ULTRASSONOGRAFIA DOPPLER VASCULAR: ASPECTOS … · ultrassonografia doppler vascular: aspectos...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS ULTRASSONOGRAFIA DOPPLER VASCULAR: ASPECTOS IMPORTANTES PARA APLICAÇÃO DA TÉCNICA Nathália Bragato Orientadora: Profª. Drª. Naida Cristina Borges GOIÂNIA 2013

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

    ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA

    PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL

    Disciplina: SEMINÁRIOS APLICADOS

    ULTRASSONOGRAFIA DOPPLER VASCULAR: ASPECTOS

    IMPORTANTES PARA APLICAÇÃO DA TÉCNICA

    Nathália Bragato

    Orientadora: Profª. Drª. Naida Cristina Borges

    GOIÂNIA

    2013

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    NATHÁLIA BRAGATO

    ULTRASSONOGRAFIA DOPPLER VASCULAR: ASPECTOS

    IMPORTANTES PARA APLICAÇÃO DA TÉCNICA

    Seminário apresentado junto à disciplina de

    Seminários Aplicados do Programa de Pós-

    Graduação em Ciência Animal da Escola de

    Veterinária e Zootecnia da Universidade

    Federal de Goiás.

    Nível: Mestrado

    Área de Concentração:

    Patologia, Clínica e Cirurgia Animal

    Linha de Pesquisa:

    Alterações clínicas, metabólicas e toxêmicas dos

    animais e meios auxiliares de diagnóstico

    Orientadora:

    Prof ª. Drª. Naida Cristina Borges – EVZ/ UFG

    Comitê de Orientação:

    Profª. Drª. Maria Clorinda Soares Fioravanti – EVZ/ UFG

    Profª. Drª. Liliana Borges de Menezes – IPTSP/ UFG

    GOIÂNIA

    2013

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    SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 1

    2 REVISÃO DE LITERATURA .............................................................................. 3

    2.1 Princípios físicos da ultrassonografia Doppler ........................................... 3

    2.1.1 Efeito Doppler ................................................................................................ 4

    2.1.2 Processamento do sinal Doppler e exibição .................................................. 7

    2.2 Modos de exibição do sinal Doppler ............................................................ 9

    2.2.1 Doppler contínuo ........................................................................................... 9

    2.2.2 Doppler pulsado ou espectral ...................................................................... 11

    2.2.3 Doppler colorido .......................................................................................... 12

    2.2.4 Modo Doppler de amplitude ........................................................................ 14

    2.3 Técnica de exame Doppler .......................................................................... 16

    2.3.1 Preparo do paciente .................................................................................... 16

    2.3.2 Exame Doppler vascular ............................................................................. 18

    2.3.3 Controles do aparelho para uso do Doppler ................................................ 20

    2.4 Artefatos da técnica Doppler ....................................................................... 28

    2.5 Interpretação do sinal Doppler .................................................................... 32

    2.4.1 Interpretação da imagem com Doppler espectral ........................................ 33

    2.4.2 Interpretação da imagem com Doppler colorido .......................................... 43

    3 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 48

    REFERÊNCIAS .................................................................................................... 50

  • iv

    LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1 – Esquema da variação das ondas sonoras transmitidas e

    emitidas pelo transdutor em: A – objeto imóvel – reflete a onda com a mesma frequência que foi emitida, B – objeto com movimentação em direção ao transdutor – reflete a onda com frequência maior que a emitida, C – objeto com movimentação em direção contrária ao transdutor – reflete a onda com frequência menor do que a emitida.............................................................................

    04

    FIGURA 2 – Esquema representando o efeito Doppler: alteração da frequência do apito do trem conforme sua aproximação ou afastamento do receptor...............................................

    05

    FIGURA 3 – Esquema demonstrando o efeito do ângulo de insonação e a curva resultante do espectro Doppler em um vaso, evidenciando a ausência de sinal na posição de perpendicularidade (90º)......................................................

    07

    FIGURA 4 – Doppler contínuo: A – foto do transdutor Doppler de ondas contínuas utilizado para avaliação da artéria poplítea; B – traçado de velocidade do fluxo da artéria poplítea obtido com o Doppler contínuo.......................................................

    10

    FIGURA 5 – Imagem duplex Doppler da veia cava caudal de um cão adulto sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, evidenciando o volume da amostra (traços horizontais em verde) e o traçado espectral do fluxo sanguíneo em função do tempo....................................................................................

    12

    FIGURA 6 – Imagem Doppler colorido da veia cava caudal e da artéria aorta de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, evidenciando a identificação do fluxo sanguíneo em tons de vermelho e azul dentro do volume da amostra (quadrado verde), a barra vertical lateral mostra a direção do fluxo com relação ao transdutor......................................

    14

    FIGURA 7 – Imagem do Doppler de potência in vitro do fluxo em um tubo de malha circular evidenciando a ausência de sinal quando é formado um ângulo de insonação de 90º (seta branca) e a redução da intensidade do sinal conforme aumenta a profundidade (seta amarela). A – imagem obtida com alta velocidade de fluxo; B – imagem obtida com baixa velocidade de fluxo evidenciada pelo aumento do ganho sem a produção de artefatos..............................

    16

  • v

    FIGURA 8 – Aspecto ultrassonográfico em modo bidimensional dos vasos sanguíneos em uma cadela adulta da raça beagle, utilizando transdutor linear com frequência de 7,5MHz: A – corte longitudinal da veia esplênica evidenciando as paredes paralelas hiperecoicas e conteúdo luminal anecoico; B – Corte transversal da veia esplênica evidenciando seu aspecto circular com parede hiperecoica e conteúdo luminal anecoico..........................

    19

    FIGURA 9 – Imagem ultrassonográfica duplex Doppler da veia cava caudal (VCC) e da artéria aorta de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, demonstrando o volume da amostra: A – método de insonação uniforme do Doppler espectral, onde o volume da amostra (traços horizontais em verde) seleciona todo o lúmen vascular; B – método de velocidade máxima do Doppler espectral, onde o volume da amostra é posicionado centralmente no lúmen do vaso; C – caixa colorida (quadrado verde) que representa o volume da amostra no Doppler colorido..............................................

    22

    FIGURA 10 – Imagem Doppler colorido do rim esquerdo de uma cadela adulta sem raça definida de pequeno porte, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, demonstrando o artefato do ganho: A – o uso de ganho excessivo promove a formação de pixels extraluminais, que são pontos coloridos na imagem que não correspondem ao fluxo sanguíneo; B – reduzindo-se o ganho os pixels extraluminais desaparecem e fica apenas a imagem colorida que corresponde ao fluxo sanguíneo nos vasos.........................................................

    24

    FIGURA 11 – Traçado espectral da artéria aorta de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, com transdutor linear de frequência de 7,5MHz, mostrando os efeitos do posicionamento da linha de base: A – traçado espectral com artefato; B – Traçado espectral corrigido pelo deslocamento da linha de base..........................................

    27

    FIGURA 12 – Imagem ultrassonográfica tríplex Doppler da artéria esplênica de uma cadela adulta sem raça definida de porte médio, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz. A – artefato de alargamento espectral devido ao posicionamento do volume da amostra muito próximo a parede do vaso; B – imagem corrigida pelo reposicionamento do volume da amostra no centro do vaso....................................................................................

    29

  • vi

    FIGURA 13 – Imagem triplex Doppler renal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de 7,5MHz. A – fluxo sanguíneo das artérias renais arqueadas com artefato de aliasing no traçado espectral, é possível identificar a ponta do pico do espectro no lado contrário da linha de base; B – imagem corrigida pelo aumento da PRF................................................................

    30

    FIGURA 14 – Imagem Doppler colorido da aorta e da veia cava caudal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz: A – presença de aliasing produzindo uma inversão de cor no lúmen do vaso; B – imagem corrigida com o aumento da PRF.....................................................

    31

    FIGURA 15 – Imagem duplex Doppler da aorta abdominal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz. A – imagem com artefato de espelho: o traçado espectral é refletido pela linha de base se forma acima e abaixo desta; B – imagem corrigida pelo aumento do ganho.................................................................................

    32

    FIGURA 16 – Traçados do Doppler espectral de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de 7,5MHz, evidenciando a direção de fluxo: A - da artéria aorta acima da linha de base – fluxo em direção ao transdutor; B - da veia cava caudal abaixo da linha de base – fluxo em direção oposta ao transdutor...................

    34

    FIGURA 17 – Esquema representando os perfis de velocidade de fluxo sanguíneo dentro de um vaso: A – perfil de velocidade de fluxo achatado; B – perfil de velocidade de fluxo semiparabólico; C – perfil de velocidade de fluxo parabólico...........................................................................

    36

    FIGURA 18 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo sanguíneo de alta resistividade da artéria aorta em uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz (seta – fluxo reverso, 1 – pico da velocidade sistólica, 2 – velocidade diastólica final).................................................

    37

    FIGURA 19 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo sanguíneo de baixa resistividade da artéria renal (1 – pico da velocidade sistólica, 2 – velocidade diastólica final)....................................................................................

    38

  • vii

    FIGURA 20 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo sanguíneo de resistividade intermediária da artéria mesentérica cranial (1 – pico da velocidade sistólica, 2 – velocidade diastólica final).................................................

    38

    FIGURA 21 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo venoso da veia cava caudal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequenos, utilizando transdutor linear de 7,5 MHz.............................................................

