UFF - Trabalho de Direito de Família - Análise do Acórdão do STF sobre União Estável...

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Faculdade de Direito DIREITO DE FAMÍLIA Professor José MarcoTayah O RECONHECIMENTO DA CONSTITUCIONALIDADE DA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA PELO STF NO JULGAMENTO DA ADIN nº 4277 E DA ADPF nº 132

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Faculdade de Direito DIREITO DE FAMÍLIAProfessor José MarcoTayah

O RECONHECIMENTO DA CONSTITUCIONALIDADE DA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA PELO STF

NO JULGAMENTO DA ADIN nº 4277 E DA ADPF nº 132

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TÓPICOS ESPECIAIS DE DIREITO CONSTITUCIONAL PROFESSOR JOSÉ MARCO TAYAHANÁLISE DE FILMES À LUZ DO DIREITO DE FAMÍLIA BRASILEIRO

André Fernandes Monteiro de Souza - Matrícula nº 205.07.139-8

Ao reconhecer a união homoafetiva como união estável constitucionalmente

protegida, o Supremo Tribunal Federal garantiu quase completamente a isonomia de

direitos entre casais homoafetivos relativamente a casais heteroafetivos. Diz-se "quase"

porque se sabe que o casamento civil garante um pouco mais de direitos que a união estável

pela forma como ambos os regimes jurídicos estão regulamentados pelo Código Civil, em

especial no que tange à sucessão hereditária (o cônjuge é herdeiro necessário, o

companheiro não; o cônjuge tem maior quinhão hereditário que o companheiro etc). Logo,

a isonomia ainda não está completamente satisfeita com a situação, embora cumpra dizer

que o STF não era obrigado a entrar no debate sobre o casamento civil homoafetivo por

terem as ações feito pedidos unicamente no que tange ao reconhecimento da união estável

entre casais homoafetivos (questão formal, pela vinculação necessária do julgamento aos

pedidos das ações).

Por outro lado, agora que o STF reconheceu que a união homoafetiva constitui uma

família/entidade familiar, não há mais nenhuma justificativa jurídica para que se negue o

direito de casais homoafetivos consagrarem sua união pelo casamento civil. A uma porque

o §3º do art. 226 da CF/88 diz que a lei deve facilitar a conversão da união estável em

casamento, donde, sendo a união homoafetiva uma união estável, deve ter a si reconhecido

o direito à conversão em casamento. A outra por uma questão de lógica: o casamento civil e

a união estável são regimes jurídicos destinados a proteger/regulamentar as famílias,

donde, sendo a união homoafetiva uma família, ela deve ter a si garantidos tanto o

casamento civil quanto a união estável. Não faz sentido jurídico nenhum dizer que a união

homoafetiva é família e constitui uma união estável constitucionalmente protegida, mas

não poderia ser consagrada pelo casamento civil, pois, repita-se, tanto o casamento civil

quanto a união estável destinam-se a proteger/regulamentar as famílias conjugais, donde é

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contraditório o não-reconhecimento do casamento civil homoafetivo quando se reconhece

a união estável homoafetiva (afinal, a redação constitucional sobre união estável e

casamento civil é análoga relativamente à menção a homem e mulher – em ambos os casos,

ela cita este fato heteroafetivo sem, contudo, proibir o reconhecimento do fato homoafetivo

como casamento civil ou união estável).

Da mesma forma, a adoção conjunta por casais homoafetivos agora deverá ser

obrigatoriamente deferida, pois a legislação diz que podem adotar conjuntamente os

cônjuges e os companheiros – e companheiros é o termo técnico do Direito para designar

os integrantes de uma união estável, que o Supremo disse existir em casais homoafetivos

pautados por uma relação pública, contínua e duradoura.

A única preocupação decorrente do julgamento parte da observação de alguns

Ministros do STF no final do julgamento, de que o Congresso não está proibido de legislar

sobre o tema (o que é evidente) e que pode regulamentar as especificidades de cada uma

das uniões. Embora somente três ministros (Lewandowski, Gilmar Mendes e Peluso)

tenham demonstrado alguma "preocupação" com os efeitos da decisão (que Gilmar Mendes

disse serem "imprevisíveis"), donde estariam vencidos no que tange a eventuais restrições

aos direitos das uniões estáveis homoafetivas relativamente às heteroafetivas naquilo que

eventualmente considerem "indispensável" a diversidade de sexos (consoante voto do

Ministro Lewandowski), o Ministro Ayres Britto, relator e autor de voto que garante a

"absoluta igualdade" entre as uniões estáveis homoafetiva e heteroafetiva, declarou que

abriram-se as portas aos homoafetivos mas não se fecharam as portas ao Congresso, para

regulamentar o tema. Será que o STF terá sinalizado a possibilidade de concessão de menos

direitos à união estável homoafetiva relativamente à união estável heteroafetiva?

