TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA: QUESTÕES E … · 10-“O que mais me custa hoje no contexto escolar...

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1 TRABALHO DOCENTE E DIDÁTICA: QUESTÕES E PERSPECTIVAS Vera Candau 2012

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TRABALHO DOCENTE E

DIDÁTICA: QUESTÕES E

PERSPECTIVAS

Vera Candau

2012

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1. Introdução

- pesquisa do GECEC – CNPq/PUC-Rio

- sociedade contemporânea: metáforas

“aldeia global” (McLuhan)“sociedade em rede” (Castells) “sociedade líquida” (Bauman) “choque de civilizações”

(Huntington)

- vivemos não somente numa época de mudanças aceleradas mas uma mudança de época

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É neste contexto de questões

e buscas que queremos

situar o presente trabalho.

OBJETIVO:

analisar as relações entre

Educação Escolar, Didática e

Interculturalidade no

momento atual.

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TRÊS TESES FUNDAMENTAIS:

A educação escolar, configurada a partir da modernidade, está instada a ser “reinventada” para enfrentar as questões atuais de um mundo complexo, desigual, diverso e plural.

2. A perspectiva crítica da Didática, que teve um amplo e significativo desenvolvimento no nosso país, está hoje desafiada por questões que exigem novos desenvolvimentos, buscas, preocupações e pesquisas.

3. É a partir do enfoque intercultural que apostamos na construção deste processo de ressignificação da Didática.

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2. Educação Escolar: entre a crise

e a reinvenção

Veiga Neto (2003):

Sentimos que a escola está em crise

porque percebemos que ela está cada vez

mais desenraizada da sociedade. [...] A

educação escolarizada funcionou como

uma imensa maquinaria encarregada de

fabricar o sujeito moderno. [...] Mas o

mundo mudou e continua mudando,

rapidamente sem que a escola esteja

acompanhando tais mudanças.”

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DUBET (2011):

“Em todos os lugares e não somente na

escola , o programa institucional

[republicano] declina. E essa mutação é

muito mais ampla que a simples

confrontação da escola com novos

alunos e com os problemas engendrados

por novas demandas. É também porque

se trata de uma mutação radical que a

identidade dos atores da escola fica

fortemente perturbada, para além dos

problemas específicos com os quais eles

se deparam.

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DUBET (cont):

A escola foi um programa instiucional

moderno, mas um programa institucional

apesar de tudo. Hoje somos “ainda mais

modernos”, as contradições desse

programa explodem, não apenas sob o

efeito de uma ameaça externa, mas de

causas endógenas, inacritas no germe da

própria modernidade”. (REB, n.47,p.299)

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3. TRABALHO DOCENTE HOJE

DEPOIMENTOS

-“Hoje ao começar as aulas me sinto

inseguro e tenso. Antes não me sentia

assim… Sabia muito bem como

manejar a situação. Sentia que tinha

autoridade com os alunos e minha

função educativa era socialmente

reconhecida. No entanto, hoje tenho a

sensação de não saber o que pode

acontecer na escola e na sala de aula e

qual será minha reação”.

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-“Para mim ser professor hoje é estar

sendo continuamente avaliado. Se a

escola vai mal, nós somos os

responsáveis. Os alunos têm baixo

desempenho nos exames nacionais e

internacionais porque somos

incompetentes. As famílias estão

insatisfeitas com a escola porque nós

não damos a devida atenção aos

alunos. Tenho a sensação de estar

sendo julgado todo o tempo. Sinto-me

sob contínua pressão”.

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-“O que mais me custa hoje no contexto

escolar é a incidência da violência. As

formas agressivas de relacionamento entre

os alunos, os conflitos entre professores e

alunos, as manifestações de bullying, entre

outras formas de discriminação em relação

a determinados alunos considerados

diferentes. O ambiente escolar resulta

pesado. Já me senti, em anos anteriores,

muito gratificado na escola. Hoje estou

sempre em clima de “alerta”, esperando

que algo aconteça”.

-“As diferenças estão bombando na escola.

Não sabemos o que fazer”.

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-“As crianças e adolescentes em geral manejam

muito bem a Internet e os celulares e participam de

várias redes sociais. A interação digital parece ser

“natural” para eles, é seu mundo. Não é o meu. Não

lido com esta realidade da mesma forma que eles e

muitas vezes me sinto perdido”.

