnico diferenciado para o controlador de trfego civil e para o
militar. O militar conta com uma retaguarda especfica dentro da estrutura corporativa.
O civil simplesmente recebe o diagnstico, ficando por sua conta a realizao dos
exames e do tratamento mdico, uma vez que no h convnio com o servio de
retaguarda especializado na corporao aeronutica.
1.6 O DESGASTE DO CONTROLADOR DE TRFEGO AREO
Devido ao fato de viverem a experincia dos novos processos de trabalho que
derivam do aumento da quantidade de aeronaves em operao, da velocidade dessas
aeronaves, do volume de passageiros no trfego areo e da introduo de sistemas
automatizados, os controladores de trfego podem estar sofrendo desgastes constantes
em funo das condies estressantes de sua atividade profissional, que resultam em um
trabalho pouco visvel, no valorizado social e financeiramente e quase desconhecido.
Esta questo constitui-se no estmulo busca da compreenso deste universo de
trabalho.
Comumente, o efeito da condio de trabalho percebido pelos operadores ao
final da jornada, quando expressam a sensao de fadiga fsica. Os sinais de fadiga
podem ser detectados atravs da avaliao do gasto energtico e custo cardaco relativo,
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em funo do volume de trfego em vigilncia. Segundo VIDAL e MOREIRA (1999), a
avaliao regular desses fatores fundamental para a manuteno da capacidade fsica e
da eficincia dos controladores, alm de assegurar a sade deste trabalhador a longo
prazo.
O estresse psicolgico, decorrente de condies variadas quanto s exigncias do
trabalho, tais como: dificuldades de comunicao entre controladores e pilotos,
controladores e supervisores, trabalho em turnos alternados e pausas para descanso
estabelecidas de forma no regular e no sistemtica, elevados nveis de exigncia de
memria e percepo mental, faz com que estes operadores mostrem maior incidncia de
sintomas de estresse em relao a outras categorias profissionais. Estes sintomas foram
estudados por DELLERBA, VENTURI, RIZZO, PORCU, PANCHERI (1994).
De acordo com HOPKIN (1988), o trabalho em turnos pode contribuir para
aumentar dificuldades familiares tambm associadas ao estresse; preocupaes
financeiras e falta de reconhecimento profissional, entre outras, exigem deste
trabalhador uma grande capacidade pessoal para lidar com estes desafios. Como
decorrncia, o quadro de instabilidade emocional, depresso, com maior falta de
concentrao e dificuldade de julgamento pode implicar conseqncias nefastas na
operao dos sistemas de controle do trfego areo.
Aponta-se ainda, a necessidade da realizao de estudos ergonmicos sobre o
equacionamento dos espaos de trabalho e de uma concepo da disposio dos
instrumentos operados pelo trabalhador, luz do conhecimento de medidas
antropomtricas especficas. Considerando-se que um indivduo no idntico a outro e
nem permanece idntico ao longo do tempo (VIDAL e MOREIRA 1999). Os fatores de
variao individual mais conhecidos so: idade, gnero, padro socioeconmico,
nacionalidade, deficincias de diversas ordens, constituio corporal, entre outros.
Por outro lado, deve-se considerar a demanda cognitiva decorrente da atividade
de vigilncias sobre as aeronaves. Neste sentido, a anlise ergonmica do trabalho
(AET) pode ser utilizada como instrumental que permite conhecer a carga representada
pelas comunicaes radiofnicas, quantificadas pela durao e frequncia das
mensagens, pela durao e frequncia dos intervalos entre as mesmas e pelo idioma
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empregado. VIDAL e MOREIRA (1999), descrevem quantitativamente a distribuio
das comunicaes controle-aeronave no APP-RJ em 19997.
O depoimento de um controlador de trfego pode retratar com riqueza de
detalhes uma das situaes de estresse e sofrimento mental, vividas no cotidiano destes
trabalhadores:
O pior momento na vida de um controlador de vo ver na tela do monitor dois pontos se fundirem, caso esses pontos, que representam duas aeronaves, estejam em nveis aproximados de altitude. Nesse instante, o controlador sua frio, seu corao dispara e os olhos ficam imveis, a espera do que vai se suceder. O susto s passa se, segundos depois, os dois se separam e verifica-se que o choque entre as duas aeronaves no ocorreu.
Este depoimento foi colhido no projeto de estudo sobre as Condies de
Trabalho e Sade dos Controladores de Trfego Areo, parte de uma pesquisa
desenvolvida pela Universidade Estadual Paulista-Unesp, desde maro de 1998, cuja
realizao atendeu solicitao do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Proteo ao
Vo, no momento em que se debatia a questo dos acidentes e incidentes areos que
ocorreram em 1996 e 1997, em So Paulo.
Tal projeto de estudo integrado est voltado sade do trabalhador e caracteriza-
se pela interinstitucionalidade, com a participao de tcnicos da Delegacia Regional do
Trabalho de So Paulo-DRT-SP, do Centro de Referncia em Sade do Trabalhador do
Estado de So Paulo-CEREST-SP, Centro de Referncia em Sade do Trabalhador da
Lapa, da Secretaria de Sade do Municpio de So Paulo CRST - Lapa.
1.7 CONDIES DE RISCO NA ORGANIZAO DO TRABALHO DO CONTROLADOR
DE TRFEGO AREO
As inovaes tecnolgicas introduzidas nos sistemas de transportes coletivos,
especialmente no controle de trfego, com equipamentos cada vez mais velozes e
avanados, implicaram em conseqncias para a sade dos operadores (SELIGMANN-
7 Cf. Vidal e Moreira em artigo: Comunicaes radiofnicas entre aeronaves e Controle de Trfego Areo do Rio de Janeiro: um aspecto da carga laboral dos radaristas em 1999.
