Texto 2 Carnavais Malandros e Herc3b3is1

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 1 Carnavais, Malandros e Heróis – Para uma sociologia do dilema brasileiro. (Texto 02) Roberto DaMatta – Resumo e comentários de Marcelo Loyola Fraga Rotinas e Ritos As festas são momentos extraordinários marcados pela alegria e por valores considerados altamente positivos. A rotina da vida diária é que é vista como negativa. Daí o cotidiano ser designado pela expressão dia-a- dia ou, mais significativamente, vida ou dura realidade da vida. Em outras palavras, sofre- se na vida, na rotina impiedosa e automática do cotidiano, em que o mundo é reprimido pelas hierarquias do poder do “sabe com quem está falando?”, e, obviamente, do “cada coisa em seu lugar”. Assim, pode-se dizer que o mundo automático da vida diária é o mundo das hierarquias e do caxias como paradigmas do comportamento quadradamente pautados pelas normas vigentes. A associação do nome do patrono do Exército a um tipo de comportamento formal, pautado por uma extrema preocupação com o cumprimento das normas, mais considerado de forma pejorativa, parece indicar a percepção complexa que temos da nossa ordem social, que nos permite leituras duplas ou triplas da sociedade brasileira. O carnaval e o dia da Pátria: uma comparação O ponto focal do Dia da Pátria é a passagem pelo local sacralizado onde se presta continência às mais altas autoridades constituídas. O povo faz o papel de assistente, e, junto com os soldados prestigia o ato de solidariedade e de respeito às autoridades e aos símbolos nacionais (a bandeira e as armas da República), por meio do sinal paradigmático de continência. O desfile militar cria um sentido de unidade, sendo seu ponto crítico a dramatização da idéia de corporação nos seus gestos, vestes e verbalizações, que são sempre idênticos. No dia da Pátria, assim, ficam separados autoridades e povo e, dentre as autoridades, aquelas que detêm e controlam maior ou menor parcela de poder. Como o desfile carnavalesco reúne um pouco de tudo – a diversidade na uniformidade, a homogeneidade na diferença, o pecado no ciclo temporal cósmico e religioso, a aristocracia de costume na pobreza real dos atores -, ele remete a vários subuniversos simbólicos da sociedade brasileira, podendo ser chamado de um desfile polissêmico. O oposto é o que ocorre no desfile militar do Dia da Pátria, em que, embora exista obviamente uma reunião do povo com as autoridades, sua separação é patente e o foco dos símbolos, gestos e falas rituais é unívoco. O que caracteriza os dois rituais, em termos dos grupos que o patrocinam é, então, a natureza desses grupos. Assim se diz que carnaval é uma festa do povo, ao passo que o Dia da Pátria é um ritual que focaliza muito mais (por sua organização interna e externa) as autoridades e os símbolos nacionais. Num caso, os grupos acentuam suas posições rituais em homologia com as posições que ocupam no mundo cotidiano. A hierarquia é, pois, mantida e, por meio de uma dramatização, manifesta. No outro as posições sociais ocupadas no cotidiano são neutralizadas ou invertidas: os rituais populares são ritos que objetivam o encontro, não a separação. E, realmente, na Independência, comemora-se o nascimento (ou pré-nascimento) do Estado Burguês, teoricamente aristocrático. Mas, no carnaval, a comemoração é cósmica (universal). Aqui celebra-se o estado de ser pobre e destituído. Desse modo, enquanto no primeiro caso o foco é a virtude burguesa da individualização ostensiva, a separação das fronteiras, no segundo focaliza-se o povo como massa não-individualizada. A ênfase é no encontro e no cerne da sociedade em sua vertente criativa fundamental que sempre se representa pelo que se chama de popular. O caso dos rituais brasileiros constitui um bom exemplo de três modos possíveis de salientar e tornar manifesto, por meio de um discurso específico, aqueles aspectos considerados importantes da estrutura da sociedade brasileira. Assim, o primeiro discurso – o Dia da Pátria - salienta os aspectos rotinizados (e por isso mesmo implícitos e internalizados) da ordem social. Traz à tona a hierarquia que é parte do sistema social, e é dominado pela ênfase com que tal sistema de posições é salientado. O segundo discurso possível é aquele que focaliza (ou destaca) os aspectos ambíguos da ordem social. É o que acontece no carnaval, quando o foco do rito parece ser o conjunto de sentimentos, ações, valores, grupos e categorias que cotidianamente são inibidos por serem problemáticos. Aqui o foco é o que está nas margens, nos limites e nos interstícios da sociedade. O discurso das festas religiosas, por seu turno, permite surpreender uma perspectiva da estrutura social em que o foco é simultaneamente os valores locais e universais.

