Transcrição penal - parte geral

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CURSO ALCANCE – TURMA REGULAR MPF 2013 Disciplina: DIREITO PENAL – PARTE GERAL Professor: GUILHERME RAPOSO AULA 1 : Teoria da Lei Penal. Conflitos de Leis Penais no Tempo. ORIENTAÇÃO DE ESTUDO - Bibliografia para a Parte Geral: (i) Luis Régis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro. (ii) Eugênio Zaffaroni. Manual de Direito Penal. Usar como segunda leitura, pois adota muitas posições minoritárias e muitas nomenclaturas peculiares. (iii) Cézar Roberto Bittencourt. Tratado de Direito Penal. - Bibliografia para a Parte Especial: (i) Luis Régis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro. Cézar Roberto deixa a desejar nessa parte. - Bibliografia para Legislação Extravagante:
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CURSO ALCANCE – TURMA REGULAR MPF 2013

Disciplina: DIREITO PENAL – PARTE GERALProfessor: GUILHERME RAPOSO

AULA 1: Teoria da Lei Penal. Conflitos de Leis Penais no Tempo.

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

- Bibliografia para a Parte Geral:

(i) Luis Régis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro.

(ii) Eugênio Zaffaroni. Manual de Direito Penal. Usar como segunda leitura, pois adota muitas posições minoritárias e muitas nomenclaturas peculiares.

(iii) Cézar Roberto Bittencourt. Tratado de Direito Penal.

- Bibliografia para a Parte Especial:

(i) Luis Régis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro. Cézar Roberto deixa a desejar nessa parte.

- Bibliografia para Legislação Extravagante:

(i) José Paulo Baltazar Júnior. Crimes Federais.

(ii) Rodolfo Tigre Maia. Lavagem de Dinheiro e Crimes contra o Sistema Financeiro.

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- No mínimo, devem ser lidas as leis a respeito dos crimes em espécie, tanto da Parte Especial, quanto da Legislação Extravagante.

- Ler alguma bibliografia sobre a Parte Geral.

- É muito comum as provas do MPF, em Direito Penal, exigirem conhecimento sobre tratados e convenções internacionais, tanto na prova objetiva, quanto na discursiva. Recomenda-se, portanto, ler os tratados que versem sobre Direito Penal.

TEORIA DA LEI PENAL

- A ordem jurídica é composta de normas jurídicas. O conceito de norma jurídica é mais amplo do que o conceito de lei penal.

- Espécies de normas jurídicas:

(i) normas proibitivas: regras de comportamento nas quais se dita um comportamento com o fim de proibi-lo;

(ii) normas mandamentais: descreve uma conduta com o fim não de proibi-la, mas sim de ordená-la. Impõe um dever;

(iii) normas premissas: não impõem nem proíbem um comportamento, mas sim permitem a sua realização. A princípio, tudo é permitido. Só não é permitido o que é proibido ou imposto. Logo, as permissões são exceções às proibições e aos mandamentos. Como regra geral, têm-se proibições e mandamentos. Exemplo: regra geral é proibido matar, mas, agindo em legítima

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defesa, a depender da situação, é permitido ceifar a vida de alguém;

- As normas proibitivas e as normas mandamentais, no Direito Penal, são veiculadas por meio de tipos penais. Logo, são analisadas no âmbito do tipo penal.

- No Direito Penal, as normas permissivas são as chamadas causas de justificação. Logo, são analisadas no âmbito da antijuridicidade.

- A norma jurídica, entendida como regra de comportamento que disciplina a vida em sociedade, pode ser veiculada de diversas formas. O costume, por exemplo, traz em si uma regra de comportamento, razão pela qual é uma fonte de norma jurídica.

- Além dos costumes, têm-se as leis em sentido amplo, tais como decretos, regulamentos, portarias, leis em sentido estrito, entre outras. Essas são formas por meio das quais as normas jurídicas se revelam.

- Para fins de Direito Penal, quando se fala em lei penal, se está fazendo referência à lei em sentido estrito, ou seja, lei ordinária.

- A lei nada mais é do que uma fonte formal da norma jurídica. É o meio formal através do qual a norma jurídica se revela.

- No âmbito do Direito Penal, as normas penais incriminadoras, ou seja, as normas proibitivas e as normas mandamentais necessariamente devem

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ser veiculadas através de lei em sentido estrito. Disso decorre a lógica do princípio da legalidade, previsto no art. 5º, XXXIX, da CF e no art. 1º do CP.

- Pelo princípio da legalidade, não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.

- Além de se exigir lei em sentido estrito para a veiculação de normas proibitivas ou mandamentais no âmbito do Direito Penal, também se exige que essa lei seja prévia.

- Tudo isso (exigência de lei em sentido estrito e prévia) se dá em razão da segurança jurídica, na medida em que, em tese, a lei penal impõe as restrições mais graves à esfera de direitos do indivíduo.

- Todavia, a ideia da legalidade não tem como fundamento apenas a segurança jurídica. Caso contrário, a previsão de crimes em medidas provisórias atenderia a legalidade, não sendo necessária a lei em sentido estrito.

