Texto Complementar - Tema 4 Cristo se refere à Ressurreição
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3º Curso Virtual de Teologia do Corpo – 2010 ____________________________________________________ 1
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Cristo se Refere à Ressurreição
Introdução
1. Depois da reflexão sobre o ―princípio‖ e sobre a
condição do ―coração humano‖ no período
teológico da ―história‖, o Papa João Paulo II se
refere agora ao ―homem escatológico‖, dentro da
realidade da ressurreição futura.
2. Esse ciclo da Teologia do Corpo é constituído
de 21 audiências gerais, proferidas por João Paulo
II entre 11 de novembro de 1981 e 21 de julho de
1982.
3. Nesse ciclo o Papa mostra uma visão profunda
da ressurreição, talvez nunca antes exposta com
tanta clareza. Além disso, fala do celibato ―para o
Reino de Deus‖ como uma antecipação, em certo
sentido, dessa realidade.
As Palavras de Cristo
4. Convém, desta vez, referirmo-nos às palavras
do Evangelho nas quais Cristo se refere à
ressurreição: palavras que têm importância
fundamental para entender o matrimônio no
sentido cristão e também "a renúncia" à vida
conjugal pelo "reino dos céus". (TdC 64)
5. Ao lado dos dois outros importantes diálogos –
nomeadamente, aquele em que Cristo faz
referência ao "princípio" (ver Mt 19, 3-9 e Mc 10,
2-12), e o outro no qual ele se refere ao [ser]
interior do homem (o "coração"), indicando o
desejo [redutivo] e a concupiscência da carne
como fontes do pecado (ver Mt 5, 27-32) – o
diálogo que nos propomos a analisar agora
constitui, diria, a terceira componente da tríade
das enunciações do próprio Cristo: tríade de
palavras essenciais e constitutivas para a teologia
do corpo. Neste diálogo Jesus refere-se à
ressurreição, revelando assim uma dimensão
completamente nova do mistério do homem. (TdC
64)
6. A revelação desta dimensão do corpo,
estupenda no seu conteúdo – mas ligada com o
Evangelho relido o seu conjunto e em
profundidade – manifesta-se no colóquio com os
saduceus, "os quais afirmam que não há
ressurreição" (Mt 22, 23): ―Havia sete irmãos. O
mais velho casou-se com uma mulher e morreu
sem deixar descendência. O segundo, então,
casou-se com ela e igualmente morreu sem deixar
descendência. A mesma coisa aconteceu com o
terceiro. E nenhum dos sete irmãos deixou
descendência. Depois de todos, morreu também a
mulher. Na ressurreição, quando ressuscitarem,
ela será a esposa de qual deles? Pois os sete a
tiveram por esposa?‖ (Mc 12, 20-23). (TdC 64)
7. A resposta de Cristo é uma das respostas-
chaves do Evangelho. Jesus responde assim:
A Realidade da Ressurreição
8. Essencial é a observação de que, na futura
ressurreição, os homens, depois de readquirirem
os corpos na plenitude da perfeição própria da
imagem e semelhança de Deus — depois de os
readquirirem na sua masculinidade e feminilidade
— "não tomarão mulher nem marido". (...) Como
fica claro destas palavras, o matrimônio, aquela
união em que, como diz o Livro do Gênesis, "o
homem... se unirá a sua mulher e os dois serão
uma só carne" (Gen 2,24) — união própria do
homem desde o "princípio"— pertence
exclusivamente "a este mundo". O matrimônio e a
"Acaso não estais errados, porque não compreendeis as Escrituras, nem o poder de Deus? Quando ressuscitarem dos mortos, os homens e as mulheres não se casarão; serão como anjos no céu"
(Mc 12, 24-25).
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procriação não constituem o futuro escatológico
do homem. Na ressurreição perdem, por assim
dizer, a sua razão de ser. (TdC 66)
9. A ressurreição, segundo as palavras de Cristo
referidas pelos Evangelhos, significa não só a
recuperação da corporeidade e o restabelecimento
da vida humana na sua integridade, através da
união do corpo e da alma, mas também um estado
completamente novo da própria vida humana.