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    Carnavais, Malandros e Heris Para uma sociologia do dilema brasileiro. (Texto 02) Roberto DaMatta Resumo e comentrios de Marcelo Loyola Fraga Rotinas e Ritos As festas so momentos extraordinrios marcados pela alegria e por valores considerados altamente positivos. A rotina da vida diria que vista como negativa. Da o cotidiano ser designado pela expresso dia-a-dia ou, mais significativamente, vida ou dura realidade da vida. Em outras palavras, sofre-se na vida, na rotina impiedosa e automtica do cotidiano, em que o mundo reprimido pelas hierarquias do poder do sabe com quem est falando?, e, obviamente, do cada coisa em seu lugar. Assim, pode-se dizer que o mundo automtico da vida diria o mundo das hierarquias e do caxias como paradigmas do comportamento quadradamente pautados pelas normas vigentes. A associao do nome do patrono do Exrcito a um tipo de comportamento formal, pautado por uma extrema preocupao com o cumprimento das normas, mais considerado de forma pejorativa, parece indicar a percepo complexa que temos da nossa ordem social, que nos permite leituras duplas ou triplas da sociedade brasileira. O carnaval e o dia da Ptria: uma comparao O ponto focal do Dia da Ptria a passagem pelo local sacralizado onde se presta continncia s mais altas autoridades constitudas. O povo faz o papel de assistente, e, junto com os soldados prestigia o ato de solidariedade e de respeito s autoridades e aos smbolos nacionais (a bandeira e as armas da Repblica), por meio do sinal paradigmtico de continncia. O desfile militar cria um sentido de unidade, sendo seu ponto crtico a dramatizao da idia de corporao nos seus gestos, vestes e verbalizaes, que so sempre idnticos. No dia da Ptria, assim, ficam separados autoridades e povo e, dentre as autoridades, aquelas que detm e controlam maior ou menor parcela de poder. Como o desfile carnavalesco rene um pouco de tudo a diversidade na uniformidade, a homogeneidade na diferena, o pecado no ciclo temporal csmico e religioso, a aristocracia de costume na pobreza real dos atores -, ele remete a vrios subuniversos simblicos da sociedade brasileira, podendo ser chamado de um desfile polissmico. O oposto o que

    ocorre no desfile militar do Dia da Ptria, em que, embora exista obviamente uma reunio do povo com as autoridades, sua separao patente e o foco dos smbolos, gestos e falas rituais unvoco. O que caracteriza os dois rituais, em termos dos grupos que o patrocinam , ento, a natureza desses grupos. Assim se diz que carnaval uma festa do povo, ao passo que o Dia da Ptria um ritual que focaliza muito mais (por sua organizao interna e externa) as autoridades e os smbolos nacionais. Num caso, os grupos acentuam suas posies rituais em homologia com as posies que ocupam no mundo cotidiano. A hierarquia , pois, mantida e, por meio de uma dramatizao, manifesta. No outro as posies sociais ocupadas no cotidiano so neutralizadas ou invertidas: os rituais populares so ritos que objetivam o encontro, no a separao. E, realmente, na Independncia, comemora-se o nascimento (ou pr-nascimento) do Estado Burgus, teoricamente aristocrtico. Mas, no carnaval, a comemorao csmica (universal). Aqui celebra-se o estado de ser pobre e destitudo. Desse modo, enquanto no primeiro caso o foco a virtude burguesa da individualizao ostensiva, a separao das fronteiras, no segundo focaliza-se o povo como massa no-individualizada. A nfase no encontro e no cerne da sociedade em sua vertente criativa fundamental que sempre se representa pelo que se chama de popular. O caso dos rituais brasileiros constitui um bom exemplo de trs modos possveis de salientar e tornar manifesto, por meio de um discurso especfico, aqueles aspectos considerados importantes da estrutura da sociedade brasileira. Assim, o primeiro discurso o Dia da Ptria - salienta os aspectos rotinizados (e por isso mesmo implcitos e internalizados) da ordem social. Traz tona a hierarquia que parte do sistema social, e dominado pela nfase com que tal sistema de posies salientado. O segundo discurso possvel aquele que focaliza (ou destaca) os aspectos ambguos da ordem social. o que acontece no carnaval, quando o foco do rito parece ser o conjunto de sentimentos, aes, valores, grupos e categorias que cotidianamente so inibidos por serem problemticos. Aqui o foco o que est nas margens, nos limites e nos interstcios da sociedade. O discurso das festas religiosas, por seu turno, permite surpreender uma perspectiva da estrutura social em que o foco simultaneamente os valores locais e universais.

