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Thiago Coelho - Direito Processual Civil

Direito Processual Civil para Tribunais

Direito Processual Civil: noções gerais. Estrutura do Código de Processo Civil. Jurisdição, processo e ação.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL: NOÇÕES GERAIS.

Diante da complexidade com que se travam as relações sociais, é impossível evitar conflitos de interesses entre os cidadãos, ou entre estes e próprio Estado, a respeito da interpretação dos direitos subjetivos e da fiel aplicação do direito objetivo aos casos concretos.

Para manter o império da ordem jurídica e assegurar a paz social, o Estado não tolera a justiça feita pelas próprias mãos dos interessados. Divide, pois suas funções soberanas, de modo a atender essa contingência, em atividades administrativas, legislativas e jurisdicionais.

A função administrativa diz respeito à gestão ordinária dos serviços públicos e incumbe ao Poder Executivo. A legislativa consiste em traçar, abstrata e genericamente, as normas de conduta que formam o direito objetivo, e cabe ao Poder Legislativo. A terceira é a jurisdição, que incumbe ao Poder Judiciário, e que vem a ser a missão pacificadora do Estado, exercida diante das situações litigiosas. Através dela, o Estado dá solução às lides ou litígios, que são os conflitos de interesse, caracterizados por pretensões resistidas, tendo como objetivo imediato a aplicação da lei ao caso concreto, e como missão mediata “restabelecer a paz entre os particulares e, com isso, manter a sociedade”. Para regular esse método de composição dos litígios, cria o Estado normas jurídicas que formam o direito processual, também denominado formal ou instrumental, por servir de forma ou instrumento de atuação da vontade concreta das leis de direito material ou substancial, que há de solucionar o conflito de interesses estabelecido entre as partes.

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Diante desse quadro, o Direito Processual Civil pode ser definido como o ramo da ciência jurídica que trata do complexo das normas reguladoras do exercício da jurisdição civil. A autonomia do direito processual civil, frente ao direito substancial, é inegável e se caracteriza por total diversidade de natureza e de objetivos. Enquanto o direito material cuida de estabelecer as normas que regulam as relações jurídicas entre as pessoas, o processual visa a regulamentar uma função pública estatal. Seus princípios, todos ligados ao direito público a que pertence, são totalmente diferentes, portanto, daqueles outros que inspiram o direito material, quase sempre de ordem privada. Tem, pois, o processo civil, natureza de direito público, pois regula o exercício de parte de uma das funções soberanas do Estado, que é a jurisdição.

JURISDIÇÃO.

- A JURISDIÇÃO E AS FORMAS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS.

A jurisdição, como se sabe, é um dos pilares no qual se funda a teoria geral do processo. As bases deste ramo do Direito, que formam, na feliz expressão de Ramiro Podetti, a trilogia estrutural do processo, são justamente a jurisdição, a ação e o processo.

A importância do estudo da jurisdição está em que os institutos processuais e o próprio processo se desenvolvem em meio à atividade jurisdicional.

É lição por demais conhecida que a jurisdição é a função do Estado, mediante a qual este ente se substitui aos particulares ou mesmo a outros órgãos públicos com o objetivo de resolver os conflitos de interesses existentes, promovendo a pacificação social.

Mas será que sempre foi assim? E quando o Estado ainda não era suficientemente forte e estruturado, como eram solucionados os conflitos de interesses?

A resposta a estas indagações nos permitirá adentrar em breve análise sobre a origem da jurisdição, perpassando por todas as formas de resolução de conflitos já evidenciadas na sociedade, que são, a bem da verdade, antecedentes lógicos da atividade jurisdicional dentro da evolução dos tempos, embora estas fases não sejam estanques nem tenham acontecido obrigatoriamente na seqüência adiante exposta.

A jurisdição, evidentemente, é a forma mais perfeita de solução dos conflitos, mas não a única, como dito. Ao longo do tempo, diante do fato de que as insatisfações sempre existiram, motivadas pela circunstância de os bens da vida serem insuficientes diante das necessidades ilimitadas dos seres humanos, alguns métodos de solução dos conflitos receberam notoriedade. Vejamo-los.

Autotutela -

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Nos primórdios da civilização, mediante a utilização de meios bastante primitivos, onde se destacava o uso da força física, os litígios eram resolvidos. Destacava-se, aqui, a fase da autotutela ou autodefesa, que significava manifesta forma de justiça privada, uma vez que as partes ou os grupos, utilizando-se dos meios que estivessem à mão, resolviam suas insatisfações. Prevalecia, portanto, a vontade unilateral e cogente dos mais fortes e poderosos.

Logicamente, no atual desenvolvimento social, há um repúdio a este modo de colocar fim aos litígios, na medida em que a justiça cede espaço para a força e a esperteza. Mas há uma razão de ser para o florescimento inicial da autotutela. Nesta época não havia um Estado organizado, capaz de enfeixar em suas mãos a solução das conflituosidades e superar os ímpetos individualistas dos homens, nem tampouco normas de conduta (leis) anteriormente fixadas que pudessem servir de regras orientadoras para o comportamento dos indivíduos.

Nesta fase de justiça privada, ademais, como é lógico concluir, era notória a prevalência da instabilidade e insegurança social, uma vez que inexistia uma garantia que os mais fracos iriam permanecer com os bens da vida obtidos. Estes viviam sob permanente ameaça de serem despojados destes bens. Diante disso, a autotutela evoluiu para uma regulamentação desta justiça privatística, como ocorreu com a criação da Lei de Talião, que preconizava a máxima do “olho por olho, dente por dente”.