    39

    FIGURA 22 – Traçado Doppler espectral da veia porta: A – Traçado de um cão normal; B – Alteração do traçado espectral de um cão com desvio porto-sistêmico mostrando presença de turbilhonamento na região do desvio............................

    40

    FIGURA 23 – Ultrassonografia do rim de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de 7,5MHz: A – imagem bidimensional do rim; B – imagem Doppler colorido do rim evidenciando vasos sanguíneos que não são visualizados no modo bidimensional, o vermelho representa o movimento em direção ao transdutor e o azul o fluxo em direção contrária ao transdutor...........................................................................

    44

    FIGURA 24 – Diferenciação de estruturas vascularizadas de não vascularizadas: A – Ultrassonografia Doppler colorida do fígado de uma gata jovem sem raça definida, utilizando transdutor linear de 7,5MHz, com dilatação dos ductos biliares evidenciada pela ausência fluxo ao Doppler colorido (setas); B – Ultrassonografia Doppler colorida de uma neoplasia vesical e, uma cadela adulta da raça Cocker evidenciando a presença de fluxo sanguíneo dentro da massa (seta) pelo Doppler.................................

    46

  • 1 INTRODUÇÃO

    A ultrassonografia Doppler vem sendo aplicada em suas diversas

    modalidades desde 1980 e, mais intensamente, por volta de 1990, com constante

    evolução dos equipamentos e técnicas possibilitando o estudo não invasivo da

    hemodinâmica corporal, como a análise da presença, direção e velocidade do

    fluxo sanguíneo em vasos e órgãos (CARVALHO, 2009). Em associação com a

    ultrassonografia bidimensional, o Doppler acrescenta informações úteis para o

    diagnóstico de enfermidades, bem como para a definição do prognóstico.

    A angiografia é o exame tradicionalmente usado para avaliação da

    anatomia vascular, neste sentido, a ultrassonografia Doppler vascular apresenta

    vantagens por ser uma técnica não invasiva, portátil, que não emprega o uso de

    radiação e sem contraindicações para pacientes com falência renal ou alergia a

    contrastes, fatores que limitam a utilização da angiografia (GAO et al., 2010).

    Acrescenta-se que, o Doppler permite a avaliação da hemodinâmica em tempo

    real e a medida de índices hemodinâmicos que podem indicar com maior

    precisão, alterações relacionadas às doenças (CARVALHO et al., 2008a).

    Contudo esta é uma ferramenta ainda pouco utilizada na medicina

    veterinária devido ao custo elevado do equipamento, ao pouco treinamento dos

    técnicos e ao restrito conhecimento do médico veterinário, em consequência da

    pequena quantidade de dados sobre o assunto na literatura veterinária, quando

    comparado aos dados na medicina. Outro fator limitante para o uso da

    ultrassonografia Doppler na veterinária é a ausência de colaboração ideal dos

    pacientes, uma vez que é necessária sua imobilidade para realização do exame,

    que em alguns casos, dependendo do temperamento do animal, só é possível

    com o uso de sedativos ou anestésicos, porém o uso destes pode afetar os

    resultados.

    Assim como no exame ultrassonográfico no modo bidimensional

    convencional, para a utilização adequada da ultrassonografia Doppler é

    fundamental o amplo conhecimento dos fundamentos físicos da técnica para a

    interpretação adequada das imagens e resultados. Para tanto, é necessário saber

    diferenciar ecos representativos de artefatos que podem ocorrer com frequência,

    assim como o conhecimento detalhado das anatomias topográfica e vascular e os

  • 2

    aspectos de imagem dos parâmetros de normalidade e das alterações que podem

    ocorrer.

    Visando contribuir com informações a cerca do assunto, realizou-se

    uma revisão de literatura abordando os princípios físicos da ultrassonografia

    Doppler, os tipos disponíveis, a técnica de exame, os artefatos e a interpretação

    da imagem Doppler espectral e colorido em pequenos animais.

  • 3

    2 REVISÃO DE LITERATURA

    2.1 Princípios físicos da ultrassonografia Doppler

    A obtenção de imagens por meio da ultrassonografia emprega técnicas

    de transmissão de pulsos e ecos, detecção e exibição (NYLAND et al., 2005).

    Pulsos breves de energia ultrassonora, emitidos pelo transdutor se refletem a

    partir de interfaces acústicas no organismo e voltam ao transdutor contendo

    informações a respeito da amplitude e frequência da onda sonora. A

    cronometragem exata do tempo de retorno do eco permite determinar a

    profundidade em que este se origina, para determinar qual a posição, a natureza

    e o movimento da interface que reflete o pulso (MERRITT, 1999).

    O ultrassom convencional de modo bidimensional (modo B) utilliza

    apenas as informações sobre amplitude no sinal que se dispersa de volta para

    gerar a imagem, e de acordo com a força do eco de retorno a imagem é formada

    em tons variáveis de cinza (NYLAND et al., 2005). Alvos em movimento rápido,

    como as hemácias na corrente sanguínea, produzem ecos de baixa amplitude

    que não podem ser exibidos, resultando em um padrão relativamente anecoico

    dentro da luz dos vasos sanguíneos (MERRITT, 1999).

    Embora a exibição em escala de cinza baseie-se na amplitude do sinal

    de ultrassom que se dispersa de volta, existe informação adicional nos ecos que

    retornam, podendo-se empregá-la para avaliar o movimento de alvos móveis.

    Quando o som de alta frequência colide com uma interface estacionária, o som

    refletido tem essencialmente a mesma frequência ou o mesmo comprimento de

    onda do som transmitido (Figura 1A). Contudo, se a interface refletora estiver em

    movimento com relação ao feixe sonoro emitido pelo transdutor, como no caso

    das células sanguíneas, há uma mudança na frequência do som que se dispersa

    pelo objeto em movimento (Figura 1B e 1C). Essa mudança da frequência é

    diretamente proporcional à velocidade da interface refletora com relação ao

    transdutor, resultando no efeito Doppler (MERRITT, 1999; KING, 2006;

    CARVALHO et al., 2008b).

  • 4

    FIGURA 1 – Esquema da variação das ondas sonoras transmitidas e emitidas pelo transdutor em: A – objeto imóvel – reflete a onda com a mesma frequência que foi emitida, B – objeto com movimentação em direção ao transdutor – reflete a onda com frequência maior que a emitida, C – objeto com movimentação em direção contrária ao transdutor – reflete a onda com frequência menor do que a emitida

    Fonte: Adaptado de CARVALHO (2009)

    2.1.1 Efeito Doppler

    O físico, astrônomo e matemático austríaco Johann Christian Andreas

    Doppler, formulou as bases do efeito Doppler, que levou seu nome em 1842. O

    efeito Doppler foi descrito pelo cientista a partir da análise da variação da altura

    do som do apito do trem em movimento (Figura 2). Ele observou que quando o

    trem se aproximava o apito apresentava um som mais agudo, de frequência mais

    alta e, quando o trem se afastava, o apito apresentava um som mais grave, de

    frequência mais baixa (CARVALHO, 2009).

    O efeito Doppler permite quantificar a velocidade do movimento relativo

    entre a fonte de um fenômeno periódico, como uma onda eletromagnética ou

    onda sonora e o observador (CARVALHO et al., 2008b). O comprimento de onda

    observado é maior ou menor, conforme sua fonte se aproxima ou se afasta. No

    caso de aproximação, a frequência aparente da onda recebida fica maior que a

    frequência emitida, enquanto que, no caso de distanciamento, a frequência

    diminui (KING, 2006).

  • 5

    FIGURA 2 – Esquema representando o efeito Doppler: alteração da frequência do apito do trem conforme sua aproximação ou afastamento do receptor

    Fonte: Adaptado de CARVALHO (2009)

    A relação da frequência do ultrassom que retorna com a velocidade de

    reflexão, é descrita pela equação Doppler (NELSON & PRETORIUS, 1988;

    MERRITT, 1999; CARVALHO, 2009):

    ΔF = (FR – FT) = _2FT . v_ c

    onde ΔF é o desvio da frequência Doppler; FR é a frequência do som refletido de

    um alvo móvel; FT é a frequência do som emitido pelo transdutor; v é a velocidade

    do alvo em direção ao transdutor e c é a velocidade do som no meio, padronizada

    em 1,54m/s nos tecidos moles (NELSON & PRETORIUS, 1988; MERRITT, 1999;

    CARVALHO, 2009).

    O ΔF aplica-se apenas se o alvo estiver movendo-se diretamente para

    o transdutor ou para longe dele, em geral abordando o alvo móvel em um ângulo

    designado ângulo Doppler. Nesse caso, o ΔF é reduzido em proporção ao

    cosseno desse ângulo (NELSON & PRETORIUS, 1988; MERRITT, 1999;

    CARVALHO, 2009). Portanto:

    ΔF = (FR – FT) = _2FT v . cosθ_ c

    onde θ é o ângulo formado pelo eixo do fluxo com o feixe incidente de ultrassom.

    Se o ângulo Doppler puder ser medido, é possível estimar a velocidade do fluxo.

