Tutela de Urgência e Tutela da Evidência - Edição 2017 · Tutela de Urgência e Tutela da...

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2017 - 11 - 15 Tutela de Urgência e Tutela da Evidência - Edição 2017PRIMEIRAS PÁGINAS

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Tutela de Urgência e Tutela da Evidência - Edição 2017SOBRE O AUTOR

LUIZ GUILHERME MARINONIProfessor Titular de Direito Processual Civil – com defesa de tese – na UFPR. Pós-

Doutorado na Universidade Estatal de Milão e na Columbia University. Tem 17 livrospublicados na América Latina e na Europa e mais de 30 livros publicados no Brasil.Diretor das Revistas Iberamerica de Derecho Procesal e de Processo Comparado – ambaspublicadas pela Ed. Revista dos Tribunais. Diretor do Instituto Iberoamericano de DerechoProcesal. Membro do Conselho da International Assotiation of Procedural Law. Recebeu oPrêmio Jabuti em 2010 e foi indicado ao mesmo prêmio em diversas outras ocasiões. Ex-Procurador da República. Ex-Presidente da OAB-Curitiba. Advogado e parecerista, comintensa atuação nos Tribunais e nas Cortes Supremas.

2017 - 11 - 15 Tutela de Urgência e Tutela da Evidência - Edição 2017PARTE I - TÉCNICA PROCESSUAL E TUTELA DOS DIREITOS

PARTE I - TÉCNICA PROCESSUAL E TUTELA DOS DIREITOS

1. Do processo neutro ao processo adequado à tutela dos direitos

A necessidade de isolamento do direito processual em face do direito material, levou adoutrina a afastar das suas preocupações a principal finalidade da jurisdição: a tutela dosdireitos.

A escola processual italiana do início do século XX teve o grande mérito de reconstruiro processo a partir de bases publicistas, mas iniciou a história que permitiu ao processo seafastar perigosamente dos seus compromissos com o direito material. A ação abstrata,preocupada – de maneira excessiva – em se despir de toda e qualquer mancha de direitomaterial, não se ligou a qualquer forma processual que pudesse indicar uma relação doprocesso com as necessidades do direito material. A escola italiana clássica não só negou àação qualquer vínculo com um procedimento que pudesse apontar para as necessidadesdo direito material, como também organizou as formas processuais que necessariamentedeveriam estar ao redor da ação a partir de critérios unicamente processuais.

Seguindo a lógica da “neutralidade” em relação ao direito material, que jácaracterizava a ação – posta no centro do sistema processual –, os processualistasimaginaram que deveriam criar um universo de sentenças igualmente abstrato. Tal lógicasupunha que a resposta jurisdicional ao direito de ação também deveria ser isenta emrelação ao plano do direito material. Por essa razão, as sentenças obviamente não foramvistas como tutela aos direitos, ou como instrumentos capazes de propiciar a tutela dosdireitos, mas apenas como provimentos de fecho do processo.

Pensou-se que o processo poderia existir sem qualquer compromisso com o direitomaterial e com a realidade social. Porém, como não é difícil constatar, houve umalamentável confusão entre autonomia científica, instrumentalidade do processo eneutralidade do processo em relação ao direito material. Se o direito processual écientificamente autônomo e o processo possui natureza instrumental, isto está muitolonge de significar que ele possa ser neutro em relação ao direito material e à realidade davida. Aliás, justamente por ser instrumento é que o processo deve estar atento àsnecessidades dos direitos.1

O mais grave é que a pretendida indiferença do processo em relação ao direitomaterial faz com que o sistema jurídico, que obviamente depende do processo para que asnormas sejam atuadas e os direitos sejam efetivados, não tenha a possibilidade de atenderàs necessidades reveladas pelo direito material. Ora, os institutos do processo dependem daestrutura não apenas das normas que instituem direitos, mas também das formas deproteção ou de tutela que o próprio direito substancial lhes confere.

No Estado constitucional, pretender que o processo seja neutro em relação ao direitomaterial é o mesmo que lhe negar qualquer valor. Isso porque ser indiferente ao que

ocorre no plano do direito material é ser incapaz de atender às necessidades de proteção oude tutela reveladas pelos novos direitos e, especialmente, pelos direitos fundamentais.

Portanto, outorgar à jurisdição o escopo de tutela dos direitos é imprescindível paradar efetividade aos direitos fundamentais, inclusive ao direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva. Como é óbvio, esta forma de conceber a função jurisdicional faz comque a ação neutra (única) perca sustentação, já que essa ação é completamente incapaz deatentar para o papel que o direito hegemônico desenvolve diante da sociedade e do Estado.

2. O escopo de tutela dos direitos

É preciso advertir que, além da tutela jurisdicional, os direitos encontram outrasformas de tutela ou proteção por parte do Estado. Lembre-se que os direitosfundamentais, quando enquadrados em uma dimensão multifuncional, exigem prestaçõesde proteção. Isso quer dizer, em poucas palavras, que os direitos fundamentais fazemsurgir ao Estado o dever de protegê-los. Ora, essa proteção ou tutela devida pelo Estadocertamente não se resume à tutela jurisdicional.

O Estado, antes de tudo, tem o dever de proteger os direitos fundamentais mediantenormas de direito. É o que ocorre, por exemplo, quando se pensa na legislação de proteçãoao meio ambiente. A norma que proíbe a construção em determinado local e a norma queproíbe o despejo de lixo tóxico em certo lugar constituem normas de proteção ou de tutelado direito fundamental ao meio ambiente sadio.

Embora o Estado tenha o dever de proteger os direitos fundamentais, o art. 5.º, XXXII,da CF não se limitou a dizer que o direito do consumidor é um direito fundamental. Eledisse que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”, deixandoexpresso que o Estado tem o dever de proteger, mediante normas, o consumidor. Trata-sede um dever de proteção ou de tutela que chamamos de dever de “tutela normativa dosdireitos”.

Porém, como a edição da norma não basta, o Estado também tem o dever de fiscalizaro seu cumprimento, impor a sua observância, remover os efeitos concretos derivados dasua inobservância, além de sancionar o particular que a descumpriu. Recorde-se dasatividades dos fiscais da saúde pública e dos direitos do consumidor e da figura do guardaflorestal. Temos, nesse caso, evidente proteção fática ou tutela administrativa.

Quando o administrador, em processo administrativo, decide que houve infração auma norma de proteção, o seu dever passa a ser – quando não lhe restar apenas o merosancionamento do particular pela conduta reprovada – o de fazer valer o desejo da norma,seja no caso de ato comissivo ou de ato omissivo. Assim, por exemplo, nas hipóteses emque o administrador determina a paralisação da construção de obra, a instalação dedeterminado equipamento antipoluente ou a retirada de remédio ou produto nocivo domercado. Nessas situações, a proteção dada pela norma é mais uma vez afirmada peloadministrador. Também não se pode negar que, mesmo quando o administrador impõemulta ao particular, ele presta tutela ou proteção ao direito fundamental.

No caso em que o legislador se omite diante do seu dever de proteção normativa, o juizdeve supri-la, admitindo a incidência direta do direito fundamental sobre o casoconflitivo.2 A questão da incidência direta do direito fundamental sobre os particulares éuma das mais tormentosas da atualidade.3 Porém, não é preciso pensar em incidênciadireta do direito fundamental sobre os particulares quando se dá ao juiz o poder de suprira omissão do dever de proteção do legislador, uma vez que, nesse caso, o direitofundamental estará incidindo sobre o sujeito privado mediante a participação da

jurisdição, e assim a sua incidência estará sendo mediatizada pelo Estado. Nessa situação,a tutela normativa estará sendo substituída pela tutela jurisdicional.

Não se quer dizer que a jurisdição, na tutela dos direitos fundamentais, apenas apareçano caso de omissão de tutela do legislador. O que realmente aqui importa é que acompreensão de tutela jurisdicional dos direitos exige esforço e concentração no plano dosignificado das normas. As normas de proteção de direitos fundamentais, como os doconsumidor e ao meio ambiente sadio, não são atributivas de direitos, mas impositivas ouproibitivas de condutas, partindo da consideração de que determinadas condutas devemser impostas ou proibidas para que os direitos fundamentais sejam tutelados. Portanto,tais normas, quando violadas, não exigem as formas de tutela que costumam ser dadas aocidadão diante do ilícito danoso. Como é evidente, a simples exposição à venda de produtonocivo à saúde não dá a consumidor algum o direito de pedir tutela jurisdicionalressarcitória. A única forma de tutela jurisdicional que se pode ter na hipótese de violaçãode norma de proteção é exatamente aquela que, de forma similar ao que acontece noplano administrativo, impõe a observância da norma ou remove os efeitos concretosderivados da sua violação. Ora, qual seria a forma de tutela jurisdicional diante daviolação de norma de proteção a direito fundamental senão aquela capaz de fazer valer opróprio desejo da norma descumprida? Nesse caso, a forma de tutela decorre da próprianatureza da norma violada. A violação exige a atuação da norma, e não um remédio capazde garantir proteção ao sujeito que sofreu dano, isto é, a tutela ressarcitória.

Isso não significa que a violação de norma de proteção não possa acabar acarretandodanos aos cidadãos ou mesmo a direitos transindividuais, como o direito ambiental. Nessecaso há duas formas de tutela ressarcitória: pelo equivalente e na forma específica.Quando não há alternativa senão a consideração do valor do dano em dinheiro ou quandoo cidadão prefere o ressarcimento em pecúnia ainda que seja possível a tutela específica,impõe-se a tutela jurisdicional ressarcitória pelo equivalente.4 No caso de direitotransindividual, sendo faticamente viável a reparação in natura, a tutela ressarcitóriadeve ser prestada na forma específica.5

Como se vê, o Estado tem o dever de tutelar ou proteger os direitos fundamentaisatravés de normas, da atividade administrativa e da jurisdição. Por isso, há tutelanormativa, tutela administrativa e tutela jurisdicional dos direitos.

A jurisdição tem o dever de proteger ou tutelar todos os direitos, sejam fundamentaisou não. Porém, dizer que a jurisdição deve atender ao direito material pode significar,simplesmente, que o processo deve acudir aos direitos atribuídos aos cidadãos pelasnormas materiais, o que não expressa algo muito relevante, a não ser um clichê que vemsendo utilizado pelos processualistas para dizer algo que é correto, porém óbvio edestituído de importância, especialmente quando se almeja uma dogmática capaz depermitir a efetiva retomada dos laços entre o processo civil e o direito material.

Esse clichê pode ser identificado no ditado de Chiovenda, hoje celebrizado peladoutrina processual, segundo o qual “o processo deve dar a quem tem um direito tudoaquilo e exatamente aquilo que tem o direito de obter”. Além de Chiovenda não terconstruído essa frase com a mesma boa vontade e intenção dos processualistas que arepetem,6ela é insuficiente para identificar uma dogmática adequada aos nossos dias.

A preocupação com a tutela dos direitos não diz respeito apenas à idoneidade doprocesso para atender aos direitos, pois é uma questão que se coloca, já em um primeiromomento, no âmbito do direito material. E, no plano do direito material, implica a adoçãode uma postura dogmática que retira o foco das normas ditas atributivas de direitos parajogar luz sobre a esfera das tutelas, local em que se encontram as formas de tutela ou de

proteção que os direitos reclamam quando são violados ou expostos a violação.7

As formas de tutela são garantidas pelo direito material, mas não equivalem aos direitosou às suas necessidades. É possível dizer, considerando-se um desenvolvimento linearlógico, que as formas de tutela estão em um local mais avançado: é preciso partir dosdireitos, passar pelas suas necessidades, para então encontrar as formas capazes deatendê-las.

Assim, por exemplo: a Constituição Federal afirma que “são invioláveis a intimidade, avida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelodano material ou moral decorrente de sua violação” (art. 5.º, X), e que “é assegurado odireito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moralou à imagem” (art. 5.º, V). Nesse caso, a Constituição garante de maneira expressa váriasformas de proteção ou de tutela aos direitos à intimidade, à vida privada, à honra e àimagem das pessoas.8

Ou seja, tais normas não se limitam a atribuir ou a proclamar direitos, mas consideramas suas necessidades e afirmam as formas imprescindíveis à sua proteção. Quando aConstituição diz que tais direitos são invioláveis, afirma que eles exigem uma forma deproteção jurisdicional capaz de impedir a sua violação. Mas, além disso, confere a taisdireitos, no caso de violação, indenização, deixando claro que eles devem ser protegidosou tutelados mediante ressarcimento nos casos de dano material e moral.

Perceba-se, porém, que a primeira parte do inciso V do art. 5.º, ao dizer que “éassegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo”, garante uma forma de proteçãoao direito que não se confunde com a inibitória ou com a ressarcitória pelo equivalente.Trata-se da tutela ressarcitória na forma específica, já que destinada a reparar o dano demodo específico, e não mediante o pagamento do equivalente em dinheiro ao seu valor.9

Como se vê, a postura dogmática preocupada com as tutelas é atenta para as formas deproteção ou de tutela dos direitos. Ela não está preocupada em saber se os cidadãos têmeste ou aquele direito, ou mesmo com a identificação de direitos difusos e coletivos. É que,na perspectiva das “formas de tutela dos direitos”, a atribuição de titularidade de umdireito fica na dependência de que lhe seja garantida a disponibilidade de uma forma detutela que seja adequada à necessidade da sua proteção. Ou melhor, o sujeito só é titularde um direito, ou de uma posição juridicamente protegida, quando esse direito dispor deuma forma de tutela adequada à necessidade de proteção que esta posição exija.10 Comoestá claro, há aí um proposital desvio de rota dirigido a permitir a diferenciação entre aatribuição – ou, como dizem alguns, a proclamação – de direitos e a existência de “posiçõesjurídicas protegidas”.

Note-se que ter direito à imagem é algo muito diferente do que ter uma forma de tutelaadequada à sua proteção, como a tutela inibitória. Ter direito ao meio ambiente sadio nãoquer dizer ter direito à tutela ressarcitória na forma específica. O direito do consumidordeve ter ao seu dispor a tutela capaz de remover os efeitos concretos derivados do ato queviolou a norma de proteção, e assim por diante.

Ademais, a questão das formas de tutela, por dizer respeito ao plano do direitomaterial, não deve se confundir com o problema de se saber se o processo civil é capaz dedar efetividade aos direitos, ou melhor, às formas de tutela prometidas pelo direitomaterial. Pergunta-se sobre as formas de tutela na esfera do direito material, portanto,antes de se analisar a efetividade do processo. Aliás, caso a questão das “formas de tutela”pudesse ser confundida com a da “efetividade do processo”, estaria negada a obviedade deque a pergunta sobre a forma de tutela é um degrau que necessariamente deve ser

ultrapassado para se chegar à problematização da efetividade do processo.

3. Técnica processual e tutela dos direitos

O processo deve se estruturar de maneira tecnicamente capaz de permitir a prestaçãodas formas de tutela prometidas pelo direito material. De modo que entre as tutelas dosdireitos e as técnicas processuais deve haver uma relação de adequação. No entanto essarelação de adequação não pergunta mais sobre as formas de tutela, mas a respeito dastécnicas processuais.

Quando se indaga sobre a efetividade do processo já se identificou a forma de tutelaprometida pelo direito material, restando verificar se as técnicas processuais são capazesde propiciar a sua efetiva prestação. Não é por outro motivo que não se pode misturartutela inibitória com sentença mandamental ou tutela ressarcitória pelo equivalente comsentença condenatória. Também por essa razão não há como deixar de constatar que atutela antecipada não é uma técnica processual, mas a antecipação da forma de tutelacapaz de atender ao direito material. Na realidade, como agora é fácil perceber, há umatécnica para a antecipação da tutela. Assim como a sentença e os meios executivos servempara viabilizar a tutela final, a decisão antecipatória e os meios executivos a elaadequados têm o objetivo de permitir a antecipação da tutela.

Ao se propor o binômio técnica processual-tutela dos direitos não se quer simplesmentereafirmar a velha história da necessidade de adequação do processo ao direito material.Deseja-se, isto sim, a partir de uma postura dogmática preocupada com as posiçõesjurídicas protegidas e com as formas de tutela necessárias para lhes dar proteção – e nãomais apenas com as normas atributivas de direitos –, chegar a uma verdadeira análisecrítica da ação e do processo, mediante a verificação da idoneidade das técnicasprocessuais para prestar as formas de tutela prometidas pelo direito material.

Deixa-se claro que o significado de “técnica”, aqui empregado, está muito longedaquele que se costuma atribuir à “técnica” despreocupada com a realidade da vida. Ao sefalar em técnica processual, não se pretende – nos termos das teorias ditas tecnicistas –elaborar um sistema imune ou neutro, como se o processo civil não fosse destinado aatender aos conflitos dos homens de carne e osso. Ao inverso, a única razão pararelacionar a técnica processual e as tutelas dos direitos é demonstrar que o processo nãopode ser pensado de forma isolada ou neutra, pois só possui sentido quando puderatender às tutelas prometidas pelo direito material, para o que é imprescindívelcompreender a técnica processual (ou o processo) a partir dos direitos fundamentais e darealidade do caso concreto. De modo que, ao contrário das doutrinas e dos sistemasdesprovidos de paixão pelo homem e pela vida, e que procuram encontrar sustentação emconceitos abstratos que tanto são melhores quanto mais “limpos e transparentes” – isto é,neutros –, a presente teoria não tem outra preocupação a não ser evidenciar a falácia dateoria processual clássica, que ignorava a própria razão de ser do processo civil.

4. A técnica da cognição e a construção de procedimentos diferenciados

A técnica da cognição permite a construção de procedimentos ajustados às reaisnecessidades de tutela.11 A cognição pode ser analisada em duas direções: no sentidohorizontal, quando a cognição pode ser plena ou parcial; e no sentido vertical, em que acognição pode ser exauriente, sumária e superficial.

4.1. A técnica da cognição parcial

O legislador, através da técnica da cognição parcial, pode desenhar procedimentosreservando determinadas exceções, que pertencem à situação litigiosa, para outrosprocedimentos; nos procedimentos de cognição parcial, o juiz fica impedido de conheceras questões reservadas, ou seja, as questões excluídas pelo legislador para dar conteúdo aoutra demanda. É o caso das ações possessórias e das ações cambiárias.12

A técnica da cognição parcial pode operar de dois modos: fixando o objeto litigioso ouestabelecendo os lindes da defesa (quando podemos lembrar a busca e apreensão doDecreto-lei 911/69).13

Tal técnica não pode ser compreendida a não ser a partir do plano do direito material;através desta perspectiva, aliás, é possível a investigação do conteúdo ideológico dosprocedimentos. Para que se possa compreender a relação entre a cognição parcial e aideologia dos procedimentos, cabe observar que o procedimento de cognição parcialprivilegia os valores certeza e celeridade, ao permitir o surgimento de uma sentença comforça de coisa julgada material em um tempo inferior àquele que seria necessário aoexame de toda a extensão da situação litigiosa,mas deixa de lado o valor “justiçamaterial”.14 O que se deve verificar, portanto, em cada hipótese específica, é a queminteressa a limitação da cognição no sentido horizontal, ou, em outros termos, a tutelajurisdicional célere e imunizada pela coisa julgada material em detrimento da cogniçãodas exceções reservadas.15

Veja-se, por exemplo, o caso da busca e apreensão do Decreto-lei 911/69. Esse Decreto-lei – que “estabelece normas de processo sobre alienação fiduciária”–, antes de sua recentealteração pela Lei 10.931/2004, afirmava que o réu, na contestação, só poderia “alegar opagamento do débito vencido ou o cumprimento das obrigações contratuais” (art. 3.º, §2.º). Essa norma, ao limitar a defesa para imprimir maior celeridade ao procedimento,outorgava um benefício ao autor proibindo o réu de discutir as cláusulas do contrato oueliminando o seu direito de convencer o juiz de que não era inadimplente. Tratava-se derestrição à defesa que não tinha qualquer justificativa, uma vez que, para conferir umajustiça mais rápida ao credor, admitia que o devedor fosse privado do seu bem sem sequerter a possibilidade de discutir as cláusulas contratuais.

Todos os parágrafos do art. 3.º, inclusive o mencionado § 2.º, foram suprimidos pela Lei10.931/2004, que acrescentou, entre outros, o seguinte parágrafo ao art. 3.º: “O devedorfiduciante apresentará resposta no prazo de 15 (quinze) dias da execução da liminar”.Esse parágrafo não faz qualquer restrição ao direito de defesa. Assim, a ilegítima restriçãoque antes era feita ao direito do devedor discutir as cláusulas contratuais não mais existe.

Não obstante, permanece a ideia conservada no caput do art. 3.º do Decreto-lei 911/69(não alterado pela Lei 10.931/2004) de que basta a comprovação da mora ou doinadimplemento do devedor para a concessão liminar da busca e apreensão. O Decreto-lei911/69, além de permanecer admitindo que a mora ou o inadimplemento são suficientespara a tomada forçada do bem do devedor, agora tem o seguinte requinte introduzido pelaLei 10.931/2004 no § 1.º do art. 3.º: “Cinco dias após executada a liminar mencionada nocaput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimôniodo credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novocertificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado,livre do ônus da propriedade fiduciária”.

Permitir, em razão de simples mora ou inadimplemento, a retirada forçada do bem dodevedor e a consolidação da propriedade e da “posse plena e exclusiva do bem nopatrimônio do credor fiduciário” é viabilizar, ainda que mediante a força estatal, umaagressão ilegítima à esfera jurídica do devedor. Isso porque o mero inadimplemento não

pode servir de justificativa para tudo isso, pois o não pagamento, como é óbvio, pode terfundamento. Aliás, a busca e apreensão liminar, mesmo que compreendida apenas comopronta retirada do bem da posse do devedor, requer, como qualquer outra tutelaantecipada, a probabilidade do direito, sob pena de se legitimar a imediata apreensão dobem e a postecipação do direito de defesa de todo e qualquer devedor que deixar deadimplir sua prestação, pouco importando a sua razão.

Alguém poderá dizer que, nesses casos, não há violação ao direito de defesa, uma vezque o réu, após a alienação ou a apreensão do bem, poderá discutir a questão que foiafastada, bastando para tanto propor ação contra o credor (no caso do leilão) ouprosseguir se defendendo (na hipótese da liminar de busca e apreensão).

Porém, nesses dois exemplos não importa saber se o réu terá a possibilidade de discutira questão suprimida ou postecipada. O que interessa perguntar é se é justificável dartempestividade à tutela (privada, no caso do Decreto-lei 70/66) do credor à custa daprotelação da defesa do devedor. Ou ainda mais especificamente: se há racionalidade emretirar o bem do devedor, dando-lhe somente após o direito de apresentar as suasalegações. Não é difícil perceber que se trata de inversão que não encontra justificativa,pois a postergação da defesa não é imprescindível para a efetividade da tutela do direito,não havendo qualquer legitimidade em subordinar o direito do devedor apresentar defesaà entrega do bem objeto do contrato.

Note-se que o estudo da legitimidade da restrição das alegações de defesa, mediante asregras instituidoras do procedimento, não se resolve à luz de uma concepção ligadaexclusivamente à possibilidade de o réu contradizer as alegações do autor, exigindo umavisualização compreensiva da racionalidade da inversão da oportunidade da alegação.

De outra parte, o Decreto-lei 3.365, de 21.6.41, afirma que a contestação só poderáversar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; e que qualquer outraquestão somente poderá ser ventilada em ação própria (art. 20). Consoante corretamentedecidiu o extinto TFR, a lei não impede “a discussão judicial em torno do fundamento dadesapropriação, no caso de eventual abuso por parte do Poder Público; também nãoimpede que qualquer alegação seja examinada pelo Poder Judiciário. Só que taisdiscussões deverão ocorrer em ação própria”.16 A restrição da cognição, nesta hipótese, sedá em atenção ao interesse público, ou seja, para propiciar a efetividade do direito dedesapropriar do Poder Público, motivo pelo qual não há como pensar em violação aodireito de defesa.

Frise-se, no entanto, que a técnica da cognição parcial permite apenas a visualização daideologia dos procedimentos; não o controle da legitimidade constitucional dosprocedimentos, tarefa que pode ser realizada por meio do controle da constitucionalidadea partir dos direitos fundamentais.

4.2. A técnica da cognição sumária

A restrição da cognição no plano vertical conduz ao chamado juízo de probabilidade ouàs decisões derivadas de uma convicção de probabilidade. É correto dizer,resumidamente, que as tutelas de cognição sumarizadas no sentido vertical objetivam: (a)assegurar a tutela jurisdicional do direito ou uma situação concreta que dela depende(tutela cautelar; art. 300 do CPC); (b) realizar, em vista de uma situação de perigo,antecipadamente um direito (tutela antecipada; art. 300 do CPC); (c) realizar, quando odireito do autor surge como evidente e a defesa é exercida de modo inconsistente,antecipadamente um direito (tutela da evidência; art. 311 do CPC); ou (d) realizar, emrazão das peculiaridades de um determinado direito e em vista da demora doprocedimento comum, antecipadamente um direito (liminares de determinados

procedimentos especiais).

A tutela de cognição exauriente garante a realização plena do princípio docontraditório, ou seja, não permite a postecipação da busca da “verdade e da certeza”. Porisso mesmo, a tutela de cognição exauriente, ao contrário da tutela sumária, écaracterizada por produzir coisa julgada material.17 O juiz, quando concede a tutelasumária, nada declara, limitando-se a afirmar a probabilidade da existência do direito, demodo que, aprofundada a cognição, nada impede que assevere que o direito que supôsexistir na verdade não existe.

A tutela de cognição sumária pode ser prestada mediante diferentes técnicasprocessuais. A tutela cautelar pode ser prestada no curso do processo de conhecimento,mas também por meio de ação cautelar antecedente – liminarmente ou ao final doprocedimento cautelar (art. 305, CPC). A tutela antecipada também pode ser prestadaincidentalmente ao processo de conhecimento e, ainda, mediante a ação que diz respeito àtutela antecipada antecedente (art. 303, CPC). A tutela da evidência, por sua vez, apenaspode ser prestada no curso do processo de conhecimento e, ao contrário das tutelascautelar e antecipada, não pode ser prestada antes da ouvida do réu – a despeito dainconstitucional previsão do parágrafo único do art. 311 do Código de Processo Civil.

A sumarização da cognição pode ter graus diferenciados, não dependendo dacronologia do provimento jurisdicional no iter do procedimento, mas sim da relação entrea afirmação fática e as provas produzidas. Perceba-se, por exemplo, que a liminar doprocedimento do mandado de segurançae a liminar concedida no procedimento da tutelacautelar antecedente diferem nitidamente quanto ao grau de cognição. No mandado desegurança a liminar é deferida com base no juízo de probabilidade de que a afirmaçãoprovada não será demonstrada em contrário pelo réu, enquanto a liminar cautelar éconcedida com base no juízo de probabilidade de que a afirmação será demonstrada,ainda que sumariamente, através das provas admitidas no procedimento sumário.

Note-se, ainda, que a tutela antecipada pode ser concedida antes de produzidas todasas provas tendentes à demonstração dos fatos constitutivos do direito, o que não acontecequando se pensa na liminar do mandado de segurança. A tutela antecipada é fundada naprobabilidade de que o direito afirmado, mas ainda não provado, será demonstrado edeclarado, enquanto que a liminar do mandado de segurança e a tutela da evidência sãobaseadas em prova dos fatos constitutivos.

Lembre-se que, quando o direito do autor está evidenciado (prova dos fatosconstitutivos) e há uma defesa provavelmente infundada, admite-se a tutela da evidência e,portanto, aplica-se a técnica da cognição sumária.

4.3. A técnica da cognição exauriente secundum eventum probationis

O mandado de segurança, como é sabido, exige o chamado “direito líquido e certo”, istoé, prova documental anexa à petição inicial e suficiente para demonstrar a afirmação daexistência do direito.

Quando o direito afirmado no mandado de segurança exige outra prova além dadocumental, fica ao juiz impossível o exame do mérito. No caso oposto, ou seja, quandoapresentada prova documental da alegação, o juiz julgará o mérito e a sentença produzirácoisa julgada material. Como está claro, o mandado de segurança é processo que tem oexame do mérito condicionado à existência de prova capaz de fazer surgir cogniçãoexauriente.

É comum a afirmação de que “direito líquido e certo” é o que resulta de fato certo, bem

como a de que fato certo é aquele capaz de ser comprovado de plano. Trata-se deequívoco, pois o que se prova são as afirmações de fato. O fato não pode ser qualificado de“certo”, “induvidoso” ou “verdadeiro”; o fato apenas existe ou não existe. Como o direitoexiste independentemente do processo, esse serve apenas para declarar que o direitoafirmado existe. Prova-se a afirmação de fato para que se declare que o direito afirmadoexiste. Acentue-se que a sentença de cognição exauriente limita-se a declarar a verdade deum enunciado, isto é, que a afirmação de que o direito existe é verdadeira de acordo comas provas produzidas e o juízo de compreensão do juiz. Em outras palavras, o direito que oprocesso afirma existir pode, no plano substancial, não existir e vice-versa. Não se provaque o direito existe, mas sim que a afirmação de que o direito existe é verdadeira,declarando-se a existência do direito (coisa julgada material).

No mandado de segurança, a afirmação de existência do direito deve ser provadadesde logo, ou melhor, mediante prova documental anexa à petição inicial. Dessa forma,não se pode aceitar a conclusão de Buzaid18 no sentido de que o direito líquido e certopertence à categoria do direito material. Trata-se, isto sim, de conceito nitidamenteprocessual,19 que serve, inclusive, para a melhor compreensão do processo modeladoatravés da técnica da cognição exauriente secundum eventum probationis.

A prática apresenta o caso em que o impetrante do mandado de segurança procurademonstrar a existência do “direito líquido e certo” através de prova testemunhal oupericial realizada antecipadamente. Entretanto, o direito líquido e certo não pode serdemonstrado através dessas provas, não apenas porque tais provas não constituem provadocumental (porém apenas prova documentada), mas especialmente porque se a provatestemunhal for admitida como suficiente para a demonstração de “direito líquido e certo”ocorrerá lesão ao direito de defesa, à medida que o réu não tem oportunidade de produzirprova para contrapor à prova antecipadamente realizada pelo autor, pois só pode se valerde prova documental. Note-se que garantir participação na formação da prova (pericial outestemunhal) nada tem a ver com o direito de produzir prova. Assim, são completamentedestoantes dos princípios as decisões que admitem mandado de segurança com base em“produção antecipada de prova”. Talvez o equívoco na admissão de prova antecipada emmandado de segurança seja derivado da falta de definição dos conceitos de “provadocumentada” e “prova documental”, o que é reflexo do esquecimento da lição de Bobbio,no sentido de que dar a cada coisa o seu nome não é mera preocupação formalista, porémnecessidade para a construção de uma ciência.20

Por outro lado, afirma-se que “não se pode admitir que o impetrante ingresse em juízopara fazer, no curso sumaríssimo do mandado de segurança, em que não há dilação, aprova das suas alegações; esta deve ser, aqui, sempre, prova pré-constituída e documental.A prova há de ser documental e os documentos comprobatórios do fato não podempadecer de dúvida. Se fossem impugnados de falsos, não seria possível a instauração doincidente de falsidade. Nesse caso não se poderia falar mais em direito líquido e certo”.21

Na realidade, no caso de o documento ser apontado como falso, é possível pensar: (a)na impossibilidade de o juiz apreciar o mérito, por ausência de direito líquido e certo; (b)na possibilidade de o juiz desconsiderar a alegação da autoridade coatora e julgar omérito; e (c) na admissão da produção de prova tendente à demonstração da existência dafalsidade.22

A primeira alternativa não merece maiores considerações. Ora, se bastasse aautoridade coatora afirmar a falsidade do documento para o juiz estar impedido de julgaro mérito, estaria aberto o caminho para a inefetividade do mandado de segurança. Serialícito, no entanto, admitir a possibilidade de uma eventual “injustiça” para a preservaçãoda efetividade da via do mandado de segurança, já que a sentença fundada em prova falsa

pode ser objeto de ação rescisória? Alguém poderia supor, de fato, que o caso seria dereserva de exceção, ou seja, que a arguição da falsidade somente poderia ser feita em açãoinversa subsequente, precisamente a ação rescisória. Perceba-se, contudo, que impedir aprodução da prova sobre o documento apontado como falso significa restrição à cogniçãono sentido vertical (ou ao aprofundamento da cognição), quando estaria sendo admitidauma sentença de cognição sumária com força de coisa julgada material.23

De modo que a opção correta é admitir a investigação da falsidade. A objeção seria deque o procedimento estaria sendo desnaturado e alargado. Porém, o procedimento nãoestará sendo desnaturado, já que a prova, por óbvio, não terá por objeto o fato que odocumento pretende representar, mas a própria idoneidade do documento. Vale dizer: oprocedimento continuará com a sua natureza documental intocada. Por outro lado, aquestão do prejuízo com o alargamento do procedimento implica a consideração daeterna problemática posta pelo binômio “celeridade-segurança”. Neste caso, seria dadaprioridade ao valor segurança em detrimento do valor celeridade apenas em razão daviabilidade da concessão de liminar no procedimento do mandado de segurança. Demais,as provas requeridas por abuso poderiam ter resposta na imposição de pena por litigânciade má-fé.

Observe-se, ainda, que a técnica da cognição exauriente secundum eventum probationis,além de permitir a construção de um processo célere e ao mesmo tempo de cogniçãoexauriente, não elimina a possibilidade de o jurisdicionado, que lançou mão do mandadode segurança mas necessitava de outras provas além da documental, recorrer aoprocedimento comum. De acordo com a Súmula 304 do STF, a “decisão denegatória demandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o usoda ação própria”.24 Este enunciado quer dizer que fica aberta a via ordinária àquele queteve denegado o mandado de segurança por ausência de direito líquido e certo. Issoporque a sentença que afirma a ausência de direito líquido e certo não declara que odireito subjetivo material não existe.

4.4. A técnica da cognição exauriente enquanto não definitiva

Há casos em que, porque presente fundado receio de dano irreparável ou de difícilreparação, é possível a antecipação da tutela após o encerramento da fase instrutória. Hátambém casos em que poderá ser necessária a antecipação da tutela após a sentença,antes ou depois da subida dos autos ao tribunal.

Nestes casos há sempre cognição exauriente mas não definitiva. Aliás, comodemonstrou Domenico Borghesi em ensaio publicado na Rivista Trimestrale diDiritto eProcedura Civile, esta também é a técnica que funda a execução “provisória” da sentença.25

4.5. A técnica da cognição exauriente por ficção legal conjugada com a técnica dacognição exauriente secundum eventum defensionis

A ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em “provaescrita” sem eficácia de título executivo, ter direito de receber do devedor capaz i)pagamento de soma em dinheiro, ii) entrega de coisa fungível ou infungível ou de bemmóvel ou imóvel ou iii) o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer (art. 700,CPC). Estando a petição inicial devidamente instruída e sendo “evidente o direito doautor”, o juiz deve deferir a expedição do mandado sem a ouvida do réu, que seconverterá em título executivo judicial quando o devedor, além de não adimplir, nãoapresentar embargos, bem como, quando apresentados os embargos, esses forem julgadosimprocedentes (arts. 701 e 702, CPC).

O procedimento monitório é resultado da combinação da técnica da cognição

exauriente por ficção legal com a técnica da cognição exauriente secundum eventumdefensionis. Objetiva a formação do título executivo sem as delongas do procedimento decognição plena e exauriente, deixando ao devedor ou ao obrigado o juízo de oportunidadesobre a instauração de embargos. A não apresentação de embargos faz surgir o títuloexecutivo, ficando o juiz impedido de determinar a produção de prova tendente àaveriguação da existência do direito afirmado, que, na verdade, é considerado existentepor ficção legal. Trata-se da adoção de um critério racional, que responde à exigência dese evitar um desnecessário procedimento de cognição plena e exauriente quando a provaescrita demonstra, em alto grau de probabilidade, a existência do direito.

4.6. A técnica dos títulos executivos extrajudiciais

A técnica dos títulos executivos extrajudiciais também é uma técnica de sumarização, àmedida que elimina a necessidade de o juiz averiguar a existência do direito, que opróprio título faz presumir presente.

A limitação ao direito de defesa igualmente decorre de um critério racional, justificadopelo alto grau de probabilidade conferido pelo título. Como o título indica apenas um altograu de probabilidade, assume-se o risco de eventual erro em virtude daquilo quecomumente ocorre. O risco de erro é deliberadamente aceito em razão de uma maiorefetividade da tutela dos direitos.26

Os títulos executivos extrajudiciais, segundo denúncia de Proto Pisani,27 sempreprivilegiaram determinados sujeitos e seus respectivos direitos, razão pela qual deve sepropor o alargamento da técnica dos títulos extrajudiciais a todas as hipóteses em que umdocumento idôneo seja capaz de fornecer um grau de probabilidade consideradosuficiente, independente do peso político dos sujeitos que dele poderão usufruir.28

5. Técnica antecipatória, tutela cautelar, tutela antecipada e tutela da evidência

A tutela cautelar é conhecida desde os primórdios do direito. A teoria da tutelacautelar, por sua vez, tem importantes raízes no direito processual civil que sedesenvolveu ao final do século XIX e início do século XX na Itália. Porém, ainda que setenha falado em tutela cautelar em favor do processo ou da jurisdição, hoje é indiscutívelque a tutela cautelar protege o direito daquele que pode ser prejudicado pela demora doprocesso. Não fosse assim, estar-se-ia diante de inexplicável e irracional prevalência dafunção pública do processo em detrimento da função de tutela dos direitos, típica aoEstado constitucional.

Tutela é a proteção que o Estado deve dar aos direitos, seja mediante normas (tutelanormativa), atividades fático-administrativas (tutela administrativa) ou mediante decisõesjudiciais (tutela jurisdicional). A tutela jurisdicional do direito certamente não pode seconfundir com a técnica processual utilizada para viabilizá-la. Assim, por exemplo, não hácomo confundir sentença mandamental com tutela inibitória. Tutela inibitória é uma dasformas de tutela do direito material, enquanto que sentença mandamental é técnicautilizada para permitir a tutela do direito. Tanto é assim que a sentença mandamentalpode servir para a prestação não só da tutela inibitória, mas também da tutelaressarcitória na forma específica e da tutela do adimplemento da obrigação contratual.

Tutela cautelar é tutela de segurança do direito; é tutela e não técnica processual. Atutela cautelar pode se valer de decisão que ordena sob pena de multa ou de outros meiosexecutivos idôneos à implementação imediata e efetiva da tutela de segurança. Como éóbvio, a decisão que ordena sob pena de multa e os meios executivos nada mais são doque técnicas processuais.

A tutela antecipada também é tutela do direito material. Substancialmente, a tutelaantecipada é a própria tutela de direito ambicionada pela parte mediante o exercício daação. É a tutela de direito que o autor pretende obter ao final do processo, mas que éconcedida antecipadamente em virtude de perigo de dano. Em outras palavras, tutelaantecipada é a tutela do direito que, em vista de uma situação de urgência, é prestada combase em probabilidade ou mediante cognição sumária.

A tutela antecipada também não se confunde com as técnicas processuais idôneas à suaprestação, como a decisão baseada em cognição sumária, a ordem sob pena de multa e osdemais meios de execução.29 Note-se que confundir tutela antecipada com técnicaantecipatória significa negar valor aos pressupostos das tutelas de direito que podem serantecipadas. A análise da tutela antecipada sempre deve tomar em conta os pressupostosda tutela de direito que se deseja antecipar. A tutela antecipada inibitória exigeprobabilidade da prática de ato contrário ao direito e a tutela antecipada de remoção deilícito, a probabilidade de que tenha sido praticado um ilícito. A tutela antecipada deadimplemento requer probabilidade de inadimplemento, mais o perigo de que, em vistado descumprimento, o autor possa sofrer dano. A tutela antecipada ressarcitória exige aprobabilidade do dano – já ocorrido – e da responsabilidade, bem como o perigo de que,em razão do dano já praticado, outro dano possa ser provocado ao autor.

Como está claro, tutela antecipada não é técnica de antecipação da tutela ou técnicaantecipatória.30 A tutela antecipada exige a consideração dos pressupostos de direitomaterial da tutela de direito que se quer antecipar, enquanto que a técnica de antecipaçãonada mais é do que previsão técnico processual que autoriza a antecipação da tutela dodireito. A técnica antecipatória é a ferramenta processual que abre oportunidade à tutelado direito material com base em probabilidade (procedimento comum) e à própria tutelacautelar mediante liminar (procedimento da tutela cautelar antecedente). Perceba-se queo juiz, diante do procedimento da tutela cautelar antecedente, pode antecipar a tutelacautelar. Mas aí, como é evidente, a técnica antecipatória continuará a não se confundircom a tutela cautelar antecipada, uma vez que a tutela cautelar, quando prestadaantecipadamente, obviamente não dispensa a consideração dos pressupostos da tutela desegurança.

É claro que se fala em tutela antecipada tomando-se em consideração o procedimentocomum, ou melhor, a tutela de direito pretendida mediante o exercício da ação. Ninguémcoloca no mesmo patamar a tutela antecipada e a tutela cautelar antecipada simplesmentepor ambas serem antecipadas em relação à tutela final. A tutela cautelar antecipadasempre existiu e sempre foi admitida em razão da urgência que marca esta forma detutela. Um procedimento cautelar que não aceitasse liminar cautelar seria umacontradição em termos ou, mais propriamente, verdadeira aberração.

Reserva-se a qualificação “antecipada” à tutela do direito prestada mediante cogniçãosumária em virtude da particularidade da admissão da tutela do direito antes dadeclaração do direito, ou seja, antes da sentença, o que, nos termos do princípio da nullaexecutio sine titulo, não seria permitido fora dos procedimentos especiais, como oprocedimento cautelar e os procedimentos possessórios. Como a liminar cautelar é parteinseparável de todo e qualquer procedimento cautelar, não há motivo para falar em tutelaantecipada cautelar nem muito menos para pensar em equipará-la à verdadeira tutelaantecipada – na medida em isso seria metodologicamente inadequado e pernicioso para odesenvolvimento da teoria do processo civil.

De lado a tutela cautelar, a técnica antecipatória permite que se dê tratamentodiferenciado aos direitos que correm risco de lesão e aos direitos evidentes noprocedimento comum. O perigo de dano é um dos fundamentos da tutela antecipada.

Porém, o legislador chamou outra forma de tutela antecipada de “tutela da evidência” (art.311, CPC). Ou seja, qualificou a tutela antecipada fundada em “direito evidente” de “tutelada evidência”. O processo linguístico suprimiu a palavra “antecipada”, que indica que setrata de tutela do direito prestada mediante cognição sumária, para usar o qualificativo“da evidência”, que indica apenas um dos fundamentos para se ter tutela antecipada.

Em substância, a tutela “da evidência” também é a tutela pretendida mediante oexercício da ação; é a tutela final prestada mediante probabilidade ou na formaantecipada. A diferença é a de que, tratando-se de tutela da evidência, a tutela finalantecipada é concedida com base na prova dos fatos constitutivos e na inconsistência dadefesa que reclama produção de prova. A tutela da evidência, assim, permite adistribuição do ônus do tempo do processo de acordo com a evidência do direito do autore com a fragilidade da defesa do réu, afastando-se da tutela antecipada baseada em perigode dano em razão do seu diferente fundamento e diversa finalidade. Enquanto a tutelaantecipada propriamente dita tem como fundamento a urgência e como objetivo aimediata tutela do direito para evitar dano, a tutela da evidência tem como fundamento aevidência do direito e a inconsistência da defesa e como fim a inversão do ônus do tempodo processo.

NOTAS DE RODAPÉ

1

O BGH alemão já afirmou expressamente que o processo civil possui o escopo de realizar odireito material, esclarecendo que as normas processuais não têm um fim em si mesmo, uma vezque são dirigidas a um fim (BGHZ 10, 359).

2

Ver Claus-Wilhelm Canaris, Direitos fundamentais e direito privado, esp. p. 101 e ss.

3

A respeito da eficácia dos direitos fundamentais sobre os particulares, ver José Carlos Vieira deAndrade, Os direitos fundamentais..., p. 290 e ss. e Os direitos, liberdades e garantias no âmbitodas relações entre particulares, Constituição, direitos fundamentais e direito privado; José JoaquimGomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1.270 e ss. e Dogmática dedireitos fundamentais e direito privado, Constituição, direitos fundamentais edireito privado;Claus-Wilhelm Canaris, Direitos fundamentais e direito privado e A influência dos direitosfundamentais...; Jörg Neuner, O Código Civil da Alemanha (BGB) e a Lei Fundamental,Constituição, direitos fundamentais e direito privado; Juan María Bilbao Ubillos, En qué medida…

4

O art. 927, caput, do Código Civil de 2002, afirma textualmente que “aquele que, por ato ilícito(arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Quase no mesmo sentido, dizia

o art. 159 do Código Civil de 1916: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ouimprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”.

5

Segundo Pontes de Miranda, na ação que objetiva reparar o ato ilícito, “o pedido pode dirigir-se àrestauração em natura, e somente quando haja dificuldade extrema ou impossibilidade de serestaurar em natura é que, em lugar disso, se há de exigir a indenização em dinheiro” (Pontes deMiranda, Tratado de direito privado, v. 26, p. 28).

6

E não vai aqui nenhuma crítica à doutrina que se vale do ditado chiovendiano. Chegamos a usá-lo expressamente em um dos itens do livro Tutela inibitória, ainda que assim advertindo: “Cabelembrar, porém, que Chiovenda, apesar de ter dito que o processo deve dar a quem tem umdireito tudo aquilo e exatamente aquilo que tem o direito de obter, afirmou, nas suas Instituições,o seguinte: ‘Se, por sua natureza ou por falta de meios de sub-rogação, não se pode conseguir umbem senão com a execução por via coativa, e os meios de coação não estão autorizados na lei,aquele bem não é conseguível no processo, salvo a atuação (se possível, por sua vez) da vontadeconcreta de lei que deriva da lesão ou inadimplemento do direito a uma prestação; salvo, porexemplo, o direito ao ressarcimento do dano’ (Giuseppe Chiovenda, Instituições de direitoprocessual civil, v. 1, p. 290)” (Tutela inibitória, p. 364).

7

Adolfo di Majo, Forme e tecniche di tutela, Processo e tecniche di attuazione dei diritti, v. 1, p. 11 ess.

8

Ver Sérgio Cruz Arenhart, A tutela inibitória da vida privada.

9

Muito embora a reparação do dano não seja plena, seja porque a publicação ou a transmissãopodem não atingir todos aqueles que tiveram ciência do fato danoso, seja porque tal ciência nãoelimina a dor moral gerada pela imputação ofensiva, o certo é que a tutela colabora para areparação do dano, que ficaria sem tutela adequada caso somente pudesse ser sancionado empecúnia. Lembre-se, para exemplificar, que, de acordo com o art. 120 do CPC italiano, nos casosem que a publicação da sentença puder contribuir para reparar o dano, o juiz, a requerimento daparte, poderá ordená-la aos cuidados e às expensas do sucumbente, mediante a inserção porextrato em um ou mais jornais por ele designados. A doutrina italiana entende que a publicaçãoda sentença, prevista no referido art. 120, assim como a publicação da retificação relativa anotícias veiculadas por meio de periódicos, colaboram para reparar o dano. Como percebeu

Grazia Ceccherini (Risarcimento del danno e riparazione in forma specifica, p. 72), o recurso aformas de tutela lato sensu específicas é, sem dúvida, mais adequado e, portanto, preferível emrelação a uma sentença que se limite a condenar o autor do dano ao direito da personalidade ao

ressarcimento em dinheiro (Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual e tutela dos direitos, 4a.ed., São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2013, p. 434 e ss).

10

 Adolfo di Majo, La tutela..., p. 43 e ss.

11

Cf., a respeito, Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil; Ovídio Baptista da Silva,Procedimentos especiais (exegese do Código de Processo Civil), p. 37-54; Andrea Proto Pisani, Sullatutela giurisdizionale differenziata, Rivista di Diritto Processuale, 1979, p. 575 e ss. e Appunti sullatutela sommaria, I processi speciali Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, p. 309-360.

12

Ver Ovídio Baptista da Silva, Procedimentos especiais (exegese do Código de Processo Civil), p. 46.

13

De acordo com Watanabe, “em termos estritamente processuais, só se pode falar em limitação àcognição quando instituída em função de um objeto litigioso já estabelecido, de sorte que nosembargos do executado não haveria, verdadeiramente, uma cognição parcial. Mas, examinada apartir do plano do direito material, é inegável que a perquirição do juiz não atinge toda arealidade fática” (Da cognição no processo civil, p. 87).

14

Ver Ovídio Baptista da Silva, Procedimentos especiais (exegese do Código de Processo Civil), p. 51.

15

“Cabe deixar anotado, aqui, que as limitações ao direito do contraditório e, por via deconsequência, da cognição do juiz, sejam estabelecidas em lei processual ou em lei material, seimpossibilitam a efetiva tutela jurisdicional do direito contra qualquer forma de denegação dajustiça, ferem o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional e por isso sãoinconstitucionais” (Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 88).

16

RTFR, v. 102, p. 94.

17

Ver Proto Pisani, Appunti sulla tutela sommaria, I processi speciali – Studi offerti a VirgilioAndrioli dai suoi allievi, p. 312-313.

18

Alfredo Buzaid, Do mandado de segurança, p. 86-87.

19

“O conceito de direito líquido e certo é tipicamente processual, pois atende ao modo de ser de umdireito subjetivo no processo: a circunstância de um determinado direito subjetivo realmenteexistir não lhe dá a caracterização de liquidez e certeza; esta só lhe é atribuída se os fatos em quese funda puderem ser provados de forma incontestável, certa, no processo. E isso normalmentese dá quando a prova for documental, pois esta é adequada a uma demonstração imediata esegura dos fatos” (Celso Agrícola Barbi, Do mandado de segurança, p. 55).

20

Norberto Bobbio, Teoria della scienza giuridica, p. 217.

21

Carlos Mário Velloso, Direito líquido e certo. Decadência, Mandado de segurança, p. 57.

22

O TJSP, ao apreciar essa questão, já concluiu: “Não pode ser deferido incidente de falsidade emmandado de segurança, onde o direito deve vir comprovável de plano. Em se tratando demandamus, impossível a produção de prova que não venha com a inicial”(JurisprudênciaBrasileira, v. 103, p. 90).

23

Demais, como ensina o professor Egas Moniz de Aragão, é irrecusável que a prova “tende aproporcionar ao juiz a formação de seu convencimento, razão pela qual tem ele, comodestinatário dela, o poder-dever de eliminar de entre as provas a serem consideradas odocumento que lhe deformaria o julgamento. Podem ser recordadas a esse respeito palavras deCarnelutti a propósito do assunto, ao dizer que ‘a luta contra a falsidade é uma espécie dedesinfecção social’, dado que ‘uma das condições para que a justiça seja bem administrada é quea fé do juiz não seja traída’ (causa certa surpresa, por isso, a afirmação de Rosenberg, de oassunto não ter importância prática)” (Exegese do Código de Processo Civil, v. 4, t. 1/297).

24

Como diz Watanabe, “no processo de mandado de segurança, é entendimento assente, inclusivecristalizado em Súmula do STF, que ‘decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendocoisa julgada contra o impetrante, não impede o uso de ação própria’ (Súmula 304) (art. 15 da Lei1.533/51) [art. 19, Lei 12.016/2009]. O exame exauriente do mérito da causa é dependente daexistência de elementos probatórios necessários para tanto. Informa Theotonio Negrão, comcitação de inúmeros precedentes, que ‘a jurisprudência do STF, dando entendimento a estaSúmula, vem afirmando que a decisão que denega a segurança, se aprecia o mérito do pedido eentende que o impetrante não tem direito algum (e não que apenas lhe falta direito líquido ecerto), faz coisa julgada material, impedindo a reapreciação da controvérsia em ação ordinária”(Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 89).

25

“Un ultimo telegrafico accenno vorrei dedicare alla provvisoria esecutorietà della sentenza diprimo grado che rappresenta un caso in cui ‘l’esecutività consegue a una cognizione nondefinitiva’ che si differenzia in modo netto da quelli precedentemente esaminati perche lacognizione, pur non essendo definitiva, nel senso che la sentenza può essere riformata neisuccessivi gradi di giudizio, è tuttavia piena ed esauriente” (Domenico Borghesi, L’anticipazionedell’esecuzione forzata nella riforrna del processo civile, Rivista Trimestrale di Diritto e ProceduraCivile, 1991, p. 197).

26

Como diz Dinamarco, “ao instituir títulos além da sentença condenatória civil ordinária, age olegislador por critério de probabilidade, sabendo que sempre algum risco haverá, masentendendo também que vale a pena corrê-lo; vale a pena porque as vantagens obtidas nagrande maioria dos casos têm muito mais significado social que eventuais males sofridos emcasos proporcionalmente reduzidos quanto aos quais, de resto, fica aberta a via defensivaconsistente nos embargos à execução. Tem-se, então, na técnica consistente em tipificar os títulosexecutivos, o culto ao escopo social de pacificação mediante eliminação dos conflitos. O legisladoracha preferível enfrentar o risco de permitir a instauração de algum processo executivo sem ocorrespondente direito subjetivo material, concedendo ao exequente a realização de medidasconstritivas (especialmente, penhora) e talvez causando algum dano ao executado” (CândidoRangel Dinamarco, A instrumentalidade do processo, p. 256).

27

“Di fatto, storicamente il ricorso a questa tecnica è stato (ne, a mio avviso, poteva esserediversamente) influenzato anche dalla opportunità di privilegiare i soggeti reali portatori deltitolo ed i relativi diritti (è sintomatico, a tale riguardo, che la stragrande maggioranza dei titoliesecutivi di formazione stragiudiziale è a disposizione di imprenditori commerciali e diPubbliche Amministrazioni)” (Andrea Proto Pisani, Appunti sulla tutela sommaria, I processi

© desta edição [2017]

speciali. Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, p. 318).

28

“Mesmo assim, e apesar de tal atitude doutrinária, de duvidosa legitimidade, os mesmosescritores que condenavam os ‘processos sumários’, ou, como diz Segni, os ‘juízos especiais’,nunca repudiaram, por exemplo, a longa e laboriosa teoria dos títulos de crédito, por meio dosquais os ‘empresários’ podiam livrar-se do tão elogiado procedimento ordinário, servindo-se domais puro e bem feito processo sumário que a doutrina moderna jamais concebeu!” (OvídioBaptista da Silva, Curso de processo civil, v. 1, p. 105).

29

A distinção entre tutela do direito e técnica processual permite investigar se a legislação possuiinstrumentos processuais (técnica processual) efetivamente capazes de propiciar a tutela dosdireitos. Para tanto, é necessário analisar, como antecedente lógico, o que é vital à proteção dosdireitos, para depois ver se os instrumentos processuais estão adequadamente preordenadospara permitir a tutela que lhes é inerente. Tal distinção traz ao direito processual um novo valor,calcado na necessidade de verificar se o processo está realmente preparado para assumirplenamente a função de tutela dos direitos ou se é algo incapaz de fazer o Estado cumprir com odever que assumiu no momento em que proibiu a autotutela. Se não é possível negar, diante daconsideração do direito material, o direito à tutela inibitória (por exemplo), fica o legisladorinfraconstitucional obrigado a estabelecer os instrumentos adequados para garanti-la, sob penade descumprir o preceito constitucional consagrador do direito fundamental de ação. Isto querdizer que a tutela jurisdicional inibitória, que é resposta do processo ao direito à tutela inibitória,deve constituir tutela jurisdicional que possa efetivamente inibir a prática, a repetição ou acontinuação do ilícito. É por isso que a tutela jurisdicional inibitória deve poder ser prestadaantecipadamente (técnica antecipatória) e por meio das sentenças e meios de execuçãoadequados.

30

Ver o importante livro de Daniel Mitidiero, Antecipação da tutela, São Paulo: Ed. Revista dosTribunais, 2014.

2017 - 11 - 15 Tutela de Urgência e Tutela da Evidência - Edição 2017PARTE II - TUTELA DE URGÊNCIA: CAUTELAR E ANTECIPADA

PARTE II - TUTELA DE URGÊNCIA: CAUTELAR EANTECIPADA

1. A evolução da tutela de urgência: da tutela de segurança à compreensão e aodelineamento das tutelas cautelar e antecipada

1.1. A tutela cautelar na origem do direito processual civil

O processo civil, à época do Estado de Direito de matriz liberal, não tinha preocupaçãoem dar tutela preventiva aos direitos. O direito, nesta época, era voltado a proteger asliberdades e as conquistas da classe burguesa contra a ameaça de arbítrio do Estado. OEstado, para garantir a liberdade, era obrigado a tratar todos da mesma forma,independentemente das suas diferenças concretas. Tomava-se em conta o conceito deigualdade formal perante a lei, sendo que qualquer tratamento desigual – ainda que aposições desiguais – era visto como “privilégio”.

Este Estado, porquanto não podia tratar as posições jurídicas e sociais de formadiferenciada, obviamente não podia desenhar políticas públicas voltadas a dar proteçãoespecífica ou mais incisiva a determinadas classes de pessoas ou espécies de direitos.Ademais, os direitos desta época eram vistos como coisas dotadas de valor de troca, demodo que, diante da prática de ato ilícito, entendia-se ser suficiente a prestação da tutelaressarcitória pelo equivalente ao valor do dano ou da prestação inadimplida.

De modo que a tutela contra o ilícito era apenas a tutela contra o dano. Lembre-se quea indistinção entre ilícito e dano é o reflexo de um árduo processo de evolução históricaque acabou por fazer concluir, a partir da suposição de que o bem juridicamente tuteladoé uma coisa dotada de valor de troca, que a tutela jurisdicional do bem é o ressarcimentopelo equivalente ao valor econômico da lesão.1

Além disto, na economia liberal clássica o Estado estava preocupado apenas em manterem funcionamento os mecanismos de mercado. Ora, a tutela pelo equivalente ao valor daprestação mantinha íntegros os mecanismos do mercado, sem alterar a sualógica.2Portanto, há aí um nexo entre a tutela pelo equivalente e os princípios daabstração das pessoas e dos bens ou, ainda, uma visível correlação entre o contrato, aigualdade formal dos contratantes e a sanção pelo equivalente como forma expressiva darealidade da economia de mercado.3 Se os bens são equivalentes e, assim, não merecemtratamento diversificado, a transformação do bem devido em dinheiro está de acordo coma lógica do sistema, cujo objetivo é apenas sancionar o faltoso, repristinando osmecanismos de mercado.

O art. 1.142 do Código Napoleão, ao dizer que toda obrigação de fazer e não fazerresolve-se em perdas e danos mais juros em caso de inadimplemento, não só expressou aspreocupações da economia liberal, como ainda refletiu os princípios de liberdade e dedefesa da personalidade, próprios ao jusnaturalismo e ao racionalismo iluminista. Ou seja,

a tutela pelo equivalente, além de reafirmar as intenções da economia liberal, manteveintacta a “liberdade do homem” ao não admitir a coercibilidade das obrigações. Acoercibilidade das obrigações de fazer, indispensável para o juiz poder convencer odemandado a cumprir, foi repudiada pelo art. 1.142 do Código Napoleão em nome dosprincípios da liberdade, da defesa de personalidade e da autonomia da vontade.

Nesta dimensão, a tutela destinada a impedir a violação do direito não era admitidanão apenas porque se supunha que os direitos podiam ser adequadamente tutelados apósa ocorrência do dano mediante o pagamento de indenização, mas também porque umatutela jurisdicional anterior à prática de qualquer ato contrário ao direito era vista comoinconcebível interferência estatal sobre a esfera da liberdade e da autonomia doindivíduo.

Nesta época, o Estado nem mesmo tinha fundamento para constranger a vontadedaquele que já tinha inadimplido. Portanto, a possibilidade de tutela estatal capaz de atuarsobre a vontade de alguém que sequer havia violado um direito era inimaginável. Aliás,Lodovico Barassi, já em meados do século XX, confessou que a “tutela puramentepreventiva”, “certamente la più energica”, seria também “la più preoccupante, come è ditutte le prevenzioni che possono eccessivamente limitare l’umana autonomia”.4

Na concepção da doutrina processual clássica, a sentença declaratória prestava tutelapreventiva. A sentença declaratória era a única técnica processual capaz de outorgartutela preventiva no processo civil mais antigo. Gian Antonio Micheli, em conferênciapronunciada em importante congresso internacional de direito comparado que versousobre as tutelas preventivas, incluiu a tutela declaratória no gênero tutela preventiva,dizendo que “a primeira figura de ação preventiva é aquela da ‘action en fixation de droit’(ação declaratória), admitida para a obtenção da declaração de um direito quando este,embora não tenha sido violado ou judicialmente contestado, torna-se objetivamenteincerto em sua existência ou conteúdo, na medida em que é discutido ou não reconhecidopelos outros”.5

A tutela declaratória realiza-se com a prolação da sentença que, contendo um juízomeramente declaratório, é revestida pela coisa julgada material. A sentença declaratóriadá ao autor apenas a vantagem de que a relação jurídica, que até então era controvertida,não mais poderá ser discutida. Entretanto, tal sentença é incapaz de obrigar alguém afazer ou deixar de fazer alguma coisa em virtude da declaração que contém.6 A sentençadeclaratória não tem capacidade para inibir o ilícito ou tutelar de forma realmentepreventiva os direitos.7

Na verdade, a confusão entre tutela declaratória e tutela preventiva, posta à luz peladoutrina chiovendiana,8 teve origem em uma exigência de construção sistemática. Adoutrina utilizou o argumento de que a existência de uma sentença (declaratória) anteriorà violação demonstrava a autonomia da ação, uma vez que nesta hipótese o autor nãoprecisaria ter direito violado para exercer o direito de ação.9 A ação declaratória, por estarem contraposição à condenação, seria preventiva.

Além disto, como a doutrina clássica formou-se sob a influência de um Estado deDireito de matriz liberal, marcado por uma acentuação dos valores de liberdadeindividual em relação aos poderes de intervenção estatal, ela não podia conceber umatutela preventiva que dependesse de meio executivo que constrangesse a vontade dodemandado. Foi por isto que circunscreveu a tutela preventiva à sentença declaratória. Naverdade, a tutela declaratória, enquanto tutela que regula apenas formalmente umarelação jurídica já determinada em seu conteúdo pela autonomia privada,10 era ideal aosvalores do Estado liberal.11 Já a tutela preventiva, vista como tutela capaz de inibir a

violação do direito, era incompatível com os pressupostos desse modelo de Estado.

Tudo isto quer dizer que, no direito processual do início do século XX, não existia tutelarealmente preventiva. Seja porque se supunha que os direitos podiam ser ressarcidos empecúnia, seja porque se entendia que o Estado não podia atuar previamente à violação dodireito, seja ainda porque o Estado não podia constranger a vontade do indivíduo.

Lembre-se que o desenho do processo depende do objetivo do direito hegemônico, oque significa que a função e a estrutura do processo são consequências do direito e dosvalores de uma época. Quando se entende que o bem jurídico jurisdicionalmente tutelávelé uma coisa dotada de valor de troca, e que o juiz deve ter os seus poderes limitados paranão interferir na esfera jurídica privada, o processo não só não precisa, como não deveexercer função preventiva.

Ainda que relacionada com o perigo, a tutela cautelar foi concebida para assegurar autilidade da tutela jurisdicional final. A tutela cautelar certamente não poderia evitar aviolação do direito, uma vez que o processo de conhecimento clássico, a partir dos valoresda sua época, não foi estruturado para tanto. Se o processo de conhecimento não tinhacomo fim evitar a violação do direito, a tutela cautelar evidentemente não poderiaoutorgar proteção preventiva aos direitos, pois desta forma estaria negando a própriafunção do processo que a deveria acudir.

A tutela cautelar, ao servir ao processo, era obrigada a aceitar a ocorrência da violaçãoou do inadimplemento, que legitimavam as próprias ações ressarcitória e doadimplemento. Se o processo de conhecimento pressupunha a violação do direito ou o danoou o inadimplemento, não há como negar que a tutela cautelar foi idealizada para assegurara tutela jurisdicional posterior à violação do direito. Daí a ideia de tutela cautelar comotutela de segurança e não como tutela de prevenção.

1.2. A proibição dos juízos de verossimilhança no processo clássico

Lembre-se que o fim da jurisdição, para a doutrina chiovendiana e pós-chiovendiana,era o de dar “atuação à lei”. A impossibilidade de se conceder a tutela do direito com baseem verossimilhança ou antes do exaurimento do processo de conhecimento teve por base,além de outras coisas, a suposição de que o único julgamento que poderia “atuar a lei” sópoderia ser posterior à verificação da existência do direito.

Na trilha do direito liberal, o processo deveria conter somente um julgamento,realizado apenas após a elucidação dos fatos componentes do litígio. O julgamentoposterior à cognição sempre foi associado à ideia de “busca da verdade”. A “certeza” dojuiz seria pressuposto da sua capacidade de “enunciar a lei”. De modo que a garantia deliberdade e de segurança, neste caso, estariam em um julgamento que, a partir da“descoberta da verdade”, atuasse a vontade da lei.

Não é de estranhar, assim, que a tutela antecipada seja incompatível com o direitoprocessual do início do século XX. Se o juiz é um mero aplicador da lei, pelo mesmomotivo havia de ser proibido de julgar com base em verossimilhança. Dar ao juiz poderpara tutelar um direito aparente é o mesmo que dar ao Judiciário o poder para rever, combase em cognição aprofundada, o julgamento baseado em verossimilhança. Porém, se osistema processual admite que o juiz pode afirmar que não deveria ter concedido a tutelado direito, há aceitação de que a “justiça” do juiz pode não ser a da lei.12

O processo liberal proibiu os juízos de verossimilhança para permitir o controle doJudiciário e para garantir a liberdade dos cidadãos. A vedação desses juízos derivou dafalta de confiança no juiz.13 Diante desta desconfiança, foram evidenciadas garantias para

a participação adequada no processo, que passaram a significar garantias de liberdade dolitigante contra a possibilidade do arbítrio judicial. Proibiu-se qualquer tipo de restrição àdefesa e ao contraditório e, assim, restou inviável a tutela do direito antes da plenitude dacognição. Quando a preocupação do direito se centrava na defesa da liberdade do cidadãodiante do Estado, as formas – e assim a rigidez dos conceitos de ampla defesa e decontraditório – possuíam grande importância para o demandado.

Perceba-se que a impossibilidade de postecipação da defesa e do contraditório é umaoutra versão da separação entre cognição e execução. Se a ampla defesa e o contraditórionão podem ser postecipados, a execução não pode ser anterior ao término da cognição.Vale dizer que a estrutura do direito processual, ancorada na separação entre cognição eexecução, tem íntima relação com uma época em que não se podia confiar no Judiciário,quando as formas garantidoras da defesa tinham outra conotação, de modo a tornarimpossível a tutela do direito antes do exaurimento do processo de conhecimento.

Assim, no processo concebido por Chiovenda e que foi desenvolvido pela doutrina quelhe seguiu, não há sequer como imaginar tutela do direito – e, portanto, execução – napendência do processo de conhecimento. Isso seria um atentado contra os valores quefundaram a fórmula técnico-jurídica da nulla executio sine titulo.

1.3. O problema da demora do processo e as novas situações jurídicas carentes detutela

A transformação da sociedade e do Estado fez surgir novas situações substanciaiscarentes de tutela. A necessidade de maior celeridade de tutela dos direitos, advinda dascaracterísticas dos “novos direitos” e das relações jurídicas próprias à sociedadecontemporânea, colocaram em xeque o processo civil clássico, evidenciando aimprescindibilidade da adaptação do sistema de distribuição de justiça à evolução dasociedade.

Porém, a falta de idoneidade do processo civil para atender às novas situações nãoimpediu a prática forense de utilizar a tutela cautelar inominada como técnica desumarização do processo de conhecimento. Como o procedimento cautelar viabilizava aconcessão de liminar, assim como o uso de meios executivos adequados às diferentessituações concretas, a prática forense brasileira assistiu ao uso não cautelar da açãocautelar.

Essa distorção do uso da ação cautelar consistiu na invocação do procedimentocautelar para atender aquilo que poderia e deveria ser tutelado pelo processo deconhecimento – desde que este tivesse as particularidades técnicas do procedimentocautelar,14 especialmente a técnica antecipatória e a possibilidade de uso de meiosexecutivos capazes de imediatamente realizar o direito ou constranger a vontade da parte.Tal fenômeno não ocorreu somente no Brasil, mas em todos os países em que o modelobásico de processo de conhecimento esgotou a sua funcionalidade. A própria práticaitaliana, ainda que sem romper a classificação trinária das sentenças, foi obrigada aadmitir a tutela inibitória (satisfativa sumária) sob o rótulo de cautelar diante da açãodeclaratória. Na Itália, sem se admitir sentença genérica que ordena sob pena de multa e,portanto, uma sentença realmente capaz de inibir, aceitou-se a possibilidade de concessãode provimento incidental à ação declaratória – com o nome de cautelar – para constrangero demandado a não fazer, ou melhor, para inibir a violação de um direito.

Lembre-se que, antes da violação do direito, a única alternativa, em face das trêssentenças de conhecimento clássicas, seria a ação declaratória. Porém, como oprocedimento desta ação não contém técnica antecipatória e a sentença declaratória nãopossui idoneidade para impedir a prática do ilícito, surgiu naturalmente, para viabilizar a

tutela inibitória das novas situações carentes de tutela, a possibilidade do emprego datécnica cautelar inominada para outorgar tutela inibitória em face da ação declaratória.

A melhor doutrina italiana foi expressa em advertir que, neste caso, ocorreu umadistorção da fisionomia original da tutela cautelar, já que o emprego da técnica cautelarpara a obtenção da tutela inibitória fez desaparecer a principal característica da tutelacautelar, isto é, a instrumentalidade. Loriana Zanuttigh, ao escrever sobre o uso dacautelar inominada na tutela dos direitos da pessoa, consignou que, graças à progressivaalteração da estrutura e da função da tutela cautelar inominada, criou-se um modelo detutela mais avançado e eficaz, com resultados de incisa aderência à especificidade dosdireitos da pessoa.15 Há aí uma importante percepção de que a tutela cautelar perdeu asua original fisionomia para permitir a adequada proteção de direitos que, de outramaneira, não encontrariam adequada tutela jurisdicional.16 No mesmo sentido, apóslembrar que o art. 700 – base do poder geral de cautela – do CPC italiano permitiu que ostribunais suprissem a ausência de tutela jurisdicional adequada, o genial Vittorio Dentiadvertiu que isto ocorreu por ter surgido a necessidade de uma “tutela de urgência comfunção não cautelar, ou seja, não vinculada instrumentalmente com a tutela que o art. 700define como ordinária”.17 A necessidade de uma tutela efetiva dos direitos nãopatrimoniais levou Proto Pisani a insistir na oportunidade de um procedimento sumárionão cautelar,18 o que, segundo Denti, superaria “o equívoco que vicia a atual aplicação doart. 700, submetido a exigências de tutela que não têm a característica dainstrumentalidade, própria das medidas cautelares”.19

Como está claro, a doutrina italiana reconheceu que a técnica cautelar passou a serutilizada de modo distorcido em razão das necessidades concretas que irradiaram dasnovas situações de direito substancial.20 No Brasil, a ação cautelar inominada também foiutilizada para dar tutela aos direitos da personalidade, acabando por assumir aconfiguração de ação autônoma e satisfativa. Assim, por exemplo, foi usada para impedirviolação do direito à honra e do direito à imagem. Nestes casos, como se desejava apenasimpedir a violação, e não qualquer outra espécie de tutela – como a ressarcitória –, oprocedimento cautelar era suficiente para prestar a única tutela desejada pelo autor oupara satisfazera sua pretensão à tutela jurisdicional do direito. Note-se que a tutela emquestão era satisfativa sumária. A tutela, por impedir a violação, satisfazia a necessidadede tutela jurisdicional, uma vez que o autor não queria nada além de inibição da práticado ilícito.

Portanto, não foi a tutela cautelar que se transformou em tutela inibitória ousatisfativa. O procedimento instituído para a viabilidade da obtenção da tutela cautelar,por admitir liminar e a utilização de meios de execução adequados, é que foi utilizadopara permitir o alcance da tutela satisfativa. Contudo, como a sentença do procedimentoque seria cautelar, quando era de procedência, prestava a tutela inibitória, e assimsatisfazia a pretensão à tutela jurisdicional do direito, o procedimento que, a princípio,deveria ser seguido pelo procedimento de conhecimento, passou a ter configuraçãoautônoma, fazendo surgir a falsa ideia de “ação cautelar satisfativa”. Frise-se que a açãodeixou de ser cautelar para atender à necessidade de tutela inibitória, passando a sersatisfativa exatamente porque a tutela inibitória, ao contrário da cautelar, não é marcadapela instrumentalidade. Assim, esta “ação cautelar satisfativa” era, na realidade, uma açãode conhecimento.

Por outro lado, a tutela que remove os efeitos concretos do ilícito impede, por meraconsequência, a produção de danos. Ou seja, a busca e apreensão dos produtos, porexemplo, coloca os consumidores a salvo de eventuais danos. Como a doutrina brasileirajamais fez a distinção entre ilícito e dano, ou soube demonstrar a importância de se ter emconta unicamente o ato contrário ao direito para a adequada tutela civil dos direitos, a

prática forense foi obrigada a encontrar na tutela cautelar, vista como tutela contra aprobabilidade do dano, um meio de garantir a tutela das situações substanciais protegidaspor normas violadas.

Contudo, não é porque a doutrina e a prática forense olharam para o ilícito já ocorridopensando na probabilidade do dano, que se poderá admitir que a “ação cautelar”, ao terpassado a servir para remover o ilícito, realmente tenha dado outra configuração à “tutelacautelar”. Em face da indistinção entre ato contrário ao direito e dano, ocorreu a distorçãodo uso da técnica cautelar para permitir o alcance da tutela de remoção do ilícito, ou seja,da tutela satisfativa do direito material. Não obstante, nesta última hipótese a distorçãonão foi simplesmente procedimental ou de técnica processual. A tutela de remoção sedestina a remover os efeitos concretos de um ilícito já praticado e não a proteger contra aprobabilidade do dano. Porém, imaginou-se que a tutela de remoção seria voltada contra aprobabilidade de dano. Ou seja, a própria tutela de remoção foi desconfigurada para, apartir desta transformação, admitir-se o emprego do procedimento cautelar.

Do mesmo modo que o procedimento da tutela inibitória assumiu característicaautônoma, o procedimento que passou a servir para a prestação da tutela de remoçãoigualmente dispensou a chamada “ação principal”. A necessidade de tutela de remoção –assim como de tutela inibitória – levaram à utilização e à distorção da técnica processualidealizada para a tutela cautelar. As tutelas inibitória e de remoção, por serem satisfativas,não são instrumentais como a tutela cautelar, o que, por mera consequência lógica, fezcom que o procedimento dotado de liminar e meios executivos idôneos adquirisseautonomia, dispensando o procedimento de conhecimento, o qual apenas teria sentidocaso houvesse necessidade de outra tutela jurisdicional do direito, que então seriaassegurada pela tutela cautelar.

Além do mais, é preciso advertir que a necessidade da obtenção da tutela do direito demodo mais célere também levou à utilização da técnica cautelar como meio desumarização do próprio processo de conhecimento.21 É importante destacar interessanteacórdão do Tribunal Superior do Trabalho que, julgando recurso ordinário em mandadode segurança, manteve decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região que haviadenegado mandado de segurança que objetivava cassar liminar – deferida inaudita alteraparte em ação cautelar inominada – para reintegrar dirigente sindical nas suas funções. OTribunal Superior do Trabalho, na ocasião, assim argumentou: “É bem verdade que odeferimento de liminar, assegurando a satisfação do direito material pleiteado, como, nocaso, a reintegração, não se coadunaria com a natureza instrumental e provisória doprocesso cautelar. Entretanto, essa natureza jurídica da ação cautelar não pode subsistirem face do provimento de maior envergadura previsto na Constituição Federal, normahierarquicamente superior. Com efeito, a dispensa de empregado, portador deestabilidade provisória, sem o competente inquérito administrativo faz letra morta agarantia constitucional ínsita no art. 8.º, inciso VIII, da Lei Maior e, em se tratando dedirigente sindical, impede, ainda, que o trabalhador exerça as funções para as quais foieleito, beneficiando a empresa em detrimento de toda uma categoria profissional. O MM.Juiz da JCJ de Ponta Grossa, ao constatar que o empregado juntou documentaçãocomprobatória de representação sindical, deferiu a liminar, adotando o entendimento deque ‘é preferível rejeitar-se uma teoria (rectius: uma tutela) que não atende à realidadesocial, principalmente no caso concreto, onde a suspensão dos salários implica empossível supressão dos meios de sobrevivência e a posterior reintegração implicariapagamento de salário sem a prestação laboral’. Conceder, pois, a segurança impetradapela empregadora, cassando a liminar e, consequentemente, anulando a reintegraçãoefetivada, significaria premiar a empregadora, que, desrespeitando norma constitucional,foi a única causadora de toda a situação. Assim, frente à hierarquia da imperatividadeínsita no dispositivo da Carta Magna, que foi friamente desrespeitado pela ora impetrante,

deve ser mantido o empregado no exercício pleno de suas funções, até que aempregadora, se porventura sair vencedora do competente inquérito, possa despedirlegalmente o dirigente sindical.”22

Esse julgado deixa evidenciada a deformação da técnica cautelar e, mais do que isto, aprópria necessidade desta transformação em nome da efetividade da tutela dos direitos.23

Realmente, as necessidades de direito substancial impuseram a distorção da técnicacautelar para a obtenção da tutela satisfativa de modo antecipado.24 Mas não há comopensar que a prestação da tutela antecipada sob o manto protetor da técnica cautelarconstituiu um abuso, uma vez que tal forma de tutela se mostrou imprescindível à efetivaproteção do direito material e, assim, legítima à luz do direito fundamental de ação.

1.4. A superação da regra da nulla esecutio sine titulo e o escopo de tutela dosdireitos

Como visto, as novas necessidades de tutela levaram à distorção da tutela cautelar e,mais do que isso, à ruptura da regra que proibia que a execução antecedesse a cognição.

Na teoria do processo civil liberal, a tutela jurisdicional era basicamente de declaração.A declaração, que apenas podia ocorrer depois do exaurimento da cognição, é que podiadar atuação à lei. Porém, no momento histórico em que outras situações de direitosubstancial passaram a exigir tutela do direito com base em verossimilhança, torna-seclara a ideia de que a função da jurisdição, longe de ser a de dar mera atuação à lei, é a deoutorgar tutela aos direitos, inclusive aos direitos fundamentais. Se o Estado passa a terdever de tutelar os direitos fundamentais, a jurisdição, além de ter que dar atuação àsnormas que lhes dão proteção e de suprir a omissão de proteção legislativa a estesdireitos, obviamente passa a ter que outorgar tutela jurisdicional efetiva (art. 5o, XXXV, CF)e tempestiva (art. 5o, LXXVIII, CF) a todo e qualquer direito.

Portanto, certamente deixou de existir razão para afirmar que a decisão deverossimilhança não pode atuar a vontade da lei. A jurisdição, no Estado contemporâneo,exerce função de grande importância quando, com base em verossimilhança ou medianteliminar, inibe imediatamente a violação de normas de proteção a direitos fundamentais,como o direito do consumidor e o direito ao meio ambiente. Há nestes casos prestaçãoindiscutível de tutela inibitória aos direitos, função primeira do processo civil do Estadoconstitucional. Há aí, sem qualquer dúvida, tutela jurisdicional dos direitos medianteverossimilhança e execução. A declaração deixa de ser imprescindível à funçãojurisdicional, que, ao contrário, passa a ser cada vez mais execução.25

É que a função de outorgar tutela aos direitos requer execução, pouco importando acognição que lhe dá suporte ou o momento em que a decisão é proferida no processo deconhecimento. Não é por outra razão, aliás, que o próprio conceito de título executivojudicial passou a ter relação com a realizabilidade do direito e não com a sua certeza.

É preciso fixar os pontos: i) atualmente, a jurisdição tem função de tutela dos direitos;ii) a tutela dos direitos não pode suportar o tempo para o exaurimento da cognição; iii) adeclaração deixou de ser pressuposto para a tutela do direito; iv) a tutela do direito, pordepender de realizabilidade prática, tornou a jurisdição mais execução do que declaração.Assim, não há mais qualquer razão teórica para relacionar tutela jurisdicional comdeclaração e coisa julgada material, nem para entender que estas últimas são pressupostospara a execução.

A tutela jurisdicional dos direitos, atualmente, depende tanto de declaração quanto dejuízo de verossimilhança e, mais do que nunca, de execução. Nesta dimensão, torna-se

importante recordar o que disse Vittorio Denti, sabidamente um dos maiores pensadoresdo processo civil contemporâneo: “Talvez a propensão, acentuada nos últimos anos, arepensar a função jurisdicional em termos de ‘tutela dos direitos’, mais do que em umquadro meramente processual, possa enriquecer com novas perspectivas a nossa pesquisae conferir uma colocação adequada às exigências de tutelas que emergem com odesenvolver da sociedade contemporânea”.26 Significa dizer que, quando se tem em contaa “tutela dos direitos”, não importa raciocinar com base nos critérios da declaração ou dacoisa julgada material – isto é, “em um quadro meramente processual” –, até porquedeixou de valer a regra da nulla executio sine titulo. A exigência de formas diferenciadasde tutelas dos direitos, ou seja, a necessidade de se admitir tutela inibitória, de remoção doilícito, do adimplemento ou ressarcitória com base em probabilidade, é que deixaabsolutamente clara a distinção entre tutela antecipada – tutela sumária satisfativa – etutela cautelar, conferindo “uma colocação adequada” às novas exigências de tutela.

1.5. O motivo da introdução da tutela antecipada no Código de 1973

Não obstante a rebelião da prática em relação à inefetividade do processo civil, antes dainstituição da tutela antecipada (em 1994) no Código de Processo Civil de 1973 havia granderesistência dos tribunais e da doutrina à admissão de tutela satisfativa do direito mediante oemprego da técnica cautelar. Anote-se, por exemplo, o que dizia Humberto TheodoroJúnior: “Por outro lado, como bem adverte Lopes da Costa, ‘a medida cautelar não devetranspor os limites que definem a sua natureza provisória’. Seu fito é apenas garantir autilidade e eficácia da futura prestação jurisdicional satisfativa. Não pode, nem deve, amedida cautelar antecipar a decisão sobre o direito material, pois não é de sua naturezaautorizar uma espécie de execução provisória”.27 Os tribunais, seguindo esta mesmadireção, afirmavam: “Não deve ser concedida a medida cautelar inominada em que oautor pretende lhe sejam franqueadas as dependências de um clube para realização defesta de casamento, em virtude do teor satisfativo de tal pedido, sendo que a sua concessãoimplicaria a perda do objeto da ação principal”.28

Ainda que a técnica cautelar tenha sido utilizada para permitir o alcance da tutelasatisfativa sob cognição sumária – ou da tutela antecipada –, importa ter claro que isto nãoera aceito pelos tribunais e pela doutrina, que não admitiam o uso da técnica cautelar para ofim de satisfação do direito, ainda que tal modo de proceder fosse indispensável à realizaçãodo direito fundamental de ação.

Bem por isso, a necessidade de tutela antecipada para a efetiva tutela dos direitos levouo legislador a inserir nova norma (art. 273) no Código de Processo Civil de 1973. Estanorma, introduzida no código em 1994, abriu oportunidade para o requerimento de tutelaantecipada em caso de perigo de dano29 diante de qualquer espécie de situação materiallitigiosa.

Isso significa que, para a adequada e honesta compreensão da teoria da tutelaantecipada, é imprescindível ter muito claro que a introdução da tutela antecipada nocódigo de 1973 foi necessária não apenas em razão das novas situações de direito materialque se mostraram carentes de tutela satisfativa sumária, mas principalmente porque ostribunais e a doutrina não admitiam a prestação de tutela sumária satisfativa – de tutelaantecipada – com base na técnica cautelar.

1.6. As razões de Calamandrei e o apego irrefletido da doutrina

Não haveria motivo para discutir aqui a doutrina de Calamandrei sobre tutela cautelar.Trata-se de doutrina consolidada nas primeiras décadas do século passado em situaçãopolítica particular. O que realmente aqui importa é deixar claro algo que costuma ser

encoberto pela teimosia das pessoas que discutem sobre o direito. Há quem imagine queuma doutrina deve ser discutida a partir dos critérios do falso ou do errado, como sepudesse existir uma teoria certa ou verdadeira. Uma doutrina se submete ao critério dooportuno, na medida em que sempre é elaborada diante de um sistema legal e de umasituação concreta em determinado tempo e espaço, dotada de especificidades sociais,culturais, religiosas e políticas. Na verdade, uma doutrina não apenas só pode ser vistacomo “oportuna”; a doutrina só pode ser assim pensada quando o intérprete ou o juristaconsidera os valores que a inspiraram diante dos valores da época em que se pretende vê-la aplicada. O intérprete não pode abdicar desta análise se não quer perder tempo ou falarno vácuo, sem trazer nada de útil à realidade em que vive. Sucede que muitos, ainda quesem perceber, valem-se das doutrinas como abstrações teóricas – despidas de contato coma realidade – para sustentar suas teses. É quando a doutrina é usada como argumento deautoridade e não para viabilizar uma elaboração teórica contextualizada. Nesses casos adoutrina é utilizada para falsear a realidade, ou melhor, para conferir a algumaproposição a ser elucidada pelo teórico a qualidade de correta, como se a circunstância deum conceito ter sido formulado por alguém de grande prestígio o credenciasse a“verdadeiro” para a eternidade, sem com que os mortais do porvir pudessem discuti-lo,não obstante vivendo em uma época sequer imaginável àquele que o elaborou. De modoque é absolutamente primário o argumento que toma a doutrina de Calamandrei comojustificativa da unificação das tutelas cautelar e antecipada no cenário do direitobrasileiro.

A doutrina de Calamandrei é perfeita à Itália de quase cem anos atrás. Obviamente nãocabe questioná-la como (in)correta para o Brasil dos nossos dias. Cabe, isto sim, verificar asua oportunidade para o direito processual brasileiro de hoje. Portanto, é preciso lembrarque Calamandrei escreveu sob a influência de uma cultura jurídico-processual querejeitava a possibilidade de execução anterior à declaração e num contexto político emque se tinha consciência da necessidade de tutela célere dos direitos contra o periculum inmora.

Em sua Introduzione allo Studio Sistematico dei Provvedimenti Cautelari, Calamandreifoi formalmente fiel à regra da nulla executio sine titulo. Não obstante, ao classificar osprovvedimenti cautelari, falou em a) provvedimenti istruttori anticipati, b) provvedimentivolti ad assicurare la esecuzione forzata, c) anticipazione di provvedimenti decisori – aísituando a esecuzione provvisoria – e em d) cauzioni processuali. O que confere notadistintiva à obra de Calamandrei é a classificação da anticipazione di provvedimentidecisori no gênero dos provvedimenti cautelari.30

Calamandrei confessa que a relação de instrumentalidade, no caso de anticipazione diprovvedimenti decisori, é profundamente diversa daquela que se tem na hipótese deprovvedimenti volti ad assicurare la esecuzione forzata, chegando a admitir que, no caso deexecução provisória contra o periculum in mora, a função cautelar pode configurar-se “indue diversi modi”: em alguns casos, o dano que se trata de evitar é o que deriva da demorana satisfação do direito, de modo que, funcionando como meio para acelerar estasatisfação mediante a imediata execução forçada, a execução provisória tem lugartipicamente no grupo da anticipazione di provvedimenti decisori (gruppo c); outras vezes, odano que se almeja evitar é o que pode derivar da fuga ou dispersão dos bens do devedor,enquanto pende o juízo de apelação; e, em tal caso, funcionando como mezzo perassicurare (non per accelerare) a execução forçada futura, a execução provisória se colocaentre os provvedimenti volti ad assicurare la esecuzione forzata (gruppo b).31

Como é óbvio, Calamandrei não enxergou na decisão antecipada a função de tutela dodireito material; limitou-se a afirmar a existência de uma “decisione anticipata eprovvisoria del merito, destinata a durare fino a che a questo regolamento provvisorio del

rapporto controverso non si sovrapporrà il regolamento stabilmente conseguibileattraverso il più lento processo ordinario”.32 Sublinhe-se que Calamandrei não poderia,nem se quisesse, estar atento à necessidade de individualização das tutelas dos direitosque podem ser prestadas mediante cognição sumária, uma vez que a sua época é anteriora do Estado cujo escopo é tutelar os direitos. Aliás, a elaboração dogmática da época deCalamandrei era servil à ideia de que o processo deve ficar distante das tintas do direitosubstancial, de modo que os provimentos de cognição sumária certamente não podiam serclassificados a partir de indicativos de tutela do direito material, mas apenas de acordocom critérios processuais, como o da provisoriedade do provimento.

Calamandrei, ciente da necessidade de tutela célere contra o periculum in mora, foiobrigado a admitir a antecipação da tutela como cautelar, na medida em que não tinhaoutra base de direito para justificar a concessão de tal forma de tutela. Uma tutela decognição sumária contra o perigo que não fosse cautelar, além de destituída de amparolegal, seria vista como tutela executiva, o que certamente representaria um atentado contraa regra da nulla executio sine titulo. Significa que a construção de Calamandrei, aomisturar tutela cautelar e tutela satisfativa sumária, merece elogios do ponto de vista dacontribuição para a efetividade do processo do seu tempo. Como todo e qualquer jurista,Calamandrei trabalhou com as possibilidades teóricas que tinha em mãos.

Hoje, no entanto, o processualista vive à luz do Estado constitucional, cujo dever é dartutela aos direitos fundamentais e, por consequência, desincumbir-se da sua missão deprestar tutela jurisdicional efetiva e tempestiva a todos os direitos. Significa que oprocesso está submetido à ideia de tutela dos direitos. Ademais, ao contrário da legislaçãoprocessual à luz da qual Calamandrei escreveu, o Código de Processo Civil brasileiro ébastante claro no sentido de que o juiz pode e deve, quando presentes os pressupostospara tanto, conceder tutela do direito com base em cognição sumária – seja comfundamento em perigo de dano, seja com fundamento na evidência do direito e nainconsistência da defesa. Não fosse isso, atualmente ninguém mais precisa escamotear oufalsear suas elaborações para fingir estar respeitando a regra da nulla executio sine titulo.Essa regra, bem como os valores que a inspiraram, não mais valem em termos de teoria doprocesso civil. A teoria do processo civil, em verdade, não pode deixar de encontrar lugarpara o tema da tutela dos direitos e, assim, não pode fingir não ver que a tutela do direito – enão apenas a tutela cautelar – pode ser prestada com base em probabilidade.

1.7. A definição legislativa de tutela cautelar – art. 301, CPC

O código, ao tratar da tutela de urgência, distingue em vários lugares tutela cautelar etutela antecipada. No § 3o do art. 300 se encontra a afirmação de que a “tutela de urgênciade natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dosefeitos da decisão”. Embora essa norma não tenha qualquer sentido, na medida em que airreversibilidade é resultado logicamente possível de toda e qualquer tutela do provável,serve ela para evidenciar que o legislador resolveu prever o óbice da irreversibilidadeapenas a uma das formas de tutela de urgência – à tutela antecipada. Mais à frente,confere-se procedimentos distintos às tutelas cautelar e antecipada requeridas na formaantecedente e admite-se a estabilização apenas da tutela antecipada (art. 304, CPC).

Relevante para o efeito de demonstrar a distinção entre tutela cautelar e tutelaantecipada, inclusive na concepção do código, é o art. 301. Essa norma, mediante o meiomais didático para demonstrar a distinção entre formas de tutela, alude a exemplos bemclaros de tutela de segurança. Diz o art. 301 que “a tutela de urgência de natureza cautelarpode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protestocontra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito”.Esses exemplos constituem genuínas tutelas de segurança da tutela principal, ou melhor,

da tutela do direito.

O art. 301 demonstra que a tutela cautelar se destina a assegurar a efetividade da tutelasatisfativa do direito material. Por esta razão, é caracterizada pela instrumentalidade epela referibilidade. A tutela cautelar é instrumento da tutela satisfativa, na medida emque objetiva assegurar a sua frutuosidade. Além disto, a tutela cautelar sempre se refere auma tutela satisfativa do direito, que desde logo pode ser exigida ou que, dependendo doacontecimento de certas circunstâncias, poderá ser exigida.

Note-se que o art. 301 fala expressamente em “asseguração do direito”. O artigo 301exemplifica hipóteses de tutela cautelar, deixando claro que estas devem ser idôneas paraa “asseguração do direito”. Refere-se ao arresto, sequestro, arrolamento de bens e registrode protesto contra alienação de bens, todas elas indiscutivelmente voltadas a assegurar oalcance da tutela efetiva do direito.

Como se vê, o Código de Processo Civil delineou a tutela cautelar diante da tutelaantecipada. Portanto, o artigo 301 é norma de enorme importância dentro do cenário datutela provisória, na medida em que define questão que há muito atormenta a doutrina eos tribunais. Agora não há mais dúvida que tutela cautelar não tem o mesmo significadode tutela antecipada. Segundo a própria lei processual, a tutela cautelar não realiza ousatisfaz o direito por antecipação; a sua função é assegurar o direito ou a tutela efetiva dodireito material.

1.8. A zona de penumbra no Código de 1973

Lembre-se que a tutela de urgência é gênero, do qual são espécies a tutela cautelar e atutela antecipada. A tutela antecipada é antecipação stricto sensu da tutela perseguida noprocesso de conhecimento, mas também foi admitida, no código de 1973, como tutela dodireito que depende da declaração ou da (des)constituição. Lembre-se, por exemplo, dahipótese em que se proíbe a alienação de um imóvel até a resolução do pedido dedesconstituição de deliberação assemblear. Nesse último caso, por não haver meradesconstituição baseada em probabilidade, inexistia propriamente tutela antecipada.

Note-se, contudo, que este desvio de rota ocorreu em razão de que, muito embora o art.273 tenha admitido requerimento de tutela antecipada no processo de conhecimento, atutela cautelar só podia ser postulada mediante ação cautelar. Como o legislador deixou delado a tutela cautelar, a doutrina e os tribunais, submetidos ao direito fundamental àtutela jurisdicional efetiva, deram interpretação extensiva ao conceito de tutelaantecipada, concluindo que seria possível postular, na qualidade de tutela antecipada,uma prestação que depende da declaração ou da constituição. Caso a interpretação fosseoutra, não seria possível requerer tutela de urgência com tal configuração nas açõesdeclaratória e constitutiva – a menos que se estivesse pensando em antecipação daconstituição ou da declaração. A tutela só poderia ser postulada mediante ação cautelarou, mais claramente, só existiria tutela antecipada nas ações cujas sentenças dependem deexecução.

Vale dizer que a opção por um conceito amplo de tutela antecipada – não restrito àantecipação da tutela do direito prestada mediante sentença condenatória, mandamentale executiva – é uma mera decorrência da necessidade de se interpretar as regrasprocessuais em conformidade com o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.Isso porque não se pode ignorar que, considerando-se as ações declaratória e constitutiva,só há real antecipação de tutela quando se admite a suficiência da declaração ou daconstituição com base em cognição sumária, ou seja, a declaração ou a constituiçãoprovisória.

1.9. O significado de tutela cautelar e de tutela antecipada no código de 2015

A tutela antecipada, porém, é satisfativa do direito material, permitindo a suarealização – e não a sua segurança – mediante cognição sumária. Na verdade, a tutelaantecipada tem a mesma substância da tutela final, com a única diferença de que élastreada em verossimilhança e, por isto, não fica acobertada pela imutabilidade inerenteà coisa julgada material. A tutela antecipada é a tutela final, antecipada com base emcognição sumária.