Em abordagem assaz didática, os professores WAMBIER, CORREIA DE ALMEIDA e TALAMINI, em obra conjunta, apresentam esclarecedor panorama desta fase evolutiva, através da seguinte lição:

“Se A e B estivessem em conflito em razão do desrespeito, por B, de direito atribuído a A, este poderia defender-se sozinho resolvendo o conflito em que estivesse envolvido, mediante qualquer tipo de solução, ainda que baseada na supremacia da força bruta ou de qualquer faceta representativa dos poderes econômico e bélico. Por exemplo: diante do inadimplemento de obrigação consistente em pagar um débito, assumida por uma parte diante da outra, o credor poder-se-ia apropriar de bens do devedor, em valor equivalente ao de seu crédito, como forma de receber aquilo a que tinha direito, sem que estivesse incidindo na prática de qualquer delito.”

O que caracteriza, portanto, a fase da autotutela, no feliz resumo de CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO, é: a) ausência de juiz distinto das partes; e, b) imposição da decisão por uma das partes à outra.

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Nos dias atuais, diante de um Estado suficientemente estruturado, não se aceita, como regra, a autotutela, sendo inclusive criminalizada a conduta de fazer justiça com as próprias mãos (art. 345 do CP - crime de exercício arbitrário das próprias razões).

Ocorre, no entanto, que no Direito presente, em situações excepcionalíssimas, existem resquícios de autotutela, como ocorre, por exemplo, nos casos de legítima defesa, desforço imediato (art. 1.210, §1º CC), etc. Segundo os sempre citados CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO: “São duas as razões pelas quais se admite a conduta unilateral invasora da esfera jurídica alheia nesses casos excepcionais: a) a impossibilidade de estar o Estado-juiz presente sempre que um direito esteja sendo violado ou prestes a sê-lo; b) a ausência de confiança de cada um no altruísmo alheio, inspirador de uma possível autocomposição.”

Autocomposição -

Aliado à autotutela, a racionalização humana engendrou outro método de solução dos conflitos de interesses mais consentâneo com a sobrevivência, a estabilidade social e a paz jurídica. Refiro-me à autocomposição. Esta consiste basicamente na existência de concessões feitas por uma ou ambas as partes em relação às suas pretensões ou parte destas. Não há, aqui, imposição pelo uso da força. A autocomposição pode se dar de três formas: a) pela renúncia (A simplesmente desiste da sua pretensão em relação a B); b) pela submissão (A renuncia à resistência que está oferecendo a B); e, c) pela transação (A e B fazem concessões reciprocas, abdicando de parte de suas pretensões).

Observa-se nesta forma de resolução de litígios que a presença do Estado ainda não é sentida, sendo sempre dependente da vontade de uma ou ambas as partes. No processo civil moderno tem sido considerada salutar e até valorizada a autocomposição. A busca da conciliação entre as partes, por exemplo, é uma diretriz inafastável do Direito Processual Civil moderno, como se percebe pela dicção dos arts. 125, IV e 331 do CPC. Somente para citar, o primeiro dispositivo estabelece que compete ao juiz, a qualquer tempo, tentar conciliar as partes.

Arbitragem (facultativa e obrigatória) -

Na seqüência da evolução das formas de solução dos conflitos, procurou-se retirar do âmbito das partes a definição dos litígios, passando-se a buscar, através da presença de um terceiro, a resolução das insatisfações sociais.

Isto ocorreu inicialmente através do acordo entre as partes para que uma pessoa eleita por estas pudesse resolver o conflito, comprometendo-se as partes a aceitarem a solução apresentada. Surgia, portanto, a figura do árbitro e a fase da arbitragem facultativa. Este terceiro (árbitro), no começo, freqüentemente, era um sacerdote ou um ancião, pois estes gozavam de maior prestígio na sociedade da época, seja pela proximidade com as divindades, seja pelo conhecimento dos costumes.

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Com o passar do tempo, a arbitragem facultativa evoluiu para a arbitragem obrigatória, o que demonstra uma presença mais efetiva do Estado, que, nesta época, já tinha força de indicar um árbitro independente da vontade das partes, cuja decisão seria válida entre as partes1.

A arbitragem (convenção de arbitragem), vale dizer, ainda hoje tem espaço no nosso ordenamento jurídico, recebendo, inclusive, com a edição da Lei nº 9.307, de 26 de setembro de 1996, novo arcabouço, restando estabelecida a arbitragem facultativa, a teor do art. 1º da citada legislação: “As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”. Isto não quer dizer, contudo, que seja a regra a ser observada.

Jurisdição -

Após a arbitragem obrigatória, com o fortalecimento e a presença efetiva do Estado, aliado à consciência cada vez mais presente da existência de um Estado de Direito, a solução dos conflitos passou a ser tida efetivamente como uma função do Estado, inicialmente atribuída ao rei, e depois emoldurada como autêntica atividade jurisdicional, nos moldes percebidos na atualidade.

A solução das contendas passava a ser dever do Estado, através de um órgão deste, que, interferindo na esfera jurídica dos indivíduos, seria capaz de substituir às partes e, com imparcialidade, declarar o direito protegido e fazer com que, efetivamente, este direito venha a ser observado no campo prático.

Chega-se, portanto, à idéia e construção da teoria da jurisdição.

- CARACTERÍSTICAS E CONCEITOS DE JURISDIÇÃO.

As princípais características da jurisdição, portanto, já foram referidas no tópico passado, sendo esta a oportunidade para traçar breve comentário sobre cada uma destas características. São elas:

a) caráter substitutivo - O Estado, como já ensinava Chiovenda, na medida em que proíbe a justiça privada, trouxe para si o monopólio jurisdicional. Sendo assim, ante a existência de um conflito de interesses trazidos ao Estado-juiz, este se substitui às partes litigantes para, com atividades do próprio Estado, solucionar o conflito e efetivar a vontade da lei. A substitutividade também indica a necessidade de o conflito ser resolvido por um terceiro (órgão estatal)

1 Nasce, portanto, nesta fase, a figura do juiz. Com a presença da arbitragem obrigatória surge também a necessidade de elaboração de regras objetivas e vinculativas para nortear as decisões da autoridade pública, o que demonstra que, no desenrolar dos estágios de desenvolvimento social, o legislador apareceu depois do julgador.