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SILVA, 1994 p. 107). Esta autora afirma que o conhecimento tcnico foi posto ao
alcance dos controladores, mas as informaes do aspecto organizacional, os projetos
sobre suas prprias carreiras, a participao em decises administrativas ficaram sempre
restritas aos altos escales. Perdendo-se, a liberdade do pensar, essencial para que a
inteligncia possa manter-se ativa e criativa, em um clima propcio gerao do
comprometimento e do interesse pela atividade desenvolvida.
Os controladores de trfego areo tm o dever e a responsabilidade permanente
de tudo controlarem neste sistema, mas o que se percebe no cotidiano do trabalho destes
operadores que se sentem desvalorizados profissionalmente. Sentir-se desqualificado
para o trabalho parece ser comum em nosso tempo, o que atinge a identidade de tantos
outros trabalhadores diante das exigncias dos equipamentos de tecnologias avanadas
(SELIGMANN-SILVA 1994, p. 108).
Esta realidade de trabalho diferentemente percebida por esses trabalhadores.
No s na tica da preservao individual do bem-estar, longevidade, possibilidades de
descobrimento das prprias potencialidades, como tambm na tica dos interesses da
categoria. Apesar da importncia da atividade desenvolvida pelo controlador de trfego
para viabilizao e segurana do transporte areo, esta no uma profisso que tenha
status e reconhecimento social, segundo relatos colhidos no j referido Relatrio de
Pesquisa sobre as condies de trabalho e sade dos controladores de trfego areo,
Unesp, 1998.
1.8 CONDIES DE RISCO PARA A SOCIEDADE
Evidentemente, no se pretende, neste estudo, esgotar todas as indagaes
apresentadas. Busca-se, contudo, trazer para o mbito da sade pblica a discusso sobre
as prticas de sade destes trabalhadores, enfocadas segundo a dimenso da sade
ambiental e da qualidade de vida nas cidades. Neste sentido, alm das condies de risco
j esboadas para a sade dos trabalhadores da aviao, discutem-se as condies de
risco vida dos passageiros, ao meio ambiente e aos cidados que vivem nas grandes
cidades.
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Na perspectiva de ampliar a discusso destas questes com a sociedade, cita-se o
Painel de Debates realizado na Unesp, em abril de 1999: Da sade do controlador de
trfego qualidade de vida na cidade. Este evento teve por objetivo discutir junto com
instituies representativas dos trabalhadores do transporte areo e com algumas
instituies da sociedade civil, questes do trabalho do controle de trfego areo,
buscando debater os riscos desse trabalho que afetam outros setores da sociedade
(ANEXO 2). Um dos desdobramentos desse evento foi a publicao de um resumo das
discusses e propostas, que exerceu papel relevante para disseminar o debate com os
diversos segmentos da sociedade civil envolvidos com a sade do trabalhador e a sade
ambiental.
Inclui-se como desdobramento desse Painel de Debates a entrevista concedida
por esta pesquisadora ao Jornal da USP n 484, de setembro de 1999, que publicou a matria Os perigos invisveis de voar (ANEXO 3), e nota sobre a entrevista publicada
no Informe APVAR n 135 (ANEXO 4). Dentre os vrios aspectos apontados, um aqui destacado como de relevncia
pelo tcnico responsvel pelo projeto de cooperao alem Gesellschaft fur Techische
Zusammenarbeit (GTZ) e pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Bsico
(CETESB), na Mesa Redonda: O trfego areo e a sade ambiental no espao
paulistano.
Os dados sobre impactos ambientais gerados s cidades8, a partir de estudos que
avaliam a quantidade de poluentes decorrentes das operaes de pouso/decolagem
(Landing/Take Off) comparados quela emitida por fontes mveis/veculos (diesel,
gasolina, lcool) na Regio Metropolitana de So Paulo (RMSP)9, mostram que uma
aeronave em operao de pouso ou decolagem (LTO) polui o correspondente a 6.578
carros rodando um quilmetro na cidade.
Considerando-se o atual volume de trfego areo,1.600 pousos/ decolagens/ dia
na rea Terminal So Paulo (Aeroportos de Congonhas, Guarulhos e Marte), calcula-se,
segundo estes estudos, que a quantidade de poluentes emitida na atmosfera paulistana
8 Cf. Dados do Instituto Federal de Meio Ambiente da Alemanha, aeroporto de Dusseldorf, 1997.
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equivaleria a 10 milhes de carros rodando 1 Km/ dia pela cidade (GTZ/ CETESB
1999).
Ainda como parte desta Mesa Redonda sobre O trfego areo e a sade
ambiental no espao paulistano, foi apresentado, por um profissional do CEREST-SP,
um levantamento bibliogrfico sobre estudos que analisam os impactos ambientais do
rudo no entorno de aeroportos. Dentre eles, podemos citar:
O incmodo provocado por rudo de avies versus nveis mximos de rudo. A
concluso deste estudo apontou que a reao ao incmodo foi melhor relatada para o
nmero de aeronaves e o nvel de rudo mximo do que a exposio ao rudo equivalente
(Leq) (BJORKMAN e col. 1992).
Risco cardiovascular e rudo de trfego. Neste estudo foram encontradas
associaes significativas entre rudo e fatores potenciais de risco para doenas
isqumicas do corao. (BABISCH e col. 1993).
