Transdiciplinaridade

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Transdisciplinaridade, Interdisciplinaridade e Multidisciplinaridade Prof. Fernando Cardona [email protected] Fevereiro 2010 Introdução O papel da escola, mais precisamente do ensino e da educação, sempre foi e sempre será questionado através dos tempos.Questionar-se-á não sobre a sua necessidade e importância na vida dos indivíduos, uma vez que estes temas já foram amplamente discutidos e esgotados por diversos grupos durante a história. Questionar-se-á sempre se esta, a escola, tem servido ao seu papel sociológico, propósito central, de "cunhar" indivíduos preparando-os para se posicionarem como seres sociais integrados e adaptados à convivência em grupo, à sociedade, agindo como participantes no desenvolvimento do todo. Ainda, não somente como membros destes grupos capazes de se interrelacionarem com seus entes, mas como membros qualitativos capazes de somar através de suas habilidades e conhecimentos. Ao pontuarmos a escola, e suas responsabilidades, como algo focado na "formatação" de indivíduos para serem inseridos em grupos sociais perceberemos, claramente, de que o desafio aqui proposto para a escola é, indubitavelmente, complexo e dinâmico. Dinâmico pelo fato de se estruturar sobre um conjunto de regras e padrões, os sociais, que se apresentam em constante mudança, reflexo do próprio processo evolutivo social de cada era na qual se viverá; Complexo pelo fato de exigir de si mesma a necessidade de capacitar o indivíduo a observar a sociedade, seus problemas, relacionamentos e saberes de uma forma dinâmica, interligada, completamente dependente de causas e efeitos nas mais diversas áreas, do saber do conhecimento ao saber do relacionamento, permitindo assim, e somente assim, que estes possam ser formados com as habilidades necessários, acima descritas, para ocuparem sua posição dentro desta sociedade. Diante do entendimento da complexidade na qual estamos inseridos percebe-se a necessidade da implantação de um raciocínio horizontalizado complementar para o estabelecimento do saber. O estudo dos problemas através de uma comunicação horizontalizada se faz necessário no intuito de maximizar o "produto social final" esperado das escolas, e mais do que isso, para a busca da democratização real do conhecimento através da libertação do pensamento, da visão e do raciocínio crítico na formação do saber individual seja ele de quem for. Currículo e as disciplinas O questionamento se inicia ao analisarmos a estrutura atual na qual estão inseridas as escolas e centros de pensamento crítico-criativo, os centros de ensino superior.Umas das primeiras barreiras encontradas para a implantação de um pensamento horizontalizado na construção do conhecimento esta na estrutura do currículo. Saviani [Saviani, 2003] é categórico quando apresenta os posicionamentos de autores como Apple e Weis sobre o currículo. Para estes o foco central na estruturação do currículo esta na concretização do monopólio social sobre a sociedade através do campo educacional. Apple prossegue afirmando que esta ferramenta será estruturada através de regras não formalizadas que constituirão o que ele mesmo denominou de "currículo oculto". Berticelli (Berticelli, 2003) e Moreira e Silva(Moreira e Silva, 1995)não destoam de Saviani ao indicar que o currículoé um local de "jogos de poder", de inclusões e exclusões, uma arena política.

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Transdiciplinaridade

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  • Transdisciplinaridade, Interdisciplinaridade e Multidisciplinaridade

    Prof. Fernando Cardona [email protected]

    Fevereiro 2010

    Introduo

    O papel da escola, mais precisamente do ensino e da educao, sempre foi e sempre ser questionado atravs dos tempos.Questionar-se- no sobre a sua necessidade e importncia na vida dos indivduos, uma vez que estes temas j foram amplamente discutidos e esgotados por diversos grupos durante a histria. Questionar-se- sempre se esta, a escola, tem servido ao seu papel sociolgico, propsito central, de "cunhar" indivduos preparando-os para se posicionarem como seres sociais integrados e adaptados convivncia em grupo, sociedade, agindo como participantes no desenvolvimento do todo. Ainda, no somente como membros destes grupos capazes de se interrelacionarem com seus entes, mas como membros qualitativos capazes de somar atravs de suas habilidades e conhecimentos.

