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Texto sobre Crise hidrica

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  • egio metropolitana de So Paulo vive sua maior crise hdrica desde 1930, quando comearam as medies nos sistemas de reservat- rios fornecedores de gua. A situao pior no sistema Cantareira, cujo nvel bate sucessivos recordes negativos desde o incio do ano. Responsvel pelo abastecimento de 8,8 milhes de pessoas quase a metade da populao da Grande So Paulo o Cantareira opera com o volume til esgotado desde julho. A retirada de gua do sistema s continuou porque, em maio, a Companhia de Saneamento Bsico do Estado de So Paulo (Sabesp) comeou a bombear gua do chamado volume morto. A utilizao indita da reserva tcnica, que fica abaixo das comportas das represas, fez o nvel do reservatrio subir a 18,5%. A previso da Agncia Nacional das guas (ANA), rgo federal responsvel pela gesto dos recursos hdricos brasileiros, de que o volume morto dure at novembro. Mas o cumprimento do prazo vai depender da chuva nas represas nos prximos meses.A presso das cidades

    O esgotamento dos mananciais na regio metropolitana de So Paulo no causado apenas pela falta de chuvas. Alm do rpido crescimento populacional, a alta taxa de urbanizao, que se aplica a todo o Brasil, polui os rios e dificulta o acesso gua potvel. Criado na dcada de 1970, o Cantareira foi uma resposta demanda crescente da regio. Foi ento preciso buscar gua na Bacia do Rio Piracicaba, onde fica o sistema, a 70 quilmetros da capital. Essa transferncia forada de recursos hdricos exerce presso sobre a oferta de gua para os centros urbanos, as indstrias e as plantaes do interior paulista.O crescimento desordenado das cidades agrava a dificuldade de acesso gua em qualidade e em quantidade satisfatrias. A falta de planejamento, com a verticalizao das construes (prdios), sobrecarrega as estruturas j existentes nas ruas, que muitas vezes no suportam a quantidade de gua que agora passa por ali milhes de litros se perdem por vazamento nos canos subterr- neos das cidades. Segundo um estudo do Instituto Socioambiental (ISA), as capitais brasileiras perdem, diariamente, quase metade da gua captada durante a distribuio. Sozinha, a cidade do Rio de Janeiro joga fora mais de 1,5 milho de metros cbicos por dia o equivalente a mais de 600 piscinas olmpicas. A maior parte desse desperdcio deve-se a vazamentos na rede de distribuio, ao crescimento urbano e falta de manuteno adequada s novas condies.Loteamentos clandestinos e vias pblicas beira de mananciais e em reas de vrzea, normalmente inundadas pelo fluxo dos rios em perodos de cheia, ameaam as fontes com a poluio por esgoto e lixo, industrial e domstico. Ao mesmo tempo, a grande concentrao de vias pavimentadas e de edifcios de concreto aquece a atmosfera sobre as grandes cidades, criando as chamadas ilhas de calor, que atraem nuvens pesadas e tempestades.O solo impermeabilizado (coberto pelo asfalto ou por construes) no permite que a gua das chuvas penetre at os lenis freticos, resultando em enchentes durante o vero, o perodo de chuvas.O serto e a origem das secas

    A crise hdrica em So Paulo chamou a ateno pelo ineditismo e por acontecer numa das regies mais desenvolvidas e populosas do pas. Mas uma boa parte dos mais de 10 milhes de brasileiros que moram no semirido nordestino convive com a estiagem ano aps ano. A falta contnua de chuvas desde 2011 fez com que, em 2013, ocorresse na regio a pior seca dos ltimos 50 anos. Muitos nordestinos perderam os meios que tinham para sobreviver e, sem outras alternativas, recorreram ajuda do governo ou decidiram deixar suas terras ridas, buscando trabalho bem longe do serto onde nasceram.A escassez de chuva na regio tem origem em lugares distantes e provocada principalmente por mecanismos de circulao de ventos. Na chamada Zona de Convergncia Intertropical (ZCIT), que circunda a Terra prxima linha do Equador, os ventos dos Hemisfrios Norte e Sul se encontram. A massa de ar que chega Regio Nordeste quente e mida, provocando chuvas na regio litornea, onde predomina a vegetao da Mata Atlntica. Mas, quando se movimenta em direo ao interior, j perdeu fora e umidade, e o resultado uma massa quente e seca que estaciona no serto durante longos perodos. Outros fatores que podem provocar chuva, como as frentes frias vindas do Sul do pas, nem sempre conseguem chegar ao Nordeste.