- Para além da segurança jurídica, deve-se ter em mente que o homem é um ser antropologicamente livre, ou seja, é da essência do ser humano a liberdade, não podendo o Estado, em princípio e como regra geral, intervir nessa liberdade. O que confere legitimidade para que o Estado, excepcionalmente, imponha uma sanção penal, intervindo na liberdade individual, é a garantia de participação da sociedade nesse processo decisório. É dizer, para que o Estado tenha

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legitimidade a fim de impor uma sanção penal, é preciso que, necessariamente, aquele destinatário da sanção penal tenha a possibilidade de participar desse processo decisório.

- E esse processo decisório é justamente o processo legislativo. O processo legislativo é o ambiente, em tese, mais democrático no qual essa discussão pode ser travada. Em uma medida provisória, por exemplo, o espaço de discussão é muito restrito e pouco democrático.

- Logo, a exigência de lei em sentido estrito para a previsão de crime, além da segurança jurídica, também se fundamenta no fato de ser o processo de elaboração da lei em sentido estrito o locus onde há maior possibilidade de participação da sociedade na formação da decisão estatal a respeito da criminalização de determinada conduta.

- Assim, para que a imposição de uma pena seja legítima, devem ser observadas duas etapas. Primeiramente, há uma etapa prévia, que é a da edição da lei, onde há ampla possibilidade de participação democrática da sociedade na discussão da lei. Posteriormente, para que a previsão genérica da lei seja concretizada, exige-se um processo penal, que também é um espaço democrático no qual se garante ao indivíduo a participação no processo decisório, nesse caso do juiz.

- Somente após essa discussão democrática no âmbito do processo legislativo e no âmbito do processo judicial é que o Estado pode restringir a liberdade do indivíduo.

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- Principais desdobramentos da legalidade:

(i) exigência de lei prévia: segurança jurídica. A lei não poderá retroagir para atingir fatos passados, salvo para beneficiar o réu;

(ii) exigência de lei em sentido estrito: segurança jurídica e participação popular em processo legislativo.

(iii) princípio da taxatividade ou determinação: segurança jurídica. Objetividade e clareza na descrição típica.

Princípio da taxatividade ou determinação

- Para garantir a segurança jurídica, o comportamento punível deve ser descrito da forma mais clara e objetiva possível. Não pode existir um tipo penal que criminalize, de forma genérica, “qualquer atentado à ordem jurídica”, por exemplo.

- Esse princípio tem sido mal interpretado por alguns autores, pois a exigência do máximo de objetividade e clareza na criminalização de um comportamento não faz com que determinados tipos abertos sejam inconstitucionais, como ocorre com os tipos culposos, onde não há definição de todas as hipóteses de violação ao dever de cuidado. A construção dos requisitos dos crimes culposos é cunhada pela doutrina. O mesmo ocorre com o crime de lavagem de dinheiro, no qual não há prévia definição sobre quais atos de ocultação ou de dissimulação de caracterizarão o delito. No caso da

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lavagem, é impossível descrever de forma detalhada todas as condutas que podem caracterizar esse delito, dada a diversidade de situações que podem ocorrer na prática.

- Logo, em determinadas situações, como ocorre no caso da lavagem de dinheiro, para conferir maior proteção ao bem jurídico tutelado pelo delito, o legislador necessita se valer de cláusulas abertas.

- Todavia, se, por um lado, a taxatividade não impede a utilização de cláusulas abertas na definição de crimes, por outro lado, a possibilidade de utilização de cláusulas abertas no tipo penal não é irrestrita e ilimitada.

- Para Zaffaroni, o legislador, ao descrever o tipo, deve buscar o máximo de concretude, objetividade e clareza possível.

- Na lavagem de dinheiro, por exemplo, o que se busca é impedir a utilização de subterfúgios para escamotear a origem ilícita de recursos financeiros. Nessa linha, ao disciplinar como crime o ato de dissimulação e ocultação, o legislador está concretizando o comportamento que almeja punir, vale dizer, qualquer ato de dissimulação de ocultação. Se ele especificar de forma taxativa os atos de dissimulação e ocultação, não conseguirá abarcar todos os atos que se enquadrem nessa categoria, deixando, portanto, desprotegido o bem tutelado pelo crime de lavagem de dinheiro. Dessa forma, o legislador deve se valer do conceito mais fechado possível, para fins de proteger o bem

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jurídico. E é isso o que ocorre na lavagem de dinheiro e no crime culposo.

Norma penal em branco

- Técnica legislativa mediante a qual o legislador, ao invés de descrever em um único ato todo o comportamento que almeja punir, opta por fazer em partes essa descrição típica. Descreve inicialmente uma parte do comportamento, sendo feita de forma separada a descrição da outra. Enfim, o comportamento punível é descrito de forma lacunosa, cabendo a outra norma trazer o complemento necessário à completude da figura típica.

- A lógica desse fracionamento é o fato de existir determinadas matérias constantemente sujeitas a modificação. É o caso das drogas, na medida em que constantemente surgem novas substâncias passíveis de serem classificadas como drogas, sendo certo que a dinâmica legislativa não conseguiria fazer frente a essa constante necessidade de atualização. Por isso, defere-se à outra fonte formal, mais ágil, a tarefa de elaborar o catálogo de substâncias classificadas como drogas.

- Normalmente, na norma penal em branco, o dispositivo complementar advém de uma fonte formal diversa daquela que veicula o tipo penal, ou seja, advém de uma fonte infra-legal. Por isso é que essa espécie de norma penal em branco, dita heterogênea, também é denominada de norma penal em branco própria.