Encontramos a confirmação deste novo estado do
corpo na ressurreição de Cristo (ver Rom 6, 5-11).
(TdC 66)
10. As palavras "Não se casarão" parecem ao
mesmo tempo afirmar que os corpos humanos,
que foram recuperados e também renovados na
ressurreição, preservarão seu específico caráter
masculino ou feminino, e que o significado de ser
homem ou mulher no corpo será constituído e
entendido, no “outro mundo”, de modo diferente
daquilo que foi "desde o princípio" e depois em
toda a dimensão da existência terrena. (TdC 66)
11. Em Lc 20, 36 lemos que "já não poderão
morrer, pois serão iguais aos anjos; serão filhos de
Deus, porque ressuscitaram." Esse enunciado nos
permite, acima de tudo, deduzir uma
espiritualização do homem segundo uma
dimensão que é diferente daquela da vida terrena
(e até diferente daquela do "princípio"). É óbvio
que não se trata aqui de transformação da natureza
humana em uma angélica, isto é, puramente
espiritual. O contexto indica claramente que o
homem conservará no "outro mundo" a própria
natureza humana psicossomática. Se fosse de
outro modo, não teria sentido falar de
ressurreição. (...) A ressurreição significa uma
nova submissão do corpo ao espírito. (TdC 66)
12. Aqui se poderia falar também de um perfeito
sistema de forças nas relações recíprocas entre o
que é espiritual e o que é corpóreo no homem. (...)
Na ressurreição o corpo voltará à perfeita unidade
e harmonia com o espírito: o homem já não
experimentará a oposição entre o que nele é
espiritual e o que é corpóreo. A "espiritualização"
significa não só que o espírito dominará o corpo,
mas, diria, que ele permeará inteiramente o
corpo, e que as forças do espírito permearão as
energias do corpo. (...) É, portanto, uma
espiritualização perfeita, na qual a possibilidade
de uma ―outra lei [em meus membros], que luta
contra a lei de minha mente‖ é completamente
eliminada. (TdC 67)
13. Entretanto, esse estado que —como é
evidente— é essencialmente (e não só quanto ao
grau) diferente daquilo que experimentamos na
vida terrena, não significa qualquer
"desencarnação" do corpo nem, por conseguinte,
uma "desumanização" do homem. Antes, ao
contrário, significa a sua perfeita "realização". De
fato, no ser composto, psicossomático, que é o
homem, a perfeição não pode consistir numa
recíproca oposição do espírito e do corpo, mas
numa profunda harmonia entre eles, na
salvaguarda do primado do espírito. (...) A
ressurreição consistirá na perfeita participação de
tudo o que é corporal no homem em tudo que é
espiritual nele. (TdC 67)
14. As palavras dos Evangelhos atestam que o
estado do homem no "outro mundo" não será
apenas um estado de perfeita espiritualização, mas
também de fundamental "divinização" da sua
humanidade. (...) A participação na natureza
divina, a participação na vida interior do próprio
Deus, penetração e permeação daquilo que é
essencialmente humano por aquilo do que é
essencialmente divino, atingirá, então, o seu auge,
de modo que a vida do espírito humano chegará a
uma plenitude que antes lhe era absolutamente
inacessível. (...) Esta intimidade com Deus em
uma perfeita comunhão de pessoas —com toda a
sua intensidade subjetiva— não dissolverá a
subjetividade pessoal do homem, antes, pelo
contrário, a fará emergir numa medida
incomparavelmente maior e mais plena. (TdC 67)
A Ressurreição e o
Significado Esponsal do Corpo
15. A "divinização" no "outro mundo", indicada
pelas palavras de Cristo, trará ao espírito humano
tal "gama de experiências" de verdade e de amor,
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que o homem nunca seria capaz de atingir na vida
terrena. (...) Nesta "espiritualização" e
"divinização", em que o homem participará na
ressurreição, descobrimos —numa dimensão
escatológica— as mesmas características que
marcam o significado "esponsal" do corpo;
descobrimos essas características no encontro com
o mistério do Deus Vivo, que se revela mediante a
visão d'Ele "face a face". (TdC 67)
16. A comunhão (communio) escatológica do
homem com Deus, constituída graças ao amor de
uma perfeita união, será alimentada pela visão
"face a face", pela contemplação da comunhão
mais perfeita – porque é puramente divina – que é,
nomeadamente, a comunhão trinitária das
Pessoas divinas na unidade da mesma divindade.