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dotado de imparcialidade, totalmente alheio ao conflito, embora, por dever de função, deva solucioná-lo.

b) escopo de atuação do direito - Um dos objetivos da jurisdição, que a caracteriza, é o objetivo de fazer prevalecer a vontade da lei, dando a quem de direito tudo aquilo e somente aquilo que, segundo a lei, o interessado tem direito de obter.

c) justa composição da lide - As mais das vezes, Carnelutti dizia que sempre, a jurisdição será exercida diante de um conflito de interesses apto a gerar uma insatisfação.

d) inércia - Outra característica importantíssima da jurisdição é a inércia dos órgãos jurisdicionais. O art. 2º do CPC estabelece que: “Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais”. Esta característica será vista com mais vagar quando se estudar o princípio da demanda, que é correlato deste, com a diferença de que a inércia é vista do ponto de vista do juiz.

A partir destas características os doutrinadores têm formulado suas definições sobre a jurisdição. A bem da verdade, cada uma delas observa a jurisdição sob um determinado ângulo, sendo muito difícil se engendrar uma definição que consiga exprimir de forma completa todo o fenômeno jurisdicional.

Para apresentar uma visão mais genérica do instituto, seguem algumas definições apresentadas por doutrinadores de nomeada:

a) CHIOVENDA - “Jurisdição é a função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos, já no afirmar a existência da vontade da lei, já no torná-la, praticamente, efetiva.”

b) AMÍLCAR DE CASTRO - “Jurisdição é um poder-dever do Estado de distribuir justiça, aplicando a lei ao caso concreto”.

c) WAMBIER, CORREIA DA ALMEIDA E TALAMINI - “A jurisdição é, portanto, no âmbito do processo civil, a função que consiste, primordialmente, em resolver os conflitos que a ela sejam apresentados pelas pessoas, naturais ou jurídicas (e também pelos entes despersonalizados, tais como o espólio, a massa falida e o condomínio) em lugar dos interessados, por meio da aplicação de uma solução prevista pelo sistema jurídico.”

d) CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO - “Jurisdição é uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito, para imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça.”

- PRINCÍPIOS DA JURISDIÇÃO.

Vários princípios informam a jurisdição. O estudo destes serve de norte indispensável para se reconhecer os verdadeiros contornos da função jurisdicional, apresentando, além disso, grande importância prática para todo o estudo do processo.

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Nesta parte, a análise deverá ser o mais minudente possível, a fim de que se possa, além de enunciar o princípio e apresentar seu significado, enfatizar todas as decorrências deste, bem como as discussões que enseja.

Merecem destaque os seguintes princípios da atividade jurisdicional: investidura, juiz natural, indelegabilidade, indeclinabilidade, inevitabilidade, aderência ao território, demanda ou dispositivo, inafastabilidade do controle jurisdicional.

Princípio da investidura -

Somente poderá exercer jurisdição a pessoa investida na atividade judicante. Eis o que enuncia o princípio da investidura. Sem estar investido no cargo de juiz não é lícito o exercício da função jurisdicional. Como explica RUI PORTANOVA: “No Brasil é condição indispensável a quem se submete a um juízo natural que este seja personificado na pessoa de um agente público investido regularmente nas suas funções estatais.”

Em razão do princípio da investidura, o juiz aposentado, pelo fato de perder a jurisdição, deverá passar os autos ao seu sucessor, não podendo julgar a causa (RJTJSP 39/218), mesmo que tenha encerrado a instrução (JTACivSP 61/143).

Princípio do juiz natural -

Outro postulado da jurisdição é o do juiz natural ou juiz legal ou constitucional. Este princípio, de particular importância, enuncia que todos têm direito a um julgamento independente e imparcial, perante autoridade previamente estabelecida pelas normas constitucionais e legais.

Sob um primeiro prisma, portanto, o princípio do juiz natural impede um julgamento viciado, proferido por juiz que não seja independente e imparcial. Para isso, garante a observância da competência prevista na Constituição e nas leis. Primeira manifestação deste postulado é o art. 5º, LIII da CF/88: “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”.

Por outro lado, o princípio em referência também impede a criação de Tribunais para julgamento de fatos anteriores a sua instituição ou para julgar pessoas determinadas, o que não se confunde com a possibilidade de se criar competência por prerrogativa de função, a qual é em razão do cargo e não da pessoa.

Não se aceitam, portanto, a criação dos chamados Tribunais de Exceção, que são aqueles criados após o fato que lhes cabe julgar. Sobre o assunto, tem-se a regra do art. 5º, XXXVII, da CF/88, que preceitua que: “não haverá juízo ou tribunal de exceção.”

O processualista RUI PORTANOVA, em feliz lição, percebeu o significado e a importância do princípio do juiz natural. Transcrevemos:

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“O princípio do juiz natural é verdadeira garantia a ser invocada contra toda e qualquer forma de autoritarismo que queira se justificar através do Poder Judiciário. A invocação do juiz natural, com seu extenso conteúdo democrático, consagra conquistas da humanidade, ao longo de sua história, contra um Judiciário subserviente a comandos ditatoriais que o afrontam.

Com base no juiz natural, poderá o operador jurídico pleitear contra invenções legislativas. No mesmo passo, o princípio do juiz natural constitucional é fundamento para afastar toda sorte de influência estranha no Poder Judiciário (tribunais de ocasião, escolhas ou substituições de juízes) tão a gosto de ditadores que conquistam o executivo.”

Princípio da indelegabilidade -

Decorre do princípio constitucional de que é vedado aos Poderes delegar atribuições. Este não é um princípio constitucional expresso, mas decorre da forma rígida como se estabelecem as atribuições dos diversos poderes estatais pela Constituição Federal.

Também o juiz, pessoa física investida na atividade judicante, não pode delegar as atribuições que lhe foram outorgadas como dever de função para que outras pessoas as exerçam.