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- Todavia, também é possível que o dispositivo complementar da norma penal em branco advenha de fonte formal da mesma estatura daquela que veicula o tipo penal. É a norma penal em branco imprópria ou homogênea. Nesse caso, perde-se a vantagem da celeridade na alteração do dispositivo complementar.

- A exigência de lei em sentido estrito é compatível com a norma penal em branco? Faz-se essa indagação, porque, na norma penal em branco própria, parte do comportamento punível é descrito por um ato infra-legal. A questão não se resolve em termos absolutos. Não se pode afirmar genericamente que a norma penal em branco será sempre constitucional ou sempre inconstitucional. Tudo dependerá da forma como foi disciplinado, na lei em sentido estrito, o comportamento principal. Exemplo: o tipo “é crime atentar contra a ordem pública, conforme definido em regulamento” é inconstitucional, pois, ao descrever a conduta principal, o legislador ordinário não teve nenhuma preocupação em manietar o legislador regulamentar, de modo que, em última instância, é este último quem descreverá o crime. Por outro lado, não é inconstitucional o tipo que considera crime o ato de, dentre outras condutas, adquirir, transportar, ministrar, ter em depósito drogas, deixando para a esfera infra-legal a descrição do catálogo de drogas. Isso porque, nessa segunda situação, o legislador definiu de forma concreta e precisa o conteúdo do comportamento punível (importar, vender, adquirir, entre outras condutas, drogas). Pela própria descrição do tipo, a

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atividade do complementador infra-legal ficará manietada, de modo que ele somente poderá classificar como droga aquelas substâncias que causem dependência e ofereçam algum risco acentuado à saúde do seu usuário.

- Logo, a norma penal em branco estará em consonância com o princípio da legalidade sempre que, no tipo penal, na norma principal, for definido o núcleo central da conduta punível e estabelecido os limites da sua integração. Caso não observe esses parâmetros, o legislador ordinário estará transferindo para o responsável pela edição do ato infra-legal a definição do comportamento punível, incorrendo, portanto, em inconstitucionalidade.

- Zaffaroni acrescenta mais um elemento para a constitucionalidade da norma penal em branco. No seu entender, além da necessidade de constar na norma principal a definição do núcleo central da conduta punível e o estabelecimento dos limites da sua integração, para a constitucionalidade da norma penal em branco também é necessário que o responsável pela edição do complemento tenha atribuição para regulamentar aquela matéria.

- Já foi indagado em prova do TRF-2 se lei estadual poderia complementar norma penal ambiental em branco. Isso é possível desde a complementação envolva matéria de competência do Estado, de modo que, considerando o caráter concorrente da competência legislativa em matéria ambiental, o complemento somente poderá ser

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veiculado por lei estadual caso a matéria seja de interesse regional.

Conflito de leis penais no tempo

- Regra geral: por imperativos de segurança jurídica, a lei incriminadora, em princípio, não pode retroagir para alcançar atos anteriores, salvo se a norma for mais benéfica, ou seja, salvo se for beneficiar o réu.

- Para definir qual lei será aplicável em vista da sucessão de leis penais no tempo, deve-se saber, em primeiro lugar, qual critério será utilizado para determinar o momento da prática do crime.

- Em segundo lugar, deve-se saber quando se considera que uma lei está em vigência.

- Logo, para definir qual lei aplicável a determinado fato, deve-se responder a duas questões:

(i) quando se considera o fato praticado?

(ii) qual a lei em vigor no momento em que o fato foi praticado?

- TEMPO DO CRIME: na forma do art. 4º do CP, “considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado”. Logo, a regra geral para a definição do momento da ocorrência do crime é a que o crime tem-se por praticado no momento da ação ou da omissão. Essa regra comporta algumas peculiaridades. Não são propriamente exceções.

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(i) concurso de agentes: caso as condutas tenham se desenvolvido em momentos distintos, deve-se levar em consideração, para efeito de aplicação da lei penal, o momento da ação de cada um dos agentes. Logo, se houver diversos comportamentos em momentos diversos e, durante esses comportamentos, houver alteração legislativa, cada conduta deve ser considerada individualmente, de modo que a referida alteração legislativa pode ensejar um tratamento diferenciado entre os agentes que concorreram para o delito. Exemplo: X pratica um fato que, até aquele momento, é atípico. Posteriormente, Y concorre para esse mesmo fato, que continua atípico. Sobrevém lei tornando crime esse fato e, em seguida, Z concorre para o fato anteriormente praticado por X e Y. Nesse caso, apenas Z poderá ser punido. X e Y, embora tenham concorrido para o crime praticado por Z, não poderão ser punidos, pois, no momento da conduta deles o fato era atípico;

(ii) crimes omissivos: existem crimes omissivos próprios e crimes omissivos impróprios (ou comissivos por omissão). Nos crimes omissivos próprios há a criminalização tão somente de uma inatividade, ou seja, para a configuração no crime, basta a não ação, não sendo necessária a ocorrência de nenhum resultado específico. Já nos crimes omissivos impróprios exige-se a ocorrência de um resultado. É dizer, tem-se a figura do garantidor, que é o garantidor da não ocorrência de um