Desse modo, a tutela antecipada não é instrumento de outra tutela ou faz referência aoutra tutela. A tutela antecipada satisfaz o autor, dando-lhe o que almejou ao propor aação. O autor não quer outra tutela além daquela obtida antecipadamente, diversamentedo que sucede quando pede tutela cautelar, sempre predestinada a assegurar umasituação dependente da tutela final ou a própria efetividade da tutela jurisdicional dodireito. A tutela antecipada também não aponta para uma situação substancial diversadaquela tutelada, ao contrário da tutela cautelar, que necessariamente faz referência auma situação tutelável ou a uma outra tutela do direito material.

O código de 2015 admite tanto o requerimento de tutela antecipada quanto orequerimento de tutela cautelar no curso do processo de conhecimento, atribuindo-lhes acaracterística de tutela urgente. Assim, não há mais qualquer motivo para, em nome dodireito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, dar ao conceito de tutela antecipada amesma abrangência que lhe era dado à luz do código de 1973, quando se atribuía naturezaantecipada à tutela urgente que ordena sob pena de multa em face dos pedidosdeclaratório e constitutivo.

Diante do código de 2015 é necessário colocar a tutela antecipada em seu devido trilho.Há tutela antecipada apenas quando a tutela final é prestada antecipadamente. Oumelhor, a tutela antecipada é, em substância, a tutela final prestada mediante a técnica daantecipação. Bem por isso não há tutela antecipada quando se pede tutela urgente paraobstar o demandado a fazer algo que não poderia ser feito se já houvesse declaração ou(des)constituição. Frise-se que é possível antecipar, por exemplo, tutela inibitória, mas aordem que ordena o demandado a não praticar um ato que não poderia ser praticado seuma deliberação social já houvesse sido desconstituída não é antecipação dadesconstituição.

Embora a tutela antecipada seja clara quando a sentença final é dependente deexecução, isso não quer dizer que não seja possível, certamente em situaçõesexcepcionais, a antecipação da tutela constitutiva. Lembre-se da fixação provisória doaluguel na ação de revisão do valor da locação. Nesse caso, a tutela antecipada produzefeitos que operam no plano do direito substancial, estabelecendo nova situação jurídica,e além disso é possível propor ação de despejo em caso de não pagamento do valor fixadoprovisoriamente.

É importante perceber que uma clara distinção teórica entre as tutelas antecipada ecautelar hoje é algo insuprimível, na medida em que o Código de 2015 não apenasdistinguiu em norma (art. 301, CPC) as duas formas de tutela jurisdicional, como aindaatribuiu a cada uma delas consequências muito distintas. Lembre-se, por exemplo, queapenas a tutela antecipada pode estabilizar.

Quando se tem claro que a segurança jurídica é indispensável ao Estado de Direito, adoutrina não pode deixar de precisar os conceitos para evitar decisões desiguais parahipóteses iguais. Na verdade, é dever da doutrina processual colaborar para evitardivergências interpretativas, uma vez que a sua função é, acima de tudo, a de propiciar oadequado e uniforme funcionamento do sistema de distribuição de justiça.

2. Perfil da tutela cautelar

2.1. Conceito

A doutrina clássica afirma que a tutela cautelar se destina a dar efetividade àjurisdição e ao processo.33 A ideia de que a tutela cautelar objetiva garantir a efetividadeda jurisdição é, de certa forma, consequência do conceito que vê na jurisdição apenas afunção de dar atuação à vontade da lei.

Ao afirmar que o fim da jurisdição é atuar a vontade da lei34 e não dar tutela ao direitomaterial, a doutrina do final do século XIX e início do século XX pretendeu ficardefinitivamente distante da teoria que confundiu o direito de ação com o direitomaterial.35 De modo que a necessidade de estabelecer a autonomia do direito processual ea finalidade pública do processo conduziu ao abandono da ideia de que a jurisdição dariatutela aos direitos.36

Ora, se a função da jurisdição era atuar a vontade da lei, a tutela que se mostrassenecessária para garantir a efetividade da função jurisdicional obviamente não poderia serconcebida como tutela do direito ou como tutela a serviço da tutela do direito, mas apenascomo tutela voltada a garantir a efetividade da atuação da vontade da lei.

Pretende-se, com isto, demonstrar que a noção clássica de tutela cautelar é tributáriado próprio conceito de jurisdição da sua época. Se o escopo de tutela dos direitos éesquecido quando se diz que a jurisdição deve apenas atuar a vontade da lei, é evidenteque a doutrina não pode concluir que a função cautelar almeja a tutela de um direito, mastem que necessariamente admitir – para ser coerente com as suas bases ideológicas ejurídicas – que a tutela cautelar tem como razão de ser apenas a função de atuar oordenamento jurídico.

Contrapondo-se à teoria clássica – que, repita-se, não relacionava a função jurisdicionalcom a tutela do direito material –, surgiu a teoria que atribuiu à função cautelar aproteção de um direito aparente submetido a perigo de dano iminente. Nesta direção, atutela cautelar não protege o processo, mas sim o direito. Ovídio Baptista da Silvaconseguiu demonstrar a superioridade desta teoria ao evidenciar que a tutela marcadapela característica da “provisoriedade” – qualidade que advém da sumariedade dacognição e significa a contradição da “definitividade” da tutela prestada ao final doprocesso – nem sempre é uma tutela cautelar.37 O que define a cautelaridade não é aprovisoriedade ou a circunstância de a tutela ser concedida no curso do processo deconhecimento, mas sim a sua função diante do direito material. A tutela que satisfaz odireito material, ainda que no curso do processo – tutela antecipada –, não pode serconfundida com a tutela cautelar, pois esta última não tem o escopo de realizar ousatisfazer o direito, mas apenas o de assegurá-lo.

No Estado contemporâneo, a função jurisdicional é uma consequência natural do deverestatal de proteger os direitos. Sem a jurisdição não seria possível garantir as formas detutela do direito material.38 Ademais, a ação atípica e abstrata apenas poderá constituirum direito capaz de dar efetividade ao direito material, deixando de ser uma meraproclamação retórica, caso permita ao autor a utilização das técnicas processuaisadequadas à obtenção das tutelas prometidas pelo direito material.39

A doutrina clássica entende que a tutela cautelar não é um direito da parte, mas simum direito do Estado, imprescindível para que a jurisdição garanta a seriedade e autilidade da sua função.40 Esta concepção, além de baseada numa visão autoritária deEstado, é fundada na ideia de que a parte apenas tem direito de obter tutela jurisdicional

ao final do processo. O equívoco é facilmente constatável não apenas porque nada impedea tutela do direito material no curso do processo, mas também porque, caso a tutelacautelar fosse direito do Estado, ela não teria sido entregue nas mãos do litigante.

A tutela cautelar é direito da parte, correlacionado com o próprio direito à tutela dodireito. Em razão deste direito, a jurisdição tem o dever de dar tutela cautelar à parte quetem o seu direito à tutela do direito submetido a perigo de dano. O titular do direito aoressarcimento, que vê o infrator se desfazer dos seus bens para futuramente não poder seralcançado pela execução, tem ameaçado o seu direito à tutela ressarcitória e, por isso, temdireito à tutela de segurança (cautelar) da tutela ressarcitória. Ora, da mesma forma quetem dever de prestar tutela ressarcitória, a jurisdição tem dever de conceder tutela queseja capaz de garantir a efetividade da tutela ressarcitória. Em outros termos, a jurisdiçãotem o dever de tutelar o direito provável – ameaçado por dano – à tutela do direito (p. ex.,tutela ressarcitória).

Note-se, ademais, que o direito à tutela cautelar não deriva do direito de ação. É certoque o direito de ação tem como corolário o direito às técnicas processuais idôneas àobtenção da efetiva tutela do direito material, decorrendo do direito de ação, por exemplo,o direito à técnica antecipatória – isto é, o direito à técnica capaz de permitir a antecipaçãoda tutela final – e o direito à técnica idônea a viabilizar a obtenção da tutela cautelar.Porém, aí se está aludindo às técnicas processuais derivadas do direito de ação e não àstutelas prometidas pelo direito material.

Há direito à técnica processual quando há, em abstrato, direito à tutela do direitomaterial. As técnicas processuais idôneas à obtenção da tutela inibitória, por exemplo,decorrem do fato de que o direito substancial promete tutela inibitória ou de que hádireito abstrato à tutela inibitória.

O mesmo raciocínio vale para a tutela cautelar. O direito de ação impõe o deverlegislativo de instituição de técnica processual capaz de permitir a obtenção de tutelacautelar exatamente porque há direito material à tutela cautelar.

O direito à tutela cautelar não advém do processo. A tutela cautelar não se destina agarantir a efetividade da ação e, por isto mesmo, não pode ser pensada como uma meratécnica processual necessária a lhe outorgar efetividade. O direito à tutela cautelar estásituado no plano do direito material, assim como o direito às tutelas inibitória eressarcitória. O titular do direito à tutela do direito – por exemplo, ressarcitória – tambémpossui direito à tutela de segurança (cautelar) do direito à tutela do direito.

De modo que, se a tutela cautelar é instrumento de algo, ela somente pode serinstrumento para assegurar a viabilidade da obtenção da tutela do direito ou paraassegurar uma situação jurídica tutelável, conforme o caso. Aliás, caso a tutela cautelarfosse considerada instrumento do processo, ela somente poderia ser instrumento doprocesso que, ao final, concede a tutela do direito material. Isto, na verdade, écompreensível, pois o elaborador da teoria da instrumentalidade ao quadrado da tutelacautelar, isto é, da teoria segundo a qual a tutela cautelar é instrumento do processo – quejá teria a natureza de instrumento do direito material –, é um dos mais célebres defensoresda teoria concreta do direito de ação.41 Ora, quem entende que a ação depende da tutela dodireito material pode confundir, com facilidade, tutela destinada a assegurar a tutela dodireito material com tutela do processo.

Deixe-se claro, porém, que, além de não ser possível aceitar a teoria que enxerga nafunção cautelar a tutela do processo, é preciso frisar que a tutela cautelar não se destina ainibir o ilícito (tutela inibitória) e a remover os efeitos concretos do ilícito (tutela deremoção do ilícito) e, portanto, não constitui uma genuína tutela preventiva. A tutela

cautelar assegura a tutela de um direito violado ou, em outro caso, assegura uma situaçãojurídica tutelável, ou seja, uma situação jurídica a ser tutelada mediante a sentença do“pedido principal”.

2.2. Tutela assecuratória da tutela do direito material ou da situação jurídicatutelável

Como está claro, cautelar é a tutela assecuratória da tutela prometida pelo direitomaterial e da situação a que o direito material confere tutela jurídica. Tal tutela é umdireito da parte e um dever do Estado, não se fundando no direito de ação, mas sim nopróprio plano do direito material.

Se a tutela cautelar foi reconhecida como tutela a serviço do Estado háaproximadamente um século, não é possível esquecer que o Estado constitucional42 tem odever de tutelar os direitos fundamentais e, em razão do direito fundamental à tutelajurisdicional (art. 5.º, XXXV, CF), o dever de tutelar de forma efetiva todo e qualquerdireito. Assim, não há como deixar de enxergar na tutela cautelar um dever do Estado,imprescindível para se outorgar segurança às situações a que o Estado deve tutelajurídica, bem como para que a tutela do direito material possa ser prestada de formaefetiva.

A tutela cautelar não pode ser vista como dirigida a assegurar a utilidade do processo.Como é evidente, a única utilidade que o autor almeja quando vai a juízo é a tutela dodireito material. Assim, a tutela cautelar somente pode ser relacionada com a efetividadeda tutela do direito ou com a segurança da situação tutelável.

A doutrina clássica, ao supor a tutela cautelar como dirigida a assegurar a efetividadedo processo, frisou a ideia de que esta nasceria para morrer quando da prolação dasentença que decidisse o litígio, pondo fim ao processo. A falta de percepção de que a tutelacautelar se destina a assegurar uma tutela do direito, não sendo, portanto, uma simplesdecisão marcada pela cognição sumária, levou a doutrina a incidir no grave equívoco desubordinar o tempo de vida da tutela cautelar à sentença condenatória.

Ovídio Baptista da Silva, ao tomar em consideração este problema e ter presente que oarresto não pode desaparecer ou ser consumido pela sentença condenatória, utilizou estasituação para exemplificar o seu entendimento de que a tutela cautelar tem naturezatemporária e não provisória. Inicialmente, argumentou Ovídio: “Para a doutrina em geralque descende de Calamandrei a nota específica que define a cautelaridade é sua condiçãode tutela provisória. O pressuposto de que a tutela cautelar seja uma forma de proteçãoprovisória está intimamente ligado à premissa principal de que parte essa doutrina, que éa conceituação da tutela cautelar como instrumento de proteção do processo ou, comodizia Calamandrei, a tutela cautelar como instrumento do instrumento”.43 E, mais à frente,referindo-se especificamente ao arresto, concluiu: “A duração do arresto, por exemplo,não fica condicionada à emanação da sentença que venha a julgar procedente a açãocondenatória. Ao contrário, se a sentença acolher a pretensão do autor que obtivera oarresto essa medida será, a partir da sentença, mais justificada do que fora antes dojulgamento, pois entre o trânsito em julgado da sentença e a penhora que substituirá oarresto pode intercorrer um lapso de tempo considerável. Pense-se no caso de umasentença que necessite de prévia liquidação para ensejar o procedimento executivo comefetivação da penhora. O arresto, diversamente do que supõe a doutrina de Calamandrei,não antecipa absolutamente nada que a sentença condenatória poderia conter, comoeficácia que lhe seja peculiar. Nem se tornará dispensável uma vez proferida a sentençadefinitiva, pois o arresto, não havendo antecipado nenhum efeito que lhe seja inerente,não será substituído por essa sentença”.44 Ovídio pretende demonstrar, com o exemplo do

arresto, que a tutela cautelar não é provisória, mas sim temporária, devendo vincular-seapenas e tão somente à situação de perigo que ameaça o direito. Entretanto, Ovídio nãoalude a uma circunstância que é fundamental para a compreensão da tutela cautelar: a deque a tutela cautelar objetiva tutelar uma tutela do direito, como, por exemplo, a tutelaressarcitória.

Como é sabido, a sentença condenatória não é suficiente para prestar a tutelaressarcitória pelo equivalente.45 A sentença condenatória é apenas uma técnica quecontribui para a prestação da tutela do direito. A tutela pelo equivalente monetáriodepende da execução.46 Portanto, a tutela pelo equivalente jamais, em tempo algum, foiprestada pela sentença condenatória. É somente por este motivo, simples, mas nuncaidentificado pela doutrina, que o arresto não pode ser substituído pela condenação,devendo sobreviver até a execução e a consequente tutela do direito.

Aliás, é preciso frisar que a tutela cautelar apenas poderia ser substituída pelassentenças autossuficientes, ou seja, pelas sentenças declaratória e constitutiva, que,respectivamente, prestam as tutelas declaratória e constitutiva. As sentençascondenatória, mandamental e executiva, porque dependem da execução para que a tutelajurisdicional do direito seja prestada, jamais poderão substituir a tutela cautelar. Quer istodizer que a tutela cautelar não se destina a resguardar o processo que culmina nacondenação, mas a garantir a frutuosidade da tutela do direito material que depende dastécnicas condenatória e executiva.

Sublinhe-se que, neste caso, a cautelar tutela o direito à tutela do direito e nãosimplesmente o direito material ou a pretensão de direito material. Não o direito decrédito ou o poder de exigir o crédito, mas o direito à tutela do direito à prestaçãopecuniária. É claro que, ao se tutelar a tutela do direito à prestação pecuniária, tutela-se,ainda que por consequência, o direito de crédito e a pretensão de direito material. Porém,quem tem um direito de crédito que ainda não pode ser exigido, ou já tem o poder deexigi-lo, somente pode temer a impossibilidade de obter a tutela do crédito e, assim, deverequerer tutela cautelar para assegurar a efetividade da tutela jurisdicional do direito.

O direito, em sua dimensão estática ou como realidade normativa, obviamente nãointeressa a quem pensa em termos de tutela dos direitos. O direito é uma situaçãojuridicamente tutelada, assumindo relevância no instante em que é ameaçado de lesão oué violado. Quando o direito é violado e surge ao seu titular o direito à sua tutela, podeaparecer uma situação de perigo capaz de obstaculizar a sua efetividade. Nesse momento,para assegurar o exercício dinâmico do direito ou o modo pelo qual se realiza ou étutelado, ou seja, a tutela prometida ao direito em sua dimensão estática, deve serutilizada a tutela cautelar, que é a tutela de segurança da tutela jurisdicional do direito.

Há casos em que a ameaça não recai sobre a efetividade da tutela do direito, mas sobrea própria situação tutelável. A tutela cautelar, então, deixa de assegurar a efetividade datutela do direito para assegurar a situação tutelável.

Há certas tutelas que não dependem de um conteúdo desligado da decisãojurisdicional. São as tutelas declaratória e constitutiva, que se realizam com a meraprolação da sentença. As sentenças declaratória e constitutiva, que prestam as tutelas quetêm o mesmo nome, não dependem de execução, sendo ditas autossatisfativas. Taissentenças não exigem execução exatamente porque prestam tutelas que não têmconteúdos que devem ser buscados fora da decisão jurisdicional.

Isso quer dizer que as tutelas declaratória e constitutiva, enquanto realidadesnormativas ou, mais precisamente, exclusivamente dependentes da decisão jurisdicional,não são sensíveis ao perigo de dano. O que pode correr risco de dano é a situação jurídica

tutelável mediante a declaração e a constituição. Enquanto as tutelas declaratória econstitutiva não são prestadas, a situação para a qual a ordem jurídica garante tais tutelascertamente pode exigir tutela cautelar. Nesta hipótese, a tutela cautelar não estaráassegurando a efetividade da tutela do direito, mas a situação que se deseja tutelarmediante a sentença.

O perigo pode fazer surgir a necessidade de segurança da situação que se pretende verdeclarada ou constituída. Isso pode ocorrer tanto na ação declaratória positiva ounegativa, quanto na ação constitutiva positiva ou negativa.

De qualquer forma, há como reduzir estas duas “formas” da tutela cautelar – segurançada efetividade da tutela do direito e segurança da situação tutelável – a uma única faceta,uma vez que a cautelar, nas duas hipóteses, acaba dando segurança ao direito à tutela dodireito material.

Note-se que situação tutelável não é o mesmo que situação acionável – ou capaz de serafirmada mediante o exercício do direito de ação –, mas situação a que a ordem jurídicaoutorga tutela ou proteção. Fala-se aqui, portanto, de situação materialmente tutelável.Ora, tutela prometida pelo direito material e situação materialmente tutelável sãoaspectos de um mesmo fenômeno, que se expressa através do direito à tutela do direitomaterial. Melhor explicando: o direito à tutela do direito material pode ser negado nãoapenas por uma tutela do direito inefetiva ou incompleta, mas também por danosprovocados à parte enquanto a situação jurídica não é tutelada.

Por outro lado, é importante esclarecer que o titular de um direito ameaçado deviolação tem ao seu dispor a tutela inibitória e não a cautelar. A tutela do direitoameaçado de violação é a inibitória, cuja função é distinta da cautelar. A inibitória tutela odireito ameaçado, impedindo a sua violação, enquanto a cautelar assegura a tutelaprometida ao direito violado ou para a hipótese de sua violação ou assegura a situaçãojurídica tutelável mediante declaração ou constituição.

Ademais, além de a tutela cautelar não se confundir com a tutela inibitória(preventiva), nem toda tutela urgente é tutela cautelar. A tutela prestada no curso doprocesso, sob o signo da urgência, mas cuja substância é a mesma da tutela que se esperaobter ao final do processo, constitui tutela satisfativa sumária ou tutela antecipada e nãotutela dirigida a garantir a frutuosidade da tutela final ou apenas a assegurar a situaçãojurídica tutelável.

2.3. Não satisfatividade

Ovídio Baptista da Silva, referindo-se a lição de Cristofolini, advertiu que esteprocessualista italiano mostrou que as provisionais, ao anteciparem a eficácia doprovimento final de acolhimento da demanda, em verdade realizam plenamente o direitoposto em causa, ainda que sob forma provisória, ao passo que as medidas propriamentecautelares – enquanto tutela apenas de segurança – limitam-se a assegurar a possibilidadede realização para o caso de vir a sentença final a reconhecer a procedência da pretensãoassegurada.47 Esta lição é imprescindível para a compreensão da tutela cautelar. Casotodas as tutelas que se fundam em perigo e, por isto mesmo, são lastreadas em cogniçãosumária, pudessem ser definidas como cautelares, não haveria como diferenciar, naspalavras de Satta e Verde, o “provimento urgente” da “urgência do provimento”.48

A distinção entre “provvedimento urgente” e “urgenza di provvedimento” já havia sidorevelada, embora em outras palavras, por Pontes de Miranda. Pontes distinguiu, em seusComentários ao Código de Processo Civil de 1939,49 o arresto “segurança para execução”(cautelar) e o arresto “execução para segurança”. De acordo com o art. 830 do Código de

Processo Civil (2015), “se o oficial de justiça não encontrar o executado, arrestar-lhe-átantos bens quantos bastem para garantir a execução”. Este arresto é um ato da execução.Ele substitui a penhora, como ato integrante do procedimento destinado à satisfação dodireito, em razão de o oficial de justiça não ter encontrado o devedor – arresto-execuçãopara segurança. Esse arresto, como ato da própria execução, difere do arresto cautelar,que se dirige apenas a assegurar a execução ou a tutela do direito de crédito. A partir dadistinção entre o arresto cautelar e o arresto-execução para segurança, Pontes de Mirandaelaborou os conceitos de “segurança da execução” e “execução para segurança”, os quaispermitiram a Ovídio Baptista da Silva concluir que, “quando se antecipa execução,satisfaz-se por antecipação, atende-se, desde logo, a pretensão, o que significa mais do quedar-lhe simples proteção cautelar”.50

A não distinção entre tutela satisfativa de cognição sumária e tutela cautelar advém daregra da nulla executio sine titulo (não há execução sem título), que eliminava apossibilidade de a doutrina entender que a tutela que satisfaz o direito com base emcognição sumária – realizando-o concretamente no plano dos fatos – é execução para arealização do direito.

Calamandrei, tomando em consideração a regra da nulla executio sine titulo,51 afirmouque o “único critério seguro para distinguir a execução satisfativa da execução cautelar é ode determinar, em atenção à regra da nulla executio sine titulo, se os atos executivosprecedem ou seguem a declaração de certeza do direito a ser satisfeito; em todos os casosem que se vê que a execução precede à declaração há execução cautelar, que não sedistingue da satisfativa pela diversidade dos meios executivos (a execução cautelar consistesempre num exercício antecipado, total ou parcial, dos mesmos meios de que se serve aexecução satisfativa), mas unicamente em razão de que estes meios não são colocados emfuncionamento para satisfazer um direito já declarado (em via ordinária ou em viasumária), mas para satisfazer um direito que, por hipótese, supõe-se que pode chegar a serdeclarado em uma fase processual ulterior”.52

O critério que serve à conclusão de que a execução anterior à sentença é tutela cautelartambém permite supor que a execução provisória da sentença é tutela cautelar. Recorde-se que Carlo Furno, na sua monografia sobre a sospensione del processo esecutivo, incidiuem tal equívoco ao concluir que a suspensão do processo executivo e a execuçãoprovisória da sentença possuem natureza cautelar, sendo a primeira voltada a resguardaro devedor e a segunda, o credor.53 Porém, como bem soube demonstrar Adolfo PerezGordo, enquanto “a medida cautelar não pode ter uma extensão maior do que a de meragarantia ou de segurança de uma sentença hipotética e futura, a execução provisória, alémde permitir a invasão da esfera jurídica do executado, pode levar à própria satisfação doexequente”.54

Na realidade, quem atribui à tutela satisfativa prestada com base em cognição sumáriaa qualidade de cautelar não só é obrigado a também considerar cautelar a execuçãoprovisória da sentença, como ainda é forçado a admitir a cautelaridade da tutela daevidência (art. 311, CPC). Isto porque o que impede a doutrina de admitir a naturezaexecutiva da tutela satisfativa sumária é a cognição não definitiva – ou a provisoriedade –,e não o simples requisito do perigo. Pior seria, de fato, se fosse o perigo que estivesse adefinir o que é cautelar, pois nesta hipótese somente a execução provisória da sentençacontra o pericolo nel ritardo passaria a constituir tutela do tipo cautelar. Ora, já foidemonstrado que “o equívoco que se esconde nessa doutrina é tão primário que não evitaesta óbvia e insuperável contradição: legitima-se a execução provisória sempre quehouver necessidade de acelerar (antecipar) a tutela jurisdicional; se, no entanto, essaaceleração for demasiadamente intensa, então a execução provisória desaparece para darlugar à tutela cautelar, de tal modo que o mesmo princípio que fundara seu cabimento

passa a ser responsável pela sua extinção.”55

O legislador, ao estabelecer hipóteses específicas de execução provisória, tem porobjetivo permitir, em função de particulares situações de direito substancial, a aceleraçãoda satisfação do direito. Assim, quando se admite, em vista de “perigo de dano”, aantecipação da tutela final, é um grosso equívoco lógico imaginar que a tutela urgenteconstitui tutela cautelar. Como é evidente, não é porque a aceleração da satisfação dodireito decorre da existência de um “perigo de dano” que a tutela deixará de ser satisfativapara se transformar em cautelar.

Admitir a execução provisória contra o periculum in mora; limitá-la a algumassituações; admitir a execução provisória da sentença em todos os casos; restringir ou não aexecução da sentença na pendência do recurso à prática de apenas alguns atos executivos:tudo isto é uma questão de política legislativa. Lembre-se, aliás, que o art. 282 do Código deProcesso Civil italiano (que regula a execução provisória), desde a reforma de 90 do séculopassado admite que a sentença produza efeitos imediatamente e independentemente depericulum in mora.

Entretanto, se é possível executar a sentença objeto de recurso com base em periculum,não há diferença entre esta modalidade de execução e a tutela antecipada contra o perigode dano, que pode, inclusive, ser prestada após ter sido proferida a sentença de primeirograu. Como é óbvio, não é possível aceitar que a execução provisória contra o periculumperca a sua natureza de execução satisfativa, transformando-se em execução cautelar,simplesmente pelo fato de que é anterior ao trânsito em julgado da sentença.

A circunstância de a tutela ser fundada em perigo e baseada em cognição sumária nãoé suficiente para caracterizá-la como cautelar. Para se definir a natureza da tutelalastreada em cognição sumária e perigo é necessário investigar a sua função, que pode sersatisfativa ou de segurança. Apenas a última possui natureza cautelar; a primeira constituitutela antecipada. De modo que a “não satisfatividade” é outro requisito da tutelacautelar.

2.4. Instrumentalidade

A tutela cautelar é caracterizada pela instrumentalidade, mas em um sentido bastantediferente daquele que lhe foi atribuído pela doutrina clássica.56 A tutela cautelar não é uminstrumento do instrumento, ou seja, um instrumento do processo.

 A tutela cautelar é um instrumento vocacionado a dar segurança à tutela do direitoque se pretende ou que pode vir a ser ambicionada. Exemplificando: o arresto não éinstrumento do processo, mas instrumento destinado a garantir a frutuosidade da tutelaressarcitória pelo equivalente.57

Contudo, não é porque a tutela cautelar é instrumento da tutela do direito que nãopode existir situação em que, ainda que a tutela cautelar apareça como instrumento datutela do direito, a ação cautelar seja autônoma, como ocorre na hipótese de ação cautelarde caução de dano infecto. Nesse caso a ação é autônoma, ou melhor, não depende de açãoprincipal ou, na dicção do art. 808, de formulação do pedido principal nos mesmos autosem que deduzido o pedido de tutela cautelar. A tutela cautelar perseguida mediante a açãoobjetiva assegurar uma tutela de direito que ainda não pode ser exigida; a caução é pedidapara a hipótese de o direito vir a ser violado. Ora, se a tutela ressarcitória ainda não podeser exigida – já que ainda não existe violação ou dano –, mas há perigo de dano em relaçãoà tutela ressarcitória que eventualmente poderá ser exigida, a autonomia da ação cautelaré algo simplesmente lógico e incontestável.

Ademais, o fato de a tutela cautelar se destinar a dar segurança à efetividade da tutelado direito não significa que ela esteja vinculada ao reconhecimento do direito material aser tutelado. A segurança é prestada para a eventualidade do reconhecimento do direitomaterial e, desta forma, para garantir que, na hipótese de procedência do pedido, a tutelado direito seja útil e efetiva. Basta lembrar que a concessão da tutela cautelar requer aprobabilidade do direito à tutela final e, portanto, aceita naturalmente a possibilidade deformação de convicção ulterior diversa.

2.5. Referibilidade

A tutela cautelar sempre está referida a uma provável tutela já requerida ou quepoderá vir a ser solicitada. Por isto mesmo, como já demonstrado, a tutela cautelar é “nãosatisfativa”; destina-se apenas a assegurar a tutela jurisdicional do direito, não sendocapaz de prestá-la ou de satisfazer ou realizar o direito. Na tutela cautelar há semprereferibilidade a uma tutela ou situação substancial acautelada. Inexistindo referibilidade,não há direito acautelado, mas sim tutela satisfativa.

Kazuo Watanabe, em importante livro sobre a cognição no processo civil – escrito àépoca do código de 1973 –, elegeu a referibilidade para a determinação de quando a “açãoprincipal” deveria ser proposta quando obtida a tutela cautelar. No seu entendimento,quando não é possível ver “referibilidade” a direito acautelado, a tutela cautelar devedispensar a propositura de “ação principal”.58

Porém, mesmo nas raras hipóteses que dispensam a ação principal ou o “pedidoprincipal” (art. 308, CPC), como na caução de dano infecto, está presente a nota dareferibilidade. Ao contrário do que sustenta Watanabe, não há tutela cautelar que possadeixar de fazer referência a uma situação substancial tutelável. A circunstância de a tutelajurisdicional ainda não poder ser exigida, como acontece com a caução voltada a garantira tutela ressarcitória para a hipótese de ser praticado dano, não significa que a tutelacautelar, ao dispensar o pedido principal, deixe de fazer referência a uma situaçãocautelanda. Para ser mais claro: a ação do art. 305 deve necessariamente fazer referência auma tutela de direito ou situação cautelandas, embora possa, em situações excepcionais,dispensar a ação principal – dita “pedido principal” pelo art. 308 –, sem com que a tutelacautelar concedida perca eficácia.

De modo que a dispensabilidade do pedido principal, ao contrário do que se poderiapensar, não é uma consequência da ausência de referibilidade. Como também não é,conforme se viu no item antecedente, consequência da falta de instrumentalidade, uma vezque essa diz respeito à tutela do direito e não ao processo.

O conceito de referibilidade advém da ideia de ligação assecurativa da tutela cautelar àtutela do direito.59 Na ação ressarcitória, por exemplo, não há qualquer referibilidade aalguma situação acautelada ou, ainda, nenhuma referibilidade da tutela ressarcitória aoutra situação substancial. Não obstante, quando se concede o arresto como medidapreparatória ou incidente em relação à tutela ressarcitória, torna-se evidente a existênciada tutela cautelar que lhe dá segurança. A falta de referibilidade é evidência da existênciade satisfatividade e, assim, de ausência de cautelaridade.

2.6. Diferença entre cautelaridade e preventividade

A mais importante das tutelas jurisdicionais a serviço da integridade do direitomaterial – ditas tutelas específicas – é a tutela inibitória, destinada a proteger o direitocontra a possibilidade da sua violação. Para ser mais preciso, a tutela inibitória é voltada aimpedir a prática de ato contrário ao direito, assim como a sua repetição ou, ainda,continuação.60

Em outras palavras, a inibitória constitui a tutela do direito ameaçado de violação. Taltutela, como é óbvio, é preventiva. Entretanto, a tutela que inibe a agressão do direito ouprevine a sua violação nada tem a ver com tutela cautelar, não obstante a costumeiraconfusão entre esta última forma de tutela e a tutela inibitória.

Por muito tempo a doutrina não teve condições de perceber a distinção entre tutelacautelar e tutela preventiva, uma vez que, em virtude de uma visão distorcida daliberdade, não podia admitir que o juiz atuasse sobre a vontade de alguém que ainda nãotinha violado um direito ou infringido uma regra jurídica. O surgimento de situações dedireito substancial de conteúdo prevalentemente não patrimonial é que obrigaram apercepção da necessidade de tutela jurisdicional capaz de impedir a violação do direito elevaram à superação do dogma da intangibilidade da liberdade do demandado. Oproblema é que como a ação de conhecimento não continha técnicas processuaisadequadas a propiciar tutela inibitória – técnica antecipatória, bem como sentença emeios executivos capazes de constranger alguém a não fazer –, a prática forense assistiuao uso distorcido da ação cautelar, ou melhor, ao uso da ação cautelar como ação deconhecimento com função inibitória – dotada de liminar e sentença que ordenam um nãofazer sob pena de multa.

Perceba-se que a inibitória é a tutela do direito ameaçado de violação, assim como aressarcitória é a tutela do direito que sofreu dano. Da mesma forma que a ressarcitória é aúnica tutela contra o dano, a inibitória é a tutela exclusiva contra a ameaça de violação dodireito. Se a cautelar serve para assegurar a tutela do direito, para prevenir a violação dodireito não é adequada uma tutela de segurança, mas uma tutela – obviamente“autônoma” – capaz de inibir a prática de ato contrário ao direito. Toda tutela inibitória oudestinada a impedir a violação do direito não é tutela de segurança de uma outra tutela.Apenas a tutela de outra tutela, ou melhor, somente a tutela de segurança de outra tutela –por esta razão caracterizada pela instrumentalidade –, é uma tutela cautelar.

Deixando-se de lado as tutelas declaratória e constitutiva, a tutela cautelar supõe aameaça de dano à tutela repressiva, ou seja, a uma tutela posterior à violação. Adolfo diMajo, em profundo estudo sobre as tutelas dos direitos, deixa claro que a tutela cautelarnão foi idealizada para exercer função preventiva. Como diz o eminente civilista italiano,para requerer a tutela cautelar é necessário não só afirmar a violação do direito objeto datutela jurisdicional final, mas ainda demonstrar que esta violação poderá provocar umdano iminente no curso do processo.61

Realmente, a tutela cautelar não foi pensada para exercer função preventiva ou capazde impedir a violação do direito. O direito liberal clássico – a partir do qual o processocivil foi elaborado –, além de eminentemente patrimonialista, preocupava-se com a rígidadelimitação dos poderes de interferência do Estado na esfera jurídica dos particulares. Poresta razão, não houve delimitação de uma tutela genuinamente preventiva (inibitória) e assentenças e meios executivos não foram moldadas para propiciá-la. Ora, quando a tutelado processo de conhecimento não pode ser preventiva, a tutela que lhe é instrumental, porlógica, evidentemente também não pode. Na verdade, caso se atribuísse naturezapreventiva à tutela cautelar, estar-se-ia negando os valores que inspiraram o processo civilliberal e a própria proibição de a jurisdição exercer função preventiva.62

Para se demonstrar o equívoco da confusão entre cautelaridade e preventividade, éimportante tomar em conta o instituto da condenação para o futuro. A condenação para ofuturo é uma exceção à regra de que a condenação é condicionada à violação do direito.Cria antecipadamente o título executivo, mas pressupõe que a execução apenas seráimplementada em caso de violação ou inadimplemento.63

O art. 323 do Código de Processo Civil afirma que, “na ação que tiver por objetocumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídasno pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas nacondenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar depagá-las ou de consigná-las”.64 Isto significa que o credor pode obter uma condenação quediga respeito não só às prestações que se vencerem depois do ajuizamento da ação, ouseja, no curso do processo, mas também àquelas que vencerem posteriormente ao trânsitoem julgado da sentença condenatória. Neste caso, há um inadimplemento em ato e acondenação abarca as prestações futuras, em relação às quais ainda não há qualquerinadimplemento. Como agudamente percebeu Pontes de Miranda, “não precisa o autorvencedor no litígio intentar ação para haver a condenação no que se vai vencendo”. Oautor apenas necessita requerer a execução da sentença, que vai aparecendo comonecessária à medida que as prestações se vencem, até que se vença a última prestaçãovincenda. A condenação é quanto ao vencido e ao vincendo. A executabilidade é quedepende de que se vençam as prestações.65

Argumenta-se, em favor da condenação para o futuro, que é preciso evitar amultiplicação de ações para cobrar aquilo que é devido periodicamente e, ainda, que aconstituição antecipada do título executivo serve para evitar que a própria efetividade datutela jurisdicional seja frustrada em razão do longo espaço de tempo que, nageneralidade dos casos, está presente entre o momento do inadimplemento e o da real econcreta satisfação do direito.66

Chiovenda, ao tratar da condenação para o futuro, afirmou que suas principaisvantagens estariam: i) “na necessidade de prevenir o dano que decorreria da falta de umtítulo executório no momento em que a prestação será devida” e ii) “na conveniência deevitar processos reiterados para conseguir o que é devido periodicamente (quota dealuguel, de alimentos, de juros, de rendas), uma vez que haja razão para supor que essesprocessos se tornariam, de qualquer forma, necessários: como quando o devedor semostra moroso no pagamento de algumas quotas”.67

Chiovenda inseriu a condenação para o futuro entre os “processos preventivos”.68 Emum de seus mais importantes trabalhos, encontra-se a afirmação de que “uma prática queremonta à doutrina italiana medieval (in Mancini, Comm. II, n. 99 seg.; Weismann,Feststellungsklage, p. 99 seg.) admite os juízos preventivos, nos quais, por razões especiais,previne-se o dano que derivaria ou da inútil repetição de ações sucessivas, ou mesmo dafalta de um título executivo no momento do vencimento da obrigação”.69

O real problema é que esta afirmação de Chiovenda acabou sendo absorvida epotencializada pela doutrina pós-chiovendiana, especialmente pela doutrina de Calamandreisobre tutela cautelar. Calamandrei, embora não tenha incluído a condenação para o futuroentre as providências cautelares, ao diferenciar a tutela cautelar da tutela preventivaacabou concluindo que a condenação para o futuro constitui o “caso mais notório” detutela preventiva. Segundo ele: “em certos casos o sistema processual (italiano) admite queo interesse suficiente para invocar a tutela jurisdicional possa surgir antes que o direitotenha sido efetivamente violado, bastando o fato de que a lesão se afigure como próximaou possível: nestes casos, a tutela jurisdicional, ao invés de objetivar eliminar aposteriori odano produzido pela lesão do direito, atua a princípio com o fim de evitar o dano quepoderia derivar da lesão de um direito. Fala-se, nestes casos, em contraposição à tutelasucessiva ou repressiva, de tutela jurisdicional preventiva, em relação à qual o interesse deagir surge não do dano, mas do perigo de um dano jurídico: o caso mais notório deste tipode juízo preventivo está na figura da condenação para o futuro”.70

Se a condenação para o futuro objetiva garantir maior tempestividade à satisfação do

direito violado,71 Calamandrei certamente se equivoca ao dizer que este tipo decondenação é “o caso mais notório” de tutela preventiva. Uma técnica processual quepermite, antes da violação do direito, a possibilidade de acesso imediato à via queimplementa a tutela repressiva, desde que a lesão ou o inadimplemento sejam praticados,está muito longe de conter qualquer resquício ou vestígio de preventividade. Acondenação para o futuro, ainda que admitida antes da violação do direito, é concedidapara atuar depois que o direito foi violado e não para impedir a sua lesão.72

A confusão entre tutela preventiva e condenação para o futuro é consequência daausência de reflexão sobre o real objetivo da tutela preventiva e do descaso com a tutelados direitos não patrimoniais, fruto de uma ideologia que não leva em consideração anecessidade de tutela efetiva de direitos que, ainda que vitais dentro do contexto doEstado contemporâneo, podem ser transformados pelo inadimplente em pecúnia. Note-seque a condenação para o futuro é plenamente adequada à tutela dos direitos patrimoniais,enquanto os “novos direitos”, frequentemente com conteúdo não patrimonial, exigem atutela inibitória, isto é, a tutela preventiva.

Ademais, a confusão entre uma técnica processual e uma tutela de direito comfinalidades tão distintas também serve para evidenciar que a doutrina clássica não tinhamuita consciência do que falava quando estudava a tutela cautelar. Se a doutrina nãoconseguia perceber – por estar cegada por uma ideologia comprometida com umdeterminado modelo institucional de Estado de Direito – a diferença entre condenaçãopara o futuro e tutela preventiva, ela não podia conceber uma tutela inibitória contrapostaà tutela cautelar e, assim, perceber a nítida distinção entre o arresto e a tutela inibitóriaque impede a violação do meio ambiente, por exemplo.73

A caução, destinada a garantir o ressarcimento diante de eventual dano, não constituitutela preventiva, mas sim tutela cautelar, voltada a dar segurança à frutuosidade e àefetividade da tutela ressarcitória. A particularidade desta forma de tutela cautelar estáem que a segurança, no caso, é de uma tutela ressarcitória eventual, e não de uma tutelaressarcitória já exigível – porque posterior ao dano.

De qualquer forma, o que deve ficar claro é que a tutela inibitória (ou a tutelapreventiva) é satisfativa e autônoma, enquanto a tutela cautelar sempre se refere a umatutela do direito ou a uma situação substancial tutelável, podendo, em casos raros, darorigem a uma ação cautelar autônoma, porque ligada a uma tutela jurisdicional ainda nãoexigível. Ou seja, a tutela cautelar é caracterizada pela instrumentalidade e pelareferibilidade, embora possa, em hipóteses excepcionais, abrir oportunidade a uma açãocautelar autônoma. Neste caso, a instrumentalidade e a referibilidade estão, por assimdizer, “encobertas”, uma vez que a tutela assegurada ainda não é exigível.

Frise-se, portanto, a distinção fundamental entre preventividade e cautelaridade. Atutela preventiva ou inibitória não é marcada pela referibilidade ou pelainstrumentalidade, uma vez que basta por si só ou dá tutela satisfativa ao direito. A tutelainibitória ou preventiva é tão satisfativa quanto a tutela ressarcitória, não obstante alamentável confusão que a doutrina costuma fazer entre tutela preventiva e tutelacautelar.

3. A tutela cautelar diante das tutelas contra o ilícito (inibitória e de remoção)

3.1. A superação da confusão entre ilícito e dano e a identificação de tutelasjurisdicionais que têm como pressuposto apenas o ato contrário ao direito

O conceito de ilícito civil, durante grande período de tempo, associou o ato contrário ao

direito e o dano. Na verdade, embora a doutrina percebesse a distinção entre ato contrárioao direito e dano, supunha que o dano era indispensável para o ilícito ter relevância noâmbito civil.

Assim, foram unificadas as categorias da ilicitude e da responsabilidade civil, como se atutela contra o ilícito apenas pudesse ser uma tutela de reparação do dano. A prática doilícito, por ser a prática do dano, abria oportunidade à tutela ressarcitória e, como o danopodia ser valorado em dinheiro, esta tutela era mais precisamente a tutela ressarcitóriapelo equivalente ao valor do dano. Portanto, a tutela contra o ilícito tinha apenas oobjetivo de outorgar tutela aos bens patrimoniais, supondo-se que o bem jurídico objetoda proteção jurisdicional era uma coisa dotada de valor de troca.

Porém, as novas situações de direito material evidenciaram a necessidade de se tutelarapenas contra o ato contrário ao direito e, assim, contra o ilícito que prescinde da suanormal consequência – o fato danoso.74 Lembre-se que o Estado constitucional tem odever de editar normas proibitivas ou impositivas de condutas para evitar danos aosdireitos fundamentais. Para a efetiva atuação destas normas é imprescindível a tutelajurisdicional capaz de inibir a violação da norma, bem como a tutela de remoção do ilícito– dos seus efeitos concretos que se propagam no tempo.

A tutela contra o ilícito, neste último caso, não se volta contra um dano, mas apenascontra um ato contrário ao direito que deixa marcas no tempo, constituindo, por assimdizer, uma fonte aberta à produção de danos. Percebe-se com nitidez, a partir daí, que odano é uma consequência do ilícito e, mais do que isto, uma consequência meramenteeventual – não necessária – do ato contra o direito.75 Realmente, imaginou-se por muitotempo que a lei, ao obrigar aquele que comete um dano a indenizar, considerasse o dano umelemento essencial da fattispecie constitutiva do ilícito. Ocorre que o dano nem mesmo éconsequência necessária do ato ilícito; é apenas um requisito para o surgimento daobrigação de ressarcir. De modo que a tutela dos direitos certamente não pode ficarrestrita às tutelas de ressarcimento e contra a probabilidade do dano (cautelar).

Não há porque supor que o interesse de agir na ação contra o ilícito seja dependente deum dano, a menos que se deseje limitar, sem qualquer justificação plausível, a função doprocesso civil à tutela contra o dano, como se o ato contrário ao direito continuasse a nãolhe dizer respeito. Não obstante, aí não haveria como explicar nem mesmo a tutela civildos direitos difusos, para a qual é imprescindível a atuação do desejo das normas deproteção dos direitos fundamentais e, desta forma, a tutela de inibição do ilícito e a tutelade remoção dos seus efeitos concretos.

De modo que, se a distinção entre ilícito e dano sempre foi identificável na perspectivalógica, hoje ela é imprescindível para a construção de uma teoria capaz de dar conta danecessidade de tutela das novas situações de direito substancial.

3.2. Tutelas contra o ilícito: tutela inibitória e tutela de remoção do ilícito

A tutela inibitória tem como pressuposto a probabilidade da prática de ato contrário aodireito – não a probabilidade de dano.76 Mas não é importante apenas sublinhar que atutela inibitória requer apenas alegação de probabilidade de violação de direito. Étambém necessário evidenciar que o dano e a culpa não podem ser objeto da cognição dojuiz, da investigação probatória ou da discussão das partes na ação endereçada à obtençãodesta tutela.

O juiz não pode pensar em negar a tutela inibitória por falta de probabilidade de dano,como também não pode exigir do autor a sua demonstração. Do mesmo modo, o réu nãopode se defender alegando a inexistência de probabilidade de dano. Isso não significa que

a probabilidade de dano não possa ser alegada pelo autor. Lembre-se que o dano, pormuitas vezes ocorrer no mesmo instante do ilícito, facilmente identifica e evidencia o atocontra o direito. O que se quer deixar claro é que a probabilidade do dano não precisa sernecessariamente invocada e demonstrada para a obtenção da tutela inibitória.77

Note-se que, do ponto de vista probatório, é muito mais fácil provar a probabilidade daprática de ato contrário ao direito do que a probabilidade de dano. Esclareça-se, porém,que dizer que basta a probabilidade de ilícito obviamente não significa excluir do campoprobatório da ação inibitória a questão da própria ilicitude, mediante a limitação dacognição judicial à probabilidade de uma “ação física”. Exige-se, além da probabilidadedesta ação ou de um agir, a demonstração de que este agir é ilícito, mediante o confrontoentre a descrição do ato temido e o direito.

A tutela inibitória, ao ter como pressuposto somente a ameaça da prática de atocontrário ao direito, pode ser utilizada não apenas quando se teme uma primeira violação,mas também quando se teme a sua repetição ou mesmo a continuação da atividade ilícita.Quer isto dizer que a tutela inibitória pode impedir a publicação de notícia lesiva a direitoda personalidade ou mesmo a difusão da publicação de notícias lesivas, assim como inibira utilização de marca comercial ou a repetição do seu uso. E ainda pode inibir acontinuação de atividade ilícita, como o prosseguimento de atividade poluidora.

A circunstância de a tutela impedir a repetição ou a continuação do ilícito e, portanto,aceitar um ilícito já praticado, certamente não lhe retira a natureza preventiva. A tutela,mesmo nestas duas hipóteses, é voltada para o futuro, ou melhor, para proteger contraalgo que ainda não aconteceu, mas apenas pode vir a ocorrer. Contra o que já aconteceu –por exemplo, ilícito que deixou marcas concretas ou dano derivado do ilícito –, terão queser requeridas, respectivamente, a tutela de remoção do ilícito e a tutela ressarcitória. Emresumo, para efeito de tutela inibitória não tem qualquer relevância o dano ou o ilícitoque já ocorreu e cuja repetição ou continuação não se teme.

A tutela que não se volta contra o dano também se desliga do pressuposto da culpa. Aculpa é um critério para a imputação ressarcitória, ou melhor, um critério para aresponsabilização pelo dano, sendo totalmente prescindível à tutela contra o ilícito e, commais evidência, para a tutela contra a probabilidade de ilícito.

É absurdo imaginar que alguém, para evitar ou corrigir um ilícito, tenha quedemonstrar culpa. O direito de inibir o ilícito e de evitar a propagação dos seus efeitosconcretos obviamente não depende de culpa. Ninguém pode impedir a concessão dequalquer destas tutelas afirmando não ter culpa. Exemplificando: ninguém pode afirmarque não sabia que determinada marca comercial pertencia a outrem para ver denegada atutela inibitória; da mesma forma, para combater a tutela de remoção do ilícito tambémde nada adianta ao réu alegar que não agiu com culpa ao colocar produto com composiçãoproibida no mercado.

Note-se que a tutela de remoção do ilícito objetiva remover ou eliminar a potencialcausa do dano; não visa ao ressarcimento pelo dano. No caso de tutela de remoção doilícito, é suficiente a transgressão de um comando jurídico, pouco importando se ointeresse privado tutelado pela norma foi efetivamente lesado ou se ocorreu um dano.Como disse Michele Mòcciola em ensaio publicado na RivistaCriticadelDirittoPrivato, aconsequência lógica da distinção entre dano e ilícito conduz à formulação do critériosegundo o qual, todas as vezes em que a intervenção judiciária tem por objeto afontedodano, não há tutela ressarcitória.78

Porém, para que haja interesse em uma tutela que, sendo posterior ao ilícito, não sedestine a ressarcir o dano, é preciso que a ação contrária ao direito deixe marcas

concretas que, propagando-se no tempo, constituam uma fonte aberta à produção dedanos. Há casos em que a ação contra ius produz efeitos concretos que, mantendo-se notempo, constituem exatamente o reflexo da conduta proibida pela norma de proteção dodireito.

É a hipótese, por exemplo, do despejo de lixo tóxico em local não autorizado pelalegislação ambiental. Ilícito é despejar o lixo tóxico; o dano que pode ser produzido diantedeste despejo é objeto de tutela ressarcitória. A permanência do lixo tóxico em localinadequado é o efeito concreto derivado da ação ilícita, constituindo-se em fonte aberta àprodução do dano. Este efeito concreto, por ser derivado de uma ação passada, não podeser inibido, mas apenas removido. Note-se, na mesma linha, que expor à venda produtocom composição nociva à saúde também não constitui dano, mas conduta que abreoportunidade à produção de dano. O produto deve ser apreendido exatamente para que ailícita exposição à venda – da qual podem derivar danos – seja removida.

A tutela de remoção do ilícito é uma resposta ao direito material ou, maisprecisamente, à necessidade de atuação do desejo de proteção da própria norma violadapela ação ilícita. Assim como há direito de inibir o ilícito, há evidente direito material deremover os efeitos concretos derivados do ilícito. Na verdade, a possibilidade de se obtertutela posterior à violação da norma e independentemente da existência de dano temrelação com o próprio conceito de norma, uma vez que, se a única sanção contra o ilícitofosse a obrigação de ressarcir em virtude do dano, a própria razão de ser da normajurídica estaria comprometida.

Além disto, a tutela de remoção do ilícito, do mesmo modo que a tutela inibitória,representa espécie de tutela específica, obtenível a partir de ação construída com base nastécnicas dos arts. 536, do CPC, e 84, do CDC, conforme a ação se destine a tutelar direitoindividual ou direito difuso ou coletivo.79

3.3. Tutela inibitória e tutela cautelar

Repita-se que o autor, para obter tutela inibitória, não precisa demonstrarprobabilidade de dano. É certo que, em razão de o ato contra o direito e o fato danosopoderem ocorrer no mesmo instante, a tutela inibitória frequentemente pode impedir opróprio dano. Porém, importa frisar que a probabilidade do dano não é exigência para aconcessão da inibitória; basta a ameaça do ilícito.

A tutela inibitória é preventiva, pois é capaz de impedir a violação do direito. A tutelacautelar, em uma das suas principais funções, destina-se a assegurar a efetividade datutela repressiva, isto é, da tutela do direito devida em virtude da prática – ou para ahipótese da prática – de um dano, do descumprimento de um dever ou do inadimplementode uma prestação. Assim, por exemplo, após a prestação ter sido inadimplida o arrestopode ser requerido para assegurar a efetividade da tutela do direito de crédito. Para ahipótese da prática de dano, pode ser requerida a caução de dano infecto para assegurar aefetividade da tutela ressarcitória.

Embora nos dois últimos exemplos haja um perigo de dano, esse recai sobre aefetividade da tutela que responde ao autor por uma violação de direito ou por um dano.O arresto e a caução de dano infecto – tutelas genuinamente cautelares – não se dirigem aimpedir o dano ou a violação do direito, mas a assegurar a efetividade da tutela contra odano ou a violação do direito.80

A tutela cautelar não foi idealizada para impedir a violação do direito.81 Isto nãoapenas pelo motivo de que, na época em que a tutela cautelar foi concebida, não seadmitia tutela jurisdicional efetivamente preventiva e o ilícito civil era associado ao fato

danoso, mas igualmente em virtude de que as técnicas processuais idealizadas para atutela dos direitos, no processo civil clássico, não foram pensadas para permitir a tutela deinibição do ilícito. Na verdade, a tutela cautelar não podia ser pensada, em vista doambiente cultural em que foi moldada,82 como tutela preventiva – como prova a estruturado processo civil clássico, inclusive o arresto cautelar.

Ovídio Baptista da Silva não aceitou essa conclusão, tendo feita a seguinte advertência:“Será lícito dizer que a tutela cautelar ‘nunca propiciou uma tutela preventiva’, seconsiderarmos, por exemplo, o arresto que nos acompanha desde o direito medieval; e osequestro que nos que foi transmitido pelo direito romano? Quem negaria o caráter cautelare preventivo desses tradicionais instrumentos do direito moderno? Quem negaria ocaráter preventivo das cauções, tanto no vastíssimo campo do direito material, público eprivado, quanto no domínio do direito processual? E, assim como haverá cauçõessatisfativas, como as negociais, incontáveis serão as hipóteses em que elas assumem anatureza cautelar, e tanto umas quanto as outras preventivas. Se os provvedimenticautelari de Calamandrei ‘nunca foram capazes de propiciar uma tutela preventiva’, nãoserá justo atribuir a culpa por essa incompetência à tutela cautelar autêntica (tutela de‘simples segurança’, portanto não satisfativa, por definição), como o concebeu, em páginasinsuperáveis, Pontes de Miranda, cuja doutrina sobre ‘pretensão à segurança’, porém, nãomereceu menção, ainda que fosse para criticá-la, na obra do talentoso jurista paranaense,não obstante seu elogiável acervo bibliográfico e o permanente diálogo mantido, ao longoda obra, com os autores italianos modernos que, com sabemos, conservam-sereligiosamente fiéis ao paradigma”.83

Reafirma-se o ponto de vista exposto. O arresto e o sequestro aceitam a violação dodireito (rigorosamente a pressupõe), não servindo para impedir a prática de ato ilícito. Alegitimidade do arresto é subordinada à existência de um dano anterior, cuja afirmação,aliás, é imprescindível para o pedido de tutela ressarcitória. O arresto se destina aassegurar a frutuosidade da tutela ressarcitória.

E a situação é exatamente a mesma no caso de caução de dano infecto. Diz o art. 1.280do Código Civil: “O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédiovizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como que lhepreste caução pelo dano iminente”. E o art. 1.281 do mesmo Código: “O proprietário ou opossuidor de um prédio, em que alguém tenha direito de fazer obras, pode, no caso dedano iminente, exigir do autor delas as necessárias garantias contra o prejuízo eventual”.

Assim como a tutela cautelar pode ser requerida depois que o dano já foi praticado,igualmente pode ser requerida para a hipótese da prática de dano ou de forma autônoma auma eventual – porque não se sabe se o dano ocorrerá – ação ressarcitória. E isto fica claromediante a simples leitura das normas do Código Civil acima descritas. A caução érequerida em face de um “prejuízo eventual”. Portanto, o arresto e a caução sempre sãorequeridos em vista do direito à tutela ressarcitória, que nada mais é do que uma proteçãoou tutela contra o dano. A caução de dano infecto e o arresto nada têm de preventivos;especialmente quando desnudada a real função preventiva da tutela jurisdicional, que é ade evitar a violação do direito. Compare-se o que se alcança com o arresto e o que se obtémcom a tutela inibitória que impede a violação do direito ambiental. É indiscutível que aprimeira tutela assegura a tutela ressarcitória, enquanto a segunda impede a violação dodireito, constituindo, esta sim, uma tutela preventiva, desligada de qualquerinstrumentalidade ou referibilidade. Enquanto a tutela cautelar assegura a tutelaressarcitória, a tutela inibitória independe de outra forma de tutela.

Aliás, a própria lição de Pontes de Miranda está de acordo com o nosso pensamento.Quando Pontes se refere à tutela cautelar como segurança-para-execução, pressupõe título

e inadimplemento, isto é, violação do direito, não demonstrando qualquer preocupaçãocom uma tutela jurisdicional capaz de impedir a violação do direito.

Ou seja, o fato de a tutela cautelar não poder propiciar tutela preventiva não temrelação de causa e efeito com os provvedimenti d’urgenza do art. 700 do Código de ProcessoCivil italiano ou com a doutrina de Calamandrei. A tutela cautelar não pode propiciartutela preventiva exatamente porque significa segurança de uma tutela que, em regra, éressarcitória pelo equivalente ou do adimplemento de obrigação de pagar dinheiro –tutelas estas que se implementam com a execução.84 Como está claro, o arresto e osequestro não constituem tutela preventiva, mas sim tutela de segurança da tutelarepressiva.

Confirma-se, assim, o que antes foi dito: o arresto admite a ocorrência do dano,cingindo-se a assegurar a concretização da tutela ressarcitória. Esta tutela cautelar aceitaa violação do direito, tendo o fim de assegurar a efetividade da tutela repressiva. Frise-seque a tutela cautelar, ao ser concebida, e, inclusive, incorporar a figura do arresto,certamente não podia abranger a inibitória, pois é ilógico conceber uma tutela preventivacomo instrumento de um processo repressivo. É absurdo imaginar que, em um sistemaque trabalhava com sentenças (declaratória, constitutiva e condenatória) que nãoviabilizavam tutela preventiva, a tutela cautelar pudesse ir além da sua função desegurança do processo, extrapolando dos seus limites para dar tutela preventiva ao direitomaterial e, assim, eliminar a própria característica de instrumentalidade que lhe foiconferida.85

A tutela cautelar passou a ser admitida como tutela preventiva quando a práticaforense percebeu que as novas situações de direito material necessitavam de uma tutelacapaz de impedir o ilícito. A transformação da tutela de segurança em tutela preventivafez com que se percebesse que essa tutela, por ser uma tutela não caracterizada pelainstrumentalidade, não necessitava de duas ações processuais, ou de uma ação principalseguindo a ação que passou a ser rotulada de cautelar. Na verdade, o fenômeno dadistorção da ação cautelar é apenas a mostra sensível de que o veículo processualidealizado para a tutela cautelar (dotado de liminar e sentença mandamental) passou a serutilizado para a obtenção da tutela inibitória (tutela preventiva). Porém, como a tutelainibitória impede a violação, satisfazendo o desejo de tutela jurisdicional, é claro que aação que a veicula apenas pode ser autônoma, dispensando qualquer ação principal.Melhor explicando: a prática não apenas admitiu a busca de tutela inibitória a partir deação rotulada de cautelar – em virtude das suas particularidades, desenhadas paraatender a uma situação de urgência –, mas foi além, aceitando a transformação do próprioprocedimento cautelar para atender à natureza desta tutela de direito.

Atualmente, quem deseja obter tutela capaz de impedir a violação de direito devepropor ação inibitória, construída com base nas técnicas processuais presentes no art. 536,do CPC; nunca ação baseada no art. 305 do Código de Processo Civil, que, por exigir aformulação de “pedido principal” (art. 308, CPC), obviamente não se presta à obtenção detutela inibitória ou de qualquer tutela satisfativa do direito material.

3.4. Tutela de remoção do ilícito e tutela cautelar

A tutela de remoção do ilícito objetiva eliminar os efeitos concretos posteriores àprática da ação ilícita, nada tendo a ver com dano ou com a sua probabilidade. Nãoobstante, em virtude da não percepção da distinção entre ilícito e dano ou da nãocompreensão da necessidade de uma tutela civil dirigida unicamente contra o ilícito, aprática forense não conseguiu admitir outra coisa além de uma tutela voltada contra aprobabilidade do dano. Assim, por exemplo, no caso de exposição à venda de produto com

composição proibida, afirmava-se a probabilidade do dano à saúde do consumidor para serequerer tutela cautelar.

Ou seja, como a doutrina brasileira jamais pensou em uma tutela voltada a remover oilícito, imaginou-se que a sua natureza fosse cautelar. Porém, isso é consequência da faltade distinção entre o ilícito e a sua consequência eventual, que é o dano. Como a tutela deremoção do ilícito, por mera consequência, impede a produção do dano, confundiu-setutela contra o ilícito já praticado (remoção do ilícito) e tutela contra a probabilidade dodano.

Note-se que a busca e apreensão de produto com composição ilícita constitui técnicaprocessual de remoção do ilícito, que satisfaz por si mesma. Se a busca e apreensão, aoremover o ilícito, acaba colaborando com a prevenção do dano, a verdade é que o seufundamento não está na probabilidade do dano, mas na prática do ilícito. De modo que oautor, em tal ação (de remoção do ilícito), deve afirmar a prática de um ilícito de eficáciacontinuada e não simplesmente a probabilidade de dano.

Realmente, o mais grave é que se admitia, nestas situações, a discussão do dano,exigindo-se do juiz a formação de convicção acerca da probabilidade do dano para aconcessão da tutela jurisdicional. Porém, quando se toma consciência daimprescindibilidade da tutela civil contra o ilícito, fica fácil ver que, para a sua obtenção,basta afirmar e demonstrar a ocorrência de um ato contrário ao direito cujos efeitosconcretos se prolongam no tempo, constituindo uma fonte aberta à produção de danos.

Além disto, como a tutela de remoção do ilícito é satisfativa, não se revestindo dainstrumentalidade característica à tutela cautelar, não há como imaginar, neste caso, anecessidade de um “pedido principal”. A tutela de remoção deve ser buscada através deação estruturada com base nas técnicas do art. 536 do Código de Processo Civil. Portanto,de ação com procedimento comum dotada de técnicas processuais idôneas à obtenção detutela específica, gênero em que está inserida a tutela de remoção do ilícito, assim como atutela inibitória.

Como está claro, a ação do art. 305 não é adequada para a prestação da tutela deremoção do ilícito. Essa tutela, assim com a inibitória, não pode ser consideradainstrumento de nenhuma das tutelas satisfativas do direito material, como a ressarcitória.As tutelas inibitória e de remoção do ilícito não se caracterizam pela instrumentalidade,não sendo marcadas pela referibilidade a uma outra tutela.

4. Da tutela antecipada

4.1. Tutela antecipada ou tutela do direito mediante cognição sumária

Não é preciso lembrar que os pressupostos da regra da nulla executio não têm maisvalor algum na atualidade e que há muito tempo, em vista de concretas exigências detutela jurisdicional, a execução passou a anteceder a declaração. Assim, não há maismotivo para pensar que a providência jurisdicional concedida no curso do processo deconhecimento não tem conteúdo jurídico, mas apenas fático, como supunha a doutrinaque enxergava na tutela cautelar uma simples “sistematização de fato da controvérsia” oumesmo a doutrina perfilhada por Fritz Baur,86 que via na satisfação do interesse dorequerente da ordem judicial de prestação (medida provisória) uma mera satisfaçãofática. Na verdade, a ideia que foi vulgarizada na ciência processual, no sentido de que atutela de cognição sumária não poderia conferir satisfação diversa da “meramente fática”,possui profundas raízes na tese chiovendiana de ação cautelar como “mera ação”. Ora,para a atribuição da qualidade “jurídica” aos efeitos produzidos pela tutela jurisdicional

pouco importa o fato de que esta supõe a existência de um direito que pode ser negado aofinal.

Aliás, é interessante lembrar a insistência, que possui fundamento chiovendiano emesmo pós-chiovendiano, no sentido de que só há jurisdição onde há provimento capazde produzir coisa julgada material. A ideia de ligar jurisdição a coisa julgada materialdesapareceu em vista das novas e recentes exigências de tutela jurisdicional, que nãopodiam esperar o tempo para a declaração relevante – que somente pode ser produzidapela cognição exauriente.87 Não é apenas a qualidade da coisa julgada material que dáconteúdo jurídico a um provimento, nem é somente a tutela marcada pela coisa julgadamaterial que incide sobre as relações substanciais. A tutela satisfativa de cogniçãosumária realiza o direito material afirmado pelo autor ou, em outras palavras, dásatisfação ao direito material afirmado, obviamente incidindo – ainda que, na angulaçãoprocessual, de forma provisória – sobre o plano das relações substanciais. A realização deum direito mediante a técnica antecipatória é realização de um direito que preexiste àsentença de cognição exauriente.

A técnica antecipatória produz a tutela material ou o efeito jurídico que, a princípio,viria apenas ao final. Um efeito que, por óbvio, não descende de uma eficácia que tem amesma qualidade da eficácia da sentença. A técnica antecipatória permite que sejamrealizadas antecipadamente as consequências concretas da sentença de mérito. Estasconsequências podem ser identificadas com os efeitos externos da sentença, ou seja, comaqueles efeitos que operam fora do processo e no âmbito das relações de direitomaterial.88

Não há mais como admitir que a tutela que satisfaz o direito com base em cogniçãosumária – antecipadamente – possa continuar a ser equivocadamente designada decautelar. Isso acontecia numa época em que, em vista da regra da nulla executio sine titulo,não se admitia realização do direito no curso do processo. Hoje, especialmente diante doteor do código de 2015, não há mais motivo algum para continuar a falsear a natureza datutela satisfativa do direito prestada com base em cognição sumária. Trata-se exatamenteda tutela que é desejada pelo autor e que, assim, pode ser prestada no curso do processocom base em cognição sumária ou ao final com base em cognição exauriente. Bem porisso, tutela satisfativa sumária é sinônimo de tutela antecipada.

4.2. Tutela antecipada declaratória e constitutiva?

Quando se fala em tutela satisfativa mediante cognição sumária ou em tutelaantecipada é fácil perceber que todas as tutelas de direito implementadas por sentençasque dependem de execução podem ser antecipadas ou prestadas mediante cogniçãosumária. O problema é saber se as tutelas declaratória e (des)constitutiva, prestadas porsentenças autossatisfativas ou que desnecessitam de execução, podem ser prestadasmediante cognição sumária ou antecipadas.

Ferruccio Tommaseo, ao tratar de questão que diz respeito à possibilidade daantecipação do efeito declaratório para atribuir ao autor o bem jurídico da certeza, afirmaque há uma intrínseca inidoneidade da cognição sumária para permitir ao juiz antecipar acerteza a respeito das relações jurídicas – em que se reduz o bem jurídico outorgado pelasentença declaratória. Porém, Tommaseo sustenta que uma “declaração sumária” pode serútil ao autor da ação declaratória para determinar o seu comportamento em face dealgumas situações de direito substancial. Assim, por exemplo, a tutela requerida peloempregador que declara antecipada e sumariamente a legitimidade da despedida de umempregado.89

Gianpiero Samori, em ensaio intitulado “La tutela cautelare dichiarativa”, publicado naRivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, advertiu que não seria possível nemmesmo uma “declaração sumária”, nos moldes preconizados por Tommaseo. SegundoSamorì, tal tipo de tutela não teria utilidade prática alguma. Para esse autor, a tutelasumária declaratória não é justificada na perspectiva funcional em vista da inidoneidadeda decisão para garantir uma concreta utilidade ao autor, que não pode pretender utilizá-la como fonte de legitimação de um comportamento.

É certamente impossível a antecipação da eficácia declaratória ou concederantecipadamente ao autor o bem da “certeza jurídica”, o qual somente é capaz de seratribuído pela sentença declaratória. A cognição inerente ao juízo antecipatório é pornatureza imprestável para atribuir ao autor a “declaração” ou a “certeza jurídica”.90 Aliás,a sentença impugnada mediante recurso igualmente não é bastante para eliminar aincerteza jurídica; só a sentença declaratória atrelada à coisa julgada material presta atutela (declaratória)91 que põe fim ao estado de incerteza, definindo a existência, ainexistência ou o modo de ser de uma relação jurídica.

Nem mesmo a declaração sumária tem alguma utilidade, a despeito da posição deTommaseo. No exemplo apresentado pelo processualista italiano, de “declaração sumária”da legitimidade da despedida de um empregado, não se confere qualquer efeito útil aoautor. Ora, a declaração sumária da legitimidade de um ato vale muito pouco – ou talveznada –, quando se percebe que o juiz pode julgar improcedente o pedido declaratórioainda que já tenha, no juízo antecipatório, “declarado sumariamente” algo no sentidoinverso. Se o juiz julga improcedente o pedido declaratório, fica definida a ilegitimidadedo ato que na “decisão sumária” foi suposto legítimo, devendo o autor responder como sea declaração sumária não houvesse sido pronunciada. Se é assim, e se o autor não precisade autorização judicial para, por exemplo, despedir um empregado, não há comovislumbrar alguma utilidade na “declaração sumária”. A declaração sumária certamentenão legitima o ato praticado pelo autor quando a sentença é de improcedência. De modoque a despedida de alguém que goza de estabilidade, por exemplo, não se torna legítimaapenas por se fundar numa “declaração sumária”. Nesse caso, proferindo-se sentença deimprocedência, o autor responderá pelo ato ilegítimo como se a declaração sumária nãoexistisse.

Já no caso de tutela antecipada em ação constitutiva, seria possível dizer que não sepode antecipar a “aquisição” de um direito ou mesmo o exercício de um direito que aindadeve ser constituído – pois dependente de uma sentença constitutiva. Estaria sendoadotada a doutrina já difundida por Calvosa, que não admite o uso do provvedimentod’urgenza para garantir o exercício de um direito que poderá ser constituído nadependência do acolhimento da ação constitutiva ou da realização de determinadascircunstâncias de fato que, no momento em que se pede a concessão da tutela de cogniçãosumária, não foram ainda realizadas e nem é absolutamente certo que se realizarão.92

Ademais, ao se pensar numa tutela urgente do direito potestativo à mudança jurídica,poderia surgir o óbice lembrado por Satta,93 no sentido de que a constituição provisória deum direito é inconcebível e contraditória.

Sabe-se que a sentença constitutiva produz um duplo efeito. Um primeiro, de naturezadeclaratória, sobre a existência do direito potestativo à modificação jurídica e, umsegundo, que seria propriamente constitutivo, capaz de operar tal modificação na esferajurídico-patrimonial das partes.94 Se o direito potestativo requer, para produzir efeitos,uma sentença constitutiva e, assim, uma atuação jurisdicional que se protrai no tempo,95

não há dúvida que no tempo necessário para que seja proferida a sentença constitutivapode ocorrer dano.

Lembre-se que o art. 282 do Código de Processo Civil italiano afirma que “a sentença deprimeiro grau é provisoriamente executiva entre as partes”.96 Durante os trabalhospreparatórios à reforma processual italiana, ficou clara a intenção do legislador em nãolimitar o art. 282 à sentença condenatória.97 A questão foi debatida no Senado italiano e aproposta do senador Acone, que restringia o art. 282 à sentença de condenação, foirejeitada sob o argumento apresentado pelo senador Lipari de que numerosas sentençasconstitutivas poderiam ser beneficiadas pela norma.98 Ora, aceitar que a sentençaconstitutiva “produza efeitos” antes do trânsito em julgado ou da formação da coisajulgada material nada mais é do que admitir uma “constituição provisória”. Trata-se deconstituição fundada em cognição exauriente mas não definitiva,99 o que, para efeito deprovisoriedade, é exatamente o mesmo que constituição baseada em cognição sumária.

Note-se que, embora também seja impossível antecipar a eficácia constitutiva (quedepende de coisa julgada material), uma constituição fundada em cognição sumária – umacognição provisória – produz modificações no direito material que podem serimplementadas mediante meios executivos que não têm relação com o processo em que atutela antecipada constitutiva é prestada, ou mediante atos de execução imprópria.Realmente, não há razão para impedir uma constituição fundada em cognição sumária, nemmesmo a alegação de que a sentença constitutiva produz efeitos ex nunc.

Pense-se, por exemplo, na tutela antecipada de fixação provisória de aluguel,admissível na ação revisional do valor da locação. Perceba-se que a decisão que fixaprovisoriamente o aluguel não antecipa qualquer efeito executivo tendente a possibilitar aobtenção do novo aluguel. Com a fixação provisória do novo aluguel não se objetiva abrirao autor o caminho da execução para a obtenção de soma em dinheiro, até porque sequerse supõe inadimplemento de obrigação de pagar aluguel na ação revisional. Nesse caso hásomente a modificação provisória do valor da locação.

É certo que tal mutação provisória poderia não ter utilidade se, por exemplo, o locadornão pudesse propor ação de despejo com base em falta de pagamento do aluguel fixadoprovisoriamente. Observe-se, contudo, que quando é possível extrair da tutela antecipadaalguma pretensão condenatória, mandamental ou executiva, dá-se vida à constituiçãoprovisória.

De qualquer forma, a hipótese da constituição provisória do aluguel difere em muitodo exemplo da declaração sumária da legitimidade da despedida do empregado, já que afixação provisória do aluguel modifica, ainda que provisoriamente, uma relação jurídica.A decisão sumária constitutiva “opera” no plano do direito substancial, modificando umasituação jurídica, que a executividade que vem de fora do processo em que concedida atutela antecipada pode fazer valer.

Ninguém pode pensar em termos de efetividade e não admitir a antecipação dos efeitosda constituição. Quem percebe que a utilidade buscada pelo autor da ação constitutivaestá no plano dos efeitos, obrigatoriamente conclui que é viável a antecipação dos efeitosda sentença constitutiva. Deixe-se claro, no entanto, que em alguns casos – em face dasituação de direito substancial controvertida – a ação constitutiva não abre oportunidadea tutela antecipada com a mesma natureza. Assim, não há como admitir tutela antecipadaconstitutiva ou desconstitutiva nas ações de estado. É absurdo imaginar, por exemplo, quealguém pode estar provisoriamente divorciado ou que se possa desconstituirprovisoriamente o estado de filho – em ação de negação de paternidade.

4.3. Tutela antecipada de soma em dinheiro

Para que se compreenda a racionalidade e a oportunidade da tutela antecipada de

soma é necessário perceber que esta tutela, a execução “provisória” da sentença e oarresto cautelar possuem funções completamente distintas.

A execução provisória, nos termos em que concebida, não supõe a necessidade derealização imediata do direito de crédito, mas apenas a necessidade de aceleração daatividade executiva para a segurança do juízo. A lição de Liebman não deixa dúvida: “naexecução provisória o efeito suspensivo dos recursos, embora atenuado, todavia existe eopera na fase final da execução, quando, estando seguro o juízo, a espera não mais produzprejuízos”.100 Também é interessante lembrar de curiosa lição de Alcides de MendonçaLima: “pela natureza da causa, a lei coloca o requisito da rapidez acima do da justiça daexecução em favor do credor no detrimento do devedor, pela expectativa desse no recursoque interpôs. Mas nem por isso deixa o devedor desamparado. Estipula tais restrições que,praticamente, o credor não obtém vantagem alguma com sua pressa”.101

Estas clássicas lições estão a falar da execução que paralisa na penhora de bem, semadmitir a sua expropriação. Deixam claro que a “execução provisória” pode ser suspensaporque "a espera não mais produz prejuízos” e que mediante esta forma de execução o“credor não obtém vantagem alguma com sua pressa”.102 O objetivo desta execução,portanto, obviamente não é satisfazer aquele que imediatamente necessita de soma emdinheiro, mas apenas garantir a viabilidade da futura e eventual realização do crédito.

Pensando-se na perspectiva da execução provisória que pode ser completa, ou seja, quepode realizar o direito de crédito (art. 520, IV, do CPC), não há como fugir da constataçãode que a tutela antecipada e a execução completa da sentença impugnada realizam – e nãoapenas asseguram – o direito. A diferença entre tutela antecipada de soma e execução“provisória” completa é a de que, na segunda hipótese, o fundamento para a realizaçãoimediata do direito não é o perigo de dano.

Por outro lado, os alemães já deixaram claro que o fim do arresto nada tem a ver com oobjetivo da antecipação do pagamento de soma em dinheiro,103 demonstrando que o fimda antecipação não é o de acautelar o direito de crédito, mas o de proteger o direito quesomente através da realização do direito de crédito pode ser adequadamente tutelado. Aantecipação do pagamento de soma em dinheiro não objetiva assegurar a tutela do direitode crédito; essa é a função do arresto cautelar. A tutela antecipada objetiva suprir umanecessidade imediata, uma vez que o autor não pode esperar – sem perigo de dano – arealização do direito de crédito.

Na antecipação, ao contrário do que ocorre no arresto, parte-se da premissa certa deque a espera produzirá prejuízos, não sendo suficiente, por causa disto, a mera segurança dodireito de crédito. A tutela antecipada de soma em dinheiro, quando fundada no art. 300, émedida idônea para impedir prejuízo a um direito conexo ao direito de crédito,104

enquanto o arresto é destinado a assegurar a viabilidade da sua realização.105

A antecipação fundada em perigo de dano a um direito conexo ao direito de créditonão pode ser suspensa após a penhora não só porque o caso não é de necessidade desegurança do direito de crédito, mas principalmente porque na hipótese de antecipação aespera pode trazer prejuízos ao direito que é conexo ao direito de crédito.

Isso igualmente permite explicar que o perigo de dano não é suficiente para atribuirnatureza cautelar à tutela satisfativa sumária. Antônio Cláudio da Costa Machado – assimcomo alguns outros processualistas – ingenuamente supõe que toda tutela baseada emperigo de dano é “cautelar”, como se o perigo fosse nota exclusiva desta tutela. CostaMachado diz expressamente que “o periculum in mora é característica exclusiva dacautelaridade”.106 Na verdade, quem pensa assim tem que atribuir natureza cautelar à

execução da sentença baseada em periculum in mora – que foi admitida por cinquentaanos na Itália. Porém, há forma bem mais fácil de demonstrar o erro de raciocíniodaqueles que pensam que a tutela antecipada baseada em periculum é cautelar. Umatutela somente pode ser dita cautelar quando é incapaz de realizar o direito que épostulado através da ação. Ora, como é absolutamente lógico, ninguém pode acautelar oque já foi realizado.

Quando se pensa no procedimento monitório italiano é também irracional admitir acautelaridade da execução provisória do decreto ingiuntivo, ainda quando baseada nasegunda parte do art. 642, do CPC italiano, ou seja, em perigo de grave “pregiudizio nelritardo”. Ora, se a execução provisória fundada na particularidade da prova tambémsurge da necessidade de evitar que a demora do processo possa trazer dano marginal aoautor, é equivocado pensar que, justamente quando se torna mais evidente a necessidadede antecipar a execução, esta assume as vestes de tutela cautelar, como se o fato de seoutorgar ao juiz o poder para apreciar a existência do “periculum in mora” pudesse sercapaz de transmudar uma tutela que realiza um direito com base em cognição não definitivaem tutela de simples segurança.107 Em outras palavras, a execução provisória do decretoingiuntivo, ainda que fundada em perigo, é tão execução provisória quanto aquela que sedá, por exemplo, quando o “credito è fondato su cambiale, assegno bancario, assegnocircolare, certificato di liquidazione di borsa, o su atto ricevuto da notaio o da altropubblico ufficiale autorizzato” (art. 642, primeira parte, do CPC italiano).

Frise-se que o art. 700, do CPC italiano também abre ensejo à tutela antecipada depagamento de soma em dinheiro.108 Essa tutela difere apenas no que diz respeito àcognição da execução provisória (completa) de uma sentença que condena ao pagamentode soma. Isso quer dizer que o motivo que impede que se atribua caráter cautelar àexecução provisória da sentença não pode deixar de estar presente quando se pensa nanatureza da tutela sumária que implica a realização antecipada do direito do credor.

É correto dizer que tanto a execução provisória da sentença que condena aopagamento de soma quanto a tutela antecipada de pagamento de soma satisfazem odireito de crédito, e que isto obviamente não é o mesmo do que lhe dar simples proteçãocautelar.109 Não deve ter sido por outra razão que Giovanni Verde afirmou, em tomincisivo, que seria sinal de escassa honestidade intelectual, ou ainda de ingenuidade nãoescusável, pensar que o pagamento que satisfaz um crédito alimentar, ainda que fundadonum provimento cautelar, não implique satisfação do direito de crédito, “ma servameramente acautelarlo”.110

Mas alguém poderia dizer que a tutela, embora realize o direito material, acautela asentença. Ora, supor que a tutela antecipada acautela a sentença configura completodesprezo pelo direito material e inacreditável valorização da técnica processual. Se oprocesso é instrumento para a realização do direito material, é evidente que as técnicasprocessuais devem ser pensadas nesta dimensão. Se a técnica de antecipação realiza odireito material, é absurdo pensar que está acautelando outra técnica de prestação dodireito material, a menos que se pense que o direito material apenas pode ser realizadopela sentença.

Aliás, o desvio que leva a supor que a tutela antecipada é cautelar também deriva dafalsa ideia de que toda tutela anterior à declaração do direito – que ocorreria na sentença– constitui tutela cautelar, pouco importando a sua função e, assim, o que acontece com odireito material. Porém, a tutela antecipada de soma realiza o direito material do mesmomodo que a sentença condenatória seguida de execução. O direito é obviamente realizadoe não apenas acautelado quando a soma buscada mediante a ação é desde logo entregue aoautor.

Na verdade, o equívoco do raciocínio que conclui que a tutela antecipada é cautelarfica ainda mais evidente quando não se vê que a antecipação de soma realiza o própriodireito buscado através da ação, protegendo um direito conexo ao direito almejado, comocorretamente observou a doutrina alemã para demonstrar que o arresto cautelar não ésuficiente para tutelar quem necessita receber judicialmente soma em dinheiro.

4.4. Irreversibilidade dos efeitos jurídicos da decisão

O § 3o do art. 300 afirma que “a tutela de urgência de natureza antecipada não seráconcedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”. Não seriapreciso dizer que irreversibilidade dos efeitos jurídicos e irreversibilidade dos efeitosfáticos da decisão são coisas que não se misturam se não fosse a confusão, que semprereinou na doutrina e nos tribunais, entre a estrutura e a função da tutela antecipada.

No direito francês, o ab-rogado art. 809,111 que afirmava que o référé não pode causar“préjudice au principal”, foi interpretado no sentido de que a tutela de cognição não podeincidir de modo irreversível na esfera jurídica do demandado. A interpretação ecooutambém na Itália e – como alerta Tommaseo – ainda é responsável por algumas decisõesque negam a possibilidade da concessão de um “provvedimento d’urgenza” que,antecipando os efeitos da sentença de mérito, conduza à satisfação integral da pretensãodo requerente, reintegrando o trabalhador no emprego ou, ainda por exemplo, restituindoantecipadamente um bem.112

O novo Código de Processo Civil francês eliminou os equívocos que a antiga fórmula do“préjudice au principal” havia feito surgir. Considera-se agora o art. 488, que diz que“l’ordonnance de référé n’a pas au principal l’autorité de la chose jugée”.113 Ainterpretação que se dá a esta regra é no sentido de que a tutela de cognição sumária nãopode prejudicar a cognição exauriente do mérito ou não pode vincular o juízo final; nãopode, em resumo, prejudicar a decisão da causa.114 A tutela antecipada, assim como oréféré francês, não pode causar “préjudice au principal”, ou “n’a pas au principal l’autoritéde la chose jugée”.115 Porém, não há contradição entre provisoriedade da decisão, em vistada cognição sumária que lhe é própria, e tutela antecipada ou realização antecipada dodireito. A tutela é provisória apenas e tão somente porque o juiz, ao concedê-la, nãoafirma que o direito existe e, portanto, não pode prejudicar a decisão sobre o direito combase em cognição mais aprofundada. A decisão que concede a tutela antecipada não podeproduzir efeito capaz de impedir outro juízo sobre o direito ou mesmo um efeito que,embora possa admitir decisão com sentido contrário, é incompatível com a situação dedireito substancial tutelanda.

A provisoriedade da tutela antecipada deve ser entendida como a sua incapacidade dedefinir a controvérsia, por absoluta falta de idoneidade para a declaração ou, em outrostermos, para a produção de coisa julgada material.116 Mas a satisfatividade da tutelasumária, e mesmo a eventual irreversibilidade dos seus efeitos fáticos, não é contraditóriacom a sua estrutura. Nada impede que uma tutela que antecipe a realização do direito eproduza efeitos fáticos irreversíveis seja – do ponto de vista estrutural – provisória, oumelhor, incapaz de dar solução definitiva ao mérito.

O que o § 3o do art. 300 veda quando afirma que a tutela de urgência “não seráconcedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão” é, além deprejuízo ao juízo final, a criação de determinados efeitos jurídicos incompatíveis com asituação de direito substancial objeto de tutela jurisdicional. Mais claramente, o que seproíbe são determinadas constituições provisórias. Como é evidente, não há comodecretar provisoriamente o divórcio ou desconstituir provisoriamente o casamento,embora seja adequado ordenar, também por exemplo, que um cônjuge se afaste do outro

em vista de decisão de separação de corpos.117

Portanto, ao falar em perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, a normaproíbe, por exemplo, a antecipação da constituição de uma relação de filiação ou aantecipação da desconstituição de um casamento. É certo que é possível, na perspectivatécnico-processual, a antecipação da constituição. Porém, também não há dúvida que éimpossível admitir, de forma generalizada, a antecipação da constituição, já que éinconcebível a tutela antecipada nas ações relativas ao estado ou à capacidade das pessoas.

Perceba-se que a possibilidade técnico-processual da antecipação da constituição nãopode eliminar a inviabilidade de constituição provisória diante de certas situações dedireito substancial. Ou seja, a impossibilidade da constituição provisória nada tem a vercom a técnica processual. Assim, pouco importa se a sentença que desconstitui ocasamento pode ser objeto de ação rescisória.

Como é obvio, todas as sentenças constitutivas ou declaratórias podem, em tese, serobjeto de ação rescisória, assim como nada impede a antecipação da constituição em umaperspectiva apenas processual. Mas o fato de uma sentença produtora de coisa julgadamaterial poder ser objeto de ação rescisória não significa, apenas por isto, que a tutela porela concedida pode ser objeto de antecipação ou de “execução provisória”.

Quando se sustenta que a antecipação da constituição está proibida em algumashipóteses e não em outras obviamente não se pensa em termos processuais. Apenas nestaúltima perspectiva alguém poderia ser levado a equivocamente concluir que a tutelaantecipada – diante da sentença (des)constitutiva – é sempre ou nunca possível. Aconclusão seria no sentido do tudo ou nada.

Entretanto, como a tutela jurisdicional – e, especialmente, a tutela antecipada –,somente adquire relevância quando compreendida como tutela dos direitos, não há amínima possibilidade de interpretar a regra processual que fala em “perigo deirreversibilidade” sem visualizar a situação de direito substancial objeto de tutelajurisdicional. Melhor explicando: o fato de o art. 300, § 3o, do Código de Processo Civil nãoter aludido aos casos em que a constituição não pode ser antecipada não permite concluirque ela jamais poderá ser antecipada nem que ela sempre poderá ser antecipada. É poressa razão, absolutamente lógica, que se afirma que a antecipação não pode ocorrer nasações relativas ao estado ou à capacidade das pessoas.

Contudo, para a adequada interpretação do § 3o do art. 300 não basta afirmar que atutela antecipada não pode prejudicar o juízo de cognição exauriente nem criardeterminadas situações jurídicas. É também necessário deixar claro que a tutelaantecipada pode produzir efeitos fáticos irreversíveis.

4.5. A irreversibilidade dos efeitos fáticos é uma consequência inerente à naturezada tutela antecipada

Disse Cândido Dinamarco, em livro escrito quando se debatia a regra que falava em“perigo de irreversibilidade do provimento antecipado” no código de 1973: “É precisoreceber com cuidado o alvitre de Marinoni, para quem se legitimaria o sacrifício do direitomenos provável, em prol da antecipação do exercício ‘de outro que pareça provável’. Odireito não tolera sacrifício de direito algum e o máximo que se pode dizer é que algumrisco de lesão se pode legitimamente assumir. O direito improvável é direito que talvezexista e, se existir, é porque na realidade inexistia aquele que era provável”.118

No caso da tutela antecipada, é claro, ainda não se sabe se o direito afirmado pelo autorexiste ou não existe. É por isso que há tutela do direito provável. Falar de sacrifício do

existe ou não existe. É por isso que há tutela do direito provável. Falar de sacrifício dodireito improvável não seria correto para Dinamarco porque “o direito improvável édireito que talvez exista e, se existir, é porque na realidade inexistia aquele que eraprovável”. Ora, a alusão a um direito improvável já traz em si a ideia de que o direito podeexistir. O que poderia ser dito, e com razão, é que o direito material não pode serqualificado de “provável” ou de “improvável”, pois ele existe ou não existe. Porém, a“existência” do direito é algo que pertence ao plano do direito material. Quando se estádiante do processo civil e, em particular, do juízo sumário, está em jogo a probabilidadeda existência do direito afirmado e, portanto, o “direito provável”, que é uma categoria,assim como a do “direito líquido e certo”, pertencente ao direito processual. A razão queimpediria alguém de falar em sacrifício do direito improvável também estaria banindo,para sempre, a já consagrada locução fumus boni iuris. Afinal, se é impossível sustentar queum direito improvável pode ser prejudicado porque o direito pode existir é tambémimpossível falar em tutela de direito com base em “fumus boni iuris” porque o direito podeinexistir.

Não há razão para não admitir tutela antecipada que possa gerar efeitos fáticosirreversíveis, pois a tutela cautelar não raramente produz tais efeitos.119 Lembre-se, aliás,que a liminar do interdito possessório constitui hipótese clara de tutela jurisdicional quepode produzir efeitos fáticos irreversíveis. Como deveria ser óbvio, não só conceder, mastambém deixar de conceder tutela de urgência pode causar prejuízos irreversíveis.120

Admitir que o juiz não pode antecipar a tutela, quando a antecipação é imprescindívelpara evitar um prejuízo irreversível ao direito do autor, é o mesmo que afirmar que olegislador obrigou o juiz a correr o risco de provocar um dano irreversível ao direito quejustamente lhe parece mais provável.121Ora, se o autor, além de ter que demonstrar aprobabilidade do direito, deve frisar o perigo de dano, não há como deixar de tutelar odireito mais provável. Não só a lógica, mas também o direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva, exigem a possibilidade de sacrifício, ainda que de forma irreversível, deum direito que pareça improvável em benefício de outro que pareça provável. Casocontrário, o direito que tem a maior probabilidade de ser definitivamente reconhecidopoderá ser irreversivelmente lesado.122 Portanto, a ética da tutela de urgência consiste nosacrifício do improvável em benefício do provável.123

Alguém poderia dizer que não é conveniente dar ao juiz um poder tão amplo.Entretanto, se o juiz da Itália, da França, da Alemanha, da Inglaterra e de outros países –em que os jurisdicionados, em tese, podem suportar com mais facilidade o tempo de demorada Justiça – podem conceder tutelas antecipadas ou sumárias que causem prejuízosirreversíveis ao réu,124 por que o juiz brasileiro estaria impedido de assim proceder? Naverdade, aqueles que temem o juiz brasileiro com o poder necessário para bem cumprir asua função partem de uma premissa – não revelada – não apenas preconceituosa, mastambém ofensiva à Magistratura. Está por detrás do raciocínio que pretende ver o juizamarrado a ideia de que a Magistratura brasileira não é suficientemente preparada para terpoder. Tal maneira de pensar não só é arbitrária, como também primária. Ora, se o juizbrasileiro, apenas em virtude da diferença entre a situação social do Brasil e a dos paíseseuropeus, não tem poder para aplicar um remédio essencial para a boa prestação dajustiça, o médico brasileiro (apenas para tomar um exemplo) deveria estar impedido deutilizar instrumentos – que podem trazer riscos aos pacientes quando mal administrados eque, por isso, também supõem profissionais bem preparados – necessários para amanutenção da vida dos brasileiros.

Na realidade, não se está dando nada ao juiz, já que o poder para a prestação da tutelajurisdicional efetiva é inerente à sua função.125 O que acontece é que alguns querem umjuiz que não é “juiz”, mas um simples burocrata. A ideologia que se esconde atrás dessasideias é bastante antiga, podendo-se dizer que deita raízes no liberalismo europeu do

século XIX. O juiz francês anterior à Revolução Francesa, como se sabe, tinha maissemelhança com o juiz inglês do que com o seu outro parceiro do direito continentaleuropeu. Basta lembrar que o sistema judicial francês era considerado rival do direito dogoverno central de Paris. A Revolução Francesa e o dogma da separação dos poderes126 éque restringiram a função do juiz francês, tornando-o um mero servidor público. Essaimagem do juiz burocrata, construída sobretudo pelo direito liberal clássico, enraizou-sepelo direito continental europeu e no direito da América Latina e ainda é a responsávelpela passividade e pela falta de poder do juiz.127

Um juiz sem poder é um juiz sem responsabilidade social ou, pelo menos, comresponsabilidade social limitada. O juiz pode tomar consciência da sua responsabilidadeperante a sociedade quando tem poder. É claro que, nessas circunstâncias, também crescea responsabilidade dos cursos preparatórios para o ingresso na Magistratura, que devemser capazes de dotar os magistrados de conhecimentos culturais, sociológicos eeconômicos que os esclareçam sobre o significado político da Magistratura e sobre anecessidade de uma postura crítica diante de uma sociedade que a cada dia se torna maiscomplexa e rica em diversidades.

É inegável que a tutela antecipada que pode causar um prejuízo irreversível requerprudência. Mas ninguém está autorizado a confundir prudência com medo. A tutelaantecipada deve ser utilizada nos limites em que é necessária para evitar ato contrário aodireito ou dano e, em casos excepcionais, até mesmo produzindo efeitos fáticos irreversíveis,já que o juiz, por lógica, não pode permitir prejuízo irreversível ao direito provável sob ajustificativa de que a sua decisão não pode causar prejuízo irreversível ao direitoimprovável. Isso seria obrigar a jurisdição a tutelar o direito improvável!

5. Pressupostos das tutelas cautelar e antecipada

5.1. Perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo

O legislador deixou de falar em “fundado receio de dano irreparável ou de difícilreparação” (art. 273, CPC/73). Alude agora a perigo de dano e a risco ao resultado útil doprocesso. São expressões destituídas de exato conteúdo técnico-jurídico. Servem apenaspara evidenciar que no curso do processo pode ocorrer gravame que ponha em risco i) aefetividade da tutela do direito (cautelar), ii) a situação objeto das tutelas declaratória e(des)constitutiva (cautelar), e iii) o direito que se pretende tutelar ou um direito a eleconexo (antecipada).

A tutela cautelar supõe que a situação tutelável ou a tutela devida ao direito materialestejam expostas a perigo. É o que pode ocorrer, por exemplo, quando o executado passa apraticar atos que evidenciam intenção de tornar infrutífera a eventual e futura execuçãoda sentença de condenação ao pagamento de soma. No caso, temendo o autor pelainefetividade da tutela final, poderá requerer tutela cautelar de arresto para que, em casode reconhecimento do direito material, a tutela do crédito pecuniário tenha efetividade.Nesta situação, o perigo de dano se liga à inefetividade ou à inutilidade da tutela do direitoalmejada através da ação a ser proposta ou já em curso.