    Ao pontuarmos a escola, e suas responsabilidades, como algo focado na "formatao" de indivduos para serem inseridos em grupos sociais perceberemos, claramente, de que o desafio aqui proposto para a escola , indubitavelmente, complexo e dinmico. Dinmico pelo fato de se estruturar sobre um conjunto de regras e padres, os sociais, que se apresentam em constante mudana, reflexo do prprio processo evolutivo social de cada era na qual se viver; Complexo pelo fato de exigir de si mesma a necessidade de capacitar o indivduo a observar a sociedade, seus problemas, relacionamentos e saberes de uma forma dinmica, interligada, completamente dependente de causas e efeitos nas mais diversas reas, do saber do conhecimento ao saber do relacionamento, permitindo assim, e somente assim, que estes possam ser formados com as habilidades necessrios, acima descritas, para ocuparem sua posio dentro desta sociedade.

    Diante do entendimento da complexidade na qual estamos inseridos percebe-se a necessidade da implantao de um raciocnio horizontalizado complementar para o estabelecimento do saber. O estudo dos problemas atravs de uma comunicao horizontalizada se faz necessrio no intuito de maximizar o "produto social final" esperado das escolas, e mais do que isso, para a busca da democratizao real do conhecimento atravs da libertao do pensamento, da viso e do raciocnio crtico na formao do saber individual seja ele de quem for.

    Currculo e as disciplinas

    O questionamento se inicia ao analisarmos a estrutura atual na qual esto inseridas as escolas e centros de pensamento crtico-criativo, os centros de ensino superior.Umas das primeiras barreiras encontradas para a implantao de um pensamento horizontalizado na construo do conhecimento esta na estrutura do currculo.

    Saviani [Saviani, 2003] categrico quando apresenta os posicionamentos de autores como Apple e Weis sobre o currculo. Para estes o foco central na estruturao do currculo esta na concretizao do monoplio social sobre a sociedade atravs do campo educacional. Apple prossegue afirmando que esta ferramenta ser estruturada atravs de regras no formalizadas que constituiro o que ele mesmo denominou de "currculo oculto".

    Berticelli (Berticelli, 2003) e Moreira e Silva(Moreira e Silva, 1995)no destoam de Saviani ao indicar que o currculo um local de "jogos de poder", de incluses e excluses, uma arena poltica.

  • Na busca da prtica da horizontalizao do pensamento e do estudo a presena do currculo como selecionador de conhecimentos pr-definidos se constitui como uma ferramenta castratria que limita o docente a mero reprodutor de conhecimento. So verdadeiros instrumentos que tolem o processo crtico-criativo necessrio ao entendimento contextualizado e multifacetado das problemticas presentes na vida real.

    A presena do currculo formal como ferramenta norteadora do processo de ensino-aprendizado institui a fragmentao do conhecimento trazendo ao discente uma viso completamente esfacelada do item analisado e desta forma impossibilitando uma compreenso maior de mundo, de sociedade e de problemtica estudada.

    Em busca de uma soluo Silva (Silva, 1999) prope o abandono do currculo padro, pr-definido utilizado atualmente, para a adoo do "currculo da sala de aula". Este, construdo no trabalho dirio do docente e do seu relacionamento com o meio na busca pela compreenso multifacetada da realidade vivenciada do aluno. Seria a instituio da relao dialgica real entre o professor e o aluno na construo do saber.

    Na construo deste currculo informal, mas real, extrado das pginas da realidade do aluno Fazenda indica a necessidade da dissoluo das barreiras entre as disciplinas buscando uma viso interdisciplinar do saber "que respeite a verdade e a relatividade de cada disciplina, tendo-se em vista um conhecer melhor" (Fazenda,1992)

    Surge ento a necessidade de reformular o modus operandiestabelecido atravs da re-anlise das atuais temticas e conseqentemente propondo uma viso horizontalizada para a analise e pesquisa dos temas apresentados no dia-a-dia do discente surgem a multidisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade.