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resultado específico, de modo que o crime somente se consuma quando da ocorrência desse resultado específico. Nos crimes omissivos próprios, mesmo não se exigindo um resultado específico, a consumação do delito ocorre somente quando houver lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado pelo tipo. Exemplo: na omissão de socorro (art. 135 do CP), o momento da omissão para a caracterização do delito é o último instante em que o indivíduo poderia agir para evitar o aumento do perigo de lesão ou a própria lesão ao bem jurídico. Deve-se investigar, no caso concreto, até que momento o indivíduo poderia agir para deixar menos exposto o objeto material do crime. Da mesma forma ocorre nos crimes omissivos impróprios, nos quais o momento da omissão é aquele último instante em que o não agir dá ensejo ao desdobramento causal que culminará no resultado. Assim, nos crimes omissivos, de uma forma geral, pode-se dizer que o momento do crime é aquele último instante em que o indivíduo poderia agir para evitar a lesão, o risco de lesão ao bem jurídico ou o resultado concreto que o legislador queria evitar;

(iii) crimes continuados e permanentes: segundo a súmula 711 do STF, “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”. Assim, se sobrevier lei mais gravosa no curso da continuidade ou da permanência, essa lei será

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aplicável a todo o crime continuado ou permanente, pois, a despeito do surgimento da lei mais grave, o agente persistiu no seu desejo criminoso, sem cessar a prática de atos executórios. Logo, nos delitos permanentes e continuados o momento do crime é constante, ou seja, perdura enquanto estiver ocorrendo a permanência ou a continuidade delitiva.

- INÍCIO E TÉRMINO DA VIGÊNCIA DA LEI: regra geral, consoante estabelece a LINDB, a lei entra em vigência, salvo disposição expressa em outro sentido, 45 dias após a sua publicação. Excepcionando essa regra, dispõe o art. 1º, § 1º da LINDB que “nos Estados, estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia três meses depois de oficialmente publicada”. Se o legislador tencionar estabelecer prazo diverso (vigência imediata ou início da vigência em outro prazo), deve dispor expressamente nesse sentido. Dispõe o art. 8º da LC 95/98 que “a vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula ‘entra em vigor na data de sua publicação’ para as leis de pequena repercussão”.

- Uma vez em vigência, assim permanecerá até que outra a modifique ou a revogue, total ou parcialmente. Exceções, nas quais não há revogação por outra lei, mas sim uma espécie de auto-revogação:

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(i) leis excepcionais: editadas para regular comportamentos sob uma circunstância excepcional. Não traz definição expressa sobre seu período de vigência. Faz isso de forma implícita, pois, cessadas as circunstância excepcionais nela previstas, cessa também a sua vigência;

(ii) leis temporárias: traz expressamente seu período de vigência.

- A regra geral no conflito de leis no tempo é a da irretroatividade da lei penal mais gravosa e retroatividade da lei penal mais benéfica.

- Exemplo: para determinado crime, a Lei “A” prevê pena de 4 a 10 anos. Posteriormente, é editada a Lei “B”, prevendo, para o mesmo crime, pena de 1 a 4 anos. Por último, ainda para o mesmo crime, a Lei “C” prevê pena de 2 a 6 anos.

- Para fato praticado na vigência da Lei “A”, pode ser aplicada a Lei “B”, por ser mais benéfica, na medida em que prevê pena menor (retroatividade). A partir da edição da Lei “B”, mais benéfica, a Lei “A” é revogada e deixa de disciplinar inclusive os fatos ocorridos durante a sua vigência, ou seja, não terá a chamada ultratividade.

- Todavia, o fato praticado durante a vigência da Lei “B”, se for praticado após a entrada em vigência da Lei “C”, mais grave, permanecerá regido pela Lei “B”. Por ser mais gravosa, a Lei “C” não retroage. Por ser mais benéfica, a Lei “B” terá ultratividade.

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- Regra geral: a lei mais grave não goza de ultratividade, tampouco de retroatividade. A lei mais benéfica goza de retroatividade e também de ultratividade.

- Essa regra tem como exceções as leis excepcionais e as leis temporárias. Na forma do art. 3º do CP, “a lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência”. É dizer, independentemente de ser mais grave ou mais benéfica em relação a outras leis, a lei excepcional ou temporária sempre irá reger os fatos cometidos durante a sua vigência.

- Isso ocorre porque não há propriamente conflito entre a lei temporária ou excepcional e a lei posterior. Cuida-se, em verdade, de uma hipótese de auto-revogação da lei.

- Há quem sustente a inconstitucionalidade do art. 3º do CP, pois ele, supostamente, violara o dispositivo constitucional que determina a retroação da lei penal mais benéfica. Todavia, o fato de que tratam as referidas leis é apenas aparentemente o mesmo. A rigor, a regulação não é idêntica. Na regulação excepcional ou temporária, o fato disciplinado pela norma é ligeiramente diverso daquele de que trata a normativa geral. Cuida-se de uma hipótese de especialidade. A excepcionalidade, a peculiaridade da situação que anima a edição da lei temporária ou

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excepcional é trazida para o bojo da norma, o que faz dela uma tipificação especial. Logo, não há inconstitucionalidade porque a lei posterior não trata exatamente do mesmo fato retratado na lei excepcional ou temporária.