Princípio da indeclinabilidade -

Este princípio tem relação com a própria função da jurisdição de solucionar todos os conflitos de interesses trazidos à apreciação do Poder Judiciário, no afã de obter a pacificação social com justiça.

As mais diversas espécies de demandas, sejam elas individuais ou coletivas, são trazidas ao conhecimento do juiz. Em razão do princípio da indeclinabilidade não pode o juiz deixar de apresentar solução para o caso, mesmo que esteja diante da mais intrincada controvérsia jurídica que se possa submeter a um magistrado.

Não pode, portanto, o órgão julgador pronunciar o non liquet, deixando assim de resolver a pendenga judicial. É obrigado a oferecer pronunciamento sobre o fato analisado, mesmo que este seja desfavorável à pretensão do autor.

O princípio da indeclinabilidade, na forma em que está emoldurado, deixa claro que a atividade jurisdicional é sobretudo um dever dos órgãos que a exerce.

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A expressão legislativa do citado postulado está no art. 126 do CPC, que preceitua: “O juiz não se exime de sentenciar alegando lacuna ou obscuridade da lei...”

Princípio da inevitabilidade

A jurisdição, como já foi dito anteriormente, é manifestação do poder estatal, este conceituado como a capacidade de decidir imperativamente e impor decisões. Isto é decorrência da natureza publicística do processo.

Existe, portanto, a sujeição das partes às decisões jurisdicionais, independentemente da vontade dos interessados. Assim, por força do princípio da inevitabilidade, a jurisdição se impõe por poder próprio, o qual independe da vontade das partes.

Assim, forçoso concluir que existe uma relação de sujeição das partes litigantes em relação às decisões jurisdicionais exeqüíveis.

Princípio da aderência ao território -

Sobre este postulado esclarece CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO: “No princípio da aderência ao território manifesta-se, em primeiro lugar, a limitação da própria soberania nacional ao território do país: assim como os órgãos do Poder Executivo ou do Legislativo, também os magistrados só têm autoridade nos limites territoriais do Estado. Além disso, como os juízes são muitos no mesmo país, distribuídos em comarcas (Justiças Estaduais) ou seções judiciárias (Justiça Federal), também se infere daí que cada juiz só exerce a sua autoridade nos limites do território sujeito por lei à sua jurisdição. O princípio de que tratamos é, pois, aquele que estabelece limitações territoriais à autoridade dos juízes.

CARREIRA ALVIM ainda acrescenta que o princípio em epígrafe: “Quer significar que a jurisdição pressupõe um território sobre a qual é exercida. Não se pode falar em jurisdição senão enquanto correlata com determinada área territorial do Estado. Tal princípio estabelece, inclusive, limites às atividades jurisdicionais dos juízes, que, fora do território sujeito por lei à sua autoridade, não podem exercê-las.”

Em razão destas limitações territoriais é que, com relação aos atos estabelecidos fora da circunscrição territorial que exerce autoridade o juiz, este deve solicitar a cooperação de outro juiz que possua aderência ao território, através da expedição de carta precatória.

Diante da organização judiciária brasileira, o STF e o STJ têm jurisdição limitada ao território nacional. Os Tribunais Regionais Federais, por sua vez, limitam-se territorialmente em relação à determinada região, que pode compreender um ou mais Estados. Os Tribunais de Justiça, por seu turno, possuem jurisdição em todo o território estadual, enquanto os juízes de direito ficam limitados às suas comarcas.

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Princípio da demanda -

Previsto no art. 2º (CPC): “Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais.”

Uma característica já estudada da jurisdição é que ela é inerte, pelo que necessita ser provocada. A inércia é o mesmo princípio da demanda sendo que visto sob a ótica do juiz.

O postulado em análise tem sua extensão evidenciada através de dois brocardos latinos: Ne procedat judex ex officio (Não proceda o juiz de ofício) e Nemo judex sine actore (Ninguém é juiz sem autor).

Significa, em rápidas palavras, que não pode haver jurisdição sem ação, o que demonstra que, para atuar, a jurisdição deverá ser provocada pela parte ou interessado. Depois de acionada a jurisdição, contudo, esta desenvolve-se por impulso oficial (art. 262 do CPC).

Outra nuance do princípio da demanda é que serve como limitação à atividade do juiz. Isto porque a parte pode ativar a jurisdição somente em relação à parte da pretensão que tenha, o que impossibilitará o conhecimento sobre a totalidade da pretensão. Além do mais, decorrência do postulado da demanda é o princípio da adstrição do juiz ao pedido da parte, de forma que o pedido é o norte do qual não pode se afastar o julgador.

A doutrina costuma elencar alguns fundamentos para a existência da necessidade de que a jurisdição seja ativada e estabelecidos os limites da pretensão. Primeiramente, este postulado é uma garantia para a imparcialidade do juiz. Já se tem observado que quando alguém dá início à ação, este se liga psicologicamente à causa, de tal maneira que dificilmente conseguiria solucioná-la com isenção.

Por outro lado, agrega-se também que este postulado se afina, de forma bastante próxima, com o escopo maior da jurisdição: a pacificação social com justiça. É que se a jurisdição fosse exercida espontaneamente, ou seja, sem depender de provocação, acabaria por fomentar conflitos que as próprias partes não têm interesse em resolver, o que, fatalmente, iria de encontro ao objetivo de pacificação social.

Ainda em relação ao princípio da demanda, indispensável observar a existência de situações excepcionais onde o mesmo não é observado. Exemplos de exceções ocorrem na possibilidade de se instaurar de ofício a execução trabalhista, assim como a execução penal.

Por último, resta comentar o princípio da inafastabilidade da função jurisdicional, sendo este um dos que maior importância prática possui.

Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional –

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Este talvez seja o mais importante de todos os princípios da atividade jurisdicional, bem como o que mais evidência tem tido, principalmente em época de reformas processuais, onde se faz urgente a remoção de obstáculos para o pleno acesso à justiça e à efetividade processual.