Suponha-se, agora, uma ação voltada a declarar que os bens de uma sociedade, acimade determinado valor, não podem ser alienados sem a concordância de todos os sócios. Orumor, no seio da sociedade, de que dois de seus administradores estão em vias de alienarum bem, representa perigo de dano à situação jurídica objeto da tutela declaratória,abrindo oportunidade à exigência de tutela de segurança (cautelar) do patrimônio social.

O perigo de dano também pode legitimar a tutela antecipada. Assim, admite-se a

antecipação da tutela para evitar dano ao bem que se pretende ver entregue ao final doprocesso. Porém, a tutela antecipada é imprescindível sobretudo para evitar dano adireito conexo ao direito objeto da tutela final e, ainda, para evitar a prática de atocontrário ao direito ou a prorrogação dos efeitos concretos de uma conduta ilícita. Nestaúltima hipótese, como obviamente não há perigo de dano, mas da prática de ato contrárioao direito ou da prorrogação dos seus efeitos concretos, cabe aludir a risco ao resultadoútil do processo – embora se saiba que o legislador, referindo-se a perigo de dano,certamente não quis excluir o perigo de ilícito.

O perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo deve estar fundado emelementos objetivos, capazes de serem expostos de forma racional, e não em merasconjecturas de ordem subjetiva. De qualquer modo, basta evidenciar a probabilidade daocorrência do dano ou do ato contrário ao direito, demonstrando-se circunstâncias queindiquem uma situação de perigo capaz de fazer surgir dano ou ilícito no curso doprocesso.

5.2. Perigo de ato contrário ao direito e da prorrogação dos efeitos concretos daconduta ilícita

A tutela inibitória antecipada não tem como pressuposto perigo de dano. A tutelainibitória antecipada tem como pressuposto perigo de prática, repetição ou continuaçãode ato contrário ao direito no curso do processo. Lembre-se que o dano é consequênciameramente eventual do ato contrário ao direito que a tutela inibitória objetiva impedir.

No caso em que o ato contrário ao direito ainda não foi praticado, devem estarpresentes elementos ou circunstâncias de fato que permitam ao juiz concluir, ainda quecom base em probabilidade, que o ilícito é iminente.128 Quando o ato contrário ao direitojá foi praticado, da sua modalidade e da sua natureza é possível inferir com notávelaproximação a probabilidade da sua continuação ou repetição no futuro.129 Em outraspalavras, nos casos em que o comportamento ilícito se caracteriza como atividade denatureza continuativa – poluição ambiental – ou como pluralidade de atos suscetíveis derepetição – atos de concorrência desleal ou difusão de notícias lesivas à personalidadeindividual –, é mais fácil a constatação do perigo de ilícito.130

Há necessidade de tutela de remoção do ilícito quando é violada uma norma de direitomaterial e os efeitos concretos da transgressão se perpetuam no tempo. É o caso, porexemplo, da exposição à venda de produto nocivo à saúde do consumidor. Nessa hipótese,tanto a tutela final, quanto a tutela antecipada, tomam em consideração um ilícito que jáocorreu. Para a tutela antecipada é suficiente a probabilidade da ocorrência do ilícito,sendo desnecessário demonstrar a probabilidade de ilícito futuro e, muito menos, aprobabilidade de dano. É que a probabilidade da ocorrência do ilícito configura, por si só,a abertura à possibilidade de danos, uma vez que a própria norma de proteção que seafirma violada possui o objetivo de evitá-los. Assim, a probabilidade da violação da normaé o que basta para evidenciar o risco ao resultado útil do processo

5.3. Perigo de dano a direito conexo ao direito à tutela final

Há casos em que se pode temer um dano a direito conexo ao direito à tutela final.Recorde-se, por exemplo, que a vítima de acidente automobilístico que, em virtude dodano sofrido, fica impossibilitada de manter o seu próprio sustento, pode terirreversivelmente prejudicado o seu direito à saúde. O direito à saúde é conexo ao direitoao ressarcimento do dano. Quando se presta imediatamente ressarcimento em pecúnia,ainda que em parte, antecipa-se a tutela ressarcitória para se evitar dano a direito conexoao direito à tutela ressarcitória.131

A jurisprudência italiana, ao admitir a antecipação do pagamento de soma em dinheirocom base no art. 700 do seu Código de Processo Civil, em regra alude à tutela de direitosconstitucionalmente protegidos. Segundo Proto Pisani, o direito patrimonial com funçãonão patrimonial, enquanto destinado a garantir a satisfação de uma necessidade primáriaou de uma “situação de liberdade”, deve ser tutelável através da tutela sumária urgente.132

Nesses casos, o crédito pecuniário, embora ressarcindo antecipadamente o autor,realiza uma função não patrimonial, impedindo dano a um direito conexo ao direito àtutela ressarcitória. Note-se que a tutela antecipa o ressarcimento, ou seja, realizaantecipadamente esse direito, sem objetivar a sua segurança. O direito ao ressarcimento éantecipadamente realizado em razão de perigo de dano a um direito a ele conexo.

Para a valoração do perigo de dano é impossível a não consideração da situaçãoconcreta que diz respeito à parte que pode ser prejudicada. Isso não significa uma“personalização” do prejuízo, mas apenas a necessidade do perigo de dano serconsiderado em relação à pessoa que se diz titular do direito.133

Ainda que a antecipação de soma tenha por fim proteger direitos de conteúdo nãopatrimonial, excepcionalmente pode ser admissível quando o perigo ameaça direitos denatureza patrimonial. Nesses casos, a tutela antecipada somente pode ser concedida casoa violação ou dano objeto da tutela final constitua a causa do perigo de dano ao direitoconexo, o que equivale a dizer que a tutela antecipada de soma não poderá ser deferidaquando não houver uma relação clara de causa e efeito entre a demora na obtenção datutela final e o dano temido.

5.4. Probabilidade do direito

Mas o perigo de dano não é suficiente quando a tutela final não é provável. Trata-se daprobabilidade relacionada à conhecida locução “fumaça do bom direito” ou fumus boniiuris. Para obter a tutela de urgência – cautelar ou antecipada – o autor deve convencer ojuiz de que a tutela final provavelmente lhe será concedida. A admissão de uma convicçãode probabilidade como suficiente à concessão da tutela urgente decorre do perigo dedano, a impor solução e tutela jurisdicional imediatas.

As tutelas antecipada e cautelar são incompatíveis com o aprofundamento docontraditório e da convicção judicial, uma vez que estes demandam porção de tempo queimpede a concessão da tutela de modo urgente.

Note-se que o juízo de probabilidade é inerente à tutela de urgência. Se a tutela dodireito não depende da elucidação de fatos ou se, para tanto, é desnecessária a produçãode prova diversa da documental, o juiz – após ouvir o réu –, mais do que poder formarconvicção de probabilidade, tem convicção que que lhe permite decidir sobre a própriatutela final.

Fala-se que o juiz, ao formar convicção de probabilidade, funda-se em uma cogniçãosumária, que é uma cognição menos aprofundada em sentido vertical, constituindo umaetapa do caminho do magistrado rumo à cognição exauriente da matéria fática envolvidano litígio. O provimento jurisdicional baseado em cognição exauriente garante arealização plena do princípio do contraditório e, desta forma, aguarda o tempo necessáriopara que as partes apresentem alegações e produzam provas. Tal provimento não admitea postecipação da discussão do litígio e, por assim dizer, da busca da “verdade e dacerteza”.

Mas se é indiscutível que a probabilidade é suficiente para a tutela de urgência, éindispensável perceber que a probabilidade se relaciona com os pressupostos da tutela

que se pretende obter ao final. Ou seja, tanto para a tutela cautelar quanto para a tutelaantecipada é imprescindível ter em consideração os verdadeiros pressupostos da tutelafinal – dano, inadimplemento, probabilidade de ilícito, ilícito já praticado etc. Embora issoseja óbvio, o certo é que as decisões judiciais costumam apenas afirmar que háprobabilidade ou fumus boni iuris – sem invocar quaisquer pressupostos da tutela final.

Como é evidente, quando a norma se refere a “elementos que evidenciem aprobabilidade do direito”, há de se ter presente a necessidade de tomar em conta asprovas, presunções, regras de experiência e argumentos que evidenciam a probabilidadedos pressupostos para a tutela (final) do direito.

6. Tutelas nas formas antecedente e incidente e momento para a concessão da tutelaincidente

6.1. Tutelas cautelar e antecipada nas formas antecedente e incidente

O art. 299 afirma que a tutela “provisória” pode ser requerida ao juiz da causa e,quando antecedente, ao juiz competente para conhecer do pedido principal. É certo que oart. 299 contém um erro de redação, na medida em que apenas a tutela de urgência podeser requerida na forma antecedente. Seria absurdo admitir tutela da evidência na formaantecedente. Quer dizer que, no lugar de tutela provisória, deve-se ler tutela de urgência.

Comparando-se com o sistema do código de 1973, a tutela cautelar, embora ainda possaser postulada na forma antecedente (art. 305 a art. 310, CPC), agora pode ser requerida nocurso do processo. Aliás, isso foi proposto em sede doutrinária há mais de vinte anos.134

No entanto, o código de 2015 admitiu tutela antecipada incidente (como ocorria no códigode 1973) e também na forma antecedente (arts. 303 e 304, CPC), ou seja, antes darealização do “pedido principal”.

Quando as necessidades da prática forense – especialmente nos anos 80 do séculopassado – levaram os advogados a requerer a antecipação da tutela final sob as vestes detutela cautelar, logo surgiu o problema da desnecessária duplicação de procedimentospara a obtenção de uma única tutela do direito. A prática forense evidenciou váriashipóteses em que processos rotulados de “cautelar” perdiam qualquer sentido após aconcessão da tutela satisfativa do direito sob o rótulo de “liminar cautelar”. Lembre-se quea prática aceitou a tese de que a ação cautelar podia substituir o mandado de segurançauma vez escoado o seu prazo decadencial. O que era direito líquido e certo setransformava, em passe de mágica, em fumus boni iuris. Porém, passada a fase propícia àconcessão da liminar, por inexistir necessidade de elucidação de matéria de fato o juizrestava em condições de proferir sentença capaz de produzir coisa julgada material. Ouseja, a “ação cautelar” seria suficiente para a resolução definitiva do mérito e para aconcessão de tutela satisfativa. Como no código de 1973 a obtenção de tutela cautelarobrigava a propositura de ação principal, percebia-se facilmente a inutilidade desta açãoquando se tinha clara consciência de que a ação rotulada de cautelar era travestida parapossibilitar o requerimento de liminar (de tutela antecipada). Nestes casos, a “açãoprincipal” era despicienda e a ação dita cautelar não era cautelar. Na verdade, em todos oscasos em que se obtinha a tutela do direito mediante liminar “cautelar”, a ação principal –cuja propositura, repita-se, era obrigatória – perdia completamente sua utilidade. Ficouclaro que bastaria um procedimento de cognição exauriente em que fosse possívelrequerer tutela antecipada na petição inicial.

O código de 2015 não chegou a admitir um procedimento autônomo para a obtenção datutela antecipada, seguido de um outro procedimento para o alcance da tutela final. Istorealmente seria pouco mais do que absurdo. Porém, para atender a uma situação

excepcional – a da impossibilidade de o advogado preparar a petição inicial da ação deconhecimento diante da urgência na obtenção da tutela –, o código complicou as coisas,abrindo oportunidade para o requerimento de tutela antecipada na forma antecedentemediante a simples “indicação do pedido de tutela final” (art. 303, caput, CPC). Neste caso,afirma-se que, no caso de concessão da tutela antecipada, o autor terá que “aditar apetição inicial com a complementação de sua argumentação, a juntada de novosdocumentos e a confirmação do pedido de tutela final” (§ 1o, I, do art. 303, CPC).

É possível que o legislador tenha imaginado que a parte, em determinados casos, possanão ter tempo para apresentar ao seu advogado os documentos necessários para afinalização da petição inicial. Contudo, a permissão de aditamento para a formulação de“pedido principal”, em virtude da falta de documento, obviamente não gera umapresunção da sua existência, viabilizando só por isso a formação de convicção deprobabilidade capaz de dar ensejo à concessão da tutela antecipada. Portanto, seria muitomais racional admitir ao advogado protestar pela juntada de procuração e de documentos,demonstrando que não pode obtê-los em tempo hábil.

O problema é que o requerimento de tutela antecipada mediante petição inicial“inacabada” infelizmente poderá ser generalizado na prática forense, na medida em que“urgência contemporânea à propositura da ação” é algo que não pode ser medido comprecisão. Isso permitirá, caso não haja rigor judicial, que a parte possa, mascarando asituação de urgência, pedir tutela antecipada sem correr qualquer risco de ser vencido noprocesso – na medida em que, para a extinção do processo quando a tutela antecipada éindeferida, basta o não aditamento da petição inicial (art. 303, § 6o, CPC).

Vale dizer que, no sistema do código, o autor não só tem direito de pedir tutelaantecipada sem devidamente argumentar e apresentar documentos; tem também poder deextinguir o processo mediante simples inércia, evitando a resolução do litígio com força decoisa julgada. Isso certamente milita contra o sistema de distribuição de justiça, poisestimula o requerimento de tutela antecipada destituído de bom fundamento, ou melhor,estimula o litigante a pedir tutela antecipada sem qualquer risco de perder, lembrando-seque o requerente sempre poderá propor ação e requerer a mesma tutela antecipadacontra o mesmo réu, bastando-lhe apresentar nova prova ou a prova que faltou paraconvencer o juiz da probabilidade do direito ou do perigo de dano.

6.2. Momento de concessão da tutela urgente incidental

6.2.1. Tutela de urgência antes da ouvida do réu

De acordo com o art. 300, do Código de Processo Civil, “a tutela de urgência pode serconcedida liminarmente ou após justificação prévia”. Tanto a tutela antecipada quanto atutela cautelar não podem privar-se da possibilidade de concessão antes da ouvida dodemandado.

A efetividade da tutela de urgência pode exigir o adiamento ou a postecipação docontraditório e do esclarecimento dos fatos. Como já declarou a Corte Constitucionalitaliana, a tutela de urgência representa um componente essencial e ineliminável da tutelajurisdicional nos limites em que necessária para neutralizar um perigo de dano.135 Apostecipação do contraditório não é possível apenas quando o dano ou o ilícito podemocorrer imediatamente ou antes da ouvida do réu, mas também quando, dando-se prazopara o réu se manifestar, haverá oportunidade para a frustração da própria finalidade datutela (suspicio de dilapidatione bonorum seu de fuga), retirando-se a sua capacidade deatender ao fim almejado.136

Nicolò Trocker reconhece que a validade destes motivos foi acolhida peloBundesverfassungsgericht alemão, mas que este advertiu que, por se tratar deinterferência na esfera jurídica de alguém, a derrogação ao princípio geral da audiênciaprévia somente pode ser admitida quando resultar indispensável (unabweisbar) para oalcance da própria tutela.137 Em outras palavras, a concessão da tutela de urgência antesda ouvida do réu somente é possível quando há motivo suficiente para fazer o juiz crerque o adiamento do seu deferimento para depois do momento oportuno à defesaobstaculizará a tutela do direito.

A concessão da tutela de urgência antes da ouvida do réu é excepcional e assim deveser tratada. É preciso atentar para o fato de que o deferimento da tutela inaudita alteraparte restringe o direito fundamental de defesa e que isto apenas tem legitimidade quandoo direito fundamental de ação, sem a emissão da tutela, não pode encontrar efetividade nocaso concreto.138

6.2.2. Justificação prévia para a concessão da tutela de urgência

Mas a tutela de urgência também pode ser concedida antes da ouvida do réu mediante“justificação prévia”. Essa justificativa é adequada especialmente quando a ouvida dodemandado pode tornar a tutela ineficaz.

Como o juiz, diante da urgência e da consequente necessidade da concessão da tutelade urgência antes da ouvida do réu é obrigado a formar a sua convicção apenas com basenos argumentos do autor, é natural que, em situações faticamente mais complexas edelicadas, tenha que exigir a justificação da situação fática que ampara o pedido de tutelade urgência.

Esta justificação, em princípio, é feita sem a presença do réu. Porém, como a tutela éconcedida inaudita altera parte porque o prejuízo pode ocorrer durante o temponecessário para a ouvida do réu ou porque este, ao ser citado, pode frustrar a suaefetividade, não há racionalidade em admitir tutela de urgência sem a ouvida dodemandado quando há tempo para convocá-lo para participar da justificação e não háperigo de inutilização da efetividade da tutela. Portanto, apenas quando não há tempopara convocar o réu para a justificação prévia ou esta convocação possa permitir-lhepraticar ato capaz de frustrar a utilidade da tutela é que se legitima a justificação sem apresença do réu.

Quanto à forma de participação do réu na justificação ou ao significado de ouvida doréu na justificação, é preciso estar atento à circunstância de a justificação prévia ser atomediante o qual o juiz busca esclarecimento acerca da situação fática que ampara opedido de tutela de urgência, constituindo espaço processual em que o autor devedemonstrar os pressupostos para obtê-la. Assim, o réu não tem oportunidade deapresentar defesa ou de produzir provas na justificação, embora tenha a possibilidade decontraditar as testemunhas e de impugnar a idoneidade do especialista – afirmando-osuspeito ou impedido –, assim como de formular perguntas às testemunhas e aoespecialista com o objetivo de suprir omissões ou eliminar contradições eventualmentepresentes nos depoimentos testemunhais e nos esclarecimentos técnicos.

6.2.3. Tutela de urgência na sentença

A sentença produz efeitos na pendência da apelação quando, além de confirmar ourevogar a tutela provisória – cautelar, antecipada ou da evidência –, concede-a (art. 1.012,§ 1o, V). No código de 1973, afirmava-se que a sentença tinha eficácia na pendência daapelação na hipótese de confirmação da tutela antecipada (art. 520, VII, CPC/73), porém

nada se dizia a respeito da possibilidade da sua concessão apenas por ocasião dasentença.139

De modo que o código de 2015, além de ter permitido a tutela da evidência nasentença,140 atentou para a circunstância de que, após a formação de juízo apto a declarara existência do direito, pode estar presente perigo de dano que justifique a concessão datutela de urgência na sentença. Não fosse assim, o juiz poderia negar a tutela urgente porfalta de probabilidade do direito e, depois de realizada a instrução e convencido do direitoe do perigo de dano, não ter possibilidade de concedê-la, o que obviamente não teriaracionalidade.

7. Tutela urgente contra a Fazenda Pública

De acordo com o art. 1.059 do Código de Processo Civil, “à tutela provisória requeridacontra a Fazenda Pública aplica-se o disposto nos arts. 1o a 4o da Lei no 8.437, de 30 dejunho de 1992, e no art. 7o, § 2o, da Lei no 12.016, de 7 de agosto de 2009”. O código de 2015reprisa regras inconstitucionais, voltadas a impedir a concessão de liminar de naturezacautelar e antecipada contra a Fazenda Pública. O art. 1.059 é uma regra que representa oviés autoritário da maioria parlamentar que o aprovou. Imaginou-se que, por ser ré aFazenda Pública, seria possível ignorar o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva– exatamente o direito fundamental imprescindível à tutela de todos os demais direitos –,bem como retirar do Judiciário o poder de definir, diante dos casos concretos, quando atutela urgente deve ser concedida para tutelar os direitos.

É certo que o tempo despendido para a cognição do litígio mediante investigaçãoprobatória é reflexo da existência do Estado e da necessidade que ele se impôs de, antes detutelar os conflitos, averiguar a existência dos direitos afirmados em juízo. Mas é reflexoda existência do Estado porque foi este que vedou a autotutela privada, não deixandooutra saída ao jurisdicionado a não ser levar o seu direito a juízo. O Estado, ao estabelecertal proibição, obviamente adquiriu a obrigação de tutelar de forma efetiva e tempestivatoda e qualquer espécie de situação conflitiva concreta. Se o Estado proibiu a autotutelaprivada é correto afirmar que está obrigado a prestar a tutela jurisdicional adequada acada conflito de interesses. Nessa perspectiva surge a resposta intuitiva de que ainexistência de tutela adequada a determinada situação conflitiva significa a próprianegação da tutela a que o Estado se obrigou no momento em que chamou a si o monopólioda jurisdição, já que o processo nada mais é do que a contrapartida que o Estado ofereceaos cidadãos diante da proibição da autotutela.

Tendo em vista que o Estado é obrigado a prestar a devida tutela jurisdicional,entendida como a tutela apta a tornar efetivo o direito material, todos têm direito à tutelajurisdicional efetiva. O jurisdicionado não tem apenas direito à resposta jurisdicional, masdireito à tutela jurisdicional efetiva e tempestiva.141 O Estado, para cumprir a suaobrigação de prestar a devida tutela jurisdicional, deve outorgar ao cidadão o poder deutilizar a técnica processual adequada ao caso concreto. As diferentes situações de direitosubstancial exigem instrumentos processuais – os diversos meios executivos e a técnicaantecipatória – diferenciados ou que se diferenciem no caso concreto.142

Portanto, se uma situação de direito material requer tutela urgente, não é possível queo Estado se negue a prestar a devida tutela jurisdicional, ou seja, a tutela fundada no art.300 do Código de Processo Civil. Tal espécie de tutela permite que o direito material sejatratado de forma diferenciada, segundo as suas necessidades.

Recorde-se que o art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal, afirma o direito fundamental à

tutela jurisdicional efetiva, obrigando o Estado a instituir técnicas processuais idôneas àtutela dos direitos. O cidadão que afirma ter um direito deve ter ao seu dispor as medidase os instrumentos necessários à realização do seu eventual direito.143 Se o direito à tutelajurisdicional efetiva é garantido constitucionalmente, o legislador infraconstitucional éobrigado a estruturar o sistema processual de modo a permitir a efetividade da tutela dosdireitos. Um sistema que não possui procedimento e técnica processual adequados à tutelade uma determinada situação de direito substancial não está estruturado de acordo com aexigência constitucional. Não fosse esta a conclusão correta, seria necessário admitir que ocidadão pode ter direitos, mas não possuir meios para os fazer valer, o que equivale dizer,simplesmente, não ter direitos.144

Se a realidade da sociedade contemporânea não comporta a espera do tempodespendido para a cognição aprofundada do litígio, o direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva está na dependência das tutelas antecipada e cautelar. O legisladorcertamente tem o dever de instituir técnicas processuais que não permitam que o cidadãoseja prejudicado pela demora do processo. Portanto, a lei, ainda que possa disciplinar osprocedimentos, obviamente não pode, sob pena de negação ao direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva, vedar o direito de postulação das tutelas antecipada e cautelar contraquem quer que seja, especialmente contra a Fazenda Pública.

Observe-se que a existência de perigo de dano diz respeito ao mérito cautelar, que deveser apreciado pelo juiz. Significa que o direito à tutela urgente não pode ser suprimido porlei com base na impossível afirmação de que não existirá perigo de dano. Qualquer regraque afirme a proibição de liminar está a dizer que jamais existirá necessidade de tutelaurgente, ou seja, está valorando aquilo que somente pode ser objeto da cognição do juiz.Ora, a lei não tem poder para controlar as situações concretas de perigo. Assim, não podepartir da premissa de que nunca haverá perigo de dano. Bem por isso, ao proibir a tutelaurgente contra a Fazenda Pública, a lei deixa desamparado o particular que, exposto aperigo de dano, necessita das tutelas antecipada e cautelar.145

De acordo com o art. 7.º, § 2º, da Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016/2009), “nãoserá concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditostributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ouequiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagensou pagamento de qualquer natureza”. Ao negar a possibilidade de liminar diante destashipóteses, sem dar ao juiz condições de avaliar as particularidades do caso concreto, a regra– que agora o art. 1.059 do Código de Processo Civil pretende ver aplicada diante da tutelade urgência – incide em inconstitucionalidade.

Não há como afirmar que é possível restringir o uso da tutela antecipada desde que aafirmação de lesão a direito possa vir a ser apreciada ao final do procedimento comum.146

O § 3° do art. 1° da Lei 8.437/92 afirma que “não será cabível medida liminar que esgote,no todo ou em parte, o objeto da ação”. A regra é, em si, equivocada, na medida em queuma liminar jamais pode esgotar o objeto da ação. Basta ver que a liminar ou a tutela deurgente é sempre concedida com base em cognição sumária. Na verdade, o legislador nãosoube dizer o que pretendia. Sabe-se que o legislador quis dizer que a liminar não podesatisfazer antecipadamente (ou com base em cognição sumária) o direito. Porém, como jáclaramente demonstrado, a proibição de tutela antecipada contra a Fazenda Públicarepresenta violação clara ao direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.

Frise-se que a tutela dos direitos diante do uso inadequado do Poder somente se realizaatravés de garantias instrumentalizadas em processos céleres e com expedientesdestinados a tutelar contra o periculum in mora. Como já declarou o Co nselho Superior deMagistratura Italiana,147 é impossível negar que um “juízo” lento, como aquele imposto à

atual organização processual judiciária, dá lugar a fenômenos de compressão dos direitosfundamentais do cidadão.148

8. Prova, convicção e justificativa

8.1. Prova e convencimento

Muitas vezes se fala em prova de probabilidade ou de verossimilhança. O código de1973 aludia a prova inequívoca (art. 273), estabelecendo uma relação entre esta prova eprova de verossimilhança ou de probabilidade. Esse vício deriva da falta de percepção daimportância de distinguir prova e convicção para o desenvolvimento da própria teoria daprova.149

A prova existe para convencer o juiz, de modo que chega a ser absurdo identificarprova com convencimento, como se pudesse existir prova de probabilidade ou prova deverdade. A prova é meio para convencer, de modo que a sua valoração é que podeproduzir convicção de probabilidade ou convicção suficiente para a resolução do litígio.

8.2. Convicção e verossimilhança

A ideia, certamente correta, de que toda certeza jurídica se resolve emverossimilhança, não deve obscurecer o que se quer dizer aqui, pois obviamente não sepretende, nessa altura dos estudos ligados à filosofia do direito, fazer alguém acreditarque o juiz pode penetrar na essência da verdade. Mas o fato de o juiz não poder descobrira “verdade” não o dispensa da necessidade de buscar se convencer a respeito do que sealega em juízo.

É evidente que a impossibilidade de o juiz descobrir a essência da verdade dos fatosnão lhe outorga o direito de definir o mérito sem estar convicto. Estar convicto da verdadenão é o mesmo que encontrar a verdade, até porque, quando se requer a convicção deverdade, não se nega a possibilidade de que “as coisas não tenham acontecido assim”.150

A “convicção da verdade” é relacionada com a limitação humana de buscar a verdadee, especialmente, com a correlação entre essa limitação e a necessidade de definição doslitígios. Para ser mais preciso: o juiz chega à convicção da verdade a partir da consciênciada impossibilidade da descoberta da sua essência, uma vez que é essa que demonstra afalibilidade do processo para tanto. Trata-se, em outros termos, de recordar Calamandreiquando advertiu que apesar de a natureza humana não ser capaz de alcançar verdadesabsolutas, “é um dever de honestidade acentuar o esforço para se chegar o mais pertopossível dessa meta inalcançável”.151

A verossimilhança ou a probabilidade, quando compreendida na linha da teoria doconhecimento, não pode ser colocada no mesmo plano da convicção, pois existe convicçãode verdade e convicção de probabilidade, ainda que ambas, na perspectiva gnoseológica,somente possam resultar em verossimilhança.

Portanto, é preciso também sublinhar a distinção entre convicção (que pode ser deverdade ou de verossimilhança) e verossimilhança em sentido filosófico. O juiz, paradecidir ou sentenciar, deve sempre procurar se convencer, ainda que, em outro sentido, asua decisão ou sentença nunca vá se afastar da verossimilhança.152

8.3. A chamada convicção de “verossimilhança preponderante”

Se existe convicção de verdade e convicção de probabilidade ou de verossimilhança,

cabe explicar a diferença entre as duas. Para tanto, não há como deixar de aludir à teoriade origem sueca que entende que o juiz pode definir o mérito com base na chamada“verossimilhança preponderante”.153 Tal teoria se move a partir da ideia de que a regra doônus da prova não é justa e, assim, não deve prevalecer. A regra do ônus da prova, naperspectiva dessa teoria, não tem qualquer importância como mecanismo de distribuiçãodo ônus probatório e, muito menos, como regra de juízo, mas como uma espécie de réguaque indicaria a parte vencedora. O ônus da prova constituiria o ponto central dessa régua,e assim não pesaria sobre nenhuma das partes; a parte que conseguisse fazer a réguapender para o seu lado, ainda que a partir de um mínimo de prova,154 deveria ganhar acausa, quando então prevaleceria o princípio da “verossimilhança preponderante”.155

A doutrina sueca concluiu que o julgamento dependeria apenas da existência de ummínimo de preponderância da probabilidade, ou seja, de um grau de 51%. Ou seja, se aposição de uma das partes é mais provável que a outra, ainda que minimamente, issoseria suficiente para lhe dar razão. Nesse sentido, ainda que a prova do autordemonstrasse com um grau de 51% a probabilidade ou a verossimilhança da alegação, issotornaria a sua posição mais próxima da verdade, o que permitiria um julgamento maisracional e melhor motivado que aquele que, estribado na regra do ônus da prova,considerasse a alegação como não provada.156

Frise-se que essa tese é ligada à definição do mérito, e não às tutelas proferidas no cursodo processo. Diante disso, ela evidentemente não pode prevalecer, pois não há comoaceitar, ao menos como regra, que o juiz possa julgar o pedido procedente sem estarconvencido de que o autor tem razão. Ou melhor, não há racionalidade em admitir, comoregra, que o juiz pode julgar o pedido procedente com base na verossimilhançapreponderante, pois isso equivaleria a entender que o juiz não precisa se convencer parajulgar.

Não é possível ter a teoria da verossimilhança preponderante como regra capaz deguiar a decisão final do juiz (que define o mérito), embora isso não signifique que a ideiade verossimilhança preponderante não possa prevalecer em determinadas situações,mesmo ao final do processo. Excepcionalmente, a dificuldade de prova e a natureza dodireito material podem justificar a redução das exigências de prova no caso concreto,dando ao juiz a possibilidade de se contentar com a verossimilhança preponderante. Issoocorre, por exemplo, em determinadas situações de direito material em que a prova dacausalidade é extremamente árdua, como acontece nos casos de lesões pré-natais.

Portanto, quando se analisa a convicção judicial é preciso considerar se a causalidadepode ser esclarecida e em que termos. Quando a possibilidade de elucidação não é plena eassim não há como exigir uma “convicção de certeza”, basta a “verossimilhançapreponderante”, sob pena de serem negadas as peculiaridades do direito material e, dessamaneira, a possibilidade de uma efetiva tutela jurisdicional. Sublinhe-se, contudo, que aredução das exigências de convicção, ao final do procedimento, somente pode seradmissível em casos excepcionais; jamais como regra, como pretende a teoria sueca daverossimilhança preponderante.

Não há como entender que o juiz, ao definir o mérito, deve simplesmente dar ganho decausa à parte cujo direito for mais provável. Até mesmo porque, como todos sabem, não épossível medir, em termos matemáticos, a graduação de uma prova ou de um conjunto deprovas, o que eliminaria a possibilidade de justificação racional da “verossimilhançapreponderante” na sentença. A convicção de verossimilhança ou probabilidade somentepode ser racionalmente justificada, ao final do processo, a partir das necessidades do direitomaterial e do caso concreto.

8.4. A convicção de probabilidade diante da postecipação do contraditório

Porém, algo diferente acontece quando se considera a convicção de probabilidadecaracterística à cognição sumária, ou seja, a convicção de probabilidade própria aos juízosque se formam no curso do processo. Esta convicção nada tem a ver com a que deriva daredução do módulo da prova ao final do processo ou com o julgamento do mérito combase em probabilidade – lesões pré-natais, relações de consumo etc. Trata-se, isto sim, daconvicção de probabilidade característica à decisão que postecipa o contraditório, ou seja,da convicção de probabilidade que sustenta a tutela de urgência.

No caso de tutela de urgência, há expressa autorização para o juiz decidir com base emconvicção de probabilidade. Nesse caso, a convicção de probabilidade não decorre dasnecessidades do direito material e do caso concreto, mas de uma regra processual (art.300, CPC) que parte da premissa de que ao juiz é suficiente a convicção de probabilidade.No caso de tutela de urgência basta que a probabilidade seja preponderante.

Decidir com base na probabilidade preponderante significa sacrificar o improvável embenefício do provável. E nem poderia ser diferente, mesmo que não houvesse tal expressaautorização, pois não há racionalidade em negar tutela a um direito que corre o risco de serlesado sob o argumento de que não há convicção de verdade.

8.5. Convicção de probabilidade, racionalidade da decisão e critérios decisionais

Quando se pensa na probabilidade suficiente para a concessão da tutela de urgência –ou da evidência –, o real problema está na racionalidade da decisão judicial, ou melhor, nocontrole da racionalidade da decisão que concede ou não a tutela.157 Essa racionalidadecertamente não pode ser garantida mediante uma artificial e impossível determinação deum grau de probabilidade.

O juiz tem o dever de justificar a decisão que concede a tutela provisória, conforme fezquestão de frisar o art. 298 do Código de Processo Civil. Sucede que o juiz, embora cientedessa necessidade, ressente-se da falta de critérios para explicar “seu convencimento demodo claro e preciso”. Esta falta de critérios também impede o advogado de podercontrolar a decisão do juiz, uma vez que, se a decisão sequer tem adequada justificativa,toma-se impossível argumentar que a decisão é incorreta. Não é por razão diversa que sãocomuns as decisões de primeiro grau que concedem ou negam a tutela urgente semqualquer fundamento idôneo e as decisões de segundo grau que a revogam ou a mantêmsem nada argumentar de forma convincente.

8.6. Justificativa da convicção de probabilidade

Ninguém mais duvida de que o raciocínio probatório não pode ser demonstradomediante o método assiomático-dedutivo, peculiar à matemática, como também é inegávelque as exigências postas pelas novas situações de direito material ampliaram o poderdecisório do juiz, que agora pode decidir no curso do processo apenas com base emconvicção de probabilidade. Porém, isso obviamente não pode conduzir à ideia de que o juiznão pode ser controlado. A garantia da motivação das decisões tem relação com anecessidade de controle do juiz, que deve justificá-las não só para legitimar o exercício doseu poder, mas também para dar às partes a possibilidade de compreendê-las e impugná-las perante os tribunais. Em outras palavras, aceitar uma decisão sem justificativa é omesmo que impedir a adequada participação das partes e retirar a legitimidade do PoderJudiciário.158

O juiz, ao valorar a credibilidade das provas, ao estabelecer a ligação entre as provas eos fatos e ao valorar as presunções e o conjunto probatório, submete o seu raciocínio a

sistemas e critérios racionais, embora não possa explicá-los através da lógica matemática.Tais critérios permitem-lhe decidir e justificar a sua decisão, embora muitas vezesnecessitem da adição de outros, próprios ao método sistemático, como os da coerência eda congruência, capazes de também auxiliar na decisão judicial.

A tutela provisória requer convicção de probabilidade. Porém, se o juiz não podedeixar de conceder a tutela de urgência com base no argumento de que o autor não seeximiu do ônus da prova, na hipótese típica de tutela da evidência os fatos constitutivossão incontroversos e a dúvida recai sobre as alegações de fatos impeditivos, modificativosou extintivos – cujo ônus da prova é do réu. Tratando-se de tutela da evidência, aprobabilidade em regra diz respeito à defesa de mérito indireta. E nesse caso aprobabilidade deve ser de que a defesa é infundada ou não será acatada.

A tutela de urgência apresenta-se necessária quando a posição do autor estágravemente fragilizada, já que está sendo ameaçada por perigo de dano. Para tornarpossível a sua proteção, outorgou-se expressamente ao juiz a possibilidade de decidir combase em probabilidade, o que significa que ele está proibido de pensar em uma convicçãode verdade, própria à regra do ônus da prova. Para a concessão da tutela de urgência,basta-lhe a convicção de probabilidade preponderante, isto é, que o material trazido aoprocesso indique que o direito do autor é mais provável do que o do réu.

Mas na tutela de urgência também assumem importância: i) as razões que levaram ojuiz a acreditar, ou não, na prova; ii) a ligação que o juiz estabeleceu entre as provas e osfatos; iii) os motivos que levaram o juiz a estabelecer, ou não, uma presunção; e iv) aconsideração das regras de experiência que guiaram o raciocínio judicial. Assim, nadasignifica dizer, seca e simplesmente, que há, ou não, probabilidade, pois essa convicção deveresultar da justificativa da decisão. Grosso modo, é preciso descrever o fato probando e asprovas produzidas, explicar a relação entre as provas e os fatos – inclusive indiciários – e arelação entre os fatos indiciários provados e o fato probando, além de deixar claras asregras de experiência – e os seus fundamentos – que conduziram o raciocínio judicial.

Observa-se que, na prática forense, não se dá importância para a definição de fatoindiciário e, consequentemente, para os raciocínios (presuntivos) que são feitos – namaioria das vezes de forma despercebida – ligando os fatos indiciários ao fato probando.Mais especificamente, nota-se uma completa desatenção para com as regras deexperiência que fundamentam os raciocínios destinados a fixar as presunções. Porém, asregras de experiência e os raciocínios presuntivos não só devem ser claramenteexplicitados, como devidamente fundamentados como aptos à formação das presunções.Se o juiz deve julgar com base em critérios racionais, não há como a motivação esquecer dedemonstrar a racionalidade das regras de experiência, sejam comuns ou técnicas.

Tudo isso quer dizer que a justificativa deve explicar o desenvolvimento do raciocínioque conduziu à decisão, e não apenas enunciar o seu resultado. Com efeito, poucoesclarece dizer que há ou não probabilidade sem explicar os motivos desseconvencimento.

A peculiaridade da decisão da tutela urgente está em que todos esses critérios deconvencimento, como o da relação entre a prova e os fatos e o da relação entre os fatosindiciários e o fato probando, não exige o esgotamento da regra do ônus da prova, pois aquiela deve ser vista como uma régua – como queria a doutrina escandinava daverossimilhança preponderante159 – que, fixando-se no grau 50, aponta em favor do autorquando inclina para a direita (de 50 para cima) e, em favor do réu, quando pende para aesquerda (de 50 para baixo).

Por isso, são relevantes cada um dos critérios antes apontados e, consequentemente, os

motivos que levaram à conclusão de probabilidade ou verossimilhança da posição de umaparte ou outra. Ou melhor, a motivação da decisão urgente deve ser tão racional quanto ada sentença, com a única diferença de que deve justificar apenas uma convicção deprobabilidade.

Frise-se que a justificação tem valor em si mesma, uma vez que dela depende aidoneidade da decisão. Ou seja, para se ter uma decisão como idônea, é preciso verificar aracionalidade da sua justificação, que objetiva explicar a racionalidade dos raciocíniosprobatório e decisório.

8.7. Critérios para o controle da racionalidade do discurso baseado na convicção deprobabilidade

Contudo, a circunstância de os critérios há pouco lembrados eventualmente nãopoderem levar à convicção de probabilidade não significa dizer que o juiz deva parar aíou que não tenha outros critérios para se convencer. Quando tais critérios levam a duasversões igualmente aceitáveis – o que também pode ocorrer na sentença –, devem seraplicados os critérios da coerência e da congruência.160

O primeiro desses critérios quer expressar que a narrativa judicial deve ser coerente, eassim não pode conter ilogicidades, como a de aceitar um fato como verdadeiro e falso aomesmo tempo, admitir fatos entre si incompatíveis, utilizar uma regra de experiência emuma situação e a negar em outra – sem que entre elas exista qualquer motivo paradiscriminação – ou se valer de regras de experiência incompatíveis.161

Ademais, além de ausente de contradições, a versão judicial não pode negar uma provaou um fato provado ou aceitar um fato afirmado, mas não provado. Nesse último contexto,a narrativa do juiz não pode ser incompleta ou “supra-abundante”.162

Esclareça-se, porém, que a coerência e a congruência podem ser utilizadas para guiar oraciocínio do juiz rumo à decisão – quando podem ser utilizados como testes para aescolha da melhor versão das partes ou para a definição da própria versão judicial – ouvistas como critérios que devem qualificar a justificativa e servir para o seu controle porparte do tribunal.163

Assim, por exemplo, a falta de lógica da versão de uma das partes pode implicar aescolha da outra ou a definição de uma terceira, quando o critério integrará o raciocíniodecisório. Mas, a justificativa também deve ser coerente e congruente, razão pela qual otribunal pode, através de recurso e fundado nesses critérios, não aceitar a justificativa dojuiz. No primeiro caso, a coerência constitui critério de decisão, enquanto que, no segundo,integra a justificação ou o raciocínio justificativo.

Note-se que a circunstância de uma prova apontar para duas versões nada tem a vercom falta de coerência ou congruência, uma vez que essas duas últimas não se referem àprova, mas sim à narrativa (ao discurso). A incoerência está no interior da narrativa queaceita dois fatos incompatíveis. Ou seja, enquanto os fatos incompatíveis estão na prova, enão na narrativa, não há que se pensar em incoerência.

Quando uma prova aponta em dois sentidos, isso não quer dizer que essa seja inútil,pois pode permitir que a convicção se forme em um dos sentidos, especialmente nadimensão da verossimilhança preponderante. Ou melhor, o fato de uma prova apontar emdois sentidos apenas pode tomar mais difícil a elaboração da convicção, mas, justamentepela razão de que pode formar ou colaborar para formar a convicção, não pode serdescartada ou simplesmente conceituada como “imprestável”.

8.8. Convicção de probabilidade e caso concreto

A consciência de que a convicção, apesar de não se submeter à lógica matemática, deveser demonstrada através de argumentos capazes de justificar racionalmente a decisãojudicial, enterra de vez por todas a ideia de pensá-la à distância do direito material e doscasos concretos.

Todo o percurso do raciocínio que leva à decisão se funda em critérios racionais quedevem ser devidamente explicitados e justificados. Esses critérios, como é evidente, sãomuito mais complexos e sofisticados do que as simplistas ideias que partem dopressuposto de que a convicção pode ser medida em graus.

Tais critérios, assim como a sua justificativa, encontram plena racionalidade quandoconectados ao direito material e ao caso concreto a que devem servir. Aliás, a obviedade deque as necessidades do direito material e dos casos concretos são várias é que aponta paraa impossibilidade de se definir, segundo critérios matemáticos, o grau exato de convicçãoque deve presidir a tutela de urgência.

Diante disso, a única coisa que se pode definir, em princípio, é que a convicção do juiz,em razão de a decisão ter que ser tomada mediante cognição sumária – no curso doprocesso – em virtude de perigo de dano, deve seguir a lógica da probabilidadepreponderante. Não é preciso dizer que isso está muito longe das ideias de graduação daconvicção e de restrição da prova capaz de gerá-la, até porque essa maneira de pensarinviabilizaria a própria elasticidade que deve marcar a tutela de urgência e, assim, a suapossibilidade de atender de forma adequada aos vários casos conflitivos concretos.

8.9. A importância da identificação da tutela do direito a ser antecipada para aracionalização da convicção de probabilidade

Evidenciada a necessidade de relacionar a convicção de probabilidade com o casoconcreto, cabe esclarecer algo que nunca foi bem considerado, certamente pelo péssimovezo de se pensar o processo – e assim a prova etc. – como instituição neutra e indiferenteao direito material e ao caso concreto.

Quando a tutela jurisdicional (final) é realmente olhada pelo ângulo do direitomaterial, torna-se fácil perceber que ela pode ser repressiva ou preventiva, isto é,posterior ou anterior à violação do direito, o que obviamente também acontece com atutela antecipada.

O que atrapalha tudo, e é reflexo do que acaba de ser denunciado, ou seja, de seimaginar que as categorias do direito processual podem ser tratadas e conceituadas comose dissessem respeito somente ao processo, é a tentativa de dissolver o conteúdo da tutelaantecipada na suposição de que não seria preciso identificar as peculiaridades e ospressupostos das diferentes tutelas fundadas em perigo, bastando conceituá-las comotutelas “de urgência” – que, assim, deixaria de ser um gênero que engloba diferentesrealidades para poder ser vista como uma categoria homogênea.

Acontece que a ideia de tutela de urgência não pode explicar como o processo trata dodireito material e dos casos concretos. A falta de identificação das tutelas que dãocomposição ao gênero “tutela de urgência” elimina a possibilidade de se explicar aconvicção de probabilidade e a justificação da decisão antecipatória, pois essas não sãouniformes, ao contrário do conceito de urgência.

A circunstância de a tutela antecipada, na perspectiva processual, poder ser conceituadacomo urgente, não pode obscurecer o fato de que a tutela urgente pode ser repressiva e

preventiva (inibitória) e as importantes implicações que essa constatação tem para o temada fundamentação das decisões de cognição sumária.

8.10. A convicção de probabilidade diante das várias tutelas de direito que podemser antecipadas

Lembre-se de que a ação inibitória é voltada para o futuro, pois preocupada com o quevai acontecer ou mais precisamente com a ameaça da prática, da repetição ou dacontinuação de um ato contrário ao direito.164 Por isso, a tutela inibitória – final ouantecipada – deve ser prestada antes da prática do ato ilícito temido.

É preciso recordar que a própria tutela inibitória final se contenta com a probabilidadeda prática do ato temido e que a aceitação da redução da convicção do juiz, nesse caso,resulta do direito material, ou melhor, da irracionalidade de se exigir uma convicção de“verdade” sobre um fato futuro. Note-se que a convicção de probabilidade está centrada napresunção decorrente da ligação entre a prova do fato passado e o fato temido. Em outraspalavras, deve haver prova do fato passado (indiciário) e, em virtude desta, convicção deprobabilidade da prática do fato temido.

Assim, no que respeita a ação voltada a impedir a repetição ou a continuação do ilícito,o juiz deve estar convicto de que o demandado já praticou ou iniciou um ato ilícito. Frise-se que, nesses casos, deve existir convicção de verdade em relação ao fato passado(indiciário) e à ilicitude. A probabilidade diz respeito apenas à presunção a serestabelecida entre a prova do fato passado e o fato futuro. Ora, se o juiz não pode chegar àameaça da repetição ou da continuação a não ser a partir da prova da violação jáocorrida, não é correto penalizar aquele que já sofreu o ilícito, pois a experiência mostraque determinados ilícitos, pela sua natureza, têm grande probabilidade de voltar a serpraticados.

Na outra modalidade de ação inibitória – denominada de “pura” –, em que não se temea repetição ou a continuação do ilícito, mas a prática de um ilícito sem que nenhum atoanterior da mesma natureza tenha sido cometido, deve haver convicção de verdade emrelação a atos preparatórios ou a fatos objetivos que possam indicar a probabilidade daprática do ato temido. Da mesma forma que nas outras duas ações, aqui a convicção deprobabilidade diz respeito apenas à presunção sobre o fato temido, e não ao fato passado.Não há dúvida de que a convicção de verdade sobre os fatos passados, bem como sobre ailicitude do fato temido, é suficiente para dar ao juiz a convicção necessária para concedera tutela inibitória final.

Porém, tratando-se da tutela inibitória antecipada, a probabilidade não atinge apenas apresunção. É preciso perceber que, enquanto na tutela inibitória final basta a ameaça deilícito e, por conta disso, a probabilidade da prática do ilícito, na tutela inibitória antecipadaé necessária a probabilidade que tenham sido praticados fatos que indiquem a ameaça. Oumelhor, na chamada ação inibitória “pura” a probabilidade igualmente incide sobre os atospreparatórios e a ilicitude do ato temido e na hipótese de ação dirigida a impedir a repetiçãoou a continuação do ilícito a probabilidade também recai sobre o fato passado e a suailicitude.

Em qualquer uma destas situações, a concessão da tutela inibitória antecipada deveráser racionalmente justificada, mediante a referência das relações entre as provas e osfatos passados e a explicação do raciocínio-ponte entre tais provas e o fato temido,demonstrando-se, além disso, a probabilidade da sua ocorrência no curso do processo.

A importância de observar o direito material e o caso concreto, nesses casos, éfacilmente constatável quando são consideradas as seguintes particularidades: i) que deve

ser provado para a concessão da tutela inibitória final apenas um ato ilícito ou um atopreparatório; ii) que o juiz, para conceder a tutela antecipada, deve ter apenas umaconvicção de probabilidade acerca desses atos; iii) que o raciocínio presuntivo deve selimitar a uma verossimilhança preponderante de que a prática, a repetição ou acontinuação de um ato contrário ao direito – e não de um dano165 – ocorram no curso doprocesso.

Por outro lado, há casos em que uma norma de proteção – por exemplo, do consumidor– já foi violada, sendo necessário remover os efeitos concretos do ilícito através de tutelaantecipada. Nesse caso basta apenas a convicção de probabilidade da violação da norma,pouco importando o dano ou a sua probabilidade – o qual, aliás, não importa nem mesmopara a tutela final. Quando o legitimado à proteção dos direitos do consumidor pede tutelaantecipada de busca e apreensão de produtos nocivos que foram postos à venda pelo réu,é suficiente que o juiz forme uma convicção de probabilidade acerca da violação da normade proteção, sendo desnecessária a prova acerca de eventual dano. O dano não pode serdiscutido nessa ação de busca e apreensão, pois o que nela importa é apenas anecessidade de atuação do desejo da norma de proteção. Por isso, o juiz não pode deixarde conceder a tutela antecipada sob a alegação de que não há probabilidade do dano.

Note-se que, na hipótese dos produtos nocivos, a convicção de probabilidade recai sobreum ilícito já praticado e o perigo deriva da probabilidade do ilícito ou da violação da norma.O que importa evitar, nessas situações, é pensar que o juiz deve se convencer daprobabilidade de dano ou que a tutela antecipada requer a demonstração de que a venda doproduto pode gerar dano.

É ainda fundamental perceber que a tutela antecipada na ação de remoção de ilícito,além de tomar em consideração um ilícito que já ocorreu, não objetiva evitar um atofuturo, mas apenas remover os efeitos concretos de um ato passado. Isso quer dizer que aprova, nesse caso, não se volta para o futuro – como acontece na tutela inibitóriaantecipada –, dirigindo-se apenas para o passado.

A situação é diversa quando se considera a tutela ressarcitória do dano. Quando sepensa na tutela antecipada de soma em dinheiro na ação ressarcitória, por exemplo,importa a convicção de probabilidade do dano e da responsabilidade – pressupostos datutela final ressarcitória – e o perigo de que, diante da demora do processo, outro danopossa ocorrer.

Perceba-se que a ação inibitória se preocupa com um ato ilícito futuro, a ação deremoção do ilícito com um ato ilícito passado e a ação de ressarcimento com um dano jáocorrido. Na ação inibitória, portanto, é preciso demonstrar que um fato passado apontapara uma ameaça de violação. Na ação de remoção de ilícito basta provar a ocorrência doilícito. E na ação ressarcitória é preciso demonstrar o dano e a responsabilidade dodemandado. Tratando-se de tutela antecipada, a convicção deve ser compreendida namesma perspectiva.166 Para a tutela inibitória antecipada é preciso a convicção deprobabilidade de que foi praticado um ato e, além disso, que esse ato aponta para umaameaça de violação que poderá ocorrer no curso do processo. Na tutela de remoção doilícito antecipada é suficiente a convicção de probabilidade de que foi praticado um ilícito.Na medida em que a tutela é contra os efeitos concretos da conduta ilícita, não se pensaem perigo de dano que pode decorrer do ato ilícito. Por outro lado, o requerimento detutela antecipada ressarcitória – em dinheiro ou na forma específica – liga-se àprobabilidade do dano e da responsabilidade que justificaram a ação ressarcitória e aoperigo que o dano ressarcível seja potencializado ou que dele derive um novo dano.

A necessidade da identificação de cada uma dessas tutelas é imprescindível não só para

que as partes saibam o que deve ser discutido e provado em cada espécie de tutelaantecipada, mas também para que o juiz tenha condições de racionalmente expressar asua convicção. Ora, o juiz somente pode se dizer convencido se sabe do que deve seconvencer. E as partes apenas podem controlar a motivação se sabem o que deve ser objetodo convencimento judicial. Daí a importância de se deixar claro, por um lado, i) que a tutelainibitória não se preocupa com o dano e com o elemento subjetivo, mas apenas com aprobabilidade do ato contrário ao direito; ii) que a tutela de remoção do ilícito nada tem aver com o dano e com a culpa, mas apenas com um ato contrário ao direito que já ocorreu; eiii) que a ação ressarcitória se liga ao dano e aos critérios de imputação da sançãoressarcitória. E, por outro lado, que o perigo está i) na ameaça de violação na açãoinibitória; ii) na própria violação na ação de remoção; e iii) na probabilidade de que o danoressarcível se incremente ou de que dele derive um outro dano a direito conexo ao direito àtutela ressarcitória. Exemplo da última hipótese é a tutela antecipada de soma em dinheirona ação ressarcitória, objetivando-se evitar dano à saúde diante da demora na obtenção doressarcimento.

Ressalte-se, contudo, na linha do que se disse até agora, que o valor da convicçãodepende da racionalidade da sua justificação, vale dizer, da descrição das relações entreas provas e os fatos e da explicação das presunções e das regras de experiência.

8.11. Convicção de probabilidade e os elementos da tutela cautelar

É claro que a justificativa da tutela cautelar pode se valer de muito do que foianteriormente exposto. Não obstante, é importante sublinhar que diante da tutelacautelar deve haver probabilidade do direito à tutela que se pretende assegurarcautelarmente, mais perigo da sua inefetividade ou perigo de dano à situação que sepretende tutelar mediante a declaração ou a (des)constituição.

A probabilidade do direito à tutela jurisdicional assemelha-se à probabilidade dodireito que legitima a tutela antecipada, porém o perigo não justifica a antecipação datutela (por exemplo, tutela inibitória) nem a proteção de um direito “conexo” que dependeda antecipação da tutela (tutela antecipada de soma). O perigo é de inefetividade da tutelajurisdicional do direito ou de dano à situação que depende das tutelas declaratória ou(des)constitutiva.

Significa dizer que, na tutela cautelar, a justificativa deve recair sobre a probabilidadedo direito à tutela jurisdicional final e sobre o perigo de que esta tutela venha a não serprestada na forma efetiva ou de que a situação que depende das tutelas declaratória ou(des)constitutiva venha a sofrer prejuízo no curso do processo.

Nesta dimensão, a justificativa deve considerar a necessidade de asseguramento ou deacautelamento de uma tutela jurisdicional de direito já solicitada ou que possa serrequerida, ou mesmo de uma situação concreta que dependa de tutela declaratória ou(des)constitutiva já pedida ou que deva ser pedida.

8.12. Perigo enquanto conceito que guarda em si a probabilidade

Tendo em vista que o art. 300 do Código de Processo Civil fala em probabilidade dodireito, mas não em probabilidade do perigo, cabe indagar se o juiz, para conceder a tutelade urgência, deve formar convicção que ultrapassa a probabilidade. Calamandreipreocupou-se com a demonstração da certeza do perigo para a legitimação da tutelacautelar.167 Porém, a questão da certeza ou da probabilidade em relação ao perigo,quando melhor analisada, torna-se uma questão falsa, na medida em que o conceito deperigo, assim como o de ameaça, contém em si a presunção de algo ou da prática de umato, ou seja, a própria probabilidade de prejuízo.

Tanto a ameaça quanto o perigo dizem respeito a eventos futuros, obviamenteinsuscetíveis de demonstração mediante prova direta. Certamente não há como provarum fato futuro. O que pode ser provado, nestas situações, são fatos passados capazes dedemonstrar um acontecimento futuro ou que se teme. Portanto é preciso a prova de fatosindiciários que permitam ao juiz, mediante raciocínio presuntivo, formar um juízo quepermita a conclusão de que há ameaça ou perigo. O juiz, em outras palavras, somentepode chegar na presunção de que algo vai acontecer, vale dizer, de que há perigo.

A presunção, para poder ser considerada legítima, depende de racionalização mediantejustificativa que considere a prova do fato indiciário, os elementos que guiaram oraciocínio judicial presuntivo, particularmente as regras de experiência,168 e a conclusãoestabelecida. Ora, para o juiz verificar se o fato indiciário aponta, e em que medida, para asituação concreta de perigo, deve raciocinar com base em regras de experiência. Bem porisso, não apenas a prova dos fatos indiciários, mas também as regras de experiênciadevem ser relatadas e motivadas na decisão para que seja possível aferir a consistência dasua base empírica e a sua eventual arbitrariedade.169

Como se vê, o perigo nada mais é do que a presunção de fato futuro, de forma que éfalso indagar se deve haver convicção de probabilidade ou de verdade acerca do perigo.Presunção não é fato nem prova; presunção é juízo, assim como a convicção. É verdadeque uma situação concreta pode comportar duas ou mais presunções, que podemconvergir ou ter sentidos contrários, a demonstrar que a convicção pode se fundar navaloração de duas ou várias presunções.170 Mas isso não significa que seja correto pensarem presunção provável, o que seria o mesmo do que falar em convicção de probabilidadesobre o perigo. O perigo não pode exigir outra coisa que não a simples presunção ouapenas uma convicção baseada em presunção. Daí que a noção de perigo contém ínsita aideia de probabilidade da prática de ato futuro.

Note-se que algo distinto ocorre quando se pensa na convicção lastreada na prova dofato indiciário, que é somente a premissa sobre a qual se assenta o raciocínio presuntivoque resulta no perigo. Aí sim é importante deixar claro que é preciso a demonstração dosfatos indiciários ou de algum fato indiciário para que o raciocínio presuntivo estejadevidamente alicerçado.

8.13. Dificuldade da prova e credibilidade das alegações

O grande entrave da ação inibitória “pura” é a demonstração de atos que indiquem aprobabilidade do ato temido. Se a convicção de verdade, própria à sentença, pode cederdiante de certos casos concretos (como os relacionados a danos pré-natais ou a danosligados ao não cumprimento de deveres de proteção), não há como negar que a convicçãode probabilidade, típica à tutela antecipada, também deve ser pensada conforme ascircunstâncias do direito material e do caso concreto, especialmente daquelas queindiquem dificuldade para a produção da prova.

Ou seja, não há como deixar de considerar a dificuldade de produção da prova, peculiara uma dada situação de direito material, quando se pensa na convicção – seja ao final ouno curso do processo –, sob pena de se negar tutela jurisdicional adequada a determinadosdireitos. É nesse sentido – isto é, considerando que a dificuldade de prova pode decorrerde uma específica situação substancial – que se afirma que o juiz deve se satisfazer – paraconceder a tutela final ou de urgência – com a “prova possível da alegação”.

Ou de maneira mais clara: a convicção de probabilidade deve ser justificada não sócom base nas provas produzidas, mas também mediante a explicação racional dadificuldade de produção de prova, considerando que, quanto maior for essa dificuldade,

menos se deve exigir para a tutela do direito. A lógica é bastante simples, pois todos sabemque não se pode exigir de quem tem um direito algo que inviabilize o seu exercício (nocaso o direito à tutela jurisdicional).

Assim, nas situações em que o direito material justifica a redução da exigência daconvicção no final do processo e naquelas em que o direito material e o caso concretoapontam para a dificuldade de se produzir prova quando da tutela urgente, não há comodeixar de elaborar critérios que possam auxiliar o encontro de um tratamento justo.

Note-se, por exemplo, que alguém pode estar articulando a prática ou mesmopraticando atos de agressão a direitos da personalidade de forma velada, cuidando paranão deixar provas. Em casos desse tipo, torna-se muito difícil produzir prova, ainda queseja para fazer surgir convicção de probabilidade. Porém, não é justo deixar o titular dodireito de personalidade ao desamparo ou nas mãos daquele que, com astúcia e cuidado,pretende infringir o direito.

Nessa dimensão, diante da impossibilidade de produção de prova, importa como nuncaa chamada credibilidade das alegações, que deve se basear em regras de experiênciadevidamente consolidadas na sociedade no momento da decisão. A credibilidade dasalegações, assim como as regras de experiência capazes de fundá-las, constituem critérioscuja racionalidade deve ser devidamente justificada.

Como é fácil perceber, o critério da credibilidade das alegações também tem grandeimportância quando se tem em conta o elemento perigo, pressuposto indispensável para aconcessão da tutela antecipada e da tutela cautelar. Ora, como o perigo apenas pode serdemonstrado mediante a prova de atos passados – fatos indiciários – que o indicam ou ofazem presente, a dificuldade de produzir prova para evidenciar tais atos também podeser contornada pelo critério da credibilidade das alegações.

Se a impossibilidade de prova pode ser suprida pelo critério da credibilidade dasalegações – que não pode se desligar da idoneidade das regras de experiência –, tanto aimpossibilidade da produção de prova, quanto a legitimidade do emprego de tal critério,dependem da racionalidade da justificativa judicial. Vale dizer: a racionalidade daargumentação é que deve justificar a dificuldade de prova, a credibilidade das alegações e aidoneidade das regras de experiência que a fundaram.

8.14. Convicção de probabilidade e consideração das posições em disputa

Outro importante critério, que pode auxiliar quando as versões do autor e do réu sãoigualmente prováveis, é o do balanceamento dos valores em litígio. Esse critério, como éóbvio, exige a consideração do direito material, ou melhor, do valor dos direitos emconflito.

Trata-se de critério complexo, que somente pode ser compreendido por quem estáconvencido da necessidade de o processo civil servir ao caso concreto. O uso de tal critériorequer que todos os demais critérios antes expostos – i) da relação entre as provas e osfatos, da explicação das presunções e da fundamentação das regras de experiência; ii) dacoerência; iii) da congruência; e iv) da credibilidade das alegações – tenham sidoinsuficientes para evidenciar de que lado pende a probabilidade.

Como ocorre em relação a todos os critérios destinados a explicar o raciocínio e adecisão judiciais, este também deve ser racionalmente justificado. Sua utilização requer aprévia justificativa da sua necessidade diante dos outros critérios que, logicamente, devemlhe anteceder, e depois a apresentação das razões pelas quais uma posição deve preferir aoutra.

A justificativa da escolha de uma posição em relação à outra exige a consideração deoutros critérios, que então podem ser chamados de subcritérios. Assim, é preciso verificarse o direito do autor, que está sendo ameaçado por dano, tem natureza não patrimonial oupatrimonial e, diante disso, se ele pode ser: i) integralmente restaurado; ii) ressarcido emdinheiro; iii) dificilmente ressarcido em dinheiro; ou é iv) insuscetível de transformaçãoem pecúnia. Por igual razão, é necessário analisar se o direito do réu possui natureza nãopatrimonial ou patrimonial, e qual a intensidade do prejuízo que a concessão da tutelapoderá lhe trazer, ou melhor, se a concessão da tutela poderá lhe ocasionar um prejuízosuscetível de restauração, ressarcível em dinheiro, dificilmente ressarcível em dinheiro ouinsuscetível de ressarcimento, ainda que em pecúnia.

Essa argumentação obviamente parte do pressuposto de que a tutela antecipada podetrazer prejuízo fático irreversível, ao contrário do que a princípio sugere o art. 300, § 3o,do Código de Processo Civil. Esta possibilidade é inegável quando o juiz chega à convicçãode que o direito do autor é provável, uma vez que a lógica que preside a tutela antecipadaé a do sacrifício do improvável em favor do provável.171 Ora, ninguém pode concluir que ojuiz pode deixar de proteger o direito ameaçado por dano e que lhe parece provávelapenas para não expor a risco de dano o direito que lhe parece improvável.

Mas como já foi possível perceber o problema aqui não é relacionado à tutela doprovável, mas sim à tutela diante de dúvida sobre a probabilidade. É convenientesublinhar que essa “dúvida” somente abrirá oportunidade à inserção do critério que agoraé exposto quando não resultar da inércia do autor na produção da prova. Porém, quandotal inércia não acontecer e o critério da credibilidade, por si só, não se apresentar comosuficiente, o critério da ponderação pode ser com ele ou isoladamente utilizado. Retorne-se, assim, aos subcritérios há pouco apontados.

Não é difícil intuir que tais subcritérios, para poderem explicar uma solução de formaracional, devem ser relacionados. E, diante deles, importa a prestação de caução, ainda quese admita a sua dispensa em casos excepcionais (art. 300, §1o, CPC). Como é curial, acaução se destina a assegurar o prejuízo que pode ser imposto ao réu e, assim, pode servista como um meio capaz de facilitar o balanceamento das posições das partes.172

Quando o direito do autor é não patrimonial ou, ainda que patrimonial, é nãorestaurável ou dificilmente ressarcível em dinheiro, esse deve preferir o direitorestaurável ou ressarcível em dinheiro, quando então deve ser prestada caução. Contudo,alguém poderá dizer que a não patrimonialidade, a não restaurabilidade e a dificuldadedo ressarcimento em dinheiro são importantes para configurar o perigo de dano, mas nãoadmitem a presença de dúvida quanto à probabilidade do direito.

Essa postura finge ignorar que o juiz pode ter dúvida e, o que é pior, que essa dúvidapode trazer prejuízo ao titular do direito fundamental à tutela jurisdicional. Quem ignoraessa situação, procurando simplesmente uma resposta mais cômoda às estruturaçõesteóricas, obviamente não consegue explicar, ao menos de maneira racional, a razão pelaqual a dúvida a respeito da probabilidade – que é problema do Estado-Juiz – deve onerar oautor.

Ora, não se está dizendo que a tutela antecipada deve ser concedida quando o juiz estáem dúvida quanto à probabilidade, mas que o juiz deve utilizar o método dobalanceamento como última alternativa para realmente aferir a necessidade da tutela.Como é evidente, a aplicação do método do balanceamento e dos subcritérios antesreferidos pode permitir a conclusão de que a tutela antecipada não deve ser concedida.

Além disso, caso os pressupostos da tutela antecipada em caso de probabilidade

preponderante fossem apenas esses, restaria excluída a possibilidade de se conceder tutelaantecipada ao direito que, lesado, pode ser ressarcido em dinheiro. Em outros termos, atutela antecipada simplesmente não existiria para alguns direitos, uma vez que estariasendo aceita a ideia de que o direito provável, quando ressarcível, pode ser lesado –conclusão que, de tão absurda, chega a ser curiosa. Ora, é completamente descabidoimaginar que a probabilidade de lesão a um direito que pode ser ressarcido não configura,apenas por isso, perigo de dano.

Na verdade, o fato de o direito ameaçado de lesão ser ressarcível somente temimportância quando é aplicado o método da ponderação, pois é elemento que justifica anão concessão da tutela quando o direito do réu for não patrimonial, insuscetível derestauração ou dificilmente ressarcível.

Não é possível relacionar todas as situações que podem marcar os direitos do autor edo réu e delas extrair critérios que possam guiar os passos do juiz, já que isso é inviávelem um plano valorativo-abstrato. Os critérios antes estabelecidos não se esgotam em simesmos, devendo ser necessariamente preenchidos diante do caso concreto.

Esses critérios, ao contrário do que se poderia pensar à primeira vista, não constituemsimples “fórmulas”. Tais critérios trazem à luz algo que é comum quando se interpreta asnormas, isto é, a necessidade de juízos de valor.173 A diferença é a de que, no caso dadecisão antecipatória, o juiz não está frente a um método de interpretação, mas apenasdiante da necessidade de aplicar um método para viabilizar a adequada decisão.

Com efeito, o sistema proposto não constitui um método de interpretação. Ainterpretação da norma, ainda que exija valoração, objetiva conferir-lhe sentido,enquanto que o balanceamento valorativo que se faz na tutela antecipada tem o fim deencontrar uma solução para a dúvida que paira sobre as posições em disputa.174

Nessa linha tal sistema mais se aproxima a um método de decisão. Importa frisar queesse método não pode ser comparado a uma fórmula com critérios previamente definidose capazes de entrar em ação assim que hipóteses concretas nela se enquadrem. É que oscritérios referidos acima, que dariam conteúdo a essa fórmula, constituem valorações quedevem ser feitas no caso concreto. E é exatamente aí que tudo fica mais claro, pois se o juizé obrigado a valorar para resolver, ele deve justificar racionalmente a razão da sua opção,considerando o sistema jurídico e as circunstâncias do caso concreto.

Deixe-se claro que o método ora proposto nada tem a ver com o princípio daproporcionalidade, utilizado para permitir a solução de conflitos entre direitosfundamentais que se chocam no caso concreto, como, por exemplo, entre o direito dapersonalidade e o direito de liberdade de expressão. O princípio da proporcionalidadevisa resolver a colisão entre dois direitos que, em abstrato, têm a mesma estatura edignidade.

Já o método que se utiliza dos critérios ora apontados toma em consideração acircunstância de o juiz ter que decidir entre duas posições no curso do processo. Nesseúltimo caso não há que se falar entre dois direitos de igual estatura jurídica, mas sim nadificuldade de se formar uma convicção (mesmo que de probabilidade) diante daincompletude do contraditório.

8.15. Convicção de probabilidade e caução

Por outro lado, como foi dito linhas acima, a caução pode ser dispensada em casosexcepcionais. De acordo com o art. 300, §1o, do Código de Processo Civil, “para a concessãoda tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória

idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução serdispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la”.

O objetivo dessa regra é garantir o direito à tutela urgente a quem não pode prestarcaução. Ou seja, a sua finalidade é evitar que o direito à tutela antecipada somente possaser exercido por quem tem condições de pagar por ele.

Tal regra, embora instituída para evitar que o autor sem patrimônio não possa usufruirdo direito à tutela antecipada, partiu do pressuposto de que a prestação da tutela antes dotérmino do processo deve fazer com que o autor garanta o dano que pode ser ocasionadoao réu.

Isso quer dizer que o juiz deve exigir caução do autor, exista probabilidade ou dúvidasobre a probabilidade, a qual somente deve ser dispensada quando a sua prestação forimpossível e, sopesadas as circunstâncias do caso concreto, ainda restar necessária aconcessão da tutela antecipada. Note-se que a regra acima mencionada não aludiusomente o crédito alimentar, mas deixou claro a possibilidade da dispensa da caução emqualquer caso em que “a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la”.

Nesse ponto alguém poderia se assustar, imaginando que estaria se dando ao juiz umaautorização destinada a beneficiar uma parte em detrimento da outra. Entretanto, a ideiaque vem permeando o presente escrito é exatamente a de que o juiz deve justificar demodo racional o que faz.

Como vem sendo dito, o juiz presta conta do seu trabalho mediante a justificaçãoracional das suas decisões. Por isso, ao dispensar a caução, deve demonstrar, através deargumentos racionais, que a necessidade de tutela antecipada justifica o risco de lesão aoréu. A falta de racionalidade desses argumentos pode ser demonstrada através de recursode agravo de instrumento, quando, se for o caso, deverá ser deferida a imediata suspensãodos efeitos da tutela antecipada.

9. Efetivação da tutela de urgência

9.1. Execução “provisória”, execução incompleta e execução fundada em cogniçãonão definitiva

O art. 297, parágrafo único, do Código de Processo Civil exige a distinção entre “execuçãoincompleta” e “execução fundada em cognição não definitiva”, advertindo-se que estapoderia ser encoberta pela velha e atécnica expressão “execução provisória”.

Como tradicionalmente concebida, a execução provisória avança apenas até um limite,ou seja, a execução é suspensa na sua fase final, não permitindo a integral satisfação dodireito.175 Nesse caso, não é correto dizer que o efeito suspensivo do recurso opera na fasefinal da execução, como dizia Liebman,176 até porque o recurso, nos casos em que aexecução pode ser realizada na pendência do recurso, obviamente não pode ser recebidono efeito suspensivo.

Bem vistas as coisas, os atos executivos que podem ser praticados com base nasentença que foi objeto de recurso ainda não apreciado não podem ser considerados“provisórios”. A penhora não é provisória, uma vez que, ainda que feita na execuçãochamada de “provisória”, produz os mesmos efeitos que produziria em uma execução ditadefinitiva. Provisório é o título no qual a execução se funda.177 Ora, se provisório é o título– já que a sentença, ainda que não imutável, tem eficácia –, a execução dita provisória é,na verdade, execução incompleta.

Se a provisoriedade está no título, pode existir execução completa e execuçãoincompleta fundadas em título provisório. O título é provisório por ser fundado emcognição não definitiva, razão pela qual é possível falar de execução, completa ouincompleta, fundada em título provisório ou de execução fundada em cognição nãodefinitiva, bastando lembrar, para demonstrar o equívoco da doutrina tradicional, que achamada execução provisória do despejo sempre foi uma execução completa fundada emcognição exauriente, mas não definitiva.

Além do mais, quem não é cegado pelo mito da nulla executio sine titulo não tem motivopara não admitir que pode haver “execução” fundada em cognição sumária. A qualidade“provisória” somente pode expressar a “não definitividade” da execução (por não existircoisa julgada material). Neste sentido, a execução “provisória” (rectius: não definitiva)pode ser completa ou incompleta.

A tutela antecipada, embora abra oportunidade para uma “execução fundada emcognição sumária”, pode realizar o direito do autor. Ninguém dirá que a imediata imissãodo comprador na posse, em ação de imissão na posse, configura uma “execuçãoincompleta”, embora seja “execução” fundada em cognição sumária e, portanto, naperspectiva da doutrina tradicional, “execução provisória”.

Atualmente, diante do art. 297, parágrafo único, e dos arts. 519, 520, IV, e 521 do Códigode Processo Civil, não pode haver dúvida de que a decisão que concede a tutela antecipadapode levar à integral realização do direito e, assim, a uma “execução completa”, emborafundada em cognição sumária ou em cognição não definitiva. É bom frisar, porém,justamente pela razão de que isto faz parte da ideia de “pesos e contrapesos” inerente aosistema, que a efetivação da tutela antecipada pode ser suspensa ou limitada, nos termosdo art. 1.019, I, do Código de Processo Civil.

9.2. Execução e efetivação da tutela antecipada

Como é óbvio, a natureza da tutela antecipada não permite que a sua execução sejasubordinada à mesma lógica da execução da sentença condenatória. As regras daexecução da sentença condenatória não foram pensadas para dar atuação às tutelasurgentes.178 Não faz parte do espírito da execução de sentença a necessidade de atuaçãocélere do comando judicial. Nesta perspectiva, aliás, a decisão de cognição sumária nãoconstituiria título executivo. É que o título executivo, na sua tradição, supõe a existênciade um direito “certo”, enquanto o provimento sumário, como o seu próprio nome indica,tem em seu conteúdo apenas a probabilidade da sua existência.179

Perguntou-se, na Itália, se os provvedimenti d’urgenza poderiam ser classificados, aoteor do art. 474 do Código de Processo Civil, como título executivo. Inicialmente, parte dadoutrina, conferindo interpretação extensiva ao art. 474, atribuiu-lhes eficácia de títuloexecutivo. A doutrina mais moderna, contudo, contrariando a posição que fora inclusiveperfilhada por Calamandrei, nega tal caráter aos provvedimenti d’urgenza. GiovanniArieta, por exemplo, afirma que o provimento urgente não pode ser considerado títuloexecutivo, nos termos do art. 474, não porque esta regra deva ser interpretada de modorestritivo, mas sim pela absoluta diversidade do fenômeno que está à base de talprovimento: “mais precisamente, a impossibilidade de atribuir aos provimentos fundadosno art. 700 a qualidade e a eficácia de título executivo descende da profunda diversidade,nas perspectivas conceitual, estrutural e funcional, do processo de execução de títuloexecutivo em relação à fase de atuação-execução dos provimentos de urgência”.180

Não só a melhor doutrina italiana nega a aplicação das regras da execução da sentençacondenatória na atuação da tutela urgente,181 como a reforma do Código de Processo Civil

italiano de 1990 refutou a terminologia esecuzione ao tratar do que denominou deattuazione dos provimentos de urgência, deixando caracterizado que estes provimentosnão podem ser “executados” como se fossem sentenças de condenação.

Quando propus, à época do código de 1973, a utilização da expressão “efetivação” nolugar de “execução” da tutela antecipada, fui motivado pelo desejo de livrar a suaexecução (ou a sua “atuação” ou o nome que se deseje dar à realização do direito com baseem cognição sumária) das amarras do modo de execução que foi instituído para servir àsentença condenatória – mas que obviamente não é idôneo para viabilizar a efetivação datutela antecipada.182

Embora o art. 297 do código de 2015 utilize a expressão “efetivação” – inclusive para atutela da evidência –, o que realmente importa é ter claro que o direito objeto de tutelaantecipada deve ser realizado através de meios executivos adequados à sua natureza e àsituação de urgência em que se encontra inserido.

Na decisão que concede a tutela urgente, o juiz deve desde logo estabelecer os meiosexecutivos a ser utilizados para que a decisão seja observada – caso não sejavoluntariamente adimplida. Como a atuação da tutela urgente não pode se subordinar aoprincípio da tipicidade das formas executivas, atribui-se ao juiz um amplo poder destinadoà determinação dos meios executivos.

De acordo com o art. 297, o juiz poderá determinar as medidas que consideraradequadas para a efetivação da tutela provisória, a qual observará as normas referentes àexecução provisória da sentença, no que couber. Além de o art. 297 utilizar a expressão“efetivação”, deixa claro que os meios para a efetivação podem ser eleitos pelo juizconforme as particularidades do caso concreto e, ainda, que esta, não obstante fundada emcognição sumária, pode ser completa.

Diante disso, é possível ao juiz impor, entre outros meios, multa, busca e apreensão,imissão na posse, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento deatividade nociva, sem prejuízo de requisição de força policial.183 Ademais, é claro que ojuiz poderá nomear um terceiro para fazer o que deveria ter sido feito (ou deverá serfeito) pelo réu. Poderá nomear um terceiro para desenvolver as atividades necessáriaspara a realização do que foi imposto pela tutela urgente, ou mesmo para controlar odesenvolvimento destas atividades.

Ademais, mesmo a tutela antecipada de soma em dinheiro dispensa a execução porexpropriação e pode se servir de modalidades executivas adequadas, isto é, de meioscompletamente diferentes dos colocados à disposição da sentença condenatória.

Por outro lado, não é possível, em vista das peculiaridades da efetivação da tutela deurgência, o uso da “impugnação” nos termos e limites do art. 525, § 1.º, do Código deProcesso Civil. No caso de penhora em valor superior ao devido ou de a tutela urgentedesbordar dos limites fixados pela decisão, o réu poderá, através de petição simples,requerer ao juiz a revogação ou a modificação da tutela. Além disso, uma vez concedida atutela urgente, a parte poderá agravar e requerer ao relator, com base no artigo 1.019, I,Código de Processo Civil, a suspensão dos efeitos da decisão que concedeu a tutela urgente.Se a tutela antecipada provocar a constrição indevida de bem de terceiro, cabem osembargos de terceiro.

9.3. Efetivação da tutela de urgência nas hipóteses em que se almeja fazer, não fazer,entrega de coisa e soma em dinheiro

No caso de tutela de urgência que impõe fazer, não fazer e entrega de coisa, aplicam-se

os meios executivos previstos entre os artigos 536 e 538 do Código de Processo Civil. Deacordo com o art. 536, o juiz pode, de ofício ou a requerimento, utilizar as “medidasnecessárias” – multa, busca e apreensão etc. – à efetivação da sentença que impõe fazer ounão fazer. De outra parte, tratando-se de sentença que reconhece a exigibilidade daentrega de coisa, afirma o art. 538 que, uma vez não adimplida a sentença, será “expedidomandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme setratar de coisa móvel ou imóvel”. Porém, isso não quer dizer que neste último caso não sepode aplicar a multa, na medida em que o § 3o do art. 538 diz expressamente que sãoaplicáveis ao cumprimento da sentença que reconhece a exigibilidade de entrega de coisa,no que couber, as disposições sobre o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer.

Tudo isso significa que, em caso de tutela antecipada que determina fazer ou não fazer,são aplicáveis, entre outras, as várias modalidades executivas exemplificadas no § 1o doart. 536, enquanto que, na hipótese de tutela antecipada que impõe a entrega de coisa,além de aplicáveis a busca e apreensão e a imissão na posse (art. 538, CPC), igualmente épossível utilizar a multa (art. 538, § 3o, CPC).184

Lembre-se que a aplicação da multa possui grande importância no caso em que oexequente desconhece a localização da coisa e na hipótese em que a busca e apreensão,diante da natureza da coisa a ser entregue, é praticamente impossível. Assim, porexemplo, se a coisa exige desmonte e transporte que requer conhecimento técnicoespecializado e grande dispêndio de dinheiro.

No que diz respeito à tutela antecipada que determina o pagamento de soma emdinheiro, é possível pensar em três modalidades de execução:185 i) na execução porexpropriação, especialmente mediante penhora on line; ii) no uso dos meios executivospredispostos para os alimentos de direito de família; e iii) na execução sob pena de multa,partindo-se do pressuposto de que, se é imprescindível a antecipação de soma, essa nãopode ficar na dependência da execução por expropriação, na medida em que talmodalidade executiva nem sempre permite uma execução tempestiva e, assim, capaz deresponder aos motivos que legitimam a própria concessão da tutela antecipada.

A multa – apesar de não claramente prevista para a execução da sentençacondenatória – obviamente pode ser utilizada para a efetivação da tutela que determina aantecipação de soma em razão da evidente diferença entre a natureza da soma que sepretende de forma antecipada e a natureza da soma que se almeja mediante a sentençacondenatória. Ora, a circunstância de a multa não estar especificamente prevista para asentença que condena ao pagamento de dinheiro evidentemente não pode conduzir àconclusão de que a tutela antecipada de soma não pode ser idoneamente executada. Talinterpretação estaria em evidente contradição com o direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva.

Em razão da previsão do art. 520, IV, é possível a expropriação ou a prática de atos queimportem transferência de posse ou alienação de propriedade ou de outro direito real,assim como o levantamento de depósito em dinheiro. Nesses casos e em outros em que aexecução puder causar grave dano ao executado, deve ser prestada caução idônea (art.520, IV, CPC). Não obstante, de acordo com o art. 521, a caução pode ser dispensadaquando o i) o crédito for de natureza alimentar, independentemente de sua origem; ii) ocredor demonstrar situação de necessidade; iii) pender o agravo do art. 1.042; e iv) asentença a ser provisoriamente cumprida estiver em consonância com súmula dajurisprudência do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou emconformidade com acórdão proferido no julgamento de casos repetitivos. Quer dizer que acaução poderá ser dispensada em caso de tutela antecipada de soma, bastando-sedemonstrar que se trata de crédito de natureza alimentar ou a situação de necessidade

que está à base da concessão da própria tutela.

Sublinhe-se que os artigos 520 e 521 não se aplicam sempre à execução da tutelaantecipada de soma, mas apenas quando “couber” (art. 297, parágrafo único, CPC). Poroutro lado, as regras que dizem respeito ao cumprimento provisório da sentença (arts.520/522, CPC), quando não se referem apenas ao pagamento de soma, também sãoaplicáveis às hipóteses em que se pretende fazer, não fazer ou entrega de coisa (art. 520, §5o, CPC).

9.4. A prisão como meio de coerção indireta

O objetivo da norma constitucional que proíbe a prisão por dívida é vedar a prisão civilpor descumprimento de obrigação que dependa, para seu adimplemento, da disposição dedinheiro. Nesse sentido é possível dizer que a norma constitucional proibiu a prisão por“dívidas pecuniárias”.186

Caso a sua intenção fosse a de proibir toda e qualquer prisão não haveria comoexplicar a razão pela qual deu conteúdo à prisão civil, afirmando que “não haverá prisãopor dívida”. O entendimento de que toda e qualquer prisão está proibida implica emretirar qualquer significado da expressão “dívida”. Ademais, alegar que existem outrasmodalidades de dívida que não apenas a pecuniária e concluir que estas vedam a prisão, énada dizer sobre a espécie de prisão proibida, mas simplesmente insistir na ideia de que anorma constitucional – de lado o caso de dívida alimentar – veda o uso de toda e qualquerprisão civil e, desse modo, prosseguir retirando o significado da expressão “dívida”. Mas,se não há como fugir da ideia de que foi proibida somente uma modalidade de prisão civil,e não toda e qualquer prisão civil, a prisão proibida somente pode ser a prisão por“débito”.187

A interpretação do art. 5o, LXVII, da Constituição Federal, deve ser alçada a um nívelque considere os direitos fundamentais. Se é necessário vedar a prisão do devedor quenão possui patrimônio – e assim considerar um direito fundamental –, é absolutamenteindispensável permitir o seu uso para a efetividade da tutela de outros direitosfundamentais.

Não há dúvida de que o direito perde a sua qualidade se não puder ser efetivamentetutelado. A proibição de fazer justiça de mão própria não tem muito sentido se ao réu fordada a liberdade de descumprir a decisão judicial, pois nesse caso ele estará fazendoprevalecer a sua vontade como se o Estado não houvesse assumido o monopólio dajurisdição, cuja atuação efetiva é imprescindível para a existência do próprioordenamento jurídico.

  Ninguém pode negar que o processo exige, diante de certas situações de direitosubstancial, o uso da coerção indireta. Porém, a multa não constitui a única forma decoerção indireta e nem se pode dizer que é suficiente para a efetiva prestação da tutelajurisdicional. A multa não tem efetividade diante de um réu que não possui patrimônio.Por essa razão, a violação de direitos é muito fácil a pessoas inescrupulosas, uma vez quetambém não é difícil que estas possam constituir “testas-de-ferro” sem patrimônio paralesar, sem qualquer preocupação, direitos da personalidade – por exemplo.

Não admitir a prisão como forma de coerção indireta é aceitar que, em determinadassituações, o processo não terá efetividade, e, assim, que nestas hipóteses o ordenamentojurídico estará apenas proclamando os direitos. Soará absolutamente falsa e demagógica –por exemplo – a afirmação da Constituição Federal no sentido de que “todos têm direito aomeio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à

sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (art. 225, caput), se não for possível –obviamente quando outro meio executivo não se mostrar adequado – a utilização da prisãocomo meio de coerção indireta para tutelá-lo. Seria o mesmo do que interpretar tal normaconstitucional como se ela dissesse que o meio ambiente, embora fundamental para asadia qualidade de vida e para as futuras gerações, infelizmente não pode serefetivamente tutelado em face de um réu que não se importa com os efeitos da multa. Ora,essa interpretação seria, para dizer o mínimo, incoerente.

A doutrina contemporânea, consciente da relevância de certos direitos de natureza nãopatrimonial, não pode ver na norma constitucional que proíbe a prisão por dívida umaporta aberta para a expropriação de direitos fundamentais para o homem.

Em uma interpretação realmente atenta aos direitos fundamentais e de acordo com amoderna hermenêutica constitucional, não há como enxergar apenas o que há denegativo na utilização da prisão.188 Se ela constitui violência inconcebível em face dedívidas em sentido estrito, não há como deixar de se perceber o seu lado positivo dianteda necessidade de tutela inibitória e de prestações que não dependam do desembolso dedinheiro, mas apenas do comportamento do demandado.189

Essa interpretação deixa de lado o conceito mítico de que a prisão civil é um simplesatentado contra a liberdade dos cidadãos e propõe que se veja, ao lado da proibição daprisão civil por dívida pecuniária, a possibilidade do seu uso para impedir a expropriaçãodos direitos.

A forma de interpretação que não admite o uso da prisão como meio coercitivoconstitui um método hermenêutico clássico, não suficiente quando comparado aosmétodos hermenêuticos modernos,190 absolutamente necessários quando o que se tem ainterpretar, diante das características da sociedade contemporânea e da importância quenela assumem os direitos fundamentais, é um contexto de grande riqueza e muitacomplexidade. Não sendo o caso de apenas considerar o texto da norma, como se elaestivesse isolada do contexto, é necessário recorrer ao método hermenêutico-concretizador.

Deparando-se com a norma do art. 5o, LXVII, da Constituição Federal, o intérprete deveestabelecer a dúvida que a sua interpretação suscita, isto é, se a norma veda o uso daprisão como meio de coerção indireta ou somente a prisão por dívida em sentido estrito. Apartir daí, verificando que a norma aponta para dois direitos fundamentais, ou seja, parao direito à efetividade da tutela jurisdicional e para o direito de liberdade, deve investigaro que significa dar aplicação a cada um deles. Concluindo, a partir da análise da própriarazão de ser destes direitos, que a sua aplicação deve ser conciliada ou harmonizada, nãohá como deixar de interpretar a norma no sentido de que a prisão deve ser vedada quando aprestação depender da disposição de patrimônio, mas permitida para a jurisdição poderevitar – quando a multa e as medidas de coerção direta não se mostrarem adequadas – aviolação de um direito.

Note-se que essa interpretação, além de considerar o contexto, dá ênfase aos direitosfundamentais, realizando a sua necessária harmonização para que a sociedade possa ver asua concretização nos locais em que a sua própria razão recomenda. De outra maneira osdireitos ficarão desprovidos de tutela e, assim, o ordenamento jurídico, exatamente naparte que consagra direitos invioláveis e fundamentais, assumirá a configuração de meraretórica e, dessa forma, sequer merecerá ser chamado de “jurídico”.191

Os artigos 297 e 536 do Código de Processo Civil afirmam que o juiz pode determinar as

medidas adequadas e necessárias à efetivação da tutela. Como tais normas configuramverdadeiras cláusulas gerais executivas, destinadas a dar ao juiz poder para adeterminação da modalidade executiva adequada ao caso concreto, não há como lhenegar a possibilidade de ordenar sob pena de prisão. A prisão, nesse caso, é apenas ummeio de efetivação das decisões do juiz civil e não um meio destinado a castigar alguémpor um crime ou a compelir ao cumprimento de dívida pecuniária.

No caso em que se ordena um fazer cuja observância depende apenas docomportamento do réu e, além disso, não exige o dispêndio de patrimônio, o juiz podeordenar o cumprimento – obviamente que dando para tanto prazo suficiente – sob penade prisão. O demandado deve ter a oportunidade de justificar a eventual impossibilidadedo cumprimento. Escoado o prazo sem manifestação ou rejeitada a justificativa, o juizdeve determinar a expedição do mandado de prisão. O tempo da prisão, no caso em que sepretende um fazer, deve servir para vencer a resistência do réu, embora deva ter umlimite.

Ordenado um não-fazer sob pena de prisão, ao demandado obviamente também deveser conferida oportunidade para falar. Nesse caso, a ameaça não está na prisão em si, massim na possibilidade da sua ocorrência. Por isso, alguém poderia pensar que a execuçãodessa prisão tem caráter penal. Acontece que o fato de a prisão poder apresentar uma facepreventiva e outra repressiva nada tem a ver com a sua natureza civil ou penal. A prisãocivil, compreendida como meio de coerção indireta, serve para constranger a parte acumprir as decisões do juiz. De modo que pode assumir a configuração de ameaça e desanção privativa de liberdade.

Lembre-se de que exatamente o mesmo acontece com a multa civil, pois ainda que aordem de não-fazer sob pena de multa tenha nítida função intimidatória, a sua natureza émodificada quando a ordem não é observada e é praticado o fazer que se desejavaimpedir. De coerção indireta a multa é transformada em mera sanção pecuniária, emboranão passe pela cabeça de ninguém que a multa assumiu natureza penal. A dupla feição damulta deriva da simples circunstância de que a ameaça que não é concretizada perde oseu valor. A multa tem que ser cobrada para que a sua função intimidatória sejaconservada.

O juiz, ao ordenar um fazer ou um não-fazer sob pena de prisão, deve fixar o seuprazo. O fato de tal prazo poder ser estabelecido pelo juiz decorre da própria natureza demeio executivo da prisão. Se a prisão, aqui, é um mero meio de execução das decisões dojuiz civil, resulta natural que o seu prazo deve se amoldar aos casos concretos, do mesmomodo que acontece em relação à multa, cujo valor pode variar conforme o caso. Isso nãoquer dizer, como é óbvio, que não exista como controlar a racionalidade da fixação de taisprazos pelo juiz.

Lembre-se de que a prisão apenas pode ser usada quando a decisão não exigirdispêndio de dinheiro e depender do exclusivo comportamento da parte. Além disso,somente pode ser utilizada quando nenhum outro meio de execução se mostrar capaz dedar efetividade à decisão judicial. Porém, tudo isso deve ser perfeitamente demonstrado namotivação da decisão judicial. Como a prisão civil é um meio executivo, e esse não pode sedesprender do caso concreto, é a motivação que viabiliza o controle da decisão judicial.

Por último, importa justificar o uso da prisão diante da tutela urgente. Cabe lembrarque a multa, apesar de ter o objetivo de forçar o cumprimento das decisões judiciais, tem oseu montante voltado à parte – e não ao Estado. Isso se deve à adoção de um modelo queainda confunde a multa e a indenização, supondo que a multa também funciona comouma medida reparatória para a parte que tinha interesse na decisão não cumprida. Deoutra parte, a sua natureza intimidatória advém da ameaça da sua cobrança.

Tomando em consideração as circunstâncias de que o valor da multa cabe à parte e deque a força coercitiva da multa está na ameaça da sua cobrança, é correto concluir que acobrança da multa deve ser admitida apenas após o trânsito em julgado – e não em face datutela antecipada, no curso do processo. Perceba-se que se a cobrança da multa – e nãoapenas a sua imposição ou a ameaça da cobrança – tivesse finalidade coercitiva, o seuvalor deveria poder ser dispensado na hipótese de o réu se dispor a cumprir a decisão,mesmo que tardiamente. Porém, a cobrança da multa, reverta para o particular ou para oEstado, sempre terá conotação repressiva, pois se pudesse ser perdoada após o nãocumprimento, apenas pela razão de o inadimplente vir a cumprir, perderia o seu efeitointimidatório. Ademais, conforme observado, tal valor é atribuído ao autor, como setivesse natureza de ressarcimento. Diante dessa natureza, o pagamento do valor da multaao autor, ainda que ele não tenha o seu direito reconhecido ao final do processo, configuragenuíno enriquecimento sem causa. Dar ao autor o direito de executar o réu para cobrarmulta devida pelo não cumprimento de decisão reputada injusta no próprio processo nãopode significar outra coisa.

Alguém dirá que no caso de multa periódica a imediata execução da multa devida temfinalidade intimidatória. A multa fixada de modo periódico somente permitiria a execuçãodo valor relativo ao período do descumprimento, pelo que o fim intimidatório da execuçãoestaria em constranger o demandado a cumprir para a multa parar de incidir. Nesse caso,porém, além de o autor poder receber injustamente o valor da multa que já se tornou devido,o fim intimidatório da multa estaria sendo transferido para a sua execução parcial. Ocorreque não há racionalidade em imaginar que o réu somente é constrangido a cumprirquando a execução já foi requerida, a menos que esse aposte – não se importando com oacréscimo do valor da multa periódica – no seu sucesso ao final do processo, o que fazpensar em um otimismo quase que paranoico.

De qualquer forma, o que realmente impede a admissão da execução da multa nocurso do processo é o fato de que o seu valor reverte à parte, o que significa que afinalidade da multa ainda é obscura no sistema brasileiro. Perceba-se que, quando se falada finalidade da multa, não se está aludindo a algo semelhante à dupla face da prisão. Amulta, ainda que deva ameaçar e ser executada (tendo dupla feição), deveria ter porobjetivo apenas a efetividade das decisões do juiz e não dar algo ao autor. Já a prisão, aoassumir dupla configuração, é obviamente sempre voltada à proteção das decisões judiciais.Assim, não há razão para a prisão não poder ser imposta para dar efetividade à decisão queconcede tutela de urgência.

No caso de não cumprimento de um fazer, não há como pensar em prisão cujo prazo seestende com o passar do tempo – à semelhança do que ocorre com a multa. A coerção daprisão está na aflição gerada pela sua execução, ao passo que o acréscimo do valor damulta é expediente expressamente previsto no Código de Processo Civil (art. 537, § 1o, I,CPC) para que a sua finalidade coercitiva possa ser potencializada e, assim, vencida avontade do renitente.

Frise-se que a coerção da multa não está na sua cobrança parcial, mas sim no acúmulodo seu valor com o passar do tempo, ao passo que, em relação à violação de uma decisãoque impôs um fazer, a prisão deve ser executada para constranger ao cumprimento. Paramelhor explicar: o prazo da prisão não precisa ser cumprido se a decisão for observada,mas se a decisão for acatada a multa apenas não mais incidirá – embora possa ser cobrada–, o que significa que a execução da prisão e o acréscimo da multa – e não a sua execução –servem para constranger ao cumprimento.