(TdC 68)
17. Neste recíproco dom de si por parte do
homem, um dom que se tornará completamente e
definitivamente beatífico, como resposta digna de
um sujeito pessoal ao dom de si por parte de
Deus, a "virgindade", ou melhor, o estado virginal
do corpo se manifestará completamente como a
plenitude escatológica do significado "esponsal"
do corpo, como o sinal específico e a expressão
autêntica da subjetividade pessoal como um todo.
Assim, portanto, a situação escatológica na qual
"não se casarão" tem o seu sólido fundamento no
estado futuro do sujeito pessoal, quando, como
consequência da visão de Deus "face a face",
nascerá nele um amor de tal profundidade e força
de concentração sobre o próprio Deus, que
inundará completamente a sua inteira
subjetividade psicossomática. (TdC 68)
18. Professamos a fé na "comunhão dos Santos"
(communio sancturum) e a professamos em
conexão orgânica com a fé na "ressurreição do
corpo". (TdC 68)
19. Devemos pensar na realidade do "outro
mundo" nas categorias da redescoberta de uma
nova e perfeita subjetividade de cada pessoa, e, ao
mesmo tempo, na redescoberta de uma nova,
perfeita intersubjetividade de todos. Desse modo,
essa realidade significa a realização verdadeira e
definitiva da subjetividade humana, e, nesta base,
a plenitude definitiva do significado "esponsal" do
corpo. (TdC 68) O significado "esponsal" de ser
um corpo será, portanto, realizado como um
significado que é perfeitamente pessoal e
comunitário ao mesmo tempo. (TdC 69)
20. O matrimônio e a procriação em si mesmos
não determinam definitivamente o significado
original e fundamental de ser um corpo nem de
ser, enquanto corpo, homem e mulher. O
matrimônio e a procriação apenas dão realidade
concreta àquele significado nas dimensões da
história. (TdC 69)
21. Aquele perene significado do corpo humano –
à qual a existência de cada homem, oprimida pela
herança da concupiscência, trouxe
necessariamente uma série de limitações, lutas e
sofrimentos –, será então revelado de novo, e será
revelado ao mesmo tempo com tal simplicidade e
esplendor, que todo participante do "outro
mundo" encontrará, no seu corpo glorificado, a
fonte da liberdade do dom. A perfeita "liberdade
dos filhos de Deus" alimentará, com aquele dom,
também cada uma das comunhões que formarão a
grande comunidade da comunhão dos santos.
(TdC 69)
Um Novo Adão
22. Este "homem celestial" — o homem da
ressurreição, cujo protótipo é Cristo
ressuscitado— não é tanto antítese e negação do
"homem na terra" (cujo protótipo é o "primeiro
Adão"), mas sobretudo é a sua consumação e a
sua confirmação. A humanidade do "primeiro
Adão", "homem da terra", leva em si, diria, uma
particular potencialidade (que é capacidade e
prontidão) para acolher tudo o que se tornou o
"segundo Adão", o Homem celestial, ou seja,
Cristo: o que Ele se tornou na sua ressurreição.
(...) Cada homem leva em si a imagem de Adão e
cada um é também chamado a levar em si a
imagem de Cristo, a imagem do Ressuscitado.
(TdC 71)
23. Este tema tem as suas origens já nos primeiros
capítulos do Livro do Gênesis. Pode-se dizer que
São Paulo (ver 1 Cor 15, 42-49) vê a realidade da
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futura ressurreição como certa restitutio in
integrum, isto é, como a reintegração e, ao mesmo
tempo, a obtenção da plenitude da humanidade.
Não é só restituição, porque em tal caso a
ressurreição seria, em certo sentido, um retorno
àquele estado da alma antes do pecado, fora do
conhecimento do bem e do mal (ver Gen 1-2).