  • 6

    A estimativa acurada da velocidade do alvo (v) requer a medição exata do desvio

    da frequência Doppler e do ângulo de insonação na direção do alvo móvel

    (NELSON & PRETORIUS, 1988; MERRITT, 1999; CARVALHO, 2009), assim:

    v = __ ΔF . c__ 2FT . cosθ

    Para melhorar a avaliação, o feixe incidente deve ser orientado o mais

    paralelo possível em relação ao vaso para evitar erros no cálculo associados aos

    grandes ângulos de incidência (CARVALHO et al., 2008b). À medida que o

    ângulo Doppler, aproxima-se de 90º, o cosseno de θ aproxima-se de zero, não

    havendo movimento relativo do alvo na direção do transdutor ou para longe dele e

    nenhum desvio de frequência Doppler é detectado (MARTINOLI et al., 1998;

    MERRITT, 1999). A magnitude de deslocamento do Doppler é maior quando o

    feixe sonoro e o eixo formado pelo vaso são paralelos e o cosseno de θ é igual a

    um (Figura 3) (CARVALHO, 2009).

    Como o cosseno do ângulo Doppler muda rapidamente quando o

    ângulo é maior do que 60º, a correção acurada do ângulo requer que as medições

    Doppler sejam feitas em ângulos inferiores a 60º. Acima de 60º, alterações

    relativamente pequenas na estimativa do ângulo Doppler, estão associadas a

    grandes alterações no cosθ e, portanto, um pequeno erro na estimativa do ângulo

    pode resultar em um grande erro na estimativa da velocidade (MERRITT, 1999;

    STEWART, 2001; CARVALHO, 2009).

    Essas considerações são importantes quando se utilizam instrumentos

    Doppler associados ao modo B, visto que a imagem ideal da parede vascular é

    obtida quando o eixo do transdutor está perpendicular a ela, enquanto que as

    diferenças máximas de frequência Doppler são obtidas quando o eixo do

    transdutor e a direção do fluxo estão num ângulo relativamente pequeno

    (CARVALHO, 2009).

  • 7

    FIGURA 3 – Esquema demonstrando o efeito do ângulo de insonação e a curva resultante do espectro Doppler em um vaso, evidenciando a ausência de sinal na posição de perpendicularidade (90º)

    Fonte: Adaptado de CARVALHO (2009)

    2.1.2 Processamento do sinal Doppler e exibição

    A frequência do ultrassom emitida corresponde a vários MHz e a

    frequência do eco recebido pelo equipamento, modificado pelo efeito Doppler,

    corresponde a alguns kHz, acima ou abaixo, da frequência de emissão, na

    dependência da velocidade e direção do movimento das hemácias (CARVALHO

    et al., 2008b). Portanto, essa variação de frequência, chamada desvios de

    frequência Doppler, se situa em níveis audíveis pelo ouvido humano e os

    aparelhos amplificam e enviam esses sinais para um alto-falante (MERRITT,

    1999; CARVALHO, 2009). Esse sinal audível pode ser analisado pelo ouvinte e,

    com treino, o operador consegue identificar muitos fluxos característicos

    (MARTINOLI et al., 1998).

  • 8

    Porém, as variações de amplitude, intensidade e frequência sofridas

    pela onda portadora do sinal Doppler deverão ter suas informações extraídas pelo

    aparelho mediante o processo chamado demodulação, pois, o sinal de alta

    frequência é a onda portadora e as variações da frequência Doppler são

    modulações de baixa frequência dessa onda. Assim, os aparelhos de

    ultrassonografia eliminam a onda portadora, extraindo apenas as informações de

    baixa frequência, cujo processamento nos fornece gráficos de velocidade do fluxo

    sanguíneo para interpretação clínica (CARVALHO, 2009).

    Nas condições reais, dentro dos vasos as hemácias são muito

    numerosas, movimentando-se com diferentes velocidades e ângulos variados.

    Assim, os ecos recebidos terão deslocamento de frequências muito variadas e

    diversas amplitudes a serem analisadas. Para avaliação deste sinal o aparelho

    utiliza os chamados analisadores de frequência, que são circuitos eletrônicos

    capazes de separar as diversas frequências existentes no volume de amostragem

    e apresentá-las em forma de gráfico (MERRITT, 1999).

    O processamento do sinal pelo equipamento realiza a transformação

    de várias ondas de frequências diferentes em um “espectro de frequência”,

    utilizando um sistema digital e um processo de cálculo matemático, chamado

    transformação rápida de Fourier (VAITKUS & COBBOLD, 1988). Este espectro

    representa a distribuição de frequência Doppler, representada pelas velocidades

    das hemácias, ao longo do tempo, sendo esta a informação que será analisada

    clinicamente para a interpretação hemodinâmica (CARVALHO, 2009).

    Por esse processo, faz-se um gráfico em escala de cinza tendo no eixo

    horizontal o tempo e no vertical as variações de frequência, de tal modo que todas

    as frequências encontradas no volume de amostragem em um determinado

    tempo estarão representadas (MARTINOLI et al., 1998; SIGEL, 1998). As

    frequências mais intensas, refletidas por um número maior de hemácias que se

    encontram na mesma velocidade, tendem para o branco e as frequências menos

    intensas, refletidas por um menor número de hemácias, tendem para o preto

    (CARVALHO et al., 2008b).

  • 9

    2.2 Modos de exibição do sinal Doppler

    Em contraste com a ultrassonografia bidimensional em escala de cinza,

    que exibe a informação de interfaces teciduais, os instrumentos de ultrassom

    Doppler são otimizados para exibir informação sobre fluxo, permitindo a avaliação

    da hemodinâmica por meio da análise do som emitido, das ondas espectrais de

    velocidade e do mapeamento colorido. Assim, existem vários modos de exibição

    desta informação, sendo eles Doppler contínuo, Doppler pulsado, Doppler

    colorido e Doppler de amplitude (MERRITT, 1999; VIECELLI et al., 2008), que

    serão descritos a seguir.

    2.2.1 Doppler contínuo

    Os primeiros equipamentos de ultrassom utilizavam transdutores de

    onda contínua, constituídos por dois cristais piezoelétricos. Um deles funciona

    como emissor e o outro, como receptor, não permitindo a realização da imagem

    bidimensional. Os circuitos eletrônicos neste tipo de Doppler analisam a diferença

    de frequência entre o sinal emitido e o recebido continuamente (CARVALHO,

    2009), os feixes que emitem e recebem sobrepõem-se em um volume sensível à

    mesma distância do transdutor (MERRITT, 1999).

    No Doppler de ondas contínuas, caso haja fluxo sanguíneo ao longo do

    feixe ultrassônico, ele será notado, havendo uma variação na frequência do

    ultrassom recebido (CARVALHO, 2009). Entretanto, embora a direção do fluxo

    possa ser determinada com o Doppler de ondas contínuas, esses dispositivos não

    permitem discriminar movimentos provenientes de várias profundidades,

    impossibilitando determinar com precisão a fonte do sinal detectado,

    considerando que todos os alvos em movimento dentro do feixe produzem sinais

    Doppler (SIGEL, 1998).

    Por outro lado, esses aparelhos são capazes de detectar frequências

    de velocidade de fluxo muito elevadas, apesar da desvantagem na falta de

    sensibilidade em relação à profundidade da fonte do eco. Na ultrassonografia com

    Doppler contínuo, a interpretação é realizada través dos padrões de som emitidos

  • 10

    pelos vasos (Figura 4A) e por gráficos (Figura 4B) que representam os traçados

    das curvas de velocidade (EVANGELISTA, 2003).

    FIGURA 4 – Doppler contínuo: A – foto do transdutor Doppler de ondas contínuas utilizado para avaliação da artéria poplítea; B – traçado de velocidade do fluxo da artéria poplítea obtido com o Doppler contínuo

    Fonte: EVANGELISTA (2003)

    Desta forma, a ultrassonografia Doppler de ondas contínuas é mais

    utilizada na cardiologia, sendo necessária na determinação da gravidade da

    insuficiência valvar e de altas velocidades dos fluxos distais às lesões estenóticas.

    O feixe deste tipo de Doppler deve conter somente um vaso ou câmara cardíaca,

    pois qualquer fluxo sanguíneo será interceptado, apresentando sinal superposto

    no equipamento e será registrado, independentemente de sua profundidade

    (CARVALHO, 2009).

    O Doppler de ondas contínuas também é utilizado em angiologia para

    avaliação de vasos sanguíneos superficiais (Figura 4), para identificação de

    alterações tanto venosas quanto arteriais (EVANGELISTA, 2003). E, também

    pode ser utilizado no leito intra-operatório, para confirmar a presença de fluxo em

    vasos superficiais, uma vez que aparelhos de Doppler de ondas contínuas são

    portáteis e possuem baixo custo em relação aos outros modos Doppler (SIGEL,

    1998; MERRITT, 1999). Além disso, os instrumentos Doppler de onda contínua

    foram miniaturizados para permitir seu fácil transporte, sendo empregados como

    “estetoscópios” vasculares periféricos para mensuração da pressão sanguínea

    (SIGEL, 1998).

  • 11

    2.2.2 Doppler pulsado ou espectral

    Devido às limitações do Doppler de ondas contínuas, foram

    desenvolvidas técnicas de mapeamento pulsado com o objetivo de identificar a

    localização espacial das estruturas vasculares, onde o som é transmitido em

    pulsos (SIGEL, 1998) e, as imagens em tempo real, assim os sinais resultantes

    são apresentados de forma audível e em gráficos simultaneamente (CARVALHO,

    2009). Assim como na imagem convencional do modo bidimensional, no

    mapeamento Doppler pulsado ou espectral, o som é emitido em pulsos e o

    mesmo cristal piezoelétrico funciona como transmissor e receptor (NYLAND et al.,

    2005).