Nessa dimensão, a diferença entre a prisão civil – vista como meio de execução – e aprisão criminal fica ainda mais nítida. Após a violação a prisão penal não pode ser

perdoada, exatamente porque, ao contrário da prisão civil, não tem o objetivo deestimular a um fazer.192

A única dúvida que poderia pairar é relativa à decisão que impõe um não fazer, umavez que a ameaça, aí, estaria exclusivamente em momento anterior à violação. Aconteceque a prisão é relacionada apenas com a atuação do poder do Estado, ou seja, com aefetividade das decisões jurisdicionais, não sofrendo do mesmo problema que obscureceua finalidade da multa. Portanto, nada desautoriza a imediata execução da prisão no casode descumprimento de decisão concessiva de tutela urgente – antecipada ou cautelar.

9.5. Execução da tutela antecipada de pagamento de soma em dinheiro

9.5.1. O uso da multa para dar efetividade à tutela antecipada de soma emdinheiro

A tutela antecipada de soma supõe a possibilidade da sua execução – ou a possibilidadeda realização do crédito – no curso do processo. Além disso, a execução dessa espécie detutela antecipada não precisa observar as regras da execução por expropriação, uma vezque o art. 297 afirma que o juiz pode se valer das medidas que considerar adequadas paraa efetivação da tutela provisória. Assim, por exemplo, é certamente possível o uso dos“meios de execução” próprios à tutela alimentar do direito de família para dar efetividadeà tutela antecipada na ação ressarcitória.

A coerção patrimonial indireta (multa) é muito importante para dar efetividade àtutela antecipada de soma. Obviamente não tem cabimento o argumento no sentido deque a decisão concessiva de tutela antecipada de soma não pode ser executada mediantemeio executivo diverso do expropriatório. O que justifica a tutela antecipada é algoabsolutamente diverso daquilo que está à base da sentença condenatória. A tutelaantecipada concedida a partir de uma situação de urgência – de lado a penhora on line –não “combina” com a execução por expropriação justamente porque deve realizarprontamente – ou sem delongas – o direito. A decisão concessiva de tutela antecipadacarece de maior efetividade e, assim, os seus meios executivos devem ser diferentesdaqueles que foram tradicionalmente associados à sentença que condena ao pagamentode dinheiro.

Como diz Taruffo, a melhor execução é aquela que não é necessária. A forma ideal derealização de um direito se dá por intermédio do adimplemento voluntário.193 Ora, se odesejável é o adimplemento voluntário, a melhor via de execução é a indireta, ou seja,aquela que atua sobre a vontade do obrigado visando ao seu adimplemento. Note-se que aexecução sob pena de multa, além de propiciar tutela jurisdicional tempestiva e “livrar” aadministração da justiça de um procedimento oneroso e longo, elimina os custos e osriscos inerentes à execução por expropriação, culminando por ser mais benéfica tambémao devedor.

A execução sob pena de multa somente tem sentido em relação ao devedor que possuipatrimônio suficiente para responder ao crédito. Na hipótese de devedor sem patrimônio,certamente não cabe a “execução” sob pena de multa. Assim, na hipótese de tutelaantecipada de soma, o juiz deve dar ao réu a oportunidade de justificar o nãoadimplemento. Ademais, é fundamental que se estabeleça prazo suficiente para o réuadimplir, sendo que a sua justificativa também pode ser no sentido de que necessita demais tempo para cumprir a obrigação.

Imaginar que o emprego da multa não tem efetividade para a tutela antecipada desoma com base no argumento de que o inadimplente não se importa com a multa não temqualquer fundamento. Como é evidente, a multa certamente pode atuar sobre a vontade

daquele que possui patrimônio, pois este tem plena consciência de que não é“compensador” esperar – e assim contar com o tempo do processo – para pagar o“principal” com multa. Supor que a multa não é meio executivo capaz de dar efetividade àdeterminação de pagamento de soma é partir do pressuposto equivocado de que odevedor nunca tem patrimônio para adimplir.194 Ora, quando o devedor não tempatrimônio nenhuma execução tem utilidade.

Note-se que esta percepção não só é importante para a efetividade da tutela antecipadade soma, mas também abre oportunidade para meditação em torno da execução dasentença condenatória, ou seja, para o questionamento da aplicabilidade da multa paradar efetividade à condenação ao pagamento de dinheiro.195

Deixe-se claro que não se está propondo a troca da execução por expropriação pelaexecução através de multa, mas a possibilidade de utilização da multa como uma dasmodalidades executivas para dar efetividade à tutela jurisdicional. O que não adianta éapenas tentar dar maior celeridade à execução por expropriação, como se esta fosse aúnica e melhor alternativa para conferir efetividade à tutela antecipada de soma oumesmo à sentença condenatória.

9.5.2. O emprego da penhora online

Diante da necessidade da imediata efetivação da tutela antecipada de soma, a penhoraon line aparece como alternativa bastante importante. Há algum tempo, o SuperiorTribunal de Justiça, o Tribunal Superior do Trabalho e o Conselho da Justiça Federalfirmaram convênio com o Banco Central, mediante o qual juízes com senhas cadastradastêm acesso, por meio da internet, a um sistema de consultas desenvolvido pelo BancoCentral (Bacenjud) para a obtenção de informações sobre eventuais depósitos bancáriosdos devedores. Mediante esse sistema, o juiz pode encaminhar ofícios eletrônicos (viainternet) às instituições financeiras solicitando informações sobre a existência de contascorrentes e aplicações financeiras, determinando bloqueio e desbloqueio de contas, ourequerendo outras informações próprias.

Lembre-se de que, para a requisição de informações ao Banco Central ou a outrosbancos, o credor não precisa ter esgotado todas as atividades necessárias para alocalização de bens penhoráveis. Não deveria ser preciso dizer que surge ao autor, diantedo descumprimento da tutela antecipada, o direito de imediatamente obter dinheiro.Pouco importa que existam ou tenham sido nomeados outros bens penhoráveis, não sóporque o credor tem o direito de penhorar dinheiro, em espécie ou em depósito ouaplicação em instituição financeira (art. 835, I, CPC), como ainda porque a efetividade datutela antecipada depende da imediata obtenção de soma.

Porém, como ao autor é impossível descobrir se o devedor possui dinheiro depositadoem instituição financeira – e em valor suficiente –, não lhe resta outra saída senão pedir aojuiz que requisite informações ao Banco Central. Por isto, quando o juiz requisitarinformações sobre a existência de ativos em nome do executado, essas devem se limitar àexistência ou não de depósito ou aplicação até o valor do crédito.

A penhora on line é um instrumento de grande valor para a execução da tutelaantecipada, especialmente quando se tem em conta o art. 774, parágrafo único, do Códigode Processo Civil, que prevê a incidência de multa de até vinte por cento do valoratualizado do débito nas hipóteses em que o executado “se opõe maliciosamente àexecução”, “dificulta ou embaraça a realização da penhora” ou não indica “quais são eonde estão os bens sujeitos à penhora e os respectivos valores” (art. 774, II, III e V, CPC).Note-se que, se o devedor retira dinheiro da conta para evitar a penhora on line, praticaato que abre ensejo à incidência de multa de vinte por cento sobre o valor do débito

atualizado.

É evidente que a penhora on line somente tem efetividade quando o réu possuidinheiro em instituição financeira. Contudo, quando o devedor toma consciência de quebasta um ofício eletrônico para a descoberta de dinheiro em suas contas bancárias e, maisdo que isso, que o seu inadimplemento ou a retirada maliciosa do dinheiro da contaconduzirá ao acréscimo do seu débito em vinte por cento, certamente preferirá pagarimediatamente a correr o risco – que passa a ser real – de ter que pagar bem mais peloinadimplemento ou pelo “esvaziamento” de suas contas.

A penhora on line, como é evidente, abre oportunidade para o levantamento dodinheiro sem a prestação de caução. A dispensa da caução está autorizada no art. 521, I eII, que estabelece a sua inexigibilidade quando o crédito for de natureza alimentar,independentemente de sua origem, e quando o credor demonstrar situação de necessidade.Como é evidente, exigir caução seria negar a necessidade da soma e a urgência quelegitimaram a própria concessão da tutela antecipada de soma.

9.5.3. A tutela antecipada na ação ressarcitória

9.5.3.1. Justificativa

Montesano observa que no direito italiano admite-se a antecipação do pagamento desoma em dinheiro quando a prestação em dinheiro é o instrumento para proteger um bemnão patrimonial: por exemplo, prestações alimentares; retribuições devidas emobediência ao art. 36 da Constituição (direito de sustento do trabalhador); antecipação desoma devida para a “reintegração específica” de um bem não patrimonial ilicitamentelesado; indenização antecipada para aliviar um estado de necessidade (e assim a lesão àdignidade humana) causado pelo ilícito.196

Há casos em que a realização do direito de crédito é imprescindível para permitir arealização de um direito fundamental, como o direito à saúde ou o direito à educação. Avítima de ato ilícito que precisa realizar urgentemente despesas médicas obviamente nãopode esperar o tempo do processo e, portanto, quando desde logo pode evidenciar o seudireito e a sua necessidade, tem direito à antecipação do pagamento. O mesmo vale para,v.g., a mulher do falecido em acidente automobilístico que fica impossibilitada de atenderàs suas necessidades e às dos filhos.197

Ovídio Baptista da Silva há muito tempo advertiu que o direito brasileiro não possuía“regra similar à que existe no direito italiano, que prevê a concessão de uma provisionalgenérica, no art. 278 do Código de Processo Civil, por onde será sempre possível fazerentrar as provisionais de alimentos nos casos em que sejam estes devidos fora do direitode família”.198 Julgados mais sensíveis e atentos a situações excepcionais, é certo,admitiam os alimentos provisionais em ação de indenização fundada em ato ilícito. OTribunal de Justiça do Mato Grosso, por exemplo, reconhecendo que o código de 1973 nãopermitia os alimentos provisionais na ação de indenização, concluiu: “a ação principal éde indenização por ato ilícito, que, normalmente, não comportaria os alimentosprovisionais. Mas, como não os conceder, nas circunstâncias espelhadas nestes autos?Como deixar perecer uma mulher viúva, lides domésticas, responsável por cinco menoresem idade variável de quatro a onze anos? (...)”.199

Lembre-se, entretanto, que o juiz italiano, ao conceder a provvisionale do art. 278, parteda certeza sobre o an debeatur e concede a tutela (a provvisionale) nos limites da quantiaque já está provada. Há, desta forma, cognição exauriente sobre o an debeatur e sobre aquantia objeto da provisional, muito embora a condenação seja parcial, ou seja, de parcela

da quantia postulada pelo autor. É o que explica Federico Carpi: “a cognição do juiz éplena e completa, seja no que diz respeito à existência do direito (an debeatur), seja nopertinente ao valor em relação ao qual se entende a prova suficiente, valor que constituiassim a medida da provvisionale. Um é a premissa do outro, mas para a pronúncia parcialnão se faz referência a uma ‘presumibile entità’ (como por exemplo no art. 24 da Lei n.990/1969) ou mesmo a um fumus boni iuris, mas se fala de obtenção da certeza da prova,mesmo que seja sobre uma parte da demanda proposta”.200

A provvisionale, como se vê, equiparava-se à tutela antecipada de parcelaincontroversa de parcela do pedido (art. 273, § 6o, CPC/73) e, atualmente, encontra similarno julgamento antecipado parcial do mérito (art. 356, CPC). Não há como equiparar aprovvisionale italiana à tutela antecipada de soma fundada em perigo (art. 300, CPC).

A tutela antecipada baseada no art. 300, ou seja, a tutela antecipada fundada emprobabilidade e que é justificada por uma necessidade imediata, encontra figura similar,no direito italiano, na tutela do art. 24 da Lei 990, de 24.12.69. A Lei 990, ao introduzir oseguro obrigatório por responsabilidade civil em caso de acidente de veículos, previu apossibilidade de a vítima requerer, encontrando-se em estado de necessidade e com basena probabilidade do seu direito, a antecipação de até quatro quintos da soma postulada.Eis o que diz o art. 24: “24. (1) No curso do processo em primeiro grau, os que têm direitoao ressarcimento e que, em virtude do acidente, venham a encontrar-se em estado denecessidade, podem pedir que lhes seja entregue uma soma a imputar-se na liquidaçãodefinitiva do dano. (2) O juiz instrutor civil ou penal, ouvidas as partes, se de um sumárioacertamento resultam graves elementos de responsabilidade a cargo do condutor, comordinanza imediatamente executiva, determina a entrega de soma nos termos da parteprimeira, no limite de quatro quintos do presumível importe do ressarcimento que seráliquidado com a sentença".

Tendo em vista que o art. 24 fala de “gravi elementi di responsabilità” e de “sommarioaccertamento”, admite-se a tutela antecipada de soma com base em probabilidade, que porisso não se equipara à provvisionale do artigo 278. Isto está claro na seguinte passagem das“Lezioni” de Proto Pisani: “No art. 24 (...) o legislador estabeleceu que, ‘no curso doprocesso em primeiro grau, os que têm direito ao ressarcimento e que, em virtude doacidente, venham a encontrar-se em estado de necessidade, podem pedir que lhes sejaentregue uma soma a imputar-se na liquidação definitiva do dano’. A utilidade prática daregra é evidente: garante-se uma forma de tutela jurisdicional urgente a favor de quem foiposto em estado de necessidade por causa do acidente, desonerando o acidentado dademora do procedimento comum de conhecimento ou do processo penal em relação aoqual a ação civil foi exercitada. Esta hipótese de tutela se diferencia nitidamente daprovisional genérica do art. 278, parte segunda, particularmente porque: a) a declaraçãorelativa à responsabilidade do condutor e ao importe do dano que será liquidado com asentença é sumária; b) consequentemente, a ‘provvisionale’ tem caráter provisório e podeser modificada no curso do processo diante do mesmo juiz, se o acertamento plenoconferir resultados opostos ou diversos do acertamento sumário: isto se deduztextualmente da última parte do art. 24, local em que se afirma que ‘l'ordinanza puòessere revocata con la decisione di merito’ (...)”.201

Como está claro, o direito italiano admite a antecipação de pagamento de soma, emfavor da vítima de acidente que se encontra em estado de necessidade, a partir daprobabilidade do direito, ou seja, do fumus boni iuris. O art. 300, ao generalizar apossibilidade de obtenção de tutela antecipada fundada em probabilidade do direito eperigo de dano, obviamente permite a antecipação de pagamento de soma em favor davítima na ação ressarcitória. Lembre-se que os tribunais brasileiros202 acolheram a tese daantecipação do pagamento de soma – sustentada quando da introdução da tutela

antecipada no código de 1973.203

9.5.3.2. A natureza alimentar da tutela antecipada na ação ressarcitória

Como diz Pontes de Miranda, juridicamente “os alimentos compreendem tudo o que énecessário ao sustento, à habitação, à roupa (Ordenações Filipinas, Livro I, título 88, 15:‘(...) o que lhes necessário for para seu mantimento, vestido e calçado e todo o mais), aotratamento de moléstias’ (M. A. Coelho da Rocha, Direito Civil português, I, 219) e, se oalimentário é menor, às despesas de criação e educação (Ordenações Filipinas, Livro I,título 88, 15: ‘E mandará ensinar a ler e escrever àqueles que forem para isso')”.204

Por outro lado, como se sabe, o dever de prestar alimentos pode decorrer da lei, deconvenção ou de ato ilícito (arts. 948, 949, 950 e 951 do Código Civil). Assim, na perspectivada fonte da obrigação alimentar, os alimentos costumam ser classificados em legítimos(devidos em razão de norma legal), voluntários (constituídos por negócio jurídico intervivos ou mortis causa) e indenizativos (derivados de ato ilícito).

9.5.3.3. A efetivação da tutela antecipada na ação de ressarcimento

Para a efetivação da tutela antecipada na ação de indenização fundada em ato ilícito,ordena-se inicialmente que o réu efetue o pagamento ou justifique a impossibilidade deefetuá-lo (art. 528, CPC). Em caso de não atendimento à ordem, o juiz deverá determinar –obviamente que se for possível no caso concreto – o desconto em folha de pagamento daimportância da prestação devida (art. 529, CPC), sendo viável, ainda, o desconto dealugueres ou de outros rendimentos do devedor.

Há quem entenda ser inadmissível o desconto em folha de pagamento no caso dealimentos devidos por ato ilícito. Entretanto, não há motivo para se dar meio de execuçãodiverso aos alimentos indenizativos. Em outros termos, a diferença de fonte não podeservir para determinar a diferenciação de meio executivo. O que importa, sem dúvida, é ofim, a exigir meio executivo efetivo. A razão, portanto, está com Pontes de Miranda: “Osalimentos de que cogita o art. 734 (art. 529, CPC/2015) são quaisquer alimentos a que foicondenada alguma das pessoas a cuja classe ele se refere, sejam alimentos de direito defamília, ou alimentos de origem negocial ou em virtude de ação de indenização por atoilícito se o condenado não pagou e nela se incluiu prestação de alimentos”.205

Não tendo o réu atendido à ordem e não sendo possível, no caso concreto, o descontoem folha ou o desconto de alugueres ou rendas, poderá ser aplicada a prisão. Algunsjulgados sustentam que a prisão civil por dívida, como meio coercitivo para oadimplemento da obrigação alimentar, é cabível apenas no caso dos alimentos pertinentesao direito de família. De modo que seria inadmissível a sua cominação “por falta depagamento de prestação alimentícia decorrente de ação de responsabilidade ex delicto”.206

Contudo, não há qualquer razão para discriminar o credor de alimentos indenizativos,deixando sem efetividade a tutela antecipada que lhe concede alimentos.207 A menos quese entenda, por exemplo, que os filhos daquele que se afasta do lar merecem tutelajurisdicional mais efetiva do que os filhos que têm o pai morto em acidenteautomobilístico.

O autor poderá optar entre a coerção pessoal e a expropriação de bens do réu, nãoestando obrigado a abrir mão do meio idôneo, ao contrário do que já entendeu o Tribunalde Justiça do Rio Grande do Sul – certamente ainda apegado a ideologia superada, que dávalor injustificável ao princípio da intangibilidade física.208

Porém, nada impede que o autor peça que o réu seja compelido a pagar a soma

antecipada sob pena de multa. O fato de a execução por expropriação estar predispostapara a sentença de condenação não significa que a utilização da multa está proibida paraa tutela antecipada ou mesmo para a própria condenação. Na verdade, como a execuçãopor expropriação é inidônea para a tutela antecipada de soma – e exatamente por issopodem ser utilizados o desconto em folha, o desconto de rendas periódicas ou a coerçãopessoal –, nada impede que se prefira a multa em relação a essas modalidades executivas.

Lembre-se de que a tutela antecipada, nesses casos, não apenas responde ao direito aosalimentos indenizativos, mas atende ao direito à dignidade da pessoa humana e ao direitofundamental à tutela jurisdicional efetiva. Ora, como as regras processuais devem serinterpretadas conforme os direitos fundamentais, e por isso o direito à tutela antecipadanão é apenas o direito à decisão que a concede, mas sim o direito à sua execução eobtenção, não há como não admitir o emprego da multa como meio coercitivo. Aliás, apossibilidade do uso da multa também é decorrência da possibilidade do uso da coerçãopessoal. Ora, o autor não apenas pode, mas na verdade deve usar meio executivo menosagressivo quando igualmente idôneo. A multa, por constituir meio idôneo e que gera menorrestrição ou gravame, sempre deve ser aplicada antes da prisão, sob pena de violação àregra da necessidade, sub-regra da regra da proporcionalidade.209

A tese que discrimina o credor de alimentos indenizativos, ilógica e distante darealidade social, certamente não pode ser admitida pelo juiz atento à razão de ser datutela antecipada. Todos os que conhecem a realidade da prática forense sabem que osréus de ações de ressarcimento, principalmente quando o autor é economicamente frágil,valem-se da demora do processo para obter vantagens econômicas. De fato, o autor, nestasações, não raramente é obrigado a abrir mão de parte do seu direito apenas por não podersuportar a lentidão da justiça, a qual lamentavelmente costuma ser lembrada para aobtenção de acordos corriqueiros na prática forense, mas imorais.

9.5.3.4. A execução da tutela antecipada de soma em dinheiro, na ação deressarcimento, admite a expropriação de bem sem a prestação de caução

Partindo-se da premissa de que a multa e a prisão se mostraram insuficientes,suponha-se a penhora de bem imóvel do demandado. Seria possível a sua alienação? Coma dispensa da caução? A impossibilidade da antecipação do pagamento de soma emdinheiro, como é sabido, pode ocasionar prejuízo irreversível ao autor. Assim, negar aojuiz a possibilidade de alienação é o mesmo que obrigá-lo a assistir a uma lesão a umdireito.210

O cumprimento provisório da sentença autoriza “o levantamento de depósito emdinheiro e a prática de atos que importem transferência de posse ou alienação depropriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultar grave dano aoexecutado”, desde que prestada “caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz eprestada nos próprios autos” (art. 520, IV, CPC). Assim, como a efetivação da tutelaantecipada se submete ao regime do cumprimento provisório da sentença, é certo que,para a efetivação da tutela antecipada, é possível alienar bem de propriedade dodemandado. Não obstante, como aquele que necessita de tutela antecipada de soma estáem situação incompatível com a prestação de caução, essa pode ser dispensada nos termosdo art. 521, I e II, que expressamente prevê a sua inexigibilidade quando i) o crédito for denatureza alimentar, independentemente de sua origem ou ii) o credor demonstrarsituação de necessidade.

Como se vê, se é possível a expropriação de bem antes de findo o processo, mesmo naexecução da tutela antecipada (arts. 297, parágrafo único e 520, IV, CPC), também não sediscute que a caução pode ser dispensada — seja para o levantamento de dinheiro, seja

para a prática de atos que importem alienação de propriedade — nos casos de verba denatureza alimentar ou quando o exequente se encontrar em estado de necessidade.

O código de 2015 corretamente deixou de relacionar a dispensa da caução com o valordo crédito postulado. O art. 475-O, § 2o, I, do código de 1973 afirmava que a caução apenaspodia ser dispensada “até o limite de sessenta vezes o valor do salário mínimo”. Contudo,como foi dito para contestar tal limitação à época do código revogado, “se a necessidadeimportar soma superior a sessenta salários mínimos e isto restar devidamentedemonstrado, não há como obrigar o exequente a prestar caução para ter o seu direitorealizado, sob pena de se discriminar aquele que possui maior necessidade de verbaalimentar. Ora, a ideia de dispensar a caução não tem relação com o valor da soma, mascom a necessidade do exequente, que pode ser de vinte ou até mesmo de oitenta saláriosmínimos – no caso em que, por exemplo, é necessária uma operação cirúrgica”.211

Registre-se que no direito alemão — assim como nos direitos inglês, italiano e francês— é admitida a antecipação do pagamento de soma em dinheiro,212 mas oVerfugungsgrund (a causa da antecipação) deve ser evidenciado e os tribunais são aquimais severos do que em outros casos.213 O mesmo deve ocorrer no direito brasileiro emcaso de antecipação de pagamento de soma em dinheiro.

9.6. Caução para a concessão da tutela de urgência

De acordo com o art. 300, § 1o, do Código de Processo Civil, “para a concessão da tutelade urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea pararessarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensadase a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la”. Note-se que esta cauçãoé exigível para a concessão da tutela, ao contrário da caução do art. 520, IV, que é exigidapara a sua execução. A caução do art. 300 pode ser exigida quando a tutela é concedidaantes da ouvida do réu, depois da sua ouvida ou mesmo na sentença. O que legitima aexigência da caução não é a não ouvida do réu ou a ausência de justificação, mas acircunstância de a decisão poder ser negada ou modificada.

O conteúdo da caução se liga ao dano que pode ser produzido pela efetivação da tutelacautelar ou antecipada. Note-se que a caução é uma cautela em face da tutela de urgência,de modo que se destina a assegurar o dano que pode ser produzido pela sua efetivação.

Embora a norma fale em caução real ou fidejussória, aquele que obtém tutela cautelarou antecipada pode garantir a parte adversária de outro modo, desde que idôneo a prestarefetiva segurança pelo eventual prejuízo capaz de ser acarretado pela efetivação da tutela.A princípio não há porque descartar, por exemplo, que o beneficiado pela tutela urgenteofereça como caução um contrato de seguro que cubra a responsabilidade pelo dano quepode ser produzido pela execução.214

A parte final do § 1o do art. 300 afirma que a caução pode ser dispensada “se a parteeconomicamente hipossuficiente não puder oferecê-la”. A caução é resultado daconsideração do direito à tutela de urgência e do direito à segurança do ressarcimento dosdanos que podem ser acarretados pela efetivação da tutela. É claro que esses dois direitosdevem ser amparados nos casos em que a parte tem condições econômicas de garantir aeventual necessidade de ressarcimento do dano provocado pela execução. Contudo,haverá situações em que a parte não terá capacidade financeira para prestar caução.Diante desta hipótese, a norma optou pelo direito à tutela jurisdicional efetiva emdetrimento do direito à segurança do ressarcimento dos danos.

Assim, nos casos em que a parte é economicamente hipossuficiente o juiz deve

dispensar a prestação de caução. Bem por isso, a parte que se afirma destituída decondições financeiras deverá provar a sua hipossuficiência e, neste caso, o juiz deve estarbastante atento.

10. Controle do poder executivo do juiz

10.1. A racionalidade da tutela antecipada parcial

É claro que se o autor pedir que a tutela final seja antecipada em parte, o juiz, aoatendê-lo, estará concedendo parcela da tutela almejada ao final, mas integralmente atutela antecipada requerida. Porém, isso não quer dizer que o juiz não possa tambématender em parte ao próprio pleito de tutela antecipada. Como é evidente, o poder deantecipar a tutela do direito traz implícito o poder de o juiz atender em parte ao pedido detutela antecipada.

O problema é pensar em critérios capazes de justificar racionalmente a concessão datutela antecipada apenas em parte. Ou melhor, a questão é a de buscar critérios quepossam racionalmente explicar a concessão de parte da tutela final almejada ou de parteda própria tutela antecipada requerida.

Tratando-se de tutela antecipada, ou seja, de tutela que requer a consideração deperigo, a tutela deve ser concedida na “medida necessária” para evitar a frustração dodireito buscado pela parte. E assim o problema passa a ser o de precisar essa “medidanecessária”. Muitas vezes é impossível recortar uma “medida necessária” no interior datutela final pretendida, até porque essa última pode não ser objeto de divisão. Entretanto,no caso de pedido de soma em dinheiro, de não fazer, de fazer ou de entrega de coisa quecomporte atendimento em parte, o juiz poderá antecipar parcela da tutela pretendida,ainda que a antecipação solicitada tenha sido total. O mesmo acontece, como é óbvio,quando se pretende como tutela antecipada apenas parcela da tutela final.

Quando a tutela antecipada pode ser deferida em parte, a sua concessão total ouparcial deve buscar justificativa, em primeiro lugar, no perigo demonstrado pelorequerente. Ou seja, se o direito ameaçado de lesão necessitar somente da antecipação departe da tutela final ou de parte da própria tutela antecipada solicitada, há plenaracionalidade na antecipação parcial. Assim, por exemplo, se o autor afirma necessitar desoma em dinheiro para atender determinada situação, e bastar para tanto apenas parte doque foi postulado como tutela final, o juiz deve conceder, como antecipação da tutela,parcela do pretendido ao final, sob pena de a sua decisão não se mostrar racional. Nãoobstante, quando a necessidade de soma em dinheiro apontar para a imprescindibilidadeda antecipação da própria tutela final, a antecipação parcial não encontrará qualquerjustificativa racional, constituindo decisão injusta para o autor.

É certo, contudo, que a determinação da “medida” da tutela antecipada também podeser visualizada a partir do risco de irreversibilidade dos efeitos fáticos da tutela. Aindaque a concessão da tutela sempre exija a verificação da necessidade da satisfaçãoantecipada do direito, a possibilidade da concessão de parcela da tutela é uma excelenteferramenta para o raciocínio decisório do juiz que se encontra diante de um risco deprejuízo irreversível ao demandado.

10.2. O princípio da tipicidade dos meios executivos

O princípio da tipicidade expressa a ideia de que os meios de execução devem estarprevistos na lei e, assim, que a execução não pode ocorrer mediante formas executivasnão tipificadas. Restringindo a execução aos meios estabelecidos na lei, o princípio

objetiva garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbítrio ou de excesso naexecução.

Supõe-se, em razão desse princípio, que os cidadãos têm o direito de saber de queforma as suas esferas jurídicas serão invadidas quando a sentença de procedência não forobservada. Esse princípio é plenamente compreensível, enquanto mecanismo garantidorda liberdade dos litigantes, quando se considera o momento histórico em que foi forjado.

A preocupação em conter o poder executivo do juiz é intimamente ligada aos valoresdo Estado liberal-clássico, ou melhor, à necessidade de impedir a interferência estatal naesfera jurídica dos indivíduos. Nesse sentido o princípio da tipicidade dos meiosexecutivos é a expressão jurídica da restrição do poder de execução do juiz e da ideia deque o exercício da jurisdição deve se subordinar estritamente à lei. Em outras palavras, alei, ao definir os limites da atuação executiva do juiz, seria uma garantia de justiça daspartes no processo.

A necessidade de subordinar o exercício da execução aos meios executivos estampadosna lei influenciou a doutrina italiana clássica e, por consequência, a doutrina brasileira e oCódigo de Processo Civil de 1973. Frise-se, apenas como exemplo, que Crisanto Mandrioli,em seu livro sobre a “esecuzione forzata in forma specifica”, publicado na Itália há maisde cinquenta anos,215 aplaudiu o princípio da tipicidade ao advertir que “a precisareferência às formas previstas no Código de Processo Civil implica no reconhecimento daregra fundamental da intangibilidade da esfera de autonomia do devedor, a qual somentepoderia ser invadida nos modos e através das formas tipicamente previstas pela leiprocessual”.216

Na verdade, não há como negar a relação entre a rigidez das formas processuais e asgarantias de liberdade. Tanto é que Vittorio Denti, ao escrever sobre “il processo dicognizione nella storia delle riforme”, lembrou que Chiovenda, em uma de suas maisfamosas conferências (“Le forme nella difesa giudiziale del diritto”, 1901), não apenassublinhou a necessidade das formas como garantia contra a possibilidade de arbítrio dojuiz, como ainda deixou clara “a estreita ligação entre a liberdade individual e o rigor dasformas processuais”.217

10.3. O princípio da tipicidade como previsão de meios de execução por sub-rogação

A possibilidade de o juiz ordenar sob pena de multa também não poderia ser admitidase o que se pretendia era um juiz despido de força, ou melhor, um juiz destituído de podercapaz de comprimir o direito de liberdade. Por esse motivo, a lei somente poderiaestabelecer meios de sub-rogação, jamais meios de coerção indireta.

Ou seja, quando o direito do autor, para ser efetivado, dependesse de sentença e deatuação no plano dos fatos, os únicos meios que poderiam estar expressos na lei, e que porisso poderiam ser aplicados, eram os meios de sub-rogação. Tal sentença, qualificada decondenatória, somente poderia se ligar a meios de sub-rogação. Daí a famosa “correlaçãonecessária” entre a condenação e a execução – chamada de execução forçada.

Como é óbvio, tal correlação não esconde apenas uma opção pela incoercibilidade dasobrigações infungíveis, mas também a ideologia da intangibilidade da vontade humana.Não há dúvida de que a restrição da atividade executiva aos meios de sub-rogação estácomprometida com as doutrinas que inspiraram o Code Napoléon, pelo qual “todaobrigação de fazer ou não fazer resolve-se em perdas e danos e juros, em caso dedescumprimento pelo devedor” (art. 1.142), e principalmente com o dogma de que acoerção das obrigações infungíveis constitui um atentado contra a liberdade dos homens.

Aliás, a limitação dos poderes de execução tem um significado que ultrapassa o daintangibilidade da vontade humana. Se o art. 1.142 do Code Napoléon constitui umaevidente consagração da garantia da liberdade e da defesa da personalidade,característicos ao jusnaturalismo e ao racionalismo iluminista,218 não se pode esquecer dovínculo entre a ideologia liberal e a transformação do processo econômico,219 ou, emoutras palavras, da estreita ligação entre a concepção liberal de contrato, a igualdadeformal das pessoas e o ressarcimento do dano como sanção expressiva de umadeterminada realidade de mercado,220 o qual necessitava simplesmente de meios deexecução por sub-rogação.

O ressarcimento em dinheiro, limitando-se a exprimir o equivalente pecuniário do bemalmejado, nega as diferenças entre os bens e as pessoas. Ora, se os litigantes são iguais, eassim livres para se autodeterminarem no contrato, não cabe ao Estado, no caso deinadimplemento, interferir na relação jurídica, assegurando a tutela especifica daobrigação mediante o uso da multa. Com efeito, se os limites impostos pelo ordenamento àautonomia privada são de conteúdo negativo, basta o pagamento do valor equivalente aoda obrigação221 e, portanto, os meios de execução por sub-rogação.

10.4. As novas necessidades do direito material e a insuficiência dos meiosexecutivos tipificados em lei

A evolução da sociedade e o surgimento de novas situações de direito substancialrevelaram a insuficiência do procedimento comum e dos meios de execução por sub-rogação.

A insuficiência do procedimento comum pode ser evidenciada pela distorção do uso daação cautelar, ou melhor, pela transformação da ação cautelar em “ação autônomasatisfativa”. Mas, ao lado dessa distorção, atribuiu-se executividade às sentençasproferidas nessas ações, admitindo que a sua execução pudesse dispensar a ação deexecução. Ou seja, diante da inefetividade da tradicional ação de conhecimento, criou-seuma técnica para a sua sumarização dotada de “executividade intrínseca”.

Isso ocorreu não só porque alguns direitos, em razão da sua natureza infungível,passaram a exigir a multa como meio executivo, como também porque outros não mais seconciliavam com os meios clássicos de execução por sub-rogação, especialmente comaqueles tradicionalmente tipificados nos códigos de processo civil.

A falência do princípio da tipicidade dos meios executivos se deve à premissa que lheserve de fundamento. Essa premissa supõe que as necessidades oriundas das váriassituações de direito material podem ser igualizadas e, portanto, se contentar com osmesmos meios executivos. Como é evidente, tal premissa, que sugere a possibilidade de sepensar de maneira abstrata – ou apenas com base em critérios processuais – a respeito daexecução dos direitos, ignora que a função judicial está cada vez mais ligada ao casoconcreto.

Ora, a diversidade das situações de direito material implica na tomada de consciênciada imprescindibilidade do seu tratamento diferenciado no processo, especialmente emrelação aos meios de execução. É equivocado imaginar que a lei pode antever os meios deexecução que serão necessários diante dos casos concretos. A lei processual, se assimatuasse, impediria o tratamento adequado daqueles casos que não se amoldam à situaçãopadrão por ela contemplada.

10.5. Do princípio da tipicidade ao princípio da concentração dos poderes deexecução

As regras processuais que consagraram, já no código de 1973, a tutela antecipada e atutela específica dos direitos, não só admitiram execução no curso do processo (tutelaantecipada), como também execução da sentença independentemente de ação deexecução e mediante os meios de execução capazes de atender às particularidades docaso.

A regra hoje contida no art. 536 do Código de Processo Civil afirma expressamente queo juiz pode determinar, de ofício ou a requerimento, as “medidas necessárias à satisfaçãodo exequente” – exemplificadas no § 1o do mesmo artigo. Note-se que a elasticidadepeculiar à multa, que pode ser fixada em montante suficiente para constranger a parte,aliada à possibilidade de o juiz determinar qualquer outra medida executiva necessáriapara a obtenção da tutela do direito, constitui resposta evidente à tendência de se darpoder executivo para o juiz tratar adequadamente do caso.

Isto demonstra a superação do princípio da tipicidade, deixando claro que, para oprocesso tutelar de forma efetiva as várias situações de direito substancial, éindispensável não apenas procedimentos e sentenças diferenciados, mas também que ojuiz tenha amplo poder para determinar a modalidade executiva adequada ao caso.

Como está claro, ao perceber a necessidade de dar maior poder e flexibilidade ao juiz, olegislador não teve outra alternativa a não ser deixar de lado o princípio da tipicidade.Diante disso é possível dizer que o antigo princípio foi substituído pelo princípio daconcentração dos poderes de execução.

10.6. A influência do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva sobre oprincípio da concentração

Como é sabido, o art. 5.º da Constituição Federal elenca uma série de direitosfundamentais, entre eles o direito à tutela jurisdicional efetiva. O art. 5.º, XXXV, afirmaque “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.Entende-se que essa norma garante a todos o direito a uma prestação jurisdicional efetiva.

A sua importância, dentro da estrutura do Estado democrático de direito, é de fácilassimilação. Ora, é sabido que o Estado, após proibir a autotutela, assumiu o monopólio dajurisdição e, como contrapartida, conferiu aos particulares o direito de ação, até bempouco tempo compreendido apenas como um direito à solução do litígio, mas hoje vistocomo direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.

Esse direito se dirige contra o Estado-legislador e o Estado-Juiz, pois não só engloba umdireito à preordenação das técnicas processuais adequadas, como se dirige à obtenção deuma prestação do juiz. Essa prestação do juiz, assim como a lei, também pode significar,em alguns casos, concretização do dever de proteção do Estado em face dos direitosfundamentais.222 Contudo, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, quando sedirige contra o juiz, não exige apenas a efetividade da proteção dos direitos fundamentais,mas que a tutela jurisdicional seja prestada de maneira efetiva para todos os direitos. Taldireito fundamental, por isso mesmo, não requer apenas técnicas e procedimentosadequados à tutela dos direitos fundamentais, mas técnicas processuais idôneas à efetivatutela de todos os direitos. Como é evidente, a resposta do juiz não é apenas uma forma deoutorgar proteção aos direitos fundamentais, mas uma maneira para se dar tutela efetivaa toda e qualquer situação de direito substancial.

Mas se o juiz tem o dever de prestar tutela jurisdicional efetiva, é certo dizer que o seudever não se resume a uma mera resposta jurisdicional. O dever do juiz, assim como o dolegislador de instituir a técnica processual adequada, está ligado ao direito fundamental àtutela jurisdicional efetiva, compreendido como um direito imprescindível para a

proteção de todos os outros direitos.

O jurisdicionado não é obrigado a se contentar com um procedimento inidôneo à tutelajurisdicional efetiva, pois o seu direito não se resume à possibilidade de acesso aoprocedimento legalmente instituído. Com efeito, o direito à tutela jurisdicional não poderestar limitado ao direito de igual acesso ao procedimento estabelecido, ou ao conceitotradicional de direito de acesso à justiça. Não mais importa apenas dizer que todos devemter iguais oportunidades de acesso aos procedimentos e aos advogados e, assim, à efetivapossibilidade de argumentação e produção de prova, uma vez que o julgamento do mérito,na perspectiva daquele que busca o Poder Judiciário, somente tem importância quando odireito material é efetivamente realizado.223

É por essa razão que o direito de ação, ou o direito de acesso à justiça, deve ser pensadocomo o direito à tutela jurisdicional efetiva, que tem como corolário o direito às técnicasprocessuais – e inclusive ao meio executivo – adequadas ao caso concreto.224 Se há direitoao meio executivo adequado, mas esse direito depende de o juiz ter poder para determiná-lo conforme as circunstâncias do caso, não é possível aceitar a ideia de que os meios deexecução devem estar previamente estabelecidos em lei. O direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva exige que o juiz tenha poder para determinar a medida executivaadequada e por consequência reclama o princípio da concentração dos poderes deexecução do juiz.

10.7. As cláusulas gerais executivas como respostas ao direito ao meio executivoadequado

Como o direito fundamental à tutela jurisdicional incide sobre o Estado-legislador,obrigando-o a instituir regras e instrumentos capazes de dar efetividade à prestaçãojurisdicional, o legislador se viu obrigado a outorgar ao juiz poder suficiente para que elepudesse bem tratar dos casos concretos.

As regras dos artigos 84 do Código de Defesa do Consumidor e 536, 537 e 538 do Códigode Processo Civil são respostas do legislador à ideia de que tal direito fundamental exigeque o juiz concentre poder para determinar a medida executiva necessária para darefetividade à tutela jurisdicional. Tais regras instituem a possibilidade de o juizdeterminar a medida executiva adequada ao caso concreto e, inclusive, variar o montanteda multa necessário ao convencimento do demandado.

Estas regras podem ser ditas abertas à concretização judicial. Elas contêm a previsãode que o poder de execução deve ser concretizado conforme as circunstâncias do casoconcreto. Reforço disso é a alusão expressa às “medidas necessárias” à execução, contidanos artigos 536 do Código de Processo Civil e 84, § 5.º, do Código de Defesa do Consumidor.

A regra do art. 297, ao prescrever que “o juiz poderá determinar as medidas queconsiderar adequadas para efetivação da tutela provisória”, constitui uma cláusula geralexecutiva a ser preenchida de acordo com as diferentes formas de tutela sumáriaobjetivadas e segundo as circunstâncias do caso.

Perceba-se que como as regras processuais, em geral, vinculam o juiz e as partes ao quepode e ao que não pode ser feito, tais regras têm uma natureza peculiar, pois não sóapresentam uma moldura ampla, dentro da qual o juiz pode trabalhar, como anunciamque esse trabalho deve ser realizado com base na natureza da tutela de direitoambicionada e segundo as circunstâncias do caso concreto, quando então poderá serestabelecida a medida executiva necessária.

Ou melhor, tais regras não “definem tudo o que poderia ser definido”, isto é, não fixam

as medidas executivas que devem ser utilizadas, mas deixam ao juiz o poder de escolher amedida executiva adequada ao caso concreto. Como é obvio, essa “indefinição” é própria auma regra aberta à concretização judicial, que também pode ser pensada, na perspectivado poder de escolha do meio executivo conferido ao juiz, como uma cláusula geralexecutiva.

Como é sabido, o juiz é obrigado a interpretar as normas infraconstitucionais deacordo com a Constituição225 ou de acordo com os direitos fundamentais.226 Isso decorre dadimensão objetiva dos direitos fundamentais ou da sua força jurídica objetiva, quando sefala na eficácia irradiante dos direitos fundamentais.227

Esta eficácia irradiante é que faz surgir a tese da interpretação de acordo com osdireitos fundamentais. Ora, a interpretação da cláusula geral executiva ou a eleição domeio executivo adequado deve ser feita em conformidade com os direitos fundamentais àtutela jurisdicional efetiva e à defesa, os quais devem ser visualizados a partir da premissade que a prestação jurisdicional se destina a fazer valer a tutela prometida pelo direitomaterial.

10.8. Princípio da concentração, ruptura da regra da congruência e possibilidade dealteração do meio executivo

Os artigos 536, 537 e 538 do Código de Processo Civil e 84 do Código de Defesa doConsumidor não só deferem ao autor a oportunidade de requerer o meio executivo quereputar adequado ao caso concreto, mas também ao juiz o poder de conceder meioexecutivo diverso do solicitado.

A quebra do princípio da tipicidade não implicou apenas na possibilidade de uso demeio executivo não previamente estabelecido, mas também na não adstrição do juiz aomeio executivo solicitado. O princípio da tipicidade e a regra da congruência possuemíntima relação com a ideia de garantia de liberdade dos litigantes. Se a tipicidade tem afunção de impedir a execução através de meio executivo não previsto na lei, a regra daadstrição seria um corolário seu, isto é, uma regra destinada a complementar a segurançado litigante, que somente poderia ter a sua esfera jurídica invadida por intermédio domeio de execução previsto na lei e escolhido pelo autor.

Quando se percebeu que, para bem tratar das novas situações de direito substancial,era necessário dar maior mobilidade ao juiz – até porque o Judiciário deixou de serpensado como “inimigo público” –, foi conferido ao autor a possibilidade de escolher omeio executivo adequado e ao juiz não apenas o poder de admiti-lo, mas também o poderde, ao considerá-lo inidôneo, conceder outro. Vale dizer que, diante das cláusulas geraisexecutivas, além de a lei não definir o meio executivo que deve ser utilizado, dando aoautor a possibilidade de postular o que reputar oportuno, o juiz não está mais adstrito aomeio executivo solicitado, podendo determinar aquele que lhe parecer o mais adequadoao caso concreto.

Nessa linha de argumentação, não é difícil perceber a razão de se dar ao juiz apossibilidade de aumentar ou diminuir o valor da multa na fase de execução, conforme oart. 537. Isso se deve ao fato de que a multa é uma modalidade executiva e, assim, deve serproporcional à finalidade a que se destina. Na verdade, o juiz pode alterar qualquermodalidade executiva e não só o valor da multa, podendo até mesmo substituir a multapor uma medida de execução direta ou vice-versa.

Note-se que a desnecessidade de observância estrita da lei e do pedido, bem como aliberdade de alteração do meio executivo, tem um só fundamento: o direito fundamental àtutela jurisdicional efetiva.

10.9. A omissão legal e o dever de o juiz determinar o meio executivo adequadocomo decorrência do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva

Se a técnica processual é imprescindível para a efetividade da tutela dos direitos, nãose pode supor que, diante da omissão do legislador, o juiz nada possa fazer, uma vez que odireito fundamental à tutela jurisdicional efetiva não se volta apenas contra o legislador,mas também se dirige contra o Estado-Juiz. Portanto, é equivocado imaginar que o juizdeixa de ter dever de tutelar de forma efetiva os direitos somente porque o legisladordeixou de editar uma norma processual capaz de atender ao direito material.

De acordo com o art. 5.º, § 1.º, da Constituição Federal, “as normas definidoras dosdireitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”.228 Quando se diz que taisnormas têm aplicação imediata, deseja-se evidenciar sua força normativa. Como a essanorma não se pode atribuir função retórica, não há como supor que o direito fundamentalà tutela jurisdicional efetiva somente possa se expressar em conformidade com a lei, e queassim seja dela dependente.

Isso significa que o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva não pode sercomprometido por um defeito de técnica processual. Supor que o direito à tutelajurisdicional é o direito de ir a juízo através do procedimento legalmente fixado, poucoimportando a sua idoneidade para a efetiva tutela dos direitos, é inverter a lógica da relaçãoentre o direito material e o direito processual. Ora, se o direito à tutela jurisdicional restarna dependência da técnica processual expressamente presente na lei, o processo é que estarádando os contornos do direito material. Mas, como é óbvio, deve ocorrer exatamente ocontrário, pois o primeiro serve para cumprir os desígnios do segundo. Por essa razão aausência de técnica processual adequada para a tutela do direito material representahipótese de omissão legal que atenta contra o direito fundamental à tutela jurisdicionalefetiva.

Se o dever de o legislador editar o procedimento idôneo pode ser reputadodescumprido diante de determinado caso concreto, o juiz, diante dessa situação,obviamente não perde o seu dever de prestar a tutela jurisdicional efetiva. Com efeito, nãoé possível ignorar os casos em que não existe legislação ou que essa é insuficiente, hipótesesdenominadas por Vieira de Andrade como de “falta de lei”.229 Nesse caso – esclarece ojurista português –, “o princípio da aplicabilidade direta vale como indicador deexequibilidade imediata das normas constitucionais, presumindo-se a sua ‘perfeição’. Istoé, a sua autossuficiência baseada no caráter líquido e certo do seu conteúdo de sentido.Vão, pois, aqui incluídos o dever dos juízes e dos demais operadores jurídicos de aplicaremos preceitos constitucionais e a autorização para com que esse fim os concretizarem por viainterpretativa”.230

Na hipótese em que o Estado se omite em editar técnica processual adequada à efetivaprestação da tutela jurisdicional, o juiz deve verificar se a sua aplicação é necessária emface das necessidades do direito material, ou seja, das tutelas que devem ser prestadaspara que ocorra a efetividade do direito. Realmente, se não há dúvida que o juiz deveprestar a tutela do direito de modo efetivo, é preciso apenas verificar se as necessidadesdo direito material exigem uma técnica processual não prevista pela lei. Nessa situação, ojuiz deve analisar a tutela prometida pelo direito material – se inibitória, ressarcitória etc.– e as circunstâncias do caso concreto – se é necessária a antecipação, qual o meioexecutivo capaz de atender à necessidade de tutela etc. – para então concluir se houveomissão legal, vale dizer, falta de atendimento ao direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva pelo legislador.

No caso de omissão ou de insuficiência legal, o juiz deve supri-la, aplicando

diretamente a norma que institui o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, massem deixar de considerar os direitos fundamentais processuais que protegem o réu.

10.10. O controle do poder executivo diante das cláusulas gerais

Já ficou claro que o juiz tem o poder de determinar o meio executivo adequado ao casoconcreto. Porém, seria absurdo imaginar que não há como controlar a racionalidade dassuas opções e decisões. Como nenhum poder pode restar sem controle e o controle dopoder de execução do juiz é imprescindível para a própria legitimidade do PoderJudiciário e para a noção de participação adequada das partes no processo, é evidente quetal controle, diante das quebras do princípio da tipicidade e da regra da congruência,agora deve ser feito de outra forma, muito mais complexa e sofisticada.

Como a concentração dos poderes de execução do juiz exige uma cláusula aberta aocaso concreto, trata-se de exigir uma relação entre o uso do poder e as peculiaridades dasituação conflitiva. Esse controle somente pode ser feito mediante uma regrahermenêutica que admita que há uma cláusula geral que deve ser concretizada pelo juizem face das circunstâncias do caso concreto. Por isso, tal regra hermenêutica, da mesmaforma que a cláusula geral executiva, jamais poderá ser definida em abstrato epreviamente, pois sempre dependerá da hipótese a ser julgada. Ora, se a regrahermenêutica serve para controlar a concretização de uma cláusula geral, é pouco maisque evidente que ela também somente adquire significado quando toma em consideraçãoas peculiaridades do caso concreto, ou seja, a concretização da cláusula geral executiva.

Quando se raciocina sobre os limites do fazer ou do não fazer – por exemplo, cessaçãode uma atividade empresarial ou instalação de equipamento antipoluente –, e não sobre amedida executiva para a implementação do fazer ou do não fazer – por exemplo, ordemsob pena de multa para a cessação ou simples interdição da fábrica –, o juiz deve justificara sua adequação e a sua necessidade.

A adequação quer significar que o fazer ou o não fazer não pode infringir oordenamento jurídico para proporcionar a tutela. A necessidade, por sua vez, tem relaçãocom a efetividade do fazer ou do não fazer, isto é, com a sua capacidade de realizar – naesfera fática – a tutela do direito. É por tal motivo que essa última regra se divide emoutras duas: a do meio idôneo e a da menor restrição possível. O fazer idôneo é aquele quetem a capacidade de proporcionar faticamente a tutela. Mas, essa ação (fazer ou nãofazer), embora idônea a prestação da tutela, deve ser a que cause a menor restriçãopossível à esfera jurídica do réu. Quando tal ação é idônea e, ao mesmo tempo, causa amenor restrição possível, ela é a mais idônea ou a mais suave para proporcionar a tutela.

Assim, por exemplo, se o Ministério Público, alegando poluição ambiental, pede que ojuiz ordene, mediante tutela antecipada, que o réu cesse as suas atividades, e a provademonstra, ainda que sumariamente, que basta a instalação de um equipamentoantipoluente, o juiz pode fugir do requerimento e ordenar a sua instalação (menorrestrição). Se a situação for inversa, tendo o Ministério Público pedido a instalação deequipamento antipoluente, e o juiz se convencido da probabilidade da necessidade decessação das atividades, o juiz deverá justificar que essa providência é a alternativa idôneapara a tutela do direito ambiental.

Além disso, como a decisão deve fixar não apenas o fazer, mas também o meioexecutivo capaz de implementá-lo, é preciso perceber que a escolha do meio executivotambém se subordina a regras ou critérios. Nessa dimensão não mais importa saber se ofazer ou o não fazer destinado a implementar a tutela é adequado e o mais suave. O queinteressa é encontrar o meio executivo adequado e necessário – idôneo à tutela do direitoe, ao mesmo tempo, menos restritivo ao réu.

É evidente que o meio executivo deve ser adequado e idôneo para a tutela do direito. Oproblema, na realidade, está na escolha do meio mais suave, isto é, daquele que, além deadequado e idôneo (efetivo) à tutela jurisdicional, é o menos prejudicial ao réu. Ora,apenas as circunstâncias do caso concreto é que poderão indicar a medida executivanecessária ou mais suave, vale dizer, aquela que, sendo boa para o autor, é também amelhor para o réu.

É possível fazer uma primeira análise – em nível doutrinário e abstrato – a respeito dosmeios executivos, mas é preciso deixar bem claro que essa análise jamais suprirá aquelareservada ao juiz diante do caso concreto. Nessa perspectiva, é possível dizer quedeterminadas medidas de execução direta, isto é, medidas executivas que prescindem danecessidade de constrangimento da vontade do réu, podem ser mais efetivas do que amulta. Mas isso nem sempre será assim, pois há casos em que a medida de execuçãodireta, ainda que praticada por auxiliar do juízo, implica em grande gasto de dinheiro,enquanto que em outros ela somente pode ser realizada por terceiro, que obviamentedeve ser custeado.

Diante do novo contexto em que vive a execução, o uso da multa deve preferir o dosmeios de execução direta, pois está totalmente ultrapassada a ideia de que a multa deveficar reservada aos casos em que a execução direta não pode atuar, ou seja, às hipótesesde obrigações infungíveis. Na verdade, o que se deseja evidenciar é a inexistência de umarelação de alternatividade entre execução direta e multa, pois não há nada que possasustentar o raciocínio de que a multa somente é cabível no caso de obrigação infungível.

Note-se, aliás, que o art. 538, § 3o, ao dizer que as disposições relativas ao fazer e ao nãofazer também são aplicáveis quando se pretende entrega de coisa, deixou claro apossibilidade do uso da multa na ação em que se pretende obter coisa. Ainda que a buscae apreensão possa ser efetiva, não é possível esquecer que, em alguns casos, podem existirobstáculos contornáveis através da utilização da multa. Assim, por exemplo, no caso emque não se pode localizar a coisa móvel para a busca e apreensão. Ou na hipótese em queo réu impede o acesso do oficial de justiça à coisa, a esconde ou se nega a informar dadosfundamentais para o seu desmonte e transporte. Nessas situações, a efetividade da multa éinegável.

Deixe-se claro, porém, que não se está afirmando que a utilização da multa édependente da dificuldade na apreensão da coisa. Ao contrário, a multa pode preferir abusca e apreensão por ser mais econômica ao autor. Pense-se em sua oportunidade nahipótese em que a coisa devida constitua uma grande máquina, que exige dispêndioconsiderável de dinheiro para o seu desmonte e transporte. Em uma situação desse tipo, ouso da multa não só é permitido, como consiste no meio mais eficaz para a tutela dodireito.231

Por outro lado – como já demonstrado acima no item “a prisão como meio de coerçãoindireta” – a prisão não é possível na hipótese em que se pretenda um ato que exijadispêndio de patrimônio. Fora daí, ela é viável quando a execução direta ou a multa nãose mostram idôneas para a tutela do direito. Ou seja, a prisão deve ser vista como a últimaalternativa para a imposição de ordem judicial imprescindível para a tutela do direito.

É necessário advertir que a escolha do agir e da medida executiva torna imprescindívela justificação do juiz. A justificação, como fundamentação da escolha judicial, éabsolutamente indispensável. A sua ausência torna arbitrária a opção do juiz, pois cabe àjustificação demonstrar a perfeição do raciocínio amparado nas regras antes referidas. Emoutras palavras, o controle do poder executivo inicia mediante a aplicação das regras antesmencionadas, mas não dispensa, como complemento, a adequada justificação. Assim, por

exemplo, quando o juiz reputa, a partir da regra da necessidade, que o fazer ou o meioexecutivo não configuram a menor restrição possível, cabe-lhe, além de impor o agir quetraz a mesma utilidade para o autor e uma menor restrição ao réu, justificaradequadamente o seu procedimento, explicando a sua decisão.

10.11. O controle do poder executivo após o trânsito em julgado

Na fase de execução, se o agir fixado na sentença não for observado pelo réu, estepoderá ser alterado, pois aquele que seria o meio mais suave para tutelar o direito doautor, por ter sido recusado pelo demandado, exige a definição de outro agir, que possa seridôneo à tutela do direito.

Como se vê, não é possível ao juiz questionar, na fase de execução, se o agir fixado nasentença é adequado à tutela do direito ou não configura a menor restrição possível. Aregra da necessidade deve ser novamente analisada em razão de o agir não ter sidoobservado pelo réu. O réu, com o não cumprimento da sentença, abre oportunidade paraque outro agir seja imposto, uma vez que o fixado na sentença restou inidôneo. Por isso,outro agir, idôneo à tutela do direito, deve ser escolhido pelo juiz.

Para exemplificar: o juiz não pode, na fase de execução, considerar que a instalação deequipamento antipoluente: i) não é adequada para a tutela do direito; ii) não representa amenor restrição possível; ou iii) fere a regra de que não é possível uma restriçãodesproporcional. O juiz apenas pode inovar quando o réu não atende à sentença, e assim oagir deixa de se configurar, por culpa sua, como meio mais idôneo, permitindo que umoutro seja imposto no seu lugar. De modo que se o réu não instala o equipamento,atendendo à ordem sob pena de multa, o juiz não é obrigado a determinar que oequipamento seja instalado por terceiro – alterando apenas o meio executivo –, mas ficacom a possibilidade de determinar a interdição da fábrica.

Por outro lado, o meio executivo – e não apenas a forma de agir – também pode sermodificado após o transito em julgado da sentença, quando novamente devem serconsideradas apenas as regras do meio idôneo e da menor restrição. O Código de ProcessoCivil é expresso no sentido de que o juiz pode, de ofício ou a requerimento, modificar ovalor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que se tornouinsuficiente ou excessiva (art. 537, § 1º, I, CPC). Assim, é possível que o juiz conclua que ovalor ou a periodicidade da multa – que devem ter observado a regra do meio mais suavena sentença – sejam modificados, ou mesmo que seja alterado um meio de execução que,embora observado pelo demandado, possa ser substituído por um menos gravoso.

Ademais, se a sentença for descumprida, o juiz pode substituir a multa pela execuçãodireta ou vice-versa, ou ainda impor a prisão como última alternativa – no caso de ordemque não exija disposição de patrimônio. Nessa linha, a única forma de se controlar oexercício do poder será através da análise da justificação. O juiz deverá justificar a razãopela qual, por exemplo, a multa não teve êxito, e porque acredita que a execução direta oua prisão poderão viabilizar o encontro da efetividade da tutela jurisdicional.

10.12. O controle da alteração da modalidade executiva na tutela antecipada

De acordo com o art. 298 do Código de Processo Civil, o juiz pode modificar ou revogara tutela antecipada. Lembre-se que não é apenas a alteração da situação de fato quepermite a alteração da tutela, mas também o surgimento, derivado do desenvolvimento docontraditório, de uma outra evidência sobre a situação fática.

Na tutela antecipada não há preclusão; assim, a modificação do fazer e do não fazer edo meio executivo não fica subordinada à hipótese de inadimplemento da decisão. Para a

alteração do não fazer ou do fazer não é necessário o não cumprimento da tutela,bastando o surgimento de uma nova circunstância, seja fática, seja decorrente dodesenvolvimento do contraditório. Por isso, o juiz pode modificar a tutela antes dela tersido conhecida pelo réu ou após ter sido observada, quando a sua eficácia deva se protrairno tempo.

10.13. O controle da determinação da modalidade executiva adequada naantecipação de soma

Como já visto, a tutela antecipada de soma deve ser implementada mediante meiosexecutivos capazes de permitir a sua efetivação em tempo que permita atender ao seupróprio pressuposto legitimador: a urgência. O direito à execução da tutela antecipada éuma modalidade especial do direito à execução das decisões jurisdicionais – que écorolário do direito fundamental à tutela jurisdicional –, particularizado por ser direito àexecução de uma tutela fundada em urgência.

Também já foi demonstrado que a tutela antecipada de soma deve ser executada porintermédio de meios executivos próprios e idôneos. Porém, nesse momento importa saberquando o juiz pode utilizar os meios executivos, ou seja, a prisão civil, o desconto emfolha, o desconto de rendas periódicas, a multa, a penhora on line e a penhora de outrosbens.

A prisão apenas pode ser utilizada para constranger o devedor a pagar alimentos.Contudo, como já observado, os alimentos não têm fonte apenas no direito de família, mastambém no ato ilícito. Isso quer dizer que a prisão pode ser utilizada, como meio decoerção, quando o juiz entende que o autor precisa imediatamente de alimentosindenizativos. Ora, se a tutela antecipada é concedida porque se supõe que o autornecessita da soma, não admitir a sua execução por intermédio da prisão pela razão de queos alimentos não se fundam em direito de família é algo claramente contraditório,constituindo violação do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.

A prisão somente pode ser negada quando há possibilidade de a execução da somaalimentar ser feita por desconto em folha, desconto de renda periódica (aluguel etc.),penhora on line ou através de multa coercitiva. Não há qualquer racionalidade em pensarque a prisão não pode ser utilizada quando for viável a penhora de bens diferentes que odinheiro. É que nesse último caso não há execução tempestiva e, portanto, hádesconsideração da própria urgência que legitimou a concessão da tutela antecipada.

Quando a soma perseguida não caracterizar verba alimentar, mas a necessidade da suaobtenção também for urgente para o autor, nada impedirá a utilização da multa comomeio de coerção indireta. Se é evidente a impossibilidade de a tutela antecipada serexecutada mediante penhora e expropriação de bens diversos de dinheiro, o direitofundamental à tutela jurisdicional efetiva não só justifica, mas na realidade impõe o usoda multa como meio executivo.232 Se isso não acontecer, o direito à tutela antecipada, queobviamente está inserido no direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, seráevidentemente negado pelo juiz.

Não se diga que a multa não tem utilidade porque pode ser transformada pelo réu emsimples valor a ser cobrado (sanção pecuniária), quando então existirá dificuldade igual aque se tinha para cobrar o valor do principal. Isso é pouco mais que absurdo, pois seria omesmo que dizer que a multa não tem efetividade alguma porque pode ser transformadaem sanção pecuniária pelo réu que se nega a não fazer, a fazer ou a entregar coisa. Negaro valor da multa diante de soma em dinheiro é simplesmente eliminar a utilidade damulta como meio de coerção indireta.

Por outro lado, há um grande equívoco em ver na dificuldade da cobrança da multaalgo que possa influir decisivamente sobre a sua efetividade. Pensar mais em como cobrara multa do que na sua efetividade como mecanismo de coerção é uma perspectiva de análiseainda comprometida com um sistema processual preocupado fundamentalmente com acobrança do valor equivalente ao do direito degradado em pecúnia.

Essa visão patrimonialista ou monetizadora dos direitos é que perturba a visão daimportância da multa como forma de pressão ao pagamento, absolutamente indispensávelquando se precisa imediatamente de soma em dinheiro e não se pode recorrer à prisão, aodesconto em folha ou de renda periódica ou à penhora on line. É por isso que, em caso detutela antecipada de soma, a execução por meio de penhora de bem diferente de dinheiro é aúltima via que deve ser percorrida.

10.14. A justificativa como forma de racionalizar o uso do poder de execução e deviabilizar a participação das partes no processo

Se o juiz pode determinar a modalidade executiva adequada ao caso concreto, cabe-lheobviamente justificar a forma executiva que lhe parecer idônea e menos restritiva. Como opoder executivo não é mais delimitado pelo princípio da tipicidade e pela regra daadstrição, o juiz deve explicar as razões que o levaram a admitir ou a determinar, aindaque em contrariedade ao pedido, o meio de execução.

Não se pretende, nesse momento, voltar a tratar da importância da justificativa dadecisão que defere ou indefere a tutela antecipada, mas apenas frisar que as regras para ocontrole da racionalidade da decisão judicial, como a do meio idôneo e da menorrestrição, não teriam qualquer importância se não fosse clara a necessidade de o juizdemonstrar a sua perfeita adoção na justificativa da sua decisão.

A justificativa permite controle crítico sobre o poder do juiz.233O equívoco, reveladopela justificativa, é que evidenciará a ilegitimidade do meio de execução. Sem ajustificativa, a legitimidade do exercício do poder de execução ficaria comprometida e nãoseria possível concretizar o direito constitucional das partes participarem adequadamentedo processo.

A ampliação do poder de execução do juiz, ocorrida para dar maior efetividade à tutelados direitos, possui como contrapartida a necessidade de que o controle da atividadeexecutiva seja feito pelas regras do meio idôneo e da menor restrição e pelo seuindispensável complemento, a justificação judicial. Em outros termos: pelo fato de o juiz terpoder para a determinação da melhor maneira de efetivação da tutela, exige-se dele, porconsequência, a justificação das suas escolhas. Nesse sentido se pode dizer que ajustificativa é a outra face do incremento do poder do juiz.

O crescimento do poder executivo do juiz e a necessidade de outros critérios decontrole da decisão judicial nada mais são do que consequências das novas situações dedireito substancial e da tomada de consciência de que o Estado tem o dever de darproteção efetiva aos direitos.

Na justificativa, o juiz deve dizer a razão pela qual preferiu uma modalidade deexecução e não outra. Porque preferiu, por exemplo: i) ordenar a instalação de umequipamento antipoluente ao invés de ordenar a cessação das atividades da empresa; ii)utilizar a multa e não a execução direta quando verificou que o réu deveria fazer, e iii)determinar o desconto em folha e não ordenar sob pena de multa quando deferiu aantecipação de soma. Tais opções somente podem ser aceitas se configuram o meio maissuave, concretizando o meio idôneo e o menos restritivo.

As regras antes referidas, embora façam parte do raciocínio decisório, pois viabilizam adecisão, obviamente não podem ser ignoradas quando da justificativa. Até porque nãoservem apenas para facilitar a decisão, mas muito mais para justificá-la de modo racional,permitindo o seu controle pelas partes.

11. Revogação e modificação da tutela

11.1. Eficácia temporal das tutelas cautelar e antecipada

A tutela cautelar, na concepção da doutrina clássica, sempre foi ligada à sentença queresolve o litígio. Daí a provisoriedade, apontada por esta doutrina como característica datutela cautelar. Nesta concepção doutrinária, a tutela cautelar é destinada a dar segurançaao processo.234

Acontece que a tutela cautelar é um direito da parte e um dever do Estado, destinando-se especialmente a dar segurança à tutela do direito material, para a qual a sentença não ébastante. Lembre-se, por exemplo, que a tutela ressarcitória pelo equivalente não éprestada pela sentença condenatória, dependendo de meios de execução idôneos.

Portanto, a tutela cautelar não encontra limite no trânsito em julgado da sentença deprocedência, mas sim no trânsito em julgado da sentença de improcedência. No caso desentença de procedência, como a tutela do direito ainda pode depender da execução, atutela cautelar deve manter-se eficaz até a utilização dos meios executivos. Como está claro,a eficácia da tutela cautelar tem ligação com o perigo que pode inviabilizar a efetiva tutelado direito e não com a sentença de procedência transitada em julgado.

Algo diferente se passa com a tutela antecipada. Essa não tem razão para sobrevir aotrânsito em julgado da sentença de procedência. Na verdade, a tutela antecipada deixar deter razão de ser quando transitada em julgado a sentença de procedência.

A tutela urgente não teria motivo para persistir caso a sentença de procedênciaproduzisse efeitos na pendência da apelação. Mas como não é assim, o art. 1.012, §1o, V, doCódigo de Processo Civil afirma que a sentença produz efeitos imediatamente quandoconfirma, concede ou revoga a tutela provisória

11.2. Manutenção excepcional da tutela de urgência em caso de sentença deimprocedência

Ademais, embora se possa entender, a princípio, ser ilógica a manutenção da tutela deurgência – cautelar e antecipada – em caso de sentença de improcedência, não há razãopara não admitir que o juiz possa mantê-la eficaz em casos excepcionais.235

Note-se que não há contradição entre a declaração da inexistência do direito e anecessidade da manutenção da tutela urgência. A declaração da inexistência do direitonão elimina o perigo de dano, já que o que vale, em caso de recurso, é o julgamento dotribunal, ou seja, a cognição definitiva. Não há como negar que a revogação da tutela, emcaso de sentença de improcedência, abre oportunidade para um dano na pendência dorecurso. Como é óbvio, dano poderá ocorrer até que o tribunal reforme a sentença queimplicou a revogação da tutela.

É claro que a não revogação da tutela – que, repita-se, é excepcional – exige do juizatenta consideração à natureza da tutela de direito em disputa e às particularidades docaso concreto, especialmente daquelas relacionadas à situação de perigo de dano.Perceba-se, por exemplo, que a revogação da tutela inibitória faz surgir a imediata

oportunidade para a prática do ilícito, eliminando completamente a possibilidade de seobter uma tutela jurisdicional íntegra do direito material em caso de reforma da sentençarecorrida.

De qualquer forma, o art. 1.012, § 1o, V, do Código de Processo Civil é claro no sentidode que a sentença produz efeitos imediatos também quando revoga a tutela provisória.Ora, se a sentença só tem efeitos imediatos quando revoga a tutela, é evidente que, quandonada diz, a mantém. Significa que o juiz, de acordo com o código, só não mantém a tutelaprovisória de urgência quando a revoga ao julgar improcedente o pedido de tutela final.

11.3. Fundamentos para a revogação ou modificação da tutela de urgência

A tutela de urgência deve ser revogada quando desaparecer a situação de perigo dedano ou a própria probabilidade do direito à tutela final que legitimou a sua concessão.Isto quer dizer que tanto a tutela cautelar quanto a tutela antecipada podem vir adesaparecer – independentemente de agravo de instrumento – sem que se tenha chegado nasentença.236

O juiz deve revogar a tutela de urgência não apenas quando surgir um fato novo capazde lhe permitir a formação de nova convicção a respeito do perigo de dano, mas tambémquando surgir nova prova derivada do prosseguimento do debate em torno do litígio.Quer dizer que o juiz não só pode revogar a tutela urgente diante de novos fatos, comotambém pode redecidir a questão com base em prova nova.

Ao decidir com base em cognição sumária o juiz não declara a existência ou ainexistência do direito à tutela; o juízo sumário é de mera probabilidade. Ao decidir pelatutela de urgência, o juiz aceita implicitamente a possibilidade de chegar a diversaconvicção no curso do processo. Assim, quando se está diante de decisão que concedetutela de urgência, quebra-se o princípio de que não é possível decidir a mesma questãoduas vezes. Tratando-se de decisão fundada em cognição sumária, a viabilidade de sevoltar a decidir é consequência da circunstância de que a convicção judicial podenaturalmente se alterar no curso do processo. A primeira decisão, por ter sido tomadacom base em cognição menos aprofundada, é logicamente sujeita a revisão, poucoimportando se os fatos não se alteraram, mas apenas novas provas foram produzidas.

Aliás, ao desaparecer qualquer dos fundamentos da tutela urgente, a sua revogaçãoimediata não só é consequência da aplicação da regra de que o réu não pode sersubmetido a gravame despropositado, como ainda da circunstância de que a tutelaurgente limita o direito de defesa para permitir a efetividade do direito de ação.

Ademais, mesmo que não haja alteração da convicção acerca da probabilidade dodireito ou do perigo de dano, o juiz pode se convencer de que uma modalidade de tutelacautelar menos gravosa é suficiente ou que basta parcela da tutela antecipada para evitarque dano seja provocado ao autor. A possibilidade de modificação da tutela sem alteraçãodas circunstâncias fáticas que envolvem o perigo e a produção de novas provas quepossam alterar a convicção sobre o litígio tem fundamento na possibilidade – que naverdade é um dever – de o juiz restringir o prejuízo do demandado desde que nãoprejudique aquele que obteve a tutela de urgência.

11.4. Revogação ou modificação da tutela de urgência no tribunal

A tutela de urgência também pode ser revogada ou modificada no Tribunal. Nessahipótese, porém, só o surgimento de novos fatos relacionados ao perigo pode justificar arevogação/modificação da tutela.

Frise-se que, quando se fala em revogação ou modificação da tutela, deixa-se de lado oagravo de instrumento ou mesmo o recurso de apelação. Quando interposto recurso não hádúvida que a tutela de urgência pode ser revogada ou modificada, inclusive em virtude deatribuição de efeito suspensivo à apelação ou ao agravo de instrumento, nos termos doart. 1.012, §§ 3o e 4o e do art. 1.019, I, do Código de Processo Civil.

O recurso, contudo, tem a ver com a natural possibilidade de o tribunal reapreciar aoportunidade da tutela de urgência em vista do que já foi demonstrado em juízo. O queaqui importa saber é se o tribunal pode ser instado a revogar/modificar a tutela emvirtude de fato novo – surgido após à interposição do recurso, especialmente da apelação –capaz de alterar a convicção acerca da situação indicativa do perigo.

Não há dúvida que sim. Diante de fato novo, capaz de eliminar ou alterar a situação deperigo, a parte pode apresentar petição simples ao relator, requerendo a revogação ou amodificação da tutela de urgência. O relator, como é óbvio, só poderá decidir depois deouvir o recorrido.

11.5. Modificação da tutela em proveito da parte que a obteve

Quando se associa modificação com revogação da tutela, entende-se quase queintuitivamente que a modificação deve favorecer a parte contra a qual a tutela foiconcedida. No entanto, o art. 296 fala em possibilidade de modificação da tutela semaludir a quem pode requerê-la.

A parte que já obteve tutela cautelar ou tutela antecipada pode ter obtido tutela quenão correspondeu ao seu pedido – v.g., tutela antecipada parcial – ou que, diante de fatosposteriormente ocorridos, deixou de ser adequada. Portanto, aquele que já obteve tutelaurgente pode ter necessidade de modificá-la ou ampliá-la, sabido que a ideia de ampliaçãoestá presente na de modificação. Nestas situações, nova prova ou fato novo – ainda quepreexistente – podem fundamentar o requerimento de tutela de urgência.

11.6. Eficácia da tutela no período de suspensão do processo

O parágrafo único do art. 296 afirma que, salvo decisão em contrário, a “tutelaprovisória” conserva eficácia no período de suspensão do processo. A norma se importaespecialmente com a tutela de urgência, tendo em vista que a suspensão do processo, alémde poder ser incompatível com o perigo, pode gerar um perigo inverso.

Note-se que, se a tutela de urgência é requerida em virtude da demora para a obtençãoda tutela final, o requerimento de suspensão do processo pelas partes pode ser indicativode que não há perigo. Não obstante, a parte que obteve tutela de urgência não deve serimpedida de requerer a suspensão do processo nem pode ter que deixar de contar com atutela de urgência quando a suspensão do processo independe da sua vontade. Naverdade, como o requerimento de suspensão do processo é consequência da convençãodas partes ou de algo que independe de ambas as vontades (art. 313, CPC), apenas naúltima hipótese é que se pode cogitar de suspensão da eficácia da tutela de urgência.

Para que o juiz possa suspender a eficácia da tutela de urgência em razão da suspensãodo processo, é necessário que o prazo de suspensão constitua sinal de que a manutençãoda tutela causará prejuízo desrazoável à parte que não pode aprofundar a discussão dolitígio e, assim, evidenciar a falta de probabilidade do direito ou a inexistência de perigode dano.

12. Restituição das coisas no estado anterior, reparação dos danos e responsabilidade

pelo dano provocado pela efetivação da tutela urgente

12.1. A restituição das coisas no estado anterior e a reparação dos danosprovocados pela execução

A efetivação da tutela provisória e a execução provisória da sentença constituem atosjurídicos lícitos que podem dar causa, quando indevidos, à restituição ao estado anteriore/ou ao ressarcimento (art. 520, I e II, CPC). É possível a restituição ao estado anteriorquando é viável a volta ao estado material que era anterior à efetivação da tutela. Quandoé possível a restituição ao estado anterior e ainda assim ocorreram danos, cabe pedir,cumulativamente, ressarcimento.

Nos casos de irreversibilidade, o réu tem direito à indenização. Quando a execuçãoleva à expropriação de bem, não é viável o desfazimento da arrematação. Diz o § 4o do art.520 que “a restituição ao estado anterior a que se refere o inciso II não implica odesfazimento da transferência de posse ou da alienação de propriedade ou de outrodireito real eventualmente já realizada, ressalvado, sempre, o direito à reparação dosprejuízos causados ao executado”.

Porém, alguém poderia argumentar que o réu não pode ser prejudicado por umaalienação fundada num direito declarado inexistente. Clito Fornaciari Júnior, ao tratar –diante do código de 1973 – da possibilidade do desfazimento da arrematação no caso daalienação na pendência do recurso interposto contra a sentença de improcedência dosembargos, afirmou que “o Estado não podia alienar aquele bem se não houvesse dívida, e,no caso, ficou provado, com o provimento do recurso, que não há dívida; então, ele nãopoderia alienar, e, se o fez, voltam as coisas ao estado anterior”.237

No entanto, na execução de título “definitivo” embargada – considerada por Fornaciari– e também na execução provisória de sentença ou mesmo na execução das tutelasantecipada e da evidência, não é vedada a expropriação do bem (art. 520, IV, CPC). Oterceiro não arremata algo que não poderia ser alienado e, portanto, não pode serprejudicado pela declaração de inexistência do direito de crédito. A inexistência do direitode crédito e, assim, a pretendida ausência de fundamento, diz respeito somente às partesdo processo em que o bem é arrematado, devendo ser resolvida em indenização.

No caso de tutela antecipada ou mesmo da evidência, declarando-se a inexistência dodireito, fica o autor obrigado a restituir ao réu a quantia, ainda que a tutela antecipadatenha ocorrido na ação ressarcitória. A suposição de que o autor da ação ressarcitória nãoterá condições financeiras para responder pelo prejuízo causado ao réu nada tem a vercom o seu dever de indenizar.

Importa notar que, tratando-se de tutela de cognição sumária, o autor tem o dever deindenizar o réu porque o Estado concluiu que ele não possui o direito que fundou a tutela.

12.2. Pressupostos da responsabilidade da parte que requereu a tutela de urgênciaefetivada em prejuízo do adversário

O art. 302, sem excluir a responsabilidade por dano processual, elenca as hipóteses emque a parte é considerada responsável pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgênciacausar à parte adversa. Trata-se de responsabilidade independente de culpa, derivadaúnica e exclusivamente dos eventos consignados nos quatro incisos do art. 302. O dever deindenizar depende apenas da ocorrência de hipótese prevista em um destes incisos,devendo a indenização ser liquidada, sempre que possível, nos autos em que a tutelahouver sido executada (art. 302, parágrafo único, CPC).

É claro que o ressarcimento pelo dano provocado pela efetivação da tutela urgente,apesar de não depender de culpa, exige a demonstração do dano, ou melhor, requer a suadelimitação e quantificação.

Tratando-se de hipótese especificamente regulada em lei, a responsabilidade objetivaestá limitada aos danos causados à parte pela efetivação da tutela. Assim, está excluída ahipótese de danos causados a terceiros. Esses danos estarão sujeitos ao regime geral daresponsabilidade civil, não podendo socorrer-se da previsão excepcional do art. 302.

12.3. Hipóteses de responsabilidade objetiva

O primeiro inciso do art. 302 afirma que a parte responde pelo prejuízo causado pelaefetivação da tutela de urgência quando a sentença lhe for desfavorável. A sentençadesfavorável – obviamente que transitada em julgado – é suficiente para fazer surgir odever de indenizar. Da sentença decorre inexoravelmente o dever de indenizar.

Mas o legislador se esqueceu da hipótese em que a parte, após a efetivação da tutelacautelar concedida inaudita altera parte, teve o pedido de tutela cautelar julgadoimprocedente e o pedido principal julgado procedente. Note-se que o autor pode terdireito à tutela do direito, mas não ter tido razão para pedir a tutela cautelar em razão deinexistência de perigo de dano. Ou seja, a tutela cautelar concedida antes da ouvida do réupode ser efetivada e, após a contestação, restar positivada a inexistência de perigo dedano, negando-se o pedido cautelar. A situação certamente não elimina a possibilidade deo pedido principal ser julgado procedente. Perceba-se que isso só vale para a tutelacautelar e não para a tutela antecipada.

O vencido em face do pedido cautelar, ainda que obtendo sentença de procedência emrelação ao pedido principal, pode causar dano. Porém, não há dever de indenizar comoresultado direto de decisão de improcedência do pedido cautelar. Neste caso, para obterressarcimento, aquele que sofreu prejuízo pela efetivação da tutela cautelar – depoisrevogada – tem que propor ação (autônoma) de ressarcimento, na qual terá quedemonstrar não apenas o dano, mas também o dever de indenizar, ou seja, a inexistênciade causa para a efetivação da tutela cautelar.

Como é evidente, caso a tutela cautelar tenha sido efetivada e, em virtude de fato novo,perca sua justificativa, não há que se pensar em responsabilidade por eventuais danos.Responsabilidade pelos danos só existirá caso a tutela se mantenha eficaz depois de setornar injustificável em virtude do fato novo. Nessa última hipótese, em que se perguntasobre a causa ou a justificativa da tutela cautelar, a responsabilidade depende de culpa,exigindo uma ação (autônoma) de ressarcimento. A responsabilidade objetiva, própria aoart. 302, não permite a análise da causa ou da justificativa da tutela cautelar.

O segundo caso de responsabilidade objetiva ocorre quando, obtida liminarmente atutela, a parte não fornece os meios necessários para a citação no prazo de cinco dias.Note-se que o inciso II confirma – como não poderia deixar de ser – a possibilidade deconcessão de tutela cautelar antes da ouvida do réu.

A urgência, em alguns casos, pode exigir a efetivação da tutela – cautelar ou antecipada– antes da ouvida do réu.238 Se a efetivação de tutela urgente inaudita altera parte pode serimprescindível,239 a sua excepcionalidade decorre do fato de postergar o contraditório.240

Em nome da efetividade do contraditório, ao réu deve ser permitido demonstrar, com amaior brevidade possível, a eventual inexistência dos fundamentos que autorizaram aconcessão da tutela urgente e mesmo a sua inadequação, por não representar a medidaque produz a “menor restrição possível”.

Portanto, há razão para o legislador se preocupar em exigir breve citação do réuquando a tutela de urgência é deferida inaudita altera parte, impondo responsabilidadeobjetiva pelo dano ocasionado pela efetivação da tutela na hipótese de o autor nãofornecer os meios necessários para a realização da citação no prazo de cinco dias.

Ao assim proceder, o autor responde por perdas e danos ainda que o pedido principalseja julgado procedente. A tutela urgente não pode permanecer eficaz por mais tempo queo necessário; não pode causar gravame despropositado ao réu, devendo obedecer à regrada “menor restrição possível”. Isto para não falar que o réu tem direito de pedir asubstituição do meio concedido por outro menos gravoso.

Embora a responsabilidade seja objetiva, a medida do dano – a ser considerada naliquidação – deve tomar em conta apenas o dano provocado durante o espaço de tempoem que o réu não esteve no processo em virtude do atraso na sua citação.

De acordo com o art. 302, III, o autor responde pelos prejuízos acarretados pelaefetivação da tutela quando ocorrer a cessação da sua eficácia “em qualquer hipóteselegal”. Na conjugação do art. 302, III com o art. 309, a primeira hipótese deresponsabilidade objetiva ocorre quando o autor não deduz o pedido principal no prazolegal. O pedido principal deve ser apresentado no prazo de trinta dias contado daefetivação da tutela cautelar (art. 308, CPC). De modo que o pedido não precisa serrealizado quando a tutela não é concedida e efetivada. Porém, em caso de efetivação datutela, a não formulação do pedido principal gera responsabilidade pelo dano.

O art. 302, III, quando combinado com o art. 309, II, pode causa embaraços, porpressupor responsabilidade quando a tutela “não for efetivada dentro de trinta dias”.Galeno Lacerda entendeu, diante de norma com o mesmo conteúdo presente no código de1973 (art. 808, II), que neste caso não pode existir responsabilidade, pois se “pressupõe,exatamente, a não execução da cautela”. Disse Galeno Lacerda que, como o “simplesdeferimento da liminar não causa dano” e “o ressarcimento exige prejuízo real oriundo daexecução da medida, situação excluída pelo referido inciso II” do art. 808, CPC/73), “nestahipótese o máximo que poderá haver é a condenação do autor na sucumbência cautelar,se o réu tiver contratado advogado para defendê-lo”.241 Frederico Marques, no mesmosentido, escreveu que a cessação de eficácia da tutela, em razão da sua não execução emtrinta dias, não pode acarretar obrigação de indenizar por não haver dano derivado daexecução.242

Na verdade, a conjugação do art. 302, III, com o art. 309, II, impõe a interpretação deque há responsabilidade quando a efetivação da tutela cautelar ocorre depois de trintadias. Quando a tutela cautelar não é efetivada, realmente não há como pensar emresponsabilidade. Porém, há que se ter em conta a hipótese em que a tutela é efetivadadepois de trinta dias. Nesta situação há responsabilidade, pois a medida é efetivadaquando a decisão não tem mais eficácia. Como é óbvio, se a decisão é ineficaz a efetivaçãonão tem fundamento e a interferência na esfera jurídica do réu é ilegal.

Ainda se prevê responsabilidade objetiva quando cessa a eficácia da tutela em virtudede improcedência do pedido principal ou de extinção do processo sem resolução demérito. A responsabilidade derivada da cessação da eficácia em razão da improcedênciado pedido principal está abarcada pela previsão do inciso I do art. 302, que afirma haverresponsabilidade em caso de sentença “desfavorável”. De forma que o art. 309, III,acrescenta apenas a hipótese de responsabilidade em razão de extinção do processo semresolução do mérito.

Diz ainda o art. 302, IV, que o autor responde pelo dano causado pela efetivação datutela de urgência se o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão

do autor. A declaração da prescrição ou da decadência opera, diante da efetivação datutela, como se houvesse sido proferida sentença de improcedência ou sentença“desfavorável”. Por conta disto o autor também responde objetivamente pelo danoeventualmente ocasionado pela efetivação da tutela urgente.

12.4. Liquidação da indenização

Diz o parágrafo único do art. 302 que “a indenização será liquidada nos autos em que amedida tiver sido concedida, sempre que possível”. Não se trata de liquidação de sentençacondenatória ilíquida nem de liquidação de obrigação de indenizar já declarada emsentença – hipótese, esta última, derivada de pedido de declaração de obrigação deindenizar e não de pedido de tutela ressarcitória.

A liquidação do art. 302 é liquidação de obrigação de indenizar, mas se diferencia daliquidação da obrigação de indenizar declarada em sentença em razão de poder chegar àconclusão de que nada é devido pelo demandado. É que na liquidação de indenizar do art.302 é preciso demonstrar o dano e, obviamente, o nexo de causalidade entre o dano e aefetivação da tutela.

A única coisa que é incontestável na liquidação do parágrafo único do art. 302 é aresponsabilidade pelo eventual dano causado pela efetivação da tutela ou o dever deindenizar eventual dano a ser identificado e quantificado na liquidação. O dever deindenizar deriva, de forma inexorável, das causas consignadas nos incisos do art. 302.Existindo qualquer um dos eventos definidos nestes incisos surge indiscutível eincontestável responsabilidade ou dever de indenizar eventual dano provocado pelaefetivação da tutela.

No caso de o dano restar quantificado na liquidação, bastará requerer a execução nostermos do art. 523 do Código de Processo Civil. Mas o problema da execução aparecequando se lembra que a liquidação não é de sentença condenatória – que, em razão dasanção executiva, abre oportunidade para o requerimento de execução –, mas de meraobrigação de indenizar – quando se torna necessário identificar em que lugar está aeficácia executiva que permite a execução.

Na hipótese de responsabilidade derivada de sentença desfavorável, não hánecessidade de que esta sentença condene a parte que pediu a tutela urgente. Se aresponsabilidade decorre dos eventos expressos nos incisos do art. 302, não há dúvida queo objetivo da liquidação é sempre definir e precisar o dano, relacionando-o com aefetivação da tutela, além de quantificá-lo. Portanto, toda e qualquer sentença quequantificar o dano derivado da efetivação da tutela urgente, simplesmente por definir odireito à tutela ressarcitória, deve abrir oportunidade para a execução da quantia certa.

Note-se que a sentença de liquidação, ao quantificar o dano, colabora com a prestaçãoda tutela ressarcitória, que resta na dependência do adimplemento voluntário ou daexecução. De modo que a execução deriva da definição do direito à tutela ressarcitória,que, obviamente, abre oportunidade para execução. A menos que se pense que a parteque sofre a tutela de urgência, ao requerer a liquidação da obrigação de indenizar, pedetutela declaratória da obrigação de indenizar e não tutela ressarcitória.

Porém, não há racionalidade em supor que alguém que sofre a efetivação de tutela que,segundo a lei (art. 302, do CPC), é indevida e de responsabilidade da outra parte, possa terinteresse em solicitar a identificação e quantificação do dano que lhe foi ocasionadoapenas para vê-lo declarado, sem a possibilidade de exigi-lo através de execução.

Além do mais, quem pede tutela ressarcitória e requer sentença declaratória e não

condenatória simplesmente solicita uma técnica processual inidônea (sentença inidônea).E esta situação, como faz ver o art. 515, I, do Código de Processo Civil, torna a sentençadeclaratória (requerida obviamente por equívoco, já que para prestar tutela ressarcitória)executável, ou melhor, identificável como titulo executivo judicial. Ou seja, quando sepede tutela ressarcitória se requer, necessária e implicitamente, sentença executável.Portanto, caso atualmente seja requerida sentença declaratória para prestar tutelaressarcitória, o juiz, diante do evidente equívoco do autor, pode admitir a sua execução.Na verdade, concederá sentença condenatória, uma vez que, como é pouco mais do queóbvio, “sentença declaratória executável” é uma contradição em termos.

Perceba-se que isto não elimina a possibilidade de se requerer tutela declaratória apósa violação do direito, como permite o art. 19 do Código de Processo Civil. O lesadocontinua com a possibilidade de pedir tutela declaratória. A diferença é a de que, a partirda exata distinção entre tutela e sentença, percebe-se que o lesado pode pedir tuteladeclaratória e sentença declaratória, mas não pode pedir tutela ressarcitória e sentençadeclaratória. A tutela ressarcitória reclama, necessariamente, sentença executável, sendo asentença condenatória a técnica adequada à prestação da tutela ressarcitória peloequivalente em pecúnia.

Melhor explicando: se a parte pede tutela de ressarcimento do dano pelo equivalente esolicita sentença declaratória, o juiz deve prestar, ao reconhecer “a exigibilidade deobrigação de pagar quantia” (art. 515, I, do CPC) – compreendida como dever de ressarcirem dinheiro –, sentença condenatória ou, mais precisamente, sentença executável denatureza condenatória.

Mas isto não quer dizer que o autor da liquidação não deva pedir a condenação(sentença condenatória) do responsável pelo dano provocado pela efetivação da tutelaurgente. E também que o juiz não deva, neste caso, proferir sentença condenatória. O quese quis demonstrar, apenas, é que, diante da omissão do requerente da liquidação empedir a sentença adequada, o juiz não tem alternativa a não ser proferir sentençacondenatória.

13. Procedimento em caso de tutela antecipada antecedente

13.1. Justificativa e importância do uso adequado da tutela antecipada na formaantecedente

A tutela antecipada de caráter antecedente pode ser solicitada antes da propositura daação mediante a qual a tutela final é postulada. A admissão desta técnica de tutelapressupõe uma situação de urgência incompatível com a demora inerente à elaboração dapetição inicial da ação. Não se trata, portanto, de mera urgência “contemporânea àpropositura da ação”. Na verdade, a urgência deve ser contemporânea a todo e qualquerrequerimento de tutela cautelar ou antecipada, tanto antecedente quanto incidente. Nãose pede tutela cautelar ou antecipada para uma urgência futura, mas para evitar um danoou ilícito futuro. O perigo de dano ou ilícito e, portanto, a urgência, deve ser semprepresente e contemporâneo.

Esse esclarecimento é importante para que não exista abuso no requerimento de tutelaantecipada na forma antecedente, na medida em que essa técnica de tutela traz váriascomplicações procedimentais – que podem prejudicar a efetividade da distribuição dajustiça. A tutela antecipada só deve ser utilizada na forma antecedente quando a urgênciafor excepcional, ou seja, capaz de impedir a apresentação dos documentos necessários aopedido de tutela final, bem como o adequado desenvolvimento dos argumentos da causa depedir.

13.2. Requisitos da petição inicial em que se pede tutela antecipada antecedente

Ao requerer a tutela antecipada na forma antecedente, o autor deve esclarecer que estáassim agindo em vista de excepcional urgência que não lhe permite desde logo apresentaros documentos e os argumentos imprescindíveis à adequada propositura da ação voltadaao alcance da tutela – final – do direito. Nessa linha, deve demonstrar que está utilizando atécnica da tutela antecipada antecedente nos termos do art. 303 e que aditaráoportunamente a petição inicial (art. 303, § 5o, CPC)

O art. 303 deixa claro que, na petição inicial, o autor pode se limitar a requerer a tutelaantecipada e a indicar o pedido de tutela final, “com a exposição da lide, do direito que sebusca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo”. Significaque, quando o autor requer tutela antecipada na forma antecedente, deve indicar o litígio,o direito que será afirmado e o pedido que formulará para obter a tutela final quepretende antecipadamente. O autor deve indicar a espécie de sentença e a tutela de direitoque pretende ao final. Assim, por exemplo, sentença mandamental (ordem sob pena demulta) e tutela inibitória ou sentença condenatória e tutela ressarcitória pelo equivalenteem pecúnia. Aliás, isso é imprescindível para que se possa saber se a tutela pode serantecipada e em que limite.

Note-se que a probabilidade do direito será aferida a partir da consideração dosreferidos elementos que devem constar da petição inicial, que, muito embora apontempara o conteúdo da discussão a ser travada para o alcance da tutela final, têm em si odireito que deve ser demonstrado como provável. Frise-se que, para a obtenção da tutelaantecipada, além da probabilidade do direito, é ainda necessário demonstrar o perigo dedano ou de ilícito (art. 303, CPC).

Lembre-se que na petição inicial em que se requer a tutela antecipada na formaantecedente é preciso indicar o valor da causa, tomando-se em conta a tutela final.

13.3. Procedimento em caso de concessão da tutela antecipada na formaantecedente

No caso em que a tutela antecipada é concedida e não se estabiliza (art. 304, CPC), oautor tem o ônus de aditar a petição inicial sob pena de extinção do processo semresolução de mérito (art. 303, § 2o, CPC) e, assim, cessação da eficácia da tutela. Frise-seque o aditamento só é necessário quando a tutela antecipada não se estabiliza, ou seja,quando o réu interpõe agravo de instrumento quando intimado da efetivação da tutelaantecipada. É certo que uma leitura apressada do § 1o do art. 303 poderia levar àconclusão de que o autor deve aditar a petição inicial depois de intimado da concessão datutela antecipada. Porém, está implícito nas normas dos artigos 303 e 304 que não hámotivo para aditamento quando a tutela antecipada se estabiliza. A fluência do prazo parao aditamento, como é pouco mais do que evidente, deve aguardar intimação a respeito dainterposição de agravo de instrumento pelo demandado.

O prazo para o aditamento, a princípio, é de quinze dias, mas o juiz pode fixar outromaior, conforme o art. 303, § 1o, I, in fine, do Código de Processo Civil. Isso só é possível,como é óbvio, quando há justificativa de que o prazo de quinze dias é insuficiente emvirtude de alguma particularidade do caso concreto. O aditamento, como não poderia serdiferente, deve ser feito nos mesmos autos e sem incidência de novas custas processuais(art. 303, § 3o, CPC).

O autor pode aditar a petição inicial apresentando novos fundamentos para a obtençãoda tutela final indicada, bem como juntando documentos. Como o autor deve apenas

confirmar o pedido de tutela final, não há possibilidade de formulação de pedido de outratutela de direito – tutela inibitória no lugar de tutela ressarcitória. Nem mesmo poderá serpedida tutela de menor ou maior extensão quantitativa do que a tutela final indicada edeferida antecipadamente. Caso a tutela final tenha sido antecipada em parte, poderá oautor – se desejar – restringir o pedido de tutela final.