    Multidisciplinaridade

    A multidisciplinaridade a viso menos compartilhada de todas as 3 vises. Para este, um elemento pode ser estudado por disciplinas diferentes ao mesmo tempo, contudo, no ocorrer uma sobreposio dos seus saberes no estudo do elemento analisado. Segundo Almeida Filho (Almeida Filho, 1997) a idia mais correta para esta viso seria a da justaposio das disciplinas cada uma cooperando dentro do seu saber para o estudo do elemento em questo. Nesta, cada professor cooperar com o estudo dentro da sua prpria tica; um estudo sob diversos ngulos, mas sem existir um rompimento entre as fronteiras das disciplinas.

    Como um processo inicial rumo tentativa de um pensamento horizontalizado entre as disciplinas, a multidisciplinaridade institui o inicio do fim da especializao do contedo. Para Morin (Morin, 2000) a grande dificuldade nesta linha de trabalho se encontra na difcil localizao da "via de interarticulao" entre as diferentes cincias. importante lembrar que cada uma delas possui uma linguagem prpria e conceitos particulares que precisam ser traduzidos entre as linguagens.

    Interdisciplinaridade

    A interdisciplinaridade, segundo Saviani (Saviani, 2003) indispensvel para a implantao de uma processo inteligente de construo do currculo de sala de aula informal, realstico e integrado. Atravs da interdisciplinaridade o conhecimento passa de algo setorizado para um conhecimento integrado onde as disciplinas cientficas interagem entre si.

    Bochniak (Bochniak, 1992) afirma que a interdisciplinaridade a forma correta de se superar a fragmentao do saber instituda no currculo formal. Atravs desta viso ocorrem interaes recprocas entre as disciplinas. Estas geram a troca de dados, resultados, informaes e mtodos.Esta perspectiva transcende a justaposio das disciplinas, na verdade um "processo de co-participao, reciprocidade, mutualidade, dilogo que caracterizam no somente as disciplinas, mas todos os envolvidos no processo educativo"(idem).

  • Transdisciplinaridade

    A transdisciplinaridade foi primeiramente proposta por Piaget em 1970 (PIAGET, 1970) h muitos anos, contudo, s recentemente que esta proposta tem sido analisada e pontualmente estudada para implementao como processo de ensino/aprendizado.

    Para a transdisciplinaridade as fronteiras das disciplinas so praticamente inexistentes. H uma sobreposio tal que impossvel identificar onde um comea e onde ela termina.

    "a transdisciplinaridade como uma forma de ser, saber e abordar, atravessando as fronteiras epistemolgicas de cada cincia, praticando o dilogo dos saberes sem perder de vista a diversidade e a preservao da vida no planeta, construindo um texto contextualizado e personalizado de leitura de fenminos". (Theofilo, 2000)

    A importncia deste novo mtodo de analise das problemticas sob a tica da transdisciplinaridade pode ser constatada atravs da recomendao instituda pela UNESCO em sua conferncia mundial para o ensino Superior (UNESCO, 1998).

    Nicolescu (Nicolescu, 1996) formula a frase: "A transdisciplinaridade diz respeito ao que se encontra entre as disciplinas, atravs das disciplinas e para alm de toda adisciplina". A esta ultima colocao entende-se "zona do espiritual e/ou sagrado".

    Concluso

    O indivduo do terceiro milnio esta exposto a problemas cada vez mais complexos. Estes podem estar ligados a prpria complexidade do inter-relacionamento dentro da sociedade humana ou atravs do grau de especializao atingido pelo conhecimento cientfico da humanidade.

    O fato que o ser social deste novo milnio, caracterizado pela era da informao, do avano tecnolgico diuturno, da capacidade de interconexo em rede e de outras propriedades que caracterizam os paradigmas que constituem essa nova era, precisa encontrar na escola, seu ente social para a formao, o aparato tcnico-cientfico-social capaz de o "cunhar" para a sua participao social.

    Diante de paradigmas to dispares quanto os que so vivenciados hoje pela humanidade, a necessidade de se repensar o processo de ensino-aprendizagem atual se faz necessrio. Continuar com o processo pedaggico-histrico atualmente institudo nas escolas e centros de estudo acadmico somente comparvel com a gerao de indivduos, e conseqentemente, de uma sociedade, intelectualmente analfabeta e limitada.