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    Tudo leva suposio de que haja uma tentativa nesses festivais de conciliar o povo com o Estado por meio do culto a Deus (ou ao santo), permitindo o encontro e convivncia dos diversos elementos descontnuos da estrutura social sob a gide da Igreja, corporao que tem o monoplio das relaes com o espiritual. As festas religiosas, por colocarem lado a lado e num mesmo momento as autoridades e o povo, os santos e os pecadores, os homens sadios e os doentes, atualizam em seu discurso uma sistemtica neutralizao de posies, grupos e categorias sociais, exercendo uma espcie de Pax Catholica. Pode-se concluir que, Roberto DaMatta expressa em suas comparaes com os discursos, que os rituais dizem as coisas tanto quanto as relaes sociais (sagradas ou profanas, locais ou nacionais, formais ou informais). Tudo indica que o problema que, no mundo ritual, as coisas so ditas com mais veemncia, com maior coerncia e com mais clareza s mensagens sociais. Destaca, ainda, que no h ritualizao que no esteja utilizando um mecanismo cujas intenes so neutralizar, reafirmar ou pr tudo de cabea para baixo. E conclui que, devemos prestar mais ateno s relaes sociais e aos sistemas dessas relaes do que aos efeitos de suas combinaes, como parece ser o caso dos rituais. A casa e a rua DaMatta(1997) considera que a oposio entre rua e casa bsica, podendo servir como instrumento poderoso na anlise do mundo social brasileiro, sobretudo quando se deseja estudar a sua ritualizao. Rua est relacionado a descontrole e massificao e casa est relacionado a controle e autoritarismo. A rua indica basicamente o mundo, com seus imprevistos, acidentes e paixes, ao passo que casa remete a um universo controlado, onde as coisas esto nos seus devidos lugares. Por outro lado, a rua implica movimento, novidade, ao, ao passo que a casa subentende harmonia e calma. Local de calor (como revela a palavra de origem latina lar, utilizada em portugus para casa) e afeto. E mais, na rua se trabalha, em casa se descansa. Assim, os grupos sociais que ocupam a casa so radicalmente diversos daqueles da rua. Na casa temos associaes regidas e formadas pelo parentesco e relaes de sangue; na rua, as relaes tm um carter indelvel de escolha, ou implicam essa possibilidade. Assim, em casa as relaes so regidas naturalmente pela hierarquia do sexo e das idades, como homens e mais velhos tendo a precedncia; ao passo que na rua preciso muitas vezes algum esforo para se localizar e

    descobrir essas hierarquias, fundadas que esto em outros eixos. Desse modo, embora ambos os domnios devam ser governados pela hierarquia fundada no respeito, conceito relacional bsico no universo social brasileiro, o local bsico do respeito se situa nas relaes entre pais e filhos, sobretudo no eixo que, em muitos contextos, parece reproduzir nitidamente a relao patro-empregado. O trao distintivo do domnio da casa parece ser o maior controle das relaes sociais, o que certamente implica maior intimidade e menor distncia social. Minha casa o local da minha famlia, da minha gente ou dos meus, conforme falamos coloquialmente no Brasil. Mas a rua implica uma certa falta de controle e um afastamento. o local do castigo, da luta do trabalho. Numa palavra, a rua o local daquilo que os brasileiros chamam de dura realidade da vida. A rua como categoria genrica em oposio a casa, o local pblico, controlada pelo Governo ou pelo destino, essas foras impessoais sobre as quais o nosso controle mnimo. Nesse sentido, a rua equivalente categoria mato ou floresta do mundo rural. E aqui estamos novamente falando de um domnio semidesconhecido e semicontrolado, povoado de personagens perigosos. Assim, na rua e no mato que vivem os malandros, os marginais e os espritos, essas entidades com quem nunca se tem relaes contratuais precisas. Sabe com quem est falando? Um ensaio sobre a distino entre indivduo e pessoa no Brasil DaMatta considera que uma pessoa usar a expresso Sabe com quem est falando? quando: a) sentir sua autoridade ameaada ou diminuda; b) desejar impor de forma cabal e definitiva o seu poder; c) inconsciente ou conscientemente perceber no seu interlocutor uma possibilidade de inferioriz-lo em relao ao seu status social; d) por pessoa interiormente fraca ou que sofre por complexo de inferioridade; e) o interlocutor, de uma forma ou de outra, percebido como ameaa ao cargo que ocupa. O sabe com quem est falando? tem inmeras variantes, seus equivalentes: Quem voc pensa que ?, Onde voc pensa que est?, Recolha-se a sua insignificncia!, V se te enxerga!, Voc no conhece o seu lugar?, Veja se me respeita!, Ser que no tem vergonha na cara?, Mais respeito!, etc. As expresses podem realizar o mesmo ato expressivo e consciente que, na sociedade

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    brasileira parece fundamental para o estabelecimento (ou restabelecimento) da ordem e da hierarquia. Nota-se que a maioria dessas expresses assume uma forma interrogativa, o que, no Brasil, surge como um modo evidentemente no cordial. Em nossa sociedade, a indagao est ligada ao inqurito, forma de processamento jurdico acionado quando h suspeita de crime ou pecado, de modo que a pergunta deve ser evitada. Sem a interrogao, a vida social parece correr no seu fluxo normal, de modo que possvel postular uma provvel ligao entre o temor das formas interrogativas e as sociedades preocupadas com a hierarquia, onde normalmente tudo deve estar no seu lugar. A pergunta em tais sistemas pode configurar uma tentativa de tudo revolucionar, detendo (ou suspendendo) a rotina santificada do sistema. Assim, no de se estranhar a surpresa dos brasileiros em pases como os Estados Unidos, onde a pergunta parte normal do mundo das relaes sociais. Alm disso, descobrem-se formas interrogativas desagradveis por l, mas de modo bastante diverso. Como j disse com clareza Andr Maurois: queles que se julgam com superioridade suficiente para poderem passar frente dos outros na alfndega ou no restaurante, o americano dir: Quem voc julga que ? (Who do you think you are?), e obriga-lo- a ocupar o seu lugar. O exemplo no poderia ser melhor, porque no caso americano a pergunta aparece no sentido inverso, para situar o homem como um igual, e no como um superior. A forma americana contendo inclusive o verbo pensar (to think), indica que o pedante com pretenses de superioridade atua num plano de fantasia, pois, certamente ele que pensa (tomando a realidade social subjetiva) algum direito a mais do que os outros. Seus concidados de fila, ao contrrio, usam a frmula para traz-lo de volta ao mundo real, reforando as regras igualitrias e colocando no plano imaginrio e da fantasia as pretenses hierarquizantes. Assim, enquanto o Sabe com quem est falando? situa quem o usa numa posio superior, sendo um rito autoritrio de separao de posies sociais, o Who do you think you are? , inversamente, um rito igualitrio. Num caso, quem usa a frmula quem pensa ser superior. Noutro, quem se utiliza dela aquele que atingido pela pretenso autoritria. Em todos os nveis, nota-se a inverso simtrica das duas sociedades.