- Há também outra questão de ordem lógica. É já se sabe de antemão que a lei excepcional ou temporária irá, em determinado momento, cessar a sua vigência. Logo, se fosse possível a retroação da lei penal mais benéfica para alcançar os fatos ocorridos durante a vigência da lei temporária ou excepcional, isso poderia ter o efeito de nulificar, ou quando menos reduzir drasticamente, a eficácia da lei temporária ou excepcional.

- Logo, tem-se aqui uma hipótese excepcional de ultratividade de lei mais gravosa.

- Em geral, a doutrina trabalha com as leis excepcionais ou temporárias nas situações em que elas são mais graves.

- Todavia, pode haver situações em que a lei excepcional ou temporária seja mais benéfica. Isso ocorreu com a atipicidade temporária do delito de posse de arma de fogo, prevista no Estatuto do Desarmamento. Entendeu o STF que essa abolitio criminis temporária não poderia retroagir. Entendeu-se que “o prazo estabelecido nos mencionados dispositivos expressaria o caráter transitório da atipicidade por ele indiretamente criada. No ponto, enfatizou-se que se trataria de

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norma temporária que não teria força retroativa, não podendo configurar, pois, abolitio criminis em relação aos ilícitos cometidos em data anterior” (HC 90995, informativo 494). Logo, a lei excepcional ou temporária, embora tenha ultratividade quando for mais grave, não terá retroatividade caso seja mais benéfica. Enfim, a lei temporária somente se aplicará aos fatos ocorridos durante a sua vigência.

- Exceção à regra geral: as leis excepcionais não retroagem, ainda que sejam mais benéficas, e gozam de ultratividade, ainda que sejam mais gravosas.

- Questão de concurso:

“(19º-91) NA HIPÓTESE DE NORMA PENAL EMBRANCO, REVOGADA OU ALTERADA A NORMA COMPLEMENTAR:(a) haverá retroatividade da norma mais benigna;(b) haverá a ultratividade da norma revogada;(c) as decisões transitadas em julgado não seriam afetadas;(d) apenas os processos em curso seriam afetados”.

- Conflitos de leis penais no tempo envolvendo norma penal em branco: esses conflitos seguem exatamente a regra geral, não possuindo nenhuma especificidade, ou seja, retroatividade e ultratividade da lei penal mais benéfica e

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ausência de retroatividade e de ultratividade da lei penal mais gravosa. Por isso a resposta da questão acima é a letra “a”.

- Caso concreto: entre 7/12/00 e 15/12/00, por um lapso, a resolução da Anvisa que descreve as substâncias classificadas como droga deixou de arrolar o cloreto de etila (“lança-perfume”). Logo, houve uma abolitio criminis nesse período que alcançou todos os condenados anteriormente.

“A Turma deferiu habeas corpus para declarar extinta a punibilidade de denunciado pela suposta prática do delito de tráfico ilícito de substância entorpecente (Lei 6.368/76, art. 12) em razão de ter sido flagrado, em 18.2.98, comercializando frascos de cloreto de etila (lança-perfume). Tratava-se de writ em que se discutia a ocorrência, ou não, de abolitio criminis quanto ao cloreto de etila ante a edição de resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA que, 8 dias após o haver excluído da lista de substâncias entorpecentes, novamente o incluíra em tal listagem. (...) Em suma, assentou-se que, a partir de 7.12.2000 até 15.12.2000, o consumo, o porte ou o tráfico da aludida substância já não seriam alcançados pela Lei de Drogas e, tendo em conta a disposição da lei constitucional mais benéfica, que se deveria julgar extinta a punibilidade dos agentes que praticaram quaisquer daquelas condutas antes de 7.12.2000. HC 94397/BA, rel. Min. Cezar Peluso, 9.3.2010”. (INFO 578)

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- Questão de concurso:

“(22º-100) CONFORME O PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM, A LEI PENAL APLICA-SE ÀS CONDUTAS OCORRIDAS DURANTE SUA VIGÊNCIA. TODAVIA, PARA SOLUCIONAR AS QUESTÕES ADVINDAS DA SUCESSÃO DE LEIS PENAIS, HÁ PRINCÍPIOS DE DIREITO INTERTEMPORAL. ASSIM,I. a regra da irretroatividade vale apenas em relação à nova lei mais gravosa;II. para aplicar a lei mais favorável ao réu definitivamente condenado, deve-se esperar o término do respectivo período de vacatio legis;III. por serem dotadas de ultra-atividade, as leis excepcionais e temporárias aplicam-se a quaisquer delitos, desde que seus resultados tenham ocorrido durante sua vigência; IV. a abolitio criminis alcança até os fatos definitivamente julgados.

ANALISANDO AS ASSERTIVAS ACIMA, PODE-SE AFIRMAR QUE:

(a) todas estão corretas;(b) estão erradas as de números I e II;(c) estão erradas as de números II e III;(d) estão erradas as de números I e IV”.

- A afirmativa III está errada porque as leis excepcionais e temporárias são dotadas de ultratividade desde que a ação ou omissão tenha sido praticada durante a sua vigência, pois tempo

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do crime é não é momento do resultado, mas sim o da ação ou omissão.

- A afirmativa II envolve um tema controvertido. Todavia, prevalece que, para aplicar a lei mais favorável ao réu definitivamente condenado, não é necessário esperar o término do respectivo período de vacatio legis.