    O uso de pulsos sonoros permite um intervalo entre a transmissão do

    pulso e o retorno do eco, com isso, o volume sensível a partir do qual os dados

    são amostrados pode ser controlado em termos de forma, profundidade e posição

    (MERRITT, 1999). O volume da amostra a ser avaliada é representado por um

    cursor retangular móvel, ajustável pelo operador, que capta os ecos originados do

    sangue em movimento que irão atingir o transdutor (CARVALHO, 2009) (Figura

    5).

    A imagem duplex combina o feixe Doppler pulsado com a imagem

    bidimensional em tempo real e, a localização do volume alvo é disposta na tela

    em modo bidimensional (SIGEL, 1998; CARVALHO, 2009). A profundidade e o

    tamanho do volume de amostra no modo bidimensional possibilitam a localização

    precisa da região de interesse, o volume da amostra pode ser movido para dentro

    do lúmen de um vaso, ao mesmo tempo em que o observamos em tempo real.

    Sobreposto ao volume de amostra está o cursor, que pode ser rotacionado e

    alinhado paralelamente a direção do fluxo sanguíneo, para determinar o ângulo

    de incidência do feixe transmissor em relação à direção do fluxo (CARVALHO et

    al., 2008b).

  • 12

    FIGURA 5 – Imagem duplex Doppler da veia cava caudal de um cão adulto sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, evidenciando o volume da amostra (traços horizontais em verde) e o traçado espectral do fluxo sanguíneo em função do tempo

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    2.2.3 Doppler colorido

    Atualmente, a grande maioria dos equipamentos de ultrassom tem a

    capacidade de apresentar mapeamentos coloridos do fluxo sanguíneo

    (CARVALHO, 2009). Nos sistemas de obtenção de imagem de fluxo colorido, a

    informação sobre fluxo determinada a partir de medições Doppler é exibida como

    um aspecto na própria imagem, em sobreposição à imagem em tempo real do

    modo bidimensional. Alvos estacionários ou em movimento lento fornecem a base

    da imagem em modo bidimensional (MERRITT, 1999) e, as células sanguíneas

    em movimento representarão o efeito do desvio Doppler, que fornecerá

    informação acerca da presença e da direção do movimento e as alterações na

  • 13

    frequência do sinal de eco em relação com a velocidade do alvo (MERRITT, 1999;

    VIECELLI et al., 2008).

    Ao contrário da técnica de Doppler pulsado, existem diferentes volumes

    de amostragem dentro de uma região circunscrita chamada de caixa colorida

    (KING, 2006). A área visualizada é dividida em vários pequenos volumes de

    amostragem, cada um dos quais é submetido a um processamento isolado. O

    sinal obtido para cada um destes elementos de amostragem é codificado por

    cores, como uma função de seu movimento na direção do transdutor ou para

    longe dele, e o grau de saturação da cor é usado para indicar a velocidade

    relativa das hemácias em movimento. Assim, sobre a imagem em tempo real é

    apresentada outra imagem, colorida, que representa um mapeamento dos

    elementos móveis em relação à intensidade e ao sentido do movimento

    (CARVALHO, 2009) (Figura 6).

    O tamanho e a posição da caixa colorida no modo bidimensional

    dependem do examinador. Dentro da caixa colorida, cada ponto móvel tem uma

    tonalidade de vermelho ou azul, em vez de tons de cinza. A direção do fluxo em

    relação ao transdutor é ilustrada em uma barra vertical colorida ao lado da

    imagem (CARVALHO, 2009).

    A obtenção de imagens pelo fluxo Doppler colorido expande a

    ultrassonografia dupla convencional ao oferecer capacidades adicionais, pois ela

    permite fazer uma estimativa semiquantitativa do fluxo a partir apenas da imagem,

    desde que sejam notadas variações no ângulo Doppler (MERRITT, 1999; KING,

    2006). A exibição de fluxo em todo o campo de imagem permite observar a

    posição e a orientação do vaso de interesse em todos os momentos; o contraste

    do fluxo na luz do vaso permite visualizar os vasos pequenos, que são invisíveis

    pelos métodos convencionais de obtenção de imagens, e aumenta a visibilidade

    de irregularidades da parede (SIGEL, 1998). O Doppler colorido também pode ser

    exibido juntamente com o Doppler espectral, sendo denominado tríplex Doppler,

    assim as informações obtidas nos dois tipos de exame se completam permitindo

    uma maior acurácia no diagnóstico (KING, 2006; CARVALHO, 2009).

  • 14

    FIGURA 6 – Imagem Doppler colorido da veia cava caudal e da artéria aorta de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, evidenciando a identificação do fluxo sanguíneo em tons de vermelho e azul dentro do volume da amostra (quadrado verde), a barra vertical lateral mostra a direção do fluxo com relação ao transdutor

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    2.2.4 Modo Doppler de amplitude

    Uma alternativa para exibir a informação sobre frequência com o fluxo

    Doppler colorido é usar um mapa em cores que mostra a potência integrada do

    sinal Doppler, em vez de seu desvio médio de frequência. Este modo, também

    conhecido como Doppler de potência ou Doppler colorido de energia permite

    apresentar mapeamentos por amplitude de sinal para detectar sinais mais fracos

    (GUDMUNDSSON et al., 1998; CARVALHO, 2009).

    Em contraste com o fluxo Doppler colorido, em que o ruído aparece na

    imagem de diferentes cores de acordo com a direção e a velocidade do fluxo, o

  • 15

    modo Doppler de potência permite que o ruído seja assinalado como fundo de

    somente uma cor homogênea, o laranja, que não interfere muito na imagem

    (MERRITT, 1999; CARVALHO, 2009). Isso resulta em aumento significativo da

    aplicação dinâmica do scanner, possibilitando ganho efetivo mais alto sem

    artefatos e maior sensibilidade para detecção de fluxos lentos, lúmens de

    pequenos vasos e avaliação qualitativa da perfusão parenquimal (ROY et al.,

    2012), sendo cinco a dez vezes mais sensível que o mapeamento colorido

    convencional (VIECELLI et al., 2008).

    Como os dados sobre desvio de frequência não são exibidos, esta

    técnica reduz significativamente a dependência de ângulo de insonação,

    minimizando artefatos de perpendicularidade e não apresenta o efeito aliasing.

    Porém a imagem não fornece qualquer informação relativa à direção ou à

    velocidade do fluxo (MARTINOLI et al., 1998; ROY et al., 2012).

    Entretanto, um estudo in vitro, realizado por GUDMUNDSSON et al.

    (1998) com o objetivo de avaliar os efeitos da intensidade do sinal do Doppler de

    amplitude em relação ao ângulo de insonação, demonstrou que a intensidade do

    sinal reduz significativamente com o ângulo de insonação de 75º, sendo

    observada ausência de sinal com ângulo de 90º, conforme esperado em todos os

    tipos de Doppler. A intensidade do sinal Doppler também reduz significativamente

    com o aumento da profundidade da estrutura a ser analisada (Figuras 7A e 7B).

    Portanto, mesmo que o Doppler de amplitude seja menos influenciado pelo

    ângulo e não produza artefatos em relação à variação deste, o uso de um ângulo

    menor que 60º permite a melhor detecção do sinal Doppler e, consequentemente,

    melhor qualidade da imagem.

  • 16

    FIGURA 7 – Imagem do Doppler de potência in vitro do fluxo em um tubo de malha circular evidenciando a ausência de sinal quando é formado um ângulo de insonação de 90º (seta branca) e a redução da intensidade do sinal conforme aumenta a profundidade (seta amarela). A – imagem obtida com alta velocidade de fluxo; B – imagem obtida com baixa velocidade de fluxo evidenciada pelo aumento do ganho sem a produção de artefatos

    Fonte: Adaptado de GUDMUNDSSON et al. (1998)

    2.3 Técnica de exame Doppler

    O conhecimento dos princípios físicos do Doppler e dos tipos de

    Doppler disponíveis, além de propiciar destreza na utilização do equipamento e

    conhecimento detalhado da anatomia topográfica e vascular, é fundamental para

    a qualidade do diagnóstico. No entanto, um exame adequado requer ampla

    colaboração do paciente para que as imagens obtidas sejam fidedignas (SILVA et

    al., 2012).

    2.3.1 Preparo do paciente

    Em medicina veterinária, questões limitantes para a realização dos

    exames dizem respeito a fatores relacionados principalmente ao paciente. Pode-

    se citar o temperamento indócil ou agitado, abdômen tenso ou aumento da

    sensibilidade dolorosa, padrão respiratório como taquipneia ou dispneia, e a falta

    de preparo prévio do paciente, como a presença de gás e conteúdo na cavidade

    gástrica e alças intestinais (CARVALHO, 2009).

  • 17

    Em seres humanos a obesidade tem sido relatada como um dos

    fatores que dificultam a avaliação Doppler (GRANTA et al., 2009; GAO et al.,

    2010) o que também se aplica aos pacientes na medicina veterinária

    (CARVALHO et al., 2008b).

    CARVALHO et al. (2009) evidenciaram os efeitos da mobilidade do

    paciente sobre o diâmetro do vaso e a velocidade do sangue, pois estes podem

    variar durante o ciclo cardíaco ou com a respiração, o que é demonstrado no

    monitor de traçado espectral. Animais taquipneicos ou dispneicos alteram o

    traçado espectral, muitas vezes impossibilitando a obtenção de um sinal Doppler

    adequado do fluxo sanguíneo no vaso em estudo e produzindo artefatos.