Mas esse retorno não corresponde à lógica interna
de toda a economia da salvação,ao mais profundo
significado do mistério da redenção. A restitutio
in integrum, ligada à ressurreição e à realidade do
"outro mundo", só pode ser a entrada em uma
nova plenitude. (TdC 72)
O Celibato para o Reino dos Céus
24. Quando a chamada à continência "para o reino
dos céus" encontra eco na alma humana, nas
condições da temporalidade, isto é, nas condições
em que as pessoas ordinariamente "tomam mulher
e tomam marido", não é difícil captar nisso uma
particular sensibilidade do espírito humano que
parece antecipar, já nas condições da
temporalidade, aquilo de que o homem se tornará
participante na ressurreição futura. (TdC 73)
25. Jesus respondeu: ―Moisés permitiu despedir a
mulher, por causa da dureza do vosso coração.
Mas não foi assim desde o princípio. Ora, eu vos
digo: quem despede sua mulher — fora o caso de
união ilícita — e se casa com outra, comete
adultério‖. Os discípulos disseram-lhe: ―Se a
situação do homem com a mulher é assim, é
melhor não casar-se‖. Ele respondeu:
26. A questão da continência para o Reino dos
Céus não é colocada em oposição ao matrimônio,
nem se baseia num juízo negativo a respeito da
sua importância. (...) Não é por causa de "não ser
melhor casar-se", nem por causa de um suposto
valor negativo do matrimônio que a continência é
observada por aqueles fazem tal opção "para o
Reino dos Céus" em suas vidas, mas em vista do
particular valor que está ligado com essa escolha e
que se deve descobrir e adotar como própria
vocação. (TdC 73)
27. Em sua doutrina, a Igreja tem a convicção de
que estas palavras não expressam um
mandamento que obriga a todos, mas um conselho
que diz respeito só a algumas pessoas: aquelas
precisamente que são capazes "de entender". E
são capazes "de entender" aqueles "a quem é
concedido". As palavras citadas indicam com
clareza a importância da opção pessoal e
simultaneamente da graça particular, isto é, do
dom que o homem recebe para fazer tal opção.
(TdC73)
28. O termo ―eunuco‖ diz respeito aos defeitos
físicos que tornam impossível a procriação no
matrimônio. Precisamente tais defeitos explicam
as duas primeiras categorias, quando Jesus fala
quer dos defeitos congênitos, quer dos defeitos
adquiridos, causados por intervenção humana. Em
ambos os casos, trata-se, portanto, de um estado
de coação externa, por isso não voluntário. Se
Cristo, no seu confronto, fala depois daqueles
"que se fizeram incapazes do casamento [eunucos]
por amor do Reino dos Céus", como de uma
terceira categoria, certamente faz esta distinção
para acentuar ainda mais o caráter voluntário e
sobrenatural dela. Voluntário, porque os
pertencentes a esta categoria "fizeram-se
eunucos"; sobrenatural, por outro lado, porque o
fizeram "para o Reino dos Céus". (TdC 74)
29. Falando daqueles que escolheram
conscientemente o celibato ou a virgindade para o
Reino dos Céus (isto é, "se fizeram eunucos"),
Cristo enfatiza —pelo menos indiretamente—
que, na vida terrena, essa escolha está conectada à
“Nem todos são capazes de entender isso, mas só aqueles a quem é concedido. De fato, existem homens impossibilitados de casar-se, porque nasceram assim; outros foram feitos assim por mão humana; outros ainda, por causa do Reino dos Céus se fizeram incapazes do casamento. Quem puder entender, entenda”.