Não parece ser o caso. É claro que, sendo a igualdade material o regime do

tratamento distinto das situações desiguais, poderia ser admitida a regulamentação distinta

no caso de se reconhecer que haveria alguma diferença relevante entre a união estável

homoafetiva relativamente à união estável heteroafetiva. Mas cabe lembrar que qualquer

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regulamentação diferenciada terá que passar pelo crivo dos testes constitucionais da

isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade, o que supõe nova análise de sua

eventual inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal se vier a existir. Algumas

situações, contudo, podem ser adiantadas neste momento: será inconstitucional qualquer

proibição de adoção conjunta e de conversão em casamento civil por parte dos casais em

união estável homoafetiva. Reitere-se:

Sobre o casamento civil, sob o aspecto formal o casamento civil homoafetivo deve

ser reconhecido porque a Constituição obriga o reconhecimento da possibilidade de

conversão da união estável em casamento civil. Sob o aspecto material, sendo a família

conjugal o objeto de proteção do casamento civil e da união estável, o reconhecimento do

status jurídico-familiar da união homoafetiva exige que a ela seja reconhecido o direito

tanto ao casamento civil quanto à união estável (a única hipótese de união estável que não

se convertia em casamento em nosso ordenamento jurídico era aquela de união estável

entre pessoa separada judicialmente, mas não divorciada, o que se justificava porque a

pessoa em questão ainda não estava divorciada, donde a vedação da bigamia impedia essa

conversão em casamento enquanto não houvesse o divórcio do companheiro que se

encontrava separado judicialmente, mas ainda casado – nada que se possa equiparar à

união estável homoafetiva de pessoas solteiras, em especial porque a hipótese narrada não

existe mais, em razão da extinção da separação judicial por força da Emenda Constitucional

n.º 66).

Sobre a adoção conjunta, ela também deve ser reconhecida tanto por um aspecto

formal quanto pelo aspecto material. Formalmente, a legislação admite a adoção conjunta

por companheiros, ou seja, pelo casal que se encontra em união estável, logo, há permissão

explícita à adoção conjunta pelo casal homoafetivo que se encontre em união estável.

Ademais, materialmente falando, considerando que diversas pesquisas psico-sociais já

demonstraram que o fato de uma criança ou adolescente ser criado(a) por um casal

homoafetivo não lhe traz nenhum prejuízo relativamente a uma criança ou adolescente

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criado(a) por um casal heteroafetivo, por se adequarem aos ambientes e convívios sociais

de forma análoga em ambos os casos, e que isso não traz nenhuma influência na orientação

sexual da criança ou do adolescente (o que sequer deveria ser investigado, pois é profundo

preconceito "preocupar-se" com o fato de a criança ou adolescente vir a se descobrir

homossexual, ante a igual dignidade entre homossexualidade, heterossexualidade e

bissexualidade), tem-se por inexistente qualquer prejuízo a crianças e adolescentes pelo

simples fato de serem criados(as) por um casal homoafetivo pela mera homoafetividade

conjugal de dito casal, donde ausente motivação lógico-racional a permitir a discriminação

da união homoafetiva relativamente à união heteroafetiva no que tange à possibilidade de

adoção conjunta, visto que o princípio da integral proteção da criança e do adolescente (art.

227 da CF/88) não se encontra prejudicado nesta hipótese.

Em suma: AO INTERPRETAR A CONSTITUIÇÃO O STF NÃO INCORREU NO CONTROVERSO

ATIVISMO JUDICIAL, TENDO MERAMENTE IDENTIFICADO DIREITOS JÁ EXISTENTES/DECORRENTES DA

PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO, PELO QUE ENTENDO SER COMPLETAMENTE CORRETO O RESULTADO FINAL

DO JULGAMENTO FAVORÁVEL À CONSTITUCIONALIDADE DA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA!

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