Na verdade, estes dois últimos princípios (acesso à justiça e efetividade processual) são o pano de fundo de que decorre o princípio da inafastabilidade do controle judicial.

Este postulado indica que a sociedade está a clamar pela solução rápida e justa dos conflitos trazidos à apreciação judicial. Na feição moderna, a inafastabilidade do controle jurisdicional implica na possibilidade de acesso a uma ordem jurídica justa.

A expressão constitucional do postulado em análise é o art. 5º, XXXV, da CF/88, que preceitua: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”

O professor NELSON NERY explica sobre esta garantia que: “Isto quer dizer que todos têm acesso à justiça para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatória relativamente a um direito. Estão aqui contemplados não só os direitos individuais, como também os difusos e coletivos.”

Dentro desta ótica, é possível afirmar que o postulado da inafastabilidade do controle jurisdicional enuncia que não podem ser criados obstáculos ao cidadão de buscar o seu direito no Poder Judiciário, o que engloba também a necessidade de se garantir a efetividade das decisões jurisdicionais.

É princípio voltado para o legislador, incitando-o a remover todos os óbices ao exercício e efetividade da função jurisdicional, assim como ao julgador que deve cuidar de não deixar prevalecer qualquer iniciativa legislativa que atente contra o citado preceito magno.

As tendências modernas do acesso à ordem jurídica justa procuram realçar a necessidade de promover uma maior admissão das partes ao processo, que este se desenvolva sob o signo do devido processo legal, com a observância de todos os princípios deste decorrente, bem como buscando que a solução final seja dotada de efetividade, outorgando-se a quem de direito, tudo aquilo e somente aquilo que tenha o direito de obter, consoante feliz máxima chiovendiana.

Analisando-se o direito positivo, a Constituição Federal de 1988 e as recentes reformas introduzidas no Código de Processo Civil e na legislação processual extravagante, vê-se claramente a busca de se aproximar de uma ordem jurídica mais justa.

Alguns aspectos demonstram esta tendência moderna de tornar prático o princípio da inafastibilidade do controle jurisdicional. São exemplos deste rumo do Processo Civil:

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a) a garantia da assistência judiciária gratuita e integral para os que comprovarem a insuficiência de recursos (art. 5º, LXXVI, da CF/88), sendo necessário a mera declaração para gozar dos benefícios da assistência judiciária gratuita;

b) criação e aperfeiçoamento de institutos jurídicos para a tutela dos mais diferentes direitos, sejam eles individuais ou coletivos. Exemplos clássicos do que foi dito são: o Mandado de Segurança coletivo, o Mandado de Injunção, o Habeas-Data, o alargamento da legitimidade e do objeto da Ação Popular e da Ação Civil Pública;

c) ampliação do campo da legitimidade processual - Exs.: Ação Direta de Inconstitucionalidade, legitimidade do partido político, organização sindical, entidade de classe ou associação no MS coletivo, legitimação da associação para representar seus filiados na defesa de seus direitos e legitimação do sindicato na defesa dos direitos e interesses da categoria (arts. 103; 5º, LXX e XXI; e, 8º, III, todos da Constituição Federal);

d) criação de órgãos específicos para atender a grande massa da população, como ocorre com instituição dos juizados especiais, previstos na Lei nº 9.099/95;

– PROCESSO - CONCEITO

Para exercer a função jurisdicional, o Estado cria órgãos especializados, contudo, esses órgãos encarregados da jurisdição não podem atuar discricionária ou livremente, dada a própria natureza da atividade que lhes compete. Subordinam-se, por isso mesmo, a um método ou sistema de atuação , que vem a ser o processo.

Entre o pedido e o provimento jurisdicional se impõe a prática de uma série de atos que formam o procedimento judicial, isto é, a forma de agir em juízo, e cujo conteúdo sistemático é o processo.

Do ponto de vista etimológico, processo significa “marcha avante”. Esta idéia, contudo, mais se aproxima da noção de procedimento, que se apresenta diversa da de processo.

Processo tem sentido teleológico, constituindo-se no instrumento pelo qual se exerce a atividade jurisdicional

– PRINCÍPIOS DO PROCESSO CIVIL

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Distingue-se também a existência de princípios fundamentais do processo civil, muito destes inclusive recebendo expressão constitucional. São exemplos:

a) Imparcialidade do juiz ( art.95 da CF) - Decorre da necessidade de o magistrado ser subjetivamente capaz (não ser suspeito nem impedido). O juiz deverá ficar eqüidistante das partes, para decidir imparcialmente. A imparcialidade liga-se ao caráter substitutivo da jurisdição e, sobretudo, ao princípio do juiz natural.

b) Igualdade ( art.5, caput, CF; art.125,I, do CPC)– Indica que deve haver tratamento igualitário entre as partes. A igualdade deve ser entendida do ponto de vista material. A justiça que é procurada no processo não será alcançada se não há igualdade entre as partes.

c) Contraditório – Também se constitui, assim como os outros, em garantia constitucional. Resta assegurado o direito à informação acerca dos atos e termos do processo, bem como a possibilidade de manifestar-se nos autos, deduzindo alegações, defesas e produzindo provas. É também chamado de princípio da bilateralidade da audiência.

d) Oralidade – Muitos autores defendem que o processo civil deveria se pautar mais pela oralidade, ao invés de valorizar tanto o procedimento escrito. Para haver oralidade, faz-se mister a presença de outros princípios, como: imediatidade (tem que haver um contato direto do juiz com as partes e as provas), concentração (procedimento deve ser concentrado em uma ou poucas audiências a serem realizadas em breve espaço de tempo), identidade física do juiz (o juiz da instrução deve sentenciar) e irrecorribilidade das interlocutórias ( não é o sistema vigente, diante do recurso do agravo).

e) Livre convencimento do juiz – A prova não deve ter um valor predeterminado, tampouco deve ficar unicamente ao arbítrio do juiz a valoração desta. O juiz deve livremente apreciar a prova, com a condicionante de que deve demonstrar as razões de sua decisão. É também conhecido por princípio da persuasão racional.

f) Princípio dispositivo ou da demanda – Não há jurisdição sem ação, pelo que a primeira deverá sempre ser provocada pela parte.

g) Impulso oficial – Apesar de iniciar por provocação, o processo se desenvolve por impulso oficial, podendo o juiz determinar o andamento do processo. Não se pode olvidar, contudo, que, no curso do processo, persiste, em algumas hipóteses, a necessidade de alegação das partes.

h) Princípios da publicidade e da motivação – Estão previstos no artigo 93, IX, da Constituição. São garantias do Estado Democrático de Direito. O processo deve ser público, salvo para resguardar o decoro e a intimidade ( casos de segredo de justiça). Deve haver também fundamentação das decisões, para que possa haver o controle judicial destas, evitando-se abusos e deformações do processo.

