trabalho Raphael

12
ESTUDOS NO GAA RAPHAEL BOËCHAT ALVES MACHADO Tema: “ A Interpretação dos Contratos sob a Ótica do Modelo Complexo”

Transcript of trabalho Raphael

Page 1: trabalho Raphael

ESTUDOS NO GAARAPHAEL BOËCHAT ALVES MACHADO

Tema: “ A Interpretação dos Contratos sob a Ótica do Modelo Complexo”

BELO HORIZONTE09 DE JUNHO DE 2010-07-09

Page 2: trabalho Raphael

SUMÁRIO

CAPÍTULO I

O MODELO LIBERAL DO CONTRATO

a) Estado Liberal

b) Dogma da Vontade

c) Intervenção mínima do Estado nos contratos, apenas vícios de vontade;

d) O Código Civil de 16 e a pacta sunt servanda;

e) Críticas – a estratificação do modelo e queda, pano de fundo histórico.

CAPÍTULO II

a) O modelo Solidarista do Direito contratual;

b) O modelo welfarista

c) Ascensão do Bem Estar Social;

d) Os deveres de cooperação mútuo, o contrato como interesse social, institucionalização do contrato;

e) A queda do modelo welfarista;

CAPÍTULO III

a) a interpretação complexa dos contratos;

b) a insegurança dos contratos diante do modelo welfarista e julgamentos;

c) interpretação complexa do artigo 421 CC;

d) exemplos da complexidade dos contratos, efeitos colaterais;

e) considerações finais

Page 3: trabalho Raphael

Capítulo IO MODELO LIBERAL DO CONTRATO

Como tendência as relações humanas, o Estado Liberal se opôs, em total, ao período medieval, do poder absoluto dos Reis.

Nessa tendência a total rupturas dos paradigmas, conceituou-se que o Estado deveria intervir o mínimo possível na economia, posto que seria da própria sociedade a busca pelo que melhor lhe conviesse.

Tal fenômeno cultural, por óbvio, gerou reflexos imediatos as relações comerciais, ramo dinâmico que atua intrinsecamente ao cotidiano da sociedade.

Assim, neste novo modelo de concepção social, há plena ruptura com a intervenção Estatal, surge dos ideais franceses de igualdade, fraternidade e liberdade, época dos anos 1789, ou seja, final do século XVIII.

Neste momento histórico, é plena a idéia da ruptura, haja vista que a revolução francesa é encabeçada pela burguesia, 3ª classe da época, abaixo dos reis e nobres, logo, não é difícil imaginar que esta revolta de classe buscasse os ideais que melhor lhe conviesse e, por excelência, romper com as amarras do Estado Absolutista para então os ideais privados.

Surge então à autonomia da vontade, sendo então a vontade do indivíduo inquestionável, na medida em que este teria total capacidade de defender os seus interesses, e não cabia a ninguém dizer o contrário, quiçá o Estado.

Também parece lógico que uma classe emergente detentora do poder monetário da época defendesse os seus interesses, como lucro, expansão do comércio, etc.

Daí o vigor da autonomia da vontade.

Nasce o conceito de auto interesse no qual o homem não vive em sociedade, e sim se relaciona por interesse próprio, posto que o homem é o centro e precede a própria formação do Estado.

Nesse sentido, é válida a lição de UNGER, Roberto Mangabeira, em O direito na Sociedade Moderna, pag 157:

“qual exatamente a natureza do vínculo social. Darei o nome de associação de interesses. (...) Em outras palavras, o sujeito aceita e obedece a um arcabouço estruturado de relações recíprocas com os outros como meio de atingir os seus próprios fins.

Sendo assim, com esse fervor pelo interesse próprio, há ascensão da idéia da autonomia da vontade, esta é a última e única instância para o direito de contratar, o contratual é o justo, e não haverá intervenção Estatal, a não ser que haja vício de consentimentos, como dolo ou coação.

Page 4: trabalho Raphael

É clara a idéia de que com a garantia da livre manifestação haver-se-ia promoção da justiça.