    Para realização do exame ultrassonográfico Doppler abdominal o ideal

    é que o animal esteja com os pelos limpos, em jejum de sólidos de oito a 12 horas

    e tenha recebido fármacos antifiséticos para eliminar os gases do trato

    gastrointestinal (NOVELLAS et al., 2007). Em seres humanos também se

    recomenda o uso de laxativos para reduzir o conteúdo intestinal (SARQUIS,

    2003). A ingestão de líquido antes do exame é desejável, pois permite um melhor

    contraste entre o trato gastrointestinal e os outros órgãos abdominais pela

    avaliação com modo bidimensional, assim como a bexiga deve estar repleta de

    urina (MATTOON et al., 2005).

    Antes do exame é realizada tricotomia ampla do local onde o exame

    será realizado e a aplicação de gel acústico em abundância, para promover um

    melhor contato entre o transdutor e a pele e evitar artefatos de reverberação

    (MATTOON et al., 2005; NOVELLAS et al., 2007).

    Animais muito inquietos ou agressivos devem ser sedados ou até

    mesmo anestesiados, porém deve-se sempre considerar os efeitos

    hemodinâmicos dos fármacos utilizados na hora da interpretação do exame

    (CARVALHO, 2009). Muitas vezes, para garantir máxima qualidade do exame,

    mesmo animais dóceis precisam ser anestesiados para controlar os movimentos

    respiratórios, sendo que alguns autores recomendam que o uso de anestésicos

    seja feito sempre que possível (NELSON et al., 2010).

  • 18

    2.3.2 Exame Doppler vascular

    Para realização da ultrassonografia Doppler, o examinador deve

    conhecer não só as características anatômicas do vaso em questão, mas também

    os aspectos hemodinâmicos normais para poder detectar as possíveis alterações

    (SILVA et al., 2012). A técnica permite diferenciar o padrão Doppler característico

    de cada vaso sanguíneo, assim como as mudanças no padrão de ondas que

    podem ter significado patológico (CARVALHO et al., 2008a; ZOU et al., 2012).

    O exame Doppler vascular deve seguir um protocolo de estudo

    preestabelecido, o qual pode variar de acordo com o vaso em questão e variáveis

    individuais, como condições de preparo, temperamento e tamanho do animal. Em

    geral, utilizam-se transdutores de 4MHz ou 5MHz para a pesquisa de vasos mais

    profundos, para cães obesos ou de porte grande. Para cães menores e gatos

    transdutores de 7MHz a 12MHz são recomendados por fornecer melhor resolução

    de imagem, principalmente para avaliação de vasos superficiais (MATTOON et

    al., 2005; CARVALHO, 2009).

    Para avaliação dos vasos abdominais, o posicionamento do animal

    pode variar, dependendo da preferência e experiência do examinador

    (CARVALHO, 2009). Porém, recomenda-se que o animal seja posicionado em

    decúbito lateral, pois esta posição permite maior proximidade dos vasos com o

    transdutor e auxilia a evitar alças intestinais preenchidas por gás. Além disso, a

    posição lateral é mais confortável em relação ao decúbito dorsal, fazendo que o

    animal se movimente menos durante o exame (SPAULDING, 1997).

    A varredura deve ser realizada tanto do lado direito quanto do lado

    esquerdo do abdômen, e devem ser feitos cortes dos vasos em múltiplos planos

    para sua avaliação (SPAULDING, 1997). Em linhas gerais, procede-se o exame

    em modo bidimensional, obtendo-se imagens em planos longitudinais e

    transversais, observando-se os aspectos ecográficos referentes à espessura da

    parede, ao conteúdo luminal, ao diâmetro e à reação do vaso à pressão manual

    do transdutor (CARVALHO et al., 2008a).

    No exame bidimensional os vasos sanguíneos abdominais têm

    estrutura tubular com paredes finas e bem definidas em plano longitudinal (Figura

    8A). As paredes são paralelas hiperecoicas e com aparência linear. Em plano

  • 19

    transversal, os vasos podem aparecer com aspecto oval ou circular (Figura 8B) e

    alguns sofrem alterações na morfologia quando submetidos à compressão. A

    presença de sangue no lúmen confere ao conteúdo vascular um aspecto

    anecoico, característico das estruturas que não possuem eco, isto é, não

    transmitem onda sonora. Porém, quando o fluxo sanguíneo é lento e o diâmetro

    do vaso é grande o suficiente, podem-se observar pontos hiperecoicos que se

    movimentam e correspondem às células sanguíneas (SPAULDING, 1997;

    CARVALHO, 2009).

    FIGURA 8 – Aspecto ultrassonográfico em modo bidimensional dos vasos sanguíneos em uma cadela adulta da raça Beagle, utilizando transdutor linear com frequência de 7,5MHz: A – corte longitudinal da veia esplênica (seta) evidenciando as paredes paralelas hiperecoicas e conteúdo luminal anecoico; B – Corte transversal da veia esplênica (seta) evidenciando seu aspecto circular com parede hiperecoica e conteúdo luminal anecoico

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    Usando o modo Doppler colorido é possível determinar a presença ou

    ausência de fluxo no vaso (VIECELLI et al., 2008). Os parâmetros coloridos

    devem ser ajustados para que o lúmen do vaso esteja preenchido somente com

    uma cor, sem ambiguidade de sinal detectado, e a informação colorida não

    ultrapasse o lúmen vascular, mas que o mesmo esteja todo preenchido com cor

    (CARVALHO, 2009).

    Por fim, usando a técnica Doppler pulsado, um traçado pode ser obtido

    colocando-se o volume de amostra em uma porção específica do vaso, se este

  • 20

    estiver livre de artefatos, a imagem deverá ser congelada e, após correção do

    ângulo, deve-se proceder à análise da morfologia das ondas (CARVALHO et al.,

    2008a).

    O traçado espectral permite o estudo da morfologia das ondas Doppler

    e a documentação dos eventuais achados patológicos (CARVALHO et al., 2008a),

    visto que, cada vaso possui uma assinatura particular, ou seja, um traçado

    característico, que permite sua identificação e a observação de alterações

    patológicas (MERRITT, 1999).

    2.3.3 Controles do aparelho para uso do Doppler

    Os equipamentos modernos permitem o uso de vários processos de

    otimização das imagens, além de demonstrar simultaneamente a imagem em

    modo bidimensional em tempo real, os gráficos de velocidade do Doppler pulsado

    e o mapeamento Doppler colorido. Com isso, há maior demanda de tempo de

    processamento da imagem, podendo ocorrer redução da resolução temporal das

    imagens obtidas (CARVALHO, 2009).

    Os parâmetros e ajustes de processamento de sinal podem ser

    modificados, permitindo ao examinador explorar os recursos do equipamento para

    melhorar a qualidade da imagem (CARVALHO, 2009). Entretanto, estes devem

    ser utilizados corretamente, pois podem interferir na imagem formada e nos

    índices hemodinâmicos, levando ao erro de interpretação (STEWART, 2001).

    Os principais controles do aparelho para processamento do sinal

    Doppler são a frequência Doppler, o volume da amostra, a velocidade de

    varredura, o ganho, o ângulo Doppler, a frequência de repetição de pulso, os

    filtros de parede e a linha de base (MERRITT, 1999; CARVALHO et al., 2009).

    Estes serão discutidos em detalhes a seguir.

    a) Frequência Doppler

    Conforme a frequência do transdutor aumenta, a sensibilidade do

    Doppler melhora, mas a atenuação pelo tecido também aumenta, resultando em

    menor penetração, devendo haver equilíbrio cuidadoso das exigências de

  • 21

    sensibilidade e penetração (MERRITT, 1999). Este efeito foi demonstrado pelo

    estudo in vitro com o Doppler de potência realizado por GUDMUNDSON et al.

    (1998), no qual foi observado menor intensidade do sinal no Doppler de amplitude

    conforme aumentava a profundidade do fluxo (Figura 7).

    Como muitos vasos abdominais situam-se vários centímetros abaixo da

    superfície, em geral são necessárias frequências Doppler na faixa de 5,0 MHz a

    7,5 MHz para que a penetração seja adequada. No entanto, para avaliação de

    vasos superficiais podem ser utilizadas frequências maiores entre 10 MHz e 12

    MHz (MATTOON et al., 2005; CARVALHO, 2009).

    b) Tamanho do volume da amostra

    O volume da amostra determina o intervalo receptivo do equipamento

    aos ecos obtidos pela variação de frequência Doppler, permitindo a análise de

    volumes maiores ou menores dentro do vaso a ser estudado (MERRITT, 1999;

    CARVALHO, 2009).

    No sistema Doppler pulsado, o mapeamento de frequências é realizado

    numa determinada porção do objeto amostrado a uma profundidade determinada

    (CARVALHO et al., 2008a). O comprimento do volume da amostra Doppler pode

    ser controlado pelo operador e a largura é determinada pelo perfil do feixe

    (CARVALHO, 2009). Porém, situações nas quais o objeto de análise é extenso ou

    maior que o volume da amostragem, o sinal Doppler obtido será representado

    somente por uma parte do objeto (MERRITT, 1999).