    No Brasil, preciso traduzir e legitimar o poderio econmico no idioma hierarquizante do sistema. E esse idioma revela as linhas das classificaes fundadas na pessoa, na intelectualidade e na considerao por uma rede de relaes pessoais. necessrio ento ser doutor e sbio, alm de rico. E estar penetrado (ou compenetrado, como falamos) por alguma instituio ou corporao perptua, como as Foras Armadas ou rgo do Estado. Os doutores assim substituram os comendadores, bares, viscondes e conselheiros do Imprio. Era o modo de manter a nobreza e as distines hierrquicas, mas usando outros recursos de diferenciao social. Ou seja, no basta apenas a posio no mundo dos negcios. Isso ser suficiente nos Estados Unidos ou na Frana. No Brasil no, preciso ser doutor. Existem medalhes em todos os domnios da vida social brasileira: na favela e no Congresso; na arte e na poltica; na universidade e no futebol; entre policiais e ladres. So as pessoas que podem ser chamadas de homens, cobras, figuras, personagens etc. e que ocorrem em qualquer campo. So os que j transcenderam as regras que constrangem as pessoas comuns daquela esfera social. algum que no precisa mais ser apresentado e com quem se deve primeiro falar (e/ou se entender). Em sistemas igualitrios, essas figuras so chamadas de VIPs (very important persons), e so raras. Em sistemas hierarquizantes, elas existem em toda parte, em todos os domnios, e so elas que fazem as conexes bsicas entre os diversos crculos hierarquizados que formam uma espcie de esqueleto do universo social. Gozam, assim, de uma fama justificada e de um prestgio especial que se manifesta no modo pelo qual so tratados: livres das regras constrangedoras do sistema, colocados unanimamente numa espcie de Nirvana social, um Himalaia das escalas hierrquicas, acima das brigas rotineiras. quando no se precisa mais usar o sabe com quem est falando?. O Sabe com quem est falando como dramatizao do mundo social

    1. Num parque de estacionamento de automveis, o guardador diz ao motorista que no h vaga. O motorista, entretanto, insiste dizendo que as vagas esto ali. Diante da negativa firme do guardador, o motorista diz irritado: Sabe com quem est falando?, e revela sua identidade de oficial do Exrcito.

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    2. Uma senhora resolve fazer compras em Copacabana e decide estacionar o carro em cima da calada, em local proibido. Aps algumas horas, o guarda a localiza e pede que ela mande o seu motorista tirar o carro daquela rea. A mulher insiste em ficar e diz Voc sabe com quem est falando? Sou a esposa do Deputado Fulano de Tal! (O desfecho ambguo, com a mulher saindo possessa e o guarda ficando totalmente embaraado de medo e vexame. H casos em que dias depois, o guarda obrigado a pedir desculpas madame.).

    3. Algum viaja para o exterior e deseja importar algum material taxado pela alfndega. Entra em contato com parentes, que finalmente localizam algum na alfndega. No dia da chegada, estando tudo combinado, a pessoa passa pela fiscalizao sem problemas, pois o fiscal sabe com quem est falando.

    4. H uma batida de automveis. Os dois motoristas saltam de seus carros esperando o pior. Um deles grita: Sabe com quem est falando? Sou coronel do Exrcito! E o outro diz Eu tambm! Ento eles se olham, reconhecem-se e resolvem enfrentar o problema com calma.

    5. Na ante-sala de um gerente de banco, algumas pessoas esperam sua vez. Entra um senhor, e, aps esperar com impacincia alguns minutos, diz num vozeiro: sabe com quem est falando? Sou Fulano de Ta! A secretria, nervosa, vai imediatamente ao gerente, e ele logo depois atendido.