Nesta idéia foi traçado o Código Civil de 1916, onde somente há previsão de intervenção do Estado nos vícios sociais, como simulação, etc. ou mesmo na autodeterminação inconsciente, como no caso dos loucos, incapazes, coação, etc.

Há pleno silenciamento do CC/16 com relação aos mecanismos de reequilíbrio ou mesmo intervenção judicial nos contratos; sendo que tal fato acompanha, por exemplo, a idéia de propriedade naquela época, ou seja, de se poder fazer e dispor de acordo com o interesse do proprietário; ora, se o indivíduo pode bem dispor de sua propriedade como lhe convier, assim o será em sua vontade.

A percepção da época diz respeito à tendência ao equilíbrio dos mercados, este se auto-regulamentaria, logo, há plena repulsa as interferências externas das fontes do mercado.

Essa idéia estática de auto-suficiência acaba por engessar os contratos, estes estão alheios aos acontecimentos sociais, políticos e econômicos, pois a autonomia da vontade o rege, e, tal fato, é o suficiente para garantir-lhe a legalidade.

Não é necessário muito esforço para vermos as falhas neste raciocínio, pois se fragiliza as hipóteses de controle econômico, contratos de execução continuadas, etc.

O mercado é imperfeito, não existe, por exemplo, a concorrência perfeita, os oligopólios, monopólios, cartéis são exemplos de como a autonomia da vontade não existe, um contrato concebido mediante esta realidade não está inadstrito aos vícios.

Capítulo IIO MODELO SOLIDARISTA DO CONTRATO

Pois bem, nessa continuação lógica ao raciocínio acima exposto, por óbvio, o modelo liberal começa a ficar ultrapassado, já não atende mais as necessidades sociais.

Estamos no início do Século XX e na Rússia já há a os indícios de uma revolução estatal, com as idéias socialistas, estamos também no início das idéias do sufrágio universal, já há a extensão dos votos para as mulheres e os tidos como maduros, este fato chegará ao Brasil nas décadas de 30 em diante.

Note-se que da mesma forma em que se borbulhava a idéia de liberdade privada, como encabeçada na revolução francesa tendeu a romper com o antigo regime, há o surgimento de um clamor por uma nova classe emergente, os trabalhadores, as minorias de grupo que representam a maioria da população.

Logo, há o retorno no Estado para garantir o direito de todos, pelo menos os direitos indispensáveis, ou assim descritos.

Page 5: trabalho Raphael

É também nesse momento temporal que há o rompimento com a sociedade escravocrata e agrária do final do século XIX para então a economia de serviços urbanos, o êxodo rural e estrutura social.

Neste momento, sonha-se com uma sociedade mais justa e igualitária, ressoam as palavras de durkheim, duguit, demogue dentre outros, nasce o chamado direito a solidariedade.

Nesse clamor pelo bem estar social, surge a famosa figura do Walfare State, o qual põe o Estado como agente da promoção do bem estar social e organizador da economia.

Externa bem o sentimento da época Georges Ripert, em o regime democrático e o direito civil moderno:

Se os homens são irmãos, devem ser iguais, se não o são, o mais fraco tem direito de ser protegido. A experiência demonstra que a liberdade não basta para assegurar a liberdade, pois os mais fortes depressa se tornam opressores. Cabe neste caso ao Estado para intervir para proteger os fracos. O dever que cada particular não cumpre em relação ao próximo, (...) pertence ao Estado cumpri-lo em nome de todos, e quando passa a ser um dever do Estrado torna-se um direito para quem se beneficia dele. A democracia moderna assegura a proteção dos fracos com tanto mais condescendência quanto estes são, de fato, os mais numerosos”

Sendo assim, o Estado chama para si o bem estar social e os princípios contratuais antes eminentemente privados são ora relativizados, pois devem resguardar o interesse social.

O Estado deverá intervir nos contratos para garantir um mínimo de lealdade, cooperação, equilíbrio e de interesse públicos, sendo a manutenção do vínculo e a consecução do contrato, o foco do direito contratual welfarista.