  • O resultado de tais fenmenos, ao longo de sculos, foi a formao de uma regio com clima semirido, de baixo ndice pluviomtrico anual (pouca chuva), com predominncia da vegetao da caatinga, solo raso e pedregoso e temperaturas elevadas em grande parte do ano. Alguns fenmenos que ocorrem a grande distncia agravam muito a falta de chuvas ali, como aconteceu em 2013. Um deles a temperatura da gua no Oceano Atlntico, nos dois hemisfrios. A diferena de 1 C pode fazer com que a ZCIT se movimente mais para o norte ou para o sul, provocando chuvas e novas correntes de vento em lugares distintos, piorando ou atenuando o perodo de seca. Outro fator o fenmeno do El Nio, que atua a cada dois ou sete anos e pode durar de um a dois anos. Ele provocado tambm por diferena de temperatura nas guas do Oceano Pac- fico, interferindo nas massas de ar prximas costa oeste da Amrica do Sul. Por causa da estiagem, mais de 1.400 municpios decretaram estado de emergncia. A situao s foi amenizada com as chuvas de vero de 2014, principalmente em maio.Polticas pblicas

    A seca um fenmeno natural, mas, quando prolongada, causa graves problemas, como os que atingem o serto. H relatos de secas nordestinas desde o incio da colonizao portuguesa. Na estiagem de 1983, 1 milho de sertanejos se inscreveram no programa de emergncia para receber dinheiro para a construo de audes. Muitos outros emigraram para o Sudeste e engrossaram o trabalho em construtoras e fbricas. A seca do ano passado causou a perda de 18 mil empregos na regio.Para atenuar o problema, o Estado brasileiro desenvolveu, principalmente a partir do sculo XX, polticas pblicas de combate aos efeitos da seca. O primeiro rgo criado foi o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), sob o nome de Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS), em 1909, e que existe at hoje, vinculado ao Ministrio da Integrao Nacional. Seu objetivo executar aes para beneficiar as reas atingidas e fomentar obras de proteo contra as secas e inundaes, como a construo de audes, que permitem tornar perenes rios intermitentes. Outra ao governamental foi criar uma legislao especfica para a regio, denominada ento de Polgono das Secas, em 1951.

    O atual governo federal investiu mais de 20 bilhes de reais em obras de infraestrutura, como os sistemas coletivos de abastecimento de gua, adutoras para a distribuio das guas das barragens e as prprias barragens, alm da operao de carros-pipa, construo de cisternas e recuperao de poos. Dentre as obras, est a controversa transposio doio So Francisco. A previso de gastos de 8 bilhes de reais (veja mais na pg. 173). Alguns especialistas afirmam que a construo de poos profundos e de cisternas para a coleta de gua da chuva seria uma alternativa mais eficaz e barata para combater a seca. Opositores da obra tambm argumentam que o projeto no alcanar muitas comunidades e beneficiar principalmente os grandes fazendeiros, alm de causar impactos ambientais ainda no bem mensurados no entorno do Velho Chico.Desigualdade