    Os métodos mais utilizados para medir o fluxo sanguíneo em um

    vaso utilizando o Doppler espectral são o método de insonação uniforme, no

    qual o lúmen inteiro do vaso fica incorporado no volume amostrado (Figura 9A);

    e o método de máxima velocidade, no qual o volume amostrado é colocado no

    centro do vaso e corresponde a aproximadamente metade do diâmetro do vaso

    (Figura 9B) (CARVALHO, 2009).

  • 22

    FIGURA 9 – Imagem ultrassonográfica duplex Doppler da veia cava caudal (VCC) e da artéria aorta de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, demonstrando o volume da amostra: A – método de insonação uniforme do Doppler espectral, no qual o volume da amostra (traços horizontais em verde) seleciona todo o lúmen vascular; B – método de velocidade máxima do Doppler espectral, no qual o volume da amostra é posicionado centralmente no lúmen do vaso; C – caixa colorida (quadrado verde) que representa o volume da amostra no Doppler colorido

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    O sangue normalmente flui mais rapidamente próximo à região central

    do lúmen vascular e mais lentamente próximo às paredes. O perfil do fluxo é

    diferente nas artérias e veias, e varia com o tamanho e a localização do vaso.

    Artérias mais largas têm perfil de fluxo diferente das artérias menores

    (CARVALHO et al., 2009).

    Essa diferença faz com que a amostragem realizada num pequeno

    volume, possa variar o perfil espectral, ou seja, sua distribuição de velocidade, do

    centro para a periferia do vaso. Para estes casos, desenvolveu-se um refinamento

    tecnológico denominado sistema multigate, que em sua configuração apresenta

    várias unidades de análise em paralelo, as quais adquirem sinais isolados de

    deslocamento Doppler em volumes de amostragem diferentes. Com isso, podem-

    se analisar simultaneamente sinais de vasos localizados em profundidades

    diferentes do corpo ou, mantendo contíguos os diversos volumes de amostragem,

    cobrir toda a área de secção de um vaso calibroso, obtendo a média de

    amostragem de velocidades ou perfil de fluxo (CARVALHO, 2009).

    Porém, na maioria dos casos, a análise dos sinais Doppler espectral

    exige que o volume da amostra seja ajustado para excluir ao máximo possível a

  • 23

    proximidade das paredes vasculares devido à alteração na velocidade do fluxo

    nessa região, que pode gerar artefatos. O ideal é utilizar o centro do vaso para

    obtenção da amostra, de forma que o fluxo sanguíneo não fique perpendicular ao

    feixe sonoro nesta área. Amostras menores produzem amostras mais precisas,

    sendo possível ampliar a janela em grandes vasos ou naqueles com fluxo mais

    lento (MERRITT, 1999; KING, 2006).

    No Doppler colorido, a região de amostragem, denominada caixa

    colorida (Figura 9C) deverá ser a menor possível e restrita à área de maior

    interesse, a fim de melhorar a taxa de quadros e a resolução espacial (GAO et al.,

    2010), além de minimizar erros de processamento provocados pela pulsação

    transmitida pelas estruturas ao redor do vaso ou por movimentos do paciente.

    Quanto menor for a janela de cor, mais rápida será a taxa de quadro e vice-versa

    (CARVALHO, 2009).

    c) Velocidade de varredura

    Este ajuste determina a velocidade com que as curvas de velocidade

    são exibidas na tela, permitindo maior ou menor detalhamento temporal das

    velocidades de fluxo. O controle da velocidade de varredura deverá ser ajustado,

    conforme a frequência cardíaca do paciente, porém levando em consideração que

    o excesso de velocidade poderá provocar artefatos como o aliasing que será

    discutido posteriormente (CARVALHO, 2009).

    d) Ganho

    Este controle regula a amplificação do sinal recebido e necessita de

    ajuste adequado para evitar ecos falsos ou ruídos indesejáveis. A função ganho

    amplifica a potência geral dos ecos processados na janela do fluxo colorido ou na

    linha de tempo do Doppler espectral (MERRITT, 1999; CARVALHO, 2009). O

    ajuste inadequado e excessivo de ganho durante o exame Doppler produz sinais

    em áreas onde não há fluxo sanguíneo, chamados de fluxo artefatual, mostrando

    uma imagem de “extravasamento” com pixels coloridos extraluminais no modo

    colorido (Figuras 10A e 10B) e “borramento espectral” no modo Doppler pulsado

    (MARTINOLI et al, 1998).

  • 24

    FIGURA 10 – Imagem Doppler colorido do rim esquerdo de uma cadela adulta sem raça definida de pequeno porte, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz, demonstrando o artefato do ganho: A – o uso de ganho excessivo promove a formação de pixels extraluminais, que são pontos coloridos na imagem que não correspondem ao fluxo sanguíneo; B – reduzindo-se o ganho os pixels extraluminais desaparecem e fica apenas a imagem colorida que corresponde ao fluxo sanguíneo nos vasos

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    Em estudo realizado in vitro por MARTINOLI et al. (1998) avaliou-se a

    influência do ganho no sinal do Doppler espectral e colorido. Quando o ganho foi

    aumentado ao máximo, a imagem foi falsamente iluminada por artefatos, sendo o

    tecido circundante incorporado pelo vaso, assim como, com a redução do ganho

    foi observado redução do sinal e desaparecimento do fluxo visível em vasos

    menores. Portanto, recomenda-se aumentar o ganho até o aparecimento dos

    artefatos e, em seguida, reduzir o ganho até que os pontos extraluminais

    desapareçam, para assim poder trabalhar com o maior ganho possível sem

    artefatos e sem reduzir o sinal de vasos menores.

    e) Ângulo Doppler

    Ao fazer medições Doppler, é aconselhável corrigir o ângulo Doppler

    antes de realizar as medidas de velocidade, pois a estimativa da velocidade

    obtida com o Doppler só é acurada se a medição do ângulo Doppler também for

  • 25

    (STEWART, 2001; CARVALHO et al., 2008b). Isso é particularmente válido

    quando o ângulo Doppler é maior que 60º. Em geral, é melhor manter o ângulo

    Doppler em 60º ou menos, porque pequenas alterações mesmo acima de 60º

    resultam em mudanças significativas na velocidade calculada e, portanto,

    medições inexatas resultam em erros muito maiores nas estimativas de

    velocidade do que erros semelhantes em ângulos Doppler menores (MERRITT,

    1999; ROY et al., 2012).

    Esta relação foi demonstrada pelo estudo in vitro realizado por

    GUDMUNDSON et al. (1998), no qual houve redução significativa do sinal no

    Doppler de amplitude com ângulo de 75º e ausência de sinal com ângulo de 90º

    (Figura 7). Em estudo realizado in vitro por STEWART (2001) com Doppler

    espectral, foram observadas alterações estatisticamente significantes nas

    velocidades quando medidas em ângulo de 40º e em ângulo de 70º, sendo que no

    ângulo de 40º as velocidades calculadas foram mais representativas da

    velocidade real.

    Caso o eixo do ângulo de insonação entre o vaso sanguíneo e o feixe

    ultrassônico esteja perpendicular um em relação ao outro, então não haverá sinal

    Doppler detectável. O vaso deveria ser observado em outra posição para obter

    um ângulo mais agudo (MARTINOLI et al., 1998; ROY et al; 2012). Se isto não for

    possível, devem-se utilizar transdutores lineares com feixes sonoros que emitam

    ondas em ângulo mais agudo, ao passo que a imagem bidimensional permanece

    a mesma (CARVALHO, 2009).

    f) Frequência de repetição de pulso (PRF)

    No Doppler pulsado, a amostragem possui uma frequência específica

    de pulsação, denominada frequência de repetição de pulso (PRF), que determina

    a frequência máxima detectável pelo equipamento. O ajuste deste controle

    determina a frequência de pulsação do feixe de mapeamento Doppler, definindo

    os limites de velocidades que podem ser amostrados sem a ocorrência de

    artefatos (CARVALHO, 2009).

    Se a PRF estiver muito baixa, ocorrerá aliansing e um mosaico de

    cores pode falsear uma turbulência e criar uma falsa interpretação de estenose.

    No caso de PRF muito elevada, lacunas coloridas ilegítimas irão aparecer e imitar

  • 26

    uma trombose ou obstrução. O ajuste correto permite uma aparência normal e

    homogênea do sinal do fluxo (STEWART, 2001; GAO et al., 2010).

    Em estudo realizado por STEWART (2001) foi observada uma relação

    entre o ângulo Doppler e a PRF, sendo observada maior ocorrência de artefatos

    associados a PRF em ângulo de 70º do que no ângulo de 40º. Assim, quanto

    maior o ângulo, mais a PRF influencia na formação de aliasing.

    De modo a assegurar que as amostras originam-se apenas de uma

    profundidade selecionada ao usar-se um sistema Doppler de onda pulsada, é

    necessário esperar o eco proveniente da área de interesse antes de transmitir o

    próximo pulso. Isso limita a taxa com que cada pulso pode ser gerado, sendo

    necessária uma PRF mais baixa para uma profundidade maior (CARVALHO et

    al., 2008b).