- É um tema controvertido, pois, se por um lado não seria razoável exigir o término do período da vacatio quando já se sabe de antemão que a pena será extinta ao fim desse lapso, por outro lado a experiência revela casos em que leis foram revogadas durante o período da vacatio.

- Todavia, o professor admite, excepcionalmente, a aplicação da lei antes do término do período de vacatio quando se trata de lei penal mais benéfica para o imputado. Isso porque é muito difícil que uma lei já promulgada venha a ser revogada antes de entrar em vigência.

- Questão de concurso:

“(24º-91) NO TEMA DE APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO TEMPO:(a) havendo sucessão das leis penais no tempo é aplicável a lei intermediária se ela for a mais favorável;(b) o Código Penal prevê a combinação de leis sucessivas sempre que a fusão possa beneficiar o réu;

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(c) o Código Penal veda a lex tertia ;(d) verifica-se a maior favorabilidade da lei, no exame da norma em abstrato”.

- A letra “d” está errada porque gravidade ou benignidade da lei penal deve ser apreciada em cada caso concreto, pois a lei pode ser benéfica em algumas situações e maléfica em outras. Exemplo: entre uma lei penal que estabeleça pena de 1 a 5 anos e um rigor maior na execução e outra que estabeleça pena de 1 a 10 anos e um rigor menor na execução, a primeira, em tese, será mais benéfica. Todavia, para o condenado à reprimenda mínima de um ano na vigência da lei antiga, estando ele na fase de execução da pena, a segunda lei irá retroagir em razão de, nessa situação concreta, ser mais benéfica. Entretanto, invertendo a situação, se a lei prevendo pena de 1 a 5 anos fosse posterior à outra, iria haver retroação para beneficiar condenado à pena máxima (10 anos) pela sistemática pretérita.

- As letras “b” e “c” tratam do tema da combinação de leis. Lex tertia significa combinação de leis. O CP não veda expressamente a combinação de leis. Não há qualquer dispositivo que trate especificamente da possibilidade ou impossibilidade de combinação de leis. É dizer, o CP nem proíbe, nem admite a combinação de leis. Por isso que as referidas alternativas estão incorretas.

- A jurisprudência majoritária entende pela impossibilidade de combinação de leis. Todavia,

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essa impossibilidade não decorre de vedação expressa constante do CP, mas sim do princípio da separação de poderes, pois, ao combinar leis, o magistrado estaria criando uma terceira lei (lex tertia), ou seja, uma lei nova.

AULA 2: Conflito de Leis Penais no Espaço. Imunidades.

CONFLITOS DE LEIS PENAIS NO ESPAÇO

- Objetiva-se nesse estudo definir qual a lei aplicável tendo em vista o local do crime.

- Regra geral: art. 5º do CP, segundo o qual “aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional”.

Território nacional

- Território efetivo ou território real: abrange os seguintes aspectos:

(i) o solo e subsolo: dentro dos limites das fronteiras do país;

(ii) aguas interiores: todas as águas interiores (rios, lagos, lagoas, enseadas) também são consideradas território nacional;

(iii) mar territorial e zona econômica exclusiva: além das águas interiores, o mar territorial e a zona econômica exclusiva,

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definidos na Convenção da ONU sobre Direito do Mar de 1982, são também território nacional. Essa convenção foi internalizada pela Lei 8.617/93, que, no seu art. 1º, prevê que “o mar territorial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítima de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no Brasil”. No art. 6º dispõe que “a zona econômica exclusiva brasileira compreende uma faixa que se estende das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial”;

(iv) espaço aéreo: o espaço aéreo correspondente à fronteira terrestre e à fronteira marítima também é considerado território nacional. Esse espaço aéreo está definido na Convenção Varsóvia de 1929 e na Convenção de Chicago de 1944.

- Território por extensão ou território flutuante: previsto no art. 5º, § 1º, da CF, segundo o qual “para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar”.

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Critério a ser utilizado para a definição do local da prática do delito

- Esse critério é definido pelo art. 6º do CP, segundo o qual “considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”.

- Verifica que o CP adotou a teoria da ubiquidade pura ou mista, pois considera como local do crime não somente onde se deu a ação ou omissão, mas também onde ocorreu ou deveria ter ocorrido o resultado. Logo, diferentemente do tempo no crime (teoria da ação), em relação ao local do crime o legislador levou em consideração múltiplos aspectos.

- O objetivo da adoção desses múltiplos critérios é evitar conflitos negativos de jurisdição no que concerne à aplicação da lei penal. Exemplo: determinado crime é praticado no Brasil, mas seu resultado se produz na Argentina. Nesse caso, se o Brasil adotasse a teoria do resultado e a Argentina a teoria da ação, o delito ficaria impune. Justamente para coibir esse vácuo na aplicação da lei penal é que há uma tendência dos países em adotar um critério mais elástico em relação à definição do local do crime.

- As considerações tecidas a respeito do momento da omissão e do tempo do crime no caso de delitos permanentes também são válidas para determinar o local do crime.

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Exceções

- Estão disciplinadas no art. 7º do CP, que traz quatro hipóteses de extraterritorialidade da lei penal.

- A lei penal é uma expressão da soberania estatal. Logo, os casos de extraterritorialidade envolvem situações em que, de alguma forma, afetam a soberania nacional.