    O Brasil um dos pases mais ricos em recursos hdricos e abriga 12% de toda a gua potvel do mundo. Esse precioso lquido, porm, no se distribui de maneira uniforme pelo territrio nacional. Cerca de 72% das reservas encontram-se nos rios da Regio Norte, que rene menos de 5% da populao nacional. Em 2013, enquanto os nordestinos pediam chuva, as populaes ribeirinhas dos rios da Bacia do Amazonas torciam para que parasse de chover. No Amazonas, 26 municpios declararam situao de emergncia, incluindo a capital, Manaus.No Sudeste, os desafios ligados gua so de outro tipo, relacionados s grandes metrpoles e falta de planejamento e manejo adequado, pois, para se tornarem potveis para uso humano, as guas precisam passar por um processo de tratamento. Como resultado, temos uma conta difcil de fechar. Mas, mesmo em lugares em que h abundncia, muitas vezes a populao no recebe gua tratada. Existem propostas para garantir a oferta de gua a todos os brasileiros, tornando o resultado desse clculo mais igualitrio. Segundo especialistas, a soluo passa por aes como o controle de uso das reservas, monitoramento constante do meio ambiente, planejamento urbano eficiente, investimentos em cisternas, construo de poos e de infraestrutura de distribuio de gua tratada.

    Um tanto da gua potvel no est luz do sol, mas escondido em aquferos, formaes geolgic

  • ubterrneas. Os especialistas calculam que essas reservas guardam um volume 100 vezes maior que o da gua doce superficial existente no planeta. E o Brasil privilegiado tambm nesse quesito, pois possui 27 aquferos, incluindo um dos maiores do mundo: o Aqufero Guarani, que se espalha sob 1 milho de quilmetros quadrados, pelo subsolo de oito estados do Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil. O restante est sob os territrios de Uruguai, Paraguai e Argentina. H estudos apontando que o depsito reserva 37 mil quilmetros cbicos de gua, volume suficiente para abastecer, sozinho, a populao brasileira por muitos sculos. Mas ainda difcil ter preciso nos clculos, pois h poucas pesquisas a respeito.

    O uso das reservas hdricas do subsolo requer planejamento. Os aquferos abastecem rios e poos, mas, se sua gua for retirada num ritmo mais intenso do que o de reposio natural (que muito lento), o nvel pode descer perigosamente. A poluio tambm ameaa os reservatrios: o Guarani corre risco nos pontos em que a gua aflora naturalmente superfcie. J h sinais de contaminao por esgoto e agrotxicos, que chegam at o subsolo quando jogados por indstrias e fazendas e so absorvidos, particularmente no Rio Grande do Sul e no interior de So Paulo.Os usos da gua

    Energia e gua esto diretamente relacionadas. So elementos-chave para sistemas agrcolas, fbricas e moradias, e condies bsicas para atender s necessidades humanas em alimentao, moradia e sade.

    Do meio ambiente mesa

    A gua que sai das torneiras e chuveiros, ou mesmo a que ocupa a garrafinha nos supermercados, s chega at ns porque existe uma rede de captao, distribuio e tratamento. A gua utilizada de diversas formas, no nosso modo de vida atual, no qual ela essencial para atender s necessidades humanas em alimentao, moradia e sade. Nem todos os brasileiros tm acesso a gua de boa qualidade. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), em 2012, apesar de 85,4% dos domiclios contarem com rede geral de abastecimento, apenas 57% possuem rede de coleta. No Norte, a taxa de 13%.

    Ainda que distribuda de maneira desequilibrada pelo territrio nacional, h abundncia do recurso vital: estima-se que o Brasil use menos de 10% do total de sua gua doce disponvel. A maior parte desse uso ocorre na agricultura e na pecuria. Tambm em termos mundiais, a agropecuria a maior consumidora dos recursos hdricos: 70% da gua captada no planeta destina-se s plantaes e criaes de rebanhos. A indstria fica com outros 22%, e o uso domstico, com apenas 8%. Mas essas percentagens variam Segundo o desenvolvimento de cada nao. Em pases menos desenvolvidos, o volume absorvido pela agricultura pode ultrapassar os 80%, enquanto nos mais industrializados, no passa de 30%.As regies hidrogrficas brasileiras

    Para a gesto de polticas pblicas, o Brasil dividido em 12 regies hidrogrficas. O pas m dos mais ricos em recursos hdricos. O clima e o regime de chuvas alimentam uma rede hidrogrfica extensa, formada por rios com grande volume de gua. Com exceo das nascentes do Rio Amazonas, que se abastecem com o derretimento das geleiras andinas, a origem das guas dos rios brasileiros so basicamente as chuvas.