    Devido à velocidade característica e individual de cada leito vascular,

    não há uma PRF padrão para ser utilizada durante o exame. O examinador

    deverá ajustar este parâmetro visando adquirir gráficos de onda sem

    ambiguidades e com dimensões adequadas à análise de leito vascular estudado

    (MERRITT, 1999). Em geral, alta PRF é aplicada para evitar o aliasing em regiões

    de alta velocidade de fluxo sanguíneo e baixa PRF é necessária para detecção de

    fluxos mais lentos (GAO et al., 2010).

    g) Filtros de parede

    Os instrumentos Doppler detectam movimento não apenas do fluxo

    sanguíneo, mas também de estruturas adjacentes, provenientes de movimentos

    dos vasos e das partes moles, causados pela respiração e/ ou movimentação do

    paciente. Para que esses sinais de baixa frequência não sejam exibidos, a

    maioria dos instrumentos contém filtros “passa-alta” ou filtros “de parede”, que

    eliminam os ruídos de baixa frequência, acima e abaixo da linha de base, para

    que estes não sejam visíveis nem audíveis no espectro Doppler. Na avaliação

    colorida, o filtro de parede elimina os sinais de baixa frequência excessivos e

    desnecessários, provocados durante a respiração e movimentação dos pacientes,

    bastante comum no exame veterinário (CARVALHO, 2009).

    Embora efetivos na eliminação de ruídos de baixa frequência, o uso

    impróprio desse controle pode remover sinais de fluxo de baixa velocidade,

  • 27

    resultando em erro de interpretação. Em certas situações clínicas, a medição

    dessas velocidades mais lentas de fluxo é importante e, com a escolha do filtro de

    parede inadequado, o fluxo venoso de baixa velocidade pode não ser detectado e

    o fluxo diastólico de baixa velocidade em certas artérias também pode não ser

    exibido, resultando em erros no cálculo de índices Doppler (STEWART, 2001).

    Em estudo realizado por STEWAT (2001) concluiu-se que os filtros de

    parede também são influenciados pelo ângulo Doppler, sendo que os efeitos

    produzidos pelo uso deste controle são menores em um ângulo de 40º do que

    num ângulo de 70º. De acordo com MERRITT (1999) o filtro deve ser mantido no

    nível prático mais baixo, que costuma estar na faixa de 50 a 100 Hz.

    h) Linha de base

    A linha de base ajusta o ponto do espectro em que o traçado de

    velocidade corresponde a zero, ou seja, ausência de deslocamento Doppler para

    uma mesma PRF. A modificação da linha de base é utilizada para incluir fluxo

    sanguíneo de velocidade mais elevada e permite eliminar o aliasing sem aumento

    da PRF (CARVALHO, 2009) (Figuras 11A e 11B).

    FIGURA 11 – Traçado espectral da artéria aorta de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, com transdutor linear de frequência de 7,5MHz, mostrando os efeitos do posicionamento da linha de base: A – traçado espectral com artefato; B – traçado espectral corrigido pelo deslocamento da linha de base

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

  • 28

    Portanto, para realizar exames de qualidade, o operador deverá ter

    bom conhecimento dos controles do equipamento, pois assim poderá controlar os

    artefatos de imagem frequentemente encontrados durante os exames em

    animais, principalmente nas técnicas Doppler, devido à alta frequência cardíaca e

    constante movimentação dos pacientes (CARVALHO, 2009).

    2.4 Artefatos da técnica Doppler

    Embora muitos dos artefatos associados à obtenção de imagens pelo

    modo B, como sombreamento e reverberação, sejam encontrados na

    ultrassonografia Doppler, a detecção e a exibição da informação sobre frequência

    relacionada com alvos móveis acrescentam um conjunto de considerações

    técnicas especiais com relação aos artefatos gerados pelo Doppler. Na prática

    clínica, é importante conhecer a fonte desses artefatos e entender sua influência

    sobre a interpretação das medidas de fluxo obtidas (MERRITT, 1999; CARVALHO

    et a., 2008b; GAO et al., 2010). As principais fontes de artefatos Doppler serão

    discutidas a seguir.

    a) Alargamento espectral

    A presença de grande número de frequências diferentes em

    determinado momento no ciclo cardíaco resulta no chamado alargamento

    espectral (MERRITT, 1999). Isso geralmente é observado em vasos com

    estreitamento importante e turbulência de fluxo, refletindo estenose vascular

    significativa (CARVALHO, 2009).

    O ganho excessivo do sistema ou alterações na variação dinâmica da

    exibição em escala de cinza do espectro Doppler, pode resultar em alargamento

    espectral; o oposto pode mascarar o alargamento do espectro Doppler, levando a

    um diagnóstico incorreto. O alargamento espectral também pode ser produzido

    pela seleção de um volume da amostra excessivamente grande ou pela

    colocação do volume da amostra muito perto da parede vascular (Figuras 12A e

    12 B), onde as velocidades são menores (MERRITT, 1999).

  • 29

    FIGURA 12 – Imagem ultrassonográfica tríplex Doppler da artéria esplênica de uma cadela adulta sem raça definida de porte médio, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz. A – artefato de alargamento espectral devido ao posicionamento do volume da amostra muito próximo a parede do vaso; B – imagem corrigida pelo reposicionamento do volume da amostra no centro do vaso

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás b) Aliasing

    Este é um artefato que surge da ambiguidade na medição de altos

    desvios de frequência Doppler (MARTINOLI et al., 1998). Se a PRF for inferior ao

    dobro do desvio máximo de frequência produzido pelo movimento do alvo,

    denominado limite de Nyquist, serão exibidos desvios de frequência mais baixos

    que os existentes de fato, ocorrendo o aliasing, que resulta no erro da informação

    sobre a velocidade (NELSON & PRETORIUS, 1988). Devido à necessidade de

    FRP baixas para alcançar vasos profundos, os sinais de artérias abdominais

    profundas tendem ao aliasing se as velocidades forem altas (MERRITT, 1999).

    No feixe Doppler espectral com aliasing, parte do espectro que está

    acima do limite superior fica cortada e aparece erroneamente no lado oposto da

    linha de base, como a continuação do espectro propriamente dita. A altura do pico

    transferido é o dobro do que deveria ser se estivesse no lado correto (MARTINOLI

    et al., 1998; CARVALHO, 2009) (Figuras 13A e 13B).

  • 30

    FIGURA 13 – Imagem triplex Doppler renal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de 7,5MHz. A – fluxo sanguíneo das artérias renais arqueadas com artefato de aliasing no traçado espectral, é possível identificar a ponta do pico do espectro no lado contrário da linha de base; B – imagem corrigida pelo aumento da PRF

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    Nas imagens de Doppler colorido, fluxos com alta velocidade, que está

    acima do limite de Nyquist, acima da tonalidade mais clara da cor em questão o

    fluxo aparece com uma cor incorreta, que codifica a direção oposta do fluxo, ou

    seja, azul em vez de vermelho (Figura 14A), resultando em um padrão de cor

    concêntrico (MARTINOLI et al., 1998; CARVALHO, 2009). Estudo realizado por

    STEWART (2001) demonstrou que o Doppler colorido é mais susceptível ao

    aliasing devido à baixa PRF do que o Doppler espectral.

    Na prática, as soluções possíveis para reduzir os efeitos deste artefato

    seriam aumentar a PRF (Figura 14B) ou reduzir o ângulo Doppler, diminuindo o

    desvio de frequência; deslocar a linha de base; ou ainda reduzir a frequência do

    transdutor (MERRITT, 1999; CARVALHO, 2009).

  • 31

    FIGURA 14 – Imagem Doppler colorido da aorta e da veia cava caudal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz: A – presença de aliasing produzindo uma inversão de cor no lúmen do vaso; B – imagem corrigida com o aumento da PRF

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    c) Espelho

    Este artefato ocorre quando abaixo do espectro normal, o mesmo pode

    também ser visto simultaneamente do outro lado da linha de base com menor

    intensidade, assim a linha de base se comporta como um espelho (Figuras 15A e

    15B). Este artefato desaparece reduzindo o ganho do Doppler. Se o fundo do

    espetro não estiver preto, mas cinza ou acinzentado, também o ganho do Doppler

    deve ser reduzido (CARVALHO et al., 2008a; CARVALHO, 2009).

  • 32

    FIGURA 15 – Imagem duplex Doppler da aorta abdominal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz. A – imagem com artefato de espelho: o traçado espectral é refletido pela linha de base se forma acima e abaixo desta; B – imagem corrigida pelo aumento do ganho.

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    2.5 Interpretação do sinal Doppler

    Na maioria das vezes, a ultrassonografia Doppler, seja no modo

    pulsado ou no modo colorido, é utilizada em associação com a ultrassonografia

    bidimensional (SILVA et al., 2012). Esta associação é denomina duplex quando

    associa o modo B com o modo Doppler espectral, e tríplex quando associam os

    três modos de processamento ao mesmo tempo. Com isso é possível obter

    informações anatômicas e funcionais ao mesmo tempo, sendo que uma técnica

    complementa o diagnóstico da outra (KING, 2006; CARVALHO, 2009).

    Os componentes dos dados Doppler que têm de ser avaliados tanto em

    imagens espectrais como de fluxo colorido incluem o desvio da frequência

    Doppler e amplitude, o ângulo Doppler, a distribuição espacial de frequências

    através do vaso e a variação temporal do sinal (MARTINOLI et al., 1998;

    STEWAT, 2001). Como o sinal Doppler em si não tem significado anatômico, o

    examinador deve interpretá-lo e então determinar sua relevância no contexto da

    imagem (MERRITT, 1999; CARVALHO et al., 2012).