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i) Princípio da lealdade – É decorrência da boa-fé que deve informar os litigantes. Há penalidades para o atuar desleal das partes (arts.17 e 18 do CPC).

J) Princípio da economia processual – Deve-se buscar o máximo da atuação do processo, com o mínimo de atividades processuais. Colima-se evitar repetições desnecessárias.

k) Duplo grau de jurisdição – É a possibilidade de reexame das decisões judiciais pelo mesmo juízo ou por juízo diverso, geralmente de instância superior, mas não necessariamente. Implícita ou indiretamente prevê a Constituição o duplo grau de jurisdição quando, entre outras coisas, incube-se de atribuir competência recursal a diversos órgãos do Poder Judiciário ( art.102,II; 105,II; 198,II ).

l) Instrumentalidade das formas – Embora haja necessidade de se estabelecer formas para os atos processuais, os mesmos consideram-se hígidos quando, mesmo inobservada a forma, atingirem sua finalidade ou não causarem prejuízo. Busca-se o total aproveitamento dos atos processuais.

– CAPACIDADE PROCESSUAL (art.7º CPC)

A capacidade processual consiste na aptidão de participar da relação processual, em nome próprio ou alheio.

Em regra geral, a capacidade que se exige da parte para o processo é a mesma que se reclama para os atos da vida civil em geral, isto é, para a prática dos atos jurídicos de direito material. Sobre o tema, convém diferenciar:

a) Capacidade de ser parte – Está intimamente ligada com a personalidade jurídica ou capacidade de direito. Têm capacidade para ser parte aqueles que têm aptidão para serem sujeitos de direitos e obrigações. È pressuposto pré-processual. O incapaz tem capacidade de ser parte, mas não possui capacidade processual.

b) Capacidade processual ou capacidade de estar em juízo – Têm capacidade para estar em juízo aqueles que puderem, por si próprios, exercer os atos da vida civil. Relaciona-se com a capacidade de fato ou de exercício.

Não têm capacidade de estar em juízo os absolutamente e os relativamente incapazes. Para estes é necessária a integração da capacidade através da representação ou assistência, conforme o caso. Tem-se ainda que o representante não é considerado parte, mas sim gestor de interesses alheios, pois age em nome alheio para a tutela de direito alheio.

A capacidade processual é pressuposto de validade do processo. Sendo a capacidade processual um pressuposto de validade, somente estando ela presente em relação a todas as outras partes é que o juiz poderá julgar o mérito da causa, caso contrário extinguirá o processo sem resolução, em consonância com o artigo 267,IV, do CPC, caso a situação não

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seja regularizada no prazo por ele fixado. Não sendo sanado o defeito, o juiz declarará a nulidade do processo se a incapacidade for do autor; a revelia se a incapacidade for do réu; se for de terceiro a incapacidade, será excluído do processo.

Trata-se de nulidade sanável, não podendo ser decretada antes de o juiz assinar o prazo do art. 13 do CPC para a sua regularização. Como é matéria de ordem pública, pode ser alegada a qualquer tempo e grau de jurisdição, devendo o juiz conhecê-la de ofício.

c) Capacidade postulatória - Indica a necessidade da parte ser representada por advogado legalmente habilitado. Tem capacidade postulatória o advogado regularmente inscrito no quadro da OAB, bem como o Ministério Público, tanto para a ação penal, quanto para o processo civil.

– SUJEITOS DO PROCESSO – PARTES E PROCURADORES

O processo só se estabelece plenamente com a participação de três sujeitos principais: Estado, autor e réu.

Gera o processo uma relação jurídica trilateral que vincula os sujeitos da lide e o juiz, todos à procura de uma solução para o conflito de interesses estabelecido em torno da pretensão de direito material de um dos litigantes e da resistência do outro.

Sem a presença do órgão judicial é impossível o estabelecimento da relação jurídica processual. Mas também, sem a provocação da parte, o juiz não pode instaurar o processo. Por outro lado, se aparte não cuida de fornecer ou indicar os meios de prova necessários à tutela de sua pretensão ou não exercitar as faculdades de defesa ou resposta, a solução a que será conduzido o juiz poderá não ser aquela a que corresponderia a verdadeira situação jurídica material.

Assim, a parte, além de sujeito da lide ou do negócio jurídico material deduzido em juízo, é também sujeito do processo, “no sentido de que é uma das pessoas que fazem o processo”, seja no sentido ativo ou no passivo.

Pode-se, portanto, distinguir dois conceitos de parte: como sujeito da lide, tem-se a parte em sentido material, e como sujeito do processo, a parte em sentido processual.

Como nem sempre o sujeito da lide se identifica com o que promove o processo, como se dá, por exemplo, nos casos de substituição processual, pode-se definir a parte para o direito processual como a pessoa que pede ou perante a qual se pede, em nome próprio, a tutela jurisdicional.

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– SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL (art.6º CPC)

Em regra a titularidade da ação vincula-se à titularidade do pretendido direito material subjetivo, envolvido na lide (legitimação ordinária).

Assim, “ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei ( art.6º CPC).