Rudo de trfego e fatores de risco para doenas isqumicas do corao. O
resultado deste estudo mostrou uma significativa associao entre exposio ao barulho
de aeronaves e prevalncia de perda auditiva induzida por rudo. Nenhum dos
resultados, no entanto, sustenta a hiptese de que o rudo de trfego aumenta o risco para
doenas isqumicas do corao (BABISCH e col. 1993).
Efeitos de rudo de avies na capacidade auditiva de crianas em idade escolar.
Este resultado mostrou uma associao positiva, mas no significativa, entre exposio
ao rudo de avio e risco de perda auditiva (GREEN e col. 1982).
Rudo de trfego ao redor das escolas: um risco para o desempenho escolar das
crianas. Nveis de rudo ao redor de centros educacionais tm afetado negativamente o
desempenho de professores e alunos. O resultado foi consistentemente melhor na escola
silenciosa (SANS e col. 1993).
Relao de dose-resposta para rudo de trfego e incmodo. Esta pesquisa
mostrou uma correlao mais alta para o nvel mximo de rudo. A relao dose-resposta
implica que o nmero de eventos acima de um determinado limite no aumenta a
9 Cf. Dados do Relatrio Anual de qualidade do ar nas RMSP, CETESB, 1996
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extenso do incmodo: determinado pelo barulho mais alto de um nico veculo
(RYLANDER e col. 1986).
A associao entre rudo de avies, perda auditiva e incmodo. O resultado deste
estudo indicou que as medidas ambientais no foram um critrio apropriado para
avaliao de risco de perda auditiva (WU e col. 1995).
Os efeitos psicolgicos de um acidente areo no fatal para a comunidade.
Entrevistas feitas com pessoas envolvidas em acidentes areos denotam sintomas como:
stress, depresso, traumas. Este estudo sugere que mesmo os acidentes no fatais podem
ter graves conseqncias psicolgicas para os envolvidos ou mesmo para a comunidade
(SLAGLE e col. 1990).
Os nveis de radiao proveniente dos radares so relevantes e devem tambm ser
considerados, conforme recomendaes da OIT, porm, no faro parte do presente
estudo, por tratar-se de uma questo especfica que requer instrumentos definidos (WHO
1993).
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2 OBJETIVOS DO ESTUDO
GERAL
Analisar as representaes sociais dos controladores de trfego areo sobre sua
sade e sobre as prticas de sade preconizadas nas normas de controle e segurana em
sade, do Comando Maior da Aeronutica, com vistas a obter subsdios que favoream a
implementao de prticas de promoo e proteo da sade e segurana da aviao.
ESPECFICOS
1. Conhecer o cotidiano de vida do controlador de trfego e suas repercusses sobre
a sade deste trabalhador.
2. Conhecer as condies de trabalho do controlador de trfego areo e identificar o
desgaste a que so submetidos no processo de trabalho.
3. Verificar a percepo dos controladores de trfego areo sobre possveis formas
de melhoria da qualidade de vida no trabalho.
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3 PRTICAS E RISCOS SADE REFERENCIAIS TERICOS
3.1 A SADE DO TRABALHADOR
O campo da Sade do Trabalhador possui como objeto de investigao o
processo sade e doena dos trabalhadores na sua relao com o trabalho. MENDES e
DIAS (1991, p. 347) relatam: apesar das dificuldades terico-metodolgicas
enfrentadas, a sade do trabalhador busca a explicao sobre o adoecer e o morrer das
pessoas, dos trabalhadores em particular, atravs do estudo dos processos de trabalho, de
forma articulada com o conjunto de valores, crenas e idias, as representaes sociais, e
a possibilidade de consumo de bens e servios, na moderna civilizao urbano
industrial.
Como campo recente de conhecimentos e prticas, a Sade do Trabalhador
caracteriza-se pela confluncia de movimentos sociais e polticos, manifesta-se como um
novo projeto de sociedade democrtica, marcado pela conquista de direitos de cidadania
por meio da livre organizao dos trabalhadores.
A teoria da determinao social do processo-sade doena, cuja centralidade
colocada no trabalho, surge como crtica limitao dos modelos vigentes da Medicina
do Trabalho e da Sade Ocupacional, o que contribuiu para aumentar os
questionamentos Medicina do Trabalho centrada na figura do mdico e orientada pela
teoria da unicausalidade: para cada doena um agente etiolgico. No mbito do trabalho,
este modelo reflete a propenso de isolar riscos especficos, atuando sobre suas
conseqncias, medicalizando em funo de sinais e sintomas ou, quando muito,
associando-os a uma doena legalmente reconhecida.
Novas polticas sociais foram introduzindo significativas mudanas na legislao
do trabalho e, em especial, nos aspectos de sade e segurana do trabalhador. A Sade
do Trabalhador , por natureza, um campo interdisciplinar e multiprofissional, devendo
possibilitar no somente um aprofundamento das disciplinas que podem compor o
campo, mas tambm, e principalmente, um dilogo entre as mesmas e os diversos atores
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envolvidos, particularmente os trabalhadores, dentro de uma perspectiva transformadora
do conhecimento e da realidade social (PORTO e FREITAS 1997, p. 60).
Na Itlia, um marco foi estabelecido em 1970, quando o Estatuto dos
Trabalhadores incorporou princpios fundamentais da agenda do movimento de
trabalhadores, tais como: a no delegao da vigilncia da sade ao Estado, a no
monetizao do risco, a validao do saber dos trabalhadores, a realizao de estudos de
investigao independentes, o acompanhamento da fiscalizao e o melhoramento das
condies dos ambientes de trabalho (MENDES e DIAS 1991). O final dos anos 70 foi
um perodo intensamente vivenciado pelo movimento social. Os episdios de Maio de
68 foram importantes referncias de solidariedade de classe, de crtica ao poder
legitimado na cincia, e com desdobramento nas mais variadas reas, inclusive na busca
dos determinantes dos agravos sade da classe trabalhadora nos aspectos infra e supra-
estruturais da organizao da sociedade (ODDONE e col.1986).