    Alguns pontos so comuns a todos os casos: configuram uma situao dramtica de grave conflito entre duas pessoas. Em situaes assim, o tom de voz, expresso facial e os gestos em geral so tensos, reveladores de que as pessoas implicadas esto em extremo grau de excitao. como falamos no Brasil: uma situao tpica de Deus me livre ou Deus nos acuda. Isto , um momento em que o senso comum define como fim do mundo, quando as regras do cotidiano esto inteiramente suspensas e as pessoas, freqentemente possessas de raiva e indignao, esto entregues a si mesmas e ao confronto cara a cara. claro que em tais situaes h uma platia, de modo que o caso logo se transforma num negcio grupal, com cada um dos disputantes procurando convencer o grupo a tomar o seu partido contra o outro. E o grupo agindo como mediador e legitimador entre os dois. Como conseqncia, ocasies assim suspendem as rotinas da vida social,

    fazendo com que as testemunhas cogitem sobre a prpria natureza da ordem por meio de julgamentos tpicos e definitivos. comum ento ver-se nas dramatizaes mais intensas e duradouras do sabe com quem est falando? meneios negativos de cabeas acompanhados de expresses tais como o fim..., o Brasil, o mundo est mesmo virado, esse Brasil est perdido, veja voc..., onde que ns estamos?, onde j se viu? expresses que revelam as frustraes cotidianas e uma certa desconfiana no sistema de regras que governa o mundo. Depois de um desagradvel sabe com quem est falando?, quando o mais forte acaba por vencer o mais fraco, fica-se realmente convencido de que o mundo ruim, e que o melhor, o ideal mesmo, a orientao para a casa e a famlia, nunca para a rua e para o mundo onde a vida se manifesta de forma injusta e cruel. Assim o sabe com quem est falando? contribui e manifesta essa desconfiana bsica do mundo que nos distingue do universo puritano dos norte-americanos. Das distines entre indivduo e pessoa A noo de pessoa pode ser caracterizada como uma vertente coletiva de individualidade, uma mscara colocada em cima do indivduo ou entidade individualizada (cl, famlia, clube, associao etc.) que desse modo se transforma em ser social. Quando a sociedade atribui mscaras a elementos que deseja incorporar no seu bojo, o faz por meio de rituais, penetrando por assim dizer essa coisa que deve ser convertida em algo socialmente significativo. Isso equivale a tomar algo que antes era empiricamente dado (algo natural), como uma criana, uma rvore, um pedao de pedra, uma casa recm construda, para elaborar uma relao essencial, ideologicamente marcada. Resumindo, diria que a noo de indivduo e de pessoa recobre as seguintes caractersticas:

    Indivduo Pessoa Livre, tem direito a um espao prprio

    Presa totalidade social qual se vincula de modo necessrio

    Igual a todos os outros Complementar aos outros

    Tem escolhas que so vistas como o seu direito fundamental

    No tem escolhas

    Tem emoes particulares

    Tem emoes sociais

    A conscincia individual

    A conscincia social

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    A amizade bsica no relacionamento = escolhas

    A amizade residual e juridicamente definida

    Faz as regras do mundo onde vive

    Recebe as regras do mundo onde vive

    No h mediao entre ele e o todo

    A segmentao a norma

    No Brasil, tudo indica que temos uma situao na qual o indivduo a noo moderna, superimposta a um poderoso sistema de relaes pessoais. Assim, o sabe com quem est falando?, o carnaval, o futebol, a patronagem e o sistema de relaes pessoais so fenmenos estruturais. Em formaes sociais desse tipo, a oposio indivduo/pessoa sempre mantida, ao contrrio das sociedades que fizeram sua reforma protestante, quando foram destrudos, como demonstra Max Weber (1967), os mediadores entre o universo social e o individual. No mundo protestante, desenvolveu-se uma tica do trabalho e do corpo, propondo-se uma unio igualitria entre o corpo e a alma. J nos sistemas catlicos, como o brasileiro, a alma continua superior ao corpo, e a pessoa mais importante que o indivduo. Assim, continuamos a manter uma forte segmentao social tradicional, com todas as dificuldades para a criao das associaes voluntrias que so a base da sociedade civil, fundamento do Estado Burgus, liberal e igualitrio, dominado por indivduos. Temos ento no Brasil, ao lado do sabe com quem est falando?, as famosas expresses preto de alma branca e dinheiro no traz felicidade, tudo isso junto com a equao segundo a qual trabalho igual a castigo e riqueza sinnimo de sujeira, de coisa ilcita. Basta ler alguns aforismos de Bem Franklin (in Weber, 1967) para ver como a idia do capitalismo entrar no mundo, e no fugir ou renunciar a ele, como parece ser o caso entre ns. Desse modo, no sistema protestante (e capitalista), o corpo vai junto com a alma, o dinheiro segue o trabalho, e o indivduo faz o mundo e suas regras. J entre ns, o corpo menor do que a alma, dinheiro e trabalho so coisas separadas e ss as pessoas que comandam. A idia de uma sociedade segmentada, com as oposies clssicas entre homem/mulher, velho/moo, rua/casa, boa vida/trabalho. No Brasil, so inmeras as expresses que denotam o desprezo pelo indivduo, usado como sinnimo de gente sem princpios, um elemento desgarrado do mundo humano e prximo da natureza,