- Princípio da defesa, real ou da proteção real: aplicação da lei penal brasileira ao crime cometido fora do território nacional quando o bem jurídico atingido for de relevância fundamental para o Estado brasileiro. Nessa linha, prevê o art. 7º, I, do CP que ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:

“I - os crimes:

a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;

b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;

c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço”.

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- Princípio da nacionalidade ou da personalidade: é subdividido pela doutrina em dois aspectos, vale dizer, princípio da nacionalidade ativa (quando o autor do crime for brasileiro) e princípio da nacionalidade passiva (quando a vítima do crime for brasileira). Nessas duas hipóteses, o que se leva em consideração é a nacionalidade, do agente ou da vítima. Logo, o ponto central aqui não é o bem jurídico afetado, mas sim o seu titular, no caso da nacionalidade passiva, e a nacionalidade do agente, no caso da nacionalidade ativa. A hipótese da nacionalidade ativa está prevista no art. 7º, II, b, do CP, segundo o qual ficam submetidos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro, os crimes praticados por brasileiro. Além disso, há discussão doutrinária sobre se a hipótese do art. 7º, § 3º, do CP revela caso de nacionalidade passiva ou de aplicação do princípio da proteção real.

- Princípio da justiça universal: há crimes cuja relevância é tamanha, atentando de tal forma contra bens jurídicos de elevado valor humanitário (ex.: genocídio), que os países se obrigam mutuamente a reprimir esses delitos, aplicando a sua lei penal e punindo os autores das infrações independentemente do local da prática do crime. É o caso do art. 7º, II, a, do CP, segundo o qual ficam submetidos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro, os crimes que por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir.- Princípio da representação: contemplado no art. 7º, II, c, do CP, segundo o qual ficam submetidos à

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lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro, os crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. É comum que crimes cometidos no interior de embarcações e aeronaves que permanecem por pouco tempo em território estrangeiro sequer cheguem ao conhecimento das autoridades do respectivo país. Dessa forma, não fosse o princípio da representação, a punição desses crimes, na prática, demandaria o retorno da embarcação ou aeronave ao território do país no qual o delito foi praticado. E isso poderia gerar situações de impunidade.

- EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA: são as hipóteses previstas no art. 7º, I, do CP. Com efeito, prevê o art. 7º, § 1º, do CP que “nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro”.

- Para alguns, essa previsão seria inconstitucional por violar o ne bis in idem. Essa orientação não prevalece, pois o art. 8º estabelece que “a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”. Logo, não haverá bis in idem.

- A aplicação incondicionada da lei brasileira, nessa hipótese, deriva da gravidade dos crimes a que ela se refere, os quais devem, portanto, merecer

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punição severa, de modo que eventual punição branda ou absolvição no país de origem é considerada insuficiente para a repressão e prevenção dos referidos delitos.

- EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA: são as hipóteses previstas no art. 7º, I, do CP. Essas condições constam do § 2º desse mesmo art. 7º:

“a) entrar o agente no território nacional;

b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;

c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;

d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável”.

- Outra hipótese de extraterritorialidade condicionada também é prevista no § 3º do art. 7º:

“§ 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior:

a) não foi pedida ou foi negada a extradição;

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b) houve requisição do Ministro da Justiça”.

- Alguns autores, a exemplo de Bittencourt e Prado, entendem que essa hipótese de extraterritorialidade do § 3º, relativa a crimes cometidos por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, enquadra-se no princípio da proteção. Todavia, entende o professor que essa é uma clara hipótese de adoção do princípio da nacionalidade passiva, pois o que se leva em conta nessa regra é tão somente a nacionalidade do sujeito passivo do delito.

- Questão de concurso:

“(21º-98) DENTRE AS PROPOSIÇÕES ABAIXOASSINALE A CORRETA:(a) tipo penal aberto é espécie de lei penal em branco;(b) fica sujeito a lei brasileira o crime de tortura contra brasileiro, embora cometido no estrangeiro;(c) a lei penal, salvo disposição expressa em contrário, entra em vigor na data de sua publicação;(d) normas previstas em tratado não podem prevalecer sobre regras estabelecidas para extradição na Lei n. 6.815/80.”

- A questão “a” está errada porque a lei penal em branco é caracterizada pela incompletude na sua descrição. Já o tipo penal aberto é aquele no qual, ao ensejo da descrição do comportamento típico, o

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legislador se utiliza de conceitos abertos, os quais não estarão necessariamente previstos na lei penal em branco. É dizer, a lei penal em branco pode ou não conter conceitos abertos. Lado outro, lei penal normal também pode ou não conter conceitos abertos.

- A questão “b” está correta, pois, nos termo do art. 2º da Lei de Tortura (Lei 9455/97), “o disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira”. Essa é uma regra específica de extraterritorialidade incondicionada, que se afasta da regra geral do art. CP.

- A questão “c” está errada porque, ausente disposição a respeito da vigência, a lei entra em vigor 45 dias após a sua publicação, nos termos da LINDB.

- A questão “d” está errada porque, em primeiro lugar, as normas sobre extradição previstas na Lei 6.815/80 são genéricas. Dessa forma, as regras especiais previstas em tratados internacionais prevalecerão sobre o referido Diploma legal. Além disso, os tratados, quando incorporados ao ordenamento pátrio, adquirem, em regra, status de lei ordinária. Logo, podem perfeitamente revogar leis da mesma estatura infraconstitucional.