No mundo todo, com algumas caractersticas prprias de contextos poltico-
sociais distintos, conquistas bsicas foram sendo alcanadas pelos trabalhadores norte-
americanos (a partir da nova lei de 1970), ingleses (a partir de 1974), suecos (a partir de
1974), franceses (a partir de 1976), noruegueses (a partir de 1977), canadenses (a partir
de 1978), entre outros (MENDES e DIAS 1991).
Tambm na rea da sade surgem propostas para a ateno sade de grupos
populacionais de trabalhadores, como na Conferncia Mundial de Sade de Alma Ata,
em 1978, e na Organizao Mundial da Sade (OMS), nesta mesma poca. Em 1983, a
Organizao Pan-americana da Sade (OPS) lana o documento Programa de Accin
en la Salud de los Trabajadores (OPS 1983), com diretrizes para a implantao de
programaes em sade na rede pblica de servios voltados para aqueles que
trabalham.
Na mesma direo coloca-se a Organizao Internacional do Trabalho (OIT) em
sua 71a. Conferncia Internacional do Trabalho (1985) adotando a Conveno e
Recomendao sobre os Servios de Sade no Trabalho, cujas principais caractersticas
baseiam-se no princpio da ampla participao dos trabalhadores. Na atuao em equipes
multiprofissionais e na implementao de polticas pblicas (OIT 1985). Estas
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proposies acompanham uma tendncia internacional de ampliao de direitos dos
trabalhadores (LACAZ 1997).
No incio dos anos 80, surge o modelo da Reforma Sanitria Italiana, que teve
como um dos seus pilares a luta pela sade na fbrica e o controle da nocividade do
trabalho, a partir da centralidade de ao dos sindicatos de trabalhadores nos locais de
trabalho, usando como metodologia de interveno o Modelo Operrio Italiano
(BERLINGUER 1983, 1988).
Este intenso processo social de mudanas tem conseqncias sobre a aparente
hegemonia da Medicina do Trabalho e da Sade Ocupacional. O exerccio da
participao do trabalhador, em questes de sade, ps em xeque conceitos e
procedimentos at ento consagrados pelo antigo modelo (MENDES e DIAS 1991).
As mudanas que vm se dando no mundo do trabalho so profundas. Assim,
cada vez mais difcil falar de um mundo do trabalho, que pertence esfera da fbrica, e
de um mundo fora do trabalho. O mundo um s e os trabalhadores existem neste
mundo, transformando e sendo transformados por ele, como um modo de viver (DIAS
1994, p. 257).
Essa dimenso do mundo do trabalho, interna e externa, est intrinsecamente
presente na temtica do transporte, uma vez que os riscos presentes nas operaes do
sistema de transporte areo ultrapassam o universo do ambiente de trabalho. Coloca-se
em questo os riscos vida. Aponta-se, desta forma, a vulnerabilidade dos
trabalhadores, dos passageiros, dos moradores e dos cidados em trnsito nas
proximidades dos aeroportos.
Assim, no transporte areo, esta relao entre trabalho, sade e meio ambiente
tem tripla dimenso: a sade do trabalhador, a vida dos usurios e a segurana dos
cidados. Neste sentido, entende-se que os riscos na aviao so relevantes em Sade
Pblica, devendo ser abordados no campo do conhecimento referido como Sade
Ambiental. Parte-se do pressuposto de que o trabalho um dos determinantes
fundamentais da sociedade, e que a sua organizao tem reflexos no nvel de qualidade
de vida de uma populao.
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Embora as prticas vigentes de Sade do Trabalhador estejam ainda fortemente
marcadas pela preocupao com a confirmao de nexos causais e com o tratamento de
doenas do ou relacionadas ao trabalho, configurando a sade do trabalhador como um
conjunto de aes de vigilncia e assistncia (...), como descrito na recente Norma
Operacional de Sade do trabalhador NOST-SUS, do Ministrio da Sade, em seu Art.
1, inciso VII, 1998, so inegveis os princpios acumulados pelas prticas de Sade do Trabalhador. Estas dizem respeito a categorias de anlise-desgaste e medidas de risco
(LAURELL e NORIEGA 1989), e ao estudo das condies de trabalho que incorporam
a participao do trabalhador na prpria concepo exploratria da investigao
(BERLINGUER 1983), e ainda ao fato de cada realidade encerrar em si mesma a
riqueza e as solues apropriadas para cada problema (VASCONCELLOS e RIBEIRO
1995).
Neste sentido, o risco decorrente de acidentes no transporte areo no uma
questo restrita sade do trabalhador. um problema, como refere ITANI (1996b),
que envolve a sociedade contempornea, j que as ocorrncias de risco so freqentes e
envolvem um nmero cada vez maior de pessoas e situaes sociais, apesar das
inovaes tecnolgicas na aviao. A ameaa de eventos catastrficos preocupante.
O campo da Sade do Trabalhador dispe hoje de um considervel acmulo de
experincias de atuao intersetorial, interdisciplinar, com fomento a parcerias e
estabelecimento de acordos coletivos, sob a lgica do controle social. Historicamente, no
que se refere insero poltica e interinstitucional, a Sade do Trabalhador tem
buscado promover o dilogo entre atores sociais normalmente colocados num segundo
plano nas prticas institucionais do pas.