Há, só por exceção, portanto, casos em que a parte processual é pessoa distinta daquela que é parte material do negócio jurídico litigioso. Quando isso acontece, dá-se a substituição processual ou legitimação extraordinária, que consiste em demandar a parte, em nome próprio, a tutela de um direito controvertido de outrem. Trata-se de uma faculdade excepcional, pois só nos casos expressamente autorizados em lei é possível tal substituição.

Exemplo claro de substituição processual está previsto no artigo 42 do CPC, ou seja, quando a parte, na pendência do processo, aliena a coisa litigiosa ou cede o direito pleiteado em juízo. Embora, neste caso, o alienante deixe de ser o sujeito material da lide, continua a figurar na relação processual como parte (sujeito do processo), agindo em nome próprio, mas na defesa de direito material de terceiro, o adquirente (substituição superveniente).

Pode-se afirmar que o substituto processual também é parte e tem atividade autônoma da vontade do substituído. Poderá, pois, praticar todos os atos processuais permitidos às partes (produzir provas, recorrer etc.). Como autor pode ajuizar ação; como réu pode contestar.

- AÇÃO

– CONCEITO

O direito de ação é o direito subjetivo público de pleitear ao Poder Judiciário uma decisão sobre uma pretensão.

Desde o momento em que o estado instituiu a proibição da justiça privada, foi outorgado aos cidadãos o direito de recorrer a órgãos estatais para a solução de seus conflitos de interesses. Primitivamente, entendeu-se o direito de ação como um complemento do direito subjetivo de cada um, mas a doutrina percebeu que aquele era independente deste, isto é, que o direito de ação existia independentemente da existência do direito subjetivo. Aliás. Chiovenda demonstrou, em seu trabalho sobre a ação declaratória negativa, que alguém poderia pleitear ao judiciário a declaração de que não existe uma relação jurídica de direito material entre dois sujeitos, de modo que o direito de pleitear (direito de ação) é autônomo e independente do direito material ou relação jurídica material eventualmente existente entre as partes.

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Além disso, ficou claro que o direito de ação não é dirigido contra o réu, mas sim contra o Estado, porque é o direito de obter dele uma decisão sobre determinado pedido. É verdade que com o pedido ao judiciário, pretende o autor que os efeitos almejados se produzam contra alguém, o réu, mas o direito de agir se exerce perante o Estado-Juiz.

Em contrapartida, o direito de ação, no que concerne ao réu, traduz-se em direito de defesa, ou seja, o direito de somente se ver constrangido a algo após a decisão judicial, com a garantia de que a decisão só sobreviverá após ser ouvido e ter oportunidade de produzir prova e manifestar-se adequadamente. Por isso se diz que o direito de ação é uma direito subjetivo ( de cada um) público, que se exerce contra o Estado, do qual se exige uma decisão sobre uma pretensão. É também um direito abstrato, autônomo e, ainda, instrumental.

A pretensão é o bem jurídico que o autor deseja obter por meio da atuação jurisdicional. É também chamada pretensão de direito material, porque o resultado pretendido deverá projetar-se nessa área. A pretensão, sim, é dirigida contra o réu, pois é contra ele que o autor deseja a produção dos efeitos da decisão, a fim de obter o que não está conseguindo sem a intervenção jurisdicional.

– CONDIÇÕES DA AÇÃO

Certo é que a jurisdição, o processo e ação são três elementos e indissoluvelmente ligados e que representam a trilogia estrutural dos conceitos básicos ou fundamentais do direito processual civil.

Mas a prestação jurisdicional realizada através do processo e em resposta à ação não é dispensada à parte como simples assessoramento consultivo ou acadêmico; pressupõe, ao contrário, uma situação concreta litigiosa a dirimir em que o manejador do direito de ação tenha realmente interesse tutelável.

Sendo um método ou sistema, o processo subordina-se a requisitos e condições indispensáveis à sua própria existência e eficácia.

Não se pode alcançar, como é óbvio, a tutela jurisdicional mediante qualquer manifestação de vontade perante o órgão judicante. Tem-se, primeiro, que se observar os requisitos de estabelecimento e desenvolvimento válidos da relação processual, como a capacidade da parte, a representação por advogado, a competência do juízo etc (pressupostos processuais já examinados).

Não atendidos tais pressupostos, não há viabilidade de desenvolver-se regularmente o processo, que, assim, não funcionará como instrumento hábil à composição do litígio ou ao julgamento do mérito da causa.

Mas, para que o processo seja eficaz para atingir o fim buscado pela parte, não basta, ainda, a simples validade jurídica da relação processual regularmente estabelecida

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entre os interessados e o juiz. Para atingir-se a prestação jurisdicional, ou seja, a solução do mérito, é necessário que a lide seja deduzida em juízo com observância de alguns requisitos básicos, sem cuja presença o órgão jurisdicional não estará em situação de enfrentar o litígio e dar às partes uma solução que componha definitivamente o conflito de interesses.

É que, embora abstrata, a ação não é genérica, de modo que, para obter a tutela jurídica, é indispensável que o autor demonstre uma pretensão idônea a ser objeto da atividade jurisdicional do Estado. Vale dizer: a existência da ação depende de alguns requisitos constitutivos que se chamam “condições da ação”, cuja ausência, de qualquer uma delas, leva à “carência de ação”, e cujo exame deve ser feito, em cada caso concreto, preliminarmente à apreciação do mérito, em caráter prejudicial.

Vale notar que a falta de uma das condições da ação acarreta a extinção do processo sem julgamento do mérito (art.267,VI), acorrendo, portanto, a carência de ação.

Por fim, é válido ressaltar que a carência de ação é matéria de ordem pública e pode ser conhecida de ofício em qualquer tempo ou grau de jurisdição, não havendo, pois que se falar em preclusão quanto a essa matéria.