    NO MUNDO

    Tal como no Nordeste brasileiro, h diversos pontos do mundo em que a escassez hdrica motivo de xodo da populao e alvo de polticas pblicas. Em termos globais, a oferta de gua corre o risco de entrar numa crise profunda, pressionada cada vez mais pel

  • o crescimento demogrfico, pelas mudanas climticas, pela contaminao de fontes e pelo desperdcio. A crise menos uma questo de insuficincia real, e mais de mau gerenciamento do uso dos recursos hdricos. A falta de gua afeta no s a sade humana, mas tambm o desenvolvimento socioeconmico da sociedade e o rumo das relaes entre naes.Diante do cenrio em que a escassez hdrica atinge 11% da populao mundial, a Unesco (entidade da ONU voltada para a educao, a cincia e a cultura) declarou que 2013 o Ano Internacional de Cooperao pela gua. A iniciativa tem o objetivo de alertar para a necessidade de administrar melhor as fontes de gua, que esto sendo afetadas pelo aumento do consumo e pelo uso desequilibrado desse recurso fundamental. As perspectivas so preocupantes: a ONU estima que, se as polticas em relao gua no mudarem, 1,8 bilho de pessoas estaro vivendo em zonas muito secas e dois teros da humanidade estaro sujeitos a alguma restrio no acesso gua em 2025.Crise silenciosa

    O planeta j enfrenta uma crise de abastecimento de gua, apesar de isso no significar que o lquido esteja diminuindo. A gua que circula por mares, rios e lagos, que est guardada nos depsitos subterrneos e nas calotas polares, como gelo, ou que circula em forma de umidade pela atmosfera, tem um volume quase constante, que demora milhes de anos para ser alterado. Essa quantidade quase no se altera pois a gua est em eterno processo de reciclagem natural: evapora, desaba como chuva, escorre para o fundo da terra e retorna para a superfcie, de onde volta a evaporar, no chamado ciclo da gua. Por isso, a gua um recurso renovvel.Afora uma pequena parcela que, quando desmembrada pelos raios solares em hidrognio e oxignio, deixa a atmosfera do planeta, a gua que hoje usamos para matar a sede e para o banho composta das mesmas molculas que formaram os mares em que nadaram os primeiros peixes, as chuvas que molharam os dinossauros e o gelo que recobriu grandes partes do planeta nas eras glaciais. Mas um recurso renovvel no se mantm, necessariamente, inesgotvel e com boa qualidade todo o tempo. Tudo depende do equilbrio entre a renovao e o consumo.Existem fatores naturais que limitam o volume de gua disponvel para os seres humanos. Muitos povos vivem em zonas ridas, e mesmo regies ricas em recursos hdricos podem passar esporadicamente por secas que afetam os mananciais. Isso sempre foi assim. A diferena, na situao atual, que enfrentamos uma ameaa de escassez crnica de propores globais cuja grande causa a atividade humana. O consumo crescente e o desperdcio, a contaminao dos mananciais e as alteraes climticas que a Terra est passando desequilibram a relao entre a oferta e a demanda de gua doce em boas condies para o uso do ser humano.Avaliar o volume total de &aaacute;gua no planeta uma cincia pouco exata. Os especialistas reconhecem que muitos dados so pouco confiveis e os nmeros podem variar. Ainda assim, a estimativa sobre o volume de gua potvel a que o homem tem acesso apresenta valores bem aceitos na comunidade cientfica. Esses valores demonstram que, apesar de a Terra ter trs quartos de sua superfcie submersos, a parcela de gua disposio da humanidade , em relao ao volume total, muito pequena.Do total de 1,39 bilho de quilmetros cbicos de gua que revestem o globo, apenas 2,5% so de gua doce. Alm disso, a maior parte da gua doce no est ao alcance do homem est ngelada nas geleiras e calotas polares ou escondida em depsitos subterrneos. A quantidade de gua a que o homem tem acesso fcil a superficial, de rios, lagos e pntanos de, no mximo, 0,4% da gua doce existente no mundo. Contamos com isso para matar a sede, cuidar da higiene, gerar energia e produzir alimentos e bens industriais. No fim das contas, gua mais do que suficiente. Mas, segundo a ONU, uma a cada nove pessoas no mundo no tem acesso gua potvel em quantidade necessria para garantir sua sade, nem um padro de vida que reflita um bom desenvolvimento social e econmico.Causas da escassez