Diante do aditamento da petição inicial, deve ser feita a citação do demandado e a suaintimação para a audiência de conciliação ou de mediação, consoante o art. 334 do Códigode Processo Civil. Inexistindo autocomposição, o prazo para contestação será contado naforma do art. 335 (art. 303, § 1o, II e III, CPC).

A partir daí o procedimento prossegue normalmente, como se a ação houvesse sidoregularmente proposta e a tutela antecipada requerida na petição inicial.

13.4. Procedimento quando a tutela antecipada é indeferida

Entretanto, é claro que, não obstante a tutela antecipada tenha sido requerida naforma antecedente sob o fundamento de urgência excepcional, o juiz pode negá-la. Nessahipótese, como é evidente, também é imprescindível o aditamento da petição inicial, tendoo autor a mesma oportunidade de deduzir fundamentos e apresentar documentos e oônus de confirmar o pedido de tutela final. A diferença em relação ao aditamento próprioà hipótese em que a tutela antecipada é concedida está no prazo, que é apenas de cincodias – e assim pode ser dito não adequado, especialmente por ser bem menor do que odeferido para a hipótese em que a tutela é concedida, situação em que o art. 303, § 1o, I,inclusive confere ao juiz a possibilidade de fixar prazo maior do que o de quinze dias.Afinal, o direito à participação no processo, como é sabido, tem como corolário o direito aoprazo adequado.243

Não havia motivo para o legislador utilizar a expressão “aditamento” no caso de tutelaconcedida e a palavra “emenda” na hipótese de tutela negada. Ora, a negação da tutelaantecipada nada tem a ver com defeito da petição em que foi requerida. Como é evidente,se a petição inicial permitiu ao juiz formar convicção para não conceder a tutelaantecipada obviamente não há como vê-la como inepta nem como suscetível de ser“emendada.

De qualquer forma, também resta esclarecido que, não ocorrendo a emenda (rectius:aditamento) da petição inicial, o processo é extinto sem resolução do mérito. Não háindeferimento da petição inicial, já que esta foi tão útil que permitiu ao juiz valorar ospressupostos da tutela antecipada para negá-la. Na realidade, a petição inicial só deve serindeferida quando deixa entrever a falta de urgência capaz de adiar a adequadapropositura da ação, ou seja, quando evidencia a ausência de motivo para o requerimentode tutela antecipada na forma antecedente. Porém, é certo que não foi para esta hipóteseque o § 6o do art. 303 previu o indeferimento da petição inicial. Há um simples e grossoequívoco – mais um do código – na hipótese em que a regra fala em indeferimento dapetição inicial e em emenda (art. 303, § 6o, CPC).

Como é óbvio, também no caso de aditamento posterior ao indeferimento da tutelaantecipada deve ser feita a citação do réu e a sua intimação para a audiência deconciliação ou de mediação (art. 334, CPC), contando-se o prazo para contestação, na faltade autocomposição, na forma do art. 335 do Código de Processo Civil.

14. Estabilização de tutela

14.1. Fundamento da estabilização da tutela

O objetivo da regra que prevê a estabilização da tutela antecipada é, por um lado,eliminar a necessidade de discussão de uma questão que, diante da conduta do réu, nãogera mais controvérsia, e, de outro, outorgar capacidade de produzir efeitos a uma decisãointerna a um processo que resulta extinto sem resolução do mérito.

Portanto, se a estabilidade da tutela antecipada é o preço da inércia do demandado,esse somente é realmente pago porque se deixa claro que a tutela não impugnada produzefeitos para além do processo em que concedida. Ou melhor, se a razão da técnicaprocessual é otimizar a prestação jurisdicional quando presente o desinteresse dodemandado, a ideia de estabilização da tutela representa a manutenção atemporal dosefeitos da tutela.244

14.2. O problema da generalização do significado de inércia do demandado

A técnica da estabilização da tutela envolve uma questão fundamental: a dageneralização da premissa de que a inação do demandado configura desinteresse.Certamente não é possível admitir que a inércia do réu, em todo e qualquer caso conflitivoconcreto, configure desinteresse e, assim, possa ter o significado de aceitação da tutelaantecipada.

É importante recordar que há muito tempo, quando se discutia os efeitos da revelia,doutrina de grande respeito sustentava, com base em argumentos de natureza sociológica,a impossibilidade de se extrair da revelia a indiscutibilidade dos fatos. Dizia-se que opadrão econômico e cultural do país não permite a construção de uma premissa quesupõe que todos os demandados têm condições de contratar advogados ou decompreender a necessidade de apresentar defesa.245

Em face desta argumentação, passou-se a mitigar os efeitos da revelia, permitindo-se aojuiz investigar as alegações de fatos não contestadas, especialmente quando dosdocumentos juntados à petição inicial e do seu contexto pudessem decorrer dúvidas sobreas alegações fáticas. O Código de Processo Civil de 2015 positivou a tese, afirmando que arevelia não gera a presunção da veracidade das alegações dos fatos quando “foreminverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos” (art. 345, IV,CPC). Significa que o juiz não só pode considerar as alegações não contestadasinverossímeis, como ainda determinar que o autor produza prova para elucidá-las.

Essa breve alusão à questão dos efeitos da revelia, como é fácil perceber, decorre dacircunstância de que a técnica de estabilização da tutela, tal como desenhada no art. 304,confere à não atuação do réu efeitos que são baseados na mesma lógica dos efeitos darevelia. Parte-se da premissa de que o réu não interpôs agravo em razão de não terqualquer interesse na discussão da questão e preocupação com os efeitos concretos datutela antecipada.

A técnica da estabilização da tutela, em boa e adequada teoria, deve ser utilizadaapenas diante de particulares situações de direito substancial ou de situações gerais querevelem a “evidência do direito”, como ocorre no procedimento monitório. Note-se que atécnica do procedimento monitório admite a conversão da decisão não embargada emtítulo executivo em virtude da existência de prova escrita dos fatos constitutivos. Sucedeque a técnica do art. 304, além de indiferente ao direito material, não se baseia naevidência do direito alegado. Trata-se de técnica fundada em perigo de dano, a justificar asumarização da cognição para a concessão da tutela.

O legislador tratou mal da tutela provisória. Em vários pontos, sendo este apenas umdeles. Bem por isso, a doutrina tem que elaborar freios para que desastres não aconteçam.Diante da generalização dos efeitos da não atuação do demandado, é preciso que qualquer

forma de reação, ainda que não o agravo de instrumento, seja vista como sinal deinconformidade, capaz de determinar o prosseguimento do processo não apenas para adiscussão do caso, mas para que o autor se desincumba do ônus de provar as alegações defato que foram admitidas como prováveis. É certo que a contestação não tem razão paraser apresentada antes do aditamento da petição inicial e, portanto, quando háestabilização da tutela. Mas se o autor, ao receber a intimação da efetivação da tutelaantecipada, apresenta petição impugnando a forma concedida para a prestação da tutelaou a sua efetivação e, por lapso, perde o prazo do agravo de instrumento, há que seconsiderar a sua petição como inconformismo com a tutela antecipada. Imagine-se ahipótese de tutela inibitória antecipada, em que o juiz determina a paralisação dasatividades de uma indústria quando bastaria a instalação de determinada tecnologia. Se oréu imediatamente adverte o juiz de que a tutela concedida para impedir a poluiçãoambiental poderia e deveria ser prestada mediante um meio “mais suave”, ou seja,mediante um meio que, além de idôneo à tutela do direito, constitui menor restrição à suaesfera jurídica, há alegação de violação à regra da proporcionalidade e manifestação deinconformismo com a tutela concedida – que, assim, não tem qualquer motivo para seestabilizar.

14.3. O esquecimento de que, se a tutela antecipada pode se estabilizar quando érequerida na forma antecedente, não há motivo algum para não poder se estabilizarquando é requerida na petição inicial da ação em se pede a tutela do direito

Não fosse tal generalização, há algo que beira ao curioso no tratamento daestabilização da tutela. Diz expressamente o art. 304 que “a tutela antecipada, concedidanos termos do art. 303, torna-se estável …”. O art. 303 pressupõe apenas tutela antecipadarequerida na forma antecedente. Aliás, uma forma (antecedente) excepcional de tutelaantecipada, imaginada para situações aberrantes da normalidade.

Ora, não há motivo razoável algum para se entender que apenas a tutela antecipadarequerida na forma antecedente pode se tornar estável. Isso seria afirmar que somente oautor que, diante da situação de urgência, não tem tempo para elaborar adequadamente apetição inicial da ação, pode gozar dos benefícios da inércia do demandado. Entretanto,como os sistemas da tutela provisória e do próprio código repudiam uma interpretaçãoliteral no sentido de que somente a tutela antecipada antecedente pode se estabilizar, hácomo evitar a contradição que uma leitura descuidada poderia provocar.

Ao admitir a estabilização da tutela antecipada requerida na forma antecedente, o art.304 aceitou implicitamente a estabilização da tutela antecipada requerida na petiçãoinicial da ação regularmente proposta. Raciocínio diverso retiraria a coerência daestabilização da tutela ou, pior do que isso, estimularia o autor a fingir que não possuidocumentos e oportunidade para desenvolver adequadamente a causa de pedir da açãoapenas para requerer a tutela na forma antecedente.

Frise-se que, quando a tutela antecipada é requerida na petição inicial da ação em quese pede a tutela final do direito, a estabilização da tutela somente é possível quandodeferida inaudita altera parte. Nesse caso, sendo o réu intimado da efetivação da tutela ecitado para contestar mediante o mesmo mandado, a estabilização dependerá da nãointerposição de agravo e da não apresentação de contestação.

14.4. Requisitos para a estabilização da tutela

A princípio, para que ocorra estabilização da tutela é preciso que o réu, devidamenteintimado da efetivação da tutela antecipada, não interponha agravo de instrumento.Lembre-se que o prazo para contestar, em caso de tutela antecedente, só pode fluir após oaditamento da petição inicial. Nessa hipótese, caso o réu – intimado da efetivação da tutela

– apresente petição ao juiz impugnando o cabimento da tutela antecipada e deixe deinterpor o agravo, há reação ou inconformismo a justificar a não estabilização da tutela.

No caso de tutela antecipada requerida na petição inicial da ação que pede a tutelafinal do direito, o réu é intimado da efetivação da tutela e citado para se defender nomesmo instante, o que faz fluir um único prazo de quinze dias para a interposição doagravo e para a apresentação da contestação. Nesse caso, apresentada contestação e nãointerposto o agravo, há inegável reação ou não conformismo com a extinção do processo ea manutenção da eficácia da tutela concedida.

Não há necessidade que o autor, ao lado de requerer a tutela antecipada, solicite aestabilização da tutela para o caso de ausência de reação do demandado. A estabilizaçãoda tutela é um efeito automático da falta de reação do réu.

14.5. Concessão parcial da tutela antecipada ou requerimento de tutela antecipadaque não abrange a integralidade do mérito

O § 1o do art. 304 afirma que, no caso de estabilização da tutela requerida na formaantecedente, “o processo será extinto”. Porém, como a tutela antecipada concedidaliminarmente na ação que pede a tutela do direito também pode se estabilizar, nestahipótese igualmente há extinção do processo.

Mas o problema da extinção do processo em virtude da estabilização da tutela não étão simples. É possível pensar, em primeiro lugar, na hipótese em que o juiz concede atutela antecipada em parte. Estabilizada parcela da tutela antecipada, o processo não podeser julgado (totalmente) extinto pelo simples fato de que a integralidade da tutelasolicitada não foi satisfeita. O autor tem o direito de ver o processo prosseguir para que,aprofundada a cognição, possa o juiz prestar a parcela da tutela que inicialmente não foideferida. Nesse caso, a falta de reação do demandado, suficiente para a estabilização datutela, obviamente não basta. Para que o processo não tivesse necessidade de continuar,seria necessária uma posição ativa do réu, ou melhor, o reconhecimento jurídico dopedido.

Situação similar ocorre quando o autor requer tutela antecipada parcial, ou seja, tutelaantecipada que não abrange todo o mérito ou que diz respeito apenas a um dos pedidosdesde logo cumulados – ou que apenas foram indicados e que serão cumulados quando doaditamento da petição inicial. Neste caso, deferida a tutela antecipada nos limitessolicitados pelo autor, o processo obviamente deve prosseguir para tratar da parte domérito ou do pedido não contemplado pela tutela antecipada.

É claro que, nesta última hipótese, há maior problema em caso de tutela antecipadaantecedente. Quando a tutela antecipada é requerida na petição inicial da ação em que sepede a tutela final do direito, todos os pedidos são imediatamente formulados, de modoque o autor obviamente pode requerer tutela antecipada parcial ou pertinente a um dospedidos cumulados sem que alguém possa estranhar a sua pretensão de obter tutela demaior amplitude ou outras tutelas ao final do processo. Contudo, quando o autor requertutela antecipada antecedente e mais tarde pretende tutela de maior amplitude ou mesmoformular outros pedidos, deve “indicar” o pedido de tutela final e os pedidos que serãocumulados (art. 303, caput, CPC), lembrando que a tutela antecipada requerida é parcial.Isso para que não se pense que a falta de reação do demandado em relação à tutelaantecipada pode levar à extinção total do processo. Frise-se que a extinção do processo, emqualquer das hipóteses antes tratadas, deve ser declarada apenas em relação à tutelaantecipada.

É importante perceber que a tutela deferida e estabilizada, não obstante a não extinção

total do processo, desde logo produz efeitos para além do processo. A tutela deixa dedepender do processo e nele não pode mais ser discutida ou revogada. A única alternativaé propor ação “com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipadaestabilizada”, nos termos do § 2o do art. 304.

14.6. Efeitos temporalmente ilimitados da tutela estabilizada

O § 3o do art. 304 diz que a tutela conservará seus efeitos enquanto não revista,reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida em ação proposta por qualquerdas partes. Ademais, o § 6o do mesmo artigo afirma que a decisão que concede a tutela nãofará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisãoque a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes.

O que interessa, nesse momento, é compreender o significado de “estabilidade dosefeitos” da tutela. Quando se pensa em tutela antecipada, como é evidente, considera-se aprópria tutela de direito solicitada, mas concedida mediante cognição sumária. Assim, porexemplo, a tutela inibitória ou a tutela ressarcitória na forma específica, poucoimportando a sentença – a técnica processual – escolhida para prestá-la.246

São os efeitos da tutela de direito material que prosseguem no tempo. Os efeitos datutela inibitória etc. Note-se que se o juiz, por exemplo, determina a demolição de ummuro que representa ato contrário ao direito (remoção do ilícito), a não reação dodemandado torna a tutela de remoção do ilícito – a demolição – estabilizadaatemporalmente. O mesmo ocorre quando o juiz ordena o ressarcimento na formaespecífica etc.

Na hipótese em que a tutela depende de um comportamento futuro imprevisível dodemandado, como é o caso da tutela inibitória que ordena um não fazer, o problema nãoestá na tutela antecipada que se estabilizou. Esse é um problema que também atinge oscasos em que a tutela inibitória é concedida por sentença transitada em julgado.

Isso não quer dizer que apenas a tutela já exaurida na dimensão física se estabiliza.Uma tutela que depende de prestações periódicas, como a tutela antecipada que impõe opagamento de soma, também pode se estabilizar. Nesse caso, a tutela antecipada mantémseus efeitos para o futuro, embora seja dependente do uso de meios de execução para ahipótese de eventual inadimplemento.

Vale dizer que, nesta última situação, a parte pode ter necessidade de requerer aaplicação de meios executivos ao juiz do processo que se extinguiu em virtude daestabilização ou mesmo ao juiz do processo que prosseguiu em razão da tutela antecipadanão ter exaurido a pretensão do autor. Na segunda hipótese, o juiz pode determinar aautuação em apenso da execução da tutela estabilizada.

Deixe-se claro, enfim, que não é o conteúdo da decisão que se torna imutável eindiscutível. A decisão não produz coisa julgada, como anuncia o § 6o do art. 304. É atutela do direito que se prolonga no tempo ou, mais claramente, são os seus efeitosconcretos – fisicamente exauridos ou não – que perduram.

14.7. Tutela estabilizada, declaração sumária e constituição provisória

De lado a tutela antecipada que depende de efetivação ou que já foi efetivada, épossível indagar se há como admitir tutela antecipada estabilizada de natureza puramentedeclaratória e constitutiva.247

A tutela declaratória só tem valor quando revestida pela coisa julgada material, de

modo que só isto é suficiente para evidenciar a impossibilidade de pensar a respeito dedeclaração sumária que se estabiliza. Não há tutela declaratória de cognição sumária; adeclaração sumária não tem utilidade.

É certo que nenhuma tutela estabilizada é revestida de coisa julgada material e, porisso, jamais inibe a rediscussão do direito afirmado provável. A estabilização é da tutela dedireito concedida e não do direito que foi suposto para concedê-la. Porém, a tuteladeclaratória, ao contrário – por exemplo – das tutelas ressarcitória e inibitória, não existesem coisa julgada material, pois o bem da “certeza jurídica” somente pode ser atribuídopela declaração qualificada pela coisa julgada material.

Uma tutela declaratória sumária estável é uma contradição em termos, na medida emque a declaração sumária é incapaz de colaborar para a dissipação da incerteza jurídica.Note-se que a declaração sumária de que o demandado não pode praticar determinado atosó tem racionalidade quando constitui tutela inibitória, ou seja, quando não é simplesdeclaração sumária, mas é ordem de não fazer sob pena de multa. Nesse caso, na ausênciade reação do demandado, a tutela inibitória se estabiliza porque constitui uma tutela dedireito que independe da coisa julgada material.

Algo diferente se passa com a tutela antecipada de natureza constitutiva. Essa pode seestabilizar porque os efeitos constitutivos ou a modificação de uma situação jurídicaindependem da coisa julgada material. Em outras palavras, admite-se uma constituiçãoprovisória, capaz de se projetar sobre o demandado independentemente da sua vontade.Assim, em caso de não reação à tutela antecipada que modifica o valor da locação, háestabilização da tutela ou, mais precisamente, do novo valor do aluguel. Enquanto nãotranscorrido o prazo de dois anos (art. 304, § 5o, CPC), hábil a permitir a reforma ou ainvalidação da tutela “constitutiva provisória”, o não pagamento do aluguel de acordo como valor definido na tutela antecipada abre oportunidade à ação de despejo.

14.8. Possibilidade de reforma e invalidação da tutela antecipada estabilizada

Como já dito, afirma o § 2o do art. 304 que “qualquer das partes poderá demandar aoutra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada”. Anorma confere às partes o direito de pedir a reforma ou invalidação da tutela antecipada.Contudo, apenas o réu pode ter interesse em se voltar contra a tutela antecipada. O autorpode renunciar à tutela do direito, não tendo qualquer motivo para propor ação parareformá-la ou invalidá-la. Como é óbvio, se a tutela do direito é insuficiente ao autor, elenão fica impedido de propor ação para pleitear uma outra forma de tutela (v. g., inibitóriaquando antes pedida remoção do ilícito), outro modo de prestação da tutela (v. g.,paralisação de atividades quando antes requerida instalação de filtro) ou a própria tutelade direito em maior extensão (v. g., ressarcitória na forma específica quando antes pedidaressarcitória pelo equivalente, ou seja, antecipação de soma). Evidentemente que sem arestrição de dois anos, prevista no § 5o do art. 304. Ora, se a decisão que concede a tutelaque se estabiliza não produz coisa julgada, o autor fica livre para pedir outro modo deprestação da tutela ou tutela que vá além da estabilizada.

Interessado em questionar a tutela antecipada é o réu, ou seja, aquele que a sofre. O §2o fala em “rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada”. Sucede que orever é pressuposto do reformar e do invalidar. O réu pode propor ação para reformar –ou seja, modificar – ou para tornar a tutela antecipada destituída de validade, que assimfica sem efeitos. De qualquer forma a ação tem em conta a decisão que concedeu a tutelaantecipada, objetivando demonstrar que a tutela estabilizada deve ser alterada ou nãopode continuar valendo.

A ação proposta pelo réu não lhe outorga o ônus de demonstrar que as alegações dosfatos constitutivos do direito suposto como provável não são verdadeiras. A propositurada ação revela o intuito do réu em modificar ou invalidar a tutela antecipada, mas estenão assume o ônus de provar que as alegações dos fatos constitutivos do direito do autor –agora réu – não correspondem à realidade. A situação é similar àquela que ocorre quandoutilizada a técnica da inversão do ônus da propositura da ação principal – depois deconcedida a tutela do direito com base em cognição sumária. Há inversão do ônus depropor a ação, mas o ônus da prova continua sendo de quem afirmou o direito e ainda nãose desincumbiu do ônus de demonstrá-lo.

A ação do § 2o do art. 304 logicamente abre oportunidade para tutela cautelar (art. 300,CPC), ou seja, para a suspensão dos efeitos da tutela estabilizada ou mesmo, conforme ocaso, para a remoção dos seus efeitos concretos. Há de estar presente probabilidade dodireito à reforma ou invalidação da tutela estabilizada e perigo de dano.

É prevento para a ação de revisão o juízo em que a tutela foi concedida, podendo serobtido o desarquivamento dos autos em que foi concedida a tutela – como não poderia serde outra forma – para o alcance de dados ou documentos necessários à instrução dapetição inicial (art. 304, § 4o, CPC).

14.9. Fluência do prazo para a propositura da ação objetivando reforma ouinvalidação da tutela estabilizada

De acordo com o art. 304, § 5o, “o direito” de reformar ou invalidar a tutela estabilizada“extingue-se após 2 anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo”. Nãohaveria problema em relação ao prazo para o exercício do direito de pedir a reforma ou ainvalidação da tutela estabilizada não fosse a possibilidade desta tutela não contemplar aintegralidade da tutela final.

Quando a tutela antecipada, requerida na petição inicial da ação em que se pede atutela do direito ou na forma antecedente, não abrange a totalidade do pedido ou dizrespeito a um dos pedidos cumulados, o processo obviamente não pode ser extinto. Nocaso de tutela antecedente, o autor tem direito de aditar a petição inicial para formular opedido de tutela final e os pedidos cumulados – previamente indicados.

Ocorre que o § 5o do art. 304 diz que o prazo para a propositura da ação voltada àreforma ou à invalidação da tutela antecipada deve ser contada “da ciência da decisão queextinguiu o processo”. Seria possível pensar, no caso de tutela estabilizada parcial, que oprazo deve ser contado da data da intimação da decisão que declara a estabilização datutela em virtude da não reação do demandado. Porém, como a letra da lei fala de“decisão que extinguiu o processo” e a insegurança em relação a prazos é algo perverso, éadequado entender que o juiz, ao invés de simplesmente declarar a estabilização da tutela,deve extinguir o processo em relação à tutela estabilizada. Desta forma resta claro que atutela antecipada não mais poderá ser discutida no processo, bem como que o prazo fluirá“da ciência da decisão que extinguiu o processo” em relação à tutela que se estabilizou.

14.10. Não há coisa julgada, mas apenas extinção do direito de reformar ouinvalidar a tutela estabilizada, depois de exaurido o prazo de dois anos do § 5o do art.304

É certo que a decisão que concede a tutela que se estabiliza não fica acobertada pelacoisa julgada material. O § 6o do art. 304 diz expressamente que “a decisão que concede atutela” não faz coisa julgada. Admitir a estabilização da tutela antecipada, portanto,significa apenas aceitar que os efeitos exauridos da tutela e os efeitos processuais que

ainda podem ser produzidos para o seu integral alcance não podem ser questionados sema propositura da ação de reforma ou de invalidação da tutela.

O art. 186-bis do Código de Processo Civil italiano reproduz situação similar ao afirmarque a tutela antecipada de soma não contestada “conserva la sua efficacia in caso diestinzione del processo”.248 O art. 186-bis, ao passar a admitir a tutela antecipada de somanão contestada em qualquer situação de direito substancial, avançou em relação ao art.423,249 que admitia a tutela de soma não contestada no âmbito do processo do trabalho,pois ao contrário do último expressamente afirmou que a tutela mantém eficácia depoisda extinção do processo.250

Não obstante, a expressão “conserva la sua efficacia” deu origem a divergências nadoutrina.251 Enquanto alguns admitiram que a decisão se torna definitiva, transformando-se em decisão imutável, dotada de verdadeira e própria autoridade de coisa julgadamaterial,252 outros concluíram que a tutela conserva apenas a sua eficácia executiva.253

Perceba-se que esta forma de tutela está muito mais próxima do julgamento antecipadoparcial do mérito (art. 356, CPC) do que de uma tutela de cognição sumária – tutelascautelar, antecipada e de evidência –, razão pela qual a preocupação com a imutabilidadeda decisão sequer se justificaria ou, ao menos, não deveria despertar tanto receio.

Na Itália, as tutelas de urgência de caráter antecipatório têm eficácia desvinculada dapropositura de uma “ação principal” (art. 669-octies, 6, CPC italiano),254 mas o Código deProcesso Civil expressamente afirma que a autoridade do provimento não é invocável emum outro processo (art. 669-octies, 9, CPC italiano).255 De modo que os chamadosprovimentos antecipatórios italianos – na mesma linha dos référés franceses256 –, emboradotados de efeitos temporais indeterminados, não constituem decisões imutáveis ou quefazem coisa julgada material.257

No direito brasileiro, o § 3o do art. 304 afirma que “a tutela antecipada conservará seusefeitos”, enquanto que o § 6o do mesmo artigo esclarece que “a decisão que concede atutela não fará coisa julgada”. A tutela antecipada, após a extinção do processo, conservaos seus efeitos executivos. Melhor dizendo, após a extinção do processo há estabilizaçãoda tutela, ou seja, exatamente a conservação dos seus efeitos executivos e dos seus efeitosmateriais exauridos.

Isso significa claramente que à estabilização da tutela não pode ser atribuído qualquerefeito preclusivo próprio à coisa julgada. O direito afirmado provável ou a questãojurídica decidida com base em cognição sumária podem voltar a ser discutidos pelodemandado em qualquer processo. O art. 304 quis apenas advertir que, para pretender ainvalidação ou a reforma da específica tutela concedida, o réu deve propor ação derevisão no prazo de dois anos.

Entretanto, existe o problema do significado do § 5o do art. 304 ou, mais precisamente,da extinção do direito de reformar ou invalidar a tutela antecipada. A impossibilidade dese pedir a revisão da decisão que concedeu a tutela antecipada para reformá-la ouinvalidá-la nada tem a ver com coisa julgada. Ora, se o legislador optou por não atribuir àdecisão que concede a tutela que se estabiliza a qualidade de coisa julgada material,certamente em virtude da precariedade da cognição que está à sua base, não há razãopara supor que o decurso do prazo para o exercício do direito de revê-la tenha a força deconferir à decisão não revista a autoridade de coisa julgada material.

É certo que a coisa julgada material, em certos limites, é uma questão de políticalegislativa. É também verdade que a coisa julgada material não decorre, necessariamente,da plena e exauriente discussão do direito decidido. Ocorre que o legislador, além de ter

dito que a decisão que concede a tutela não produz coisa julgada, afirmou que oexaurimento do prazo de dois anos para a propositura da ação de revisão simplesmenteextingue “o direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada”.

Ora, não ter mais direito de reformar ou invalidar a tutela antecipada não significa nãopoder mais discutir o direito que foi suposto como provável para se conceder a tutela.258

Este direito pode ser rediscutido em qualquer processo, desde que não para reformar ouinvalidar a tutela antecipada. Lembre-se que o art. 503, § 1o, do Código de Processo Civil,diz expressamente que – em determinadas condições – a decisão de questão prejudicialproduz coisa julgada. É claro que, no caso de tutela de antecipada, não há “contraditórioprévio e efetivo” (art. 503, § 1o, II, CPC), razão pela qual este contraditório obviamente nãopoderia ser exigido em caso de tutela estabilizada que faria precluir a discussão dequestão prejudicial decidida com base em cognição sumária. Mais claramente: a fluênciado prazo de dois anos, caso gerasse coisa julgada, também impediria a discussão daquestão prejudicial, não importando a falta de contraditório prévio e efetivo. Contudo,como a passagem do prazo de dois anos para o exercício do direito de revisão da tutelaestabilizada não faz surgir coisa julgada, a questão jurídica decidida enquanto prejudicialà concessão da tutela não só pode voltar a ser analisada enquanto pedido ou mesmo comoquestão prejudicial à formulação de pedido em ação de cognição exauriente, comotambém pode permitir decisão inversa ou contrária sem que se possa falar em violação decoisa julgada. Assim, por exemplo, se a decisão que concedeu a tutela que se estabilizouafirmou com base em cognição sumária a responsabilidade contratual do demandado,nada impede que se chegue à conclusão, diante de outro pedido formulado pelo autorcontra o demandado, que não existe a responsabilidade contratual antes admitida comoprovável.

Realmente, se a norma simplesmente afirma que o prazo de dois anos extingue odireito de reformar ou invalidar a tutela antecipada, não cabe pensar em qualquer efeitopreclusivo próprio à coisa julgada. Há somente impedimento de rever a tutela do direitomaterial, seja para reformar, extirpar ou remover os efeitos concretos da tutela que já seexauriu, seja eventualmente para paralisar a sua eficácia executiva. Note-se, aliás, que aprocedência do pedido de revisão gera não apenas a reforma ou a invalidação da tutela,mas também pode levar à determinação de restituição ao estado anterior e/ou aoressarcimento, aplicando-se o art. 520, I e II, do Código de Processo Civil.

14.11. Estabilização da tutela contra a fazenda pública

De acordo com o art. 392 do Código de Processo Civil, a admissão em juízo de fatosrelativos a direitos indisponíveis não vale como confissão. O § 1o deste artigo afirma que aconfissão será ineficaz se feita por quem não for capaz de dispor do direito a que sereferem os fatos confessados. Quer dizer que o advogado da Fazenda Pública, a menos queautorizado a confessar, não pode produzir confissão dotada de eficácia. Como diz o art.341, I, do Código de Processo Civil, as alegações de fato feitas pelo autor, ainda que nãoimpugnadas, não são presumidas verdadeiras quando não for admissível a seu respeito aconfissão. De modo que a não contestação de fatos relativos a direitos indisponíveis nãovale como confissão e, por consequência, as alegações que lhe dizem respeito, ainda quenão impugnadas, devem ser investigadas pelo juiz. Assim, a não contestação atribuída aoadvogado da Fazenda Pública igualmente não torna os fatos incontroversos.

Portanto, quando se pergunta se a não reação pode estabilizar a tutela antecipadadiante da Fazenda Pública, tornando-a imutável depois de exaurido o prazo da ação derevisão (§ 5o do art. 304, CPC), cabe verificar se a não interposição do agravo deinstrumento impediu o juiz de investigar alegações de fato.259 Se a tutela antecipada nãose baseou na probabilidade das alegações de fato serem verdadeiras não há motivo para

pensar que a estabilização da tutela antecipada está a contradizer a regra que afirma quenão vale como confissão a admissão em juízo de fatos relativos a direitos indisponíveisnem mesmo a regra que diz que as alegações de fato não impugnadas não se presumemverdadeiras quando não podem ser objeto de confissão.

Interfere aí a regra do art. 374 do Código de Processo Civil, que diz que não dependemde prova os fatos: i) notórios; ii) afirmados por uma parte e confessados pela partecontrária; iii) admitidos no processo como incontroversos; e iv) em cujo favor militapresunção legal de existência ou de veracidade. É evidente que os incisos II e III não seaplicam, uma vez que os fatos pertinentes a direitos indisponíveis não podem ser objetode confissão nem podem ser vistos como incontroversos porque admitidos. Porém, nocaso de fatos notórios e em cujo favor milita presunção legal de existência ou deveracidade, bem como nos casos – que certamente representam a grande maioria – em quea probabilidade do direito é consequência exclusiva da resolução de uma questão dedireito que não depende de investigação de alegação de fato – que se costuma chamar dequestão “puramente” de direito –, certamente não há qualquer razão para não admitir a“plena” estabilização – dotada de imutabilidade – da tutela antecipada.

Nos casos em que a questão é “puramente” de direito, a não interposição do agravo deinstrumento não retira do juiz a oportunidade de investigar qualquer alegação de fato, oumelhor, não elimina a possibilidade de uma instrução aprofundada – derivada doprosseguimento do processo – permitir a modificação ou a revogação da tutelaliminarmente concedida.

Note-se que, no que tange aos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos, jamaishaverá não contestação ou admissão, podendo se falar apenas em inércia de dedução. Anão reação, neste caso, certamente não é uma admissão, mas uma não dedução de fatosque poderiam impedir, modificar ou extinguir o direito. Significa que a não dedução nãose confunde com a confissão ou com a admissão que importa na presunção de veracidadedas alegações de fato realizadas pelo autor. Portanto, a estabilização da tutela não podeser vedada em razão de a Fazenda Pública deixar de deduzir defesa de mérito indireta.Aliás, é preciso perceber que a estabilização da tutela, além de ter como pressuposto aidoneidade – num juízo de probabilidade – dos fatos alegados para produzir os efeitosjurídicos afirmados, sempre e em qualquer caso requer a ausência de fatos impeditivos,modificativos ou extintivos releváveis de ofício.

Tudo isso quer dizer que o regime que subordina a modificação ou invalidação dosefeitos concretos e processuais da tutela antecipada a uma ação de revisão proponível noprazo de dois anos deve ser aplicado de forma diferenciada em relação à Fazenda Pública.Só a tutela antecipada que supõe probabilidade de direito a partir da análise de questão dedireito que não requer investigação de alegação de fato está integralmente subordinadaao regime da estabilização da tutela. Nesse caso, a não propositura de ação de revisão pelaFazenda Pública torna a tutela estabilizada insuscetível de rediscussão e mutação.

Contudo, na hipótese em que a probabilidade do direito resulta da suposição de que asalegações de fato são prováveis, o regime da estabilização da tutela não é integralmenteaplicável. A não interposição de agravo pela Fazenda Pública, qualquer que seja o caso,conduz à extinção do processo e a perdurabilidade dos efeitos da tutela antecipada até queseja proposta ação de revisão, mas a tutela antecipada baseada em fatos que não foramplenamente investigados – embora se torne estável diante da não interposição do agravo deinstrumento – nunca se torna imutável em face da Fazenda Pública.

Ainda que a conservação dos efeitos da tutela em virtude da não interposição doagravo seja equivalente a atribuir efeitos a uma tutela em vista da não contestação defatos por parte de quem não tem poder para confessar, é certo que a admissão de fatos

que dizem respeito a direitos de que não se pode dispor – que exatamente por isso nãovale como confissão – apenas não pode gerar a indiscutibilidade dos fatos ou equivaler auma renúncia à discussão dos fatos. A circunstância de a Fazenda Pública ter que propor“ação de revisão” para que os fatos possam ser investigados sequer gera a inversão doônus da prova, que continua sendo do autor da ação em que concedida a tutela. De modoque a não interposição do agravo, ao impor a extinção do processo e a conservação dosefeitos da tutela, não tem os efeitos de uma confissão, na medida em que basta à FazendaPública propor ação para que o autor da primitiva ação tenha que demonstrar os fatosque foram supostos prováveis quando da concessão da tutela antecipada.

Em resumo: toda e qualquer tutela antecipada concedida inaudita altera parte –portanto ainda que não requerida na forma antecedente –, quando não impugnadamediante agravo de instrumento pela Fazenda Pública, conserva efeitos após a extinçãodo processo. Porém, a tutela antecipada fundada em fatos não aprofundadamenteinvestigados, a despeito de também conservar efeitos diante da extinção do processoprovocada pela inércia, não se torna imutável, o que significa dizer que o prazo de doisanos – previsto no § 5o do art. 304 – não se aplica à Fazenda Pública.

Mas também importa aqui analisar a “remessa necessária”, prevista no art. 496 doCódigo de Processo Civil. A remessa necessária significa que a sentença proferida contra aFazenda Pública, para se tornar imutável, depende de reanálise do caso pelo tribunal.Quando o art. 496 fala que a sentença não produz “efeito senão depois de confirmada pelotribunal”, quer dizer que a sentença não produz coisa julgada senão após confirmada. Éclaro que os efeitos da sentença ou da decisão são produzidos independentemente dacoisa julgada. Caso os efeitos da decisão não pudessem ser imediatamente produzidoscontra a Fazenda Pública não haveria como ter qualquer forma de tutela urgente diantedela. Ora, não admitir que a tutela antecipada conserve efeitos diante da inércia daFazenda Pública é não perceber que, diante dela, a tutela antecipada sempre produzefeitos independentemente de remessa necessária.

A Fazenda Pública, como qualquer outro, sempre tem à sua disposição a ação derevisão.260 Proposta essa ação, a sentença proferida contra a Fazenda Pública estarásujeita, se for o caso (§§ 3o e 4o do art. 496, CPC), à remessa necessária. Caso a ação nãoseja proposta – quando necessária, ou seja, em caso de tutela antecipada em que não setomou em conta alegação de fato dependente de posterior elucidação –, a tutela se tornaráimutável e indiscutível ainda que a decisão que a concedeu não tenha sido revista pelotribunal. Na verdade, a garantia buscada pela remessa necessária é plenamentecompensada pela possibilidade de se propor a ação de revisão. Lembre-se que, nos casosem que a ação de revisão é necessária, não há que se pensar em admissão de fatos ou emconfissão. O que realmente importa é que, como a própria Administração Pública fica nopleno controle da gestão dos seus casos judiciais, não há racionalidade em obrigar oparticular a pagar por eventual atuação omissiva (não propositura da ação de revisão)destituída de adequação ou probidade. Isto significaria uma gritante violação da igualdadeperante os procedimentos judiciais, indispensável ao desenvolvimento da vida social numEstado de Direito, alimentada por possíveis condutas desviadas dos agentes públicos. Ora,casos deste tipo, como é pouco mais do que evidente, devem ser tratados medianteinvestigação da responsabilidade do funcionário público e não por meio de imposição deprejuízo ao particular. Não raciocinar assim é tutelar ilegitimamente o Estado e prejudicaros jurisdicionados. Ou pior: é desconsiderar o direito à igualdade perante o processo parapreservar ou acobertar maus funcionários públicos e alimentar uma visão de Estado quenão tem qualquer preocupação com o desenvolvimento da sociedade e da sua economia.

Alguém ainda poderia dizer que a tutela antecipada não pode ser concedida contra aFazenda Pública ou que essa sempre deve ser intimada a se pronunciar antes da

concessão da tutela (art. 1.059, CPC; art. 1º, § 3° e art. 2º, Lei no 8.437/92). Porém, o direitoà tutela urgente é corolário do direito fundamental à tutela judicial efetiva, de modo que alei obviamente não pode dizer que a tutela antecipada não pode ser concedida contra aFazenda Pública. Além disso, a lei jamais pode subordinar a tutela urgente à ouvida dodemandado, na medida em que a sua concessão imediata pode ser indispensável para queo direito não sofra dano – exatamente como ocorre quando é concedida inaudita alteraparte e, assim, pode se estabilizar.

15. Diferenças entre os procedimentos das tutelas antecipada e cautelar antecedentes

15.1. Distinção entre o procedimento da tutela cautelar antecedente e oprocedimento da tutela antecipada antecedente

No caso de tutela antecipada antecedente não há contestação do pedido de tutela. Estaé concedida ou negada em face apenas da petição inicial em que requerida a tutelaantecipada. O réu só é citado quando a inicial é aditada, tenha a tutela sido concedida ounegada. No caso de não ter sido possível a autocomposição, o réu poderá apresentarcontestação para se contrapor ao pedido de tutela final e aos seus fundamentos.

Algo bem diverso sucede em caso de tutela cautelar antecedente. Nessa hipótese, alémde não se exigir a indicação do pedido de tutela final na petição em que é requerida atutela de urgência, fala-se expressamente em contestação do pedido cautelar (artigos 306 e307, CPC) e, além disso, esclarece-se que o pedido principal deve ser apresentado apenasquando a tutela cautelar for efetivada – não bastando a sua concessão e pouco importandoa sua negação (art. 308, CPC). Só quando efetivada a tutela cautelar o autor terá o ônus deapresentar o pedido principal e a causa de pedir – embora a norma fale, por lapso, emaditar a petição inicial (art. 308, § 2o, CPC). Diante deste novo pedido, caso não se chegue àautocomposição, o réu novamente terá oportunidade de contestar (art. 308, §§ 3o e 4o,CPC). Como está claro, o réu tem duas oportunidades para contestar: uma para contestar opedido de tutela cautelar e outra para contestar o pedido de tutela “principal”. Ademais, ojuiz deve julgar o pedido de tutela cautelar à luz do contraditório travado entre oslitigantes e não apenas decidir sobre o requerimento de tutela urgente em face deargumentos exclusivamente do autor – como ocorre no caso de tutela antecipadaantecedente.

Tudo isso quer dizer, bem vistas as coisas, que há um mérito cautelar, autônomo emrelação ao mérito “principal”. Aliás, curiosamente nada se fala acerca de tutela cautelarantes da ouvida do réu, como se esta só pudesse ser concedida depois da oportunização dedefesa ao demandado. Na realidade, o procedimento da tutela cautelar antecedente,embora também viabilize a posterior apresentação do pedido principal, claramenteconserva a autonomia do mérito cautelar – que não se confunde com autonomiaprocedimental.

Tanto existe um mérito cautelar que o réu é chamado a contestar o pedido cautelar e aindicar as provas que pretende produzir (art. 306, CPC). Mais do que isso: afirma-se que osfatos que amparam o pedido de tutela cautelar devem ser admitidos como ocorridos emcaso de não apresentação de contestação (art. 307, CPC). É óbvio que estes fatos dizemrespeito tanto ao perigo quanto ao direito que se busca assegurar, o que evidencia demodo incontestável a existência de um litígio cautelar a ser resolvido.

15.2. Ações cautelar e principal num único processo e ação única com requerimentode tutela antecipada antecedente

É indiscutível que não há uma tutela antecipada autônoma em relação à tutela final.

Substancialmente, a tutela antecipada é a tutela final. O que as distingue é a cognição e aconvicção com base em que são concedidas. A tutela prestada mediante a técnicaantecipatória, que se diz antecipada, é a tutela do direito, ou seja, a tutela final prestadacom base em juízo de probabilidade.

Exatamente por isso não há uma ação que almeja a tutela antecipada e outra ação quebusca a tutela final. Há apenas uma ação em que se pede a tutela do direito – que pode serconcedida ao final ou antecipadamente. Prova eloquente disso é o ônus do autor formularo pedido principal, mesmo que indeferida a tutela antecipada, para que o processo não sejaextinto sem resolução do mérito.

A tutela cautelar obviamente não se confunde com a tutela do direito ou com a tutelaassegurada. A chamada tutela cautelar antecedente sempre depende de uma ação própriadestinada à sua obtenção. Note-se que, em caso de tutela cautelar, a formulação do pedidoprincipal só constitui ônus do autor quando a tutela é concedida e efetivada.

Não é correto pensar que, em caso de tutela cautelar antecedente, há um merorequerimento de tutela cautelar que, quando efetivada, passa a depender dorequerimento de tutela principal. A tutela cautelar e a “tutela principal” dependem deações específicas, cada uma delas com suas particularidades e técnicas processuaisdiferenciadas. Além de o pedido cautelar e o pedido principal serem contestados edecididos autonomamente, a tutela cautelar pode ser concedida tanto antes da ouvida doréu – técnica antecipatória em favor da tutela cautelar – quanto depois da contestação aopedido cautelar e aos seus fundamentos. É claro que, nesta perspectiva, a ação é vista emsua adequada dimensão, ou seja, como a ação que é exercida mediante técnicasprocessuais idôneas ao alcance da tutela jurisdicional, e não apenas como um mero direitoà resolução do mérito.

Imaginar que existe apenas uma ação voltada ao alcance da tutela cautelar e,eventualmente, da tutela do direito assegurada, significa ter uma ação cautelar que, sobduas condições – efetivação da tutela e dedução do pedido e da causa de pedir pelo autor–, pode permitir o alcance da tutela de direito assegurada. Sucede que a segunda“condição” é o exercício da pretensão à tutela do direito, ou seja, exatamente a açãoprincipal.

Na realidade há um procedimento com duas ações: a primeira cautelar e a segundaprincipal – mas eventual, sujeita à efetivação da tutela cautelar. Não é comum uma açãoser proposta no curso de um procedimento, embora isso seja tecnicamente possível etenha sido a opção do legislador.

15.3. Diferença da urgência que legitima a tutela cautelar na forma antecedente

A tutela antecipada, por ser apenas a tutela final prestada mediante cognição sumária,a princípio não tem qualquer motivo para não ser requerida incidentalmente ao processoem que se busca a tutela final. É por isso que a tutela antecipada antecedente é fruto deuma situação excepcional, em que a urgência impede o autor de dispor dos documentosnecessários ou de elaborar adequadamente os argumentos para propor a ação em quedeve pedir a tutela do direito e requerer a sua antecipação.

Contudo, a urgência que legitima a tutela cautelar antecedente nada tem a ver comimpossibilidade de elaborar adequadamente a petição inicial da ação em que se pede atutela do direito. A ação cautelar antecedente faz parte da tradição do direito processualbrasileiro. A tutela cautelar pode ser requerida na forma antecedente até mesmo paraassegurar a tutela jurisdicional de um direito que pode vir a ser lesado, quando, portanto,ainda sequer há interesse de agir no pedido de tutela principal. Pense-se no pedido

cautelar de caução para a hipótese de dano temido – quando o interesse de agir na tutelaressarcitória obviamente só surge se o dano ocorrer. Note-se que a tutela cautelar nemsempre assegura um direito já violado, que, portanto, pode ser afirmado para legitimar ointeresse de agir na ação ressarcitória. Aliás, mesmo que a tutela cautelar não objetiveassegurar direito para a hipótese da sua violação, mas vise apenas assegurar a tutelarepressiva de um direito já violado, nada impede o seu requerimento na formaantecedente. Ora, não é difícil imaginar a situação em que um direito já foi objeto de danoe, portanto, desde logo pode justificar a propositura de ação ressarcitória, mas o lesado,antes de aforar a ação de ressarcimento, pretende assegurar o direito à obtenção daefetiva tutela do seu direito em vista do claro perigo de o infrator desviar o seu patrimôniopara frustrar a frutuosidade do ressarcimento.

15.4. Fungibilidade das tutelas cautelar e antecipada

Afirma o parágrafo único do art. 305 que, caso o juiz entenda que a tutela requerida naforma antecedente tem natureza antecipada e não cautelar, poderá diretamente observaro disposto no art. 303, ou seja, considerar que o autor requereu tutela antecipada – aindaque a tenha chamado de cautelar.

A possibilidade de conceder determinada forma de tutela urgente quando solicitadaoutra era uma solução prática na época do código de 1973, quando não se admitia tutelacautelar incidente e, por esse motivo, ampliava-se o conceito de tutela antecipada parapermitir a busca de tutela urgente independentemente da propositura de ação autônoma.Atualmente, como já demonstrado supra (esp. itens 1.8 e 1.9), não há motivo para não bemdelinear as figuras das tutelas cautelar (de segurança) e antecipada (satisfativa), de modoque a eventual confusão razoável entre as tutelas é praticamente nula.

De qualquer forma, o legislador quis premiar o autor que equivocadamente requertutela antecipada sob o rótulo de cautelar, dando-lhe a oportunidade de ver os trilhos doprocedimento pertinente à tutela substancialmente pleiteada utilizados pelo juiz. Porém,se isto está escrito na lei, certamente não há motivo para não admitir o inverso, ou seja, apossibilidade de o juiz entender que o pedido de tutela equivocadamente batizada peloautor como antecipada seja processado mediante o procedimento e sob as técnicasprocessuais idealizados para a tutela cautelar.

16. Do procedimento cautelar

16.1. Requisitos da petição inicial da tutela cautelar antecedente

A petição em que é requerida a tutela cautelar antecedente deve indicar o litígioprincipal e a causa de pedir que deve sustentar o pedido de tutela principal. Também devedemonstrar a probabilidade do direito que se pretende assegurar e igualmente apresentardetidamente o perigo de dano. Perceba-se que não se trata de uma exposição “sumária” ouresumida do direito cautelando, mas de uma exposição que, embora deva convencer ojulgador da probabilidade do direito, deve ser tão bem fundamentada e adequada quantoqualquer exposição que pretenda convencer o juiz.

16.2. Concessão da tutela cautelar antes da citação do réu

O art. 802, parágrafo único, do código de 1973 dizia que o prazo de contestação poderiaser contado da data da juntada aos autos i) do mandado de citação devidamente cumpridoou ii) do mandado de execução da tutela cautelar, quando concedida liminarmente ouapós justificação prévia. É certo que o prazo de contestação deve, em qualquer hipótese,ser contado a partir do momento em que o réu é comunicado do seu prazo para tanto.

Aliás, a interpretação do parágrafo único do art. 802 do código de 1973 era no sentido deque, em caso de efetivação da tutela antes da ouvida do réu, o prazo para contestação erade cinco dias da juntada aos autos do mandado (formalmente único) de citação e de“execução” da tutela. Porém, o que se pretende deixar claro é que o fato de haver omissão,entre os artigos 305 e 310, sobre a possibilidade de concessão de tutela cautelar antes daouvida do réu e o art. 306 nada dizer sobre a contagem do prazo para contestar quando atutela é efetivada antes da citação, certamente não significa que a tutela cautelar nãopossa ser concedida inaudita altera parte quando necessário.

Ora, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva impõe a concessão de tutelacautelar, mesmo antes da ouvida do réu, quando imprescindível à segurança da tutelajurisdicional do direito. Embora a regra deva ser a da prévia possibilidade demanifestação do demandado, a tutela cautelar e a tutela antecipada podem ser concedidasinaudita altera parte quando a audiência do réu puder inviabilizar a segurança ou asatisfação do direito.

Aliás, a tutela de urgência – cautelar ou antecipada – não pode ser proibida nos lugaresem que é necessária para evitar dano. Não apenas porque a lei não pode prever assituações em que a tutela de urgência será necessária – uma vez que isso depende do casoconcreto –, como também porque o direito à tutela de urgência é corolário do direitofundamental à tutela jurisdicional. Assim, a tutela cautelar pode e deve ser concedida,evidentemente que mediante a adequada justificativa, quando as circunstâncias do casodemonstrarem a sua necessidade antes da ouvida do demandado.

16.3. Procedimento acelerado

O prazo de cinco dias, conferido à apresentação de contestação, indica que oprocedimento pertinente à tutela cautelar é acelerado, ou seja, mais abreviado do que oprocedimento comum. A aceleração do procedimento, apesar de ter origem na mesmarazão que justifica a sumarização da cognição, com essa última não se confunde. Asuficiência da convicção de probabilidade para a prestação da tutela jurisdicional associa-se à celeridade da prática dos atos processuais em nome da tutela urgente, mas istoobviamente não quer dizer que não possa existir procedimento acelerado que não confereao juiz poder para decidir com base em probabilidade. Procedimento célere – ouformalmente sumário – não se confunde com procedimento de cognição sumária.261

16.4. Apresentada a contestação será observado o procedimento comum

O parágrafo único do art. 307 diz que, apresentada contestação no prazo legal,observar-se-á o procedimento comum. Assim, o procedimento, em seu aspecto formal,passa ser o comum, mas isto não interfere sobre a cognição – que continua a ser sumária –ou sobre a convicção suficiente para a resolução do mérito cautelar.

Esta regra deve ser complementada com a advertência de que, uma vez efetivada atutela cautelar – inclusive a concedida antes da ouvida do réu –, o pedido principal deveráser apresentado “nos mesmos autos” no prazo de trinta dias. Neste caso, o procedimento,diante da ação principal – ou da dedução do pedido de tutela principal – proposta napendência do processo instaurado com a ação cautelar, deve observar as regras dos §§ 3o

e4o do art. 308.

Quando a tutela cautelar foi deferida antes da ouvida do réu e, por conta disso, a açãoprincipal é proposta antes do julgamento do pedido cautelar, passa a existir um únicoprocedimento voltado a regular a maneira como se deve proceder para preparar o juízosobre o pedido de tutela cautelar e o juízo sobre o pedido principal. Ainda que na prática –

da época do código de 1973 – a tendência sempre tenha sido a de julgar o pedido cautelarconjuntamente com o pedido principal, isto não é correto, uma vez que a cognição –sumária – da tutela cautelar não se confunde com a cognição – exauriente – da tutelaprincipal. Basta perceber que as provas pertinentes ao juízo sumário são distintas dasprovas hábeis à formação da convicção de certeza, típica à cognição exauriente. A parteque sofre a tutela cautelar tem direito de ver o pedido que lhe é correspondente julgadoem prazo adequado ao juízo de cognição sumária, que obviamente não pode ser o prazopara a resolução do pedido de tutela principal. Aliás, o direito fundamental à duraçãorazoável do processo assim garante.

16.5. Contestação e defesa

O réu é citado para contestar. Não obstante, obviamente também pode apresentar“petição específica” para arguir a incompetência ou a suspeição do juiz, nos termos dosartigos 144, 145 e 146 do Código de Processo Civil. É claro que as alegações de suspeição eimpedimento, caso não tenham sido feitas, podem ser apresentadas quando daapresentação de defesa ao pedido principal (art. 308, § 4o, CPC). Lembre-se, aliás, que nãohá preclusão da alegação de impedimento. Tendo em vista que a alegação de decisãoproferida por juiz impedido constitui fundamento para a ação rescisória (art. 966, II, CPC),não há racionalidade em privar a parte de alegar impedimento em qualquer tempo e graude jurisdição.

Contudo, não há como admitir reconvenção diante do pedido de tutela cautelar emvirtude da própria natureza desta tutela, incompatível com a demora inerente à formareconvencional.

Na contestação o réu pode deduzir defesa de mérito e defesa processual. A defesaprocessual pode articular qualquer preliminar que, respeitante à ação ou ao processo,possa obstaculizar a apreciação do mérito cautelar. A defesa de mérito diz respeito àprobabilidade do direito e ao perigo de dano. Assim, pode negar os fatos constitutivos dodireito dito provável, deduzir fatos impeditivos, modificativos ou extintivos deste direito,bem como ainda negar os fatos que representam o afirmado perigo de dano.

A defesa de mérito não precisa convencer o juiz de que o direito não existe, uma vezque se situa na dimensão da probabilidade. Os argumentos alinhados para negar os fatosconstitutivos do direito provável, assim como para sustentar os fatos impeditivos,modificativos ou extintivos deste direito, são dirigidos a convencer o juiz de que o direitonão é provável. Portanto, o réu pode se valer de todas as defesas que podem ser opostas ao“pedido principal”, mas lhe basta demonstrar que o direito não é provável.

16.6. Reconhecimento da procedência do pedido

Além de poder permanecer inerte ou apresentar defesa, o réu pode reconhecer aprocedência do pedido. O reconhecimento só tem relevância quando a tutela que sealmeja assegurar diz respeito a direitos disponíveis, não acontecendo o mesmo quando aprovidência cautelar objetivada visa a assegurar direitos indisponíveis.

Recorde-se que o reconhecimento da procedência do pedido não se confunde com anão apresentação de contestação. Diante do pedido de tutela cautelar, a não apresentaçãode contestação faz surgir o efeito da presunção da probabilidade dos fatos afirmados nainicial (art. 307, CPC). Daí não decorre a conclusão automática de que o pedido cautelardeva ser julgado procedente. Mas ao reconhecer a procedência do pedido o réu não selimita a admitir os fatos articulados pelo autor como prováveis, porém reconhece o pedidode tutela cautelar, tomando-o como legítimo e procedente.

O reconhecimento do pedido redunda na vinculação do magistrado à procedência dopedido cautelar. Não basta ao juiz simplesmente homologar o reconhecimento do pedido,devendo dar ao réu prazo breve para eliminar a situação de perigo, sob pena dedeterminar a efetivação da tutela cautelar reconhecida.

16.7. Pedido de tutela cautelar e efeitos da revelia

O art. 307 reproduz a ideia contida no art. 344, que afirma que, “se o réu não contestara ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fatoformuladas pelo autor”. Enquanto o art. 344 diz que a não apresentação de contestação,isto é, a revelia, gera a presunção de veracidade dos fatos alegados, o art. 345 elencaexceções a este efeito da revelia, aplicáveis em face da tutela cautelar.

A existência de revelia deriva da caracterização do estado de inação quanto aooferecimento da contestação. É uma situação processual da qual decorrem efeitos – deordem material e processual –, sendo a presunção de veracidade das alegações de fatoapenas um deles. Só é possível saber se a revelia ensejará a realização completa ou parcialde seus efeitos mediante a avaliação das várias circunstâncias que em torno dela orbitam.O réu pode ser revel sem sofrer o efeito da presunção da veracidade das alegações de fato,conforme deixa claro o art. 345, especialmente o seu inciso IV, que nega a possibilidade deo juiz admitir a presunção quando “as alegações de fato formuladas pelo autor foreminverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos”. Imagine-se,por exemplo, que o autor, ao instruir a petição inicial, junte documento totalmentecontrário ao seu interesse ou que demonstre o pagamento da dívida pelo réu. Ainda que oréu seja revel, o juiz certamente há de considerar a presença do documento e, com isso,afastar a incidência da presunção legal, aplicando o art. 345, IV. Na verdade, a presença dequalquer elemento que conflite com a aplicação toutcourt da presunção material darevelia deve afastar sua incidência, fazendo preponderar a realidade sobre a ficção.

De lado a circunstância de que da ausência de contestação não decorre a automáticafalta de obrigação de o juiz verificar as afirmações fáticas do autor, há uma circunstância,particular à tutela cautelar, que impede que se admita uma presunção de veracidade dosfatos alegados. É que a tutela cautelar não reclama um juízo de veracidade acerca dosfatos, mas apenas um juízo de probabilidade. Ora, se o autor não tem pretensão deconvencer o juiz da veracidade dos fatos que alega, e ao réu basta demonstrar que odireito ameaçado não é provável, a ausência de contestação jamais poderá redundar napresunção de veracidade, mas, no máximo, na presunção de probabilidade dos fatosalegados na petição inicial.

A falta de contestação só pode gerar um efeito compatível com a discussão travada noâmbito da tutela cautelar, precisamente a presunção de probabilidade das alegações defato. Portanto, o art. 307 deve ser interpretado no sentido de que a não apresentação decontestação presume os fatos “ocorridos” para o efeito de permitir o juízo suficiente – deprobabilidade – para a concessão da tutela cautelar.262 Aliás, raciocinar de formacontrária implicaria equívoco grosseiro, já que faria surgir uma qualidade de convicçãojudicial que sequer pode ser formada dentro dos limites inerentes à tutela cautelar.

A não contestação faz surgir a presunção de probabilidade dos fatos, mas não elimina apossibilidade de o juiz confrontar tais fatos com a situação concreta e, inclusive,determinar o imediato comparecimento das partes em juízo.

16.8. Provas admissíveis

Frise-se que o réu tem o direito à plena defesa, ou melhor, o direito de contestaradequadamente o pedido de tutela cautelar. Não há qualquer restrição ao direito de

invocar argumentos e apresentar provas hábeis a impedir a tutela cautelar. Sumária é acognição judicial bastante à decisão sobre o pedido de tutela cautelar. Portanto, o réu temo direito de invocar as defesas e produzir as provas que lhe permitam convencer o juiz deque a tutela não deve ser concedida.

Lembre-se que o juiz, para julgar improcedente o pedido e negar a tutela cautelar, nãopode exigir um grau de convicção que lhe permitiria chegar à conclusão de que o direitoafirmado pelo autor não existe. A discussão relativa à tutela cautelar ocorre no plano daprobabilidade do direito. Exatamente por isso as partes não têm razão para produzirprovas mais elaboradas, que, além de inadequadas à formação do juízo de probabilidade,são incompatíveis com a urgência que legitima a tutela cautelar.

Embora o art. 306 não restrinja as provas admissíveis, essas logicamente devem serpróprias aos juízos de probabilidade e de urgência. Devem ser aptas a permitir averificação da existência do perigo e à formação de juízo limitado à probabilidade dodireito. Toda e qualquer prova capaz de permitir a formação de juízo apto à tuteladefinitiva do direito cautelando é um excesso.

17. Repercussão da decisão tomada em sede cautelar sobre o julgamento do pedido detutela do direito

17.1. A decisão cautelar não interfere sobre o julgamento do pedido principal

A declaração judicial somente é apta a receber a qualidade de coisa julgada materialquando tem força suficiente para se tornar definitiva. Portanto, a declaração fundada emcognição sumária – típica à decisão cautelar – não é capaz de gerar coisa julgada material,até porque não objetiva produzir “definitividade”. Diante do pedido de tutela cautelar, ojuiz decide com base em cognição sumária ou fundado na probabilidade do direito, semque possa chegar a um juízo de “certeza” e, desta forma, “declarar” direito, o que éimprescindível para a formação da coisa julgada material.

Ao julgar o pedido cautelar, o juiz “declara” que o direito é provável ou improvável.Porém, declarar uma probabilidade não é o mesmo do que declarar um direito. Aliás,declarar uma probabilidade é, implicitamente, confessar que o que foi afirmado comoprovável certamente pode ser dito em contrário – no mesmo ou em outro processo, pelomesmo ou por outro juiz. Daí deflui com naturalidade a regra de que “o indeferimento datutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi nojulgamento desse” (art. 310, CPC).

Não há dúvida que a decisão que declara o provável não pode interferir sobre adiscussão do mesmo direito em sede de cognição exauriente, motivo pelo qual se fala nodireito francês que “l’ordonnance de référé n’a pas au principal l’autorité de la chosejugée” (art. 488, CPC) ou que a coisa julgada do référé é uma “coisa julgada provisória”263 –expressão que, bem vistas as coisas, guarda uma contradição intrínseca e apenas servepara negar a existência de coisa julgada material diante da decisão fundada em cogniçãosumária e, além disso, reafirmar a ideia de que o indeferimento da tutela cautelar nãopode influir sobre o julgamento do pedido principal.

17.2. Reconhecimento de decadência ou de prescrição em sede de tutela cautelar

O art. 310 do Código de Processo Civil, quando dá ao juiz o poder de reconhecer adecadência ou a prescrição em sede de tutela cautelar, permite que matéria que dizrespeito à “tutela principal” tenha o seu julgamento deslocado. De forma excepcional,admite-se que o mérito da ação principal seja definido quando do julgamento do pedido

de tutela cautelar. Isso, como é óbvio, quando o juiz tem convicção que lhe seria suficientepara declarar a prescrição ou a decadência caso estivesse diante do pedido principal. Oumelhor: o juiz pode declarar a prescrição ou a decadência, ao tratar da tutela cautelar,quando tem convicção de certeza e não quando tem apenas convicção de probabilidade,caso em que, quando muito, poderia “declarar” a probabilidade da prescrição ou dadecadência.

A exceção aberta pelo art. 310, portanto, não apenas permite ao juiz tratar de matériaque diz respeito à tutela principal, mas também lhe outorga a possibilidade de decidir combase em cognição exauriente, ou seja, com base em cognição impertinente – maisaprofundada – à tutela cautelar.

Como o juiz trata do mérito da tutela principal com base em cognição exauriente, a suadecisão, ao reconhecer a prescrição ou a decadência, produz coisa julgada material,impedindo a propositura da ação principal ou a dedução do pedido de tutela principal. Poressa razão, e considerando que a cognição do juiz é exauriente, também se deve considerarpreclusa a discussão em caso de expressa rejeição da alegação de prescrição ou dedecadência. Vale dizer que, se o acolhimento implica a impossibilidade da dedução dopedido de tutela principal, a expressa rejeição – com base em cognição exauriente –obstaculiza a rediscussão da questão.

A previsão do art. 310 tem nítido sabor de celeridade e economia processuais, poispermite que o juiz desde logo declare algo que, a princípio, apenas poderia ser discutidomais tarde, evitando-se com isto a manutenção do estado de litigiosidade, além dodispêndio de tempo e dinheiro das partes e da administração da justiça.

É claro que a aplicação do art. 310 só tem sentido quando o pedido cautelar éantecedente. Ademais, é importante esclarecer que a norma não permite a declaração dedecadência ou de prescrição do direito do réu. Portanto, caso o autor entre com açãocautelar e alegue, entre outras coisas, que a pretensão do réu está prescrita, o juiz assimnão poderá declará-la. A previsão do art. 810 constitui exceção e regra especial, nãoadmitindo interpretação extensiva.264

18. Ação principal

18.1. Duas ações e um processo

O art. 308 afirma que, uma vez efetivada a tutela cautelar, o autor deve deduzir opedido principal em trinta dias nos próprios autos em que formulado o pedido cautelar.Se no código de 1973 era necessário propor ação cautelar e posteriormente “açãoprincipal” (art. 806, CPC/73), agora o autor propõe ação cautelar e mais tarde açãoprincipal no próprio processo instaurado pela ação cautelar.

Como é evidente, nada impede que sejam propostas duas ações em um só processo,como frequentemente ocorre em caso de ações cumuladas. É certo que se pode pensarapenas em pedidos cumulados e, num caso como o presente, em pedido cautelar seguidode pedido principal. Sucede que, bem vistas as coisas, não se trata apenas de pedidos, masde ações (compostas por pedido e causa de pedir) em que se busca tutela de segurança etutela do direito material. Por existir apenas um processo, instaurado quando dapropositura da ação cautelar, o autor é dispensado do adiantamento de novas custasprocessuais.

18.2. Aditamento da causa de pedir?

O § 2o do art. 308 diz que “a causa de pedir poderá ser aditada no momento deformulação do pedido principal”. Trata-se obviamente de regra mal redigida, uma vezque, ao contrário do que ocorre na hipótese de tutela antecipada, aqui não há busca deuma mesma tutela de direito nem apenas uma causa de pedir. A causa de pedir da açãocautelar não se confunde com a causa de pedir da ação principal.

Ao redigir o § 2o do art. 308 o legislador não percebeu que, ao reproduzir o conteúdodo revogado art. 801, III e IV do código de 1973 no art. 305, estava apenas a exigir a“indicação” da causa de pedir da ação principal e não a sua formulação. A causa de pedir,referida mediante a expressão “fundamento” no art. 305, deve ser “indicada” para dar aojuiz oportunidade de situar a ação cautelar no contexto do direito cautelando. Não háqualquer razão para o autor deduzir a causa de pedir da ação principal desde logo, aocontrário do que ocorre no “procedimento da tutela antecipada antecedente”, em que éperseguida uma única tutela mediante uma só ação.

Uma vez efetivada a tutela cautelar o autor tem trinta dias para propor a açãoprincipal, quando obviamente pode formular não só pedido, mas também deduzir a causade pedir – antes apenas indicada – em sua integralidade.

18.3. Relação entre ação principal e efetivação da tutela cautelar

Sublinhe-se que a ação principal deve ser proposta apenas quando efetivada a tutelacautelar. E isso sob pena de cessação da eficácia da tutela e de responsabilidade objetivapelos eventuais danos ocorridos (arts. 309, I, e 302, III, CPC). É assim para que a tutelacautelar não se mantenha eficaz sem o necessário aprofundamento da cognição e dodebate em torno do direito assegurado. De modo que a propositura da ação principal éônus daquele que obteve tutela cautelar que foi efetivada.

Em caso de tutela cautelar não concedida ou concedida e não efetivada, o autor podepropor a ação de modo formalmente autônomo. Aliás, quando a tutela é efetivada e a açãoprincipal não é proposta, o autor não perde o direito de propor a ação de modo autônomo,mas apenas é gravado com a responsabilidade objetiva por eventual dano produzido pelaefetivação da tutela.

Note-se, porém, que em caso de tutela antecipada antecedente pouco importa se atutela não foi concedida ou efetivada. Não deferida a tutela antecipada, o autor tem o ônusde aditar a petição inicial sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito (art.303, § 6o, CPC). Essa é uma importante distinção entre os procedimentos das tutelasantecipada e cautelar antecedentes, pois evidencia que, enquanto o ajuizamento da açãoprincipal é requisito para a eficácia da tutela cautelar, o requerimento de tutela antecipadaé indissociável da ação em que se pede a tutela final.

18.4. Procedimento após o ajuizamento da ação principal

Depois do ajuizamento da ação principal no processo instaurado pela ação cautelar aspartes devem ser intimadas para a audiência de conciliação ou de mediação (art. 334,CPC), pessoalmente ou na pessoa dos seus advogados. Não ocorrendo autocomposição, oprazo para contestar deve ser contado na forma do art. 335 do Código de Processo Civil.

Lembre-se, contudo, que quando a ação principal é proposta – em virtude de a tutelater sido concedida inaudita altera parte e efetivada – antes do julgamento do pedidocautelar, passa a existir um único procedimento para regular a preparação dos juízossobre os pedidos de tutela cautelar e de tutela principal.

18.5. Cumulação das ações cautelar e principal

Não haveria racionalidade em não admitir a cumulação das ações cautelar e principal,formulando-se petição inicial em que estejam presentes as causas de pedir de cada umadas ações e seus respectivos pedidos. É nesse sentido o teor do § 1o do art. 308, emboraaluda a pedidos principal e de tutela cautelar.

Ainda que se diga que o pedido principal pode ser formulado conjuntamente com opedido de tutela cautelar, há duas ações que ambicionam duas tutelas – passíveis deconcessão ao final do processo. Não há apenas ação em que se pede tutela do direito comrequerimento de tutela cautelar incidental. Há pedidos de duas tutelas finais, sendo acautelar passível de ser concedida também no curso da ação cautelar. A ação cautelar éexercida, com base em técnicas processuais que lhe são próprias – como a possibilidade deantecipação da tutela cautelar final –, ao lado da ação em que se almeja o alcance da tutelado direito.

19. Cessação da eficácia da tutela cautelar

19.1. Introdução

Os incisos do art. 309 estabelecem hipóteses de cessação da eficácia da tutela cautelar.Objetiva-se evitar que a tutela cautelar se mantenha eficaz quando perde sua justificativa.O principal motivo a animar a “cessação da eficácia” é o de que a tutela cautelar afeta aesfera jurídica do réu, causando-lhe gravame a partir de um juízo de probabilidade.

Porém, é preciso ter cautela na interpretação dos incisos do art. 309, uma vez que, porexemplo, nem toda tutela cautelar efetivada necessita ser seguida por uma ação principal,de modo que nem sempre a não dedução do pedido principal pode redundar em cessaçãoda eficácia da tutela cautelar – ao contrário do que a interpretação literal do inciso I doart. 309 permite concluir.

19.2. Não formulação do pedido principal no prazo legal

Realmente, nem sempre a efetivação da tutela cautelar exige a propositura da açãoprincipal, como ocorre no caso de caução de dano infecto. Lembre-se que a caução dedano infecto é idônea para assegurar a viabilidade da tutela ressarcitória diante depossível dano futuro. Neste caso, não tendo ainda ocorrido o dano e, portanto, nãohavendo sequer possibilidade de exercício da pretensão à tutela ressarcitória, uma “açãoprincipal” é obviamente impensável.

A cessação da eficácia da tutela cautelar só pode ocorrer quando a propositura da açãoprincipal for exigível no processo instaurado pela ação cautelar. Quando a tutela cautelarfoi efetivada e o autor pode exigir a tutela do direito acautelada, a ação principal deve serproposta para que se demonstre a razão de ser da tutela cautelar e reste justificada arestrição da esfera jurídica do demandado,265 dando-se-lhe, ademais, oportunidade parademonstrar a inexistência do direito que foi suposto existente ao se conceder a tutela deurgência.

O prazo de trinta dias para a dedução do pedido principal ou, mais precisamente, paraa propositura da ação principal, corre da juntada aos autos do mandado de efetivação datutela cautelar. Quando são concedidas várias tutelas, como por exemplo diversosarrestos, o prazo começa a correr da juntada aos autos do primeiro mandado deefetivação. Lembre-se que a imposição de brevidade para a propositura da ação principalatende à necessidade de não se permitir a sobrevivência de uma tutela eventualmenteinfundada por longo período de tempo, exigindo-se que o autor assuma, no menor tempopossível, o ônus de demonstrar o direito assegurado pela tutela cautelar. Portanto, como a

primeira tutela obviamente interfere na esfera jurídica do réu, o prazo deve começar acorrer a partir da juntada aos autos do primeiro mandado.

O prazo para a propositura da ação principal nada tem a ver com a preclusão dadecisão, já que a tutela pode ser efetivada apesar do recurso. Caso a tutela efetivada sejarevogada antes de escoado o prazo para a propositura da ação principal, essa não precisaser proposta. Se a decisão primitiva voltar a prevalecer e a tutela for novamente efetivada,novo prazo de trinta dias é aberto à propositura da ação principal.

Não deduzido o pedido principal no prazo legal, o juiz deve declarar a perda da eficáciada tutela. Aliás, essa declaração apenas não é necessária quando o pedido principal forjulgado improcedente ou quando o processo for extinto sem resolução de mérito. Adeclaração é necessária nas hipóteses dos incisos I e II do art. 309 porque essas requeremjuízo sobre a observância ou não do prazo. Mas a perda da eficácia sempre se dá com anão propositura da ação principal no prazo legal e não com a decisão que declara acessação ocorrida, de modo que, por exemplo, há responsabilidade objetiva do requerenteda tutela cautelar desde o momento em que escoou o prazo legal para a propositura daação principal, não importando para este efeito a declaração da cessação da eficácia.

É possível indagar sobre a natureza do prazo para a propositura da ação principal, sedecadencial ou não. Critérios de direito material, relativos à prescrição e à decadência,não são adequados à regulação dos prazos processuais.266 Note-se que o prazo para apropositura da ação principal deve ser suspenso, por exemplo, nas hipóteses dos incisos I,II e VI do art. 313 do Código de Processo Civil.

19.3. Não efetivação da tutela em trinta dias

Afirma-se que cessa a eficácia da tutela quando essa não é efetivada no prazo de trintadias. Note-se que a tutela cautelar não foi efetivada e, assim, não afetou a esfera jurídicado demandado. Portanto, a cessação não é da eficácia da tutela cautelar, mas da eficáciada decisão que concedeu a oportunidade para a efetivação da tutela.

A razão de ser da cessação, desta forma, está na inércia do requerente da tutelacautelar, ou melhor, na sua presumível falta de interesse na pronta obtenção (efetivação)da tutela cautelar. O legislador parte do pressuposto de que, se o juiz profere decisãoconcedendo a tutela cautelar e o autor não a efetiva no prazo de trinta dias, hádesinteresse superveniente na pronta obtenção da tutela cautelar. A perda supervenientede interesse é que justifica a cessação da eficácia da decisão cautelar.

Contudo, não ocorrerá cessação da eficácia se a tutela não for efetivada em razão defato atribuível ao juízo ou à parte contrária. Incidirá, neste caso, o art. 313, VI, do Códigode Processo Civil, suspendendo o prazo para a efetivação da tutela. Assim, está exato oacórdão do Tribunal de Justiça do Paraná que afirmou que a exigência da efetivação datutela cautelar, sob pena de cessação de sua eficácia, “não vinga quando se evidencia queo réu oculta o veículo que é a razão da expedição do mandado judicial e que não foicumprido, máxime, ainda, quando provado está que o autor realiza esforços para localizaro bem”.267

Por outro lado, quando a tutela cautelar for de efetivação complexa – por exemplo,necessidade de vários arrestos ou de vários sequestros –, a sua efetivação parcial no prazode trinta dias impede a cessação da eficácia da decisão que concedeu a tutela cautelar.

A não efetivação da tutela cautelar concedida antes da ouvida do réu não elimina anecessidade da sua citação para apresentar contestação. Perceba-se que a cessação daeficácia da decisão impede a efetivação da tutela cautelar, mas não o prosseguimento do

procedimento e, inclusive, a reiteração da concessão da tutela depois da apresentação dadefesa. O objetivo do inciso II do art. 309 é impedir a efetivação após trinta dias da decisãocautelar e não impor a extinção do processo.

19.4. Improcedência do pedido principal ou extinção do processo sem resolução demérito

O inciso III do art. 309 corrige o problema que estava presente no inciso III do art. 808do código de 1973. O art. 808, ao também tratar das hipóteses de cessação da eficáciatutela cautelar, dizia que cessava a eficácia no caso em que “o juiz declarar extinto oprocesso principal, com ou sem julgamento do mérito” (art. 808, III, CPC/73). O problema éque a sentença de procedência do pedido certamente não pode gerar a cessação daeficácia da tutela, nem mesmo depois do seu trânsito em julgado. Há casos em que,transitada em julgado a sentença de procedência, a tutela cautelar deve prosseguir eficazpara garantir a tutela do direito que depende da execução. O arresto, por exemplo,garante a tutela ressarcitória pelo equivalente em pecúnia ou a tutela do direito decrédito, que obviamente dependem da execução em caso de não cumprimento voluntárioda condenação. O inciso III do art. 309 corretamente restringe o âmbito da cessação daeficácia, limitando-o às hipóteses de improcedência do pedido principal e de extinção doprocesso sem resolução do mérito.

A improcedência do pedido e a extinção do processo sem resolução do mérito, mesmoantes do trânsito em julgado, a princípio são suficientes para determinar a cessação daeficácia da tutela cautelar. No momento em que se reconhece que a tutela do direitoinicialmente acautelada não deve (improcedência) ou não pode (extinção do processo semresolução do mérito) ser prestada, a princípio há contradição em manter eficaz a tutelacautelar. Não há como não admitir que a sentença que extingue o processo semjulgamento de mérito, ao dizer que o autor sequer pode exigir a tutela do direito, e asentença de improcedência do pedido, ao afirmar que o autor não tem direito à tutela dodireito, descalçam a tutela cautelar do pressuposto da probabilidade do direito, o que, emuma perspectiva lógica, deveria obrigatoriamente conduzir à cessação da tutela cautelar.

Ocorre que o perigo de dano pode persistir no período de processamento do recurso deapelação. Nesta situação, caso o tribunal reforme a sentença, a tutela do direitoprovavelmente não será prestada de modo efetivo. Bem por isso o tribunal pode, aovisualizar probabilidade de provimento do recurso e perigo de dano, conceder tutelacautelar (art. 299, parágrafo único, CPC). Uma vez interposta a apelação, cabe ao tribunalapreciar o pedido de tutela cautelar, ainda que o recurso esteja sendo processado emprimeiro grau.

É certo que a cessação da eficácia da tutela cautelar depende da intimação do autoracerca da sentença de improcedência do pedido ou de extinção do processo semjulgamento do mérito. Porém, não é absurdo considerar o período entre a intimação dasentença e a interposição do recurso de apelação. É verdade que este período não é muitolongo. Não obstante, neste espaço de tempo obviamente pode haver perigo de dano, que,assim, pode ser eliminado pelo próprio juiz de primeiro grau de jurisdição. Diante disto,há de se aceitar que o juiz, em hipóteses excepcionais – em que vislumbre a iminência daprática de dano –, possa manter a eficácia da tutela cautelar ou simplesmente deixar derevogá-la na sentença de improcedência ou de extinção do processo sem julgamento domérito, a despeito de ser possível ao autor, igualmente em casos excepcionais, requerer atutela cautelar diretamente ao tribunal mesmo que o recurso de apelação não tenha sidointerposto.

20. Renovação do pedido de tutela cautelar sob novo fundamento

De acordo com o parágrafo único do art. 309, “se por qualquer motivo cessar a eficáciada tutela cautelar, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo fundamento”. Éimportante analisar se, tratando-se de tutela cautelar, há coisa julgada material ou apenasproibição de renovação do pedido, bem como o significado de “novo fundamento” capazde oportunizar a renovação do pedido de tutela.

É claro que a coisa julgada material não se confunde com a proibição do bis in idem. Oprincípio do ne bis in idem marca uma série de situações em que não se pode admitir arenovação ou repetição de um pleito. Há proibição do bis in idem na esfera administrativa,assim como na chamada “jurisdição voluntária”, mas certamente não existe coisa julgadamaterial nestas situações. Quer isto dizer que a simples circunstância de um pedido tersido decidido não é suficiente para produzir coisa julgada material ou tornar a questãodecidida indiscutível.

A coisa julgada material é a qualidade que torna indiscutível a declaração ou o efeitodeclaratório contido na sentença. A coisa julgada somente incide em face de algumassentenças. Não diante das sentenças da “jurisdição voluntária” e das que decidem opedido de tutela cautelar, uma vez que a “declaração” contida nestas sentenças é inaptapara produzir coisa julgada material, ou melhor, não é propriamente declaração oudeclaração para efeito de coisa julgada material.

A sentença, para produzir coisa julgada material, deve ser capaz de declarar aexistência ou a inexistência de um direito. Se o procedimento não outorga às partesadequada oportunidade de alegação e produção de prova, ou melhor, de exercício docontraditório, nele jamais se poderá chegar a um juízo capaz de permitir a “declaração dodireito”, mas apenas a um juízo idôneo a autorizar uma “declaração sumária”, que, porsua própria natureza e origem, não terá força suficiente para gerar a imutabilidade típicada coisa julgada.

Se o juiz rejeita a tutela cautelar por entender que o fato, ainda que evidenciado, nãogera situação perigosa suficiente à sua concessão, não há como admitir a renovação dopedido de tutela cautelar com base na mesma circunstância fática. Mas a proibição dereutilização da mesma circunstância fática ou do mesmo fato indicador do perigoobviamente nada tem a ver com coisa julgada. Nem mesmo se pode aceitar a tese de que anegação da tutela cautelar impede a invocação de fato que poderia ser utilizado parademonstrar o perigo, conforme pretendeu Giuseppe Tarzia no ensaio “Rigetto eRiproponibilità della Domanda Cautelare”, publicado na Rivista di Diritto Processuale.268

O autor, para pedir tutela cautelar, não precisa alegar todos os fatos que poderiamconvencer o juiz da sua necessidade. Fatos não alegados, mas já existentes, podem fundarnovo pedido de tutela cautelar. Não há como aglutinar ou imantar os fatos que podemfundar o pedido de tutela. Cada um deles constitui um fundamento para o pedido de tutelacautelar. Portanto, não há preclusão na não alegação de fato que já existia à época dorequerimento da tutela cautelar negada. Proíbe-se apenas a reiteração de fato jádescartado como capaz de indicar situação perigosa suficiente para a concessão da tutela,o que obviamente não se confunde com coisa julgada material, constituindo apenasmanifestação da proibição do bis in idem.

Nos casos de não propositura da ação principal no prazo legal (art. 309, I, CPC) e de nãoefetivação da tutela cautelar em trinta dias (art. 309, II, CPC), a parte pode renovar opedido de tutela cautelar com base em “novo fundamento”. Este novo fundamento nãopode ser o fato reconhecido como perigoso para a concessão da tutela cautelar que perdeua eficácia. O fato deve ser outro, suficiente para a concessão de nova tutela cautelar. Estefato, distinto do que fundou o pedido de tutela cautelar que perdeu a eficácia, é o “novofundamento” que permite a renovação do pedido nos termos do parágrafo único do art.

309.

Note-se que o parágrafo único do art. 309, ao aludir a “novo fundamento”, não tempreocupação alguma com a probabilidade do direito. O seu objetivo é impedir a renovaçãodo pedido com base no mesmo fato que levou à concessão da tutela cautelar que perdeu aeficácia. Assim, ainda que cesse a eficácia da tutela cautelar, a parte pode requerer novopedido de tutela cautelar com base em fato novo ou com base em fato já existente, masnão alegado. Só não lhe é possível requerer tutela cautelar com base no mesmo fatoperigoso que fundou a tutela cautelar cuja eficácia cessou.

NOTAS DE RODAPÉ

1

Cesare Salvi, Leggitimità e “razionalità” dell’art. 844 Codice Civile, Giurisprudenza italiana, 1975,p. 591.

2

Ver Adolfo di Majo: “Le dottrine giuridiche dell’Ottocento, dopo la parentesi medioevale,recuperano appieno il principio romanistico (della prevalenza) della condemnatiopecuniaria,dovendo apparire, questa prevalenza, come la più funzionale alle esigenze del mercato. Nelmercato, com’è noto, non contano le qualità dei soggetti nè quelle dei valori od interessi in essopresenti (astrattezza dei valori). In presenza di atti e/o di fatti che comportano inadempimento diobblighi e/o violazioni di diritti, la linea tendenziale è di imporre al responsabile il mero ‘costoeconomico’ di sifatti comportamenti, tendendosi in tal modo a riprodurre i meccanismi dimercato alterati” (Adolfo di Majo, La tutela civile dei diritti, p. 156).

3

Diz Salvatore Mazzamuto: “I soggetti dello scambio sono liberi di autodeterminarsi attraverso ilcontratto e debbono soltanto rispettare le regole del giuoco, le quali sono concepite nelpresupposto della parità formale dei contraenti e non impongono di adequare il regolamentod’interessi a parametri di valutazione sociale. I limiti posti dall’ordinamento all’autonomia deiprivati appaiono come limiti squisitamente negativi. Così è per il divieto di conformare il negozioin contrasto con le norme imperative e per la corrispondente sanzione della nullità. Ma così èanche per la misura del risarcimento del danno che consegue all’inattuazione dello scambio”(Salvatore Mazzamuto, L’attuazione degli obblighi di fare, p. 37-38).

4

Lodovico Barassi, Lateoriageneraledelleobbligazioni, Milano: Giuffrè, 1964, p. 428. Porém, adoutrina contemporânea, inclusive a italiana, não se rende ao velho argumento de que ainibitória pode colocar em risco a liberdade do homem. Ver Cristina Rapisarda, Profili della tutela

civile inibitoria, p. 90 e ss; Aldo Frignani, L’injunctionnella common lawel’inibitorianeldirittoitaliano, Milano: Giuffrè, 1974, p. 428.

5

Gian Antonio Micheli, L’azione preventiva, RivistadiDirittoProcessuale, 1959, p. 205.

6

Desta forma, é correta a lição de Barbosa Moreira, no sentido de que a tutela declaratóriasomente pode prevenir uma violação quando a parte vencida sai também convencida e resolvecumprir a obrigação em tempo oportuno: “Como meio de intimidação, e pois de coerção, todavia,o remédio é fraco: basta pensar que, na eventualidade de inadimplemento, o titular do direitolesado terá de voltar a juízo para pleitear a condenação do infrator, ao qual se concede assimuma folga em boa medida tranquilizadora” (José Carlos Barbosa Moreira, Tutela sancionatória etutela preventiva, Temasdedireitoprocessual, São Paulo: Saraiva, 1980, p. 27).

7

Andrea Proto Pisani, L’attuazionedeiprovvedimentidicondanna, Roma: Foro Italiano, 1988, p. 184;Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p. 183; Aldo Frignani, L’injunctionnellacommon law el’inibitorianeldirittoitaliano, p. 592 e ss.

8

Giuseppe Chiovenda, L’azione nel sistema dei diritti, p. 82.

9

Chiovenda discordou da teoria de Redenti sobre o fim sancionatório da justiça civil, exatamenteporque, ao aceitar a tese de Wach, que demonstrava uma relação teórica entre a autonomia dodireito de ação e a ação declaratória, concluiu que a ação declaratória não supõe a violação deum direito e não tem por fim aplicar uma sanção (Cristina Rapisarda, Profili della tutela civileinibitoria, p. 53).

10

Vittorio Denti reconhece a ligação da tutela declaratória, como remédio de caráter preventivo,com o modelo institucional liberal: “Altro punto che va tenuto fermo è il carattere preventivodell’azione inibitoria. La dottrina processualistica ha, per lunga tradizione, risolto la tutelagiurisdizionale preventiva nel mero accertamento, con una scelta che non ha avuto – come èstato recentemente dimostrato – soltanto carattere concettuale, poiché era condizionata dallatendenza a delimitare rigidamente i poteri di ingerenza statale nella sfera giuridica privata. Sitrattava, quindi, della adesione al modello istituzionale liberale, chiaramente presente nel

maggiore teorizzatore dell’azione di mero accertamento e della sua funzione preventiva,Giuseppe Chiovenda” (Vittorio Denti, Diritti della persona e tecniche di tutela giudiziale.L’informazioneeidirittidellapersona, Napoli: Jovene, 1983, p. 267).

11

Cristina Rapisarda, Profili della tutela civile inibitoria, p. 70-72; Cristina Rapisarda, Premesse allostudio della tutela civile preventiva, RivistadiDirittoProcessuale, 1980, p. 128 e ss.

12

Ver Ovídio Baptista da Silva, Jurisdiçãoeexecução na tradição romano-canônica, São Paulo: Revistados Tribunais, 1996, p. 147.

13

Os magistrados anteriores à Revolução Francesa eram considerados aliados da nobreza e doclero. A desconfiança da burguesia em relação aos juízes – que era totalmente justificada – foiresponsável pela feição passiva e neutra que a Revolução Francesa atribuiu ao Judiciário.

14

 O procedimento de cognição plena e exauriente, complementado pelas três sentenças daclassificação trinária, é absolutamente incapaz de propiciar uma tutela preventiva adequada.Este modelo de “processo”, que pode ser chamado de “processo civil clássico”, além de refletir,sobre o plano metodológico, as exigências da escola sistemática, baseadas na necessidade deisolar o processo do direito material, espelha os valores do direito liberal, fundamentalmente a“neutralidade” do juiz, a autonomia da vontade, a não ingerência do Estado nas relações dosparticulares e a incoercibilidade do facere.

15

Loriana Zanuttigh, La tutela cautelare atipica, L’informazione e i diritti della persona, Napoli:Jovene, 1983, p. 281.

16

Como diz Zanuttigh, “un ulteriore profilo dell’esperienza concreta dell’istituto conferma, ai fini diuna valutazione complessiva, che le indicazioni emergenti dalla evoluzione degli orientamenti deigiudici e dalle istanze degli utenti della giustizia sono nel senso di una chiara propensione versoforme sempre più estese di tutela preventiva e non repressiva, almeno per talune categorie didiritti. Ne è prova, l’attitudine dei provvedimenti urgenti a porsi come strumenti di tutelasommaria non cautelare, nella sostanza cioè ad operare come forma autonoma di tutela. Siffattaalterazione della funzione delle misure cautelari atipiche è resa percepibile e viene accentuata da

talune applicazioni dell’istituto” (Loriana Zanuttigh, La tutela cautelare atipica, p. 276-277).

17

Vittorio Denti, Diritti della persona e tecniche di tutela giudiziale, L’informazione e i diritti dellapersona, Napoli: Jovene, 1983, p. 263.

18

Andrea Proto Pisani, La tutela giurisdizionale dei diritti della personalità: strumenti e tecniche ditutela, Foro Italiano, 1990, p. 17 e ss.

19

Vittorio Denti, Diritti della persona e tecniche di tutela giudiziale, p. 265. Ver ainda FrancescoPaolo Luiso, Diritto processuale civile, vol. 4, Milano: Giuffré, 2015, p. 210 e ss; Carmine Punzi, Ilprocesso civile, v. 3, Padova: Cedam, 2010, p. 35 e ss.

20

Giovanni Verde também analisa a deformação da fisionomia original da tutela cautelar diante daevolução da sociedade e dos direitos: “Nel tirare le somme, avviandomi a concludere, mi accorgodi avere tenuto un discorso confuso, disarticolato e in qualche parte incoerente. Ma la verità è chesono stato travolto dalla stessa maniera disorganica con la quale l’istituto del provvedimentod’urgenza si è venuto modificando e adattando alle concrete esigenze. E mi pare che le indicazionifornite, dalle quali si sono volutamente tralasciate le ricchissime serie di provvedimenti a tuteladei diritti della personalità (in senso tradizionale) e della concorrenza, che rappresentano ilcampo naturale di applicazione dei provvedimenti in esame, abbiano confermato che non ci siastata vicenda di qualche rilievo (...) che non sia passata per tale forma di giustizia. Ne è venutafuori una tipologia assai varia e che forse meriterebbe di essere organizzata secondo criterisistematici, che non sono stato in grado di elaborare. Si potrebbero, così, isolare accertamentisommari con prevalente funzione cognitiva, accertamente sommari con prevalente funzioneesecutiva, ingiunzione, inibizione oltre che meri provvedimenti cautelari” (Giovanni Verde,Considerazioni sul procedimento d’urgenza – Come è e come si vorrebbe che fosse, I processispeciali – Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, Napoli: Jovene, 1979, p. 458-460).

21

Em razão disso, Tarzia alertou para o fato de que a doutrina colocou-se de frente ao “fenomenopiù impressionante di evoluzione e trasformazione di uno strumento processuale” (GiuseppeTarzia, Intervento, La tutela d’urgenza, p. 150).

22

TST, RO-MS 37.219/91.2, rel. Min. Hylo Gurgel.

23

Lembre-se, neste exato sentido, a lição de Roger Perrot: “Mais pour cette raison, la philosophiemême de la mesure provisoire a changé. Au siècle dernier, elle avait surtout pour rôle d’assurerla conservation des biens litigieux ou d’aménager temporairement une situation contentieuse enattendant le jugement définitif. De nos jours, ce rôle premier n’a pas disparu. Mais une autrefonction s’est développée qui gagne en importance et qui consiste moins en une mission desauvegarde qu’en une anticipation sur la décision définitive” (Roger Perrot, Les mesuresprovisoires en droit français, Les mesures provisoires en procédure civile, Milano: Giuffrè, 1985, p.153). Em igual sentido Michelle Aiello: “Ulteriore ed indiretta conseguenza della ravvisatainadeguatezza degli strumenti della cognizione ordinaria è stata però anche quella di snaturarela finalità e l’efficacia dei medesimi provvedimenti di urgenza” (Michelle Aiello, I provvedimentidi urgenza nell’attuale momento legislativo italiano, Les mesures provisoires en procédure civile,Milano: Giuffrè, 1985, p. 265). Ver, ainda, Giovanni Arieta, Comunicazione, p. 269-270; VittorioDenti, La giustizia civile, Bologna: Il Mulino, 1989, p. 129-130.

24

 No direito argentino, a doutrina também elaborou importante trabalho para demonstrar adistinção entre a tutela antecipada e a tutela cautelar e para evidenciar a necessidade deprocedimentos e técnicas processuais capazes de viabilizá-la. Ver as obras coletivas Medidasautosatisfactivas (dirigida por Jorge W. Peyrano) e Sentencia anticipada (dirigida por Jorge W.Peyrano e organizada por Carlos A. Carbone). Ver, ainda, Augusto Morello, Anticipación de latutela, La Plata: Platense, 1996; Roberto Berizonce, S. Patricia Bermejo e Zulma Amendolara,Tribunales y proceso de familia, La Plata: Platense, 2001, p. 50-59; Jorge W. Peyrano,Reformulación de la teoría de las medidas cautelares: tutela de urgencia – medidasautosatisfactorias. Revista de Direito Processual Civil, v. 9; Jorge W. Peyrano, Régimen de lasmedidas autosatisfactivas, nuevas propuestas. Revista de Direito Processual Civil, v. 7; ÁlvaroPerez Ragone, Introducción al estudio de la tutela anticipatoria, Revista de Direito ProcessualCivil, v. 5; Álvaro Perez Ragone, Gênesis e Concepto estructural y funcional de la tutelaanticipatoria, Revista de Direito Processual Civil, v. 13; Carlos Alberto Carbone, Los procesosurgentes y la anticipación de la tutela, Revista de Direito Processual Civil, v. 21; Abraham LuizVargas, Teoría general de los procesos urgentes, Medidas autosatisfactivas; Abraham Luis Vargas,Tutela anticipada: Perfiles actuales, Cuestiones Procesales Modernas, 2005, p. 174; Jorge Rojas, Loslímites de la tutela anticipada, Sentencia anticipada, Buenos Aires: Rubinzal-Culzoni, 2001; Sergio J.Barberio, La medida autosatisfactiva, Santa Fé: Panamericana, 2006.