(Mt 19, 8-12)
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renúncia e também a um determinado esforço
espiritual. (TdC 74)
30. Essa maneira de existir enquanto ser humano
(homem e mulher), aponta para a "virgindade"
escatológica do homem ressuscitado, na qual, eu
diria, o absoluto e eterno significado esponsal do
corpo glorificado será revelado na união com o
próprio Deus, na sua visão "face a face"; e
glorificado, também, mediante a união de uma
perfeita intersubjetividade, que unirá todos os
"participantes do outro mundo", homens e
mulheres, no mistério da comunhão dos santos. A
continência terrena "por amor do Reino dos Céus"
é indubitavelmente um sinal que indica esta
verdade e esta realidade. É sinal de que o corpo,
cujo fim não é a morte, tende para a glorificação;
e por esse mesmo fato já é, eu diria, um
testemunho entre os homens que antecipa a
futura ressurreição. (TdC 75)
31. A continência "por amor do Reino dos Céus"
— na medida em que é indubitável sinal do "outro
mundo"— leva em si sobretudo o dinamismo
interior do mistério da redenção do corpo (ver Lc
20, 35), e neste significado possui também a
característica de uma particular semelhança com
Cristo. (TdC 76)
Maria e José
32. O matrimônio de Maria com José (em que a
Igreja honra José como esposo de Maria e Maria
como esposa dele), encerra em si, ao mesmo
tempo, o mistério da perfeita comunhão das
pessoas, do Homem e da Mulher no pacto
conjugal, e ao mesmo tempo o mistério daquela
singular "continência por amor do Reino dos
Céus": continência que serviu a mais perfeita
"fecundidade do Espírito Santo" da história da
salvação. (TdC 75)
33. A divina maternidade de Maria é também, em
certo sentido, uma superabundante revelação
daquela fecundidade do Espírito Santo, a que o
homem submete o seu espírito, quando livremente
escolhe a continência "no corpo": precisamente, a
continência "por amor do Reino dos Céus". (TdC
75)
Celibato e Matrimônio
34. Do contexto do evangelho de Mateus 19, 10-
12, resulta de modo suficientemente claro que não
se trata aqui de diminuir o valor do matrimônio
em favor da continência e nem sequer de ofuscar
um valor com o outro. (TdC 77)
35. As palavras de Cristo (Mt 19, 11-12) se
iniciam com todo o realismo da situação do
homem e com o mesmo realismo elas o conduzem
para fora, para o chamamento em que, de maneira
nova, embora permanecendo pela sua natureza um
ser "dual" (isto é, inclinado como homem para a
mulher, e como mulher, para o homem), ele é
capaz de descobrir nesta sua solidão, que nunca
deixa de ser uma dimensão pessoal da natureza
dual de cada um, uma nova e até mesmo mais
plena forma de comunhão intersubjetiva com os
outros. (TdC 77)
36. No seu enunciado, põe Cristo porventura em
relevo a superioridade da continência ―pelo Reino
dos Céus‖ acima do matrimônio? Sem dúvida, ele
diz que esta é uma vocação "excepcional", não
"ordinária". Afirma, além disso, que é
particularmente importante, e necessária para o
Reino dos Céus. Se compreendemos a
superioridade sobre o matrimônio neste sentido,
devemos admitir que Cristo aponta para ela
implicitamente; contudo, não a exprime de modo
direto. Só Paulo dirá daqueles que escolhem o
matrimônio, que fazem "bem", e, dos que estão
dispostos a viver na continência voluntária, dirá
que fazem "melhor" (ver 1 Cor 7, 38). (TdC 77)
37. Tal é também a opinião de toda a Tradição,
tanto doutrinal como pastoral. A "superioridade"
da continência sobre o matrimônio não significa
nunca, na autêntica Tradição da Igreja, uma
depreciação do matrimônio ou uma diminuição
do seu valor essencial. Não significa tampouco
um desvio, nem sequer implícito, para as posições
maniqueístas ou um apoio a modos de avaliar e de
agir que se fundam na compreensão maniqueísta
do corpo e do sexo, do matrimônio e da geração.