    Se o problema no a quantidade, ento o que est causando uma crise global de gua? A resposta a combina- o de diversos fatores: o crescimento populacional, a expanso do consumo associada melhoria dos padres de vida, mudanas alimentares, aquecimento do planeta e mau gerenciamento esto aumentando as presses sobre o abastecimento local e mundial de gua. Essas variveis passam por mudanas rpidas e muitas vezes imprevisve

  • is. A populao mundial cresce aceleradamente. Em 1950, ramos 2,5 bilhes de pessoas, e, em 2011, 7 bilhes. Segundo as estimativas da ONU, passaremos a 8,3 bilhes em 2030 e a 9,3 bilhes em 2050. Os efeitos desse aumento populacional sentido em vrias regies.O crescimento demogrfico no significa apenas mais torneiras, descargas sanitrias e chuveiros nas residncias. Significa, principalmente, que as sociedades precisam gerar mais energia e produzir cada vez mais, tanto no campo quanto nas fbricas. Os clculos indicam que precisaremos de 60% a mais de energia vindas de hidreltricas e de outras fontes renovveis. O desenvolvimento industrial e agropecurio hoje responsvel pelo consumo de 90% de toda gua usada pela humanidade. E, quanto mais rica uma populao, maior o consumo de gua por pessoa, tanto no uso domstico quanto por meio de sua alimentao e seu modo de vida. Com mais gente, prev-se que, em 2030, a demanda por comida aumentar em 50% em todo o planeta.A disparidade entre o consumo de gua por ricos e pobres expressa uma perversa lgica de mercado. populao carente sem acesso ao servio de fornecimento de gua restam duas tristes opes: ou longas caminhadas dirias at poos e reservatrios, ou a compra de gua de fornecedores particulares agueiros ou caminhes-pipa. Nas duas situaes, os prejuzos econ- micos e sociais so imensos: estima-se que os africanos gastem 40 bilhes de horas a cada ano s no trabalho de coleta de gua em pontos distantes e de transporte para suas casas.Mau gerenciamento