    como os animais. Da a expresso indivduo poder ser utilizada na linguagem da crnica policial como um terrvel sinnimo para o pleno anonimato. Utilizamos ento expresses como aquele indivduo sem carter, ou ou o indivduo assassinou o menino sem piedade etc., tomando a individualizao no seu sentido literal, como para exprimir a realidade de algum que foi incapaz de dividir-se, de dar-se socialmente. Ficando indivisa, aquela criatura no foi capaz de ligar-se na sociedade, no foi penetrada por ela, como ocorre quando se uma pessoa. Da no Brasil, o individualismo ser tambm um sinnimo e expresso cotidiana de egosmo, um sentimento ou atitude social condenada entre ns. No Brasil, assim, o indivduo entra em cena, todas as vezes em que estamos diante da autoridade impessoal que representa a lei universalizante, a ser aplicada para todos. E, j vimos quando usamos o sabe com quem est falando? ou formas mais sutis e brandas de revelar a verdadeira identidade social. No mais como cidados da Repblica, iguais perante a lei, mas como pessoas da sociedade, relacionadas essencialmente com certas personalidades e situadas acima da lei. Desenvolvendo ao longo dos anos essa maneira de hierarquizar e manter as hierarquias do mundo social, criamos os despachantes ou padrinhos para baixo, esses mediadores que fazem as intermediaes entre a pessoa e o aparelho de Estado quando se deseja obter um documento como o passaporte ou a nova placa do carro, as pessoas contratando um despachante podem dispensar filas e um tratamento impessoalizado, quando se est sujeito aos vexames de um tratamento igualitrio que sempre sinnimo de tratamento inferior. O despachante, ento, esse padrinho para baixo, garante um tratamento diferenciado em locais onde operam as regras impessoais, sua lgica de funcionamento sendo a mesma do padrinho (ou mediador para cima), que nos relaciona ao mundo social em geral como pessoas. Voc deve ter ouvido falar da expresso quem tem padrinho no morre pago!. No sistema social brasileiro, ento, a lei universalizante e igualitria utilizada freqentemente para servir como elemento fundamental de sujeio e diferenciao poltica e social. Em outras palavras, as leis s se aplicam aos indivduos e nunca s pessoas; ou, melhor ainda, receber a letra fria e dura da lei tornar-se imediatamente um indivduo. Poder personalizar a lei sinal de que se uma

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    pessoa. Desse modo, o sistema legal que define o chamado Estado liberal moderno serve em grande parte s sociedade semitradicionais como o Brasil como mais um instrumento de explorao social, tendo um sentido muito diverso para os diferentes segmentos da sociedade e para quem est situado em diferentes posies dentro do sistema social. J o conjunto de relaes pessoais sempre um operador que ajuda a subir na vida, amaciando e compensando a outra vertente do sistema. As reas de Passagem Mas reduzir nossa sociedade a apenas dois universos (o das pessoas e a dos indivduos) seria simplificar demais o problema. Porque existem zonas de conflito e tambm zonas de passagem entre eles, e essas zonas so crticas para o entendimento de alguns processos sociais brasileiros. Vimos acima alguns dos dilemas colocados pelas relaes entre os dois sistemas, pois fica claro que a lei uma faceta indissocivel da moralidade pessoal e do jeitinho, do mesmo modo que o Caxias o outro lado do malandro, e o carnaval o reverso da parada de Sete de Setembro. A moralidade pessoal, todavia, com seu cdigo de interesses, intimidades e respeitos, acima circularmente os mecanismos jurdicos impessoais, de modo que as relaes entre os dois sistemas so complexas e problemticas. Vejamos agora alguns casos de passagem de um sistema ou domnio a outro, ou seja: quando e como os indivduos se transformam em pessoas e quando as pessoas se transformam em atividades. Tomemos, inicialmente, a trajetria mais bsica e universal entre ns, que vai do nascimento at a idade adulta, quando o indivduo entra no mundo. Aqui a oposio bsica aquela entre a casa e a rua. Na casa as relaes so marcadas pelo lao de sangue ou de substncia, pelo dormir, pelo comer juntos, por uma atmosfera de estar meio dentro e meio fora do mundo real. Numa casa, no seio da famlia, fazemos a primeira passagem fundamental, pois, nascendo indivduos, somos transformados em pessoas quando ganhamos o nosso nome no ritual de batismo, que nos liga ao mundo e sociedade maior. Na casa ou no lar, s temos pessoas, e os papis so vistos como complementares: velho/jovem; homem/mulher; pais/filhos; marido/mulher; famlia/empregada domstica; sala/quarto etc. Na famlia e na casa, em conseqncia, o individualismo banido e qualquer comportamento individualizante vivido como