-“Para mim o que está acontecendo é que a família

está pondo toda a responsabilidade da educação

das crianças e adolescentes na escola. Os pais não

têm tempo ou não sabem o que fazer com os filhos

e acham que nós, os professores, temos de educá-

los em todos os sentido: intelectual, ético, social,

sexual, em relação ao meio ambiente, ao trânsito,

às drogas, etc. Nós não estamos preparados para

assumir tanta responsabilidades e não acho que

seja desejável”.

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• “Acredito que o mal-estar que se vem

acentuando em nossas escolas exige

que nos enfrentemos com a questão

da crise atual da escola não de um

modo superficial, que tenta reduzi-la à

inadequação de métodos e técnicas, à

introdução das tecnologias da

informação e da comunicação de

forma intensiva, ou ao ajuste da

escola à lógica do mercado e da

modernização. Penso que a crise da

escola se situa em um nível mais

profundo”.

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Estes desafios questionam os

conhecimentos e as pesquisas vigentes no

âmbito da Didática e nos obrigam a investir

numa compreensão mais aprofundada da

realidade das escolas e do trabalho

docente hoje.

A buscar caminhos de promover

processos de ensino-aprendizagem mais

significativos e produtores de criatividade

e construção de sujeitos plenos, tento no

âmbito pessoal como social. Neste sentido

consideramos importante dialogar com a

perspectiva intercultural.

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3.Didática e Interculturalidade:

desafios atuais

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EDUCAÇÃO INTERCULTURAL

amplo desenvolvimento na

América latina

admite diferentes significados

ancoragem em múltiplos

referencias teóricos

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Lopez-Hurtado Quiroz (2007, p.21-22):

Nestes trinta anos, desde que o termo foi acunhado

na região, a aceitação da noção transcendeu o

âmbito dos programas e projetos referidos aos

indígenas e hoje um número importante de países,

do México à Terra do Fogo, veem nela uma

possibilidade de transformar tanto a sociedade em

seu conjunto como também os sistemas educativos

nacionais, no sentido de uma articulação mais

democrática das diferentes sociedades e povos que

integram um determinado país. Desde este ponto de

vista, a interculturalidade supõe agora também

abertura diante das diferenças étnicas, culturais e

lingüísticas, aceitação positiva da diversidade,

respeito mútuo, busca de consenso e, ao mesmo

tempo, reconhecimento e aceitação do dissenso, e

na atualidade, construção de novos modos de

relação social e maior democracia.

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PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

desconstruir, desnaturalizar o

caráter monocultural e etnocêntrico da

cultura escolar e da escola

articular igualdade e diferença

resgatar processos de construção

de identidades socioculturais

promover experiências sistemáticas

de interação com os „outros”

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Educação Intercultural

Construção de um Mapa Conceitual

● origem: Novak (1970)

● utilizados para diferentes finalidades:

organização de sequências de

aprendizagem, estratégias de estudo,

construção de instrumentos de avaliação

escolar, realização de pesquisas

educacionais, entre outras.

● ferramenta cujo principal objetivo é

organizar e representar o conhecimento.

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MAPA CONCEITUAL

CATEGORIAS BÁSICAS

SUJEITOS E ATORES

CONHECIMENTOS E SABERES

PRÁTICAS SOCIOEDUCATIVAS

POLÍTICAS PÚBLICAS

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Educação

Intercultural

Sujeitos e

Atores

Políticas

Públicas

Práticas

Sócio-educativas

Saberes e

Conhecimento

Reconhecimento

e Redistribuição

Movimentos

Sociais

Democracia

Radical

Saberes

Sociais

Universalismo e

Relativismo

Conhecimento

científico

Emancipação e

Autonomia

Identidade

Empoderamento

Construção

Coletiva

Diferenciação

PedagógicaConflitos

Múltiplas

Linguagens

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CATEGORIA:SULEITOS E ATORES

► refere-se à promoção de relações tanto

entre sujeitos individuais, quanto entre

grupos socioculturais.

► visa fortalecer a construção de

identidades dinâmicas, abertas e plurais,

assim como questiona uma visão

essencializada de sua constituição.

► potencia o empoderamento,

principalmente de sujeitos e atores

inferiorizados e subalternizados e a

construção da autoestima e da autonomia

num horizonte de emancipação social.