    Talvez o maior exemplo de como a ao humana interfere na gua disponvel no planeta esteja na sia Central, no Mar de Aral. Significa mar das ilhas, mas hoje pouco restou do corpo de gua que dava nome ao local. Encravado entre o Uzbequisto e o Cazaquisto, o Aral era o quarto maior lago do mundo at 1960, ocupando uma rea de 68 mil quilmetros quadrados o equivalente a cerca da metade do Cear. Hoje, no restam nem 10% de sua rea original. O desastre fruto de projetos muito mal concebidos na poca da Unio Sovitica: as guas dos Rios Amu e Syr, que alimentam o Aral, foram desviadas para irrigar lavouras em extenses desrticas daquela parte do mundo. Em pouco tempo, o lago comeou a ver suas guas recuarem, numa dinmica que no parou mais.Alm de supersaturada de sal, a gua que resta est bastante poluda por agrotxicos oriundos das lavouras nas proximidades. Em condies to adversas, todo o ecossistema do Aral ficou comprometido, e o clima prximo tornou-se mais desrtico. As antigas ilhas surgiram na paisagem como cumes de ridas montanhas. A insalubridade afeta a sade humana. Arrastada pelos ventos, a areia poluda do leito seco espalha-se por quilmetros, afetando as populaes. Como resultado, aumenta a incidncia de doenas respiratrias, de fgado e dos rins e os casos de cncer.Os especialistas consideram impossvel devolver ao Aral a configurao e as caractersticas de 50 anos atrs. Mais fcil corrigir a salinidade e a polui- o em algum bolso, isoladamente. O Cazaquisto realizou uma experincia no lago norte em 2005, construindo um grande dique para reter a gua no que restava do mar. Com a ao, o nvel da gua subiu e a salinidade caiu. Os peixes voltaram e, com eles, a pesca atividade econmica que garante a sobrevivncia de comunidades locais. Para os lagos no sul, as perspectivas no so to boas. que as obras, muito maiores, exigem dezenas de bilhes de dlares e dependem de acordos difceis de se concretizarem entre as naes que dividem a Bacia do Rio Amu.

    Fontes de conflitos

    O exemplo do Mar de Aral revela uma das facetas da crise global de gua, pois as necessidades econmicas acirram, cada vez mais, disputas pelo precioso lquido. O principal foco de briga est nos rios e bacias compartilhados por dois ou mais pases. Essa foi uma das motivaes do Ano Internacional de Cooperao pela gua. A palavra cooperaanha um carter estratgico: a ONU espera que as sociedades desenvolvam mecanismos de ao compartilhada para manejar as fontes hdricas capazes de gerar benefcios econmicos e melhorias no padro de vida das populaes envolvidas. Alm disso, o termo no deixa de ter um apelo pacifista, medida que os conflitos pelo controle das fontes de gua so uma realidade em vrios pontos do planeta.

  • Um exemplo o Rio Nilo, que, ao atravessar o Deserto do Saara, a base da vida no Egito h milhares de anos. Antes de atingir o territrio egpcio, suas guas atravessam diversos pases, como o Sudo, a Etipia e o Qunia. As guas podem ser afetadas por barragens, uso excessivo ou poluio na parte superior da bacia antes de chegar ao Egito. As polticas de gesto do Nilo, por isso, so assunto importante na relao entre o Egito e seus vizinhos.No mundo, existem mais de 200 aqu- feros localizados em subterrneos de mais de uma nao, como o Guarani que se estende sob o Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. H mais de 260 bacias hidrogrficas transnacionais, que abrangem 148 pases e 40% da popula- o mundial. Os especialistas estimam que, se tais recursos no forem bem manejados em conjunto pelas naes envolvidas, pode-se criar um contingente de 100 milhes de migrantes nas prximas duas dcadas. Avaliam tambm que, no sculo XXI, a gua pode ser o principal deflagrador de guerras.O Instituto Pacfico, especializado no tema, contabiliza mais de 50 episdios de confronto militar, revoltas populares ou ataques terroristas relacionados ao acesso gua, entre 2000 e 2012.O atual conflito na Sria tem como um dos panos de fundo a disputa pela gua. Depois que Bashar al-Assad assumiu, em 2000, passou a favorecer os grandes fazendeiros, que acumularam terra e extraram do subsolo a gua sem qualquer controle, reduzindo as reservas hdricas do pas. As dificuldades para manter as lavouras acabou por expulsar pequenos agricultores do campo, e a seca que atingiu o pas entre 2006 e 2011 acentuou o xodo rural. Os centros urbanos incharam, e o governo no conseguiu prover servios adequados a uma massa de crianas que chegava ao incio da vida adulta com grande descontentamento com a situao, quando o conflito comeou.Um dos casos mais persistentes de disputa pela gua, que tambm envolve a Sria, a tenso permanente, h dcadas, entre o pas e Israel, na disputa pelas Colinas de Gol, regio sria ocupada militarmente pelos israelenses em 1967. Alm da importncia militar, em funo de estarem em um terreno elevado, as colinas abrigam as nascentes do Jordo, o principal rio da regio. As guas do Jordo so de uso vital para as populaes da regio, inclusive para palestinos, que dependem de Israel para ter acesso a elas. A preocupao aumenta, pois o Rio Jordo vem perdendo volume de gua, e as margens do Mar Morto, onde ele desgua, esto recuando.