A superioridade evangélica e autenticamente
cristã da virgindade, da continência, é, portanto,
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ditada pelo motivo do Reino dos Céus. Nas
palavras de Cristo, referidas por Mateus 19, 11-12
encontramos uma base sólida para admitir apenas
tal superioridade; pelo contrário, não encontramos
nelas base alguma para qualquer desmerecimento
do matrimônio que porventura pudesse estar
presente no reconhecimento daquela
superioridade. (TdC 77)
38. As palavras de Cristo referidas em Mateus 19,
11-12 (como também as palavras de Paulo na
primeira Epístola aos Coríntios, cap. 7) não
oferecem motivo para sustentar nem a
"inferioridade" do matrimônio, nem a
"superioridade" da virgindade ou do celibato com
base no fato de que o celibato, pela sua natureza,
consiste em abster-se da "união" conjugal "no
corpo". Sobre este ponto as palavras de Cristo são
decididamente claras. Ele propõe aos seus
discípulos o ideal da continência e o chamado a
ela não por motivo de inferioridade ou em
prejuízo da "união" conjugal "no corpo", mas só
"por amor do Reino dos Céus". (TdC 78)
39. O matrimônio e a continência nem se
contrapõem um ao outro, nem dividem a
comunidade humana (e cristã) em dois campos
(digamos: aqueles que são "perfeitos" por causa
da continência e aqueles que são ―imperfeitos‖ ou
menos perfeitos por causa da realidade da vida
conjugal). Mas estas duas situações fundamentais,
ou seja, como se costuma dizer, estes dois
"estados", em certo sentido explicam-se e
completam-se reciprocamente com respeito à
existência e à vida (cristã) desta comunidade.
(TdC 78)
Celibato e Significado Esponsal do Corpo
40. O perfeito amor conjugal deve ser
caracterizado pela fidelidade e pela entrega ao
único Esposo (e também pela fidelidade e entrega
do Esposo à única Esposa), sobre os quais se
fundam a profissão religiosa e o celibato
sacerdotal. Em resumo, a natureza de um e outro
amor é "esponsal", ou seja, se expressa mediante o
dom total de si. (TdC 78)
41. O amor esponsal que encontra a sua expressão
na continência "pelo Reino dos Céus", deve levar,
em seu desenvolvimento normal, à "paternidade"
ou "maternidade" no sentido espiritual (ou seja,
precisamente àquela "fecundidade do Espírito
Santo", de que já falamos), de modo análogo ao
amor conjugal que amadurece na paternidade e
maternidade física e nela se confirma exatamente
como amor esponsal. (TdC 78)
42. Parece que para esclarecer o que é o Reino dos
Céus para aqueles que por causa dele escolhem a
continência voluntária, tem particular significado
a revelação da relação esponsal de Cristo com a
Igreja (...) Sem dúvida, mediante tudo isto, o que
transparece e reluz é o amor: o amor como
prontidão a fazer de si um dom exclusivo pelo
"reino de Deus". (TdC 79)
43. Deste modo, a continência "por amor do Reino
dos Céus", a opção pela virgindade ou pelo
celibato para toda a vida, tornou-se na experiência
dos discípulos e dos seguidores de Cristo o ato de
uma resposta particular ao amor do Esposo
Divino, e por conseguinte adquiriu o significado
de um ato de amor esponsal: isto é, de um dom
esponsal de si, a fim de retribuir de modo
particular o amor esponsal do Redentor; um dom
de si entendido como renúncia, mas feito
sobretudo por amor. (TdC 79)
44. A mentalidade contemporânea habituou-se a
pensar e a falar sobretudo do instinto sexual,
transferindo para o terreno da realidade humana o
que é próprio do mundo dos seres vivos, os
animalia. (...) A aplicação do conceito de "instinto
sexual" ao homem — varão ou mulher— limita
grandemente, e em certo sentido "diminui" o que
essa mesma masculinidade-feminilidade é na
dimensão pessoal da subjetividade humana. (...)