Tais princpios coincidem com aqueles que vm sendo renovados na tica da
Promoo da Sade, razo pela qual seu instrumental conceitual e metodolgico pode
ser adotado como estratgia geral de anlise e atuao sobre condies sociais que so
crticas para melhorar as condies de sade e a qualidade de vida para os cidados e
para as cidades (OTTAWA CHARTER 1987).
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3.2 OS DIVERSOS ASPECTOS DO RISCO
A bibliografia a respeito do termo risco demonstra pouco consenso sobre o seu
significado (AYRES 1997). O conceito utilizado para identificar diferentes situaes.
A palavra risco propicia diferenas de compreenso entre disciplinas do conhecimento
e mesmo entre pases. O termo refere-se a mensuraes de carter objetivo, como a
probabilidade estatstica de ocorrncia de um determinado evento indesejvel e seus
efeitos. A palavra risco tambm expressa situaes de carter subjetivo, a exemplo da
percepo e aceitabilidade do risco, condicionadas por fatores socioculturais,
socioeconmicos, individuais e psicolgicos (SINGLETON 1987).
Nas ltimas duas dcadas, o uso do termo risco tecnolgico comeou a ser
empregado com mais freqncia, justamente em funo do aumento do nmero e da
gravidade das situaes de risco, causado pela atividade humana. O termo engloba tanto
os eventos j ocorridos - acidentes e alteraes importantes nas condies de trabalho e
de vida, direta ou indiretamente motivados e agravados por fatores de ordem tcnica e
organizacional, como eventos previsveis, dadas as possibilidades e circunstncias que
favorecem a sua ocorrncia (SEV 1989).
A vivncia do trabalhador com condies de risco diversa. H riscos de
agresso sade que se contabilizam cumulativamente no organismo. Alteraes dos
ritmos biolgicos podem ser (co)responsveis por perturbaes do sono, doenas
cardiovasculares, alteraes do sistema imunolgico, disfunes do trato
gastrointestinal, aquisio de hbitos de fumo e bebida, e outros distrbios de origem
psquica. H riscos que implicam em danos psicossociais, entre eles, o isolamento scio-
temporal conseqente ao trabalho em horrios irregulares, com limitado nmero de
folgas nos fins de semana (FISCHER 1991).
Os trabalhadores em regime de turnos alternados se enquadram em cinco dos 13
critrios propostos para prever conseqncias negativas relacionadas a esta forma de
organizao do trabalho (JANSEN 1990): falta de regularidade dos horrios de trabalho;
inconstncia na realizao de tarefas domsticas e familiares; inconstncia de perodo de
repouso noite; inconstncia de perodos de recreao noturnos e inconstncia de
perodos de recreao nos fins de semana.
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No caso do transporte areo, caracterizado por um sistema tecnolgico
complexo, recoloca-se em questo a convivncia com uma controvrsia, j antiga, do
risco. Mas o risco em si no novo. O que novo o aumento da dificuldade em
reconhecer situaes de risco, na medida em que aparentemente todas as situaes
parecem estar controladas por um aparato arquitetnico de alta tecnologia. A
visibilidade de uma condio de risco em sistemas tecnologicamente avanados pode ser
mais difcil de ser levantada, em alguns casos quando a prpria inovao possui
tambm significados controversos para os implicados (ITANI 1996b).
Nos processos tecnolgicos de alto risco, entre eles, as usinas nucleares, os
complexos petroqumicos e transportes e rotas areas, a ocorrncia de falhas resulta,
invariavelmente, em eventos de carter catastrfico, expondo a sociedade industrializada
a uma condio de fragilidade diante da necessria competncia no controle dos riscos.
Um acidente gera grande impacto pelo que representa em riscos ou potencialidade de
riscos para vidas humanas. Apesar das inovaes tecnolgicas, as ocorrncias so
freqentes e envolvem um nmero cada vez maior de pessoas.
A condio de risco, numa cultura tcnica recente, construda com significados
marcados pela modernidade industrial e apoiada sobretudo em tecnologia nova.
Verifica-se que h uma maior expectativa entre os tcnicos, especialmente, de que os
novos modelos de sistema possuam maiores ndices de segurana. Coloca-se a questo:
At que ponto a segurana suficiente? A competncia profissional e a mobilizao
social em torno do risco tecnolgico so ainda bastante deficientes em face da urgncia e
da dimenso das providncias necessrias (SEV 1989).
O alto contedo de incertezas dos sistemas tecnolgicos pode ser potencializado,
a depender das condies em que so instalados e das formas de uso. Quando se concebe
um equipamento com potencial de risco preciso testar as probabilidades de falhas e
incertezas. Isto pesa na deciso empresarial e freqentemente obriga a interveno
governamental, via legislao e normas, bem como fiscalizaes e sanes. A indstria
aeronutica e a nuclear esto entre as que mais se preocupam com a segurana para
reduzir os seus riscos inerentes. No entanto, no h como reduzir a zero a probabilidade
de acidente em um sistema tecnolgico complexo. A soluo possvel reduzir o risco a
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um limite aceitvel, de acordo com um critrio, para o qual contribuem fatores como
viabilidade tcnica, custo econmico, aceitabilidade social e benefcios da tecnologia em
questo (ROSA 1989)
Teoricamente o risco inversamente proporcional ao custo da segurana para
que o risco se aproxime de zero. No caso do transporte areo, no qual as probabilidades
de riscos julgadas aceitveis no funcionamento de um equipamento esto na ordem de
uma chance sobre 10 milhes, seria necessrio efetuar uma quantidade to grande de
horas de testes, que tornaria impossvel sua aplicao. Isto efetivamente inviabilizaria a
indstria aeronutica (ITANI 1998b).