25

Como escreve Eduardo Ricci, “se definirmos ‘tutela de mérito’ a tutela completa do direitosubjetivo, que pode ser obtida seja através da sentença, seja mediante a sua execução, a antíteseentre a tutela instrumental (e portanto cautelar) e a tutela antecipatória corre o risco de ser

concretamente atenuada todas as vezes em que o conteúdo da tutela antecipatória for muitotímido e prudente. E, sob esse aspecto, a análise provavelmente merece ser fixada mais noproblema da concreta atuação e satisfação do direito do que naquele referente à sua declaração.Se em sede de atuação do direito decorrente do provimento antecipatório se devesse parar antes dasatisfação efetiva, seria quase inevitável que os escopos dos efeitos do provimento antecipadoparecessem, na verdade, meramente instrumentais em relação a uma futura satisfação; e aqui deveser lembrado o que foi observado em um precedente parágrafo, quando se disse que a penhora sempossibilidade de alienação corre o risco de ser equiparada a uma espécie de arresto” (EdoardoRicci, A tutela antecipatória brasileira vista por um italiano, Revista de Direito Processual Civil, v.6, p. 708).

26

Vittorio Denti, Intervento, La tutela d’urgenza, Rimini: Maggioli, 1985, p. 171.

27

Humberto Theodoro Júnior, Processo cautelar, São Paulo: LEUD, 1976, p. 108.

28

TJSC, 1.ª CC, Ap. 26.034, v. u.

29

Assim como nas hipóteses de abuso de defesa e parte incontroversa da demanda; art. 273, II e §6.º, CPC/73.

30

Piero Calamandrei, Introduzione allo studio dei provvedimenti cautelari, Padova: Cedam, 1936, p.31-51.

31

Piero Calamandrei, Introduzione allo studio dei provvedimenti cautelari, p. 38-39; 43-44.

32

Piero Calamandrei, Introduzione allo studio dei provvedimenti cautelari, p. 39.

33

Piero Calamandrei, Introduzione allo studio sistematico dei provvedimenti cautelari, Padova:

Cedam, 1936.

34

 Foi Chiovenda quem afirmou que a função da jurisdição era a de dar atuação à vontadeconcreta da lei (Giuseppe Chiovenda, Istituzioni di diritto processuale civile, v. 1, Napoli: Jovene,1960).

35

 Abordando a obra de Chiovenda, Giannini escreveu: “Affrontava decisamente una ricostruzionedel diritto processuale, con carattere pubblicistico, sulla base dell’autonomia dell’azione e delrapporto giuridico processuale, elevando la scienza processuale, con un balzo di dignità, su quellogià compiuto dal Mortara, ad una ricostruzione sistematica storico-dogmatica (...)” (AmedeoGiannini, Gli studi di diritto processuale civile in Italia, Rivista Trimestrale diDirittoe ProceduraCivile, 1949, p. 109).

36

“La c. d. ‘pubblicizzazione’ del processo civile inverte i presupposti di fondo che erano alla basedel codice del 1865 e della dottrina ottocentesca: il processo non è più esclusivamente un ‘affaredelle parti’ ma un luogo in cui si esprime l’autorità dello Stato; esso non mira solo alla tutela diinteressi privati, ma realizza l’interesse pubblico all’amministrazione della giustizia; il perno delprocesso non è più l’iniziativa delle parti, ma la funzione del giudice. In sintesi, il processo non èpiù visto come una forma in cui si esplica l’autonomia privata nell’esercizio dei diritti, ma comeuno strumento che lo Stato mette a disposizione dei privati in vista dell’attuazione della legge.Con tutto ciò si salda perfettamente la ridefinizione del concetto di azione, compiutaessenzialmente da Chiovenda: l’azione non è più una sorta di appendice del diritto sostanzialeprivato, ma un diritto autonomo di natura pubblica, che mira a produrre conseguenze giuridichenella sfera della controparte (donde la nota definizione dell’azione come diritto potestativo), mache soprattutto chiama in gioco l’autorità dello Stato come tramite e garante dell’attuazione dellalegge” (Michele Taruffo, La giustizia civile in Italia dal’700 a oggi, Bologna: Il Mulino, 1980, p. 188).

37

Ovídio Baptista da Silva, A ação cautelar inominada no direito brasileiro, São Paulo: Forense, 1979;Ovídio Baptista da Silva, Do processo cautelar, Porto Alegre: Lejur, 1985; Ovídio Baptista da Silva,Comentários ao Código de Processo Civil, v. 11, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. Sobre atutela cautelar, ver ainda no direito brasileiro: Galeno Lacerda,ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. 8, t. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1980; Galeno Lacerda eCarlos Alberto Alvaro de Oliveira, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 8, t. 2, Rio deJaneiro: Forense, 1980; Alcides Alberto Munhoz da Cunha, Comentários ao Código de ProcessoCivil, v. 11, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001; José Joaquim Calmon de Passos, Comentáriosao Código de Processo Civil, v. 10, t. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1977; Egas Moniz de Aragão,

Medidas cautelares inominadas, RevistaBrasileiradeDireitoProcessual, v. 57, p. 33 e ss; HumbertoTheodoro Júnior, Processocautelar, São Paulo: LEUD, 1976.

38

Não há dúvida de que a jurisdição, atualmente, tem a função de tutelar (ou proteger) os direitos,especialmente os direitos fundamentais. Isto não quer dizer, como é óbvio, que a jurisdição nãose preocupe em garantir a idoneidade da defesa ou a adequada participação do réu. O que sedeseja evidenciar é que a função jurisdicional é uma consequência natural do dever estatal deproteger os direitos, o qual constitui a essência do Estado contemporâneo. Sem ela seria impossívelao Estado não apenas dar tutela aos direitos fundamentais e permitir a participação do povo nareivindicação dos direitos transindividuais e na correção dos desvios na gestão da coisa pública,mas sobretudo garantir a razão de ser do ordenamento jurídico, dos direitos e das suas própriasformas de tutela ou proteção. Quando se diz que a jurisdição tem o fim de dar tutela aos direitosse está muito longe das antigas concepções privatistas, próprias do século XIX, especialmente doconceito de direito subjetivo, característico ao espírito dessa época e desenvolvidoparticularmente por Windscheid. Ao escrever A ação do direito romano do ponto de vista dodireito civil, inaugurando a célebre polêmica sobre a ação que travou com Muther, Windscheidapresentou as linhas de uma nova concepção de direito subjetivo, caracterizado pelo poder (dosujeito ativo) de exigir uma conduta e pelo dever (do sujeito passivo) de prestá-la. Esse conceitode direito subjetivo, como não poderia deixar de ser – diante da evidente relatividade históricadas doutrinas jurídicas –, recebeu forte influência do princípio da autonomia da vontade,sabidamente a base de todo o sistema individualista que marcou o século XIX. O dever deproteção ou de tutela dos direitos, que identifica o Estado constitucional, nada tem a ver com anoção clássica de direito subjetivo. O Estado possui o dever de tutelar determinados direitos,mediante normas e atividades fático-administrativas, em razão da sua relevância social e jurídica.Trata-se do dever de tutelar os direitos fundamentais. Mas não é só. O Estado também tem odever de tutelar jurisdicionalmente os direitos fundamentais, inclusive suprindo eventuaisomissões de tutela normativa, além de ter o dever de dar tutela jurisdicional a toda e qualquerespécie de direito – em razão do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva (art. 5.º, XXXV,da CF). Assim, por exemplo, o Estado tem o dever de tutelar, através de normas e atividadesfático-administrativas, o meio ambiente. Mas também tem o dever de dar-lhe tutela jurisdicional,conforme as necessidades derivadas da situação concreta. Isso porque determinada situaçãoconcreta pode demonstrar a necessidade de tutela jurisdicional inibitória, outra de tutelajurisdicional ressarcitória na forma específica e assim por diante. O Estado tem o dever de prestara tutela jurisdicional prometida pelos direitos – transindividuais ou individuais. Ver LuizGuilherme Marinoni e Alvaro Perez Ragone, Fundamentos del Proceso Civil, Santiago: AbeledoPerrot, 2011; Luiz Guilherme Marinoni, Introducción al Derecho Procesal Civil, Lima: Palestra,2015.

39

Ao se dizer que a jurisdição tem o dever de tutelar os direitos, deseja-se igualmente pôr às clarasque ela tem o dever de viabilizar as tutelas prometidas pelo direito material e pela Constituição.

Em termos concretos, o que se deseja evitar é que a inidoneidade técnica do processo ou a falta decompreensão constitucional do juiz impeçam a efetiva proteção das diferentes necessidades dodireito material – como, por exemplo, a tutela preventiva (a tutela inibitória) de um direito dapersonalidade. O direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva incide sobre o legislador e ojuiz, ou seja, sobre a estruturação legal do processo e sobre a conformação dessa estrutura pelajurisdição. Sobre o direito à construção da ação adequada à tutela do direito, ver Luiz GuilhermeMarinoni, Il diritto alla tutela giurisdizionale effettiva nella prospettiva della teoria dei dirittifondamentali, Studi di diritto processuale civile in onore di Giuseppe Tarzia, v. 1, Milano: Giuffrè,2005, p. 93-162.

40

Piero Calamandrei, Introduzione allo studio sistematico dei provvedimenti cautelari.

41

Piero Calamandrei, Istituzioni di diritto processuale civile.

42

Sobre o processo civil no Estado constitucional, ver Daniel Mitidiero, Processo civil e EstadoConstitucional, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007; Hermes Zaneti Júnior, Processoconstitucional (o modelo constitucional do processo civil brasileiro), Rio de Janeiro: Lumen Juris,2007.

43

Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil, v. 3, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 73.

44

Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil, v. 3, p. 74.

45

A antiga ação condenatória, única alternativa para quem desejava soma em dinheiro até meadosde 2006, apesar de responder ao conceito tradicional de ação, pois garantia uma sentença demérito, não viabilizava, por si só, a tutela do direito material. Isto é suficiente para fazer ver adiferença abismal entre direito a uma sentença de mérito e direito à possibilidade de obtenção datutela do direito material, o qual depende de um processo tecnicamente adequado e justo, capazde espelhar o direito à pré-ordenação das técnicas processuais adequadas e o direito àparticipação no procedimento, mediante a oportunidade de alegações e produção de provas, istoé, de convencimento do juiz. Aliás, quando se pensa no conceito contemporâneo de direito deação, a falta de sintonia entre condenação e ação obriga a afastar, de vez por todas, as

nomenclaturas que ligavam o direito de ação às técnicas processuais, como as espécies deprocedimentos – por exemplo, ação ordinária – e de sentenças – por exemplo, ação condenatória -,fazendo com que a ação passe a se relacionar com a sua única razão de ser, isto é, com a tutela dodireito material. Ou seja, a ação, quando voltada à obtenção da tutela ressarcitória peloequivalente, é ressarcitória e não condenatória. Ninguém que deseja ressarcimento peloequivalente em dinheiro ou pagamento de obrigação pecuniária deseja somente condenação, atéporque essa é apenas uma das técnicas processuais instituídas para que seja possível a obtenção datutela do direito. Ao lado da condenação, estão predispostas, igualmente como técnicasprocessuais a liquidação – através de suas diferentes espécies – e as várias modalidadesexecutivas. O que a ação realmente almeja, portanto, é a tutela do direito e, assim, na hipótesereferida, a tutela ressarcitória pelo equivalente ou a tutela do adimplemento da obrigação depagar quantia.

46

Sobre a importância da estruturação adequada da técnica processual para a efetividade da tutelado crédito pecuniário, ver Benedito Pereira Filho, Repensando o processo de execução para umamaior efetividade da tutela do crédito pecuniário, Tese de doutorado, Universidade Federal doParaná, Faculdade de Direito, 2002.

47

Ovídio Baptista da Silva, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 11, p. 66.

48

Salvatore Satta, Proveddimenti d’urgenza e urgenza di provvedimenti, Soliloqui e colloqui di ungiurista, Padova: CEDAM, 1968, p. 392 e ss.; Giovanni Verde, Considerazioni sul provvedimentod’urgenza, I processi speciali – Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, Napoli: Jovene, 1979.

49

Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 8, Rio de Janeiro: Forense, 1977.

50

Ovídio Baptista da Silva, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 11, p. 67.

51

“Por el contrario, la imposibilidad de recurrir directamente a la via ejecutiva y la necesidadconsiguiente de obtener un título ejecutivo judicial mediante un proceso de cognición se explicanfácilmente por la existencia de una situación jurídica sustancial caracterizada por el elemento dela incertidumbre. En este segundo supuesto, dada la necesidad previa de eliminar la

incertidumbre sobre la situación jurídica sustancial, la acción no puede ser ejercitada más que envía declarativa, a fin de que el antecedente lógico-jurídico de la ejecución, que es la aptitud de laacción para ser ejercitada in executivis, encuentre su base en el acertamiento y su realización enla creación del título que condiciona la iniciación de la vía ejecutiva” (Carlo Furno, Teoría de laprueba legal, Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1954, p. 190).

52

Piero Calamandrei, La sentencia declarativa de quiebra, Apêndice n. 2 à Introducción al estudiosistemático de las providencias cautelares, p. 204-205.

53

“E poichè alla clausola di provvisoria esecutorietà è stata da tempo, autorevolmente, riconosciutafunzione cautelare, analoga funzione deve pure riconoscersi alla sospensione dell’esecuzione”(Carlo Furno, La sospensione del processo esecutivo, Milano: Giuffrè, 1956, p. 55).

54

“Así, tal y como ya se deduce de lo expuesto, mientras que la naturaleza y función de la ejecuciónprovisional es la propia de la ejecución ordinaria, es decir, esencialmente satisfactiva para elejecutante dentro de los límites de la ejecución misma, la naturaleza de la medida cautelar essimplemente de tutela, de aseguramiento o garantía, no pudiendo llegarse en la adopción de lamisma hasta penetrar en la propia esfera jurídica del perjudicado por la medida, a través deinstitutos tales como el embargo y la enajenación forzosa” (Adolfo Perez Gordo, La ejecuciónprovisional en el proceso civil, Barcelona: Bosch, 1973, p. 42).

55

Cf. Ovídio Baptista da Silva, Teoría de la acción cautelar, Porto Alegre: Fabris, 1993, p. 79.

56

Na teoria de Calamandrei, nas providências cautelares “se encontra uma instrumentalidadequalificada, ou seja elevada, por assim dizer, ao quadrado; são, com efeito, indubitavelmente, ummeio predisposto para o melhor êxito da providência definitiva, que, por sua vez, é um meio paraa atuação do direito; isto é, são, em relação à finalidade última da função jurisdicional,instrumento do instrumento” (Piero Calamandrei, Introduzione allo studio sistematico deiprovvedimenti cautelari, p. 21-22).

57

De qualquer modo, conforme escreveu Edoardo Ricci – que muito contribuiu para odesenvolvimento do tema da tutela sumária na Itália –, “só pode ser instrumental em relação à

tutela de mérito uma tutela que não coincida com esta”. (Edoardo Ricci, A tutela antecipatóriabrasileira vista por um italiano, Revista de Direito Processual Civil, v. 6, p. 708).

58

Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1987, p. 45 ess.

59

Ovídio Baptista da Silva, A ação cautelar inominada no direito brasileiro, p. 67.

60

Ver Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o ilícito, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. e LuizGuilherme Marinoni, Tutela Inhibitoria, Madrid: Marcial Pons, 2014.

61

Adolfo di Majo, Latutelaciviledeidiritti, Milano: Giuffrè, 1993, p. 144.

62

Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual e tutela dos direitos, p. 51 e ss.

63

Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, Napoli: Jovene, 1994, p. 185.

64

 A hipótese é semelhante à do art. 644, primeira parte, do CPC italiano, a qual, segundo ProtoPisani, “in ipotesi di sfratto per morosità, consente al giudice adito di pronunciare ‘decretod’ingiunzione per l’ammontare dei canoni scaduti e da scadere fino all’esecuzione dello sfratto’:anche in questo caso la condanna è richiesta per crediti futuri (...)” (Andrea Proto Pisani, Lezionidi diritto processuale civile, p. 184). No direito italiano – entre outros casos de condenação para ofuturo –, o art. 657 do CPC permite que o locador obtenha, antes do término do contrato, um títuloexecutivo que lhe permita executar imediatamente o despejo logo depois do término do prazocontratual. Ver Renata Paolini, Note sulla condanna in futuro,RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, 1976, p. 511 e ss.

65

Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, p. 62.

66

Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p. 185.

67

Giuseppe Chiovenda, Instituiçõesdedireitoprocessualcivil, v. 1, São Paulo: Saraiva, 1965, p.191.

68

Cristina Rapisarda, Profili della tutela civile inibitoria, Padova: CEDAM, 1987, p. 189.

69

Giuseppe Chiovenda, L’azione nel sistema dei diritti, Saggididirittoprocessualecivile, Roma: ForoItaliano, 1930, p. 79.

70

Piero Calamandrei, Introduzione allo studio sistematico dei provvedimenti cautelari, p. 33-34.

71

Massimo D’Antona, Lareintegrazionenelpostodilavoro (art. 18delloStatutodeiLavoratori), Padova:CEDAM, 1979; Renata Paolini, Note sulla condanna in futuro,RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, 1976, p. 526.

72

Proto Pisani percebeu a nítida diferença entre a condenação para o futuro e a tutela inibitória,demonstrando a função repressiva da primeira: “O problema da admissibilidade da condenaçãopara o futuro é um problema diferente daquele da admissibilidade, ou não, da tutela inibitóriageral: contrariamente à inibitória, a condenação para o futuro possui uma função que pode serqualificada como preventiva somente se a este termo for dado um significado muito amplo; o quede fato a condenação para o futuro objetiva prevenir não é tanto a violação quanto a diferençatemporal entre o momento da violação e possibilidade de instaurar a execução forçada; assimparece mais correto inserir tal tipo de condenação entre as hipóteses em que a condenação cumpreuma função repressiva” (Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p. 184).

73

Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o ilícito, p. 137-138.

74

Basta pensar “nos direitos que não podem ser tutelados de forma adequada através doressarcimento em pecúnia (p. ex., concorrência desleal) e, principalmente, nos direitos nãopatrimoniais. Não viabilizar a tutela de inibição do ilícito quando em jogo direitos nãopatrimoniais é admitir a sua expropriação, transformando-se o direito ao bem em direito aoressarcimento ou, em outras palavras, em simples pecúnia. Tal possibilidade, como é óbvio, estámuito distante das Constituições fundadas na dignidade do homem e preocupadas em propiciar asua inserção em uma sociedade mais justa. A Constituição Federal afirma expressamente que: i)são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado odireito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (art. 5.º, X); ii) éinviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e dascomunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma quea lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (art. 5.º, XII); iii)aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras,transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar (art. 5.º, XXVII); iv) a lei assegurará aosautores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção àscriações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signosdistintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País(art. 5.º, XXIX); v) o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor (art. 5.º, XXXII);vi) todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povoe essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever dedefendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (art. 225, caput). Supõe-se, como éóbvio, que tais direitos devam ser efetivamente tutelados, até mesmo porque a falta deefetividade da tutela jurisdicional implica a existência de um ordenamento impotente à tutelados direitos” (Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o ilícito, p. 97-98).

75

“Com’è noto, a partire dalla metà degli anni 60 un consistente orientamento dottrinale ha postoin luce l’importanza della distinzione tra illecito (come condotta antigiuridica) e danno, comefatto storico, materiale, che può essere (eventuale) conseguenza dell’illecito, o può derivare dafatti non suscettibili di tale qualificazione” (Michele Mòcciola, Problemi del risarcimento deldanno in forma specifica nella giurisprudenza, RivistaCriticadelDirittoPrivato, p. 367). “Ilriferimento all’art. 2.043 codice civile ha un significato innovatore, se si traggono tutte leconseguenze dalla revisione che la dottrina più recente ha operato dell’intera materia dell’illecitocivile. Uno dei più proficui risultati di tale revisione appare, infatti, la netta distinzione tra attoillecito e fatto dannoso da cui deriva la responsabilità civile” (Cesare Salvi, Legittimità e“razionalità” dell’art. 844 Codice Civile, Giurisprudenza Italiana I, 1, 1975, p. 590).

76

“Note-se, porém, que se o dano é uma consequência meramente eventual e não necessária doilícito, a tutela inibitória não deve ser compreendida como uma tutela contra a probabilidade dodano, mas sim como uma tutela contra o perigo da prática, da repetição ou da continuação do

ilícito, compreendido como ato contrário ao direito que prescinde da configuração do dano” (LuizGuilherme Marinoni, Tutela contra o ilícito, p. 65).

77

Para evidenciar que o dano não é elemento constitutivo do ilícito, argumentou-se que, quando sediz que não há ilícito sem dano, identifica-se o ato contraius com aquela que é a sua normalconsequência, e isto ocorreria apenas porque o dano é o sintoma sensível da violação da norma.A confusão entre ilícito e dano seria o reflexo do fato de que o dano é a prova da violação e,ainda, do aspecto de que entre o ato ilícito e o dano subsiste frequentemente umacontextualidade cronológica que torna difícil a distinção dos fenômenos, ainda que no planológico. Ver Eduardo Bonasi Benucci, Atto illecito e concorrenza sleale,RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, p. 569.

78

Michele Mòcciola, Problemi del risarcimento del danno in forma specifica nella giurisprudenza,RivistaCriticadelDirittoPrivato, p. 380-381. Ver Michele Giorgianni, Tutela del creditore e tutela“reale”, RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, 1975, p. 853 e ss; Renato Scognamiglio, Ilrisarcimento del danno in forma specifica, RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, 1957, p.201 e ss.

79

O art. 84 do CDC tem grande semelhança com o art. 536, do CPC, dispondo no seu caput que, “naação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá atutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado práticoequivalente ao do adimplemento”. Esse artigo está inserido no sistema de tutela coletiva dosdireitos, integrado, fundamentalmente, pela Lei da Ação Civil Pública e pela parte final do Códigode Defesa do Consumidor. De modo que o art. 84 do CDC constitui a base de qualquer açãovoltada à tutela específica dos direitos difusos e coletivos.

80

Note-se que o arresto, por exemplo, difere nitidamente da tutela inibitória, já que não exercefunção inibitória, mas destina-se a assegurar a efetividade da tutela ressarcitória. Ou seja, háuma nítida diferença entre a tutela inibitória e a tutela que visa a dar segurança a um direito quejá foi violado. Na verdade, e para irmos um pouco mais além, parece mais exato afirmar que atutela cautelar, além de ter por fim assegurar a efetiva tutela de um direito já violado, pode terpor escopo assegurar um direito para a hipótese de ele ser violado. Basta pensar nos casos emque a caução cautelar pode ser utilizada para assegurar ao autor a efetividade da eventual (e aínão necessária) tutela ressarcitória, que poderá ser requerida se o direito (que apenas se temever violado) for realmente lesado. Da mesma forma que a condenação para o futuro – que, porpressupor a violação do direito, não tem natureza preventiva (apesar da expressa discordância

de Calamandrei, que afirma que a condenação para o futuro constitui o casomásnotorio de tutelapreventiva) –, a caução que visa a assegurar uma eventual e futura tutela ressarcitória tambémnão pode deixar de ser diferenciada da tutela inibitória. Tanto a tutela que visa a assegurar aefetividade da tutela de um direito que já foi violado, quanto a tutela que objetiva assegurar umdireito para a hipótese de ele ser violado, têm natureza acautelatória, ou seja, de segurança quenão se dirige a impedir a violação do direito, mas sim a garantir o direito na suposição de que ele,após ter sido violado, poderá não ser efetivamente tutelado.

81

Adolfo Di Majo, um importante civilista italiano, deixa bem clara a idéia de que a tutela cautelarnão foi pensada para exercer a função hoje reservada para a inibitória. Segundo Di Majo, para aobtenção de tutela cautelar nem mesmo seria suficiente afirmar a ocorrência de uma violação dedireito, sendo necessário demonstrar que esta violação, com o transcurso do tempo, causaria umdano iminente. Disse ele: “... a tutela ex art. 700, CPC, que por outro lado se insere em umdiscurso mais vasto em relação às medidas que têm caráter cautelar, pressupõe que uma violação(a direitos de propriedade, a direitos da pessoa, ou também a direitos relativos) já tenha ocorrido,e não ainda que seja simplesmente objeto de ameaça ou que em relação a ela existam indícios”(Adolfo di Majo, La tutela civile dei diritti, Milano: Giuffrè, 1993, p. 144).

82

Lodovico Barassi afirmou que a “tutela puramente preventiva”, “certamente la più energica”,seria também “la più preoccupante, come è di tutte le prevenzioni che possono eccessivamentelimitare l’umana autonomia” (Lodovico Barassi, Lateoriageneraledelleobbligazioni, Milano:Giuffrè, 1964, p. 428). A ideia de que a tutela inibitória encontra obstáculo na liberdade dohomem guarda raízes em princípios próprios do direito liberal clássico, os quais não podemservir para inspirar uma doutrina que vive em um outro Estado, sob diversos valores e em umadiferente época. A tutela preventiva, como já foi dito, é fundamental para a efetividade dedireitos muito importantes dentro do contexto do Estado atual.

83

Ovídio Baptista da Silva, Processo e ideologia, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 123.

84

A tutela que necessita ‘de fazer, não fazer, entrega de coisa ou pagamento de quantia’, é umatutela que não é prestada por uma sentença que basta por si só, como a sentença declaratória –que não pode e não precisa ser executada –, uma vez que exige meios de execução. Tal tutela éprestada pela sentença e pelos meios executivos, ou melhor, por uma sentença cuja natureza édelineada com base nos meios de execução que a complementam (...). Portanto, a execução, noEstado constitucional, não pode ser reduzida a um ato de transferência de riquezas de umpatrimônio a outro, devendo ser vista como a forma ou o ato que, praticado sob a luz da

jurisdição, é imprescindível para a realização concreta da tutela jurisdicional do direito, e assimpara a própria tutela prometida pela Constituição e pelo direito material.

85

 Lembre-se de que no direito italiano a tutela inibitória passou a ser prestada sob o mantoprotetor da tutela cautelar em razão das novas exigências de tutela; não em virtude de especialdisposição legislativa ou de interpretação doutrinária que tivesse enxergado no art. 700 do CPCitaliano a base de um princípio geral de prevenção. Se o art. 700 do CPC italiano passou a servirde base, em razão das necessidades concretas de tutela, à tutela inibitória, isto não quer dizer quea tutela cautelar, na sua gênese, constituía um gênero a que pertencia a tutela inibitória. Aocontrário, a tutela cautelar inominada jamais abrangeu a tutela inibitória, até porque seriacontraditório pensar que uma tutela que foi desenhada para ser “instrumento do instrumento”poderia viabilizar a tutela preventiva em um sistema de tutelas finais que foi construído sobre aideia de que o direito material só pode ser prevenido em hipóteses excepcionais. Na verdade, écompletamente ilógico imaginar que, em um sistema que trabalha apenas com as sentençasdeclaratória, constitutiva e condenatória (as quais não viabilizam a concessão de tutelainibitória), a tutela cautelar – criada para dar efetividade à jurisdição – poderia ir além da suafunção de segurança do processo, extrapolando dos seus limites para dar tutela ao próprio direitomaterial, e assim tornar sem sentido a própria “ação principal”. É certo, portanto, que a tutelacautelar, quando originariamente pensada, não podia se confundir com a tutela inibitória. Seessa confusão foi instalada na prática forense em virtude da própria necessidade de tutelaadequada dos direitos, é tarefa da doutrina eliminá-la, esclarecendo que a tutela inibitória não seidentifica com a tutela cautelar, constituindo a primeira uma forma de tutela que ainda éconfundida com a cautelar, em razão de a doutrina não ter separado conceitualmente as noçõesde prevenção e cautela. No Brasil, aliás, diante dos arts. 536 do CPC e 84 do CDC, e assim daevidência da ação inibitória – que é de conhecimento e, portanto, autônoma – constituiverdadeira heresia continuar confundido tutela cautelar com tutela inibitória. A tutela inibitória,no Brasil, ao contrário do que acontece na Itália, não precisa ser requerida com base em umanorma construída para servir de base à tutela cautelar. No Brasil, assim, justamente porque ainibitória tem endereço nos arts. 536 do CPC e 84 do CDC, jamais surgirá o problema que aparecena prática italiana quando é requerida tutela inibitória sob o rótulo de cautelar, e indaga-se, comsurpresa, a respeito da sua instrumentalidade. A distinção entre prevenção e cautela, se realizadano direito italiano, poderia inviabilizar a tutela inibitória sumária atípica na própria açãodeclaratória; certamente por isso, ou seja, para não se construir uma teoria contra as própriasnecessidades da vida, é que a doutrina italiana se mantém calada sobre o assunto. No direitobrasileiro, porém, onde estão presentes os instrumentos processuais dos arts. 536 do CPC e 84 doCDC, deve ser prontamente revelado o equívoco da confusão entre a tutela cautelar e a tutelainibitória, pois somente assim o uso do processo civil será mais adequado e efetivo. Com efeito, aconfusão entre tutela inibitória sumária e tutela cautelar também decorre da exigência prática detutela inibitória em um sistema de tutelas fundado sobre o binômio sentença condenatória-execução forçada. Teoricamente, em um sistema como este, não há lugar para a tutela inibitóriaatípica sumária, mas apenas para aquela que deseja garantir a tutela final do direito violado.Portanto, a necessidade de separar conceitualmente as tutelas inibitória e cautelar deriva, de umlado, da evidência da imprescindibilidade da tutela inibitória na sociedade contemporânea, e, de

outro, do surgimento de novas sentenças e meios de execução, os quais se colocam ao lado dassentenças declaratória, constitutiva e condenatória (as únicas que eram admitidas pela doutrina),viabilizando, assim, a concessão de tutelas que antes não podiam ser prestadas, e desta formauma maior efetividade ao processo. Ora, se o Código de Processo Civil consagra expressamente assentenças mandamental e executiva e a antecipação da tutela, há bastante luz para afirmar, semmedo de errar, que a tutela inibitória deve ser prestada através de ação inibitória, e assim nãopode mais ser confundida com a cautelar. Lembre-se, finalmente, de que as tutelas, sejam elasfinais ou antecipadas, devem ser classificadas a partir de sua relação com o plano do direitosubstancial. Ora, se o nexo de separação-abstração do direito processual do direito material,transmitido pelo pensamento chiovendiano, pode hoje ser considerado historicamente superado,constituindo preocupações da doutrina mais moderna a relativização do binômio direito-processo e a construção de tutelas jurisdicionais aderentes às diversas necessidades do direitomaterial, é evidente que as tutelas não mais devem ser classificadas com base em critériosprocessuais, como é o da provisoriedade, devendo, sim, merecer atenção o que as tutelassignificam no plano do direito material e na vida das pessoas. Ver Luiz Guilherme Marinoni,Tutela contra o ilícito, esp. capítulos II e III.

86

Fritz Baur, Studien zum einstweiligen Rechtsschutz, p. 52 e ss. Em sentido contrário, porém, nadoutrina alemã: Othmar Jauernig, Der zulässige Inhalt einstweiliger Verfügungen, ZZP, 1966, p.333 e ss.

87

Nesse sentido é significativa a afirmação de Vittorio Denti: “La stella del giudicato sembra cosìdestinata ad impallidire nel sistema complessivo della tutela” (“Intervento”, La tutela d’urgenza,Atti del XV Convegno Nazionale, Bari, 4-5 Ottobre 1985, p. 167).

88

Ver Ferruccio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza, p. 247 e ss.

89

“Se é, então, verdadeira aquela doutrina segundo a qual não pode ser antecipado o efeitodeclaratório da sentença de mérito, não obstante nos podem perguntar se não é suficiente, para ofim de satisfazer provisoriamente o interesse do requerente, a obtenção daquela certeza de graumais modesto que resulta na valoração em termos de probabilidade do fumus boni iurisafirmado pela parte. Sem dúvida, a concessão da tutela urgente é subordinada, aqui como nosoutros casos, à irreparabilidade do prejuízo e à idoneidade da medida para remediar o perigo dedano. Foi visto que a situação de incerteza pode ser indicadora de prejuízo irreparável, mas sepode duvidar se a valoração em termos de mera verossimilhança do direito do requerente sejapor si só idônea para remediar o prejuízo e para justificar um apreciável interesse do requerente

em obter em sede urgente a antecipação da mera declaração. Os exemplos retirados dajurisprudência mostram que tal interesse pode surgir em concreto quando a parte esteja emcondições de valer-se do dictum judicial para determinar o seu próprio comportamento em vistade particulares situações de direito substancial. Assim, a tutela urgente de mera declaração seapresenta no seu conteúdo mais restrito e, ao mesmo tempo, mais significativo lá onde orequerente pede ao juiz a valoração em sede de gonição sumária da legitimidade de um próprioato. Assim, a tutela de urgência pode conter a valoração antecipada da nulidade da cláusula deum contrato ou de um estatuto societário. Nestes casos, sempre que subsista em concreto umprejuízo irreparável para ser eliminado, o interesse da parte parece encontrar satisfação tambémem uma forma atenuada de certeza, fundada sobre um juízo de mera verossimilhança. A ação deconhecimento que a parte terá o ônus de propor servirá para transformar a probabilidade emcerteza e para produzir aquele efeito declaratório que apenas impropriamente, como foi visto,pode ser dito antecipado em sede de cognição sumária” (Ferruccio Tommaseo, I provvedimentid’urgenza, p. 257).

90

Ferruccio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza, p. 257.

91

As sentenças declaratória e constitutiva não podem ser enquadradas na classificação das tutelasdos direitos, uma vez que, assim como a sentença condenatória, constituem apenas técnicas paraa tutela do direito material. O problema é que, se as tutelas dos direitos podem ser facilmenteseparadas das sentenças condenatória, mandamental e executiva, o mesmo não acontece quandose está diante das tutelas declaratória e constitutiva e das sentenças declaratória e constitutiva.Isso porque, se obviamente não existe tutela condenatória, mandamental e executiva, há tuteladeclaratória e tutela constitutiva. Ou seja: as sentenças declaratória e constitutiva prestam tutelasdeclaratória e constitutiva. Se alguém pode ter, no plano do direito material, direito à tutela peloequivalente ao valor do dano ou da obrigação, e, no plano do direito processual, direito àsentença condenatória, isso não significa que não se possa ter direito a uma tutela do direito quepossa ser prestada mediante uma sentença satisfativa, cujo nome seja idêntico ao da tuteladevida na dimensão do direito material. O fato de não ser possível obrigar alguém a reconheceruma relação jurídica ou a desconstituir um contrato, ou mesmo a circunstância de não serpossível constituir determinadas situações jurídicas fora da jurisdição, certamente não interfereno problema, pois não descarta a possibilidade de alguém ter direito e pretensão às tutelasdeclaratória e constitutiva no plano do direito material e, assim, exigi-las mediante as sentençasdeclaratória e constitutiva. Ver Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio C. Arenhart e Daniel Mitidiero,Novo Curso de Processo Civil, v. 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, v. 1, Parte II, Capítulo 5,item 5.5.

92

Carlo Calvosa, I provvedimenti d’urgenza, Novissimo digesto italiano, v. XIV, p. 448 e ss.

93

Salvatore Satta, Commentario al Codice di Procedura Civile, v. 4, p. 270 e ss.

94

Ferruccio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza, p. 262.

95

Ferruccio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza, p. 264.

96

Art. 282. “Esecuzione provvisoria (1) La sentenza di primo grado e provvisoriamente esecutivatra le parti”.

97

Cf. Bruno Lasagno, Le riforme del processo civile (a cura di Sergio Chiarloni), p. 342.

98

Bruno Lasagno, Le riforme del processo civile (a cura di Sergio Chiarloni), p. 343.

99

Adverte Domenico Borghesi que a execução imediata da sentença de primeiro grau “rappresentaun caso in cui l’esecutività consegue a una cognizione non definitiva che si differenzia in modonetto da quelli precedentemente esaminati perché la cognizione, pur non essendo definitiva, nelsenso che la sentenza può essere riformata nei successivi gradi di giudizio, è tuttavia piena edesauriente” (Domenico Borghesi, L’anticipazione dell’esecuzione forzata nella riforma delprocesso civile, Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1991, p. 197).

100

Enrico Tullio Liebman, Processo de execução, p. 58.

101

Alcides de Mendonça Lima, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 6, t. 2, p. 434.

102

“A execução por quantia certa não pode chegar até a arrematação, podendo, no máximo, ir até apenhora, como medida de cautela, a favor do credor” (Alcides de Mendonça Lima, Comentáriosao Código de Processo Civil, v. 6, t. 2, p. 444).

103

Com base no § 940 da ZPO alemã, Othmar Jauernig, Der zulãssige Inhalt EinstweiligerVerfügungen, ZZP, 1966, p. 303 e ss.

104

Na Itália, há julgado que admitiu – com base no art. 700 do Código de Processo Civil – antecipaçãode pagamento de soma em favor de um hospital que necessitava imediatamente do dinheiro paranão interromper as suas atividades (Pret. Roma, 15.12.82, Temi Romana, 1982, p. 637). Tambémhá julgado que admitiu a antecipação para evitar a falência de uma empresa que necessitava desoma devida pelo Município de Roma e que trabalhava quase que exclusivamente para ele, o seudevedor “di gran lunga principale”. (Pret. Roma, 31.7.86, Giustizia Civile, 1986, I, p. 2.583). VerArnaldo Miglino, La tutela giurisdizionale anticipatoria, Roma, 1986, p. 198.

105

. Arnaldo Miglino, La tutela giurisdizionale anticipatoria, p. 196 e ss.

106

Antônio Cláudio da Costa Machado, Observações sobre a natureza cautelar da tutela antecipadado art. 273, I, do CPC, Reforma do Código de Processo Civil, São Paulo: Saraiva, 1996, p. 182.

107

Referindo-se à “ordinanza di ingiunzione” (art. 186-ter do CPC italiano), demonstra GabriellaRampazzi que o juiz deve “dichiarare l’ordinanza provvisoriamente esecutiva se il credito èfondato su cambiale, assegno bancario e circolare, certificato di liquidazione di borza o su attoricevuto da notaio od altro pubblico ufficiale autorizzato; ha, invece, un potere discrezionale diconcederla qualora vi sia pericolo di grave pregiudizio per il creditore nel ritardare l’inizio delleprocedure esecutive, nonché, per la sola ipotesi di debitore costituito, se le sue difese non sonofondate su prova scritta o di pronta soluzione” (Gabriella Rampazzi, Le riforme del processocivile (a cura di Sergio Chiarloni), Bologna: Zanichelli, 1992, p. 254).

108

Ver Achille Saletti, Le riforme del codice di rito in materia di esecuzione forzata e di attuazionedelle misure cautelari. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1992, p. 458 e ss.; Bruno

Capponi, Sull’esecuzione-attuazione dei provvedimenti d’urgenza per condanna al pagamento disomme. Rivista di Diritto Processuale, 1989, p. 88 e ss.; Giampiero Rossielo, Tema di esecuzione diprovvedimenti d’urgenza recanti l’ordine di corrispondere somme di denaro. Rivista di DirittoProcessuale, 1987, p. 1.046 e ss.; Pasquale Frisina, La tutela cautelare d’urgenza dei diritti aprestazione pecuniarie. Rivista di Diritto Processuale, 1986, p. 972 e ss.

109

Como escreve Ovídio Baptista da Silva, “se tivermos nossa visão voltada exclusivamente para oplano das normas jurídicas, sem qualquer preocupação com o que acontece no mundo darealidade, talvez possamos dizer que a satisfação obtida pelo credor que logre receber osalimentos sob forma de provisionais poderá ser uma satisfação diversa da que ele próprioobteria se o juiz do processo de conhecimento o declarasse, em sentença, verdadeiro credor dosalimentos definitivos. Se, no entanto, examinarmos a questão sobre outro ângulo paradeterminar se os provisionais apenas asseguram ou, ao contrário, satisfazem – ainda queprovisoriamente – a pretensão alimentar, veremos que o uso que o credor irá fazer da pensão,tanto provisional quanto definitiva, será rigorosamente o mesmo. A contraposição entrealimentos provisórios e alimentos definitivos dá-se exclusivamente no plano lógico das normasjurídicas. O que são provisórios ou definitivos não são os alimentos, mas os respectivosprovimentos judiciais” (Ovídio Baptista da Silva, Curso de processo civil, v. 3, p. 23).

110

Giovanni Verde, L’attuazione della tutela d’urgenza, p. 92.

111

“Les ordonnances sur référés ne ferant aucun préjudice au principal” (art. 809 do Código deProcesso Civil francês de 1806).

112

Ferruccio Tommaseo, “Intervento”, p. 305.

113

No direito francês, fala-se diante do référé em provisoriedade da coisa julgada. Ver Louis Boré,L’autorité provisoire de la chose jugée, in L’autorité de la chose jugée (direção de Loïc Cadiet eDominique Loriferne), Paris: IRJS, 2012, p. 61 e ss.

114

Cf. Ferruccio Tommaseo, “Intervento”, p. 304-306.

115

Philippe Jestaz, L’urgence et les principes classiques du droit civil, p. 56 e ss.

116

Como diz Giuseppe Tarzia, “‘il punto essenziale’ è che il rego lamento provvisorio non ostacola ilrego lamento definitivo” (Guiseppe Tarzia, “Considerazioni conclusive”, p. 315).

117

Cf. Ovídio Baptista da Silva, Comentários ao Código de Processo Civil, 2. ed., v. 11, São Paulo:Revista dos Tribunais, 2000, p. 122.

118

Cândido Dinamarco, A reforma do Código de Processo Civil, 2ª Ed., São Paulo: Malheiros, 1995, p.144.

119

Ver Ferruccio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza, p. 149.

120

“Todos sabem que a concessão liminar do interdito possessório (ou sua negação, tanto faz) podedestruir o outro litigante” (Egas Moniz de Aragão, Medidas cautelares inominadas, p. 51).

121

“Basti per ora rilevare che il legislatore preferisce sia evitato un pregiudizio irreparabile a undiritto Ia cui esistenza appaia probabile anche ai prezzo di provocare un danno irreversibile a undiritto che, in sede di concessione della misura cautelare, appaia invece improbabile: in altritermini, il diritto probabile prevale sul diritto improbabile” (Ferruccio Tommaseo, “Intervento”,p. 307).

122

De fato, a doutrina moderna aceitou a tese de que, em determinados casos, o juiz está autorizadoa assumir o risco de causar um prejuízo irreversível ao réu. Cf., por exemplo, Ovídio Baptista daSilva (Curso de processo civil, v. 3, p. 108 e ss), Alcides Munhoz da Cunha (A lide cautelar noprocesso civil, p. 144 e ss) e Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (Efetividade e processo cautelar,Ajuris 61/176-177). Esse último autor assim afirmou em importante Congresso: “A meu ver,dentro do contexto específico da realidade brasileira, impõe-se realçar com mais força o valor daefetividade. O provimento cautelar, inclusive liminar, deve ser emitido mesmo à custa de uma

satisfação provisória, se a situação perigosa só pode ser evitada ou minimizada com aantecipação dos efeitos da futura sentença de mérito. A tanto, aliás, autoriza o Código (de 73), aofacultar ao juiz ‘determinar as medidas adequadas’ para a prevenção do dano. Entre as duasconcepções opostas que se digladiam nessa matéria, uma exigindo a contraposição dos interessesem conflito, outra privilegiando quem se apresente como provável titular do direito, inclino-mepela segunda, quando, sublinho, outra solução não puder ser encontrada para evitar o prejuízo”.(Efetividade e processo cautelar, Ajuris 61/176-177). O Ministro Eduardo Ribeiro há muito tempoargumentou: “uma situação angustiosa em que o juiz pode encontrar-se é exatamente quandoisso se lhe depara: as duas soluções são irreversíveis”. (Proteção cautelar, tutela preventiva,contracautela, RTDP, v. 3, p. 123). É o que sucede em caso de apreensão de jornal. Negar a tutelaantecipada, nestes casos, é impedir a tutela jurisdicional efetiva para uma série de casosconflitivos concretos e esquecer que a própria doutrina brasileira sempre admitiu o risco deirreversibilidade dos efeitos fáticos da tutela urgente.

123

Ferruccio Tommaseo, “Intervento”, p. 307; Daniel Mitidiero, Antecipação da tutela, p. 82 e ss.

124

Giuseppe Tarzia, “Considerazioni conclusive”, p. 309 e ss.

125

“O temor que muitos manifestam, quando se sugere a ampliação dos poderes dos juizes paraconceder liminares, sob o argumento de possíveis injustiças que elas possam causar, não leva emconta a circunstância fundamental e que deveria estar sempre presente no raciocínio de quemlida com a ciência processual de não poder o julgador, jamais, conceder algum benefício a umadas partes senão à custa de seu adversário. Uma vez instaurado o litígio judicial, tanto o agir domagistrado, concedendo algum benefício a quem o postula, quanto sua omissão, ao recusá-lo, serãofeitos a dano ou a vantagem da outra parte. A recusa de uma liminar é concessão de umavantagem, às vezes decisiva, ao demandado. A neutralidade judicial é mais do que uma quimera; éuma impossibilidade lógica e prática. Os que, na esteira de Chiovenda, afirmam que o processo éum instrumento perigoso, a exigir que o juiz somente proveja com absoluta segurança, só veemperigo na mudança da situação de fato, não em sua conservação. A ideologia que inspira essasdoutrinas é bem visível no repúdio às liminares” (Ovídio Baptista da Silva, Curso de ProcessoCivil, v. 3, p. 108).

126

Como diz Giovanni Verde, segundo o pensamento iluminista as funções do Estado eram três epodiam ser distinguidas nitidamente entre si: a do Poder Legislativo, voltado à edição das leis, ado Poder Executivo, voltado à atuação concreta de todas as exigências de governo, e a do Poderjurisdicional, voltada à aplicação das leis. Havia uma tal segurança em poder traduzir em

concreto este quadro que, ao início do século XIX, pensou-se, em alguns países onde oensinamento de Montesquieu era mais vivo, até em se proibir ao juiz a interpretação da lei(Giovanni Verde. Profili del processo civile (Parte generale), Napoli: Jovene, 1988, p. 39).

127

John Henry Merryman, La tradición jurídica romano-canónica, Mexico: Fondo de CulturaEconómica, 1986, p. 66 e ss.

128

Giovanni Arieta, I provvedimenti d’urgenza, Padova: CEDAM, 1982, p. 133.

129

Aldo Frignani, L’injunction nella common law e l’inibitoria nel diritto italiano, Milano: Giuffrè,1974, p. 323 e ss.

130

Ver Cristina Rapisarda, Tutela preventiva, inibitoria cautelare ‘ex’ art. 700 C.P.C. ed inibitoriafinale, Rivista di Diritto Processuale, 1986, p. 138 e ss.

131

Lembre-se que, como nada impede uma ação ressarcitória na forma específica, a tutelaantecipada também pode ser ressarcitória na forma específica, instrumentalizando-se através deuma ordem de fazer (art. 536, CPC). A tutela resarcitória na forma específica antecipada pode sernecessária para que o dano não se potencialize ou cause um outro dano. Ver Luiz GuilhermeMarinoni, Tutela contra o ilícito.

132

Andrea Proto Pisani, Appunti sulla giustizia civile, Bari: Cacucci, 1982, p. 382.

133

Ver Arnaldo Miglino, La tutela giurisdizionale anticipatoria, p. 171.

134

Luiz Guilherme Marinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatória, São Paulo: Revista dos Tribunais,1992.

135

Cf. Andrea Proto Pisani, “Intervento” – Atti del XV Convegno Nazionale, La tutela d’urgenza, p.118. No mesmo sentido, Vittorio Denti, “Intervento” – Atti del XV Convegno Nazionale, La tutelad’urgenza, p. 164.

136

Cf. Nicolò Trocker, Processo civile e costituzione, Milano: Giuffrè, 1974, p. 406.

137

Nicolò Trocker, Processo civile e costituzione, p. 408.

138

Ver Luigi Paolo Comoglio, La garanzia costituzionale delll’azione ed il processo civile, Padova:CEDAM, 1970.

139

Assim escrevi à época do código de 1973: “Entretanto, é irracional admitir que a tutela do direitonão pode ser prestada após a fase instrutória ter encerrado. Realmente, há um grande equívocono sistema processual que não admite a execução da sentença na pendência do recurso deapelação ao menos nos casos em que estão presentes os fundamentos que justificam a tutelaantecipada. A lei que alterou o art. 520 do Código de Processo Civil perdeu uma grandeoportunidade para corrigir tal defeito. Como é óbvio, não basta afirmar que o recurso deapelação não será recebido no efeito suspensivo quando a sentença confirmar a antecipação datutela, como diz o inciso VII do art. 520. É evidente que o recurso de apelação, neste caso, nãodeve suspender a eficácia ou a “execução” da tutela antecipada. Note-se que o inciso VII,acrescentado ao art. 520, fala em sentença que “confirmar a antecipação dos efeitos da tutela” e,portanto, pressupõe uma tutela antecipadamente concedida. Há casos, porém, em que emborarequerida a antecipação da tutela, essa é negada com base no fundamento de que o direito nãofoi demonstrado como provável. Contudo, se mais tarde o direito restar evidenciado e aindapersistir o perigo, não há razão lógica para não se deferir a tutela, embora o inciso VII do art. 520aluda somente à sentença que confirmar a antecipação da tutela. Portanto, o correto seriaestabelecer, no art. 520, que a sentença pode produzir efeitos na pendência da apelação tambémquando conceder a tutela. Era neste sentido a nossa proposta de alteração do art. 520”.

140

Sobre a possibilidade de concessão da tutela da evidência na sentença, ver adiante, Parte III.

141

Ver Delosmar Mendonça Júnior, Princípios da ampla defesa e da efetividade no processo civilbrasileiro, São Paulo: Malheiros, 2001.

142

Ver Ferrucio Tommaseo, Appunti di dirito processuale, Torino: Giappichelli, 1995, p. 19.

143

“Il discorso sulla tutela dei diritti implica dunque necessariamente la riflessione sui mezzi ditutela che l’ordinamento prevede nell’ipotesi di vioIazione del diritto. l’argomento della tutelaavrebbe mero vaIore declamatorio ove esso non si confrontasse con le previsioni di dirittopositivo sui mezzi attraverso i quali i diritti sono tutelati” (Adolfo di Majo, La tutela civile deidiritti, p. 4).

144

Luiz Guilherme Marinoni, Il diritto di azione come diritto fondamentale, Torino: Giappichelli,2016; Luiz Guilherme Marinoni, Il diritto alla tutela giurisdizionale effettiva nella prospettivadella teoria dei diritti fondamentali, p. 93-162; Luiz Guilherme Marinoni, El derecho de accióncomo derecho fundamental, Bogotá: Temis, 2015.

145

Como é evidente, o mandado de segurança jamais poderá ser admitido com a supressão doinstrumento propício à tutela contra o periculum in mora, sob pena de deixar de ser um relevanteremédio constitucional posto a serviço do cidadão para tornar-se um procedimentocompletamente inadequado, por pressupor urgência e não dispor de instrumento destinado arealizar uma tutela imediata para as hipóteses em que a própria sentença de cognição exaurientenão se apresentar como eficaz. Se o direito que se visa a amparar através do mandamus requerprocedimento acelerado, a possibilidade de aferição da eventual periclitação deste direito emvirtude de periculum in mora não pode ser suprimida. De outro modo, o direito que deve serprotegido mediante a via célere, quando reconhecido, poderá jamais ter relevância no plano darealidade da vida, ocasião em que a sentença transitada em julgado e produtora de coisa julgadamaterial adquirirá o perfil de mero adorno, a compensar a insatisfação do homem com aineficiência da justiça e a alegrar aqueles que não desejam um processo efetivo porque têm medodas mudanças sociais que ele poderá realizar. Perceba-se, aliás, que a efetividade do processocaminha na razão proporcional inversa do uso arbitrário do poder.

146

Como já disse Donaldo Armelin, “sempre que existir a possibilidade de ocorrerem danos gravesou irreparáveis para o titular de um direito, ainda que meramente in status assertionis e não

houver possibilidade de se incoar o processo veiculador de pretensão à prestação de tutelajurisdicional do tipo satisfativo, ou ainda sempre que o desequilíbrio entre as partes seja gritante,a tutela do tipo cautelar terá seu cabimento e indeclinabilidade garantidos” (Donaldo Armelin, Atutela jurisdicional cautelar, p. 116).

147

Cf. Federico Carpi, La provvisoria esecutorietà della sentenza, p. 12.

148

Pode afirmar-se, até mesmo, que as regras ora referendadas pelo art. 1.059 do Código de ProcessoCivil ferem o princípio da separação dos poderes. É que este princípio tem base no princípio daseparação de poderes, reconhecido pela doutrina como garantia das garantias constitucionais(José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, São Paulo: Malheiros, 2002, p. 410).Realmente, a busca pela efetividade do processo é necessidade que advém do direitofundamental à tutela jurisdicional efetiva, indissociavelmente ligado ao due process of law eínsito no princípio da inafastabilidade, que é garantido pelo princípio da separação dos poderes econstitui princípio imanente ao próprio Estado de Direito, aparecendo como contrapartida àproibição da autotutela privada ou ao dever que o Estado se impôs quando chamou a si omonopólio da jurisdição.

149

Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Arenhart, Prova e Convicção, São Paulo, Ed. Revista dosTribunais, 2015.

150

Gerhard Walter, Libre apreciación de la prueba, Bogotá: Temis, 1985, p. 169.

151

Piero Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile, Rivista di Diritto Processuale,1955, p. 190.

152

Eis o que escrevi quando o código de 1973 aludia expressamente a “juízo de verossimilhança”(art. 273). “Quando o procedimento deve prosseguir para que outras provas sejam produzidas háa formação de uma espécie de juízo que deve ser qualificado de ‘juízo provisório’. A prova nãopode ser qualificada de ‘prova de certeza’ ou de ‘prova de verossimilhança’. É o juízo, formado apartir da prova, que, por ser formado no curso do procedimento tendente à cognição exauriente,pode ser designado de ‘juízo provisório’, embora seja chamado pelo código de ‘juízo de

verossimilhança’. Falar que a prova deve formar um ‘juízo de verossimilhança’ – como preceituao art. 273 do CPC/73 – constitui tautologia. Isso porque toda prova, esteja finalizado ou não oprocedimento, apenas pode permitir a formação de um ‘juízo de verossimilhança’ quando separte da concepção de que a verdade é algo absolutamente inatingível. Entretanto, se por ‘juízo deverossimilhança’ deseja-se significar juízo não formado com base na plenitude de provas eargumentos das partes, é correto falar de ‘juízo-provisório’ ou de convicção de verossimilhança,deixando-se claro que convicção de verossimilhança e convicção de verdade não dizem o mesmo doque as noções de verossimilhança e verdade”.

153

Per Olof Ekelof, Beweiswürdigung, Beweislast und Beweis des ersten Anscheins, ZZP, 75, 1962, p.289 e ss.

154

Gerhard Walter, Libre apreciación de la prueba, p. 160.

155

Com efeito, essa teoria fala em verossimilhança preponderante ou Överviktsprincip paraevidenciar que basta, para a procedência ou para a improcedência, um grau de probabilidademínimo (Salvatore Patti, Prove. Disposizioni generali, Bologna:Roma, Zanichelli-Il Foro Italiano,1987, p. 164).

156

Salvatore Patti, Prove. Disposizioni generali, p. 165.

157

Sobre o tema do controle da racionalidade da decisão, ver Michele Taruffo, “Il controllo dirazionalità della decisione fra logica, retorica e dialettica” (www.studiocelentano.it)

158

Michele Taruffo, La motivazione della sentenza civile, Revista de Direito Processual Civil (Genesis),v. 30, p. 392 e ss.

159

Ver Salvatore Patti, Prove. Dispozioni Generali, p. 223 e ss.

160

Ver Michele Taruffo, Funzione della prova: Ia funzione dimostrativa, Rivista di DiríttoProcessuale, 1997, p. 568 e ss.

161

Michele Taruffo, La prova dei fatti giuridici, Milano: Giuffrè, 1992, p. 295.

162

Michele Taruffo, La prova dei fatti giuridici, p. 295.

163

Sobre a distinção entre o raciocínio decisório e o raciocínio justificativo, ver Michele Taruffo,Cinco lecciones mexicanas, México: Escuela Judicial Electoral, 2003, p. 1 e ss.

164

Ver Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o Ilícito.

165

No que concerne à diferença entre probabilidade de ato contrário ao direito e probabilidade dedano, é conveniente esclarecer mediante um exemplo: em ação inibitória voltada a impedir arepetição do uso de marca comercial, é suficiente, para a concessão da tutela antecipada, aconvicção de verossimilhança de que o réu utilizou indevidamente a marca comercial detitularidade do autor. É claro que o juiz deve referir a prova que lhe convence do uso indevido damarca – ainda que na dimensão da probabilidade –, além de ter que explicar a razão ela qual lheparece provável que o réu volte a utilizá-la antes do encerramento do processo. Porém, o autorsequer precisa aludir ao fato de que o uso indevido da marca pode gerar dano; basta aprobabilidade da repetição desse uso. Ver Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o Ilícito.

166

De acordo e citando o livro “Técnica Processual e Tutela dos Direitos” (Marinoni), ver CécileChainais, La protection juridictionnelle provisoire dans le procès civil en droits français et italien,Paris: Dalloz, 2007, p. 774.

167

Piero Calamandrei, Introducción al estudio sistematico de las providencias cautelares, p. 78-80.

168

Ver Michele Taruffo, Funzione della prova: la funzione dimostrativa, Rivista Trimestrale di Dirittoe Procedura Civile, 1997, p. 561; Michele Taruffo, Senso comune, esperienza e scienza nelragionamento del giudice, Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 2001, p. 667 e ss.

169

Juan Igartua Salaverría, La motivación de las sentencias. Imperativo constitucional, Madrid:Centro de Estudios Políticos e Constitucionales, 2003, p. 167.

170

É possível perguntar o local em que a presunção se insere entre a valoração individual e avaloração do conjunto probatório. Como dito, a presunção é um juízo, não uma prova. Trata-se dejuízo que decorre de raciocínio (que chamamos de presuntivo) que parte da prova de um fatoindireto, isto é, de prova (indiciária) que se destina a demonstrar o fato indireto. Nesse caso,considerada a prova do fato indireto, o juiz raciocina, através de regras de experiência, paraconcluir se pode deduzir o fato direto do fato indireto (provado). Não há qualquer dúvida de quea valoração da prova indiciária é uma valoração individualizada. O problema é saber se avaloração individualizada abarca a prova indiciária e a presunção (o juízo), ou se a presunçãosomente é formada quando da valoração do conjunto probatório. A presunção se encontra, noiter do raciocínio judicial, entre a valoração da prova indiciária e a valoração do conjuntoprobatório. Dessa forma, é antecedente à valoração do conjunto das provas. Nesse sentido, aliás,é mais exato concluir que a valoração do conjunto probatório é, na realidade, a valoração dosargumentos de convicção, aí incluídas as provas e as presunções. Cf. Luiz Guilherme Marinoni eSérgio C. Arenhart, Prova e Convicção, p. 329-334.

171

Ver Ferruccio Tommaseo, “Intervento”, Les mesures provisoires en procédure civile, Milano:Giuffrè, 1985, p. 307.

172

Não que a caução não possa ser exigida quando o direito do autor for provável.

173

“È noto che il linguaggio delle norme e spesso di carattere valutativo (non solo quando esseenunciano principi generali o concetti indeterminati), e che di conseguenza scelte di carattereassiologico sono inevitabili e frequenti nel ragionamento che il giudice svolge intorno alle normeche applica. In cio non vi è nulla di strano o di patologico: occorre però che il giudice sia anzituttoconsapevole delle proprie valutazioni (e non le scambi quindi per giudizi di fatto o per dati apriori), e che – essendone consapevole ne fornisca giustificazioni adeguate, indicando il criterio

valutativo che ritiene di dover applicare (eventualmente spiegando le ragioni di questa scelta), especificando come tale criterio fonda e giustifica il giudizio di valore che egli ha formulato nelcaso concreto”. (Michele Taruffo, La motivazione della sentenza, Revista de Direito ProcessualCivil, v. 30, p. 687 e ss).

174

“Le teorie per cui i giudizi di valore sarebbero null’altro che reazioni soggettive non razionalizzabilihanno fatto il loro tempo, e soprattutto non sono applicabili alle valutazioni che il giudice formulain sede di decisione, poiché siffatta concezione delle scelte assiologiche non farebbe chelegittimare l’arbitrio individuale del giudicante sottraendo il fondamento della decisione aqualunque sindacato esterno (...) Di conseguenza, poiché i giudizi di valore sono spesso essenziali edeterminanti per l’interpretazione e l’applicazione di norme, va ribadita l’importanzafondamentale della giustificazione esplicita di tali giudizi nell’ambito della motivazione. Lo stessoprincipio vale – naturalmente – per le valutazioni che spesso hanno luogo nell’ambito deigiudizio sui fatti” (Michele Taruffo, La motivazione della sentenza, Revista de Direito ProcessualCivil, v. 30, p. 687 e ss).

175

Eis o que escreveu Alcides de Mendonça Lima em seus Comentários ao Código de Processo Civil de1973: “Normalmente, portanto, a execução por quantia certa não pode chegar até a arrematação,podendo, no máximo, ir até a penhora, como medida de cautela, a favor do credor. Se forexecução de entrega de coisa, a mesma também não se poderá proceder, pela sua natureza efinalidade. Quanto à execução de obrigações de fazer e não fazer, apenas fica excluída aincidência dos arts. 641, 642 e 643” (Alcides de Mendonça Lima, Comentários ao Código deProcesso Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1987, v. 6, t. 2, p. 444).

176

Enrico Tullio Liebman, Processo de execução, São Paulo: Saraiva, 1968, p. 58.

177

Ver Federico Carpi, La provvisoria esecutorietà della sentenza, p. 6; Carlo Furno, La sospensionedel processo esecutivo, p. 54.

178

A ruptura com as regras relativas à execução da sentença condenatória rompe com oconvencional. Parece que o processualista caiu no poço de Alice, em que todas as coisas ficamsoltas no ar, ou seja, em estado de suspensão. Ninguém pode esquecer, porém, que a obra deLewis Carrol – que era um lógico –, se abala o sentido do saber, também manifesta o sentidoevidente de todas as coisas ou, ainda, a reversibilidade do sentido.

179

Como diz Giovanni Verde, “il terzo libro del Codice di Procedura Civile è legato alla filosofia deltitolo esecutivo. È una filosofia dai contorni incerti come tutte le filosofie. Di essa può peraltrocon facliItà cogliersi il nucleo essenziale nell’esigenza che l’esecuzione abbia di mira un assettostabile delle situazioni materiali e non un qualcosa di provvisorio e/o di strumentale ecaducabile” (Giovanni Verde, L’attuazione della tutela d’urgenza, La tutela d’urgenza, p. 81).

180

Giovanni, Arieta, I provvedimenti d’urgenza, p. 313.

181

Ver Bruno Capponi, Sull’esecuzione-attuazione dei provvedimenti d’urgenza per condanna alpagamento di sornme, Rivista di Diritto Processuale, 1989, p. 89 e ss; Achille Saletti, Le riforme delcodice di rito in materia di esecuzione forzata e di attuazione delle misure cautelari, RivistaTrimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1992, p. 453; Romano Vaccarella, Titolo esecutivo,precetto, opposizioni, p. 175; Edoardo F. Ricci, I provvedimenti interinali e cautelari, La riformadel processo civile, p. 58; Federico Carpi, La miniriforma dell’esecuzione forzata, RivistaTrimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1992, p. 1.188; Girolamo Monteleone, Spigolature e dubbisulla Legge 26 novembre 1990 n. 353 (provvedimenti urgenti sul processo civile), Rivista di DirittoProcessuale, 1992, p. 27-46.

182

Luiz Guilherme Marinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatória; Luiz Guilherme Marinoni,Novidades sobre a tutela antecipatória, Revista de Processo, v. 69, p. 105 e ss.

183

No direito italiano, sobre o problema da efetivação da ordem que impõe um fazer ou um nãofazer, ver Andrea Proto Pisani, Appunti sulla tutela di condanna, Rivista Trimestrale di Diritto eProcedura Civile, 1978, p. 1.104 e ss; Aldo Frignani, L’injunction nella common law e l’inibitoria neldiritto italiano; Ugo Mattei, Tutela inibitoria e tutela risarcitoria; Cristina Rapisarda, Proflil dellatutela civile inibitoria; Elisabetta Silvestri, Problemi e prospettive di evoluzione nell’esecuzionedegli obblighi di fare e di non fare, Rivista di Diritto Processuale, 1981, p. 41 e ss. Sobre ainterlocutory injunction no direito inglês, ver Vincenzo Varano, Tendenze evolutive in materia ditutela provvisoria nell’ordinarnento inglese, con particolare riferimento all interlocutoryinjunction, Rivista di Diritto Civile, 1985, p. 39 e ss.

184

Lembre-se que a multa pode ser imposta contra a pessoa física investida de autoridade para

representar o Poder Público. Como já dito, “o problema da efetividade do uso da multa emrelação ao Poder Público repousa na sua própria natureza. Se a multa tem por meta compelir oréu a cumprir, é evidente que a sua efetividade depende da sua capacidade de intimidação e,assim, somente pode incidir sobre uma vontade. Caso a multa incida sobre a pessoa jurídica dedireito público, apenas o seu patrimônio poderá responder pelo não cumprimento da decisão.Entretanto, não há cabimento na multa recair sobre o patrimônio da pessoa jurídica se a vontaderesponsável pelo não cumprimento da decisão é exteriorizada por determinado agente público. Se apessoa jurídica exterioriza a sua vontade por meio da autoridade pública, é lógico que a multasomente pode lograr o seu objetivo se for imposta diretamente ao agente capaz de dar atendimentoà decisão jurisdicional. Não há procedência no argumento de que a autoridade pública não podeser obrigada a pagar a multa derivada de ação em que foi parte apenas a pessoa jurídica. É queessa multa somente constituirá sanção pecuniária, e assim poderá ser cobrada, quando aautoridade pública, que exterioriza a vontade da pessoa jurídica, não der atendimento à decisão.Note-se que a cobrança da multa não tem relação com o fato de o inadimplente ser ou não parte,mas com a circunstância de o inadimplente ser o responsável pelo cumprimento da decisão. Nãose está exigindo nada da autoridade em virtude do que foi discutido no processo. Portanto, a teseque sustenta que a multa não pode recair sobre a autoridade somente poderia ser aceita separtisse da premissa – completamente absurda – de que o Poder Público pode descumprirdecisão judicial em nome do interesse público” (Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual etutela dos direitos, p. 487-488).

185

A respeito da antecipação do pagamento de soma em dinheiro no direito italiano, ver GiampieroRossielo, In tema di esecuzione di provvedimenti d’urgenza recanti l’ordine di corrisponderesomme di denaro, Rivista di Diritto Processuale, 1987, p. 1.046 e ss; Pasquale Frisina, La tutelacautelare d’urgenza dei diritti a prestazioni pecuniarie, Rivista di Diritto Processuale, 1986, p. 972e ss; Bruno Capponi, Sull’esecuzione-attuazione dei provvedimenti d’urgenza per condanna alpagamento di somme, Rivista di Diritto Processuale, 1989, p. 88 e ss.

186

Pontes de Miranda sustentou que a proibição da Constituição estaria na prisão por não-pagamento de dívida pecuniária e que, por isso, seria possível utilizar a prisão como meiocoercitivo (Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1967, São Paulo: Revista dosTribunais, 1968, t. 5, p. 253).

187

Ver Sérgio Arenhart, A tutela inibitória coletiva, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 270;Marcelo Lima Guerra, Execução indireta, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 245 e ss.

188

Ver Marcelo Lima Guerra, Execução indireta, p. 245-246.

189

“Quanto à prisão para cumprimento de ordem judicial, não tem caráter obrigacional. Aocontrário, deriva do imperium estatal e tem por fim resguardar a dignidade da justiça. Enfim,

encontra apoio na regra do art. 5o, inciso XXXV, da Constituição Federal, no que pertine à garantiade um provimento jurisdicional útil. Isto porque, em tese, pode haver situações em que a únicaforma de se obter provimento jurisdicional capaz de ser eficaz no caso concreto será contando coma colaboração do réu (sujeito a uma ordem judicial); e, também, não é difícil imaginar hipóteses(especialmente em sede de tutela inibitória) em que a imposição de astreintes ou de outra medida deapoio, que não a prisão civil, seja totalmente inadequada para garantir o cumprimento dadeterminação. Para estes casos, então, será legítima a imposição da prisão civil como meio

coercitivo, sem que se vislumbre qualquer óbice a isto na regra constitucional do art. 5o, LXVII(ou mesmo nos textos das convenções inicialmente mencionadas)” (Sérgio Cruz Arenhart, Atutela inibitória coletiva, p. 270). “Encarada a prisão como um importante meio de concretizaçãodo direito fundamental à tutela efetiva e não apenas como uma odiosa lesão ao direito de liberdade,

uma exegese que restrinja a vedação do inc. LXVII do art. 5o da CF aos casos de prisão por dívidaem sentido estrito preserva substancialmente a garantia que essa vedação representa, semeliminar totalmente as possibilidades de se empregar a prisão civil como medida coercitiva paraassegurar a prestação efetiva da tutela jurisdicional” (Marcelo Lima Guerra, Execução indireta, p.245-246).

190

Ver José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional, Coimbra: Almedina, 1993 e JorgeMiranda, Manual de direito constitucional, t. II, Coimbra: Coimbra Editora, 1983.

191

Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o Ilícito; Luiz Guilherme Marinoni, Tutela Inhibitoria.

192

Como observou Milena de Oliveira Guimarães, “pode ocorrer uma sanção coercitiva por ‘civilcontempt’ no caso de desobediência à ordem de praticar determinado ato, ou seja, o ‘contemnor’deve permanecer preso até que cumpra a ordem” e “uma prisão punitiva por ‘civil contempt’ podeocorrer no caso de o sujeito deixar de cumprir ordem judicial de se abster de praticardeterminado ato, como, por exemplo, uma ordem de não molestar o peticionário” (Milena deOliveira Guimarães, O contempt of Court e a efetividade da tutela executiva, Dissertação deMestrado, 2003, orientação: Professor Donaldo Armelin). Portanto, não há dúvida que a prisãopor civil contempt pode configurar, no caso de obrigação de não-fazer, uma ameaça para que aparte não pratique um ato e uma punição pela sua eventual prática, embora essa punição nãoconfira caráter criminal ao contempt. Em ambas as situações há um civil contempt.

193

Michele Taruffo, Note sul diritto alla condanna e all'esecuzione, Rivista Critica del Diritto Privato,1986, p. 668.

194

Lembre-se que, justamente na Itália, onde grande parte da doutrina tem grande dificuldade parase libertar do velho, inefetivo e ideologicamente superado esquema da correlação necessáriaentre a condenação e a execução forçada – assim, por exemplo, Crisanto Mandrioli, Sullacorrelazione necessaria tra condanna ed eseguibilità forzata, Rivista Trimestrale di Diritto eProcedura Civile, 1976 -, propõe-se algo similar há muito tempo. Registre-se a ideia de Taruffo:“Não se exclua, em outros termos, a eventualidade de medidas de coerção indireta, cumuláveiscom a possibilidade da execução direta, dirigidas a provocar o adimplemento espontâneo. Não setrata, como é óbvio, de evocar o fantasma da prisão por dívida, mas de considerar se a ameaça deuma sanção (ainda que apenas de caráter pecuniário, segundo o modelo da astreinte) pode terefetividade para induzir ao adimplemento, com isto evitando o recurso à execução forçada. Apossibilidade de obter o adimplemento, evitando assim as complicações, os custos e os riscos deineficácia inerentes à execução por expropriação, constitui a razão de fundo que deverá animar aque se percorra de forma decisiva o caminho da introdução de adequadas medidas coercitivas,ainda que destinadas a garantir a efetividade das sentenças que condenam ao pagamento dedinheiro” (Michele Taruffo, Note sul diritto alla condanna e all’esecuzione, Rivista Critica delDiritto Privato, 1986, p. 668).

195

Ver, longamente, Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual e tutela dos direitos, p. 459-476.Reafirmando a tese diante do novo CPC, ver Marinoni, Arenhart e Mitidiero, Novo Curso deProcesso Civil, v. 2, 2a. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016; Marinoni, Arenhart, Mitidiero,Novo Código de Processo Civil Comentado, 2a. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.

196

Luigi Montesano, La tutela giurisdizionale dei diritti, Trattato di diritto civile italiano, Torino:UTET, 1994, v. 14, t. IV, p. 257.

197

“Se si parla di un référé provision – istituto, come è stato illustrato, di larghissimo sviluppo inFrancia, e di controversa applicazione in Belgio – o di quelle provvisionali per ordinanza chefanno capolino nella legislazione italiana, in materie determinate, con varietà di fortuna (conampia applicazione nella materia dell’assicurazione della responsabilità civile automobilistica, econ minore sucesso nel processo del lavoro), ma costituiscono, comunque, una linea di tendenza,o se si parla di una Befriedigungs o Leistungsverfügung, che ha pure per oggeto la condanna

provvisoria, per via di anticipazione, al pagamento di una somma di denaro, è vero che lapossibilità, per il condannato, di ottenere la restituzione, e il risarcimento dei danni, se ne è ilcaso, qualora la causa si concluda poi in senso a lui favorevole, è sovente del tutto teorica, ma,tuttavia, essa esiste. Non si può dire che il préjudice au principal, sotto il punto di vista dellarealizzabilità della sentenza sul merito, sia inevitable. Il giudice di merito non è spogliato dellasua essenziale funzione di dicere jus, de dire droit, nello specifico senso che l'esecuzione della suapronuncia non è irrimediabilmente impedita” (Giuseppe Tarzia, “Considerazioni conclusive”, Lesmesures provisoires en procédure civile, Milano: Giuffrè, 1985, p. 316).

198

Ovídio Baptista da Silva, Curso de processo civil, v. 3, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.252.

199

Revista dos Tribunais, v. 598, p. 177.

200

Federico Carpi, Provvedimenti interinali di condanna, esecutorietà e tutela delle parti, RivistaTrimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1977, p. 621.

201

Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, Napoli: Jovene, 1994, p. 189-190.

202

O Tribunal do Paraná, em acórdão brilhante, assim decidiu após a introdução da tutelaantecipada no código de 1973: “Tutela antecipada. Ação de reparação de danos por acidente deveículos. Contrato de transporte. Ônibus. Responsabilidade objetiva. Convencimento daverossimilhança da alegação. Prova documental idônea. Autora hipossuficiente. Princípios danecessidade e da efetividade do processo. Condenação provisória no pagamento de um saláriomínimo mensal. Admissibilidade. Requisitos do art. 273 do CPC configurados. Concessão. Agravode instrumento. Decisão reformada. Recurso provido. A agravante provou que viajava depassageira em ônibus da ré; que sofreu acidente e lesões na coluna, encontrando-se incapacitadapara o trabalho de doméstica. Daí decorre o fundado receio de dano irreparável ou de difícilreparação, porque a agravante e sua família enquanto em curso o processo poderão passarprivações. Na antecipação da tutela impõe-se ao julgador fazer uma análise dos valores jurídicoscolocados em julgamento na demanda. No caso, encontra-se de um lado uma vítima pobre eimpossibilitada de trabalhar e, de outro lado, uma empresa que explora a concessão de serviçopúblico, um dos mais rentáveis, ou seja, o transporte público. Deve o juiz estar atento aosprincípios da necessidade e ao da efetividade do processo” (Revista de Direito Processual Civil

(Genesis), v. 2, p. 488 e ss). O extinto 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, seguindo estamesma orientação, igualmente admitiu a tutela antecipada de pagamento de soma em ação deindenização por acidente de veículos: “Tutela antecipada — Responsabilidade civil — Acidente detrânsito — Colisão de veículos — Vítima fatal — Pretensão ao recebimento de alimentosprovisiomais pela autora grávida, esposa do de cujus — Caracterização da verossimilhança dasalegações cujo conceito é diverso daquele de certeza — Confirmação do receio de danoirreparável ou de difícil reparação em face da condição pessoal da autora — Art. 273 do Códigode Processo Civil — Alimentos provisionais concedidos — Recurso improvido” (1º. TACSP, AI638.219, 4ª C. Civ, rel. Juiz Franco de Godoi) Estes acórdãos ainda servem de paradigma para oscasos de tutela antecipada de soma em ação de reparação de danos.

203

Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela na reforma do processo civil, São Paulo: Revistados Tribunais, 1994, p. 122 e ss.

204

Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1976, t. 10,p. 459.

205

Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1977, t. 10,p. 485.

206

. RT 646/124. O mesmo entendimento é adotado por Willard de Castro Villar: “As demais formasde alimentos previstos em testamentos (legados) ou provindos de ato ilícito não podem estarprotegidas pelos meios coativos previstos neste capítulo, uma vez que se permitiria a prisão dodevedor por dívidas, e não foi esse o espírito da lei” (Processo de execução, São Paulo: Revista dosTribunais, 1975, p. 267). Contra Araken de Assis, “o verdadeiro espírito da lei é o de franquearmeios executórios mais lestos e eficazes aos alimentários em geral, deixando de discriminá-losem razão da fonte da obrigação alimentar” (Execução de alimentos e prisão do devedor, São Paulo:Revista dos Tribunais, 1993, p. 111).

207

“Contra o meio executório da coação pessoal se opõe tenazmente a força do preconceito,ignoradas a utilidade e a natureza do mecanismo. Entretanto, o estudo científico dos meiosexecutórios, avaliados e pesados como expedientes práticos, predispostos com o único propósitode realizar as operações materiais destinadas ao implemento executivo da eficácia sentencialcondenatória, revela a verdade. A prisão civil do alimentante não, merece a pátina de coisa

obsoleta, entulho autoritário e violento só a custo tolerado e admitido no ordenamento jurídicocontemporâneo. Em nome da ideologia liberal, preocupada em preservar o princípio daintangibilidade física, ainda que provoque a dor, a penúria e mesmo a morte do alimentário,avalia-se desfavoravelmente o aprisionamento do executado” (Araken de Assis, Execução dealimentos e prisão do devedor, p. 120-121).

208

Jurisprudência Brasileira, v. 3, p. 218.

209

Quando se pensa no meio executivo capaz de garantir a efetividade da tutela do direito não épossível esquecer da esfera jurídica do réu. Se o juiz deve eleger o meio executivo idôneo à tutelajurisdicional, não é possível admitir que esta eleição possa prejudicar o demandado. Isso querdizer que a utilização do meio executivo, diante de uma cláusula geral executiva, tem a sualegimitidade condicionada a uma prévia análise, que considera tanto o direito do autor quanto odireito do réu. Essa análise deve ser feita a partir da regra da proporcionalidade, maisprecisamente com base na sub-regra da necessidade, que se desdobra em regra do meio idôneo eregra da menor restrição possível. É claro que, antes de tudo, o meio executivo deve ser idôneo àtutela do direito. Porém, quando dois meios se mostram a princípio igualmente idôneos, só o usodo meio que causa menor restrição possível não viola a regra da proporcionalidade.

210

“A proteção imediata do direito que se mostre ao magistrado apenas como plausível poderáevidenciar-se, depois, como uma solução injusta e violadora do verdadeiro direito daquele contraquem fora ela consumada. A renúncia a essa forma arriscada de proteção da aparência, noentanto, não isentará o Estado de cometer igualmente injustiças contra o litigante que realmentetenha direito. Lá, a injustiça será determinada pela pressa com que se teve como verdadeiroaquilo que se mostrava apenas provável; aqui, a injustiça decorrerá da mora do juízo, do inevitávelatraso em prover, em favor do titular do direito, que só o teve reconhecido pelo juiz tardiamente(...)”(Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil, v. 3, p. 103-104).

211

Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela, p. 234.

212

Habscheid, referindo-se às hipóteses — encontradas no direito alemão — em que é declarada ainexistência do direito do autor (após o seu pagamento) e o réu constata que o seu direito asperdas e danos não tem valor real — porque o autor não tem patrimônio suficiente —, indaga seo Estado deveria indenizar esse cidadão que foi obrigado a sacrificar o seu patrimônio pelo bem

comum (Walther Habscheid, Les mesures provisoires en procédure civile: droits allemand etsuisse, Les mesures provisoires en procédure civile, Milano: Giuffrè, 1985, p. 47).

213

Ver Walther Habscheid, Les mesures provisoires en procédure civile: droits allemand et suisse,Les mesures provisoires en procédure civile, p. 45.

214

Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil, v. 3, p. 166.

215

Crisanto Mandrioli, Lesecuzione forzata in forma specifica.

216

Ver, também, Luigi Montesano, Condanna civile e tutela dei diritti, p. 86; Crisanto Mandrioli, Sullacorrelazione necessaria tra condanna ed eseguibliItà forzata, Rivista Trimestrale di Diritto eProcedura Civile, 1976, p. 1.347; Crisanto Mandrioli, L’esecuzione specifica dell’ordine direintegrazione nel posto di lavoro, Rivista di Diritto Processuale, 1975, p. 23.

217

Vittorio Denti, Il processo di cognizione nella storia delle riforme, Rivista Trimestrale di Diritto eProcedura Civile, 1993, p. 808.

218

Salvatore Mazzamuto, Lattuazione degli obblighi di fare, p. 36.

219

Como observa Mazzamuto, “il significa to della garanzia dell’incoercibliItà ed il ricorso aliasanzione risarcitoria, allorché venga compromessa in obbligo Ia stessa persona dei debitore nelsuo multiforme dispiegarsi in attività pratiche (materiali, intellettuali, giuridiche), va oltre, insostanza, Ia pura difesa dei valori di libertà e si ricollega direttamente alie trasformazioni delprocesso economico” (Salvatore Mazzamuto, Lattuazione degli obblighi di fare, p. 36-38).

220

Salvatore Mazzamuto, Lattuazione degli obblighi di fare, p. 37.

221

Salvatore Mazzamuto, Lattuazione degli obblighi di fare, p. 36-38.

222

A diferença é que a lei é resposta abstrata do legislador, ao passo que a decisão é resposta do juizdiante do caso concreto. Ou seja, há direito, devido pelo Estado-legislador, à edição de normas dedireito material de proteção, assim como de normas de direito instituidoras de técnicasprocessuais capazes de propiciar efetiva proteção. Porém, o Estado-Juiz também possui dever deproteção, que realiza no momento em que profere a sua decisão a respeito dos direitosfundamentais.

223

Não há dúvida de que o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva engloba o direito aosmeios executivos adequados. Veja-se, nesse sentido, a lição de Canotilho: “Finalmente, aexistência de uma proteção jurídica eficaz pressupõe a exequibilidade das sentenças (‘fazercumprir as sentenças’) dos tribunais através dos tribunais (ou, evidentemente, de outros órgãos),devendo o Estado fornecer todos os meios jurídicos e materiais necessários e adequados para darcumprimento às sentenças do juiz. Esta dimensão da proteção jurídica é extensiva, em princípio,à execução de sentenças proferidas contra o próprio Estado (CRP, artigo 208/2 e 3, e, em termosconstitucionalmente claudicantes, o Dec.-lei 256/77, de 17 de junho, artigo 5.º ss., e Dec.-lei 267/85,de 12 de julho, artigo 95 ss.). Realce-se que, no caso de existir uma sentença vinculativareconhecedora de um direito, a execução da decisão do tribunal não é apenas uma dimensão dalegalidade democrática (‘dimensão objetiva’), mas também um direito subjetivo público doparticular, ao qual devem ser reconhecidos meios compensatórios (indenização), medidascompulsórias ou ‘ações de queixa’ (cfr. Convenção Europeia dos Direitos do Homem, artigo 6.º),no caso de não execução ilegal de decisões dos tribunais” (José Joaquim Gomes Canotilho, Direitoconstitucional, p. 654).

224

A doutrina espanhola tem deixado de lado as velhas discussões em torno da ação como merodireito de ir a juízo ou como simples direito a uma sentença de mérito e assim estabelecido: “EIderecho a la tutela judicial efectiva que consagra el art. 24 CE no agota su contenido en laexigencia de que el interesado tenga acceso a los Tribunales de Justicia, pueda ante ellosmanifestar y defender su pretensión jurídica en igualdad con las otras partes y goce de la libertadde aportar todas aquellas pruebas que procesalmente fueran oportunas y admisibles, ni se limitaa garantizar la obtención de una resolución de fondo, fundada en derecho, sea o no favorable a lapretensión formulada, si concurren todos los requisitos procesales para ello. Exige también que el‘fallo se cumpla’ y que el recurrente sea repuesto en su derecho y compensado, si hubiere lugar aello, por el daño sufrido. Lo contrario sería convertir las decisiones judiciales y el reconocimiento delos derechos que ellas comportan en favor de alguna de las partes en meras declaraciones deintenciones” (David Vallespín Pérez, El modelo constitucional de juicio justo en el ámbito del

proceso civil, p. 142-143). Ver, ainda, Álvaro Gil-Robles, Los nuevos límites de la tutela judicialefectiva, p. 85 e ss.

225

“Trata-se, antes de mais, de conceder todo o relevo, dentro do elemento sistemático dainterpretação, à referência à Constituição. Com efeito, cada norma legal não tem somente de sercaptada no conjunto das normas da mesma lei e no conjunto da ordem legislativa; tem outrossimde se considerar no contexto da ordem constitucional; e isso tanto mais quanto mais se temdilatado, no século XX, a esfera de acção desta como centro de energias dinamizadoras dasdemais normas da ordem jurídica positiva” (Jorge Miranda, Teoria do estado e da Constituição, p.659).

226

Como observa Cristina Queiroz, valendo-se de lição de Herbert Kruger, “‘antes os direitosfundamentais só valiam no âmbito da lei; hoje as leis só valem no âmbito dos direitosfundamentais’ estabelecidos na Constituição” (Direitos fundamentais – Teoria geral, p.32).

227

Ingo Wolfgang Sarlet, A eficácia dos direitos fundamentais, p. 148.

228

A respeito do tema, ver João Pedra Gebran Neto, A aplicação imediata dos direitos e garantiasindividuais.

229

José Carlos Vieira de Andrade, Os direitos fundamentais (na Constituição Portuguesa de 1976), p.256.

230

José Carlos Vieira de Andrade, Os direitos fundamentais (na Constituição Portuguesa de 1976), p.256-257.

231

Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual e tutela dos direitos.

232

Aliás, a multa também pode ser utilizada para efetivar a decisão (e a sentença) que ordena oressarcimento na forma específica, seja para compelir a um fazer, a entrega de coisa emsubstituição à destruída, ou para constranger o réu a custear o fazer necessário para a reparaçãoespecífica ser desenvolvida por terceiro. É o que foi dito no livro Técnica processual e tutela dosdireitos (p. 212 e ss.): “No contexto da efetividade dos meios de execução, nada parece tãorelevante quanto o problema da tutela ressarcitória na forma específica. Como é sabido, o direitoao ressarcimento na forma específica prefere ao ressarcimento pelo equivalente. Porém, como sepercebe na prática forense, o ressarcimento pelo equivalente é muitas vezes imaginado como oúnico possível de ser obtido. Isso ocorre, como é óbvio, em razão de que o CPC originariamenteinstituiu, como veículo processual destinado ao ressarcimento na forma específica, a sentençacondenatória e a ação de execução de obrigação de fazer – quando, uma vez não cumprido ofazer necessário para a reparação, o exequente teria que requerer que esse fosse prestado porum terceiro às custas do devedor. Como o executado que não faz geralmente não paga para umterceiro fazer, a probabilidade do lesado ter que pagar para a reparação na forma específica eramuito grande, e assim praticamente inviabilizava o ressarcimento na forma específica. Porém, sereparar significa, antes de mais nada, fazer ou entregar coisa em substituição à destruída, nadapode impedir que, atualmente, seja empregada a multa para dar efetividade ao ressarcimento naforma específica (arts. 536 e 538 do CPC e 84 do CDC). É verdade que não há procedência emobrigar o réu a reparar – ou seja, a fazer –, quando ele é destituído de capacidade técnica paratanto. Porém, isso constitui circunstância meramente acidental em relação ao dever de reparar –que é, acima de tudo, dever de ressarcir na forma específica, e não simples obrigação de pagardinheiro. O dever de reparar na forma específica não se extingue no caso em que o demandadoprova não ter capacidade técnica para fazer. Ou seja, a demonstração de incapacidade técnicanão tem o condão de transformar o direito ao ressarcimento na forma específica em direito aindenização em pecúnia. Assim, demonstrada a incapacidade técnica e não cumprida a sentença,o juiz deve utilizar a multa para compelir o infrator a pagar para que terceiro preste o fazernecessário ao ressarcimento. Nesse caso, a multa não estará sendo utilizada para compelir oinfrator a pagar, mas sim para viabilizar o ressarcimento na forma específica. Como é evidente, aincapacidade técnica do lesado não pode transformar o seu dever de ressarcir em obrigação depagar dinheiro. Na realidade, em todos os casos em que a multa for o único meio capaz deconferir a tutela do direito, o seu uso será evidentemente sustentado pelo direito fundamental àefetividade da tutela jurisdicional. Isso ocorre no caso de tutela antecipada de soma em dinheiroe no caso de tutela ressarcitória na forma específica. Perceba-se que a não utilização da multa,mesmo para compelir o infrator a custear o fazer, inutiliza o ressarcimento na forma específica.Ou melhor: a multa, embora não expressamente prevista, é absolutamente necessária para aefetividade da tutela antecipada de soma em dinheiro e para a tutela ressarcitória na formaespecífica. Sendo assim, não há como argumentar que, pelo fato dela não ser expressamenteprevista para essas situações, o seu uso fica vedado. É que a omissão do legislador em darefetividade ao direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, como é óbvio, não pode serinterpretada em seu desfavor” (Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual e tutela dos direitos,p. 212 e ss).

233

Sobre a importância da justificativa, ver Michele Taruffo, La motivazione de la sentenza civile, p.

194-195, Michele Taruffo, Funzione della prova: la funzione dímostratíva, Rivista Trimestrale diDiritto e Procedura Civile, 1997, p. 553-554; Michele Taruffo, Il controllo di razionalità delladecisione fra logica, retorica e dialettica, www.studiocelentano.it; Michele Taruffo, Lamotivazione della sentenza, Revista de Direito Processual Civil (Genesis), v. 30, p. 674 e ss; MicheleTaruffo, Senso comum, experiência e ciência no raciocínio do juiz, conferência proferida naFaculdade de Direito da UFPR, Curitiba, março 2001, p. 17.

234

 “I provvedimenti cautelari sono destinati a durare per um tempo limitato. Infatti quando ilprocesso principale giunge a conclusione, viene meno il problema stesso per cui furono concesso:o il diritto è stato riconosciuto esistente, e potrà ricevere piena soddisfazione; oppure è statodichiarato inesistente e la misura cautelare dovrà essere revocata” (Enrico Tullio Liebman,Manuale di diritto processuale civile, Milano: Giuffrè, 1984, v. 1, p. 93).

235

 Veja-se, neste sentido, a posição de Ovídio Baptista da Silva: “Não se leva em consideração acircunstância de que a revogação prematura do provimento liminar, ou mesmo da medidacautelar concedida em sentença final cautelar, deixará o direito litigioso sem qualquer proteçãoassegurativa durante a tramitação dos recursos, em muitos casos extremamente demorada, de talmodo que a reforma da sentença, nos graus superiores de jurisdição, poderia deparar-se comuma situação de prejuízo irremediável ao direito somente agora reconhecido em grau de recurso.Para que situações desta espécie sejam evitadas, recomenda-se que o magistrado – sensível àscircunstâncias especiais do caso concreto – disponha, em sua sentença contrária à parte queobtivera a provisional, que esta medida liminar, não obstante a natureza do julgamento posteriordivergente, conserve-se eficaz até o trânsito em julgado da sentença a ser proferida no juízo dorecurso. Esta parece ser a tendência contemporânea da doutrina italiana (...)” (Ovídio Baptista daSilva, Curso de Processo Civil, v. 3, p. 124).

236

 Ver Donaldo Armelin, A tutela jurisdicional cautelar, Revista da Procuradoria Geral do Estado deSão Paulo, v. 23, p. 123.

237

Clito Fornaciari Júnior, O destinatário da norma do art. 686, n. V, do Código de Processo Civil(1973), Revista de Processo, v. 6, p. 122.

238

Nicolò Trocker, Processo civile e costituzione, p. 406.

239

Ver Luigi Paolo Comoglio, La garanzia costituzionale dell’azione ed il processo civile.

240

”Si è detto che il principio del contraddittorio è rispettato anche quando il provvedimento èpronunciato inaudita altera parte, purche prima che il provvedimento diventi difinitivo, la partecontro cui e emesso abbia la possibilità di proporre le sue difese” (Giuseppe Martinetto,Contraddittorio (Principio del), Novissimo Digesto Italiano, v. 4, p. 461).

241

Galeno Lacerda, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. 8, t. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1980, p.254 e ss.

242

José Frederico Marques, Manual de direito processual civil, v. 4, São Paulo: Saraiva, 1974, p. 397.

243

No direito italiano, Vincenzo Vigoriti extrai o direito ao prazo adequado do direito ao devidoprocesso legal. Ver Vincenzo Vigoriti, Garanzie costituzionali del processo civile, Milão: Giuffrè,1973, p. 64.

244

Acerca do tema da estabilização da tutela, ver Gustavo Paim, Estabilização da tutela antecipada,Porto Alegre: Livrariados Advogados, 2012; Daniel Mitidiero, Autonomia e estabilização daantecipação da tutela no novo Código de Processo Civil, Revista de Direito Civil e Processual Civil(Magister), v. 63; Eduardo Talamini, Tutela de urgência no projeto de novo Código de ProcessoCivil: a estabilização da medida urgente e a “monitorização” do processo civil brasileiro, Revistade Processo, v. 209; Heitor Vitor Mendonça, Doze problemas e onze soluções quanto à chamada“estabilização de tutela antecipada”, p. 177 ss; Humberto Theodoro Jr e Érico Andrade, Aautonomização e a estabilização da tutela de urgência no Projeto de CPC, Revista de Processo, v.206; Frederico Augusto Gomes e Rogério Rudiniki Neto, Estabilização da tutela de urgência:algumas questões controvertidas, p. 161 ss; Weber Luiz de Oliveira, Estabilização da tutelaantecipada e teoria do fato consumado. Estabilização da estabilização? Revista de Processo, v.242; Guilherme Cardoso Antunes da Cunha, Tutelas de urgência satisfativas autônomas, Revistade Processo, vol. 227; Mirna Cianci, A estabilização da tutela antecipada como forma dedesaceleração do processo (uma análise crítica), Revista de Processo, v. 247; Eduardo Henrique deOliveira Yoshikawa, Tutela de urgência definitiva? Medidas autossatisfativas (Argentina),medidas provisionais (Brasil) e a proposta de estabilização da antecipação de tutela, Revista deProcesso, v. 231; Bruno Garcia Redondo, Estabilização, modificação e negociação da tutela de

urgência antecipada antecedente: principais controvérsiais, Revista de Processo, v. 244; HorivalMarques de Freitas Junior, Breve análise sobre as recentes propostas de estabilização dasmedidas de urgência, Revista de Processo, v. 225; Marcelo Pacheco Machado, Simplificação,autonomia e estabilização das tutelas de urgência: análise da proposta do Projeto de novo Códigode Processo Civil, Revista de Processo, v. 202.

245

Eis o que dizia sobre o problema o professor Barbosa Moreira: “Quem é esse réu que perdeu oprazo? Foi voluntária a omissão? Se não foi, que lhe terá dado causa: imperfeita compreensão dochamamento ao juízo? Problema de saúde? Dificuldade em conseguir os serviços de umadvogado? Impossibilidade material de remunerá-lo conforme o solicitado? Desconhecimento daexistência de órgão apto a prestá-las gratuitamente? Atuação ineficiente de tal órgão, ou doadvogado constituído – ou, ainda, de algum funcionário a quem a contestação foi entregue e quedeixou de encaminhá-la ou de juntá-la aos autos? Veja-se que amplo leque de indagações se abrea partir daquele acontecimento de aparente (mas enganosa) singeleza. Uma infinidade deaspectos da vida social podem ser questionados com fundamento nele. Entrariam aí, a rigor,temas como o de nível de instrução do povo, o da abundância ou escassez de recursosfinanceiros, o da disponibilidade de serviços, o da formação profissional, o das condições detrabalho nos órgãos judiciais, e assim por diante” (José Carlos Barbosa Moreira, Sobre amultiplicidade de perspectivas no estudo do processo, Revista Brasileira de Direito Processual, v.56, p. 19-20).