    Termos de Uso

    MapaSatliteQuesto de sade

    Uma das bases da vida humana, o acesso gua de boa qualidade est diretamente ligado sade. A ONU considera que desenvolvimento socioeconmico e gua so fatores interdependentes. Sem gua, no possvel sobreviver. Mas o excesso dela tambm atrapalha: enchentes foram pessoas a deixarem suas casas, alm de transmitirem doenas. Sem gua limpa, a populao adoece. E sem sade, as crianas tm dificuldade em aprender e os adultos, em trabalhar. Forma-se um crculo vicioso: sem trabalho e aprendizado, uma populao permanece subdesenvolvida e pobre o que contribui para mais desinformao e maior incidncia de doenas. Estima-se que, no mundo todo, mais de 700 milhes de pessoas no tenham acesso gua potvel e 2,3 bilhes caream de esgoto tratado.A gua transmite ou est relacionada com a transmisso de diferentes tipos de enfermidades, divididos em quatro grupos de acordo com os tipos de transmisso: guas fluviais contaminadas: transmisso direta por meio da ingesto ou contato com gua no tratada. Exemplo: a diarreia, que mata mais de 2 milhes de pessoas a cada ano. Contaminao por falta de gua: acontece quando a quantidade de gua disponvel no suficite para a higiene pessoal. Exemplo: a diarreia. Doenas causadas por agentes patognicos, pelo consumo de alimento contaminado ou pelo contato interpessoal: so transmitidas por organismos que vivem na gua ou preci

  • sam dela em seu ciclo de vida. Exemplo: a esquistossomose, que afeta 200 milhes de pessoas a cada ano. Contaminao por hospedeiros: so transmitidas por insetos que tm seu ciclo de vida ligado gua. Exemplos: a dengue, a febre amarela e a malria. Juntas, essas doenas causam 1,5 milho de mortes por ano no mundo.As maiores vtimas das doenas so as crianas de pases pobres e em desenvolvimento do total de pessoas que morrem anualmente de diarreia, 90% tm abaixo de 5 anos. Mesmo quando no causa a morte diretamente, a gua contaminada provoca enfermidades que debilitam o indivduo, tanto fsica quanto mentalmente. o caso da esquistossomose, que retarda o crescimento e afeta a capacidade de aprendizagem das crianas.Para quase todas as doenas, a contaminao poderia ser evitada com gua limpa e uma rede de tratamento de esgoto. A difuso de hbitos de higiene, o monitoramento de represas e o cuidado com a limpeza de vegetaes aquticas e controle de pntanos tambm so mecanismos de combate difuso dessas enfermidades. Essas medidas fariam a mortalidade infantil diminuir drasticamente no mundo e, como resultado, haveria o aumento da expectativa de vida da populao mundial.A soluo da crise de gua em toda sua extenso enfrentamento de secas, medidas contra a desertificao e as enchentes, gerenciamento adequado das fontes hdricas exige investimento macio de recursos com objetivo de ampliar o acesso universal aos servios de fornecimento de gua e saneamento, alm de acordos efetivos entre pases para a cooperao no uso da gua. Os especialistas apontam tambm a necessidade de mudana nos padres de produo e consumo, para evitar o desperdcio de gua nas esferas domstica, industrial e agropecuria.