3.3 AS CONDIES DE RISCOS SADE DOS CONTROLADORES DE VO
Os modos de viver e todas as interaes humanas so atingidos pelas
transformaes no mundo do trabalho. Incluem-se, neste caso, desde as formas de
produo de bens materiais e de servios, at as relaes humanas nos diferentes
mbitos, do interacional ao comunitrio, alcanando os ambientes de trabalho e a
famlia. Os indivduos e os vnculos afetivos tambm esto envolvidos neste processo de
mudanas profundas (SELIGMANN-SILVA 1997).
ELIAS (1995) destaca a importncia das interaes entre os processos de
transformao tcnica e os processos sociais. Os estudos deste pensador contemporneo
foram ressaltados por SELIGMANNSILVA (1997), com relao imprevisibilidade
das dinmicas sociais mediadas pelas descobertas cientficas e pelas tecnologias
incorporadas indstria, aos transportes, s comunicaes, aos servios em geral e ao
cotidiano humano.
Os novos paradigmas da organizao do trabalho, marcados pela implantao de
novas tecnologias, entre as quais, a automao e a informatizao dos processos de
trabalho, embora cercados de uma certa aura mtica de se constiturem na ltima palavra
da cincia a servio do homem, tm introduzido, na verdade, profundas modificaes na
organizao do trabalho.
A tecnizao repercute na civilizao, atingindo de modo especial tambm os
diferentes territrios e padres da vida relacional. Convive-se atualmente com o
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acirramento da soberania do capital, que diminui a dependncia do trabalhador e, ao
mesmo tempo, amplia as possibilidades de controle do trabalho. Configura-se o processo
social descivilizatrio. Segundo o pensamento de ELIAS (1995), o conjunto das
transformaes materiais e sociais no mundo do trabalho possibilita encontrar tendncias
ora civilizatrias ora descivilizatrias. Para este autor, o conceito de civilizao
tomado como equivalente ao processo social direcionado para o plo do bem e da vida.
O movimento das transformaes pode conduzir ao aperfeioamento da civilizao;
quanto aos retrocessos, o autor denomina descivilizao.
Os novos modos de organizao do trabalho vm se traduzindo pela caracterstica
da falta de visibilidade da tarefa realizada. Essa questo da invisibilidade torna mais
complexa a experincia com as condies de risco. Verificou-se que o operador, em
situaes de emergncia, utilizando-se de suas experincias e conhecimentos
acumulados, consegue adaptar os procedimentos previstos ao contexto real de trabalho
em situaes inesperadas (FAVERGE 1980).
A complexidade dos sistemas to grande que os operadores no conseguem
compreender os problemas. A concepo e a gesto inapropriadas do ponto de vista da
segurana transformam os acidentes em eventos que podem fatalmente ocorrer. O
surgimento de incidentes que no podem ser controlados pelos operadores acaba sendo
inevitvel (PERROW l984).
A atividade de controle no deixa dvidas quanto importncia dos operadores
para a confiabilidade do sistema, cuja segurana diz respeito vida de muitas pessoas
(LEPLAT e DE TERSSAC 1991). So eles que tomam as decises finais que conduzem
a uma posio segura diante das perturbaes. Alguns estudos referidos a sistemas de
transporte coletivo que esto absorvendo novas tecnologias foram realizados no Brasil.
Entre eles, podem ser referidas, por exemplo, diferentes pesquisas voltadas para
operadores de trem metrovirio e de controle de trfego areo (SELIGMANN-SILVA e
col. 1986; JARDIM 1994; ITANI 1997; ITANI 1998; VIDAL e MOREIRA 1999).
VIDAL e MOREIRA (1999) comentam a ineficincia relativa dos procedimentos
prescritos e a impossibilidade de um domnio tcnico perfeito do processo, que levam os
operadores a elaborar modos operatrios originais, muitas vezes contraditrios s
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normas prescritas, constituindo, dessa forma, a organizao real do trabalho. Assim, o
que determina a segurana e eficincia do processo a capacidade de mobilizao das
iniciativas individuais diante do inesperado, o que implica a efetividade da dimenso
coletiva e a cooperao entre os operadores.
O risco no transporte areo tem tambm uma dimenso ambiental. A partir da
dcada de 70 e durante toda a dcada de 80, ficou mais explcito o elo entre a Sade
Ambiental moderna e o campo das relaes sade/doena-trabalho dentro do sistema de
sade (CMARA e GALVO 1995). No Brasil, a Constituio Federal, a lei referente
ao Sistema nico de Sade e algumas leis ordinrias oferecem instrumentos legislativos
que tm contribudo de forma ainda incipiente para uma melhor proteo do ambiente
em geral e do ambiente de trabalho. Entretanto, as instituies pblicas que deveriam
coordenar programas nacionais, estaduais e municipais de controle sobre a sade e o
ambiente ainda operam de forma dicotomizada (PORTO e FREITAS 1997).
Para compreender o conjunto das transformaes materiais e sociais que
envolvem os seres humanos e gera repercusso no ambiente a partir do trabalho,
importante que os problemas ambientais e de sade do trabalhador sejam vistos
integradamente. O fracionamento de um problema complexo em reas parciais,
correspondente ao domnio de disciplinas especficas, impede a anlise e proposio de
polticas alternativas.