246

Sobre o ponto, ver Luiz Guilherme Marinoni, Técnica processual e tutela dos direitos.

247

Andrea Proto Pisani, La nuova disciplina del processo civile, p. 195; Luigi Montesano-GiovanniArieta, Diritto processuale civile, v. 2, p. 185-186; Giuseppe Tarzia, Lineamenti del nuovo processodi cognizione, p. 186-187; Federico Carpi, La provvisoria esecutorietà della sentenza, p. 59 e ss;Ferruccio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza, p. 257; Gianpiero Samori, La tutela cautelaredichiarativa, Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1995, p. 949 e ss.

248

O texto do art. 186-bis, que se vale da técnica da não contestação para a formação antecipada dotítulo executivo judicial, reproduz a fórmula do projeto provisório de reformas urgentes doprocesso civil – redigido por Fabbrini, Proto Pisani e Verde em nome da “Associazione Italiana fragli Studiosi del Processo Civile” -, assim como disposição do Projeto Rognoni. Sobre o ProjetoRognoni, ver Edoardo Ricci, Il progetto Rognoni di reforma urgente del processo civile, Rivista diDiritto Processuale, 1987, p. 628 e ss.

249

Sobre o art. 423 do Código de Processo Civil italiano, consultar Giuseppe Tarzia, Manuale delprocesso del lavoro, Milano: Giuffrè, 2008, 1987; Luigi Montesano e Romano Vaccarella, Manualedidiritto processualedel lavoro, Napoli: Jovene, 1989.

250

Na verdade, a disposição do art. 186-bis diferencia-se da disposição que serve ao processo dotrabalho nos seguintes pontos: i) a não-contestação deve vir de uma parte que constituiuadvogado em juízo, enquanto que a norma do processo do trabalho abria oportunidade para adiscussão sobre se a “contumacia” do réu poderia configurar hipótese de não-contestação; ii) a“ordinanza”, no processo de conhecimento, é modificável e revogável, não podendo prejudicar adecisão sobre o mérito; argumentava-se, no processo do trabalho, mediante uma determinadainterpretação do art. 423, que a “ordinanza” não poderia ser modificada ou revogada; iii) deacordo com a nova disposição, a “ordinanza” não pode ser pronunciada em qualquer fase doprocesso, como acontecia no processo do trabalho; iv) a “ordinanza” conserva eficácia mesmoapós a extinção do processo, o que não era especificamente previsto pelo art. 423. Ver Edoardo F.Ricci, I provvedimenti interinali e cautelari, in La riformadel processocivile, Milano: Giuffrè, 1991,p. 52; Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo, Lezioni sulprocesso civile, Bologna: IlMulino, 1995, p. 588; Domenico Borghesi, L’anticipazione dell’esecuzione forzata nella riformadel processo civile, p. 193.

251

“Il problema – è evidente – sta tutto nel significato da attribuire all’espressione ‘conserva la suaefficacia’, nessun dubbio potendosi avanzare sul fatto che il concetto di estinzione ècompreensivo sia della renuncia agli atti che dell’inattività delle parti” (Gabriella Rampazzi, Leriformedel processocivile (a cura di Sergio Chiarloni), p. 238). Ver Filippo Collia, L’ordinanza per ilpagamento di somme non contestate nel processo del lavoro, Rivista diDiritto Processuale, 1994,p. 554.

252

Andrea Proto Pisani, I provvedimenti anticipatori di condanna, Foro italiano, 1990, p. 399.

253

Giuseppe Tarzia, Lineamenti delnuovo processodi cognizione, p. 135; Crisanto Mandrioli, Le nuoveordinanze ‘di pagamento’ e ‘ingiunzionale’ nel processo ordinario di cognizione, Rivista diDirittoProcessuale, 1991, p. 649; Aldo Attardi, Le nuovedisposizioni sulprocesso civile, Padova,: Cedam,1991, p. 94; Luigi Montesano e Giovanni Arieta, Il nuovoprocesso civile, Napoli: Jovene, 1991, p. 54;Claudio Cecchella, Il processocivile dopole riforme, Torino: Giappichelli, 1992, p. 123; GabriellaRampazzi, Le riformedel processocivile (a cura di Sergio Chiarloni), p. 238-240.

254

Ver Antonio Carrata, Profili sistematici della tutela cautelare, I procedimenti cautelari, Bologna:Zanichelli, 2013.

255

Giovanni Bonato, Tutela anticipatoria di urgenza e sua stabilizzazione nel nuovo c.p.c. brasiliano:comparazione con il sistema francese e con quello italiano, Revista de Processo Comparado (ed.Revista dos Tribunais), v. 4.

256

No direito italiano, a doutrina há algum tempo alude à técnica do référé para sustentar aimportância de uma forma de tutela provisória dotada de eficácia executiva e não marcada pelacoisa julgada. Ver Remo Caponi, La tutela sommaria nel processo societario in prospettivaeuropea, in Studi in onore di Giuseppe Tarzia, Milano: Giuffré, 2005, vol. 3, p. 1.605 e ss; SergioMenchini, Nuove forme di tutela e nuovi modi di risoluzione delle controversie: verso ilsuperamento della necessità dell’accertamento con autorità di giudicato, Rivista di DirittoProcessuale, 2006, p. 869. No direito francês, sobre a inexistência de coisa julgada no reféré, verLouis Boré, L’autorité provisoire de la chose jugée, in L’autorité de la chose jugée (direção de LoïcCadiet e Dominique Loriferne), p. 61 e ss; Cécile Chainais, La protection juridictionnelle provisoiredans le procès civil en droit français et italien, p. 294.

257

Ver Roberta Tiscini, I provvedimenti senza accertamento, Torino: Giappichelli, 2009; BrunoSassani, Lineamenti del processo civile italiano, Milano: Giuffré, 2014, p. 645 e ss.

258

Giovanni Bonato, Tutela anticipatoria di urgenza e sua stabilizzazione nel nuovo c.p.c. brasiliano:comparazione con il sistema francese e con quello italiano, Revista de Processo Comparado (ed.Revista dos Tribunais), v. 4.

259

No direito italiano, sobre o problema da tutela antecipada baseada em não contestação diante dedireitos indisponíveis, ver Andrea Proto Pisani, I provvedimentianticipatori dicondanna, p. 397;Giuseppe Tarzia, Lineamenti delnuovo processodi cognizione, p. 135

260

Lembre-se que, quando a tutela antecipada é deferida com base na probabilidade de alegação defato dependente de posterior elucidação, a Fazenda Pública não está sujeita ao prazo de dois anos

para a ação de revisão.

261

Como esclareceu Víctor Fairen Guillén, “los procedimentos plenarios rápidos se diferencian delordinario, simplemente por su forma, más corta, pero no por su contenido, que es el mismocualitativamente, jurídicamente plenario” (…) “los procedimientos sumarios se diferencian delordinario plenario, por su contenido, cualitativamente, jurídicamente parcial, siendo indiferente laforma, aunque tendente a la brevedad, por lo cual se aproximaban – en ocasiones hastaconfundirse procedimentalmente – con los plenarios rápidos” (Juicio ordinario, plenarios rápidossumario, sumarísimo, Temas del ordenamiento procesal, Madrid: Tecnos, 1969, p. 828). Ver, ainda,Víctor Fairen Guillén, El juicio ordinario y los plenarios rápidos, Barcelona: Bosch, 1953.

262

Note-se que, embora o art. 344 fale que “presumir-se-ão verdadeiras”, o art. 307 não alude averacidade das alegações, mas diz que os fatos alegados “presumir-se-ão aceitos pelo réu comoocorridos”.

263

Ver Louis Boré, L’autorité provisoire de la chose jugée, in L’autorité de la chose jugée (direção deLoïc Cadiet e Dominique Loriferne), p. 61 e ss.

264

Ver Ovídio Baptista da Silva, Do processo cautelar, p. 215.

265

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “a cessação da eficácia da medida também deve serimputada aos casos em que, a despeito de ter sido proposta, a ação principal permanece paralisadapor mais de dois anos consecutivos por negligência da parte autora, o que configura o desinteressena rápida solução do litígio, fulminando o requisito do periculum in mora” (REsp 225357, 2.ªTurma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 15.08.2005).

266

Ver Ovídio Baptista da Silva, Comentários ao Código de Processo Civil, p. 224.

267

RT 552/222.

© desta edição [2017]

268

Giuseppe Tarzia, Rigetto e riproponibilità della domanda cautelare, Rivista di Diritto Processuale,1988.

2017 - 11 - 15 Tutela de Urgência e Tutela da Evidência - Edição 2017PARTE III - TUTELA DA EVIDÊNCIA

PARTE III - TUTELA DA EVIDÊNCIA

1. Introdução

1.1. Tutela da Evidência como Técnica de Distribuição do Tempo do Processo

Como é óbvio, a tutela da evidência não pode ser confundida com a tutela cautelar oucom a tutela antecipatória que se funda em perigo. O art. 311 diz expressamente que atutela da evidência independe “da demonstração de perigo de dano ou de risco aoresultado útil do processo”.

O código de 2015, na linha do art. 273, II, do código de 1973, institui uma técnicaprocessual destinada a viabilizar a tutela do direito do autor quando os fatos constitutivosdo direito são incontroversos ou evidentes e a defesa é infundada, e, portanto, quando oexercício da defesa pode ser visto como um abuso.

Bem vistas as coisas, tal técnica de tutela jurisdicional destina-se a viabilizar adistribuição do ônus do tempo do processo. Para tanto, a técnica não poderia realmentefugir dos critérios da evidência do direito e da fragilidade da defesa, aptos a permitir que atutela do direito se dê no curso do processo sem que seja pago o preço do direito de defesa.

Note-se que esta espécie de técnica de tutela dos direitos é o resultado da admissão deque: i) o tempo do processo não pode ser jogado nas costas do autor, como se esse fosse oculpado pela demora inerente à investigação dos fatos; ii) portanto, o tempo do processodeve ser visto como um ônus; iii) o tempo deve ser distribuído entre os litigantes em nomeda necessidade de o processo tratá-los de forma isonômica.

1.2. O Tempo do Processo como Ônus e a Necessidade da sua Distribuição entre asPartes

No processo de conhecimento clássico – destituído de tutela antecipatória –, o tempo doprocesso é suportado unicamente pelo autor, independentemente das particularidades dasituação de direito material e do caso litigioso. Isso certamente não é justo nem está deacordo com a necessidade de se prestar tutela jurisdicional adequada às pessoas. O tempodo processo não pode prejudicar o autor e beneficiar o réu, já que o Estado, quandoproibiu a justiça de mão própria, assumiu o compromisso de, além de tutelar de formapronta e efetiva os direitos, tratar os litigantes de forma isonômica.1

É possível distribuir o tempo do processo através dos procedimentos especiais,elaborados a partir das técnicas da cognição.2 Os procedimentos que impedem a discussãode determinadas questões (cognição parcial), que restringem o uso das provas (porexemplo, mandado de segurança; cognição exauriente secundum eventum probationis) oumesmo que são de cognição plena e exauriente mas, dotados de tutela antecipatória,permitem uma melhor distribuição do tempo da justiça.3

Porém, tratando-se do procedimento comum, não há outra alternativa a não ser inserirno seu interior uma técnica capaz de permitir a distribuição do tempo do processo, comose fez pela primeira vez no direito brasileiro mediante o art. 273 do CPC/73. A distribuiçãodo ônus do tempo no procedimento comum é imprescindível para a democratização doprocesso civil, pois evita que o tempo seja tratado de forma diferenciada apenas diantedos procedimentos especiais, que, como o próprio nome indica, preocupam-se apenas comsituações especiais, esquecendo que a questão da distribuição do tempo é vital diante detoda e qualquer situação litigiosa concreta.

Afigura-se completamente irracional obrigar o autor a sofrer com a demora quando,por exemplo, os fatos constitutivos são provados por meio de documento e o réu apresentadefesa de mérito indireta infundada que exige instrução dilatória. Para que impere aigualdade no processo é preciso que o tempo seja isonomicamente distribuído entre oslitigantes.4 O tempo deve ser repartido no procedimento de acordo com o índice deprobabilidade de que o autor tenha direito ao bem disputado.5 Esta probabilidade estáassociada à evidência do direito do autor e à fragilidade da defesa do réu. Quando odireito do autor é evidente e a defesa do réu carece de seriedade, surge a tutela daevidência como técnica de distribuição do ônus do tempo do processo, pois de outra formauma defesa abusiva estará protelando a tutela jurisdicional do direito.

1.3. A Falsidade do Princípio da Nulla Executio Sine Titulo Diante do Conflito entre oDireito à Tutela Tempestiva e o Direito à Cognição Definitiva

A teoria processual clássica, ao conceituar os processos, chamou de processo deconhecimento o destinado a verificar a existência do direito e de processo de execução ovoltado a realizar o direito declarado pelo primeiro. O processo de conhecimento deveriaaveriguar a existência do direito alegado para que o juiz pudesse declarar (ou não) aexistência do direito afirmado, sendo que a execução somente poderia iniciar após otérmino do processo de conhecimento.

O que importa, para bem situar o problema, é que a execução teria como pressuposto adeclaração do direito ou a coisa julgada material. A coisa julgada material, nestadimensão, foi considerada o fundamento lógico-jurídico da execução. Se o trânsito emjulgado da sentença seria imprescindível para a formação do título executivo judicial,nenhuma diferença poderia haver em se falar que a coisa julgada é o fundamento lógico-jurídico da execução ou que esta depende de uma sentença transitada em julgado.

O princípio da nulla executio sine titulo foi concebido para deixar claro que a execuçãonão poderia ser iniciada sem título, que deveria conter em si um direito já declarado ounão mais passível de discussão. O pensamento clássico pode ser compreendido através daseguinte lição de Carlo Furno: “A impossibilidade de recorrer diretamente à via executivae a necessidade consequente de obter um título executivo judicial através de um processode conhecimento se explicam facilmente pela existência de uma situação jurídicasubstancial caracterizada pelo elemento de incerteza. Com base neste pressuposto, dada anecessidade de se eliminar a incerteza sobre a situação jurídica substancial, a ação nãopode ser exercitada senão em via declaratória, a fim de que o antecedente lógico-jurídicoda execução, que é a aptidão da ação para ser exercida ‘in executivis’, encontre sua base nadeclaração e sua realização na criação do título que condiciona a instauração da viaexecutiva”.6

Como se vê, há aí uma associação muito íntima e evidente entre “descoberta daverdade”, realização plena do princípio do contraditório, declaração, coisa julgadamaterial e título executivo judicial. Atrás do princípio da nulla executio sine titulo estáescondida a ideia de que a esfera jurídica do devedor não pode ser atingida sem a

descoberta da verdade e a realização plena do princípio do contraditório.

De qualquer forma, a ideia de que a execução depende do exaurimento do processo deconhecimento está ligada à premissa de que o juízo de cognição sumária, exatamente porser um juízo que postecipa o direito de defesa, não é suficiente para a instauração daexecução. A execução, neste sentido, sempre dependeu da “certeza jurídica”.7 É o próprioChiovenda quem confessa: “Entrementes, pode ocorrer a figura duma sentença nãodefinitiva, mas executória, e, pois, a separação entre a definitividade da cognição e aexecutoriedade. É o que sucede, em primeiro lugar, quando a condenação é confirmadaou proferida em grau de apelação, e isso porque a sentença de apelação, se bem que nãodefinitiva, por sujeita a cassação, é todavia executória, uma vez que o recurso para acassação não suspende a execução da sentença. Conquanto seja essa uma figura anormal,porque nos apresenta uma ação executória descoincidente, de fato, da certeza jurídica...”.8

A “execução provisória” da sentença seria uma figura anormal exatamente por nãopressupor a “certeza jurídica”. Entretanto, a certeza jurídica, ou a coisa julgada material,em vista das novas necessidades de tutela, não mais pode constituir o pressuposto lógico-jurídico para a instauração da execução.

As novas exigências de tutela jurisdicional – responsáveis, inclusive, pelatransformação da tutela cautelar em técnica de sumarização – transformaram o princípioda nulla executio sine titulo em mito. Recorde-se que a tutela antecipatória, na maioria doscasos, antecipa a própria execução.9 Como já disse Ovídio Baptista da Silva, “a introduçãoem nosso direito de uma forma de tutela antecipatória – tão extensa quanto o permite asua conceituação, como tutela genérica e indeterminada – invalida todos os pressupostosteóricos que sustentam o processo de conhecimento, pois as antecipações de julgamento,idôneas para provocarem tutela antecipatória, pressupõem demandas que contenham,conjugadas e simultâneas, as atividades de conhecimento e execução”.10

No procedimento comum, há enorme conflito entre o direito à cognição definitiva(direito de defesa) e o direito à tempestividade da tutela jurisdicional. Para que o autornão seja prejudicado pela demora do processo, deve atuar, no interior do procedimento decognição plena e exauriente, uma técnica que permita a antecipação da execução.

Ora, se é inegável a existência de conflito entre o direito à tempestividade da tutela e odireito à cognição definitiva e é sabido que o réu tem interesse em utilizar o processo paraconservar o status quo pelo maior espaço de tempo possível, deve ser admissível aantecipação da execução nos casos de direitos evidentes e de defesas infundadas. Não háoutra alternativa para o processo não prejudicar o autor que tem razão.

Na verdade, uma postura dogmática coerente com a realidade impõe a redefinição doconceito de título executivo, indagando-se se a qualidade de título executivo pode serconferida a um provimento sumário. Não há qualquer razão, digna de consideração, queimpeça um provimento sumário de constituir título executivo, pois abrir a via executiva aum direito não é uma consequência da sua existência, mas uma simples opção pela suarealização prática. Desta forma, é certo, a tutela jurisdicional passa a ser muito maisexecução do que declaração e coisa julgada material, mas esta é uma decorrência dasnovas exigências de tutela e do conflito – que é ineliminável – entre segurança eefetividade.

1.4. Evidência do Direito e Fragilidade da Defesa

No jogo entre a tempestividade e a segurança, a tutela da evidência ou a distribuição dotempo do processo somente é possível quando a defesa deixar entrever a grandeprobabilidade de o autor resultar vitorioso e, consequentemente, a injusta espera para a

realização do direito.

A tutela da evidência tem similar no direito comparado no référé provision do direitofrancês. É possível a antecipação mediante a provision na hipótese em que “a obrigaçãonão é seriamente contestável” (“l'obligation n'est pas sérieusement contestable”; artigos809, II e 849, II, do Código de Processo Civil francês).11

Como demonstra Roger Perrot, a provision não requer o requisito da urgência e o juiznão pode exigir uma incontestabilidade absoluta, sob pena de restringir abusivamente odomínio do référé provision.12 O référé provision, assim, é uma forma de tutela dos direitosevidentes.

Um direito é evidenciado de pronto quando é demonstrado desde logo. Para a tutela daevidência, contudo, são necessárias a evidência do direito do autor e a fragilidade dadefesa do réu, não bastando apenas a caracterização da primeira. A defesa deve ser frágil,de modo que o seu exercício, ao dilatar a demora do processo, configure abuso. Note-se,aliás, que de lado o inciso I do art. 311 – que fala expressamente em abuso de direito dedefesa –, os demais incisos deste artigo representam hipóteses em que o direito é evidentee a defesa de mérito deve ser frágil.

1.5. Evidência dos Fatos Constitutivos, Inconsistência da Defesa e Distribuição doÔnus do Tempo Processo

O processo – ou fase do processo – em que se “declara” a tutela do direito é fundado noprincípio de que o autor deve provar o fato constitutivo do direito que alega possuir e oréu deve provar o eventual fato impeditivo, modificativo ou extintivo afirmado nacontestação. É o que evidencia o art. 373 do Código de Processo Civil quando diz que oônus da prova incumbe i) ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ii) ao réuquanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

A necessidade de distribuir o ônus da prova decorre do princípio de que o juiz, mesmoem caso de dúvida resultante de carência de prova, não pode deixar de dar solução àcausa. Se o juiz tem o dever de sentenciar, solucionando o mérito, alguém tem que pagarpela carência da prova que o impede de ter um juízo perfeito sobre o conflito deinteresses.13 Nesse sentido, a regra do art. 373 é apenas um indicativo para o juiz se livrardo estado de dúvida, e, assim, poder definir o mérito.

Mas a regra de que o autor deve provar o que alega, independentemente da situação dedireito substancial controvertida, não gera um processo justo ou de acordo com aConstituição Federal. Não se nega que o ônus da prova é uma consequência do ônus deafirmar, mas há situações que têm particularidades suficientes para demonstrar que aaplicação do art. 373 seria contrário ao desejo do próprio direito material.14 Além disto, hácasos em que é muito difícil, ou quase impossível, ao autor provar a sua alegação, sendomais fácil ao réu demonstrar que o fato alegado pelo autor não é verdadeiro.15 Taiscircunstâncias levam aos conceitos de inversão do ônus da prova na sentença (julgamentocom base em verossimilhança) e na decisão de saneamento e organização do processo(art. 357, III, CPC).

Porém, aqui não importa saber quem deve provar ou quando o ônus da prova deve serinvertido, mas quem deve suportar o tempo necessário à produção da prova. Se o ônus daprova dos fatos litigiosos deve ser repartido entre o autor e o réu na medida do que estesalegam, cabe indagar se o tempo para a produção da prova também não deve serrepartido de acordo com a mesma regra. Ou melhor: se o réu deve provar o fatoimpeditivo, modificativo ou extintivo, há racionalidade em obrigar o autor a pagar pelo

tempo necessário à produção da prova de tais fatos? Essa questão, de grande relevânciapara a realização do princípio da efetividade16 e do princípio chiovendiano de que oprocesso não pode prejudicar ao autor que tem razão, está à base da tutela da evidência.

Se o fato constitutivo é incontroverso não há racionalidade em obrigar o autor aesperar o tempo necessário à produção da prova dos fatos impeditivos, modificativos ouextintivos, uma vez que o autor já se desincumbiu do ônus da prova e a demora inerente àprova dos fatos cuja prova incumbe ao réu certamente o beneficia.17 Assim, a regra doônus da prova deixa de ser lida em uma perspectiva meramente estática para sercompreendida em uma dimensão dinâmica, em que importa o tempo da instruçãoprobatória. Não só a produção da prova, mas também o tempo para tanto, constituemônus que devem ser repartidos entre os litigantes.

A tutela da evidência tem importante base na ideia de que a demonstração dos fatosconstitutivos, ao desobrigar o autor do ônus da prova, repercute sobre a inversão do ônusdo tempo do processo. A tutela da evidência permite ao juiz, a partir da incontrovérsia dofato constitutivo, antecipar a realização do direito, deixando à fase processual sucessiva acognição da defesa de mérito indireta infundada. É claro que tal tutela tem eficáciaimediata, resolutivamente condicionada ao acolhimento da defesa.

Mas a tutela da evidência não requer apenas a incontrovérsia dos fatos constitutivos,pois exige, ainda, que a defesa de mérito indireta tenha duas características: em primeirolugar não pode se basear em prova documental, uma vez que deve exigir produção deoutras provas e, por consequência, o alongamento do tempo do processo; em segundolugar, ainda que abra oportunidade à produção de prova pericial ou testemunhal, asalegações dos fatos extintivos, modificativos ou impeditivos devem ser infundadas.

Tal técnica de tutela faz com que o réu, e não o autor, suporte o tempo necessário paraa demonstração do fato impeditivo, modificativo ou extintivo. Trata-se de uma decisãomarcada por uma cognição sumária e parcial, em que o tempo do processo, necessáriopara a declaração dos fatos modificativos, extintivos e impeditivos, deixa de ser ônus doautor e passa a ser ônus do réu, ou seja, daquele que tem necessidade do prosseguimentodo processo para que se desenvolva a fase instrutória.18

Note-se que o juiz, ao conceder a tutela da evidência, tem cognição exauriente sobre aalegação dos fatos constitutivos e cognição sumária em relação ao fato impeditivo,modificativo ou extintivo. De modo que a cognição é sumária sobre parcela do mérito.19

De lado a tutela da evidência em caso de defesa de mérito indireta, há hipóteses emque os fatos constitutivos são evidenciados e, ainda assim, postos em dúvida por umadefesa direta inconsistente, ou seja, pela contestação infundada dos fatos constitutivos.Nesta situação não há defesa indireta (alegação de fatos extintivos, modificativos ouimpeditivos), porém apenas defesa direta (negação dos fatos constitutivos). Essa, emborasuscite a produção de prova, não é capaz de abalar a convicção formada pela prova dosfatos constitutivos.

No caso de prova emprestada capaz de gerar convicção de certeza acerca dos fatosconstitutivos ou de prova do núcleo do fato constitutivo, a defesa destituída defundamento ou a contestação infundada dos elementos secundários ao núcleo do fatoconstitutivo não pode protelar a realização do direito. A defesa que protela a realização deum direito evidenciado, controvertendo os fatos constitutivos sem fundamento capaz deabalar a convicção decorrente da prova produzida pelo autor, deve ser consideradaabusiva.

A tutela da evidência excepciona o princípio de que a execução ou a tutela jurisdicional

do direito deve seguir a sentença de cognição plena e exauriente. Trata-se de técnica quevisa a impedir que aquele que tem razão seja prejudicado pelo tempo da instrução dacausa.

É certo que esta técnica – como acontece com toda técnica antecipatória – apresentariscos para o réu. Contudo, a circunstância de o juiz somente poder conceder a tutelaquando a defesa de mérito for infundada atenua bastante este risco. Ademais, tal risco,ainda que exista, é plenamente justificável, pois não é racional que o autor tenha quesuportar o tempo do processo quando os fatos constitutivos são incontroversos ou estãoevidenciados e a defesa é infundada.20 Ora, da mesma forma que o réu pode serprejudicado pela tutela, o autor pode ser prejudicado pela demora para a prestação datutela jurisdicional do direito material.

1.6. A Importância de Situar Corretamente os Fatos Litigiosos para a Distribuiçãodo Tempo do Processo

Discorrendo sobre os fatos jurídicos, afirma Chiovenda que os fatos constitutivos sãoaqueles que dão vida a uma vontade concreta da lei e à expectativa de um bem por partede alguém e exemplifica fazendo referência ao empréstimo, ao testamento, ao ato ilícito eao matrimônio. Os fatos extintivos, por sua vez, segundo a doutrina chiovendiana, sãoaqueles que “fazem cessar uma vontade concreta de lei e a consequente expectativa de umbem. Por exemplo: pagamento; remissão de dívida; perda da coisa devida”.21

As circunstâncias de fato que têm por escopo específico dar vida a um direito e quenormalmente produzem este efeito podem ser chamadas de fatos constitutivos.Entretanto, para que estas circunstâncias possam dar vida a um direito, é preciso queestejam presentes outras que, quando ausentes, impedem que o direito possa ter vida.Quando falta uma das circunstâncias que devem concorrer com os fatos constitutivos háum fato impeditivo.22 Vejamos a explicação, à luz do direito italiano, realizada porChiovenda: “Todo direito nasce de determinadas circunstâncias que têm por funçãoespecífica dar-lhe vida: contudo, para produzirem o efeito que lhes é próprio, normal,devem concorrer outras circunstâncias (...) A posse da coisa móvel pelo vendedor é acondição específica (fato constitutivo) para que o comprador lhe adquira a propriedade,ainda que a coisa não pertencesse ao vendedor: não obstante, se o comprador obrou demá-fé, esse efeito não se produz; assim, se o proprietário perdera a coisa. Em taishipóteses, a incapacidade, a violência, o dolo, o erro, a simulação, a ilicitude, a má-fé, aqualidade de coisa perdida funcionam como fatos impeditivos do direito; e da mesmaforma toda circunstância que obste a um fato produzir o efeito que lhe é normal, queconstitua a razão de sua existência”.23

É preciso, porém, uma advertência: os fatos impeditivos não integram os elementos dafattispecie. O fato impeditivo pode ser identificado com a inexistência de um pressupostode eficácia. O fato está no exterior da fattispecie, mas incide no seu interior. O fatoimpeditivo não é um elemento integrativo da fattispecie, mas um elemento autônomo queincide sobre a produção dos efeitos de uma fattispecie completa.24

Já os fatos modificativos são aqueles que pressupõem válida a constituição do direito,mas tendem a alterá-lo, como, por exemplo, a moratória concedida ao devedor.25 Assim, seo autor pede o pagamento da dívida e o réu alega o seu parcelamento e, portanto, que adívida somente pode ser exigida em parte, o fato é modificativo;se o réu afirma opagamento, o fato é extintivo;se o réu alega exceção de contrato não cumprido, o fato éimpeditivo.26

Situar um fato corretamente entre os fatos constitutivos, extintivos, impeditivos ou

modificativos é fundamental para a correta distribuição do ônus da prova e,consequentemente, para a adequada repartição do ônus do tempo do processo.

1.7. A Condenação com Reserva no Direito Italiano

No direito italiano são conhecidas hipóteses típicas de condenação com reserva, como,por exemplo, a do art. 1.462 do Código Civil, que assim estabelece: “Clausola limitativadella proponibilità di eccezioni – La clausola con cui si stabilisce che una delle parti nonpuò opporre eccezioni al fine di evitare o ritardare la prestazione dovuta, non ha effettoper le eccezioni di nulittà, di annullabilità e di rescissione del contratto. Nei casi in cui laclausola è efficace, il giudice, se riconosce che concorrono gravi motivi, può tuttaviasospendere la condanna, imponendo, se del caso, una cauzione”.

Essa norma disciplina as cláusulas limitativas da apresentação de exceções. São ascláusulas com as quais uma parte – de acordo com o princípio chamado de solve et repete –subordina o direito de suscitar exceções em juízo ao prévio cumprimento das obrigaçõescontratuais.27 A cláusula assegura a uma das partes o cumprimento imediato da prestaçãocontratual, obtido através da suspensão provisória dos meios de tutela predispostos peloordenamento. Isto quer dizer que a exceção do réu somente poderá ser conhecida pelojuiz depois da condenação, que é considerada, por isso mesmo, uma condenação comreserva.28

Afirma o art. 1.462 que na presença de “graves motivos” o juiz pode “suspender acondenação”. Embora a própria norma fale em “suspensão da condenação”, é óbvio que aexpressão é aí utilizada de forma não técnica. Não é possível suspender a condenação. Asuspensão pode dizer respeito à eficácia executiva ou à execução “provisória”, mas não àcondenação. De qualquer forma, não é errado dizer que a referida suspensão dacondenação deseja significar a desaplicação da cláusula.29

Não é o caso, evidentemente, de analisar as várias outras hipóteses concretas previstasno ordenamento italiano. O que importa é salientar que parte da doutrina italianareclama uma norma que consagre a atipicidade da condenação com reserva. SegundoGiuliano Scarselli – autor de uma importante obra sobre o tema –, o sistema italiano atual,apenas com a predisposição de hipóteses determinadas e específicas de condenação comreserva, arrisca-se a tratar de modo diverso situações em tudo análogas e, portanto, podetornar em parte inúteis as justificativas lógicas e sistemáticas que estão à base do próprioinstituto da condenação com reserva.30

É inegável que uma série de situações concretas, que estão à margem das hipótesestipificadas no direito italiano, exigem a condenação com reserva para que o tempo doprocesso seja suportado pela parte que tem necessidade da instrução da causa. É oportunolembrar, aliás, que algo muito análogo à generalização da técnica da condenação comreserva já chegou a ser proposto por um grupo de estudos do Conselho Superior daMagistratura italiana. Trata-se de uma proposta que teve a rubrica “Ordinanza dicondanna con riserva” e disse o seguinte: “Quando i fatti costitutivi del diritto fatto valerein giudizio siano non contestati dalle parti costituite o risultino già pienamente approvati,ma la causa non si presenti di pronta decisione per le necessità istruttorie collegate alleeccezioni del convenuto, ove le eccezioni stesse, tenuto conto della natura del rapporto,della qualità delle parti e di ogni altro elemento risultante in causa, appaionoverosimilmente infondate, il giudice istruttore, su istanza di una parte e nelcontraddittorio dell’altra, pronuncia ordinanza di condanna all’adempimento totale oparziale della prestazione richiesta. L’ordinanza costituisce titolo esecutivo e titolo perl’iscrizione di ipoteca giudiziale. L’efficacia dell’ordinanza può essere subordinata allaprestazione di una cauzione. L’ordinanza è soggetta alla disciplina delle ordinanze

revocabili di cui agli artt. 177 e 178, primo comma. Essa è altresì reclamabile nelle forme enei termini dell’art. 669 bis 13. Se il processo se estingue, si applica l’ultimo commadell’art. 186 bis”.

Note-se que tal proposta exige, para a condenação com reserva, i) a prova dos fatosconstitutivos ou a não contestação destes fatos e ii) uma exceção de não pronta soluçãoque se afigure provavelmente infundada.31

1.8. Pressupostos da Tutela da Evidência

A tutela da evidência é ligada à ideia de abreviação do tempo necessário à realizaçãodo direito material. A técnica abre oportunidade à antecipação da tutela jurisdicional dodireito material, ignorando a exigência de que a execução somente seria possível após acognição plena e exauriente.

O art. 350 do Código de Processo Civil afirma que, “se o réu alegar fato impeditivo,modificativo ou extintivo do direito do autor, este será ouvido no prazo de 15 quinze dias,permitindo-lhe o juiz a produção de prova”. É certo que o réu pode alegar fato impeditivo,modificativo ou extintivo e, ao mesmo tempo, negar o fato constitutivo. Porém, aoapresentar defesa de mérito indireta, o réu em regra admite, por mera consequência lógica,o fato constitutivo do direito.

A apresentação de defesa de mérito indireta em regra equivale, por um princípio deincompatibilidade lógica, à não-contestação dos fatos constitutivos. Por exemplo: se oautor pede o pagamento de crédito pecuniário afirmando a venda de determinadamercadoria e o réu alega que o bem entregue apresenta vícios, a contestação admite ocontrato e o recebimento da coisa, ou seja, os fatos constitutivos.32 Nesta situação, a defesasubstancial indireta torna, por uma razão de (in)compatibilidade lógica, os fatosconstitutivos incontroversos – ainda que tenham sido contestados.

Entretanto, é também possível que o réu não conteste os fatos constitutivos e apresenteapenas defesa de mérito indireta. Nesta hipótese a tutela é baseada na evidência do direitoe na defesa de mérito indireta infundada; a evidência do direito, porém, não decorre daincompatibilidade lógica entre a defesa indireta e a negação dos fatos constitutivos, massimplesmente da ausência da defesa direta.

Além disso, os fatos constitutivos podem ser provados mediante documento.Acontecendo isso, a mera apresentação de defesa indireta somente reafirma a evidênciados fatos constitutivos. Porém, quando o réu nega a validade ou a autenticidade dodocumento oferecido para demonstrar os fatos constitutivos, descaracteriza-se a evidênciaapta à concessão da imediata tutela do direito. Além disso, quando o fato constitutivo édemonstrado mediante prova emprestada ou mesmo documental, negando-se na primeirahipótese o próprio fato constitutivo e, na segunda, apenas os elementos secundários dofato, também há evidência do direito que, quando conjugada à inconsistência da defesadireta, abre oportunidade à tutela da evidência.

Realmente, a não contestação,33 a negação logicamente incompatível com a defesaindireta e a demonstração dos fatos constitutivos não são suficientes para a tutela daevidência. Bem por isso, como demonstram as duas primeiras situações, a tutela daevidência não constitui simples repartição do tempo do processo de acordo com anecessidade da instrução da causa. Exige-se, ainda, que a defesa – indireta ou direta – sejainfundada ou a probabilidade de que não será acolhida ao final do processo. A falta defundamento ou a inconsistência da defesa é critério imprescindível à tutela da evidência.

Como é óbvio, além de infundada, a defesa deve exigir instrução probatória. A tutela

da evidência somente tem sentido quando a defesa indireta não admite a imediataresolução do mérito. Isto porque a tutela da evidência é justificada pelo tempo que o réuvai utilizar com a instrução probatória para permitir ao magistrado um juízo de cogniçãoexauriente sobre a defesa. Não há como esquecer que é o tempo do processo que justificaa tutela da evidência.

1.9. A Defesa de Mérito, Além de Não Poder Ser de Pronta Solução, Deve SerInconsistente

A tutela da evidência somente tem razão de ser quando a defesa requer instruçãodilatória, podendo adiar o momento de realização do direito. Quando a defesa pode serimediatamente apreciada, independentemente da produção de prova pericial outestemunhal, obviamente não há motivo para tutela da evidência, bastando ao juizproferir a sentença.

Mas para que seja possível a tutela da evidência é também necessário que a defesa sejainfundada ou inconsistente. É correto dizer que a defesa deve ser provavelmenteinfundada, quando não se está falando de algo muito diferente de fumus boni iuris, umavez que esta expressão tem clara relação com a ideia de “probabilidade”. A diferença éque fumus boni iuris significa probabilidade do direito do autor, ao passo que o conceitoque agora interessa diz respeito às alegações do demandado.34

Em determinado sentido, não há como falar em verdade como categoria contraposta àprobabilidade ou à verossimilhança. Por isso mesmo, argumenta-se que o juiz, mesmo aofinal do processo, somente encontra a probabilidade ou a verossimilhança.35

Piero Calamandrei, abordando lição de Wach,36 advertiu que, quando se diz que umfato é verdadeiro, afirma-se, em substância, que ele atingiu, na consciência de quem assimo julga, aquele grau máximo de verossimilhança que, em relação aos meios limitados deconhecimento de que o julgador dispõe, é suficiente para lhe dar a certeza subjetiva deque aquele fato se verificou. Advertiu Calamandrei que, mesmo para o juiz mais atento eescrupuloso, vale o limite fatal de relatividade que é próprio da natureza humana, pois oque se vê é somente aquilo que parece estar se vendo. É por isso que todo o sistemaprobatório civil é preordenado não somente a permitir, mas verdadeiramente a impor aojuiz de se contentar, ao apreciar os fatos, com a probabilidade.37

Isto não quer dizer, como é óbvio, que o juiz não deva formar, para proferir a sentença,uma convicção de certeza.38 No plano do processo, aliás, é importante distinguir afirmaçãode fato provada e afirmação de fato provável, embora em outra perspectiva ambos osconceitos – como visto acima – possam levar apenas a um juízo de probabilidade.39

Uma afirmação de fato está provada quando supera o controle legal e formal deveracidade, ao passo que uma afirmação é provável quando, ainda que não tenha sesubmetido à plenitude do contraditório, faz surgir a convicção – a partir da relação quepossui com outros fatos, provas e regras de experiência – de que será demonstrada na faseseguinte do processo.

Na realidade, mais importante do que estabelecer a diferença entre afirmação provadae afirmação provável, é distinguir afirmação que pôde ser plenamente provada deafirmação que não pôde ser plenamente provada. Uma afirmação pôde ser plenamenteprovada quando em relação a ela não houve qualquer restrição do direito à produção daprova. Em contrapartida, uma afirmação não pôde ser plenamente provada quando teveque ser apreciada em momento anterior ao esgotamento da instrução probatória e àplenitude do contraditório.

Quando há restrição do direito à produção da prova, ou limitação do contraditório, hácognição sumária. Na tutela da evidência com base na reserva da cognição da defesa demérito indireta infundada somente há cognição exauriente sobre os fatos constitutivos.40

A defesa indireta deve ser examinada com base em cognição sumária exatamente porqueexige instrução dilatória. Por ser anterior ao esgotamento do contraditório, tal cogniçãosomente pode permitir a formação de uma convicção de probabilidade. Neste sentido,cabe ao juiz analisar se tal defesa é infundada ou inconsistente, ou seja, se faz surgir aconvicção de que as alegações de fato não serão demonstradas na fase seguinte doprocesso.

Note-se que a probabilidade, neste caso, não se relaciona com um fato que deve serprovado pelo autor, mas sim com um fato que deve ser provado pelo réu. Frise-se que nãoé o autor que deve demonstrar que a defesa é infundada. A convicção judicial acerca dadefesa indireta decorre unicamente da atividade do réu.

Lembre-se que a incontrovérsia dos fatos constitutivos gera uma espécie de presunçãoda existência do direito, exigindo do réu o ônus de demonstrar que o fato extintivo,modificativo ou impeditivo se sobrepõe à incontrovérsia dos fatos constitutivos. Como aincontrovérsia dos fatos constitutivos – condição para se pensar na análise da ausência deinconsistência da defesa indireta – tem grande peso e influência sobre a convicção do juiz,apenas a defesa indireta fundada pode ser capaz de abalar a convicção judicial acerca daexistência do direito. Caso isto não ocorra, a defesa deve ser considerada infundada, oumelhor, incapaz de dissolver a força da incontrovérsia dos fatos constitutivos e, assim, deprotelar a prestação da tutela jurisdicional do direito.

A situação é semelhante em se tratando de defesa direta. Diante da prova emprestada eda prova documental do fato constitutivo, só as alegações – inclusive quanto aoselementos secundários do fato constitutivo – merecedoras de credibilidade podemdescaracterizar a evidência do direito e, deste modo, racionalmente adiar a tutela dodireito.

2. A Tutela da Evidência Baseada na Técnica da Reserva da Cognição da Defesa deMérito Indireta Infundada

2.1. Os Critérios da Não-Contestação e da Incompatibilidade entre Apresentação deDefesa de Mérito Indireta e Negação dos Fatos Constitutivos

Lembre-se que a incontrovérsia dos fatos constitutivos é condição imprescindível paraa tutela da evidência com base na reserva da cognição da defesa de mérito indiretainfundada. Em outras palavras, a análise da seriedade da defesa de mérito indireta só temrazão de ser quando há incontrovérsia dos fatos constitutivos.

A evidência, diante da técnica da reserva da cognição da defesa indireta infundada,pode decorrer da não contestação dos fatos constitutivos. Embora apresentada defesaindireta, o fato constitutivo se torna incontroverso em razão da não apresentação dedefesa direta, ficando o autor dispensado e o réu impedido de produzir prova em relaçãoa ele. Há aí “não-contestação” e, assim, aplicação do art. 374, III, do Código de ProcessoCivil, que afirma que não dependem de prova os fatos admitidos no processo comoincontroversos.

De acordo com o art. 341 do Código de Processo Civil, incumbe também ao réumanifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial,presumindo-se verdadeiras as não impugnadas, salvo se: i) não for admissível, a seurespeito, a confissão; ii) a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a

lei considerar da substância do ato;�e iii) estiverem em contradição com a defesa,considerada em seu conjunto.41 Portanto, existe no direito brasileiro um princípio queestabelece a necessidade de o réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados napetição inicial, ficando dispensados de prova os fatos não contestados.

O art. 341, III, diz que as alegações de fato não contestadas não são presumidasverdadeiras quando estão em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto.Para que um fato possa ser considerado não contestado, não basta simplesmente a não-contestação individualizada – ou um mero comportamento passivo em relação adeterminado fato –, sendo necessário verificar se outras alegações, contidas nacontestação e inclusive na reconvenção (art. 343, CPC), não significam, mesmo queimplicitamente, a sua negação. Se o réu deixa de contestar um fato de forma específica, oefeito da não contestação – ou seja, a admissão do fato como verdadeiro – somente seproduzirá se as demais alegações da defesa não forem tomadas como negação do fato nãocontestado de maneira específica.42

Para que um fato não contestado possa ser presumido verdadeiro, é necessárioanalisar a defesa globalmente, verificando-se, a partir do conjunto das alegações do réu, seé certo concluir que o fato não especificamente impugnado foi aceito como verdadeiro. Éapenas a partir da análise da defesa na sua totalidade que se pode dizer que um fato nãocontestado deve ser considerado incontroverso.

A evidência também pode advir da incompatibilidade lógica entre a apresentação dasdefesas indireta e direta. Isso ocorre quando a defesa indireta implicitamente admite osfatos constitutivos. Quando é apresentada apenas defesa indireta – sem com que os fatosconstitutivos tenham sido negados pela globalidade da defesa – ou no caso em que,deduzidas as defesas direta e indireta, a segunda é incompatível com a primeira, não hádúvida que os fatos constitutivos são admitidos como verdadeiros.

Perceba-se que, quando a defesa indireta é logicamente compatível com a defesadireta, ou seja, com a negação dos fatos constitutivos, obviamente não há como concluirpela tutela da evidência com base na técnica da reserva da cognição da defesa de méritoinfundada. Se diante da defesa indireta não há não-contestação ou incompatibilidade coma negação dos fatos constitutivos, esses somente poderão ser ditos evidentes se provadosmediante prova documental – excepcionalmente por meio de prova testemunhal oupericial emprestada. Neste caso, entretanto, é importante notar que a tutela da evidêncianão se funda na técnica da reserva da cognição da defesa indireta infundada, mas natécnica da prova documental dos fatos constitutivos – que também pode ser dita técnicamonitória.

2.2. A Defesa de Mérito Indireta Equivale, em regra, à Não-Contestação dos FatosConstitutivos

A apresentação de defesa de mérito indireta equivale, na grande maioria dos casos epor um princípio de incompatibilidade lógica, à não contestação dos fatos constitutivosalegados pelo autor.43 Se o autor afirma que, em virtude da venda de determinadamercadoria, possui determinado crédito em relação ao réu, e esse alega, na suacontestação, que o crédito não pode ser exigido porque a mercadoria apresenta vícios, nãohá contestação dos fatos constitutivos. O réu, ao dizer que a mercadoria possui vícios,admite que realizou o contrato de compra e venda e recebeu a mercadoria, sendo estes osfatos constitutivos do direito do autor. Da mesma forma, se o trabalhador pede opagamento do valor devido pela atividade que desenvolveu e o réu alega a má execuçãoda obra, a defesa admite o contrato e a sua execução, isto é, os fatos constitutivos. Nos doisexemplos, a alegação contida na defesa indireta admite, por uma questão lógica, a

presença dos fatos constitutivos.44

Ao alegar fato extintivo, modificativo ou impeditivo, o réu assume comportamentoprocessual que equivale, normalmente, à não-contestação dos fatos constitutivos,exatamente porque, em regra, a própria defesa indireta pressupõe a existência dos fatosconstitutivos.45

2.3. Resolução do Impasse Diante da Incompatibilidade entre as Defesas de MéritoDireta e Indireta

Nada impede que o réu apresente defesa indireta e, ainda assim, conteste os fatosconstitutivos. Nem sempre a concomitância das duas defesas revela incompatibilidadelógica ou inconciliabilidade.

Não há inconciliabilidade entre a negação do contrato e a afirmação de prescrição ouentre a negação do crédito tributário e alegação de moratória, embora existaincompatibilidade lógica entre a alegação de vício no serviço e a negação do contrato e doserviço.

Nos dois primeiros exemplos é adotado o princípio da eventualidade, em virtude doqual se permite a dedução de uma defesa para a hipótese da outra não ser acatada. O réuapresenta duas defesas para que, na eventualidade do não acolhimento de uma, sejaadmitida a outra. No exemplo da prescrição, o fato negado na defesa direta não é “aceito”na indireta. O fato é sempre negado, requerendo-se que, na eventualidade de não seracolhida a defesa indireta, seja aceita a direta. Articula-se que o crédito afirmado peloautor, se existisse, estaria prescrito. Ou seja, afirma-se, com base na eventualidade, aprescrição do crédito (defesa indireta), mas é expressamente contestado o fato constitutivo(defesa direta).

Contudo, quando se tem em conta a defesa de mérito indireta que não se concilia com anegação dos fatos constitutivos, importa saber o que acontece quando o réu apresentadefesas de mérito direta e indireta logicamente incompatíveis. No direito italiano,Giuliano Scarselli argumenta que o juiz deveria considerar, nestes casos, os arts. 88 e 116,segunda parte, do Código de Processo Civil. O art. 88 afirma que as partes e os seusadvogados têm o dever de se comportar em juízo com lealdade e probidade, enquanto asegunda parte do art. 116 diz que o juiz pode retirar argumentos de prova das respostasque as partes lhe dão por ocasião do chamado “interrogatorio non formale”, da renúnciainjustificada destas a admitir inspeções, assim como, em geral, do próprio comportamentodas partes no processo.46

O art. 77 do Código de Processo Civil afirma que são deveres das partes, de seusprocuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo: i) exporos fatos em juízo conforme a verdade; ii) não formular pretensão ou de apresentar defesaquando cientes de que são destituídas de fundamento;�iii) não produzir provas e nãopraticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito; iv) cumprircom exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criarembaraços à sua efetivação; v) declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nosautos, o endereço residencial ou profissional onde receberão intimações, atualizando essainformação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva; e vi) nãopraticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso. Ademais, diz o art. 80que é considerado litigante de má-fé aquele que: i) deduzir pretensão ou defesa contratexto expresso de lei ou fato incontroverso; ii) alterar a verdade dos fatos;�iii) usar doprocesso para conseguir objetivo ilegal;�iv) opuser resistência injustificada ao andamentodo processo;�v) proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;�

vi) provocar incidente manifestamente infundado;�e vii) interpuser recurso com intuitomanifestamente protelatório.�

Como está claro, é dever da parte expor os fatos conforme a verdade e não apresentardefesa ciente de que é destituída de fundamento. Acontece que a parte que nega o fatoconstitutivo na defesa direta e, ao mesmo tempo, aceita-o implicitamente na defesaindireta, certamente está faltando aos seus deveres de expor os fatos conforme a verdadee não apresentar defesa ciente de que é destituída de fundamento.

Quando pode existir incompatibilidade entre as defesas direta e indireta, o juiz, combase no princípio da lealdade processual, deve determinar que a parte esclareça a suadefesa. Se o réu não se manifestar ou não esclarecer a defesa adequadamente, os fatosconstitutivos devem ser reputados não contestados. Se a defesa indireta for infundada eexigir instrução dilatória, a tutela da evidência deverá ser concedida.

2.4. O Dever de o Réu se Manifestar Sobre os Fatos Narrados na Petição Inicial, oDever de Veracidade e o Dever de o Réu Esclarecer a sua Defesa

A ZPO alemã, em seu § 138,47 afirma que as partes devem esclarecer as circunstânciasde fato da causa de modo completo e conforme a verdade. Diz, ainda, que cada parte devese manifestar sobre os fatos afirmados pelo adversário e que aqueles que não foremexpressamente contestados devem ser considerados admitidos se a intenção de querercontestar não resultar de outras declarações da parte.48

No direito brasileiro, segundo disposição expressa do Código de Processo Civil, cabe aoréu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial, presumindo-severdadeiros os não impugnados (art. 341, CPC). Demais disto, o réu tem o dever de exporos fatos em juízo conforme a verdade e não alegar defesa ciente de que é destituída defundamento (art. 77, I e II, CPC).

Assim, à semelhança do que ocorre no sistema alemão, no direito brasileiro estãopresentes o dever de veracidade e o dever de o réu se manifestar sobre os fatos narradosna petição inicial. Isto é muito importante, já que valoriza ao máximo a busca da verdadematerial e reduz a massa dos fatos controversos, sabido que a defesa pode ser exercidacom o objetivo de alterar a verdade e com intuito meramente protelatório.49

O réu, porque tem o dever de expor em juízo os fatos conforme a verdade, não podenegar o fato que sabe verdadeiro, mas apenas silenciar. O seu silêncio, contudo, conduz àpresunção de veracidade do fato não contestado.50 O réu pode ser tentado a contestarexpressamente o fato constitutivo implicitamente admitido na sua defesa indireta. Nestecaso, porém, o réu deveria deixar de apresentar defesa direta, hipótese em que apresunção de veracidade decorreria, antes de tudo, da própria admissão implícita do fatoconstitutivo na defesa indireta.

O dever de veracidade e o dever de o réu se manifestar precisamente sobre os fatosnarrados na petição inicial impedem que o réu aceite o fato constitutivo na defesa indiretae o negue através de defesa direta, bem como eliminam a necessidade de o juiz considerarfatos que poderiam ser contestados apenas por abuso, o que torna racional a prestaçãojurisdicional.

Por isso mesmo, como antes adiantado, caso o réu aceite o fato constitutivo na defesaindireta e conteste-o na defesa direta, o juiz, considerando o dever de a parte expor osfatos conforme a verdade, deve determinar o esclarecimento da defesa, até porque o deverde esclarecimento nada mais é do que um desdobramento do dever de veracidade. A partirdaí, conforme dito no item anterior, caberá a concessão da tutela da evidência.

3. Tutela da Evidência Baseada na Técnica da Prova dos Fatos Constitutivos

3.1. A Prova Documental dos Fatos Constitutivos

Lembre-se, antes de tudo, que o objeto da prova são as afirmações de fato e não os fatosem si. O fato não pode ser qualificado de “certo”, “induvidoso” ou “verdadeiro”; ele apenasexiste ou não existe. Como o direito existe independente do processo, esse serve paradeclarar que o direito afirmado existe. Isto é, prova-se a afirmação de fato para que sedeclare que o direito afirmado existe. A sentença de cognição exauriente limita-se adeclarar a verdade de um enunciado, ou melhor, que a afirmação de que o direito existe é,de acordo com as provas produzidas e o juízo de compreensão do juiz, verdadeira. Emoutras palavras, o direito que o processo afirma existir pode, no plano substancial, nãoexistir e vice-versa. Não se prova que o direito existe, mas sim que a afirmação de que odireito existe é verdadeira, declarando-se a existência do direito (coisa julgada material).

Como a tutela da evidência se funda na incontrovérsia ou na evidência dos fatosconstitutivos, antes de mais nada é necessário precisar o conceito de prova documental.Ressalte-se que a prova pericial ou a prova testemunhal realizada mediante oprocedimento da “produção antecipada da prova” (art. 381, CPC), não raramenteconfundidas com a prova documental, constituem apenas provas pericial ou testemunhal“documentadas”. Na realidade, o chamado “documento” que, por exemplo, contém adeclaração testemunhal feita antecipadamente, prova apenas a declaração testemunhal enão a afirmação de fato que tal declaração pretende provar. A prova testemunhalantecipada permite a dedução da veracidade da afirmação do fato a partir da declaraçãotestemunhal, constituindo fonte secundária de prova.

O testemunho é ato humano que serve para demonstrar uma afirmação de fato,enquanto o (verdadeiro) documento é uma coisa (embora também produto da atividadehumana)51 capaz de representar um fato.52 O testemunho, como ato humano, nãodemonstra, por si só, um fato, enquanto o documento, que é uma coisa, é suficiente pararepresentá-lo.

É importante advertir, no que diz respeito ao documento particular, quer seja escrito eassinado ou somente assinado, que as declarações dele constantes presumem-severdadeiras em relação ao signatário (art. 408, CPC). Se o documento contiver declaraçãode ciência de determinado fato, o documento particular prova a ciência, mas não o fatodeclarado, incumbindo ao interessado em sua veracidade o ônus de prová-lo (art. 408,parágrafo único, CPC). A declaração de ciência, como é óbvio, não prova o fato em si.Prova apenas que alguém tem conhecimento de como o fato se passou. Por isto, cabe àparte interessada requerer a prova do fato, surgindo como necessária outra modalidadede prova capaz de demonstrar a sua ocorrência. A declaração de ciência, assim, não éprova suficiente para a tutela da evidência.

O documento público gera presunção de autenticidade, ao passo que o particularnecessita do reconhecimento da parte contrária para ser considerado autêntico. De acordocom o art. 430, a falsidade deve ser suscitada na contestação, na réplica ou no prazo dequinze dias contado a partir da intimação da juntada do documento aos autos. O SuperiorTribunal de Justiça já decidiu que, uma vez contestada a assinatura do documentoparticular, cessa-lhe a fé, cabendo o ônus da prova à parte que o produziu, durante ainstrução da causa.53 Tendo em vista que a tutela da evidência, mediante a presentetécnica, exige prova dos fatos constitutivos, é correto afirmar que o documento apontadocomo falso não é suficiente para a sua concessão.

3.2. A Necessidade de Tutela da Evidência no Procedimento Monitório

O legislador apostou no procedimento monitório como técnica destinada a propiciar aaceleração da realização dos direitos e, assim, capaz de evitar o custo do procedimentocomum. Partindo da premissa de que um direito evidenciado mediante “prova escrita” emregra não deve sofrer contestação, o procedimento monitório objetiva, através da inversãodo ônus de instaurar a discussão do direito, desestimular as defesas infundadas e permitira tutela do direito sem as delongas do procedimento comum.

Mas o procedimento monitório, para realmente ter efetividade, depende doinstrumento da tutela da evidência para inibir as defesas infundadas. Sem a tutela daevidência o procedimento monitório não alcançará os fins sonhados pelo legislador.Apenas a possibilidade desta tutela poderá desestimular os embargos infundados eprotelatórios.

Por outro lado, nada impede que a tutela da evidência, baseada na prova do fatoconstitutivo e em defesa infundada, seja admitida no curso do procedimento comum, umavez que também nada impede que o autor, munido de prova documental, pretendarealizar o seu direito mediante este procedimento e seja surpreendido por uma defesainfundada.

3.3. A Diferença entre Prova Escrita, Prova Suficiente para a Tutela da Evidência eProva Suficiente para a Procedência do Pedido

O conceito de “prova escrita”, estabelecido pela doutrina e pela jurisprudência italianaa partir dos arts. 633 a 636 do Código de Processo Civil, é singular.54 A doutrina brasileira,ao tratar do procedimento monitório e da “prova escrita”, sempre acatou as formulaçõesitalianas.55 O conceito de prova escrita formulado a partir do código italiano é realmentediverso do conceito de prova documental. Como escreve Garbagnati, “é comum najurisprudência a afirmação de que a ‘prova escrita’ do direito do autor pode serconstituída, na linha do art. 633, por qualquer documento merecedor de fé quanto à suaautenticidade e eficácia probatória. Mas não se esclarece, com isto, se um escrito privadonão reconhecido e não autenticado deva, ou possa, considerar-se merecedor de fé ...”.56 Naverdade, a doutrina italiana entende que o documento particular não reconhecidoconstitui prova escrita, mas não costuma explicar as razões desta conclusão.

De acordo com o art. 411, III, do Código de Processo Civil, considera-se autêntico odocumento quando não houver impugnação da parte contra quem foi produzido odocumento. Nos termos do art. 412, o documento particular de cuja autenticidade não seduvida prova que o seu autor fez a declaração que lhe é atribuída. Porém, este documento– ainda que não reconhecido pela parte contra a qual foi produzido – é considerado provasuficiente para se afirmar o direito de exigir o pagamento de quantia, a entrega de coisafungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel e o adimplemento de obrigação defazer e de não fazer – de acordo com o art. 700 do Código de Processo Civil brasileiro. Podeser considerado prova escrita porque, embora não reconhecido – nem mesmo tacitamente–, é merecedor de fé. Ora, se conforme o enunciado id quod plerumque accidit asassinaturas são genuínas, o juiz também deve considerar autêntica, de acordo com aexperiência comum, a assinatura do documento não reconhecido em relação ao qual,dada a falta do contraditório, ainda não pôde operar a regra do reconhecimento tácito.57

No caso de apresentação de embargos à ação monitória, contestando o embargante aautenticidade da assinatura, o processo deverá caminhar de acordo com a regraprobatória do art. 429, II, do Código de Processo Civil, recaindo sobre o embargado o ônusda prova. Nesta hipótese, como é óbvio, o documento particular não reconhecido peloembargante não é prova suficiente para a improcedência dos embargos. Como explicaGarbagnati, “a parte credora tem o ônus de pedir a ‘verificação’ judicial do escrito privado,

colocado como fundamento do decreto injuntivo e desconhecido pelo réu; com efeito, se opretenso credor não prova o fato constitutivo do seu direito, a oposição deve ser acolhida,porque em um processo de conhecimento comum o juiz não tem o poder de fundar a suadecisão em um escrito privado desconhecido, cuja autenticidade não tenha sido, emseguida ao ato de desconhecimento, formalmente ‘verificada’ de acordo com a lei.”58

A hipótese do documento particular não reconhecido bem demonstra a diferença entreprova escrita, prova suficiente para a tutela da evidência (no procedimento monitório ouno procedimento comum) e prova suficiente para a procedência do pedido noprocedimento comum ou para a improcedência dos embargos à ação monitória.

A tutela da evidência com base em prova do fato constitutivo e em defesa infundadasomente é possível, como é óbvio, após a ouvida do réu. Se o autor pretender provar o seucrédito mediante documento particular e o réu alegar a sua falsidade na contestação, nãoé possível a tutela da evidência.

É ainda interessante outro exemplo. De acordo com o art. 2.710 do Código Civil italiano,os livros obrigatórios e outras escrituras contábeis, regularmente mantidos, somentepodem constituir prova a favor de um empresário contra outro e nas relações inerentes aoexercício da empresa. Apesar da dicção do art. 2.710 do Código Civil italiano, o art. 634 doCódigo de Processo Civil considera prova escrita os extratos autênticos das escriturascontábeis, ainda que a “ação monitória” seja proposta por um empresário – que exerceuma atividade comercial – contra uma pessoa que não seja comerciante.59

A doutrina que admite que os extratos autênticos das escrituras contábeis podemconstituir prova escrita em uma demanda proposta por um comerciante contra umapessoa que não exerce atividade comercial, seguramente não pode admitir que esta prova ésuficiente para a tutela da evidência (no procedimento monitório ou no procedimentocomum) e, por muito mais razão, para a procedência do pedido no procedimento comum oupara a improcedência dos embargos na ação monitória.

Se o devedor não comerciante afirma que não adquiriu a mercadoria cujo preço estásendo exigido com base em um extrato autêntico de escritura contábil, descabe a tutela daevidência – ou a antecipação da execução – por ausência de prova do fato constitutivo.Ora, o extrato contábil não é suficiente para provar a compra e venda, no procedimentocomum ou no procedimento monitório, porque a regra, tanto no direito brasileiro60

quanto no direito italiano, é a de que os livros comerciais fazem prova no litígio entrecomerciantes.

Na verdade, o extrato contábil, justamente porque não prova o fato constitutivo dodireito de crédito, não é prova suficiente para a tutela da evidência (no procedimentomonitório ou no procedimento comum) nem para a procedência do pedido noprocedimento comum ou para a improcedência dos embargos à ação monitória.61

3.4. A Tutela da Evidência e a Tutela Antecipada no Procedimento Monitório

Como é sabido, o procedimento monitório foi pensado como alternativa para atribuirmaior tempestividade do processo, chegando a ser visto como tutela jurisdicionaldiferenciada.62 O procedimento monitório tem por fim permitir a formação do títuloexecutivo sem as delongas do procedimento comum. O seu objetivo, em outras palavras, éacelerar a realização do direito.

De acordo com o art. 700 do Código de Processo Civil, a ação monitória pode serproposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de títuloexecutivo, ter direito de exigir do devedor capaz: i) o pagamento de quantia em dinheiro;�

ii) a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel;�e iii) oadimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer.�No procedimento monitório,estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá a expedição de mandadode pagamento, de entrega de coisa ou para execução de obrigação de fazer ou de nãofazer, constituindo-se o título executivo judicial no caso de não oposição ou de rejeição deembargos.

Exige-se para o cabimento da ação monitória prova escrita que sustente o crédito e quenão constitua título executivo. Uma vez deferida a expedição do mandado e citado odevedor, esse poderá: i) atender à determinação judicial, hipótese em que pagaráhonorários de cinco por cento sobre o valor da causa e ficará isento do pagamento decustas; ii) permanecer inerte, quando será constituído, “de pleno direito o título executivojudicial”; ou iii) apresentar embargos, caso em que será instaurado um procedimento decognição plena e exauriente para discutir o direito afirmado pelo credor (arts. 701 e 702,CPC).

No procedimento monitório é empregada a técnica da cognição exauriente secundumeventum defensionis, já que, uma vez apresentados os embargos – em que o réu poderáalegar qualquer matéria que pode ser deduzida como defesa no procedimento comum(art. 702, § 1.º, CPC) –, a cognição será exauriente.

Os embargos, a princípio, são processados nos mesmos autos da ação monitória edispensam a prévia segurança do juízo (art. 702, CPC). Na hipótese de não apresentação deembargos, o devedor, após a formação do título executivo, somente poderá alegar asmatérias que podem ser deduzidas para a impugnação do cumprimento da sentença, nostermos do Título II do Livro I da Parte Especial.

O procedimento monitório, ao supor que a ausência de iniciativa do réu confirma aexistência do direito que já era aceito como provável (em virtude da prova escrita), apenasreafirma a tão sentida necessidade de tratamento diferenciado aos direitos que podem serevidenciados de pronto. Parte-se da premissa de que a prova escrita e a inércia dodevedor são suficientes para a formação do título executivo. É preciso ter em mente que otítulo executivo judicial, formado pelo procedimento monitório, parte da existência deprova escrita capaz de demonstrar, em alto grau de probabilidade, a existência do direito.O legislador, quando criou o procedimento monitório, aceitou o risco que a defesa correem nome da necessidade de tutela adequada dos direitos.

Contudo, o procedimento monitório somente terá efetividade se tiver um mecanismocapaz de conter o abuso de direito de defesa e, desta forma, os embargos protelatórios.Este mecanismo consiste na tutela da evidência, única capaz de permitir que o credor queprova os fatos constitutivos do seu direito não seja prejudicado pelo tempo necessário àelucidação de alegações infundadas do devedor.

Os embargos, que nada mais são do que meio de impugnação, poderiam ser simplescontestação não fosse a ideia de se inibir a inércia do devedor, exigindo-se dele apropositura dos embargos para o desenvolvimento do contraditório. Assim, seriacompletamente desrazoável a tese que apontasse para a impossibilidade da tutela daevidência sob o argumento de que o art. 311, I, do Código de Processo Civil fala em abusode direito de defesa e em manifesto propósito protelatório do réu.

Não é muito difícil perceber a realidade: o devedor exerce a sua defesa através deembargos ao mandado, não estando livre de se ver tentado a dela abusar. Com efeito,também é possível que o réu queira se valer dos embargos apenas para protelar arealização do direito afirmado pelo autor. Ora, o intuito protelatório, no procedimentomonitório, evidentemente não pode ser desconsiderado, especialmente porque este

procedimento visa a tratar de forma diferenciada um direito evidente.

A tutela da evidência – no procedimento monitório – somente é cabível quando háprova documental do fato constitutivo do direito (não bastando qualquer prova escrita,conforme ficou demonstrado no item anterior) e os embargos são infundados.

De outra parte, é possível que o autor precise desde logo do bem da vida perseguidosob pena de sofrer dano – como também pode acontecer no procedimento comum. Noprocedimento monitório é certamente possível a tutela antecipada fundada no art. 300, àsemelhança do que ocorre no direito italiano diante da norma do art. 642, segunda parte,do Código de Processo Civil.63

À primeira vista, muitos poderão não compreender a razão para a tutela antecipadabaseada em perigo de dano no procedimento monitório, imaginando que a tutela cautelarde arresto é suficiente para proteger o credor. Para que se perceba o motivo para a tutelaantecipada é importante lembrar que a antecipação de pagamento de soma pode serimprescindível para proteger um bem não patrimonial. É a hipótese do ressarcimentoantecipado para aliviar um estado de necessidade causado pelo dano.64

Nestes casos, a realização do direito de crédito tem por escopo a tutela de um direitonão patrimonial, como por exemplo, o direito à saúde. O objeto da tutela não é o direito decrédito, mas o direito que lhe é conexo. A tutela não se destina a assegurar o juízo ou aviabilidade da realização do direito de crédito, mas a realizar antecipadamente o créditopara permitir a efetiva tutela de um direito que lhe é conexo e merecedor de especialproteção. Note-se, de fato, que a antecipação de pagamento de soma fundada no art. 300 émedida idônea para impedir prejuízo irreparável a um direito conexo ao direito decrédito,65 ao passo que o arresto (cautelar) é a medida capaz de assegurar a viabilidade darealização do direito de crédito.

Realizadas estas explicações, fica fácil admitir, no procedimento monitório, não apenasa tutela da evidência (art. 311, CPC) – lastreada na prova do fato constitutivo e emembargos infundados –, mas também a tutela antecipada de soma fundada em perigo dedano (art. 300, CPC).

3.5. A Execução Imediata no Caso de Improcedência dos Embargos ao MandadoMonitório

Como diz Proto Pisani, não apenas estudos clássicos, mas especialmente o bom sensoindica que o processo de cognição plena e exauriente tem um custo altíssimo para aspartes e para a administração da justiça. Em todos os casos em que é afirmado um direitoe falta uma contestação séria o custo do procedimento comum revela-se injustificado ouexcessivo; a realização plena e antecipada do princípio do contraditório funciona no vazioe ainda apresenta o risco: i) de servir de estímulo para contestações ou resistências semqualquer consistência, apresentadas pelo réu que sabe não ter razão apenas com o intuitode lucrar com o tempo necessário para a conclusão do processo; e ii) de abarrotar, além damedida, a administração da justiça com processos de conhecimento inúteis, aumentando oseu número, paralisando o seu desenvolvimento e de qualquer forma alongando a suaduração.66

Se o objetivo do procedimento monitório é evitar o “custo” do procedimento comumquando esse não é justificado por uma defesa plausível, e para tanto a tutela da evidênciaé imprescindível, é importante atentar para a possibilidade da execução imediata napendência do recurso de apelação interposto contra a sentença de improcedência dosembargos.

Qualquer tese que sustentasse que a execução só é possível após o trânsito em julgadoda sentença de improcedência dos embargos estaria em desconformidade com o espíritodo procedimento monitório. Ora, se o escopo deste procedimento é abreviar o temponecessário para a formação do título executivo, não há lógica em subordinar a realizaçãodo direito ao trânsito em julgado da sentença de improcedência dos embargos.

O código de 2015 deixou clara a possibilidade da execução na pendência da apelaçãointerposta contra a sentença de improcedência dos embargos. O art. 702, § 8.º, afirma que“rejeitados os embargos, constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial,prosseguindo-se o processo em observância ao disposto no Título II do Livro I da ParteEspecial, no que for cabível”. A norma não diz que, transitada em julgado a sentença derejeição dos embargos, “constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial,prosseguindo-se o processo...”. Também não afirma que, rejeitados os embargos,constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial, que terá sua eficácia executivasubordinada ao trânsito em julgado da sentença.

Ao contrário, o art. 702, § 4.º, afirma que a oposição dos embargos suspende a eficáciada decisão que determina a expedição do mandado “até o julgamento em primeiro grau”.Portanto, se com a apresentação dos embargos é suspensa a eficácia executiva, essa restasubordinada ao “julgamento em primeiro grau”. Na hipótese de improcedência dosembargos é reestabelecida a eficácia executiva da decisão de expedição do mandado, quepassa a autorizar a execução imediata. É nesse sentido que deve ser compreendido o § 8.ºdo art. 702 quando afirma que, “rejeitados os embargos, constituir-se-á de pleno direito otítulo executivo judicial”. Note-se que a sentença de improcedência evidentemente não temeficácia executiva, tendo apenas carga declaratória capaz de permitir a restauração daeficácia executiva que estava paralisada pela apresentação dos embargos.

3.6. A Tutela da Evidência Mediante a Técnica Monitória (Prova do FatoConstitutivo) no Procedimento Comum

O art. 311 admite a tutela da evidência no procedimento comum com base em prova dofato constitutivo e defesa infundada. O art. 311, nos incisos I e IV, fala respectivamente em“abuso do direito de defesa” e em “prova documental suficiente dos fatos constitutivos dodireito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável”.

Quando oposta em face da prova documental dos fatos constitutivos, a defesa de méritoinfundada, ao exigir tempo para a produção de prova, faz com que a demora do processoirracionalmente conspire contra o autor. Assim, o exercício desta defesa constituirá abusode direito caso o ônus do tempo não seja invertido – mediante a tutela da evidência – emfavor do autor. Não obstante, o inciso IV do art. 311 fala em “prova documental suficientedos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerardúvida razoável”.

Frise-se que a tutela da evidência exige prova do fato constitutivo, isto é, prova que,dentro das regras probatórias que incidem no procedimento comum, seja capaz dedemonstrar o fato que constitui o direito. Assim, por exemplo, o comerciante não pode,alegando ter crédito não adimplido, obter tutela da evidência com base em extratocontábil, uma vez que esta prova não é suficiente para demonstrar o fato constitutivo.

Como é evidente, a prova do demandado “capaz de gerar dúvida razoável” não é aprova documental, ou seja, a prova capaz de demonstrar de plano o fundamento dadefesa. Essa prova seria suficiente para o julgamento antecipado do mérito em favor doréu. A tutela da evidência só tem razão de ser quando a defesa exige instrução dilatória,ou melhor, tempo do processo. De modo que a prova oposta pelo réu, para permitir atutela da evidência, além de não poder ser um documento capaz de evidenciar de plano o

fundamento da defesa, não pode ser uma prova “capaz de gerar dúvida razoável”.

Lembre-se que, no direito italiano, a antecipação da execução no procedimento comume a execução provisória na pendência da oposição apresentada em face do “decreto diingiunzione” (embargos ao mandado de pagamento) também exigem que a defesarequeira instrução dilatória, afirmando-se que a defesa não pode ser fundada em provaescrita. Diz o art. 648, I, do Código de Processo Civil italiano que, se a oposição (embargos)non è fondata su prova scritta ou di pronta soluzione, o juiz pode conceder, com“ordinanza” não impugnável, a execução provisória do “decreto di ingiunzione”, caso essajá não tenha sido concedida com base no art. 642.67

Melhor seria que o art. 648, I, ao invés de falar em prova escrita, houvesse aludido a“prova documental”. Como já foi explicado, a “prova escrita”, suficiente para a concessãodo “decreto di ingiunzione” ou do mandado de pagamento, não se confunde com a “provadocumental”. A prova necessária para a concessão da tutela da evidência, assim como aprova capaz de demonstrar a defesa de plano, e assim impedir a concessão da tutela daevidência, é a prova documental. Em outros termos: a prova escrita, suficiente parademonstrar a defesa de plano, não é a mesma que pode fundar o “decreto di ingiunzione”ou o mandado de pagamento. Como elucida Garbagnati, “prova ‘escrita’ é qualquerdocumento escrito idôneo para provar, nos termos do art. 2699 et seq. do CC, ainexistência do fato constitutivo do direito do credor, e assim o fundamento da relativaexceção (em sentido lato) do devedor, ou mesmo a existência dos fatos extintivos ouimpeditivos (pagamento, prescrição etc.), deduzidos pelo devedor em sustentação das suasexceções (em sentido estrito); portanto, uma escritura privada com subscrição nãoautenticada, se pode servir de prova escrita com base no art. 633 et seq, não contém eficáciaprobatória para os efeitos do art. 648, primeira parte, quando o credor, constituindo-se naoposição (nos embargos), não tenha reconhecido a sua autenticidade”.68

Como se vê, além de a defesa de mérito não poder ser baseada em documento, énecessário que seja infundada ou não lastreada em prova ou argumento que exija prova –capaz de gerar dúvida razoável –, embora seja correto admitir que, em regra, a defesaapresentada diante da prova dos fatos constitutivos e não baseada em documento ou emprova capaz de gerar dúvida razoável seja infundada.

3.7. A Tutela da Evidência Quando a Ação Impõe Entrega de Coisa, Fazer ou Não-Fazer

É importante lembrar que os artigos 536, 537 e 538 do Código de Processo Civilobjetivam atribuir efetividade ao processo69 nos casos em que se almeja prestação defazer ou de não-fazer ou a entrega de coisa.70 Não há lógica em não admitir tutela daevidência nestas ações quando o direito do autor está evidenciado e a defesa do réurequer instrução dilatória e se mostra infundada.

Na realidade, a tutela da evidência, tratando-se de entrega de coisa e prestação de fazere de não fazer, é viável no procedimento comum e no procedimento monitório. A tutela daevidência cabe no procedimento monitório quando há prova documental dos fatosconstitutivos e no procedimento comum quando, de lado a hipótese de prova documental,os fatos constitutivos não são contestados ou são implicitamente aceitos na defesa demérito indireta. Em todos os casos, é claro, a defesa não pode estar baseada emdocumento e deve ser infundada, ou seja, não pode estar lastreada em provas ouargumentos capazes de gerar dúvida razoável.

4. A Tutela da Evidência Fundada em Prova do Fato Constitutivo e em Defesa DiretaInfundada

4.1. Defesa Direta Infundada

Há situações excepcionais em que se pode ter defesa de mérito direta infundada capazde justificar a tutela da evidência. A defesa de mérito direta deve exigir instruçãodilatória, ou seja, tempo do processo.

Quando os fatos constitutivos estão evidenciados – embora não definitivamenteprovados – e a defesa direta carece de fundamento para colocá-los em dúvida, há defesade mérito direta infundada ou destituída de seriedade. A prova dos fatos constitutivos,ainda que não documental, gera forte convicção, o que significa que a defesa direta, paraabalá-la, deve ser fundada. Mais uma vez se tem uma espécie de presunção da existênciado direito, a atribuir ao réu o ônus da argumentação fundada, ou melhor, o ônus daargumentação capaz de demonstrar que a prova produzida pelo autor poderá ser negadapela instrução. Em caso contrário, a defesa deve ser considerada infundada ouimprestável para retirar a força da prova do autor.

Frise-se que a tutela da evidência, neste caso, não se funda em defesa de méritoindireta infundada, embora nada impeça que o réu, ao lado da defesa direta, articule aprimeira forma de defesa. O que importa perceber, nesta situação, é que a defesa demérito indireta infundada não é suficiente para permitir a tutela da evidência, uma vezque os fatos constitutivos são contestados.

O art. 311, IV do Código de Processo Civil, que se aplica à hipótese de prova documentaldos fatos constitutivos e prova do réu incapaz de gerar dúvida razoável sobre os fatosimpeditivos, modificativos ou extintivos, igualmente fundamenta a tutela da evidênciaquando há prova (não documental) dos fatos constitutivos e a defesa do réu é incapaz decolocá-los em dúvida. Não fosse assim, ou seja, se a prova dos fatos constitutivos tivesseque ser documental strictu sensu – documento –, não haveria motivo para cogitar de prova(in)capaz de gerar dúvida razoável sobre os fatos constitutivos. A única alternativa seriainvocar a falsidade do documento. Sucede que os fatos constitutivos também podem serevidenciados mediante prova (pericial ou testemunhal) documentada – e não apenas pordocumento – e a sua negação pode ser baseada em prova ou argumento que exijainstrução, porém incapazes de trazer dúvida razoável.

4.2. A Tutela da Evidência Baseada em Prova Emprestada

A doutrina diz que a prova emprestada é aquela que, tendo sido utilizada como provaem determinada processo, é transportada na forma documentada para outro, de idênticaou diversa natureza.71

As provas pré-constituídas, como o documento público, não se confundem com a provaemprestada, não importando se já foram utilizadas em um processo anterior entre asmesmas partes. Estas provas são formadas à distância do juízo e, desta forma, não podemser qualificadas de emprestada simplesmente pelo fato de já terem sido utilizadas emalgum processo. Apenas as provas que são formadas em um processo anterior é quepodem ser ditas emprestadas.

Para que uma prova, formada em determinado processo, possa ser utilizada de formaeficaz em outro, é necessário que tenha sido formada mediante a participação emcontraditório das mesmas partes que figuram no processo para o qual deve sertransportada.72 A eficácia da prova depende de que as partes do processo para o qual deveser transportada tenham participado do processo no qual foi formada mediante umcontraditório efetivo e adequado.

Se a tutela da evidência é admissível quando há prova documental do direito e a defesa

é infundada, é também razoável admiti-la quando o autor demonstra o fato constitutivodo seu direito mediante prova pericial ou testemunhal emprestada e a defesa – indireta oudireta – é infundada. Em outras palavras, se o autor pode demonstrar o fato constitutivomediante prova emprestada e a defesa é infundada, não há motivo para não admitir atutela da evidência.

Não há dúvida de que a prova pericial ou a prova testemunhal não têm o mesmo valorprobatório da prova documental; contudo, a prova emprestada é suficiente para tornar umdireito evidente e, assim, legitimar a sua pronta tutela. Nesta hipótese, a defesa infundada,capaz de legitimar a tutela da evidência, pode ser indireta ou direta. Lembre-se que o réupoderá requerer contraprova para tentar demonstrar a não existência dos fatosconstitutivos.

4.3. A Tutela da Evidência na Hipótese de Prova do Núcleo do Fato Constitutivo e deContestação Infundada dos seus Elementos Secundários

A doutrina distingue o núcleo do fato constitutivo dos seus elementos secundários,afirmando que cabe ao autor provar o primeiro, enquanto que os segundos sãopresumidamente aceitos como existentes.73 Para que fique clara a premissa a ser firmada,é oportuno recordar a seguinte passagem da doutrina de Moniz de Aragão: “assim, se oautor alega um negócio jurídico, terá de provar os fatos nucleares de que se origina, masnão terá de demonstrar, por exemplo, que o tabelião procurado para lavrá-lo agiu noperfeito exercício de suas atribuições, que o coparticipante é capaz, subscreveu-o e quis oato etc. Esses fatos, por serem presumidamente aceitos como existentes, só terão de serdemonstrados se postos em dúvida. Mas, se o fato estiver incluído ‘no tipo’, cumprirá aoautor demonstrá-lo a despeito de normalmente ser tido como existente por força daaludida presunção”.74

Como está claro, os denominados elementos secundários do fato constitutivo, se postosem dúvida pelo réu, devem ser provados pelo autor. Porém, o réu pode se sentir tentado apôr em dúvida um fato secundário – que goza de presunção de existência – apenas paraprotelar o momento da tutela do direito.

Tratando-se de tutela da evidência, tal possibilidade não pode ser desconsiderada. Éque o fato secundário, quando o núcleo do fato constitutivo está provado, goza depresunção, que evidentemente não pode ser elidida por qualquer alegação. Aliás, sequalquer alegação atinente aos fatos secundários fosse capaz de significar que o autordeve arcar com o tempo necessário para a elucidação do fato secundário contestado,estaria aberto o caminho para o demandado negar qualquer fato desta espécie, ainda quesem qualquer fundamento ou seriedade, apenas para protelar a realização do direitoevidente.

Assim, cabe ao juiz indagar sobre a seriedade da defesa que investe contra fatosecundário, devendo conceder a tutela da evidência quando a defesa for infundada e,desta forma, não merecer credibilidade suficiente para adiar a realização do direito. Nestahipótese, não obstante a concessão da tutela da evidência com base em prova dos fatosnucleares do direito, o processo prosseguirá para que o autor possa provar os elementossecundários do fato constitutivo.

Sublinhe-se que a relação entre direito evidente e defesa infundada ou inconsistentenão permite definir um grau de convicção suficiente. Não obstante, é certo que os casosem que os fatos constitutivos são admitidos ou são provados por meio de documento têmmaior capacidade de permitir a formação de convicção suficiente à tutela da evidência.Isto, é claro, no que diz respeito ao pressuposto “direito evidente”, na medida em que afragilidade da defesa está relacionada com a alegação de fatos impeditivos, modificativos

ou extintivos ou com a negação dos fatos constitutivos ou mesmo dos seus elementossecundários.

5. Justificativa da Tutela da Evidência Baseada em Defesa Indireta Infundada

5.1. O Critério da Distribuição do Ônus da Prova como Vetor para a Repartição doTempo do Processo

O art. 373 do Código de Processo Civil, ao estabelecer que, em relação ao fatoconstitutivo, o ônus da prova75 incumbe ao autor e, quanto ao fato impeditivo,modificativo ou extintivo, este ônus é do réu, permite que se determine, com facilidade,qual a parte que precisa da instrução da causa e, por consequência lógica, do tempo doprocesso.

Se o código afirma que cabe ao réu provar os fatos impeditivos, modificativos ouextintivos, o mesmo critério deve servir de base para a distribuição do tempo do processo,pois aí o réu precisa não apenas da instrução da causa, mas também do tempo doprocesso.

Se os fatos constitutivos são incontroversos, não há razão para o autor ter que sofrer osmales do tempo que o réu utilizará para tentar demonstrar os fatos que alegou na defesaindireta. Em outras palavras: ao autor não pode ser imposto o peso do tempo que serveunicamente ao réu.76

Scarselli, analisando esta questão à luz do art. 2.697 do CC italiano, argumenta que, namedida em que este artigo77 é visto como uma norma ditada pelo bom senso para umajustiça distributiva dos ônus probatórios, pode ser lido extensivamente como a disposiçãoque reparte entre o autor e o réu os ônus em geral da atividade instrutória processual, osquais não dizem respeito somente ao aspecto estático da prova, mas também àqueledinâmico do tempo necessário à sua produção. Assim, como é injusto que ao autor venhaimposto o ônus da prova de todos os fatos controversos para obter o acolhimento dademanda, é também injusto que a este venha sempre atribuído o tempo da duração doprocesso sem a possibilidade de uma repartição imediata,78 que no direito brasileiro podeser feita mediante a tutela da evidência.

5.2. O Princípio de que o Tempo do Processo Deve ser Suportado pela Parte queNecessita da Instrução da Causa

A tutela da evidência permite a realização antecipada do direito, evitando que o tempodo processo seja utilizado pelo réu em prejuízo do autor. Quando baseada na técnica dareserva da cognição da defesa de mérito indireta infundada, responde precisamente aoprincípio pelo qual o tempo do processo deve se voltar contra a parte que tem necessidadeda instrução da causa para demonstrar a sua alegação.79 Com efeito, se os fatosconstitutivos são incontroversos e é apresentada uma defesa de mérito indireta infundadaque requer instrução dilatória, é racional que o réu suporte o tempo que correrá em seubenefício.

A tutela da evidência, exatamente porque abre oportunidade para a generalização deum mecanismo de distribuição do tempo do processo, evita que se veja na aceleração daexecução qualquer privilégio atribuído a uma determinada posição social em detrimentode outra.

É importante recordar que a teoria dos títulos executivos extrajudiciais, atrelando-se àtécnica da reserva de todas as defesas do devedor, foi fundamental para viabilizar a

estruturação do processo de execução à margem do processo de conhecimento.80 Melhorexplicando: a reserva da cognição das defesas do devedor para os embargos do executadofoi o que tornou possível a execução apenas a partir do título executivo extrajudicial.

De modo que o conceito de título executivo extrajudicial e a individualização da açãode execução constituem genuíno exemplo de distribuição do ônus do tempo da justiçaentre o detentor do título extrajudicial e o devedor.81 É o que explica Scarselli: “Se aqualidade dos títulos executivos extrajudiciais decorre do fato de que estes representam aprova dos fatos constitutivos, então parece indiscutível que para o ordenamento jurídicoesta prova é pressuposto suficiente para a instauração da execução. Nestes termos, ostítulos executivos extrajudiciais – de cuja legitimidade ninguém nunca duvidou –demonstram melhor do que qualquer outro instituto processual a existência do princípiopelo qual o tempo do processo deve ser suportado pela parte que tem necessidade dainstrução da causa, porque evidenciam que, em regra, o ordenamento supõe suficiente aprova dos fatos constitutivos para antecipar a execução à sentença de cogniçãoexauriente”.82

A existência da técnica dos títulos executivos extrajudiciais demonstra a correção doprincípio de que o tempo do processo deve ser suportado pela parte que necessita dainstrução da causa.83 Aliás, a relação da técnica dos títulos executivos extrajudiciais comeste princípio é reafirmada quando se estabelece que “os embargos à execução não terãoefeito suspensivo” (art. 919, CPC), deixando-se ao juiz a possibilidade de, a requerimentodo embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando, estando a execução jágarantida por penhora, depósito ou caução suficientes, houver probabilidade de êxito dosembargos e possibilidade de o prosseguimento da execução causar dano ao executado –obviamente que significativo.

Este sistema executivo dá valor à evidência do direito, representado pelo títuloexecutivo extrajudicial, assim como ao conteúdo e ao significado da defesa, já que asuspensão da execução resta na dependência da relevância dos fundamentos dosembargos e de o prosseguimento da execução poder causar dano.

Quem evidencia um direito deve ter à sua disposição – no procedimento comum oumonitório – técnicas que correspondam a esta situação, ou seja, técnicas (antecipatórias)que permitam a aceleração da realização do direito evidenciado. A falta de predisposiçãodestas técnicas certamente agrava o dano marginal que é sempre imposto ao autor quetem razão e nega o princípio de que o autor que evidencia o seu direito não pode serprejudicado pelo tempo necessário à instrução de uma defesa abusiva.

Porém, através da técnica dos títulos executivos84 muitas vezes são privilegiadasdeterminadas posições sociais sem que ocorra uma precisa visualização do benefíciooutorgado. Os cultores do direito processual meramente técnico não poucas vezes deixamde se importar com a “substância das coisas”. É interessante recordar, de fato, que aquelesque condenaram os processos sumários jamais rejeitaram a teoria dos títulos de crédito,abstração criada para que os empresários pudessem deixar de lado o procedimentocomum para usar do mais sumário de todos os procedimentos que a doutrina jáconcebeu.85

Proto Pisani, além de expressamente denunciar que os títulos executivos extrajudiciaissempre privilegiaram determinados grupos sociais e seus respectivos direitos,86 propõe oalargamento da técnica dos títulos extrajudiciais a todas as hipóteses em que umdocumento idôneo seja capaz de fornecer um grau de probabilidade consideradosuficiente, independente do peso político dos sujeitos que deles poderão usufruir.87

Note-se, entretanto, que a tutela da evidência mediante a técnica da reserva dacognição da defesa de mérito indireta infundada, porque atípica e genérica, respondeprecisamente à exigência de distribuir o tempo do processo sem privilegiar umadeterminada posição.

Perceba-se que, se é preciso distribuir o tempo do processo de acordo com anecessidade da instrução probatória, esta distribuição pode ser feita por meio daconcepção de um procedimento especial ou de uma técnica que atue no interior doprocedimento comum. O procedimento especial, contudo, parte do pressuposto de queexiste uma situação específica que requer tratamento processual diferenciado. Entretanto,se todos concordam que o autor não pode pagar pelo tempo que serve ao réu, não hácomo supor que apenas algumas situações específicas podem exigir técnica que permita adistribuição do ônus do tempo do processo. Melhor explicando: a necessidade dedistribuição do ônus do tempo processual não constitui situação especial, mas sim algoabsolutamente comum a toda e qualquer situação de direito substancial, motivo pelo qualo procedimento comum não pode deixar de ser dotado de técnica processual capaz depermitir a distribuição do tempo.

Ao se admitir a distribuição do ônus do tempo somente em procedimentos especiaisestará se tratando de forma diferenciada apenas determinadas situações de direitosubstancial, esquecendo-se que a inversão do ônus do tempo pode ser necessária diante dequalquer caso conflitivo concreto. Nesta dimensão, tal tratamento diferenciado constituievidente privilégio discriminador, obrigando a ver que a tutela da evidência com base nareserva da cognição da defesa de mérito indireta infundada é imprescindível para ademocratização do processo civil.

5.3. O Processo não Pode Prejudicar o Autor que Tem Razão

O princípio de que “la durata del processo non deve andare a danno dell’attore che haragione”, analisado por Chiovenda – em antigo ensaio intitulado “Sulla perpetuatioiurisdictionis”88 – a partir do princípio geral segundo o qual “la necessità di servirsi delprocesso non deve tornar a danno di chi è costretto ad agire o difendersi in giudizio”,objetiva demonstrar que o processo deve dar ao autor tudo aquilo e precisamente aquiloque ele tem o direito de obter.

Este princípio obviamente não pode ser compreendido à distância da ideia de que otempo do processo deve ser suportado pela parte que necessita da instrução da causa.Essa ideia explicita algo fundamental para a concretização do princípio, na medida emque a distribuição do tempo de acordo com o ônus da produção da prova é indispensávelpara que o processo não cause dano ao autor que tem razão ou para que lhe dêexatamente o que tem o direito de obter.89

Afirma-se que o processo prejudica o autor que tem razão quando não lhe dá, apesarda sentença de procedência transitada em julgado, o bem da vida a que tem direito. É quedurante o curso do processo, como é sabido, podem surgir situações – como a dissipaçãodos bens que seriam objeto da execução – que impeçam ao autor obter aquilo que aprópria sentença reconheceu ser seu direito.

Entretanto, ainda que nenhuma situação anômala possa colocar em risco o direito doautor, a simples duração do processo, eliminando a possibilidade de o autor poder verrealizado imediatamente o seu direito, é fonte de prejuízo. Neste sentido se diz que oprocesso sempre causa um dano “marginal” ao autor que tem razão.90 Este dano marginalsomente pode ser atenuado ou eliminado através de técnicas que permitam a distribuiçãodo ônus do tempo do processo e, assim, também através da tutela da evidência.

É por isto que o princípio de que o processo não pode prejudicar o autor que tem razãodeve ser lido à luz da ideia de que o tempo deve ser suportado pela parte que necessita dainstrução da causa. Quando o tempo é corretamente distribuído entre os litigantes, o autordeixa de ser prejudicado pela demora do processo, compreendido o prejuízo, aí, como odano que é imposto pelo tempo da “justiça” a todo autor que tem razão.

5.4. A Necessidade de Evitar o Abuso do Direito de Defesa

A tutela da evidência baseada na técnica da cognição com reserva da defesa de méritoindireta infundada, além de permitir a repartição do tempo do processo entre oslitigantes, desestimula o réu de abusar do seu direito de defesa.91

Se não basta a circunstância de a defesa indireta exigir instrução dilatória, devendo sernecessariamente infundada, a tutela da evidência certamente não tem apenas o objetivode repartir o tempo do processo entre o autor e o réu, mas também o escopo de inibir oexercício abusivo do direito de defesa. Ora, caso a realização do direito tivesse que serprotelada em virtude de uma defesa indireta infundada, o réu estaria com o campo abertopara abusar do seu direito de defesa.

Aliás, Proto Pisani argumenta, no direito italiano, que “a técnica que pode satisfazer aexigência de evitar o abuso do direito de defesa é a da ‘condenação’ com reserva dasdefesas. Com base nesta ‘condenação’, o juiz, conhecendo apenas os fatos constitutivos,profere uma tutela relativa ao mérito, remetendo a uma fase processual sucessiva acognição das defesas indiretas”.92

6. Justificativa da Tutela de Evidência na Hipótese de Defesa Direta Infundada

6.1. A Imprescindibilidade de Defesa Direta Necessariamente Fundada Diante daForça Argumentativa Implícita na Prova do Autor

Na hipótese em que o direito afirmado na petição inicial é evidenciado mediante provadistinta da documental, como acontece quando o autor se vale de prova emprestada, bemcomo no caso em que o autor prova documentalmente o núcleo do fato constitutivo e oréu nega os seus elementos secundários, também há “direito evidente”.

No caso em que o fato constitutivo é objeto da instrução dilatória e, ainda assim, estáevidenciado, evidentemente não é possível distribuir o ônus do tempo do processo a partirda ideia de que o ônus da prova é do réu. A instrução dilatória, neste caso, recairá sobre osfatos constitutivos. Não é possível aplicar o critério “da distribuição do ônus da provacomo vetor para a repartição do tempo do processo” e o “princípio de que o tempo doprocesso deve ser suportado pela parte que necessita da instrução da causa”.

Porém, como a prova realizada pelo autor faz surgir um “direito evidente”, esse direitogoza de presunção e legitima a inversão do ônus do tempo do processo. O direito evidentepossui força argumentativa implícita. Assim, especialmente porque a defesa é direta –negando apenas os próprios fatos constitutivos –, o réu tem o ônus de argumentar paradissolver a evidência do direito e, portanto, o ônus de articular uma “defesa fundada” enão uma “defesa qualquer”. Isto porque o “direito evidente” obviamente não pode serdescaracterizado por qualquer defesa direta, como aconteceria se o direito não fosseevidente. Para abalar a credibilidade do direito do autor, o réu deverá necessariamenteapresentar uma “defesa fundada”.