    uma ameaa vida do grupo. Podemos, pois, dizer que no Brasil o domnio da pessoa o da famlia e o da casa, onde todos se sentem agasalhados e protegidos da famosa e dramtica luta pela vida. Mas o que significa a expresso luta pela vida e suas congneres vida, dura realidade da vida, sair de casa para ganhar a vida, mulher da vida, a vida dura etc.? Todas indicam a importncia da dicotomia casa/rua como dois domnios sociais distintos e bsicos no universo social do Brasil. O momento de sada de casa , deste modo, dramtico. E, porque efetivamente marcamos o mundo em termos de domnios e posies com regras internas diferenciadas, todas as passagens so perigosas e muito bem marcadas. Do primeiro dia na escola ao primeiro dia no trabalho, passando por todos os rituais como batismo, crisma, os aniversrios e, sobretudo, as formaturas, todos os movimentos so ocasies para uma aguda tomada de conscincia de afastamento do grupo de substncia e do lar, esse ponto de referncia fixo na vida de qualquer brasileiro. Este movimento representa a passagem da pessoa (em casa) para indivduo (rua, quando se entra no mercado de trabalho), sendo poucas as pessoas que ingressam no mercado de trabalho sem a passagem pelo estado de indivduo, desconhecido e s, lutando para ser algum. Normalmente, a passagem de pessoa a indivduo e depois a pessoa, quando o emprego se torna familiar e laos de simpatia, amizade e considerao so estabelecidos com os patres. E toda troca de emprego assim, existe este movimento da passagem de pessoa a indivduo e depois o retorno para pessoa. Ento no por mero acaso que os brasileiros no exterior sentem saudade, ou seja, vm descobrir a terrvel nostalgia do estado de solido, quando se situam diante de um mundo impessoal, sem nenhuma relao de mediao e de complementaridade com ele. Pedro Malasartes e o paradoxo da malandragem Aqui DaMatta (1999) faz uma comparao entre o Caxias e o malandro, o trabalhador honesto e o astuto. Aponta que est na cultura brasileira, que o trabalho puro e simples no pode ser tomado como um mediador perfeito entre a pobreza e a riqueza, pois ningum fica rico com o trabalho, mas por meio de um golpe de sorte, por intermdio de um padrinho (ou madrinha), pelos favores de um patro ou

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    algum que nos d a mo e nos ajuda a subir. Como compensao, a riqueza no traz necessariamente a felicidade. Temos, nessa narrativa, mais uma estrutura de hierarquizao da estrutura social brasileira. Pois conforme diz a ideologia, ningum muda de posio social somente pelo trabalho e pelo dinheiro. preciso alguma coisa mais: um pouco de nobreza, muita sorte, alguma transformao substantiva, interna. A vadiagem e a astcia (a malandragem) podem ser traduzidas sociologicamente como a recusa de transacionar comercialmente com a prpria fora de trabalho. Ou seja, de pr a sua fora de trabalho no mercado, j que isso implica graas a demonstrao de Marx a apresentao da prpria pessoa moral nesse mercado. Em outras palavras, o malandro prefere reter para si sua fora de trabalho e suas qualificaes. O vadio, assim, aquele que no entra no sistema com sua fora de trabalho, e fica flutuando na estrutura social, podendo nela entrar ou sair, ou ainda a ela transcender. A astcia, por seu turno, pode ser vista como um equivalente do jeitinho como um modo estruturalmente definido de utilizar as regras vigentes na ordem em proveito prprio, mas sem destru-las ou coloc-las em causa. A origem de Pedro Malasartes (http://www.terrabrasileira.net/folclore/regioes/3contos/entesud.html) Pedro Malasartes figura tradicional nos contos populares da Pennsula Ibrica, como exemplo de burlo invencvel, astucioso, cnico, inesgotvel de expedientes e de enganos, sem escrpulos e sem remorsos. Convergem para o ciclo de Malasartes episdios de vrias procedncias europias, vivendo mesmo nos contos orais dos irmos Grimm, de Hans Andersen, dos exemplrios da Europa de Leste e do Norte. o tipo feliz de inteligncia despudorada e vitoriosa sobre os crdulos, os avarentos, os parvos, orgulhosos, os ricos e os vaidosos, expresses garantidoras da simpatia pelo heri sem carter. Em Portugal a mais antiga citao a cantiga 1132 do Cancioneiro da Vaticana: chegou Payo de maas Artes, datando de fins do sc. XIV. Na Espanha ocorre em vrios livros do sc. XVI, aproveitado literariamente, denunciando popularidade total. Na Lozana Andaluza, de Francisco Delicado, 1528, cita-se Pedro de Urdemalas. Tirso de Molina (Dom Gil de las Calzas Verdes, 2. Ato, cena primeira) compara a herona a Pedro de Urdemalas.