É concebida a idéia da intervenção Estatal a GRANO SALIS, ou seja, a vontade é autônoma, porém, o Estado deverá intervir quando o contrato resultar em prejuízo para a sociedade, nesse momento ocorre à institucionalização dos contratos.

Com a reabertura dos modelos contratuais ao Estado, há a percepção de que os contratos não emanam da autonomia da vontade, mas da necessidade da sociedade em se relacionar e adquirir serviços, em fazer a economia girar.

Há uma divisão dos trabalhos, sendo assim, há, por óbvio, uma maior necessidade de se correlacionar.

Portanto, há um clamor para a intervenção do Estado, no sentido de se garantir o bem estar comum.

Assim, se há uma maior necessidade de relação, há uma maior necessidade de cooperação e esta palavra irá designar as novas intervenções estatais.

Page 6: trabalho Raphael

Logo, o bem estar social consiste na vigência dos contratos equilibrados, no dever de solidariedade e cooperação das partes.

É o momento das cláusulas garantidoras do equilíbrio contratual, como a teoria da imprevisão, rebus sic standibus, boa-fé, abuso de direito, justiça contratual e função social.

São editadas as leis antitrustes, a boa-fé se torna a exigência e ganha força a defesa da concorrência e economia, a justiça contratual deixa o campo de vínculo da autonomia da vontade como plena, mas na manutenção dos níveis mínimos de equilíbrio, colaboração e cooperação.

Note-se que nosso CC se baseou no código civil italiano de 1942, o chamado código de Mussolini, onde há plena idéia do Estado como garantidor do bem estar social.

Nessa nova interpretação, há o modelo solidarista do contrato, com a crista da boa-fé objetiva, como arquétipo de conduta social, estabelecido pelo BGB, base de nosso CC.

É interessante que nessa interpretação dos contratos, também constituição a destina para a propriedade, com a chamada função social desta.

Leon Duguit, traduzido por Luciano Benetti Timm em o novo direito contratual brasileiro, assim ensina:

A propriedade deixou de ser direito subjetivo do indivíduo e tende a se tornar a função social do detentor da riqueza mobiliária e imobiliária; a propriedade implica para o detentor de uma riqueza a obrigação de empregá-la para o crescimento da riqueza social(...)a propriedade não é, de modo algum, um direito inatingível e sagrado, mas um direito em contínua mudança que deve se modelar sobre as necessidades sociais às quais se deve responder(...)

Ronaldo Porto Macedo defende, em sua obra Carl Schmitt e a fundamentação do direito, defende (..) nesse sentido, a sociedade é a fonte primária do contrato, aspectos que desde há muito é reconhecido e estudado pelos clássicos do pensamento social como Marx, Durkheim e Weber.

Note-se, que há vários artigos que tratam as salvaguardas Estatais de intervenção nos contratos, instituídas pelo novo CC, com base no código de Mussolini 113, 421, 422 e 596, 701, 721, 724 e ainda o equilíbrio financeiro do contrato nos artigos 423 e 424.

Há ainda o interesse na preservação da ordem pública e interesses coletivos, concorrência, meio ambiente, etc.

Note-se que o estado volta a gerir o ramo privado dos contratos, fato que, por óbvio, começa a desaguar em insatisfações, posto que apesar da autonomia da vontade, há uma crescente relativização do direito obrigacional, fato que torna o comércio inseguro e atenta contra um bem estar maior.

Page 7: trabalho Raphael

Capítulo IIIA interpretação complexa dos contratos;

Mais uma vez o direito empresarial mostra seu dinamismo e vínculo embrionário com a economia, a falência do Walfare State é uma prova disto.

Com este excesso de regulamentações e proteções, o Estado do Bem Estar social fali, literalmente, posto que a máquina pública não agüenta a saturação das garantias, se torna economicamente inviável este modelo.

As relações sociais tornam-se cada vez mais complexas e um apanhado geral de regras e salvaguardas não satisfazem a todos os contratos de um forma ótima, eficiente.