O paradigma da Promoo da Sade tem como estratgia a preveno de riscos, a
assistncia, a informao, a educao e a comunicao, como aspectos fundamentais que
vm ganhando reconhecimento crescente no mbito dos movimentos de sade, como
uma exigncia do contexto atual. A formulao de polticas pblicas saudveis, por meio
de uma ao coordenada entre diferentes setores sociais, essencial para se atingir a
qualidade de vida almejada no mundo contemporneo.
3.4 OS AGRAVOS SADE DO CONTROLADOR DE TRFEGO AREO
O sistema de turnos rodiziantes faz parte dos fatores psicossociais que interagem
nos processos sade-doena, tendo sido apontado como uma contnua e mltipla fonte
de problemas de sade e de perturbaes scio-familiares. Inmeras pesquisas
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realizadas, principalmente na Europa, Estados Unidos, Brasil e Japo, mostraram os
principais problemas que afetam os trabalhadores sujeitos a esta forma de organizao
do trabalho (MONK e TEPAS 1985; RUTENFRANZ 1989; CIPOLLA-NETO 1988).
O comprometimento do desempenho causa do aumento de erros e de acidentes
do trabalho durante certos perodos do dia e da noite, sendo ainda maior entre
trabalhadores em turnos. Decorrente de uma dessincronizao interna do funcionamento
do organismo, o desempenho e a disposio para o trabalho ficam prejudicados no
perodo noturno, seja pela incompatibilidade da realizao de certas tarefas, seja por
conseqncias de perturbaes do sono, que levam impossibilidade de manter a
ateno ou mesmo a viglia devido sonolncia (AKERSTEDT 1988).
Os problemas decorrentes das alteraes de ritmos biolgicos, causados pelo
trabalho em turnos e noturno, constituem-se importantes perturbadores da ritmicidade
circadiana, tendo certamente implicaes negativas em muitos dos processos biolgicos
de auto-regulao, alm de gerarem conflitos de ordem social (LUNA e col. 1997;
STOYNEV e MINKOVA 1997; STOYNEV e MINKOVA 1998). Alguns estudos tm
apontado, contudo, a diminuio do nmero de acidentes de trabalho noite. Entre os
aspectos que parecem contribuir para esta ocorrncia esto, por exemplo, a reduo de
atividades laborais perigosas e a menor movimentao de materiais e de pessoal no
perodo noturno (FISCHER 1984). Por outro lado, a ocorrncia de grandes acidentes,
como de Three Mile Island e Bophal (indstria petroqumica), durante a madrugada,
parece ter pouco a ver com o horrio do acidente e muito com questes de manuteno e
de desconhecimento sobre o desenho do projeto. No entanto, uma ocorrncia como a de
Chernobyl, sugere que, pelo menos em parte, pode-se associar este evento necessidade
da tomada de deciso administrativa importante em horrios desfavorveis (LLORY
1996), assim como diminuio da condio de alerta do trabalhador, o que prejudica a
tomada de decises (FOLKARD 1990).
Outro aspecto importante a ser levado em conta no desenvolvimento desse
trabalho a dificuldade de sono - geralmente, um grande problema para os trabalhadores
em turnos, em particular para os que trabalham em turnos rodiziantes e ainda acumulam
outra atividade. Os vrios tipos de perturbaes e a diminuio na durao do perodo
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principal do sono foram estudados (FISCHER e col. 1987). O aumento na sonolncia, o
aumento dos cochilos ou perodos de sono fragmentados, a diminuio da qualidade do
sono e a influncia de fatores ambientais, tais como, rudo, desconforto trmico, que
perturbam o sono diurno foram estudados por AKERSTEDT (1988). A estrutura do
sono diurno distinta daquela apresentada pelo sono noturno: os episdios do sono
paradoxal e do estgio 2 so mais curtos, a latncia do sono e a distribuio do sono
REM so diferentes nos perodos de sono diurnos (AKERSTEDT e GILLBERG 1982).
SEGA e cols. (1998), pesquisaram, em estudo caso-controle, 80 Controladores de
Trfego Areo do Aeroporto de Linate, em Milo. Este estudo procurou esclarecer se os
controladores de trfego apresentavam aumento de presso sangunea e hipertenso
devido natureza estressante desta profisso. Os casos foram devidamente monitorados
e comparados a um grupo controle, trs vezes maior. Segundo os resultados, a presso
sangunea (sistlica e diastlica) era similar nos dois grupos. Este estudo levantou,
ainda, hipteses que poderiam explicar a semelhana de resultados entre casos e
controles. Esta pode estar associada rigorosa seleo dos controladores e ao preparo
adequado destes profissionais para lidar com o estresse que faz parte deste trabalho.
Outros distrbios, como alteraes gastrointestinais, tm sido apontados em
alguns estudos (KOLLER 1983). Fatores de risco, tais como o hbito de fumar, dietas
mais ricas em carboidratos e lipdios e mais pobres em fibras foram comprovadamente
mais acentuadas entre os trabalhadores em turnos. No entanto, h estudos contraditrios
no que diz respeito relao de causalidade entre trabalho em turno e as manifestaes
de distrbios gastrointestinais. Alguns autores descrevem, pormenorizadamente, como
as alteraes biolgicas causadas pelas modificaes dos padres de sono podem
provocar mudanas na alimentao, na motilidade intestinal e na patognese da
ulcerao gstrica e duodenal (VENER 1989).
Em contraposio, outro trabalho, realizado por conceituados cronobiologistas,
no encontrou diferena na prevalncia de lcera pptica numa populao de milhares
de trabalhadores em turnos e diurnos (HALBERG e col. 1977). No se pode esquecer,
como j foi sugerido por muitos autores, que uma auto-seleo pode interferir nos
resultados descritos.