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Neste sentido, é importante que as

práticas educativas:

▪ partam do reconhecimento das

diferenças presentes na escola e na

sala de aula, o que exige romper com

os processos de homogeneização,

que invisibilizam e ocultam as

diferenças e reforçam o caráter

monocultural das culturas escolares

▪ desnaturalizem o “daltonismo

cultural” (Cortesão/Stoer)

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▪ exige valorizar as histórias de vida de

alunos/as e professores/as e a construção

de suas identidades culturais, favorecendo

a troca, o intercâmbio e o reconhecimento

mútuo; estimula que se perguntem quem

situam na categoria de “nós” e quem são

os “outros” para eles;

▪ convida à interação da escola com os

diferentes grupos presentes na

comunidade e no tecido social mais amplo,

favorecendo uma dinâmica escolar aberta e

inclusiva.

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CATEGORIA:

SABERES E CONHECIMENTOS

► esta categoria tem uma especial importância

para a Didática; convém ter presente que há

autores que empregam estes termos como

sinônimos, enquanto outros os diferenciam e

problematizam a relação entre eles

► parto da afirmação da ancoragem historico-social

dos diferentes saberes e conhecimentos e de seu

caráter dinâmico, o que supõe analisar suas raízes

históricas e o desenvolvimento que foram sofrendo,

sempre em íntima relação com os contextos nos

quais este processo se vai dando e os mecanismos

de poder nele presentes

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► Nesta perspectiva, é importante conceber a

escola como um espaço fluido e de complexo

cruzamento de culturas, conhecimentos e saberes

que se dá de diferentes maneiras, algumas vezes de

modo confluente ou complementário, e outras de

interação tensa, chegando mesmo a um confronto

entre diferentes posições; as tensões entre

universalismo e relativismo no plano epistemológico

e pedagógico em geral, se fazem especialmente

presentes.

► O que considero importante na perspectiva

intercultural é estimular o diálogo, o respeito mútuo e

a construção de pontes e conhecimentos comuns no

cotidiano escolar, nos processos de ensino-

aprendizagem desenvolvidos nas salas de aula.

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CATEGORIA:

PRÁTICAS SOCIOEDUCATIVAS

► exige colocar em questão as dinâmicas

habituais dos processos educativos, muitas

vezes padronizadores e uniformes,

desvinculados dos contextos socioculturais

dos sujeitos que dele participam e baseados

no modelo frontal de ensino-aprendizagem

►favorece dinâmicas participativas,

processos de diferenciação pedagógica, a

utilização de múltiplas linguagens e estimula

a construção coletiva

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CATEGORIA:

PRÁTICAS SOCIOEDUCATIVAS

►2 aspectos de especial relevância:

Diferenciação pedagógica: “desengessar” a sala

de aula, multiplicar/diversificar espaços e tempos

de ensinar e aprender;

Utilização de múltiplas linguagens e mídias no

cotidiano escolar; não se trata simplesmente de

introduzir as TICs e sim de dialogar com os

processos de mudança cultural, presentes em

toda a população, tendo, no entanto com maior

incidência entre os jovens e as crianças.

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CATEGORIA:

POLÍTICAS PÚBLICAS

►reconhece os diferentes movimentos

sociais que vem se organizando em torno

de questões identitárias

►defende a articulação entre políticas de

reconhecimento e de redistribuição

► apóia políticas de ação afirmativa

orientadas a fortalecer processos de

construção democrática

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CATEGORIA:

POLÍTICAS PÚBLICAS

►Na perspectiva da Didática, supõe ter

sempre presente o contexto onde se realizam

as práticas educativas, os constrangimentos e

possibilidades que lhe são inerentes, e

desenvolver um diálogo crítico e propositivo

orientado a fortalecer perspectivas educativas

e sociais orientadas a radicalizar os processos

democráticos e articular igualdade e diferença,

em todos os níveis e âmbitos, do macrossocial

à sala de aula. Afirma que o horizonte

emancipador é a referência fundamental.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

►Assumo a perspectiva de que é necessário

“reinventar a escola”, para que possa ser mais

significativa e relevante para os tempos pós-

modernos em que vivemos. Não se trata de negar

suas referências fundantes: as questões

relacionadas aos conhecimentos e saberes social

e historicamente produzidos, à cidadania e à

construção de sonhos e projetos pessoais e

coletivos. Não se trata de negar a utopia e

mergulhar nos fragmentos e na dinâmica do

instantâneo e provisório. Reinventar exige

ressignificar e construir uma nova configuração.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

►Nesta perspectiva a Didática e o

Trabalho Docente estão chamados a

desenvolver uma reflexão crítica e

intercultural sobre os desafios atuais e

à produção de conhecimentos e

práticas que ofereçam elementos

significativos para reinventar a

educação escolar, tornando-a mais

significativa para os tempos difíceis e

incertos em que vivemos.