- Questão de concurso:

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“(24º-92) A POLÍCIA FEDERAL DO AMAPÁ, EM AÇÃO DESENVOLVIDA COM A MARINHA DO BRASIL E COM A MARINHA FRANCESA, APREENDEU, EM ÁGUAS INTERNACIONAIS, UMA EMBARCAÇÃO PESQUEIRA COM 800 KG DE COCAÍNA. OS TRIPULANTES, TODOS BRASILEIROS, FORAM PRESOS. CONSIDERANDO APENAS OS DADOS ENUNCIADOS, É APLICÁVEL A LEI BRASILEIRA PORQUE:(a) O crime de tráfico internacional de drogas foi praticado por brasileiros;(b) A embarcação se encontrava em alto-mar;(c) A lei francesa não é aplicável;(d) A embarcação é brasileira”.

- Alto-mar é sinônimo de águas internacionais. Se a embarcação é pesqueira, verifica-se que se trata de embarcação privada. Não consta do enunciado a nacionalidade dessa embarcação. A nacionalidade ativa é brasileira.

- O item “d” deve ser descartado, pois não consta do enunciado a nacionalidade da embarcação. Se fosse brasileira, esse seria um fundamento para a aplicação da lei brasileira.

- O item “c” está errado, pois não existe nenhuma disposição que estipule ser aplicável a lei brasileira quando a lei de outro país não o for. Além disso, não se sabe se a lei francesa é ou não aplicável.

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- O item “b” está errado, pois o fato de a embarcação se encontrar em alto-mar somente seria fundamento para a aplicação da lei brasileira se a embarcação fosse brasileira, mas no caso em questão não se sabe a nacionalidade da embarcação.

- O item “a” está correto, pois o caso comporta a aplicação do princípio da nacionalidade ativa. Essa é a única hipótese de extraterritorialidade que se adequa à previsão do enunciado.

IMUNIDADES

- Questão de concurso:

“(24º-93) BRASILEIRA, AFRODESCENDENTE, CASADA COM ESTRANGEIRO, COM QUEM TEM 4 FILHOS, DOIS NASCIDOS NO PAÍS DO MARIDO E DOIS NASCIDOS NO BRASIL, COMPARECE AO CONSULADO DO PAÍS ESTRANGEIRO PARA FAZER UM REGISTRO DE NASCIMENTO DOS FILHOS NASCIDOS NO BRASIL E OBTER O PASSAPORTE PARA ELES. A FUNCIONÁRIA DO CONSULADO NÃO ACEITA COMO SUFICIENTES O REGISTRO BRASILEIRO E FAZ COMENTÁRIOS JOCOSOS A RESPEITO DOS DIFERENTES FENÓTIPOS DAS CRIANÇAS, PONDO EM DÚVIDA A PATERNIDADE DO MARIDO. O CASAL REPRESENTA AO MINISTÉRIO PÚBLICO SOLICITANDO A PUNIÇÃO DA FUNCIONÁRIA PELA PRÁTICA DE RACISMO:

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(a) o MPF pode oferecer a denúncia tendo em vista que o crime foi cometido no território nacional;(b) o MP nada pode fazer porque o fato ocorreu no Consulado de país estrangeiro;(c) só o MPF tem atribuição para oferecer a denúncia;(d) o MP deve encaminhar os elementos de prova ao Ministério das Relações Exteriores para que este solicite ao Governo estrangeiro que proceda a apuração do fato e a persecução penal”.

- Essa funcionária, como praticou o crime no exercício das suas funções, goza de imunidade de jurisdição. Logo, não pode ela ser denunciada pelo MP brasileiro. Todavia, isso não significa que o MP nada pode fazer, uma vez que o crime pode ser julgado pela Justiça do país do referido consulado. Nessa linha, o MP deve encaminhar as peças de informação a quem tem jurisdição para o caso. Como a jurisdição, nesse caso, é de país estrangeiro, deve encaminhar as peças ao Ministério das Relações Exteriores. Em função disso, a alternativa correta é a letra “d”.

- Imunidade de jurisdição: prevê o art. 43, item 1, da Convenção de Viena sobre Relações Consulares, internalizada pelo Decreto Legislativo 61.078/67:

“1. Os funcionários consulares e os empregados consulares não estão sujeitos à Jurisdição das autoridades judiciárias e administrativas do

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Estado receptor pelos atos realizados no exercício das funções consulares”.

- Prevê o art. 31 da mesma convenção, que trata da inviolabilidade dos locais consulares:

“1. Os locais consulares serão invioláveis na medida do previsto pelo presente artigo.

2. As autoridades do Estado receptor não poderão penetrar na parte dos locais consulares que a repartição consular utilizar exclusivamente para as necessidades de seu trabalho, a não ser com o consentimento do chefe da repartição consular, da pessoa por ele designada ou do chefe da missão diplomática do Estado que envia. Todavia, o consentimento do chefe da repartição consular poderá ser presumido em caso de incêndio ou outro sinistro que exija medidas de proteção imediata”.

- Alguns realizam uma interpretação equivocada no item 2 acima, entendendo que embaixadas e consulados seriam territórios estrangeiros. Na verdade, as dependências dessas repartições são consideradas territórios do país onde elas se situam. O que há é apenas proteção contra a inviolabilidade desses locais, como forma de garantir o pleno exercício das funções consulares.