A verdade sobre o significado esponsal do corpo
humano na sua masculinidade e feminilidade e na
estrutura pessoal da subjetividade do homem e da
mulher, parece ser neste âmbito um conceito-
chave e, ao mesmo tempo, o único conceito
apropriado e adequado. (TdC 80)
45. À luz das palavras de Cristo, devemos admitir
que esse segundo tipo de opção, ou seja, a
continência pelo reino de Deus, se realiza também
em relação com a masculinidade ou feminilidade
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própria da pessoa que faz tal opção; realiza-se
com base na plena consciência do significado
esponsal, que a masculinidade e a feminilidade
contêm em si. (TdC 80)
46. A renúncia ao matrimônio por amor do Reino
de Deus coloca em evidência, ao mesmo tempo,
aquele significado [esponsal do corpo] em toda a
sua verdade interior e em toda a sua beleza
pessoal. Pode-se dizer que esta renúncia por parte
de pessoas individuais, homens e mulheres, é em
certo sentido indispensável para um
reconhecimento mais claro do mesmo significado
esponsal do corpo em todo o ethos da vida
humana e sobretudo no ethos da vida conjugal e
familiar. (TdC 81)
A Compreensão de São Paulo acerca da
Relação entre Virgindade e Matrimônio
(1 Cor 7)
47. Em 1 Coríntios 7, encontramos um claro
encorajamento a se abster do matrimônio, e a
convicção de que a pessoa que decide se abster
―faz melhor‖ (1 Cor 7, 38). Entretanto, não
encontramos nenhum fundamento para chamar de
―carnais‖ aqueles que vivem no matrimônio, e
nem, por contraste, para chamar de ―espirituais‖
aqueles que por razões religiosas escolhem a
continência. De fato, em ambos os modos de viver
o ―dom‖ que cada um recebe de Deus está agindo,
ou seja, a graça, que traz consigo a realidade de
que o corpo é um “templo do Espírito Santo”, e
permanece como tal tanto na virgindade
(continência) quanto no matrimônio, isso se o
homem permanece fiel ao próprio dom e, em
conformidade com o seu estado ou vocação, não
―desonra‖ o ―templo do Espírito Santo‖ que é seu
corpo. (TdC 85)
48. Na doutrina de São Paulo contida acima de
tudo em 1 Coríntios 7, não encontramos nenhum
vestígio daquilo que seria depois conhecido como
―maniqueísmo‖. O Apóstolo tem plena
consciência de que – muito embora a continência
pelo reino de Deus seja sempre digna de
recomendação – ao mesmo tempo a graça, ou seja,
―o dom de Deus próprio a cada um‖, também
auxilia os esposos na vida em comum, na qual (de
acordo com as palavras de Gênesis 2, 24) estão
unidos tão intimamente que se tornam ―uma só
carne‖. (TdC 85)
Conclusão
49. ―Também nós, que temos as primícias do
Espírito, gememos em nosso íntimo, esperando a
condição filial, a redenção de nosso corpo.‖ (Rom
8, 23)
50. Na sua vida cotidiana, o homem deve ir buscar
no mistério da redenção do corpo a inspiração e a
força para vencer o mal que está latente em si sob
a forma da tríplice concupiscência. O homem e a
mulher, ligados no matrimônio, devem
cotidianamente, como a uma tarefa, reafirmar a
união indissolúvel da aliança fizeram entre si. Mas
também os homens e mulheres que
voluntariamente escolheram a continência por
amor do Reino dos Céus devem dar
cotidianamente um testemunho vivo da fidelidade
a tal escolha, escutando as diretrizes de Cristo.
(TdC 86)
51. Tudo isto, que procuramos fazer no decurso
das nossas meditações, para compreender as
palavras de Cristo, tem o seu fundamento
definitivo no mistério da redenção do corpo. (TdC
86)
________________________________________
Perguntas para estudo 1. A relação conjugal nesta terra é “ícone” ou
“imagem” do matrimônio celeste que virá. Como essa
visão pode afetar o matrimônio, namoro, ou o
discernimento de uma vocação celibatária?
2. Qual sua primeira reação ao ensinamento de Cristo
de que não haverá matrimônio no céu?
3. De acordo com JPII, como pode o celibato não ser
uma rejeição da sexualidade, mas sim uma vivência do
sentido mais profundo dessa mesma sexualidade?
4. Quais são as razões sobrenaturais para um
sacerdócio celibatário?
5. Em que sentido se diz que cada homem está
chamado a ser de alguma maneira esposo e pai, e cada
mulher está chamada a ser de alguma maneira esposa
e mãe? (Sugere-se enviar as respostas para [email protected]) ____________________________________________
© Texto elaborado pela equipe Teologia do Corpo - Brasil
exclusivamente para fins didáticos, contendo trechos das
catequeses do Papa. As citações das catequeses TdC seguem
a numeração de Michael Waldstein (ver quadro de referência
em separado) As citações bíblicas são da tradução da CNBB.