    Bibliografia:

    [Saviani, 2003] - Saviani, Nereide. Saber Escolar, currculo e didtica: problemas da unidade contedo/mtodo no processo pedaggico - 4 edio - Campinas, SP; Autores Associados, 2003

    [Berticelli, 2003] BERTICELLI, Ireno Antonio. Currculo: tendncias e filosofia. In: COSTA, Marisa Vorraber (Org.). O currculo nos limiares do contemporneo. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

    [Moreira e Silva, 1995] MOREIRA, Antonio Flvio, SILVA, Tomaz Tadeu Currculo, cultura e sociedade. So Paulo. Cortez, 1995. Silva, Tomaz Tadeu da. (1999). Documentos de identidade: uma introduo s teorias do currculo. Belo Horizonte: Autntica.

  • FAZENDA, I. C. A Integrao e interdisciplinaridade no ensino brasileiro: efetividade ou ideologia? So Paulo.Loyola, 1992. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessrios prtica educativa. 13. ed. So Paulo: Paz e Terra, 1996 ALMEIDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Sade Coletiva. Cincia & Sade Coletiva. II (1-2), 1997. MORIN, Edgar. A cabea bem-feita: repensar e reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand, 2000. PIAGET, J. Problemas gerais da investigao interdisciplinar e mecanismos comuns. Traduo Maria Barros. Paris: Bertrand, 1970. BOCHNIAK, Regina. Questionar o conhecimento: interdisciplinaridade na escola. So Paulo: Loyola, 1992. 147p. Theophilo, Roque. A transdisciplinaridade e a modernidade. Disponvel em: http://www.sociologia.org.br/tex/ap40.htm. Acesso em 24/02/2010. UNESCO. Dclaration mondiale sur l'enseignement suprieur pour le XXIe sicle et Cadre d'action prioritaire pour le changement et le dveloppement de l'enseignement suprieur. In: Conferncia Mundial sobre o Ensino Superior, 1998, Paris. PIRES, M.F.C. Reflexes sobre a interdisciplinaridade na perspectiva de integrao entre as disciplinas dos cursos de graduao. In: Revista do IV Circuito PROGRAD: As disciplinas de seu curso esto integradas? UNESP. So Paulo, 1996. NICOLESCU, Basarab. O manifesto da transdisciplinaridade. So Paulo: Triom, 2001. Coleo Trans. NICOLESCU, Basarab. La transdisciplinarit, manifeste, Paris: ditions du Rocher, Collection "Transdisciplinarit", 1996. Da Silva, talo Bastista. Uma pedagogia multidisciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar para o Ensino/Aprendizagem de Fsica. Disponvel em http://www.ufmg.br/congrext/Educa/Educa173.pdf. Acesso em 24/02/2010 Brito, jorge Sousa. Cultivar a atitude transdisciplinar saber pensar desta forma. Disponvel em http://www.redebrasileiradetransdisciplinaridade.net/file.php/1/Artigos_dos_membros_da_Rede/Cultivar_a_atitude_transdisciplinar_e_saber_pensar_desta_forma_-_Jorge_Souza_Britto.pdf. Acesso em 25/02/2010 Fundacin Instituto de Ciencias del Hombre. Los temas transversales del currculo. Disponvel em http://www.oposicionesprofesores.com/biblio/docueduc/LOS%20TEMAS%20TRANSVERSALES%20DEL%20CURRICULO.pdf. Acesso em 24/02/2010 Alves, Fernanda; Reinert Jos. Percepo dos coordenadores dos cursos de graduao da UFSC sobre a multidisciplinaridade dos cursos que coordenam. Disponvel em http://www.scielo.br/pdf/aval/v12n4/a07v12n4.pdf. Acesso 23/02/2010 Garrutti, rica; Santos, Simone. A interdisciplinaridade como forma de superar a fragmentao do conhecimento. Disponvel em http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/ric/article/viewFile/92/93. Acesso em 24/02/2010. Luedy, Eduardo. Batalhas culturais: educao musical, conhecimento curricular e cultura popular na perspectiva das teorias crticas em educao. Disponvel em

  • http://www.abemeducacaomusical.org.br/Masters/revista15/revista15_artigo10.pdf. Acesso 24/02/2010

    Fonte: http://www.webartigos.com/articles/34645/1/Transdisciplinaridade-Interdisciplinaridade-e-

    Multidisciplinaridade/pagina1.html#ixzz1J905i8WH