São condições da ação a legitimidade, o interesse e a possibilidade jurídica do pedido.

a) Legitimidade - A legitimidade refere-se às partes, sendo denominada, também, legitimação para agir ou, legitimatio ad causam. A legitimidade, no dizer de alfredo Buzaid, é a pertinência subjetiva da ação, isto é, a regularidade do poder de demandar de determinada pessoa sobre determinado objeto. A cada um de nós não é permitido propor ações sobre todas as lides que ocorrem no mundo. Em regra, somente podem demandar aqueles que forem sujeitos da relação jurídica de direito material trazida a juízo (legitimação ordinária). Cada um deve propor as ações relativas aos seus direitos. Salvo casos excepcionais expressamente previstos em lei, quem está autorizado a agir é o sujeito da relação jurídica discutida.

Há casos em que texto expresso de lei autoriza alguém que não seja o sujeito da relação jurídica de direito material a demandar. Nestes casos, diz-se que a legitimação é extraordinária.

A legitimação extraordinária foi denominada por Chivenda “substituição processual”, e ocorre quando alguém, em virtude de texto legal expresso, tem qualidade para litigar, em nome próprio, sobre direito alheio. São comumente citados como exemplos dessa figura a ação do Ministério Público na ação de acidente do trabalho e na ação ex delicto, quando a vitima é pobre etc.

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Diferem legitimação extraordinária de representação processual. A substituição ocorre, como já se disse, quando a lei autoriza que alguém demande, em nome próprio, sobre direito alheio; já a representação processual verifica-se quando alguém ( o representado) demanda por intermédio de outrem ( o representante). Este atua em nome alheio sobre direito alheio. A representação resulta da lei, como, por exemplo, a dos pais que representam os filhos menores em juízo e fora dele, e do contrato, em virtude do mandato que se outorga por meio de procuração.

Na primeira figura, quem é parte e exerce toda a atividade processual é o substituto, cabendo ao substituído, apenas, suportar os efeitos da demanda; na representação, por sua vez, a parte é o representado, sofrendo ele também os resultados da ação, sendo que o representante exerce a atividade processual em nome dele.

A legitimação para ser regular, deve verificar-se no pólo ativo e no pólo passivo da relação processual. O autor deve estar legitimado para agir em relação ao objeto da demanda e deve propô-la contra o outro pólo da relação jurídica discutida, ou seja, o ré deve ser aquele que, por força da ordem jurídica material, deve, adequadamente, suportar as consequências da demanda.

Apesar de a legitimidade ser examinada no processo e ser uma condição da ação, a regra é a de que as normas definidoras da parte legítima estão no direito material, porque é ele que define as relações jurídicas entre os sujeitos de direito, determinando quais os respectivos titulares. Assim, somente a análise cuidadosa das relações jurídicas entre os sujeitos, a serem submetidas ao judiciário, é que determinará a legitimatio ad causam .

b) Interesse de agir – O termo interesse pode ser empregado em duas acepções: como sinônimo de pretensão, qualificando-se, então, como interesse substancial ou de direito material, e para definir a relação de necessidade existente entre um pedido e a atuação do Judiciário, chamando-se, neste caso, interesse processual.

O interesse processual é, portanto, a necessidade de se recorrer ao Judiciário para a obtenção do resultado pretendido, independentemente da legitimidade ou legalidade da pretensão. Para verificar-se se o autor tem interesse processual para a ação deve-se responder afirmativamente à seguinte indagação: para obter o que pretende o autor necessita da providência jurisdicional pleiteada?

Faltará o interesse processual se a via jurisdicional não for indispensável, como, por exemplo, se o mesmo resultado puder ser alcançado por meio de um negócio jurídico sem a participação do judiciário.

O interesse processual é, portanto, uma relação de necessidade e uma relação de adequação, porque é inútil a provocação da tutela jurisdicional se ela, em tese, não

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for apta a produzir a correção da lesão arguida na inicial. Haverá, pois, falta de interesse processual se, descrita determinada situação jurídica, a providência pleiteada não for adequada a essa situação. Se alguém, por exemplo, foi esbulhado em sua posse, fará pedido inadequado, faltando-lhe interesse, se pleitear a declaração de que e proprietário, pois, neste exemplo, o pedido só pode ser de devolução da posse, indevidamente esbulhada.

Parcela da doutrina se manifesta no sentido de que o Código de Processo Civil exige, quanto ao interesse, também a utilidade, e que o parágrafo único do artigo 4º existe exatamente porque é uma exceção a essa regra. Se o princípio geral do Código dispensasse a utilidade para a ocorrência de interesse, o dispositivo referido seria inútil e repetitivo, justificando-se, pois, em virtude de sua excepcionalidade ou seja, porque o Código, em princípio, somente admite a provocação do judiciário quando o autor tiver necessidade de obter o provimento jurisdicional e, também, quando esse provimento lhe puder trazer utilidade prática.

Assim, diz-se existir interesse de agir quando está presente o trinômio necessidade-utilidade-adequação. É preciso que haja necessidade de buscar a proteção do Poder Judiciário, bem como que a providência requerida venha a ser útil e que o meio utilizado seja adequado para o fim pretendido.

c) Possibilidade Jurídica do Pedido – Indica-se a exigência de que deve existir, abstratamente, dentro do ordenamento jurídico, um tipo de providência como a que se pede através da ação. Esse requisito, de tal sorte, consiste na prévia verificação que incumbe ao juiz fazer sobre a viabilidade jurídica da pretensão deduzida pela parte em face do direito positivo em vigor. O exame realiza-se, assim, abstrata e idealmente, diante do ordenamento jurídico.

Cabe observar que a rejeição da ação por falta de possibilidade jurídica deve limitar-se às hipóteses claramente vedadas, não sendo o caso de se impedir a ação quando o fundamento for injurídico, pois, se o direito não protege determinado interesse, isto significa que a ação deve ser julgada improcedente e não o autor carecedor de ação.

São exemplos de pedidos juridicamente impossíveis: a revogação de adoção; herança de pessoa viva;cobrança de dívidas de jogo etc.