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O presente estudo deve observar ainda os efeitos cumulativos, que potencializam
a manifestao de distrbios psicossomticos, tais como: dor de cabea, tontura,
nervosismo, ansiedade, tremores, fadiga constante, taquicardia, azia, diarria, perda de
apetite, entre outros, freqentemente acompanhados de distrbios do sono
(RUTENFRANZ 1985).
A influncia dos fatores scio-familiares se expressa nas freqentes queixas dos
trabalhadores em reao aos prejuzos causados por relativo isolamento social,
discriminao de atividades e dificuldades em conciliar suas horas de folga com a de
seus amigos e familiares. As caractersticas individuais e as circunstncias que cercam a
vida dos trabalhadores so muito diversas para serem feitas generalizaes, mas pode-se
concluir, no momento, que as desvantagens do trabalho em turnos, na esfera social, so
maiores que as vantagens (WALKER 1985).
A fadiga visual citada em trabalhos de ergonomia em postos de trabalho
informatizados, onde se apontam fortes exigncias visuais associadas ao trabalho
intensivo em terminais de vdeo, tendo como conseqncia tambm a rigidez postural
(GURIN e col. 1979).
O aumento considervel do desgaste do aparelho visual decorrente da
introduo de modernas tcnicas no somente na indstria, mas no setor servios. Ainda,
existe uma enorme expanso do processo de informao e o aumento do uso do
computador, o qual tem transformado inmeros locais de trabalho em indstria e servio
de manufatura, com o uso do Cathode-ray tube (CRT) screens, video screen,
microreaders, e o uso de mesas com iluminao inadequada.
O meio ambiente de leitura sofreu modificaes considerveis. Os caracteres
escuros contra um fundo brilhante retransmitem sob condies de luminescncia
imprprias adaptao dos olhos luz. Outros terminais de video, entretanto, possuam
caracteres brilhantes dispostos contra um fundo escuro, que tambm resultou em
problemas. Apesar dos esforos para a adaptao da unidade de display visual (VDU), o
trabalho nos terminais de computador sujeita o operador a vrios fatores de estresse.
No h contra-indicaes mdicas para o trabalho em terminais de vdeo de
processos informatizados. No entanto, nenhum operador deve ser solicitado para
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trabalhar mais do que 4 horas por dia nestes postos, assim como, com microscpio ou
microleitura. A recomendao feita para a observao de pausas no decorrer dessas 4
horas. No existe perigo de exposio radiao com os equipamentos atuais, desde que
estejam regularmente checados. Entretanto, pessoas com problemas de retina ou com
dificuldade de acomodao visual devem ser desencorajadas para este trabalho que
envolve alto nvel de desgaste visual (DANIELLOU e cols 1985). No se pode
compreender os riscos apresentados pelos monitores sade, analisando somente os
monitores em si. a situao geral de trabalho que exige do operador.
O estresse psicolgico surge em decorrncia de condies variadas, como as
exigncias do trabalho, tenses familiares, preocupaes financeiras, entre outras, indo
alm da capacidade pessoal em lidar com estes desafios. Estas condies variadas, com
instabilidade emocional, depresso, falta de concentrao, dificuldade de julgamento,
queda da imunidade com conseqncias nefastas, podem interferir na operao dos
sistemas de controle do trfego areo (DELLERBA 1994).
Alguns trabalhos tm indicado o alto nvel de exigncia de desempenho de
memria e capacidade cognitiva destes operadores de trfego, especialmente nas
condies de trabalho que fazem parte da realidade vivida nos tempos atuais, em que a
expanso da aviao tem se dado em velocidade maior do que os investimentos na
requalificao e ampliao do quadro de recursos humanos (BOUDES 1977; MILLOT
1977).
Esta breve apresentao dos diversos referenciais tericos uma tentativa de
compreender as mudanas ocorridas no mundo do trabalho, os riscos e os agravos a
que esto submetidos os controladores. Representam um esforo que desafia o
pesquisador na busca da compreenso desse complexo objeto de estudo. Neste sentido,
trazer as experincias que so vividas por esses trabalhadores, nesse ambiente com
sistemas automatizados, requer uma escolha metodolgica que permita apreender o
modo como este realizado, bem como a forma de compreenso de cada um dos gestos
de trabalho, por meio das possibilidades que estes operadores possuem de expressar esse
entendimento (ITANI 1996a).
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4 METODOLOGIA
4.1 PESQUISA QUALITATIVA: JUSTIFICATIVA DA ESCOLHA
De acordo com os referenciais tericos, pressupostos, objetivos e complexidade do
universo a ser estudado, optou-se por um instrumental de abordagem qualitativa. Para
MINAYO (1996), a natureza do problema a ser estudado, bem como o recorte da
realidade que cada pesquisa pretende enfocar, devem nortear a escolha metodolgica.
Similarmente MURPHY e cols. (1998) afirmam que a razo da escolha reside no fato de
que este mtodo de pesquisa pode ser uma ferramenta til para iluminar os fatores que
sustentam prticas profissionais que so tidas como no efetivas, inapropriadas ou
prejudiciais em cuidados de sade. Para ANDR (1983) e LEFVRE e LEFVRE
(2000), esta tcnica permite apreender o carter complexo e multidimensional dos
fenmenos em sua manifestao natural, sendo que estes aparecem naturalmente nos
discursos dos indivduos, como depoentes e como sujeitos sociais, situados num dado
ca