O réu tem o ônus de argumentar para demonstrar que o direito evidenciado nãomerece pronta tutela, assim como acontece no caso de tutela da evidência baseada na

técnica da reserva da cognição da defesa de mérito infundada. A diferença é a de que, nocaso de defesa indireta, a argumentação é dirigida a demonstrar um fato alegado naprópria defesa, ao passo que, na defesa direta, a argumentação nega o fato articulado napetição inicial.

Ora, há clara distinção entre argumentar para demonstrar algo que deve ser provado eargumentar para dissolver o que está evidenciado. Para se concluir que a defesa indireta éfundada é preciso atentar para a argumentação relacionada com os fatos nela alegados.Ao inverso, para se admitir que a defesa direta é fundada, é preciso ver se a argumentaçãonela desenvolvida tem idoneidade para descaracterizar fatos já evidenciados.

Por outro lado, se na defesa indireta o ônus da prova e, por consequência lógica, o ônusdo tempo do processo são do réu, na defesa direta o ônus da prova ainda pesa sobre oautor e, assim, a justificativa para retirar do autor e atribuir ao réu o ônus do tempoprocessual certamente é diferente da que se funda no “princípio de que o tempo doprocesso deve ser suportado pela parte que necessita da instrução da causa”.

Nesta hipótese não existe propriamente distribuição, mas sim inversão do ônus dotempo do processo. Embora o tempo seja gasto para elucidar os fatos constitutivos,justifica-se a sua inversão em razão da circunstância de a defesa não ser revestida defundamento ou seriedade capaz de colocar em dúvida a prova produzida pelo autor.

Quando os fatos constitutivos estão demonstrados através de prova emprestada ou onúcleo do fato constitutivo está positivado através de documento, a defesa direta deve serrevestida de uma argumentação capaz de abalar a convicção judicial decorrente da provajá produzida pelo demandante. Daí a razão para se falar de defesa necessariamentefundada e de inversão do ônus da argumentação em virtude da força argumentativaimplícita na prova do autor.

6.2. A Força da Prova do Autor como Critério para se ter como Abusiva a DefesaDireta Apresentada sem Fundamento Sério

Diante de prova emprestada ou de prova do núcleo do fato constitutivo, a defesadestituída de fundamento ou seriedade não pode protelar a realização do direito. É poristo que, no caso de defesa infundada, legitima-se a concessão da tutela da evidência.

É claro que a defesa é abusiva porque exige instrução dilatória e, assim, consometempo do processo e retarda a satisfação do direito. Note-se, porém, que a circunstância dea instrução ser necessária diante dos argumentos de defesa não significa que estes sejamfundados. É abusiva a defesa que protela a realização de um direito evidenciado, negandoos fatos constitutivos sem fundamento capaz de abalar a convicção decorrente da provaproduzida pelo autor.93

A tutela da evidência, nesta dimensão, colabora para inibir o exercício abusivo dodireito de defesa, voltado a extrair vantagem às custas de prejuízo ao autor que faz ver odireito que afirma como evidente.

7. A Tutela da Evidência na Dimensão dos Direitos Fundamentais Processuais

Como é sabido, o art. 5.o, XXXV, da Constituição Federal, garante o direito fundamentalà tutela jurisdicional efetiva. Não basta afirmar que todos têm direito de ação quando aorganização judiciária e os procedimentos não estão adequadamente predispostos paraviabilizar a adequada e efetiva tutela jurisdicional.94

O tempo que o Estado consome para tutelar os direitos não pode ser jogado nas costasdo autor, como se a culpa pela demora do processo fosse sua. O processo deve ter o seutempo igualitariamente distribuído entre as partes. Aliás, a melhor doutrina italianaadverte que as reformas legislativas têm privilegiado as formas de tutela de cogniçãosumária exatamente em razão da intolerância cada vez maior em relação à demora e àdisfunção do processo civil, intolerância esta que acompanha a tomada de consciência deque a tempestividade da tutela jurisdicional é elemento indispensável para a atuaçãoconcreta e efetiva da garantia constitucional da ação e de que a falta de efetividade dosinstrumentos processuais pode levar à acentuação das desigualdades entre os litigantes.95

A distribuição do tempo do processo, realizada quando o réu necessita da instrução dacausa a partir de defesa indireta infundada e quando nega os fatos constitutivos semfundamento sério, além de imprescindível para evitar o exercício de defesas abusivas, éabsolutamente indispensável para dar às partes igual responsabilidade perante o processoe para que os ônus processuais recaiam sobre ambas as partes de forma isonômica.

É intuitivo que quando o tempo é visto de modo neutro e indiferente em relação aoresultado concreto do processo, o réu não só recebe sinal positivo para protelá-lo como éisento de qualquer responsabilidade pela sua conduta. O art. 5.o, LV, da ConstituiçãoFederal, ao dizer que aos litigantes são assegurados o contraditório e a ampla defesa, comos meios e recursos a ela inerentes, obviamente não impede o emprego da técnicaprocessual indispensável à distribuição do ônus do tempo do processo entre as partes.

A tutela da evidência – não obstante o inconstitucional parágrafo único do art. 311 –não pode ser prestada inaudita altera parte. O réu sempre tem a oportunidade decontestar os fatos constitutivos e apresentar os fatos impeditivos, modificativos ouextintivos do direito do autor, requerendo, se a defesa não depender de instrução, oimediato julgamento do mérito.

Lembre-se, por outro lado, que esta forma de tutela antecipada – dita de evidência –sempre se funda em cognição sumária. No caso de defesa indireta, a cognição sumáriarecai sobre os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos, ao passo que, tratando-se dedefesa direta, a cognição sumária fica retida nos próprios fatos constitutivos. Quer istodizer que a tutela da evidência é provisória e capaz de ser revogada ao final doprocedimento. De modo que, após a sua concessão, o réu continua a se defender noprocesso, atuando para que a defesa seja acolhida. O contraditório é apenas postecipado, àsemelhança do que ocorre em todas as outras hipóteses em que se concede tutelaprovisória.96 Além disto, para combater os efeitos da tutela da evidência, o réu tem odireito de interpor recurso de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo(arts. 1.015, I, e 1019, I, CPC).

A necessidade de distribuição do tempo do processo e, portanto, de técnica processualidônea a tanto, é indispensável para dar concretude ao direito fundamental à tutelajurisdicional efetiva e ao princípio da isonomia. A circunstância de tal técnica trazer riscoao direito de defesa não pode inviabilizar a sua utilização, pois o procedimento comum, aoobrigar o autor a arcar sozinho com o tempo do processo, é desconforme aos valoresconstitucionais, constituindo fonte de injustiça e evidente estímulo para o abuso do direitode defesa.

8. As Hipóteses do art. 311 do Código de Processo Civil

8.1. A Cláusula Geral do “Abuso do direito de Defesa ou Manifesto PropósitoProtelatório”

O inciso I do art. 311, ao falar em abuso do direito de defesa e manifesto propósitoprotelatório, simplesmente repete a dicção do inciso II do art. 273 do código de 1973, queabria oportunidade para tutela antecipada em caso de abuso de direito de defesa. Nuncahouve razão para distinguir abuso de defesa e manifesto propósito protelatório, namedida em que aos dois é possível outorgar um mesmo sentido geral, capaz de serconcretizado nos vários casos conflitivos.

Trata-se de conceito jurídico indeterminado. Bem por isso, cabe tutela da evidênciaquando, em qualquer caso, o juiz puder declarar, diante da evidência do direito e dainconsistência da defesa, que o seu exercício, ao exigir instrução dilatória, constitui umabuso. Portanto, o inciso I é a base da tutela da evidência, capaz de ser utilizado apenasquando se compreende a elaboração teórica desta forma de tutela (exposta supra,especialmente nos itens 4-8).

Realmente seria absurdo imaginar que a tutela da evidência é cabível apenas nashipóteses dos incisos II, III e IV do art. 311. Note-se que o inciso III nada mais é do que umdos muitos exemplos de tutela da evidência baseada em prova dos fatos constitutivos edefesa infundada que requer instrução dilatória. Na verdade, caso o art. 311 fosse ummero amontoado de exemplos, haveria uma simples descrição de hipóteses traçadas emprivilégio de determinados titulares de documentos ou contratos. Assim, caso não existisseo inciso I, ou melhor, a cláusula geral da tutela da evidência, a oportunizá-la em todos oscasos em que há direito evidente e defesa inconsistente que exige instrução dilatória,haveria violação da isonomia. Não é por outro motivo que o inciso I do art. 311 deve servisto como uma regra geral de democratização do processo – que viabiliza técnicaprocessual idônea a toda e qualquer situação de direito substancial.97

8.2. “As Alegações de Fato Puderem ser Comprovadas Apenas Documentalmente eHouver Tese Firmada em Julgamento de Casos Repetitivos ou em Súmula Vinculante”

A regra do inciso II do art. 311 pretende sintetizar uma hipótese de direito evidente.Porém, não servirá a um devido fim caso não interpretada de acordo com a elaboraçãoteórica supra desenvolvida.

Percebe-se desde logo que a norma misturou alegações de fato com questão jurídicaque pode ser resolvida mediante a aplicação do entendimento devidamente consolidadoem Corte Suprema. A ideia de súmula vinculante e de decisão tomada em “casosrepetitivos” indica meros exemplos do entendimento das Cortes Supremas, que, mais doque em qualquer outro lugar, está em seus precedentes.98

Seria possível raciocinar mediante o argumento de que as alegações de fato do autordevem estar provadas documentalmente, sem depender de qualquer outra prova. Porém,ao não existir qualquer outra alegação de fato passível de demonstração – nem do réu –,entendimento de Corte Suprema serviria apenas para mais uma vez viabilizar ojulgamento antecipado do mérito.

Isso significa que a norma só tem algum valor se interpretada no sentido de que asalegações do autor, evidenciadas por documento, têm fundamento jurídico amparado ementendimento de Corte Suprema, mas as alegações de fato do réu, a despeito de destituídasde seriedade, exigem instrução dilatória.

Note-se que a prova dos fatos constitutivos, somada ao entendimento de CorteSuprema, retira do autor qualquer necessidade de atuar no processo para convencer o juizsobre o seu direito. A única razão para o processo prosseguir está na necessidade deinstrução dilatória, derivada das alegações de fato cujo ônus da prova é do réu. De modoque, se tais alegações não são dotadas de seriedade suficiente para fazer crer que podem

ser ao final acolhidas, a tutela indispensável à distribuição do ônus do tempo do processo(tutela da evidência) deve ser concedida.

8.3. “Se Tratar de Pedido Reipersecutório Fundado em Prova Documental Adequadado Contrato de Depósito, Caso em que será Decretada a Ordem de Entrega do ObjetoCustodiado, Sob Cominação de Multa”

O inciso III é um particular – e especial – benefício outorgado pelo legislador aostitulares dos documentos que espelham contrato de depósito. Nada contra estes. Contudo,há dezenas de documentos de igual natureza não contemplados pelo legislador. Daí que aregra só pode ser uma encomenda da posição social que se vale destes documentos. Note-se que a curiosidade está em se ter uma previsão específica, quando as demais situaçõesde direito substancial, à falta de uma elaboração teórica capaz de outorgar inteligência aoinciso I do art. 311, ficariam destituídas de tutela da evidência. Aliás, a compreensão doinciso I a partir de uma visão teórica que beneficia toda e qualquer situação de direitosubstancial obviamente exclui a necessidade do inciso III. De forma que nada elimina aideia de que o legislador – um Parlamento habitado por maioria de orientação socialista –agiu apenas para bem tratar uma específica posição social. Contraditoriamente ou não –não se sabe a real intenção dos parlamentares -, vale a pena advertir para a “evidência” da“falta de seriedade” – o trocadilho é oportuno – com que este Parlamento agiu.

De qualquer forma, o conteúdo técnico da norma do inciso III não é menos vexatório.Isto porque, se o objetivo é privilegiar o titular do contrato de depósito, não é suficientealudir a “prova documental adequada do contrato de depósito”. A tutela da evidênciadepende de prova documental ou de incontrovérsia de todos os fatos constitutivos.Tratando-se de contrato de compra e venda, por exemplo, os fatos constitutivos doexercício da pretensão ao recebimento do preço estão no contrato e na entrega da coisa.No caso de contrato de depósito, é indispensável a prova do contrato e da mora na entregada coisa. É simples: só há evidência, capaz de justificar a distribuição do ônus do tempo doprocesso mediante a imediata outorga da tutela do direito, quando os fatos constitutivosnão estão na dependência de demonstração.

Se o demandado alegar a falsidade do documento que ampara o fato constitutivo,mostrando-se necessária a produção de prova, deixa de existir evidência hábil a justificara tutela da evidência. A alegação de falsidade desconstitui a evidência intrínseca à provadocumental.

Além disso, quando o contrato e a mora estão provados ou são incontroversos, só hárazão lógica para pensar em tutela da evidência quando o processo deve prosseguir para aelucidação de alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo que careça deconsistência ou seriedade. Se assim não acontecer, a hipótese é de julgamento antecipadodo mérito.

Note-se que o inciso III não faz qualquer indicação a prosseguimento do processo e adefesa de mérito infundada. Ora, a demora do processo e a resistência destituída deseriedade são imprescindíveis para pensar em tutela da evidência. Portanto, há que seinterpretar o inciso III do seguinte modo: além da prova documental do contrato dedepósito e da incontrovérsia sobre a mora, há de se ter defesa de mérito indiretainfundada que requeira instrução dilatória. Se esta instrução não é necessária, o caso é dejulgamento antecipado do mérito. Ora, se os fatos constitutivos estão evidenciados e nãohá alegação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos que exijam tempo doprocesso, a solução obviamente está no julgamento antecipado, não havendo qualquermotivo para cogitar de tutela da evidência.

8.4. “A Petição Inicial for Instruída com Prova Documental Suficiente dos Fatos

Constitutivos do Direito do Autor, a que o Réu Não Oponha Prova Capaz de GerarDúvida Razoável”

O inciso IV é a norma que mais se aproxima da razão teórica da tutela da evidência.Fala em prova documental suficiente dos fatos constitutivos. É certo que, tendo-se emconta o significado teórico de prova documental, aludir a prova suficiente constituiequívoco. É que, quando se leva à sério o conceito de prova documental, dessa decorrenecessariamente o fato. O documento é um objeto que tem em si o fato. Daí que a únicamaneira de negar o fato representado em documento é a alegação da sua falsidade.Lembre-se que a prova documental ou o documento não se confunde com a provadocumentada, ou seja, com a prova que contém a declaração de uma testemunha sobreum fato ou mesmo a declaração de um especialista sobre determinada situação fática.Estas provas, não obstante retidas em papel, constituem declarações de testemunha e deespecialista sobre um fato, vale dizer, precisamente uma mera versão a respeito do fato.

Admitida a falta de técnica jurídica, é possível ler no lugar de prova documental provacapaz de ser apresentada mediante papel, ou seja, prova que pode constituir documento etambém prova testemunhal ou pericial documentada. Nessa dimensão, a defesa que podeser oposta aos fatos constitutivos não se limita à alegação de falsidade. O réu tem apossibilidade de requerer prova testemunhal ou pericial para negar os fatos constitutivos.Isso porque a prova testemunhal ou pericial documentada de que se vale o autor, ou seja,a prova produzida em outro processo de que o réu também participou, não é provasuficiente à demonstração dos fatos constitutivos.

O inciso IV fala em oposição de prova “capaz de gerar dúvida razoável”. Entretanto, oque pode se opor à prova dos fatos constitutivos é a alegação de falsidade do documentoou a negação dos fatos constitutivos evidenciados mediante prova testemunhal ou pericialdocumentada. A alegação de falsidade, ao abrir oportunidade a prova, retira a força dodocumento, excluindo a possibilidade de tutela da evidência. Porém, a negação do fatoconstitutivo e o consequente requerimento de produção de prova, conforme o casoconcreto, podem ser incapazes “de gerar dúvida razoável” diante da prova “documentada”dos fatos constitutivos. Nessa hipótese o juiz está autorizado a conceder tutela daevidência.

Mas o inciso IV melhor se aplica à hipótese em que há prova documental dos fatosconstitutivos e o réu apresenta defesa de mérito indireta – alegação de fatos impeditivos,modificativos ou extintivos – infundada. Como é óbvio, a defesa indireta, não obstanteinfundada, tem que exigir instrução dilatória, uma vez que de outra forma o caso será dejulgamento antecipado do mérito. Em outras palavras, quando há prova dos fatosconstitutivos e o réu apresenta defesa indireta – “incapaz de gerar dúvida razoável” – querequer produção de prova, cabe tutela da evidência.

9. A Inconstitucionalidade do Parágrafo Único do art. 311

Afirma o parágrafo único do art. 311 que, “nas hipóteses dos incisos II e III, o juizpoderá decidir liminarmente”. Ou seja, o parágrafo único, sem qualquer racionalidade ebase constitucional, afirma que o juiz pode conceder tutela da evidência se “as alegaçõesde fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada emjulgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante” (inciso II, art. 311, CPC) equando “se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada docontrato de depósito …” (inciso III, art. 311, CPC).

Em primeiro lugar há absoluta falta de racionalidade no dispositivo. É que obviamentenão se pode aferir evidência do direito antes de o réu ter sido citado e apresentado defesa.

Note-se, por exemplo, que a alegação de falsidade é suficiente para descaracterizar aevidência das “alegações de fato” e da “prova documental” do contrato de depósito. Issopara não falar que a tutela da evidência sempre depende da análise da consistência dadefesa de mérito, direta ou indireta. Os incisos II e III, conforme demonstrado, dizemrespeito a situações em que o réu apresenta defesa de mérito indireta infundada querequer instrução dilatória. De modo que é absolutamente impossível aferir ospressupostos para a tutela da evidência liminarmente.

Na verdade, o legislador se confundiu bastante ao editar as normas relativas à “tutelaprovisória” e, ao tratar da “tutela da evidência”, continuou perdido. Bem vistas as coisas,parece que o legislador não sabia o que estava fazendo. Daí a importância de a doutrinacolocar as coisas em seus devidos lugares. Tudo indica que o legislador supôs que poderia,sob o rótulo de tutela da evidência, construir uma espécie de procedimento documental,em que o juiz estaria autorizado a proferir sentença, com base na evidência do direito –prova documental -, logo após a ouvida do réu.

A lógica equivocada do legislador parte do pressuposto de que, como a sentença podeser proferida logo após a ouvida do réu, antes da citação deve caber liminar quando “asalegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tesefirmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante” (inciso II, art. 311,CPC) e quando “houver prova documental adequada do contrato de depósito” (inciso III,art. 311, CPC). Como é óbvio, isto só teria algum sentido se a tutela nada tivesse a ver comevidência do direito e com fragilidade da defesa. Ora, estes pressupostos devem seraferidos depois da apresentação da defesa para que o autor não seja prejudicado pelademora do processo. Não é por outro motivo que a tutela da evidência é provisória, oumelhor, concedida mediante decisão fundada em cognição sumária e sujeita aconfirmação pela sentença.

Lembre-se, aliás, que a cognição sumária diz respeito em regra à defesa indireta; osfatos constitutivos devem ser incontroversos ou estar provados mediante documento, oque significa que em relação aos fatos constitutivos deve haver cognição exauriente.Sucede que a cognição exauriente, ou melhor, a aferição da incontrovérsia – nãocontestação e incompatibilidade entre a negação do fato constitutivo e a defesa indireta –e da qualidade do documento – não alegação de falsidade – dependem da devidaoportunidade à manifestação do demandado, especialmente da análise da defesa. Issodemonstra que liminar antes da ouvida do réu jamais pode ser tutela da evidência, emborapossa ser concedida quando o tempo para a ouvida do demandado puder causar dano.

O parágrafo único do art. 311 não é apenas uma peça que não foi feita para o jogo ouque não cabe no tabuleiro. Ao exigir direito evidente e, assim, não poder dispensar aanálise da defesa, tutelada evidência antes da ouvida do réu não é apenas umacontradição em termos; é igualmente uma tutela que viola o contraditório e o direito dadefesa. Não há como admitir que um fato constitutivo está provado mediante documentoantes da ouvida do demandado.99 De outro modo, o procedimento monitório, em caso deprova escrita que configura prova documental ou documento, também deveria abriroportunidade para a tutela do direito antes da citação do réu. No mínimo para que osdireitos não fossem tratados de modo diferente. E nem se diga que os incisos II e IIIrepresentam formas de tutela jurisdicional diferenciada ou especial. O inciso II afirmapressupostos para a tutela da evidência que podem ser encontrados nas mais diversassituações de direito substancial. De outra parte, embora relativo à hipótese específica docontrato de depósito, o inciso III está inserido num quadro em que a lógica da tutela daevidência deve ser preservada sob pena de se ter outra forma de tutela – que não a tutelada evidência.

10. Tutela da Evidência e Fundamentação

A tutela da evidência requer, em regra, fatos constitutivos incontroversos, ou seja, fatosconstitutivos provados mediante documento, não contestados ou reconhecidosexpressamente na contestação. Nesse caso a tutela da evidência é baseada naincontrovérsia dos fatos constitutivos e em defesa de mérito indireta inconsistente ouinfundada – alegação improvável de fatos impeditivo, modificativo ou extintivo. Admite-se, excepcionalmente, tutela da evidência ancorada em fatos constitutivos demonstradosmediante prova testemunhal ou pericial produzidas em outro processo. Nessa últimahipótese deve haver defesa de mérito direta inconsistente – negação infundada dos fatosconstitutivos.

De modo que a probabilidade, em regra, recai sobre a afirmação de fato impeditivo,modificativo ou extintivo. Apenas excepcionalmente é que se pensa na probabilidade daalegação de fato constitutivo em face da sua negação – defesa de mérito direta. Significaque, no comum dos casos, a alegação de fato deve ser improvável. Requer-se aprobabilidade de que a defesa de mérito indireta não venha a ser acolhida.

Nesta dimensão, a fundamentação na maioria das vezes deve relacionar osdocumentos apresentados com os fatos constitutivos ou esses com a não contestação oucom o seu reconhecimento expresso e, além disso, demonstrar as razões pelas quais seentende que as alegações de fatos modificativos, impeditivos ou extintivos sãoimprováveis. No entanto, a justificativa obviamente não precisará se preocupar comdefesa indireta no caso em que há apenas negação dos fatos constitutivos demonstradosmediante prova testemunhal ou pericial realizada em outro processo. Nessa situação, ajustificativa deve ter em conta a prova dos fatos constitutivos e a (in)consistência danegação do demandado. Em outras palavras, a fundamentação deve demonstrar que aevidência derivada da prova – que não é documento – dos fatos constitutivos não foielidida pela defesa direta.

11. Momento Oportuno à Concessão da Tutela da Evidência

De acordo com o art. 357 do Código de Processo Civil, não sendo o caso de julgamentoantecipado do mérito ou de extinção do processo, deverá o juiz, em decisão desaneamento e de organização do processo: i) resolver as questões processuais pendentes,se houver;�ii) delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória,especificando os meios de prova admitidos;�iii) definir a distribuição do ônus da prova,observado o art. 373;�iv) delimitar as questões de direito relevantes para a decisão domérito;�e v) designar, se necessário, audiência de instrução e julgamento.

A “delimitação das questões de fato” importa para a seleção dos fatos litigiosos queainda devem ser elucidados, tendo grande relevo para a racionalização do processo,evitando discussões estéreis, provas produzidas sem propósito, custos econômicos aoslitigantes e ao Poder Judiciário, e especialmente o dispêndio do tempo da justiça e daspartes sem razão de ser.

A definição de um fato como controvertido constitui premissa para a produção daprova, mas a exata localização do fato controvertido entre os fatos constitutivos,extintivos, modificativos e impeditivos é pressuposto para a atribuição do ônus da prova aum dos litigantes, nos termos do inciso III do art. 357.

Além disto, a delimitação do material fático controvertido e a caracterização da suaqualidade constituem elementos imprescindíveis ao tratamento do ônus do tempo doprocesso.Frise-se que a tutela da evidência é viável em duas situações: i) quando a

controvérsia recai unicamente sobre os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos, masa defesa indireta é infundada e ii) quando a controvérsia atinge os fatos constitutivos, masa prova sobre eles gera forte convicção e a defesa direta é infundada.

Se a decisão de saneamento e organização do processo define os fatos litigiososcontroversos e onde eles se situam, não há dúvida que este é o momento ideal para o juizdecidir sobre a tutela da evidencia,100 lembrando-se que o juiz pode inclusive dialogar comas partes para melhor compreender a situação fática. Não é demais recordar que, nostermos do § 3.º do art. 357 do Código de Processo Civil, “se a causa apresentarcomplexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz designar audiência para queo saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o juiz, se for ocaso, convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações”.

Note-se, ainda, que a possibilidade da tutela da evidência restaura o equilíbrio daspartes e neste sentido favorece a conciliação – não obstante o momento processualdefinido pelo código para a conciliação já tenha sido ultrapassado. Como a demoraprejudica o autor e beneficia o réu, o tempo obviamente assume valor diante dapossibilidade de conciliação. A tutela da evidência coloca as partes em posição deequilíbrio, viabilizando uma “conciliação justa”, ou melhor, uma conciliação em que otempo do processo não é utilizado como “moeda de troca” em favor do réu. Roger Perrot,aliás, ao falar sobre os resultados do référé-provision,101 adverte que na França foramdesencorajados os maus litigantes que se esforçavam em fazer o processo durar muitotempo apenas para poder arrancar concessões dos seus adversários.102

12. Possibilidade de Revogação da Tutela e Agravo de Instrumento com EfeitoSuspensivo

Quando os fatos constitutivos são incontroversos ou estão evidenciados, o exercício dadefesa, mediante a produção de provas, somente não é abusivo quando a defesa não éinfundada ou destituída de seriedade. A defesa infundada que protela a tutelajurisdicional do direito evidente é abusiva, abrindo oportunidade à tutela antecipada deevidência (art. 311, CPC).

A decisão que concede a tutela da evidência é fundada em cognição sumária. Quandose exige fatos constitutivos incontroversos e defesa indireta infundada, há cogniçãoexauriente sobre os fatos constitutivos e cognição sumária sobre os fatos extintivos,modificativos ou impeditivos. Quando os fatos constitutivos são controvertidos e a defesadireta é infundada, a cognição exauriente não atinge qualquer parcela dos fatos, havendocognição sumária sobre os fatos constitutivos.

Por ser baseada em cognição sumária, a decisão é provisória e suscetível demodificação ou revogação quando da sentença (art. 296, CPC). Justamente porque não põefim à fase de conhecimento, constitui decisão interlocutória. Desafia recurso de agravo deinstrumento (art. 1.015, I, CPC), que deve ser recebido no efeito devolutivo.103

A efetivação da tutela da evidência pode causar prejuízo ao demandado. Não é poroutra razão que não se pode descartar eventual concessão de efeito suspensivo ao agravode instrumento interposto contra a decisão que a concede. O relator do agravo deinstrumento deve ter em conta que a suspensão se volta contra uma tutela baseada emdireito evidente e defesa inconsistente, ao contrário do que ocorre quando o agravo éinterposto em face da tutela urgente – baseada em probabilidade do direito e perigo dedano. No agravo interposto contra a tutela da evidência não há valoração de perigo dedano enquanto pressuposto para a concessão da tutela. No que diz respeito ao efeitosuspensivo, no caso de tutela urgente há nova análise do fumus e do perigo de dano – que

legitimou a concessão da tutela ao recorrido – e análise do perigo de dano “inverso” – aorecorrente. Na hipótese de tutela da evidência, há – além da consideração da evidência dodireito e da inconsistência da defesa – somente valoração do dano que pode derivar daefetivação da tutela.

13. Execução Imediata da Tutela da Evidência e a Questão da Caução

A tutela da evidência é necessidade derivada do direito fundamental à duraçãorazoável do processo efetiva.104 Na sua falta, o Estado estaria impedido de distribuir oônus do tempo entre as partes e, assim, de exercer o poder jurisdicional através de umprocesso isonômico.

Por isso, é completamente absurdo pensar que a tutela da evidência somente poderáproduzir efeitos a partir da sua confirmação pela sentença. Se assim fosse a tutela nãoteria qualquer utilidade, já que o ônus do tempo do processo jamais seria distribuído. Ora, sea tutela da evidência é concedida porque há direito evidente e defesa de méritoinconsistente, é certo que a sua execução deve ocorrer no curso do processo.

Contudo, seria possível argumentar que a tutela da evidência, ainda que tendo eficáciaimediata, deve ter os seus efeitos suspensos por eventual recurso. A decisão concessiva detutela da evidência configura decisão interlocutória e, assim, desafia recurso de agravo deinstrumento (art. 1.015, I, CPC). Ainda que esse recurso deva ser recebido apenas no efeitodevolutivo e, por isso, não deva obstar o andamento do feito, é preciso demonstrar osmotivos que inviabilizam a suspensão dos efeitos da tutela da evidência.

Quando os fatos constitutivos são incontroversos e a defesa de mérito é infundada,existem incontestáveis motivos para a tutela da evidência e, dessa forma, para a suaimediata execução. Qual a razão para supor, então, que o agravo deva ser recebido noefeito suspensivo? Nenhuma. Se o direito é evidente e há defesa de mérito infundada, nãohá racionalidade em obrigar o autor a suportar o tempo para o processamento do recurso.A conclusão que o autor deve arcar com o tempo do recurso interposto contra a própriadecisão que o liberou de tal ônus seria mais do que incoerente.

A execução da tutela da evidência é imediata, mas deve atender ao art. 520 do Códigode Processo Civil, pois é uma execução fundada em título provisório. Nos casos de tutelada evidência que impõe fazer, não fazer ou entrega de coisa, a execução é feita de acordocom as regras dos arts. 536 a 538 do Código de Processo Civil. Na hipótese de soma emdinheiro, de lado a possibilidade de aplicação de multa e as várias hipóteses de alimentos,a execução é por expropriação, conforme o art. 523 e seguintes.

A execução da tutela de soma em dinheiro subordina-se ao art. 520, IV, que diz que “olevantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem transferência deposse ou alienação de propriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultargrave dano ao executado, dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de planopelo juiz e prestada nos próprios autos”. Portanto, a tutela da evidência também autorizaa prática de atos que importem transferência de posse, alienação de propriedade ou deoutro direito real e também o levantamento de dinheiro – a princípio desde que prestadacaução. Mas essa pode ser dispensada – como acontece em qualquer caso – quando: i) ocrédito for de natureza alimentar, independentemente de sua origem; e ii) o credordemonstrar situação de necessidade. (art. 521, I, II, CPC).

A execução da tutela da evidência de soma em dinheiro é fundada em título (decisão)provisório, porém completa, ou seja, capaz de satisfazer integralmente o direito doexequente.105 A circunstância de a execução se submeter a restrição – prestação de caução

suficiente e idônea – certamente não significa limitação ao seu alcance.

Lembre-se, por outro lado, que a caução do § 1o do art. 300 pode ser imposta apenaspara a concessão da tutela urgente. A caução, diante da tutela da evidência, além desomente ser cogitável para a execução, só pode ser exigida quando a tutela é depagamento de soma em dinheiro, desde que não incidam os pressupostos de exceção dosincisos I e II do art. 521.

Na execução da tutela da evidência de soma em dinheiro, como acontece diante dequalquer espécie de execução, é necessário aplicar a regra da menor restrição possível.Diante da possibilidade – ainda que remota – de o autor poder ter o seu direito nãoreconhecido ao final, a expropriação deve recair no bem que comporte a consequênciamenos gravosa ao executado.106

De qualquer forma, o agravante pode requerer ao relator que suspenda os efeitos oulimite a execução da tutela da evidência quando puder demonstrar que da execução poderesultar dano grave (art. 1.019, I, CPC). De maneira que a situação está envolvida em um“sistema de pesos e contrapesos”, uma vez que, se a tutela da evidência deve ser executadaimediatamente, pode ter os seus efeitos suspensos. Não há como negar que a construçãodesse sistema privilegia os valores constitucionais, pois não só permite que o juiz trabalhecom um processo realmente isonômico, como ainda cuida dos direitos fundamentaisprocessuais do autor e do réu.107

14. Tutela da Evidência na Sentença

14.1. A Tutela da Evidência Diante da Contestação Genérica

O art. 416, terceira parte, do Código de Processo italiano, veda a contestação genéricaao frisar que “il convenutodeve prendereposizione, inmaniera precisae nonlimitata adunagenericacontestazione, circai fattiaffermati dall’attorea fondamentodella domanda,proporre tutte le sue difese in fatto e in diritto ed indicare specificamente, a pena didecadenza, i mezzi di prova dei quali intende avvalersi ed in particolare i documenti chedeve contestualmente depositare”.

Discute-se na Itália se é possível a tutela antecipada de soma não contestada em caso decontestação genérica.108 Parte da doutrina entende que a contestação genérica deve serequiparada à não-contestação para efeito de tutela antecipada.109 Outra parte da doutrinanega que a contestação genérica possa ser enquadrada na esfera de comportamentos emque está situada a não-contestação.110 Porém, há autores que, embora não equiparando acontestação genérica à não-contestação, concluem que a contestação genérica abreoportunidade à tutela antecipada. Afirma-se que o art. 423, primeira parte, contém umasanção para a violação da proibição de contestação genérica – estabelecida na partesupracitada do art. 416 do código italiano. Argumenta-se que tal sanção – a tutelaantecipada de soma não contestada – é necessária,111 já que a sua falta reduziria aproibição de contestação genérica a uma inútil enunciação de princípio, sem qualquereficácia vinculante para as partes, frustrando assim os escopos de colaboração e deconcentração processual almejados pelo art. 416.112

Como relata Wellington Moreira Pimentel, durante a vigência do Código de 1939 adoutrina se dividiu “quanto à admissibilidade da negação geral. Frederico Marquesconsiderava-a incabível. Outras vozes, não menos autorizadas (Gabriel de Rezende Filho,Lopes da Costa, Moacyr Amaral Santos), a admitiam. O legislador de 1973 tomou posição.A exigência feita no sentido de o réu manifestar-se precisamente sobre os fatos alegadospelo autor torna inviável a contestação por negação geral. A imposição relaciona-se

diretamente com a questão do ônus probatório. É indispensável que se saiba se o réureconhece ou admite cada um dos fatos apontados pelo autor na inicial, ou se osreconhece mas outros lhe contrapõe, ou, ainda, se os nega, ante a regra do ônusprobatório. O texto primitivo do artigo, no Projeto enviado ao Congresso Nacional,estabelecia que ‘compete também ao réu manifestar-se especificamente sobre os fatosarticulados na petição inicial’ e a alteração introduzida (manifestar-se precisamente)torna desenganadora a posição do legislador de repulsa à contestação por negação geral.Nem se poderá falar em contestação por simples negação geral que, no magistério de JoãoMonteiro, se dá quando o réu nega geralmente os artigos da ação, sem, todavia,especializar a resposta (Teoria do Processo Civil, I, p. 324) diante de todo um sistemaintroduzido no Código que desce aos mínimos detalhes quanto à matéria a serdetidamente especificada pelo réu em sua resposta, desde todo um elenco de preliminares,até a própria defesa contra o mérito”.113 Ora, o art. 341 do Código de Processo Civil de 2015é uma reprodução do art. 302 do código de 1973, que claramente afirmou o ônus de o réuse manifestar de modo preciso sobre os fatos alegados na inicial.

A regra contida no art. 341 do Código de Processo Civil, segundo a qual cabe ao réumanifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, afastacompletamente a possibilidade de contestação genérica no direito brasileiro. Segundo oparágrafo único do art. 341, a regra de que são presumidos verdadeiros os fatos nãocontestados não se aplica ao defensor público, ao advogado dativo e ao curador especial. Aestes é admitida a contestação genérica.

Se não há dúvida acerca da proibição da contestação genérica, cabe perguntar se o seudescumprimento pode acarretar a presunção de veracidade dos fatos articulados peloautor. A proibição da contestação genérica é ligada à ideia de que as partes têm o dever decolaborar com o juízo, expondo com veracidade e lealdade as suas posições.114 O réu tem odever de não alterar a verdade dos fatos e o ônus de não se omitir em relação aos fatosarticulados pelo autor. A contestação deve impugnar especificamente os fatos deduzidosna petição inicial para que a massa dos fatos controversos seja limitada, definindo-se oscontornos do tema litigioso. A contestação genérica, por ser capaz de tornar os fatoscontroversos a partir de uma simples negativa geral, não colabora para a redução dosfatos controversos e, assim, para a racionalização do processo mediante a investigação doque realmente importa para a elucidação do litígio.

A inobservância da proibição de contestação genérica obviamente deve ser sancionadacom a presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor. De outra forma talproibição não só deixa de ter valor, como ainda são frustrados os escopos de colaboraçãoprocessual e concentração que estão à sua base.

Na hipótese de contestação genérica cabe julgamento antecipado do mérito. Note-se,porém, que o julgamento antecipado do mérito, nesta situação, não decorre de revelia (art.355, II, CPC). Como é evidente, não há como pensar em revelia no caso de contestaçãogenérica, já que houve apresentação de contestação, ainda que inepta. É preciso observarque o réu deve apresentar uma defesa apta. Se o réu apresenta contestação genéricaincidem o arts. 341 e 355, I – e não os arts. 344 e 355, II –, uma vez que os fatos nãocontestados são presumidos verdadeiros e considerados incontroversos, independendo deprova.115

Não tem sentido supor que o juiz, ao final do procedimento em que foi apresentadacontestação inepta, não possa dar tutela ao direito. Isto seria premiar aquele quedescumpre o seu dever de apresentar contestação idônea. Assim, há de se admitir aconcessão da tutela da evidência na sentença (art. 1.012, § 1o, V, CPC), evitando-se que ocusto do duplo grau de jurisdição possa recair sobre os ombros daquele que possui um

direito que não foi controvertido devido à participação indevida do réu.

Lembre-se que no direito italiano, mesmo com a regra da execução imediata dasentença,116 a doutrina insistiu para a necessidade da tutela antecipada total de soma nãocontestada (porque a não-contestação podia ser total). Argumentou-se que entre o términoda instrução e a sentença se passa um longo tempo, que não deve ser suportado pela parteautora.117 Como observou Rampazzi, “deixando-se de lado o fato de que da letra da lei nãose retiram elementos que façam pensar na necessidade de uma não-contestação parcialcomo pressuposto indispensável para a emanação do provimento, contra a opinião antesrecordada se coloca o interesse concreto que a parte credora tem de obter uma tutelaexecutiva antecipada, ainda quena presençadas condiçõespara apronúncia demérito:aninguém passadespercebido quantoé longoo tempoque intercorreentre ofim dainstrução easentença,até mesmose, namelhor dashipóteses, sãoexatamente respeitadosos prazosquenaintenção dolegislador devemdar oritmo àatividade decisória”.118 Cabe advertir, aliás, queo código italiano passou a admitir a tutela antecipada (total) após o encerramento dainstrução.119

Se o sistema permite que o réu descumpra o ônus de se manifestar precisamente sobreos fatos alegados na petição inicial, mas não admite que o autor desde logo obtenha atutela do direito, abre caminho para o abuso do direito de defesa (art. 311, I, CPC). Com atutela da evidência, evita-se que o réu apresente contestação genérica e ainda assim possausufruir do tempo do processo – interpondo recurso – para protelar a prestação da tutelajurisdicional.

14.2. O Réu que Comparece no Processo e Não Apresenta Contestação

Embora a revelia seja associada à não apresentação de contestação, pouco importandose o réu veio a juízo e não a apresentou ou simplesmente não veio a juízo, cabe aquidistinguir as duas hipóteses.

A revelia não implica necessariamente a presunção de veracidade dos fatos articuladospelo autor. Entende-se que o simples não comparecimento não pode ser fonte de prejuízoprocessual para o réu porque uma série de razões, dignas de consideração, podemjustificá-lo.120

Contudo, o comparecimento e a não apresentação de contestação não devem merecer amesma complacência. Aquele que vem a juízo e não contesta assume uma posição quedeve ser definida como ativa, já que há uma opção pela não contestação.

É sabido que um dos principais princípios do processo civil moderno impõe às partes odever de colaborar com o juízo. A parte que opta por não contestar não só despreza esteprincípio, como também coloca em risco a validade daquele outro que diz caber ao réumanifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial. Esteúltimo princípio, como já foi dito, não só visa possibilitar a redução da massa dos fatoscontrovertidos, como também permitir a sua melhor elucidação, contribuindo para umamelhor prestação jurisdicional.121

Ora, se o réu que deixa de se manifestar precisamente sobre os fatos alegados e o réuque apresenta contestação genérica são sancionados com a presunção de veracidade dosfatos articulados pelo autor, não é possível que o comparecimento seguido de nãocontestação não seja igualmente sancionado. Haveria não só infringência ao princípio daisonomia, mas também estímulo ao silêncio. Como diz Rampazzi, o silêncio da partedevedora, em um sistema processual caracterizado por um ônus bastante preciso deimpugnação dos fatos, oferece elementos de não-contestação capazes de justificar uma

‘condenação’ antecipada.122

Admitir que o réu pode comparecer em juízo, optar por não contestar e aindanãoadimplira suaobrigação, é desconsiderar o direito do autor e abrir espaço para que otempo do processo seja utilizado pelo réu para retardar um direito que se mostra desdelogo incontroverso.

Igualmente aqui, à semelhança do ocorre em caso de contestação genérica, deve o juizconceder a tutela da evidência na sentença (art. 1.012, § 1.º, V, CPC). A tutela da evidência,neste caso, também almeja evitar o abuso do direito de defesa (art. 311, I, CPC), pois nãohá racionalidade em atribuir ao autor o ônus do tempo de processamento do recursointerposto pelo réu que optou por não contestar.

14.3. Contestação que Nega Precedente de Corte Suprema

Como é sabido, a dissociação entre texto e norma, a técnica das cláusulas abertas e oimpacto do constitucionalismo deram à decisão judicial um significado bem distintodaquele imaginado por quem supunha que a missão do juiz era apenas declarar a normacontida na lei. A decisão judicial, não só pela circunstância de que resulta de umaatividade interpretativa que contém valorações e decisões de conteúdos externos ao textoda lei, mas também diante das regras legais que convidam o juiz à sua concretizaçãosegundo as circunstâncias do caso e da imprescindibilidade de a lei ser conformada aosditados da Constituição, certamente agrega sentido ou substância à ordem legislativa.Essa, em outras palavras, não é suficiente para orientar a sociedade ou para sozinhaespelhar o direito que conduz a vida social. O direito precisa de algo mais: necessita dacolaboração do Judiciário. Contudo, se todos os juízes têm poder para proclamar esse “algomais” ou o direito que não se limita ao sentido exato da lei, só as Cortes Supremas – STJ eSTF – têm a função de defini-lo e desenvolvê-lo. Os juízes e tribunais inferiores têm afunção de resolver os casos e, apenas antes da pronúncia das Cortes Supremas, dizer sobreo sentido de uma questão de direito ou sobre a interpretação de um texto legal ouconstitucional. A função de dar unidade aos conteúdos acrescidos ao texto é apenas do STJe do STF.

Tais “conteúdos”, exatamente porque revelam sentidos ou compreensões jurídicasdotadas de novidade, são imprescindíveis para orientar a sociedade e, por consequência,não podem ser ignorados pelos demais órgãos judiciais, sob pena de violação da igualdadeperante o direito. Perceba-se que tais “conteúdos”, que se revelam mediante o que sechama de precedentes, também constituem direito, pois aperfeiçoam o produto dolegislativo, dando-lhe plena capacidade de operar com imperatividade e eficiência social.Esses “conteúdos”, a partir de valorações racionalizadas mediante a devida argumentação,especificam o significado da lei diante das circunstâncias concretas do caso. Só isso ésuficiente para ver que os precedentes são, em razão apenas da sua substância, dotados deforça obrigatória. Afinal, nessas condições os precedentes integram a ordem jurídica,naturalmente vinculante.123

Já foi demonstrado que não se pode admitir tutela da evidência antes da ouvida do réu.Lembre-se que, mesmo em caso de perigo de dano ou de ilícito, a tutela inaudita alteraparte é excepcional. Só há razão para tutela da evidência – distribuição do ônus do tempodo processo – quando fica claro que a contestação é destituída de fundamento e, ademais,exige instrução dilatória, ou seja, dispêndio de tempo do processo. Portanto, não hámotivo para tutela da evidência quando o réu sequer ainda teve oportunidade parademonstrar que o precedente é inaplicável ao caso.

Porém, quando o demandado tem oportunidade para apresentar defesa e, ainda assim,não apresenta fundamento sério para demonstrar que o precedente não se aplica à

resolução do caso, seria possível supor que, sendo a hipótese de julgamento imediato domérito, não haveria razão para dar qualquer valor à autoridade do precedente que baseouo pedido de tutela do direito. Engano! Se o precedente não favorece a tutela do direitoantes da ouvida do demandado – como graciosamente pretendeu o parágrafo único do art.311 -, ele certamente justifica a distribuição do ônus do tempo do processo mediante aexecução da sentença na pendência da apelação. Não é racional que a sentença, quandobaseada em precedente de Corte Suprema, não outorgue imediata tutela ao direito, poisisto seria um único estímulo para o réu “licitamente” negar a sentença e os precedentes dasCortes Supremas em prejuízo daquele que tem razão e em desprestígio do Direito e do PoderJudiciário. Inexiste qualquer razão para imaginar que o autor tenha que, também numahipótese como esta, carregar o ônus do tempo do processamento da apelação. Significaque, quando a contestação não nega a aplicação do precedente ou é destituída defundamento sério para justificar a sua inaplicação ao caso, a tutela da evidência deve serconcedida na sentença, nos termos do art. 1.012, § 1.º, V, do Código de Processo Civil. Frise-se, no entanto, que se a contestação seriamente argumenta de modo a demonstrar adistinção do caso e, assim, a inaplicabilidade do precedente, ou mesmo o desgaste doprecedente, não há que se pensar em tutela da evidência.

NOTAS DE RODAPÉ

1

Sobre o problema do tempo no processo civil há interessantes estudos no direito francês. VerSoraya Amrani-Mekki, Le temps et le procès civil, Paris: Dalloz, 2002; Didier Cholet, La célérité dela procédure en droit processuel, Paris: L.G.D.J, 2006.

2

Ver Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela, p. 33 e ss.

3

“A tendência para a ‘plenarização’ das demandas que vem inspirando a evolução de nosso direitoprocessual, com a correspondente universalização da ordinariedade e supressão dos‘procedimentos especiais’, acabou por tornar a demanda especial de depósito uma demandaplenária, de modo que é muito freqüente suceder que uma ação desta espécie tenha uma duraçãode vários anos, durante os quais o proprietário-depositante ver-se-á, sem remédio e sem consolo,privado da utilização do bem que lhe pertence e que fora entregue ao depositário apenas paraguarda e nem mesmo para o uso. Neste caso, nosso direito prefere sacrificar o demandante, emhomenagem ao princípio da segurança máxima do resultado, impedindo que o juiz lhe conceda aposse provisória do bem que lhe pertence, mesmo que o índice de verossimilhança de seu direitoalcance um grau tão elevado que a probabilidade de sua vitória final seja inquestionável” (OvídioBaptista da Silva, “A ‘plenitude de defesa’ no processo civil”, in As garantias do cidadão na justiça,São Paulo: Saraiva. 1993, p. 160).

4

Por outro lado, um processo que se alonga no tempo além do necessário representa um custoaltíssimo para a administração da justiça. Quanto maior é o número de casos de abuso de direitode defesa, maior é o número de processos em desenvolvimento e, assim, o número de juízes efuncionários envolvidos, e, consequentemente, o congestionamento e a morosidade da “justiça”.Além disso, não é possível esquecer que a demora pode afetar a qualidade do serviço do juiz, jáque as possibilidades de erro se multiplicam rapidamente na medida em que transcorre o tempoentre a ocorrência do fato a ser investigado em juízo e a sua declaração através da sentença.Lembram Rafael Bielsa e Eduardo Graña que “la Corte Suprema de los Estados Unidos haseñalado – hace ya algunos años – que la demora no sólo perjudica al afectado, sino que tambiéndificulta la administración de justicia en sí misma, ya que no se posterga únicamente larectificación del daño o la reivindicación de la persona injustamente acusada, sino que – además– se colman de causas los tribunales, se aumentan los costos para todos los litigantes, se obliga alos jueces a simplificar, y se interfiere con la pronta decisión de aquellos litigios en los que todaslas partes muestram la debida diligencia y preparación para el juicio, viéndose todo el procesorecargado por la falta de organización y de solución a los problemas” (Rafael A. Bielsa e EduardoR. Graña, “El tiempo y el proceso”, Revista del Colegio de Abogados de La Plata, v. 55, p. 200-201).

5

“L’interesse di urgenza, supponendo costante la sua entità quantitativa, acquista una rilevanzacomplessiva tanto più grande quanto maggiore è la probabilità che il sucessivo giudicato conducaad un accertamento positivo del diritto dell’attore; analogamente, l’interesse alla completacognizione, supponendo costante la sua entità quantitativa, acquista una rilevanza complessivatanto più grande quanto maggiore è la probabilità che il sucessivo giudicato conduca ad unaccertamento negativo della situazione sostanziale controversa” (Italo Andolina, Cognizione edesecuzione forzata nel sistema della tutela giurisdizionale, Milano: Giuffrè. 1983, p. 36/37).

6

Carlo Furno, Teoría de la prueba legal, Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1954, p. 190.

7

“Il terzo libro del Codice di Procedura Civile è legato alla filosofia del titolo esecutivo. È unafilosofia dai contorni incerti come tutte le filosofie. Di essa può peraltro con facilità cogliersi ilnucleo essenziale nell’esigenza che l’esecuzione abbia di mira un assetto stabile delle situazionimateriali e non un qualcosa di provvisorio e/o di strumentale e caducabile” (Giovanni Verde,“L’attuazione della tutela d’urgenza”, in La tutela d’urgenza, Rimini: Maggioli Editore, 1985, p. 81).

8

Giuseppe Chiovenda, Instituições de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, 1965, v. 1, p. 235.

9

Ver Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela, p. 139 e ss.

10

Ovídio Baptista da Silva, “Tutela antecipatória e juízos de verossimilhança”, in O processo civilcontemporâneo (coordenado por Luiz Guilherme Marinoni), Curitiba: Juruá, 1994, p. 127-128.

11

Ver Loïc Cadiet, Jacques Normand, Soraya Mekki Amrani,Théorie générale du procès, Paris:Presses Universitaire de France, 2010.

12

“Quelles sont les conditions exigées? Contrairement à ce que l’on pourrait croire, la conditiond’urgence n’est pas requise. La seule et unique condition exigée est que “l’obligation ne soit passérieusement contestable” (articles 771 et 809 nouv. c. pr. civ.). Cette condition fondamentale, quele juge doit constater, est extrêmement difficile à définir de façon abstraite. Il est certain que lejuge ne peut exiger une incontestabilité absolue, sous peine de restreindre abusivement ledomaine du référé-provision” (Roger Perrot, “Les mesures provisoires en droit français”, in Lesmesures provisoires en procédure civile, Milano, Giuffrè, 1985, p. 164).

13

“D’altra parte, almeno secondo l’insegnamento tradizionale, la mancata “convinzione” del giudicecirca la verità del fatto impone di non decidere la controversia in base alla norma che avrebbedovuto essere applicata ove del fatto fosse stata fornita “piena” prova, bensì in base alla regolache prevede il rigetto della domanda o dell’eccezione quale conseguenza del mancatosoddisfacimento dell’onere” (Salvatore Patti, Prove-Disposizioni generali, Commentario del CodiceCivile (a cura di A. Scialoja e G. Branca), Bologna-Roma: Zanichelli-Foro Italiano, 1987, p. 24-25).

14

Como o juiz deve se convencer de algo que está no plano do direito material, não há como exigiruma convicção uniforme para todas as situações de direito substancial. Em alguns casos, como osde lesões pré-natais, de seguro e relativos a atividades perigosas, a redução das exigências deprova ou de convicção de certeza é justificada pela própria estrutura e natureza dessas situações.Por isso, diante delas é admitida a convicção de verossimilhança. Tais situações têmparticularidades próprias, suficientes para demonstrar que a exigência de prova plena seriacontrária ao próprio desejo do direito material. Nelas o próprio direito material não se conciliacom a aplicação da regra do ônus da prova.

15

É evidente que o fato de o réu ter condições de provar a não existência do fato constitutivo nãopermite, por si só, a inversão do ônus da prova. Isso apenas pode acontecer quando asespecificidades da situação de direito material, objeto do processo, demonstrarem que não éracional exigir a prova do fato constitutivo, mas sim exigir a prova de que o fato constitutivo nãoexiste. Ou seja, a inversão do ônus da prova é imperativo de bom senso quando ao autor éimpossível, ou muito difícil, provar o fato constitutivo, mas ao réu é viável, ou muito mais fácil,provar a sua inexistência.

16

Sobre o princípio da efetividade, ver, na doutrina italiana, Luigi Paolo Comoglio, La garanziacostituzionale dell’azione e il processo civile, Padova: Cedam, 1970; Luigi Paolo Comoglio,Commentario della Costituzione (a cura di G. Branca), Bologna-Roma: Zanichelli-Foro Italiano,1981, p. 1 e ss; Andrea Proto Pisani, Brevi note in tema di tutela specifica e tutela risarcitoria, ForoItaliano, 1983, p. 128 e ss; Andrea Proto Pisani, L’effettività dei mezzi di tutela giurisdizionale conparticolare riferimento all’attuazione della sentenza di condanna, Rivista di Diritto Processuale,1975, p. 633; Adolfo di Majo, La tutela civile dei diritti, Milano: Giuffrè, 1993, p. 1 e ss; MicheleTaruffo, Note sul diritto alla condanna e all’esecuzione, Rivista Critica del Diritto Privato, 1986, p.635-637; Ferruccio Tommaseo, Appunti di diritto processuale civile, Torino: Giappichelli, 1995, p.169 e ss; Italo Andolina e Giuseppe Vignera, Il modello costituzionale del processo civile italiano,Torino: Giappichelli, 1990, p. 61 e ss.

17

Ver Andrea Proto Pisani, Appunti sulla tutela sommaria” (note “de iure condito” e “de iurecondendo”), I processi speciali, Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, Napoli: Jovene,1979, p. 311 e ss.

18

Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, , Napoli, Jovene, 1994, p. 627.

19

Ver Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela, p. 33 e ss.

20

“Lo squilibrio esistente tra attore e convenuto nell’ambito delle ipotesi in cui la tecnica èutilizzata ha indotto i giudici di merito a sollevare questioni di legittimità costituzionale perqueste ipotesi, ma la Corte costituzionale le ha sempre dichiarate infondate, per non violazionedei principi ex artt. 3 e 24, 2 comma, Cost., sulla base di un rilievo costante: il potere e non ildovere del giudice di emmetere il provvedimento di condanna con riserva, una volta accertata la

mancanza di ‘gravi motivi in contrario’. La razionalizzazione che può essere data a taleespressione è nel senso di ritenere che il giudice in tanto possa pronunciarsi in quanto leeccezioni sollevate dal convenuto e non provate documentalmente appaiano, a livello didelibazione, prima facie infondate. Pertanto, affinché sia soddisfatta l’esigenza di evitare l’abusodel diritto di difesa da parte del convenuto, senza peraltro che alcun principio costituzionalmentegarantito venga violato, è preferibile una ricostruzione della tecnica della condanna con riserva icui pressuposti siano: a) la prova piena o la non contestazione dei fatti costitutivi del dirittoazionato; b) la delibazione sommaria del giudice sulla infondatezza delle eccezioni delconvenuto” (Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, Napoli, Jovene, 1994, p. 627-628).

21

Giuseppe Chiovenda, Instituições de direito processual civil, São Paulo: Saraiva, 1965, v. 1, p. 7.

22

Cf. Idem, Ibidem. p. 8.

23

Giuseppe Chiovenda, Instituições de direito processual civil, cit., p. 9.

24

Cf. Salvatore Patti, Prove-Disposizioni generali, Commentario del Codice Civile (a cura di A. Scialojae G. Branca), Bologna-Roma: Zanichelli e Il Foro Italiano, 1987. p. 91-92.

25

Ver Egas Moniz de Aragão, Exegese do Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: AIDE, 1986, v. 4, t.1, p. 92.

26

Segundo Manuel de Andrade, são impeditivos os fatos suscetíveis de obstar a que o direito doautor se tenha validamente constituído (v.g., incapacidade, simulação, erro, dolo etc.), e ainda, aomenos parcialmente, os que, operando ab initio, apenas retardem o surgir desse direito ou a suaexercibilidade; são modificativos os que podem ter alterado o direito do autor tal como elevalidamente se constituiu (v.g., a mudança de local de uma servidão); são extintivos os quetenham produzido a cessação do direito do autor, depois de este já validamente formado (v. g.,condição resolutiva, termo peremptório, pagamento, prescrição etc.) (Manuel de Andrade, Noçõeselementares de processo civil, Coimbra: Imprensa Oficial,1979, p. 131).

27

Cf. Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p.321-322

28

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989.p. 322-323; Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, Napoli, Jovene, 1994, p. 628

29

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989, p. 323.

30

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989, p. 562.

31

Ver Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989, p.434.

32

Ver Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989, p.432-433.

33

Saliente-se que o conceito de não-contestação, ora proposto, nada tem a ver com o fenômeno danão contestação tal como tradicionalmente concebido (equivalente à revelia). Não é demaislembrar que ocorre contestação ainda que apresentada apenas defesa de mérito indireta.

34

“Si tratta, allora, di vedere che significato si possa attribuire all’espressione di eccezioneverosimilmente (in)fondata. A questo problema è dedicata l’ultima parte di questo paragrafo, cheintende sottoporre a breve esame il concetto stesso di verosimiglianza. Questo, sotto l’angolovisuale del quale ci stiamo occupando, non si distanzia affatto da quelli di prova prima-facie ofumus boni iuris o semplena probatio, ecc., facendo riferimento tutte queste espressioni, consfumature di scarso rilievo, allo stesso identico fenomeno, consistente nel prendere atto che uninsieme di fatti dedotti in giudizio non possono dirsi provati, ma egualmente la loro fondatezzapuò ritenersi probabile” (Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989.Milano: Giuffrè. 1989, p. 503).

35

Discorrendo sobre a experiência alemã a respeito do chamado “juízo de verossimilhança”,Salvatore Patti assim adverte: “as resistências em relação a um ‘balanceamento objetivo’ dasprovas com base em critérios de verossimilhança, no processo civil, derivam da influênciaexercida pelo conceito filosófico de verdade, como também das diversas exigências do processopenal, que impõem a eliminação de qualquer dúvida para se chegar ao juízo de culpabilidade. Asdúvidas que sempre subsistem em face dos limites do conhecimento humano não devem deixarmarcas na sentença penal; devem ficar na camera di consiglio. No processo penal, em definitivo,os resultados de tipo objetivo devem ser ‘integrados’ por uma fase subjetiva, por uma ‘tomada deconsciência interior’ que deve conduzir à certeza. Tudo isto, ao contrário, não é necessário noprocesso civil, no qual, vice-versa, almeja-se a eliminação destas ‘vozes internas’ que, além domais, podem levar a resultados diversos em hipóteses análogas” (Salvatore Patti, Prove –Disposizioni generali, Commentario del Codice Civile (a cura di A. Scialoja e G. Branca), p. 168).

36

“Aller Beweis ist richtig verstanden nur Wahrscheinlichkeitsbeweis” (todas as provas, a bemsentir, não são mais do que provas de verossimilhança) (ver Piero Calamandrei, Verità everosimiglianza nel processo civile, Rivista di Diritto Processuale, 1955, p. 164).

37

Piero Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile, p. 164-166. Ver ainda GerhardWalter, Livre apreciación de la prueba, Bogotá: Temis, 1985, p. 169-170.

38

A impossibilidade de o juiz descobrir a essência da verdade dos fatos não lhe dá o direito dejulgar o mérito sem a convicção da verdade. Estar convicto da verdade não é o mesmo queencontrar a verdade, até porque, quando se requer a convicção de verdade, não se nega apossibilidade de que “as coisas não tenham acontecido assim”. Lembre-se que Calamandrei, apósafirmar que “a natureza humana não é capaz de alcançar verdades absolutas”, salientou que “éum dever de honestidade acentuar o esforço para se chegar o mais perto possível dessa metainalcançável”. Ou seja, a verdade, quando compreendida na linha da teoria do conhecimento,não pode se colocar no mesmo plano da convicção de verdade. Ao lado dessa última categoriadeve ser colocada a convicção de verossimilhança, pois não há como aceitar a antítese“convicção-verossimilhança”, como se fosse possível pensar que a convicção somente pode serqualificada pela verdade. Ora, pode haver convicção de verdade e convicção de verossimilhança,ainda que ambas, na perspectiva gnoseológica, somente possam resultar em verossimilhanças. Aconvicção da verdade é relacionada com a limitação da própria possibilidade de buscar averdade e, especialmente, com a correlação entre essa limitação e a necessidade de definição doslitígios. O juiz chega à convicção da verdade a partir da consciência da impossibilidade dadescoberta da sua essência, uma vez que é essa que demonstra a falibilidade do processo para

tanto. Dessa tomada de consciência, para a conclusão de que o processo, apesar de tudo isso, nãopode impedir a eliminação dos conflitos, é um passo. Em resumo: o juiz, para pôr fim ao conflito,deve estar convicto, dentro das suas limitações, a respeito da verdade, uma vez que a suaessência é impenetrável.

39

Como diz Scarselli, “fatto provato e fatto verosimile sono due concetti distinti e tali devonorestare: su questa distinzione si basa la differenza tra il fumus boni iuris e la prova piena e noncrediamo che qualche giudice o qualche giurista abbia mai inteso dubitare della sostanzialediversità dei due concetti” (La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989, p. 507).

40

No caso de defesa direta infundada, pode não existir cognição exauriente nem mesmo sobre osfatos constitutivos, na medida em que, em alguns casos, tais fatos podem estar demonstrados pormeio de prova emprestada.

41

O ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao defensor público, ao advogadodativo e ao curador especial. (art. 341, parágrafo único, CPC).

42

A não-contestação “nasce da un sistema di argomentazioni del difensore o della parte, comparsade persona, che sia conciliabile con la verità dei fatti allegati dall’altra parte o dal difensore diquesta, né importa che la conciliabilità sia implicita o esplicita” (Virgilio Andrioli, Prova,Novissimo DigestoItaliano. vol. 143, p. 274).

43

Cf. Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p.432.

44

Cf. Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p.432-433.

45

“L’eccezione di merito, infatti, avendo ad oggetto un fatto estintivo, impeditivo o modificativo,pressupone normalmente l’esistenza del fatto costitutivo, che è il suo naturale pressuposto logico

imprescindibile, proprio perché, in tanto un fatto può modificarsi o estinguersi, in quanto siatorto, e in tanto ha un senso postulare uno o più fatti impeditivi in quanto si faccia riferimentoall’esistenza di un fatto costitutivo al quale il fatto impeditivo si ricollega. Ed è in questi terminiche sollecitiamo, di nuovo, a tener presente che, di regola, la proposizione di un’eccezione dimerito pressupone la non contestazione dei fatti costitutivi” (Giuliano Scarselli, La condanna conriserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p. 437).

46

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p. 439.

47

“§ 138 Erklärungspflicht über Tatsachen; Wahrheitspflicht

(1) Die Parteien haben ihre Erklärungen über tatsächliche Umstände vollständig und derWahrheit gemäßabzugeben.

(2) Jede Partei hat sich über die von dem Gegner behaupteten Tatsachen zu erklären.

(3) Tatsachen, die nicht ausdrücklich bestritten werden, sind als zugestanden anzusehen, wennnicht die Absicht, sie bestreiten zu wollen, aus den übrigen Erklärungen der Partei hervorgeht.

(4) Eine Erklärung mit Nichtwissen ist nur über Tatsachen zulässig, die weder eigeneHandlungen der Partei noch Gegenstand ihrer eigenen Wahrnehmung gewesen sind”.

48

Cf. Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 419.

49

Cf. Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 420.

50

É interessante recordar a didática lição de Wellington Moreira Pimentel: “A imposição daespecificação dos fatos impugnados é uma conseqüência do princípio da igualdade processualdas partes. Assim como o autor deve fazer constar da inicial o fato, ou fatos, bem como osfundamentos jurídicos do pedido, compete ao réu impugná-los com a mesma especificidade, ouse terá aqueles por verdadeiros. Se é certo que o réu não tem o dever de se defender, vale dizer,de contestar, se o faz deve colaborar para que se atinja o objetivo do processo. E esse dever decolaboração o obriga, inclusive, a expor os fatos em juízo conforme a verdade (art. 77, I,CPC/2015), e o impede de, licitamente, alegar defesa ciente de que é destituída de fundamento(art. 77, III, CPC/2015)” (Comentários ao Código de Processo Civil, São Paulo: Revista dos Tribunais,1975, v. 3, p. 268-269).

51

“Il documento, a differenza dalla testimonianza, non è un atto, ma una cosa. L’attività dell’uomo èla fonte comune delle due forme di rappresentazione, ma è con la rappresentazione in rapportodiverso: nella testimonianza l’atto è lo stesso fatto rappresentativo, onde la rappresentazione ne èl’effetto immediato; nel documento l’atto non è punto il fatto rappresentativo, ma un momentoprecedente a questo, poiché non rappresenta per sé, ma crea un oggetto capace di rappresentare.Chi vuol avere una brusca impressione di questa differenza paragoni l’atto del narratore all’attodel preparatore fonografico: il primo agisce rappresentando, il secondo agisce preparando unacosa, che rappresenterà. Il punto di contatto fra i due tipi di fatti rappresentativi è pertanto laformazione mediante la attività dell’uomo; il punto di distacco è il pressuposto di questa attività,che nel documento opera su un fatto presente e si proietta nel futuro, nella testimonianza operasu un fatto non presente e si proietta nel passato” (Francesco Carnelutti, La prova civile, Roma:Edizioni dell’ateneo, 1947, p. 181). Ver, também, Francesco Carnelutti, Istituzioni del processocivile, Roma: Soc. ed. del “Foro Italiano”, v. 1, p. 155; Teoria generale del diritto, Roma, 1951, v. 1, p.383 e ss; Diritto e processo, Napoli: Morano, 1959, p. 128 e ss.

52

“ Il documento non è soltanto una cosa, ma una cosa rappresentativa, cioè capace dirappresentare un fatto” (Francesco Carnelutti, La prova civile, Roma: Edizioni dell’ateneo, 1947. p.183).

53

EDcl no AgRg no AREsp 151.216/SP, 3a. Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe 20.09.2013.

54

No direito italiano, existindo prova do fato constitutivo, é possível a execução imediata domandado de pagamento (decreto injuntivo) no procedimento monitório. O legislador italiano, apartir da experiência do procedimento monitório e visando a aceleração da prestaçãojurisdicional, introduziu no CPC regra que dá ao autor a possibilidade de propor “ação decondenação” dizendo-se credor de soma em dinheiro, de determinada quantidade de coisasfungíveis ou de coisa móvel determinada, desde que demonstre o seu direito através de “provaescrita”. Ou seja, o art. 186-ter do CPC italiano transplantou a técnica do procedimento monitóriopara o procedimento comum. No que diz respeito à prova do direito, admite-se apenas achamada “prova escrita” – art. 633, primeira parte, n. 1 –, considerando-se com esta qualidadetambém as previstas no art. 634, que assim dispõe: “634. Prova scritta (1) Sono prove scritteidonee a norma del n. 1 dell’articolo precedente le polizze e promesse unilaterali per scritturaprivata e i telegrammi, anche se mancanti dei requisiti prescritti dal Codice civile. (2) Per i creditirelativi a somministrazioni di merci e di danaro fatte da imprenditori che esercitano un’attivitàcommerciale, anche a persone che non esercitano tale attività, sono altresì prove scritte idoneegli estratti autentici delle scritture contabili di cui agli artt. 2214 e segg. del Codice civile, purché

bollate e vidimate nelle forme di legge e regolarmente tenute, nonché gli estratti autentici dellescritture contabili prescritte dalle leggi tributarie, quando siano tenute con l’osservanza dellenorme stabilite per tali scritture”. São excluídas as hipóteses previstas no art. 633, 2 e 3, e nosarts. 635 e 636. Assim, por exemplo, os créditos do Estado e dos entes públicos, e os relativos ahonorários profissionais, não podem ser tutelados mediante a prova descrita nas referidasnormas. Como explica Claudio Cecchella, “não se trata de um provimento monitório denominado‘puro’ (no qual a prova dos fatos constitutivos não tem importância), como no caso das‘ordinanze’ ao pagamento de soma não contestada, pois a parte que pretende obter a‘ingiunzione’ ou a ‘ordine’ de entrega deve fornecer prova ‘por escrito’ dos fatos constitutivos doseu direito” (Claudio Cecchella, Il processo civile dopo le riforme, Torino: Giappichelli. 1992. p.125). No direito italiano, a “ordinanza di ingiunzione” e o “decreto ingiuntivo” não sãoimediatamente executivos. A eles se pode dar execução provisória apenas quando presentes ospressupostos dos arts. 642 e 648, primeira parte, do CPC, isto é, quando: i) “il credito è fondato sucambiale, assegno bancario, assegno circolare, certificato di liquidazione di borsa, ou su attoricevuto da notaio o da altro pubblico ufficiale autorizzato” (art. 642, primeira parte, do CPCitaliano); ii) há perigo de grave prejuízo no atraso do início do procedimento executivo (art. 642,segunda parte, do CPC italiano); iii) há documento subscrito pelo devedor comprovando o direito(art. 642, segunda parte in fine, do CPC italiano); e iv) não havendo contumácia, a oposição não éfundada sobre prova escrita ou de pronta solução (art. 648, primeira parte, do CPC italiano). Diz oart. 186-ter, segunda parte, que a “ordinanza” pode ser declarada provisoriamente executiva sepresentes os pressupostos do art. 642, “nonché”, se o réu não é contumaz, quando as suas defesasnão são fundadas em prova escrita ou de pronta solução. O uso do advérbio “nonché” levou parteda doutrina a sustentar que a “ordinanza” – no caso de réu constituído – somente poderia serconcedida na presença dos pressupostos cumulados dos artigos 642 e 648. Outros, como ProtoPisani, concluíram que para esta tutela bastariam apenas os pressupostos do art. 648 (AndreaProto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p. 640). Finalmente, outra parte da doutrinachegou ao entendimento no sentido de que a tutela poderia ser concedida tanto frente aospressupostos do art. 642 como diante daqueles do art. 648 (Gabriela Rampazzi, Le riforme delprocesso civile (a cura di Sergio Chiarloni), Bologna: Zanichelli, 1992. p. 255; Aldo Attardi, Leordinanze di condanna nel giudizio ordinario di cognizione di primo grado secondo la legge diriforma, Giurisprudenza italiana, 1992, p. 6). Afirma o art. 186-ter, após fazer referência àshipóteses em que o juiz pode dar imediata eficácia à “ordinanza”, que esta não pode serconcedida quando o réu alegar desconhecimento da escritura privada ou propuser “querela difalso” contra o ato público. O objetivo da regra é evitar o início da execução quando houver afundada probabilidade de que o documento contestado, sobre o qual se funda a execução da“ordinanza”, possa perder a sua eficácia. Ver Giuseppe Tarzia, Lineamenti del nuovo processo dicognizione, Milano: Giuffrè, 1991, p. 137 e ss; Edoardo Ricci, A tutela antecipatória na Itália,Revista de Direito Processual Civil (Genesis), v. 4; Edoardo Ricci, Per una efficace tutela provisoriaingiunzionale dei diritti di obbligazione nell’ordinario processo civile, Rivista di DirittoProcessuale, 1990, p. 1025 e ss; Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p. 639 e ss;Romano Vaccarella, Bruno Capponi e Claudio Cecchela, Il processo civile dopo le riforme, Torino:Giappichelli, 1992, p. 125 e ss; Gabriella Rampazzi, Le riforme del processo civile (a cura di SergioChiarloni), Bologna: Zanichelli, 1992; Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo,Lezioni sul processo civile, Bologna: Il Mulino, 1995, p. 597 e ss; Crisanto Mandrioli, Le modifichedel processo civile, Torino: Giappichelli, 1991, p. 78 e ss; Sergio Chiarloni, Riflessioni inattuali sulla

novella del processo civile (con particolare riguardo ai provvedimenti cautelari ed interinali),Foro Italiano, 1991, p. 501 e ss; Claudio Consolo, Un codice di procedura civile “seminuovo”,Giurisprudenza italiana, 1990, p. 443 e ss; Aldo Attardi, Le ordinanze di condanna nel giudizioordinario di cognizione di primo grado secondo la legge di riforma, Giurisprudenza italiana, 1992,p. 2 e ss.

55

Ver José Rogério Cruz e Tucci, Ação monitória, São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001. p. 41.

56

Edoardo Garbagnati, Il procedimento d’ingiunzione, Milano, Giuffrè, 1991, p. 51-52.

57

Cf. Edoardo Garbagnati, Il procedimento d’ingiunzione, Milano, Giuffrè, 1991, p. 44.

58

Edoardo Garbagnati, Il procedimento d’ingiunzione, Milano, Giuffrè, 1991, p. 203.

59

Edoardo Garbagnati, Il procedimento d’ingiunzione, Milano, Giuffrè, 1991, p. 58-59.

60

De acordo com o art. 418 do Código de Processo Civil, “os livros empresariais que preencham osrequisitos exigidos por lei provam a favor de seu autor no litígio entre empresários”.

61

“Invero, poiché l’opposizione dà vita nel quadro di un unico processo ad un procedimento incontraddittorio con cognizione ordinaria, in cui tornano ad avere vigore quelle medesime normesull’ammissibilità e rilevanza dei singoli mezzi di prova, che sarebbero state applicabili sel’azione di condanna, anziché attraverso lo speciale procedimento d’ingiunzione, fosse stataesercitata subito in forma di citazione, può accadere che un documento, costituente prova scrittain base agli art. 633 e seg. e posto, como tale, a fondamento di un decreto d’ingiunzione, perda inseguito all’opposizione la sua speciale efficacia probatoria: con la conseguenza che, se ilricorrente non deduce altri mezzi di prova del fatto costitutivo del suo preteso credito, contestatodall’opponente, la sua domanda può essere rigettata, in applicazione dell’art. 2697 c. civ., essendola formazione del convincimento del giudice nuovamente regolata, agli effetti della decisione inmerito alla opposizione, dalle norme vigente in un processo ordinario di cognizione” (Edoardo

Garbagnati, Il procedimento d’ingiunzione, p. 200-201).

62

Sobre as chamadas tutelas jurisdicionais diferenciadas, Luiz Guilherme Marinoni, Efetividade doprocesso e tutela de urgência, Porto Alegre: Fabris, 1994, p. 1-10; Luiz Guilherme Marinoni, Tutelacautelar e tutela antecipatória, p. 17 e ss.; Federico Carpi, Flashes sulla tutela giurisdizionaledifferenziata, Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1980; Nicola Picardi, I processispeciali, Rivista di Diritto Processuale, 1982; Andrea Proto Pisani, Sulla tutela giurisdizionaledifferenziata, Rivista di Diritto Processuale, 1979; Augusto Mario Morello, Las nuevas exigenciasde tutela, RePro, v. 31; Adolfo Gelsi Bidart, Tutela procesal diferenciada, RePro, v. 44.

63

O art. 642, II, do CPC italiano, diz que “l’esecuzione provvisoria può essere concessa anche se vi èpericolo di grave pregiudizio nel ritardo...”

64

Cf. Luigi Montesano, La tutela giurisdizionale dei diritti, Trattato di diritto civile italiano, v. XIV, t.4, p. 257.

65

Na jurisprudência italiana, ver Pretura di Roma, 15.12.82, in Temi Romana, 1982, p. 637; Preturadi Roma, 31.07.86, in Giustizia Civile, 1986, I, p. 2.583.

66

Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, Napoli, Jovene, 1994, p. 505.

67

Eis o que diz o art. 648, I, do CPC italiano: “648. Esecuzione provvisoria in pendenza diopposizione – (1) Il giudice istruttore, se l’opposizione non è fondata su prova scritta ou di prontasoluzione, può concedere, provvedendo in prima udienza, con ordinanza non impugnabile,l’esecuzione provvisoria del decreto, qualora non sia già stata concessa a norma dell’articolo 642...”.

68

Edoardo Garbagnati, Il procedimento d’ingiunzione, p. 178-179.

69

Sobre a inefetividade da sentença condenatória para a tutela de determinadas situações dedireito substancial, ver Michele Taruffo, Note sul diritto alla condanna e all’esecuzione, RivistaCritica del Diritto Privato, 1986; Elisabetta Silvestri e Michele Taruffo, Esecuzione forzata,Enciclopedia Giuridica Trecanni, v. 13; Andrea Proto Pisani, Appunti sulla tutela di condanna,Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1978; Cristina Rapisarda, Profili della tutela civileinibitoria, Padova: Cedam, 1987; Massimo D’Antona, La reintegrazione nel posto di lavoro (art. 18dello Statuto dei Lavoratori), Padova: Cedam, 1979; Michele Taruffo, Problemi in tema diesecutorietà della condanna alla reintegrazione del lavoratore, Rivista Trimestrale di Diritto eProcedura Civile, 1976; Adolfo di Majo, Reintegrazione nel posto di lavoro e controllo del poterenell’impresa (a proposito di una pubblicazione), Rivista Giuridica del Lavoro, 1979. No direitobrasileiro, ver Luiz Guilherme Marinoni, Tutela contra o ilícito; Ovídio Baptista da Silva, Curso deprocesso civil, v. 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

70

Sobre a tutela das obrigações de fazer e não fazer, ver Salvatore Mazzamuto, L’attuazione degliobblighi di fare, Napoli: Jovene, 1978; Lanfranco Ferroni, Obblighi di fare ed eseguibilità,Pubblicazioni della Scuola di Perfezionamento in Diritto Civile dell’Università di Camerino, 1983;Giuseppe Borrè, Esecuzione forzata degli obblighi di fare e di non fare, Napoli: Jovene, 1966;Giuseppe Borré, Verso la riforma del codice di procedura civile? Riflessi sulla disciplinadell’esecuzione forzata nel disegno di legge delega n. 1.463, Foro italiano, 1983; Giuseppe Tarzia,Presente e futuro delle misure coercitive civile, Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile,1981; Vittorio Colesanti, Misure coercitive e tutela dei diritti, Rivista di Diritto Processuale, 1980;Girolamo Monteleone, Recenti sviluppi nella dottrina dell’esecuzione forzata, Rivista di DirittoProcessuale, 1982; Luigi Montesano, Considerazioni su storia moderna e proposte di riforme dellagiustizia civile in Italia, Rivista di Diritto Processuale, 1981.

71

Ovídio Baptista da Silva, Curso de processo civil, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 295.

72

“Dessarte só será admitido o traslado da prova de um processo para outro quando em ambossejam as mesmas as partes litigantes e haja sido fielmente respeitada a igualdade de suasoportunidades no processo de onde provém. Isso não significa que somente em tais casos possaser transportada prova de um processo para outro. Não. O que acontece é o seguinte: quando aprova emprestada foi colhida escorreitamente e as partes são as mesmas, conserva a eficácia quelhe é peculiar; fora disso não. Neste caso (como em vários outros) considera-se atípica a provaproduzida, por não o ter sido em estrita conformidade com as regras que regem o procedimentoprobatório” (Egas Moniz de Aragão, Exegese do Código de Processo Civil, v. 4, t. 1, p. 62).

73

Cf. Egas Moniz de Aragão, Exegese do Código de Processo Civil, v. 4, t. 1, p. 98.

74

Egas Moniz de Aragão, Exegese do Código de Processo Civil, v. 4, t. 1, cit., p. 97-98.

75

Sobre o ônus da prova, ver Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, Prova e Convicção;Salvatore Patti, Prove, Disposizioni generali; Gian Antonio Micheli, Onere della prova, Padova:Cedam, 1966, p. 177 e ss; Luigi Paolo Comoglio, Le Prove, Trattato di diritto privato (diretto daRescigno), v. 19, p. 193 e ss; Giovanni Verde, Prova, Enciclopedia del diritto, v. 37, p. 628 e ss.

76

Cf. Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p.560.

77

Art. 2.697 (Código Civil italiano): “Onere della prova. – Chi vuol far valere un diritto in giudiziodeve provare i fatti che ne costituiscono il fondamento. Chi eccepisce l’inefficacia di tali fattiovvero eccepisce che il diritto si è modificato o estinto deve provare i fatti su cui l’eccezione sifonda”.

78

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p. 560-561.

79

Cf. Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 551.

80

A técnica dos títulos executivos extrajudiciais também é uma técnica de sumarização, à medidaque elimina a possibilidade de o juiz averiguar a existência do direito que o próprio título fazpresumir presente (Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela, p. 45).

81

Veja-se a doutrina de Andolina: “Nelle pagine seguenti, attraverso una adeguata elaborazione del

modello concettuale del “conflitto esecutivo”, tenterò per l’appunto di mostrare come il titoloesecutivo tragga la sua ragion d’essere dalla distensione diacronica del processo, o se si vuole,dalla necessità di pagare, in termini di tempo, il prezzo d’un soddisfacente accertamento dellaverità. Parafrasando il Calamandrei, ritengo possibile affermare che “in un ordinamentoprocessuale puramente ideale, in cui l’accertamento definitivo potesse sempre essere istantaneo,in modo che, nello stesso momento in cui l’avente diritto presentasse la domanda, subito potesseessergli resa giustiza in modo pieno ed adeguato”, non vi sarebbe più bisogno del titolo esecutivo(sia giudiziale che stragiudiziale): o meglio, la qualità di titolo esecutivo verrebbe attribuitasoltanto al giudicato, sicché l’esecuzione forzata sarebbe sempre fondata sull’accertamentodefinitivo del diritto soggettivo insoddisfatto” (Italo Andolina, “Cognizione” ed “esecuzioneforzata” nel sistema della tutela giurisdizionale, Milano: Giuffrè, 1983, p. 14-15).

82

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 561-562.

83

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 562.

84

Ver, sobre a discussão a respeito do papel desenvolvido pelo título executivo, FrancescoCarnelutti, Titolo esecutivo, Rivista di Diritto Processuale Civile, 1931, p. 313; Enrico TullioLiebman, Le opposizioni di merito nel processo d’esecuzione, Foro Italiano, Roma, 1936; EnricoTullio Liebman, La sentenza come titolo esecutivo, Rivista di Diritto Processuale Civile, 1929, p.117; Enrico Tullio Liebman, Il titolo esecutivo riguardo ai terzi, Rivista di Diritto ProcessualeCivile, 1934, p. 127. Mais recentemente, ver Ferdinando Mazzarella, Contributo allo studio deltitolo esecutivo, Milano: Giuffrè, 1965; Ferdinando Mazzarella, Ancora sul titolo esecutivo, Rivistadi Diritto Processuale, 1967, p. 314; Ferdinando Mazzarella, Scienza e teologia del titolo esecutivo,Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1971, p. 177; Italo Andolina, Contributo alladottrina del titolo esecutivo, Milano: Giuffrè, 1982; Romano Vaccarella, Titolo esecutivo, precetto,opposizioni, 2ª. ed., Torino: Giappichelli, 1993.

85

Ver Ovídio Baptista da Silva, Curso de processo civil, v. 1, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000,p. 105..

86

“Di fatto storicamente il ricorso a questa tecnica è stato (nè, a mio avviso, poteva esserediversamente) influenzato anche dalla opportunità di privilegiare i soggeti reali portatori deltitolo ed i relativi diritti (è sintomatico, a tale riguardo, che la stragrande maggioranza dei titoli

esecutivi di formazione stragiudiziale è a disposizione di imprenditori commerciali e diPubbliche Amministrazioni)” (Andrea Proto Pisani, Appunti sulla tutela sommaria, I processispeciali, Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, Napoli: Jovene, 1979, p. 318).

87

Andrea Proto Pisani, Appunti sulla tutela sommaria, I processi speciali, Studi offerti a VirgilioAndrioli dai suoi allievi, Napoli: Jovene, 1979,p. 315 e ss.

88

Giuseppe Chiovenda, Sulla perpetuatio iurisdictionis. Saggi di diritto processuale civile, Roma,1930, p. 264 e ss.

89

“In primo luogo la condanna con riserva è diversa dal principio secondo il quale la durata delprocesso non devere andare a danno dell’attore che ha ragione. La prima, infatti, facendo seguirel’esecuzione forzata alla prova dei fatti costitutivi, addossa immediatamente al convenuto i tempidel processo che servono per la verifica della fondatezza delle sue eccezioni; il secondo, invece(ove si eccettuino le ipotesi di provvedimenti cautelari anticipatori), continua a far sopportareall’attore il peso dell’intera durata del processo, però evita che, a seguito della sentenza definitivache accoglie la sua domanda, questi possa subirne nocumenti” (Giuliano Scarselli, La condannacon riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 577-578).

90

“Ma, per il momento, è opportuno mettere da parte queste considerazioni e concentrarel’attenzione sul danno che l’attore subisce nelle more del procedimento: esso puòconvenientemente definirsi come “marginale”, in quanto va progressivamente ad aggiungersi aquello eventualmente già sofferto anteriormente alla proposizione della domanda. Ora va rilevatoche, in pendenza del processo, l’unico dato di sicura rilevazione è l’entità quantitativa del dannomarginale (e del correlativo vantaggio accumulato dal convenuto), mentre non si è ancoraassolutamente in grado di stabilire se esso sia secundum ius o contra ius; una qualificazionegiuridica nell’uno o nell’altro senso potrà essere operata soltanto successivamente, cioè quando,compiutosi il cammino del processo, si potrà disporre dell’accertamento definitivo (dell’esistenzao dell’inesistenza) del diritto dell’attore” (Italo Andolina, Cognizione ed esecuzione forzata nelsistema della tutela giurisdizionale, p. 17).

91

Assim Scarselli, La condanna con riserva, p. 584.

92

Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p. 627. Ver do mesmo autor: Verso lariforma del Codice di Procedura Civile? Prospettive in tema di processi a cognizione piena esommaria in un recente disegno di legge delega, Appunti sulla giustizia civile, Bari: Cacucci, 1982,p. 436 e ss; La tutela di condanna, Appunti sulla giustizia civile, Bari: Cacucci, 1982, p. 190 e ss;Appunti sulla tutela sommaria, I processi speciali, p. 320 e ss; Sulla tutela giurisdizionaledifferenziata, Rivista di Diritto Processuale, 1979, p. 207 e ss.

93

Admite-se no direito francês o référé-provision, quando “l'obligation n'est pas sérieusementcontestable” (a obrigação não for seriamente contestável). Trata-se de espécie de référé baseadoem “direito evidente”, conforme artigos 809, II e 849, II, do Código de Processo Civil francês. Asegunda parte dos artigos 809 e 849 – o primeiro relativo ao presidente do tribunal e o segundoao juiz do tribunal de instância – assim dispõe: “Dans les cas où l'existence de l'obligation n'est passérieusement contestable, il peut accorder une provision au créancier, ou ordonner l'exécution del'obligation même s'il s'agit d'une obligation de faire”. Ver Roger Perrot, Les mesures provisoiresen droit français, in Les mesuresprovisoires enprocédure civile, p. 164; Loïc Cadiet, Code deProcédure Civile, Paris: LexisNexis, 2016; Loïc Cadiet, Jacques Normand e Soraya Mekki Amrani,Théorie générale du procès, Paris: Presses Universitaire de France, 2010; Loïc Cadiet e EmmanuelJeuland, Droit Judiciaire Privé, Paris: LexisNexis, 2016.

94

Luiz Guilherme Marinoni, Il diritto di azione come diritto fondamentale, Torino: Giappichelli,2016; Luiz Guilherme Marinoni, El derecho de acción como derecho fundamental, Bogotá: Temis,2015; Luiz Guilherme Marinoni, Il diritto alla tutela giurisdizionale effettiva nella prospettivadella teoria dei diritti fondamentali. Studi di diritto processuale civile in onore di GiuseppeTarzia, v. 1, p. 93-162.

95

Ver Federico Carpi, Flashes sulla tutela giurisdizionale differenziata, Rivista Trimestrale di Dirittoe Procedura Civile, 1980, p. 239.

96

“Si è detto che il principio del contraddittorio è rispettato anche quando il provvedimento èpronunciato inaudita altera parte, purchè, prima che il provvedimento diventi definitivo, la partecontro cui è emesso abbia la possibilità di proporre le sue difese” (Giuseppe Martinello,“Contradittorio (Principio del)”, Novissimo digesto italiano, v. 4, p. 461).

97

Sobre a tutela da evidência, ver Leonardo Greco, A tutela de urgência e a tutela da evidência noCódigo de Processo Civil de 2015, Coletânea Novo CPC: DoutrinaSelecionada, vol. 4, Salvador:Juspodivm, 2015, p. 199 ss; Andrea Carla Barbosa, Direito em expectativa: as tutelas de urgência eevidência no projeto de novo código de processo civil. Breves comentários, Revista de Processo, v.194; Roberto Antonio Vallim Bellocchi, A tutela da evidência: irreversibilidade, Revista deProcesso, v. 252; Antonio de Moura Cavalcanti Neto, Possibilidade de concessão de tutela daevidência contra a Fazenda Púbica no projeto de novo Código de Processo Civil: sobre acreditarou não no acesso à justiça, Revista de Processo, v. 238; Lucas Buril de Macedo, Antecipação datutela por evidência e os precedentes obrigatórios, Revista de Processo, v. 242; Antônio PereiraGaio Júnior, Apontamentos para a tutela provisória (urgência e evidência) no novo Código deProcesso Civil brasileiro, Revista de Processo, v. 254; Leonardo de Souza Naves Barcellos. Ashipóteses de tutela de evidência previstas no novo CPC, Revista de Processo, v. 254.

98

Luiz Guilherme Marinoni, Precedentes obrigatórios, 5a. ed., São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,2016.

99

O art. 186-ter do Código de Processo Civil italiano, depois de aludir às hipóteses em que o juizpode dar imediata eficácia à “ordinanza”, afirma que esta não pode ser concedida quando o réualegar desconhecimento da escritura privada ou propuser “querela di falso” contra o ato público.O objetivo da regra é evitar o início da execução quando houver a fundada probabilidade de que odocumento contestado, sobre o qual se funda a execução da “ordinanza”, possa perder a suaeficácia. Ver Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, Napoli, Jovene, 1994, p. 639e ss; Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo, Lezioni sul processo civile, p. 597 e ss;Claudio Consolo, Un codice di procedura civile “seminuovo”, Giurisprudenza italiana, 1990, p. 443e ss.

100

Isto não quer dizer que, em hipóteses excepcionais, a tutela da evidência não possa ser prestadana sentença. Ver um pouco mais na frente o item 14.

101

Sobre o référé francês, ver Jacques Vuitton e Xavier Vuitton, Les référés, Paris: LexisNexis, 2006;Roger Perrot, L’évolution du référé, in Mélanges Hébraud, Toulouse: Université Toulouse 1, 1981;Serge Guinchard, Frédérique Ferrand e Cécile Chainais, Procédure civile, Paris: Dalloz, 2008.

102

“Grâce au ‘référé-provision’, ces méthodes détestables n’ont pas totalement disparu, mais du

moins ont elles été sérieusement découragées. À cet égard, le ‘référé provision’ a constitué unimmense progrès et il n’est pas excessif d’y voir l’une des meilleures réformes judiciaires desdernières années” (Roger Perrot, Les mesures provisoires en droit français”, Les mesuresprovisoires en procédure civile, Milano, Giuffrè, 1985, p. 168-169).

103

Lembre-se, contudo, que recebido o agravo de instrumento o relator poderá “atribuir efeitosuspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensãorecursal, comunicando ao juiz sua decisão” (art. 1.019, I, CPC).

104

“O ‘devido processo legal’ é um privilégio processual reconhecido apenas aos demandados? Ou,ao contrário, também os autores terão direito a um processo igualmente ‘devido’, capaz deassegurar-lhes a real e efetiva realização prática – não apenas teórica – de suas pretensões? Umprocesso capenga, interminável em sua exasperante morosidade, deve ser reconhecido como um‘devido processo legal’, ao autor que somente depois de vários anos logre uma sentençafavorável, enquanto se assegura ao réu, sem direito nem mesmo verossímil, que demanda emprocedimento ordinário, o ‘devido processo legal’,com ‘plenitude de defesa’?” (Ovídio Baptista daSilva, A ‘plenitude de defesa’ no processo civil, As garantias do cidadão na justiça,São Paulo:Saraiva, 1993, p. 154).

105

Há muito demonstrou-se a distinção entre execução provisória (rectius: fundada em decisãoprovisória) e execução completa (Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da tutela), embora adoutrina em geral e o novo código não a tenham percebido. Mas não faz mal: ela é inescondível.

106

Sobre os princípios da menor restrição possível e do meio mais idôneo, ver Luiz GuilhermeMarinoni, Técnica processual e tutela dos direitos, p. 236-239.

107

Como a garantia constitucional de acesso à justiça incide sobre a estrutura técnica do processo deiure condendoe de iure conditio,é dever do processualista extrair das normas uma interpretaçãoque permita a construção de um “processo justo”, isto é, de um processo que atenda aos valoresconstitucionais em uma perspectiva concreta e não meramente formal.

108

Ver Collia, L’ordinanza per il pagamento di somme non contestate nel processo del lavoro, Rivista

diDiritto Processuale, 1994, p. 540 e ss.

109

Vittorio Denti, Il nuovoprocesso dellavoro, Milano: Giuffrè, 1974, p. 138.

110

Giuseppe Tarzia, Manuale del processo del lavoro, Milano: Giuffrè, 2008, Milano: Giuffrè, 2008, p.183.

111

Filippo Collia, L’ordinanza per il pagamento di somme non contestate nel processo del lavoro,Rivista diDiritto Processuale, 1994, p. 541.

112

Ver Andrea Proto Pisani, Le controversiein materiadi lavoro, Bologna-Roma, 1987, p. 421.

113

Wellington Moreira Pimentel, Comentários aoCódigo deProcesso Civil, São Paulo: Imprenta. 1975.p. 267-268.

114

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. p. 439.

115

Ver Rita Gianesini, Da reveliano processocivil brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p.78.

116

Art. 282 do CPC italiano.

117

Sobre o ponto, assim escrevem Comoglio, Ferri e Taruffo: “La sua funzione pratica è, quindi, perevidenti motivazioni di economia processuale, diretta ad assicurare l’effettività della tutela dicondanna con la creazione anticipata di un titolo esecutivo, neutralizzando i ‘tempi morti’(misurabile anche in ragione di anni) che – secondo una prassi consolidata, ormai imposta dal

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sovraccarico degli uffici giudiziari – perlopiù intercorronotra lachiusura dell’istruzioneeladecisione dellacausa” (Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo, Lezionisulprocesso civile: Bologna, Il Mulino, 1995, p. 607).

118

Gabriella Rampazzi, Le riforme del processo civile (a cura di Sergio Chiarloni), Bologna:Zanichelli, 1992. p. 237-238.

119

Mediante o art. 186-quater, cuja primeira parte assim estabelece: “186-quater. Ordinanzasuccessiva alla chiusura dell’istruzione (1) Esaurita l’istruzione, il giudice istruttore, su istanzadella parte che ha proposto domanda di condanna al pagamento di somme ovvero alla consegnao al rilascio di beni, può disporre con ordinanza il pagamento ovvero la consegna o il rilascio, neilimiti per cui ritiene già raggiunta la prova. Con l’ordinanza il giudice provvede sulle speseprocessuali”.

120

Ver José Carlos Barbosa Moreira, “Sobre a multiplicidade de perspectivas no estudo do processo”,Revista Brasileirade DireitoProcessual, v. 56, p. 19-20.

121

Giuliano Scarselli, La condanna con riserva, Milano: Giuffrè. 1989. Milano: Giuffrè. 1989. p. 439.

122

Gabriella Rampazzi, Le riforme del processo civile, Bologna: Zanichelli, 1992, p. 237.

123

Luiz Guilherme Marinoni, O STJ enquanto Corte de Precedentes, 2.ª. ed., São Paulo, Ed. Revista dosTribunais, 2014, p. 154-155.

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