Infelizmente, a maioria dos julgadores ou não tem uma segunda formação ou não se preocupam com isso, fato que fazem julgar o caso isoladamente e não observar o contexto social.

Ora é concedida uma resilição, ora não, ora a cobrança de uma multa, ora não, há uma insegurança gritante.

Logo, diante da inexatidão de um mecanismo de seleção eficiente das contingências políticas e sociais, as decisões judiciais passam a ficar aleatórias, deixando de fornecer um guia de comportamento para as situações semelhantes futuras.

Alinhado este fato a total incapacidade ou mesmo inexistência de um recurso capaz de uniformizar a jurisprudência, se torna dramático pensarmos no generalismo das cláusulas de equilíbrio e bem estar, como o artigo 421 do CC.

O artigo 421 do CC assim determina:Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

A gravidade atinge o cume no momento em que inexiste qualquer preocupação, ou melhor, há uma renúncia à realidade econômica, essa excessiva proteção aos fracos torna os mecanismos de intervenção judicial do contrato, necessariamente políticos, fato que apenas refere uma retórica eleitoral, sendo que há interesses difusos, diferentemente do estado ótimo.

Como princípio básico da economia, não há almoço grátis, nesse sentido também nos valemos do método econômico do ótimo de paretto, no qual uma parte para ganhar implica necessariamente em perda para a outra.

Uma decisão judicial não preocupada com seu valor econômico ou mesmo suas conseqüências perante a realidade social acaba por prejudicar os demais destinatários daquela modalidade contratual, como nos planos de saúde, uma eventual procedência de certo procedimento, gera um efeito em cascata para os demais consumidores com reajustes, etc.

Portanto, concluímos que os contratos devem receber uma interpretação híbrida, em termos a natureza privada resguardada, porém, não tão pungente que lhe engesse,

Page 8: trabalho Raphael

em contrapartida as cláusulas de salva guarda devem existir a proteger um ordenamento jurídico específico, porém, não que tal fato lhe traga insegurança.

Assim, podemos ter no poder judiciário o divisor de águas dessa nova interpretação dos contratos, a qual adequará o contrato ao caso concreto e não permitirá e efeitos colaterais das decisões a terceiros a lhes favorecer ou prejudicar.

Apesar da generalidade desta norma, entendemos que na interpretação complexa dos contratos, o artigo 421 deve ser visto como base dos contratos prulilaterais, ou seja, há o interesse das partes, autonomia da vontade destas e todas as condutas do walfare state, porém, além desta bilateralidade há um lado do contrato para com a sociedade, haja vista que é interesse desta que este seja cumprimento, de forma harmônica e ótima.

Essa deve ser a interpretação correta dos contratos, sendo que os acordos são efetivados em microssistemas e as salvaguardas de um, não podem beneficiar a outros, as fontes se comunicam, há o diálogo, porém, não podem servir de base.

Logo, a interpretação complexa dos contratos consiste em interpretá-lo de acordo com o microssistema que este se reflete e dar-lhe extensão a todo, a fim de se verificar o impacto e efeitos da interpretação para todos os interessados, posto que os meios interpretativos e princípios estão em constante choque.

Cita-se AINDA:

Em segundo lugar, porque o sistema judiciário, como um todo, é incapaz de uniformizar entendimentos - com a pequena exceção das súmulas vinculantes. Essa indeterminação e absoluta discricionariedade judicial incentiva as pessoas - limitadamente racionais -- a tentar a sorte, tornando o Judiciário uma "roleta russa". (Luciano Benetti – Advogado – Valor Econômico)

BIBLIOGRAFIA

Luciano Betti Timm – o novo direito contratual brasileiro

Código Civil Comentado – Min. Cézar Pelluso

Ronaldo Porto Macedo defende, Carl Schmitt e a fundamentação do direito

Roberto Mangabeira Unger, em O direito na Sociedade Moderna

Georges Ripert, em o regime democrático e o direito civil moderno.