FIBROMIALGIA

JULIO TRONCOSO

e tinha medo de perguntar

Tudo que você queria saber sobre1

dorcronica.blog.br

2

dorcronica.blog.br

AgradecimentosOs meus agradecimentos à Ana Nogueira, doutora em psicobiologia, Jamir Sardá, doutor em psicologia e Jaime Olavo Marquez, doutor em neurologia, pelas suas sugestões e correções ao manuscrito.

JULIO TRONCOSO

PhD pela Cornell University. Membro da SBED – Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor, da ABCT – Association for Behavioural and Cognitive Therapies, USA e do WIP – World Institute of Pain.

3

Introdução01

O que é Fibromialgia02

Prevalência & Incidência03

Uma Doença Feminina?04

O que Fibromialgia Não É05

É Tudo Imaginação? Está Tudo na Cabeça?06

Causas e Fatores de Risco07

Índice

Pontos-chave

dorcronica.blog.br

Introdução

01

6

Os múltiplos sintomas e comorbidades associados à fibromialgia tornam difícil o diagnóstico e a fibromialgia ainda é subdiagnosticada e subtratada.1

Introdução

7

O significado prático dessa frase é o de que é possível que um indivíduo com fibromialgia procure ajuda médica e seja diagnosticado com o rótulo de fibromialgia em um momento, e o mesmo paciente, em outro momento, receba um diagnóstico pertinente a uma queixa localizada, como dor lombar crônica, cefaleia ou desordem da articulação temporomandibular, síndrome do intestino irritável e assim por diante.2

Quem afirma isso não é um paciente de fibromialgia, nem o representante de uma ONG ou uma autoridade de Governo, mas três médicos pesquisadores ligados a uma faculdade de medicina americana. Poderia ser britânica, canadense, australiana, sueca ou alemã. Afirmações – ou seriam denúncias? - como a de cima, hoje, se multiplicam pelo mundo fora. Porém, não no Brasil.

Uma das razões é simplesmente desinformação. Muito se fala sobre fibromialgia, porém pouco se sabe. E não apenas a nível de pacientes. Essa é a questão que o ebook se propõe a examinar. E por que o meu interesse?

O blog Dor Crônica3 recebe diariamente centenas de mensagens de visitantes como as duas a seguir:

C “Tenho dores inacreditáveis

em todo corpo, sinto como se todo dia alguém tivesse conseguido tocar nos meus músculos e me deixar roxa. Não durmo mais direito nem com medicação, só penso em dormir, estou tão cansada dessa dor que às vezes desisto do dia que estou vivendo é só quero passar para o próximo dia.”

L “Estou reafirmando o diagnóstico

do médico reumatologista, o qual disse que tenho Fibromialgia, apertou alguns pontos e eu simplesmente dei um grito que ecoou no consultório. Depois disso, uma exaustão tem tomado conta e tarefas simples como ler e estudar são difíceis e a vontade é ficar na cama, pois o peso na cabeça e a fraqueza é constante. Estou tomando remédios para a “depressão”, embora sempre fui de “sorriso fácil”, disposta, ágil e trabalhadora. Pode-se dizer que é tão impactante quanto um câncer, receber um diagnóstico desses.”

8

dorcronica.blog.br

A fibromialgia, enfim, deve ser provavelmente uma das doenças mais pesquisadas no mundo, sobre a qual mais se escreve e “inova” – a sua definição e conteúdo mudaram repetidamente nos 110 anos de sua existência – e, no entanto, menos se sabe.

À primeira vista

A dupla resposta acima, aventada numa publicação científica, é típica. E também dúbia. A verdade é que os números epidemiológicos sobre a fibromialgia não são confiáveis.

A prevalência de fibromialgia varia de 0,5 a 12%, dependendo da população amostrada e do método de averiguação.8 Em apenas 5 países europeus (Alemanha, Itália, Portugal, França e Espanha), por exemplo, a doença variou de 2,9 a 14% em pacientes ambulatoriais tratados em clínicas de reumatologia.9

(Num país do tamanho populacional do Brasil, a variação pode ir de 1 milhão a 30 milhões de pessoas!)

Em suma, tem havido muitos desenvolvimentos interessantes em pesquisas sobre a fisiopatologia e tratamento da fibromialgia e síndromes relacionadas. O status da fibromialgia como uma “doença real”, em vez de uma doença psicocultural, por exemplo, hoje não mais é questionado cientificamente e tem sua identidade patológica reconhecida pela Organização Mundial da Saúde.

O denominador comum dessas mensagens é o extremo desespero, mas nas entrelinhas pode-se identificar um outro: desinformação.

Escrever sobre fibromialgia, por outro lado, não é um passeio no parque. A profusão de artigos científicos baseados em evidências de todos os níveis, a cada ano, é monumental. Em 2009, para formular diretrizes de diagnóstico da fibromialgia, uma dezena de cientistas alemães teve de revisar mais de 8 mil publicações.4

Quase duas décadas depois, com objetivo semelhante, pesquisadores brasileiros revisaram 5.571 artigos.5

Na mesma época, o Index Medicus listava quase 10 mil artigos relacionados a fibromialgia.6

dorcronica.blog.br

Exemplo disso é a dificuldade para responder a indagações aparentemente simples: Qual a prevalência da fibromialgia numa população? A fibromialgia é mesmo uma “doença feminina”?

A prevalência de fibromialgia varia de 0,2 a 6,6% na população geral, sendo as mulheres mais afetadas que os homens, na proporção de 9 para 1.7

9

Quais são as consequências do anterior?

10

Apesar disso:

Falta de concensoPersistem equívocos sobre o que é fibromialgia e falta de consenso em relação ao seu diagnóstico e tratamento. Concretamente, o “gatilho” da fibromialgia continua difícil ou mesmo impossível de identificar; assim como inexiste um tratamento do tipo “padrão ouro”, capaz de insinuar boas chances de se obter alívio.