    Cervantes de Saavedra escreveu a Comdia Famosa de Pedro de Urdemalas (Madrid, 1615), onde o personagem vence pela arteirice imprevista, embora sem as liberdades morais dos contos populares. Ramn Laval informa que, em meados do sc. XVI, Alonso Jernimo de Salas Barbadilho publicara a primeira parte do El Sutil Cordovs Pedro de Urdemalas. D. Francisco Manuel de Melo, no aplogo dos Relgios Falantes, cita a Pedro de Malas Artes. Pedro Malasartes, Malasartes, Urdemalas, Urdemales, Urdimale, Ulimale, Undimale, veio com portugueses e espanhis para a Amrica, onde se aclimatou e vive num vasto anedotrio. O Prof. Aurlio M. Espinosa, da Stanford University, recolheu no Cuentos Populares Espaoles, III, muitos episdios em vrias provncias castelhanas. No Chile, Ramn Alvear Laval encontrou outros tantos, publicando um ensaio, Cuentos de Pedro Urdemales, Santiago de Chile, 1925, reimpresso em 1943. Maria Cadilla de Martinez fez semelhante em Porto Rico, Raices de la Tierra, Arecibo, 1941, sobre Pedro Urdemala, Pedro Urdiala ou Juan Animala. No Brasil, Slvio Romero publicou um conto, Uma das de Pedro Malas Artes, 5. do Contos Populares do Brasil, o Prof. Lindolfo Gomes divulgou doze faanhas, Contos Populares, I, 64. No Vaqueiros e Cantadores, Porto Alegre, 1939, registrei o Pedro Malasartes na poesia popular sertaneja nalgumas aventuras famosas (Pedro Malasartes no Folclore Potico Brasileiro, 183) e comentei seis aventuras suas no Contos Tradicionais do Brasil, Seis Aventuras de Pedro Malasartes, 218, Rio de Janeiro, 1946) publicando um estudo sobre o personagem (Histrias de Pedro Malasartes, A Manh, 11-6-1944, Rio de Janeiro). Jorge de Lima e Mateus de Lima publicaram (Rio de Janeiro, segunda ed. 1946) um volume, Aventuras de Malasartes, mas se trata de sucessos de Till Eulenspiegel, estranhos literatura oral brasileira. Malasartes figura com Till Eulenspiegel pela identidade de alguns processos psicolgicos e no pelos assuntos. No coincide Malasartes com os temas de seus irmos Gusman dAlfarache, Lazarillo de Tormes, Marcos de Obregn, Estebanillo Gonzles, El Buscn e outros eminentes da novelstica picaresca espanhola. O episdio mais tradicional a venda de uma pele de cavalo, urubu ou outro pssaro vivo, tido como adivinho, por anunciar o jantar escondido pela adltera e

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    expor o amante como sendo um demnio. fuso de dois temas espalhadssimos na Europa. O primeiro, Magic Cow-hide (K114, K1231, na sistemtica de Stith Thompson), elemento de um conto muito conhecido, The Rich and the Poor Peasant. Mt-1535 de Arne-Thompson, n. 61 dos irmos Grimm, divulgado por Andersen, Afanasiev, Gonzenbach. O segundo tema, identificao do amante como diabo e aproveitamento do jantar oculto, deu assunto a Cervantes para o entremez La Cueva de Salamanca (1610 ou 1611). Leite de Vasconcelos (Tradies Populares de Portugal, 294, Lisboa, 1882) registrou uma estria de Pedro Malasartes e o Homem de Visgo, que o Tar-Baby dos folcloristas ingleses e norte-americanos, uma das mais espalhadas do mundo. O Prof. Espinosa reuniu 318 variantes e h longa bibliografia na espcie (Os Melhores Contos Populares de Portugal, notas, 247, Rio de Janeiro, 1944). O nome de Pedro se associa ao apstolo So Pedro, com anedotrio de habilidade imperturbvel, nem sempre prpria do seu estado e ttulo. Na Itlia, Frana, Espanha, Portugal, So Pedro aparece como simplrio, bonacho, mas cheio de manhas e clculo, vencendo infalivelmente. Rodriguez Marn registra o Cinco Contezuelos Populares Andaluzes, onde o divino chaveiro um exemplo de finura velhaca e simplicidade ladina. Pedro Malasartes a figura humana que determinou um ciclo de faccias em maior quantidade, de exemplos e com atrao irresistvel (Amadeu Amaral, Pedro Malasartes, Tradies Populares, Instituto Progresso Editorial S. A. So Paulo, 1948; Lindolfo Gomes, Contos Populares Brasileiros, 80-97, Ed. Melhoramentos, So Paulo, s. d.; Lus da C6amara Cascudo, Contos Tradicionais do Brasil, Seis Aventuras de Pedro Malasartes, Amric Edit., Rio de Janeiro, 1946; Ramn Laval, Cuentos de Pedro Urdemales, Santiago de Chile, 1943 (na introduo estudo bibliogrfico); ver a nota do Prof. Angel Valbuena y Prat prolongando a comdia Pedro de Urdemalas, de Cervantes de Saavedra, Obras Completas, 534, Ed. M. Aguilar, Madrid, 1946; Aurlio M. Espinosa, Cuentos Populares Espaoles, 1., os contos, 407-420, III, bibliografia, notas, 130-140, Madrid, 1946, 1947). Alusio de Almeida, O Vigarista Malazarte (contos e notas), sep. Investigaes, n. 28, S. Paulo, 1941. Exerccio: Trace um paralelo entre A justificativa de desempenho ou meritocracia brasileira de Lvia Barbosa, em Igualdade e Meritocracia, e o Sabe

    com quem est falando? de Roberto DaMatta, enfatizando a viso do indivduo x pessoa e rua x casa discutido por Roberto DaMatta em Carnavais, Malandros e Heris: para uma sociologia do dilema brasileiro.