Muitas das novas informações sobre fibromialgia não atingiram todos os médicos, especialmente os clínicos no primeiro atendimento, os que têm o maior potencial para influenciar positivamente a vida de seus pacientes.

Pesquisas indicam que esses profissionais de saúde reclamam de critérios diagnósticos pouco claros e desconfiança em relação ao seu uso, treinamento insuficiente ou inabilidade no diagnóstico, e desconhecimento das opções de tratamento.

Pouca informação Desconfiança

Em geralEm geral, profissionais de saúde em todo o mundo não tem uma compreensão clara de onde a fibromialgia se situa dentro do continuum da dor em relação a outros distúrbios periféricos de dor crônica, como osteoartrite ou artrite reumatoide, e...

ou entendem universalmente como o Sistema Nervoso Central – atualmente abrigando a causa mais provável da fibromialgia – contribui para a dor.

... Não concordam

ESTADOS UNIDOS

ALASKA(U.S.)

No total, quase 2% da população americana – ou

estariam mal diagnosticadas.6

6 milhõesde pessoas

dorcronica.blog.br

01Primeiro, o

diagnóstico de fibromialgia

frequentemente falha em

fornecer um diagnóstico

clínico adequado à realidade.10

11

Quando você tem tuberculose, você tem tuberculose, independentemente de ser diagnosticado. O mesmo vale para o câncer, a artrite reumatoide, e um monte de doenças... porém não para a fibromialgia. Ninguém tem fibromialgia até ela ser diagnosticada.”11

GE Erlich

Dos 497 pacientes, 121 (24,3%) satisfizeram os critérios de fibromialgia, enquanto 104 (20,9%) receberam o diagnóstico de fibromialgia da International Classification of Diseases (ICD).

A concordância entre médicos e critérios foi de 79,2%.

0112

Na vida real, isso significa que 3 milhões de americanos não dormem direito por pensar que têm fibromialgia, e outros 3 milhões perdem o sono por sentir dor generalizada sem saber o que é.

E esses seis milhões de insones estão angustiados à toa!

Um exagero! Você deve estar pensando.

Como é que depois de 10 mil artigos em revistas científicas sobre fibromialgia e duas revisões dos critérios universais para diagnosticá-la, publicados e debatidos nos últimos 30 anos, pode-se errar tanto com algo tão sério quanto é a saúde e a qualidade de vida de tanta gente?

(Se você projetar esses dados para o mundo inteiro, a China inclusive, a conta deve ultrapassar, estou chutando, os 30, 40 milhões de pessoas.)

Pois bem, três anos depois os mesmos pesquisadores insistiram na sua tese de que os médicos diagnosticam erroneamente muitas pessoas com e sem fibromialgia, dessa vez baseados numa pesquisa de campo abrangendo 497 pacientes avaliados e diagnosticados pela equipe de reumatologia de uma universidade.

dorcronica.blog.br

Mulheres e pacientes com mais sintomas, mas com menos áreas de dor, tinham maior probabilidade de receber o diagnóstico de um clínico do que de satisfazer os critérios de fibromialgia.

ConclusãoExiste uma falta de sintonia considerável entre o diagnóstico clínico da Classificação Internacional de Doenças (CID) e o diagnóstico baseado em critérios da fibromialgia.12

Deste modo, chega-se à melancólica conclusão de que, apesar de tanta pesquisa e esforço para estabelecer critérios de diagnóstico e protocolos de tratamento eficientes para a fibromialgia, o julgamento de um médico, obtido em ambientes comunicativos reais com pacientes, parece ser o único caminho confiável para diagnósticos mais válidos.

Agregue-se a isso, também, uma atitude comunicativa e vigilante do paciente, toda vez que o que se sabe sobre fibromialgia é público e por enquanto, gostemos ou não, as chances dele ir se consultar com um profissional da saúde desinformado sobre esse tema não é pequena.

Este ebook foi originalmente previsto para atender as necessidades de informação de pacientes sem conhecimento sobre fibromialgia, ou mal informados a respeito. Com o andar da carruagem, diante de um tema tão confuso quanto

dinâmico em termos informativos, eu percebi que seria impossível excluir alguns dados de natureza clínica, acessíveis apenas à profissionais da saúde (ex.: sensibilização central) – e nem sempre a todos, porque nem todos entendem plenamente de fibromialgia.

Os textos mais “técnicos” são identificados por uma área cinza. O paciente que for leigo no assunto e não quiser se aprofundar nele basta com pular esses campos sombreados.

O meu interesse, enquanto autor do ebook, não é acadêmico, convém esclarecer. O meu único objetivo é informar. Nada há de original, ou opinativo, no texto. O seu mérito, se tiver algum, é congregar trechos extraídos de publicações médicas e/ou científicas, no intuito de traçar um panorama completo da fibromialgia no presente.

A maioria dos trechos é acompanhada pela fonte de origem. Alunos de faculdades relacionadas aos cuidados da saúde podem assim encontrar no ebook as referências necessárias para preparar bons papers sobre fibromialgia, sem ter que procurá-las em bibliotecas ou na internet.

13

ESTADOS UNIDOS

ALASKA(U.S.)

DORCRÔNICA

100 milhões de americanos

DIABETES

25,8 milhões de americanos

DOENÇACARDÍACA

CÂNCER

16,3 milhões de americanos

11,9 milhõesde americanos

FIBROMIALGIA

= 1.000.000s

Estima-se que 1/6 dos pacientes com dor crônica tenham fibromialgia, mas são estimativas pouco confiáveis.

Fonte: The American Academy of Pain Medicine