  • 33

    Será discutida apenas a interpretação do Doppler espectral e do

    Doppler colorido, por estes trazerem um maior número informações clínicas em

    relação aos outros tipos de Doppler. Além disso, são mais utilizados na rotina

    veterinária pelo fato se serem associados ao exame bidimensional ao contrário do

    Doppler de ondas contínuas, e por serem mais acessíveis em relação ao Doppler

    de amplitude.

    2.4.1 Interpretação da imagem com Doppler espectral

    No Doppler espectral, os dados sobre o desvio Doppler são

    representados na forma de gráficos, como um espectro temporal do sinal que

    retorna. O tempo decorrido fica no eixo horizontal ou linha de base e, a frequência

    de deslocamento Doppler, pode ser vista no eixo vertical (KING, 2006;

    CARVALHO, 2009). A detecção de desvio da frequência Doppler indica

    movimento do alvo, que na maioria dos casos está relacionado com a presença

    de fluxo. O sinal de desvio da frequência, positivo ou negativo, indica a direção do

    fluxo com relação ao transdutor (MERRITT, 1999; CARVALHO et al., 2008b).

    O traçado na linha de base horizontal indica o ponto zero de frequência

    de deslocamento, representando ausência de fluxo no eco retornado (VAITKUS &

    COBBOLD, 1988). Por convenção, o traçado espectral é disposto acima do zero

    da linha de base (desvio positivo) quando a frequência do eco retornado é maior

    do que a frequência transmitida e, o fluxo encontra-se na direção do transdutor

    (Figura 16A). Um traçado disposto abaixo da linha de base (desvio negativo)

    indica que o fluxo está direcionado no sentido contrário ao transdutor e a

    frequência retornada é menor do que a frequência de insonação (Figura 16B)

    (CARVALHO et al., 2008a; CARVALHO, 2009).

  • 34

    FIGURA 16 – Traçados do Doppler espectral de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de 7,5 MHz, evidenciando a direção de fluxo: A - da artéria aorta acima da linha de base – fluxo em direção ao transdutor; B - da veia cava caudal abaixo da linha de base – fluxo em direção oposta ao transdutor

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    O espectro resultante de frequência Doppler exibe a variação existente

    das frequências Doppler com o tempo no volume da amostra, com o invólucro do

    espectro representando as frequências máximas presentes em dado momento no

    tempo e a largura do espectro em algum ponto indicando a variação das

    frequências presentes. O aumento da largura determinado pelo alargamento de

    janela espectral ocorre quando grande número de frequências diferentes está

    presente em qualquer ponto em particular (MERRITT, 1999).

    O brilho, representado na escala de cinza, também é usado para

    representar amplitude de cada componente de frequência, indicando a quantidade

    de células sanguíneas que viajam a uma velocidade particular. Quanto maior o

    brilho do traçado espectral de um local, tendendo para o branco, maior o número

    de células que passaram àquela velocidade no momento específico da

    amostragem (VAITKUS & COBBOLD, 1988; CARVALHO, 2008).

    Durante o exame com Doppler pulsado, a frequência de deslocamento

    Doppler não é disposta somente graficamente, pois também são audíveis (SIGEL,

    1998). As artérias têm som parecido com um assovio, enquanto as veias

    possuem som parecido com o vento soprando continuamente (CARVALHO et al.,

    2008a). A intensidade do som audível é diretamente proporcional à quantidade de

  • 35

    células sanguíneas em movimento. A altura do som depende do deslocamento de

    frequência Doppler, quanto maior a velocidade do fluxo sanguíneo, mais larga a

    frequência de deslocamento Doppler, mais audível se torna o som (CARVALHO,

    2009).

    a) Perfis ou curvas de velocidade de fluxo

    Os fluxos sanguíneos podem ser caracterizados em laminar e

    turbulento (CARVALHO, 2009). Na maioria dos vasos o fluxo sanguíneo é

    laminar, com o sangue movendo-se em finas camadas concêntricas ou lâminas,

    as camadas centrais apresentam fluxo mais rápido, ao passo que forças de atrito

    causam perda de energia e promovem a formação de camadas mais lentas

    próximas à parede do vaso. As hemácias movem-se em velocidade uniforme e na

    mesma direção (CARVALHO et al., 2008b). Os perfis de velocidade de fluxo tipo

    laminar são classificados em três tipos: achatado, semiparabólico e parabólico

    (Figura 17) (CARVALHO, 2009).

    O perfil de velocidade de fluxo achatado ocorre nas artérias mais

    calibrosas, como na aorta, onde a velocidade do sangue é aproximadamente a

    mesma no centro do vaso e próximo à sua parede (CARVALHO et al., 2008b;

    CARVALHO et al., 2009). A grande maioria das células sanguíneas move-se a

    uma velocidade uniforme, embora a distribuição da velocidade seja muito estreita

    através do lúmen vascular (Figura 17A). Como resultado, a curva espectral de

    velocidade é caracterizada por uma linha fina na sístole, que promove um espaço

    nítido chamado janela espectral ou janela sistólica (CARVALHO, 2009).

    O perfil de velocidade de fluxo semiparabólico ocorre nas artérias

    menores, como na artéria lineal, onde o sangue que se movimenta centralmente

    tem velocidade mais alta quando comparado àquele próximo da parede do vaso

    (Figura 17B), então, a distribuição da velocidade é ampla através do lúmen

    vascular (CARVALHO et al., 2008b). A janela espectral não pode ser vista durante

    a sístole no monitor espectral, porque as células do sangue com variedade de

    velocidades fluem através do volume de amostragem (CARVALHO, 2009).

    O perfil de velocidade de fluxo parabólico ocorre nas artérias de

    tamanho médio, como no tronco celíaco, onde o fluxo é semelhante ao perfil de

    velocidade do fluxo achatado no centro do vaso, isto é, as células se movimentam

  • 36

    de maneira uniforme; no entanto, o fluxo é mais similar ao perfil de velocidade do

    fluxo semiparabólico nas regiões periféricas do vaso. A distribuição da velocidade

    através do lúmen vascular tem amplitude intermediária (Figura 17C) (RIESEN et

    al., 2002; CARVALHO et al., 2008b).

    FIGURA 17 – Esquema representando os perfis de velocidade de fluxo sanguíneo dentro de um vaso: A – perfil de velocidade de fluxo achatado; B – perfil de velocidade de fluxo semiparabólico; C – perfil de velocidade de fluxo parabólico

    Fonte: CARVALHO et al. (2008b)

    O fluxo turbilhonado ou turbulento ocorre sobrepondo-se ao fluxo

    laminar em ocasiões em que há alteração de tamanho do vaso, velocidade do

    fluxo ou viscosidade do sangue. Geralmente, isso se dá em nível das bifurcações,

    curvas ou ramos, quando ampla distribuição de velocidade, isto é, espectro largo,

    ou mesmo o fluxo reverso está presente; e quando células com grande gama de

    velocidades estão representadas (CARVALHO, 2009; SOLANO et al., 2010).

    b) Morfologia das ondas Doppler

    A perfusão de cada órgão determina o estado do seu leito vascular,

    que, por sua vez, afeta as características de fluxo dos vasos adjacentes. O

    contorno da linha de frequência de deslocamento Doppler máxima corresponde

    ao tempo de variação de máxima velocidade de fluxo dentro do vaso

    (CARVALHO et al., 2008a).

  • 37

    Cada contração cardíaca causa um impulso no fluxo sanguíneo e

    resulta na distensão das artérias. O fluxo diastólico reverso ocorre porque o

    sangue é rebombeado da aorta com velocidade refletida de alta impedância do

    leito vascular periférico dos membros posteriores. À medida que o diâmetro

    vascular retorna ao normal, a energia repercutida fornece o potencial necessário

    para promover fluxo contínuo durante a diástole. O fluxo sanguíneo das artérias

    que supre os órgãos parenquimatosos, como rins, fígado e baço, que requerem

    perfusão constante e apresentam fluxo contínuo, gradualmente decrescente no

    período diastólico e sem fluxo diastólico reverso (CARVALHO, 2009).

    Os diversos padrões de fluxo demonstrados pelo mapeamento

    espectral serão detalhados nos parágrafos seguintes.

    O padrão de fluxo de alta resistividade (Figura 18) é caracterizado por

    alta pulsabilidade e alta resistividade de fluxo, observado pela presença de picos

    sistólicos finos (afilados) e fluxo reverso no início da diástole (CARVALHO, 2009),

    este tipo de fluxo é observado na aorta (CARVALHO et al., 2008a; CARVALHO et

    al., 2009).

    FIGURA 18 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo sanguíneo de alta resistividade da artéria aorta em uma cadela adulta sem raça definida de porte pequeno, utilizando transdutor linear de frequência de 7,5MHz (seta – fluxo reverso, 1 – pico da velocidade sistólica, 2 – velocidade diastólica final)

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    O padrão de fluxo de baixa resistividade (Figura 19) é caracterizado por

    baixa pulsabilidade e baixa resistividade de fluxo, com a presença de picos

    sistólicos amplos e contínuos e alta velocidade de fluxo na diástole com

    velocidade decrescente (CARVALHO, 2009). As artérias de baixa resistividade,

  • 38

    como a artéria renal, suprem órgãos que possuem uma demanda contínua de

    sangue (CARVALHO et al., 2009; CARVALHO et al., 2008a).

    FIGURA 19 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo sanguíneo de baixa resistividade da artéria renal (1 – pico da velocidade sistólica, 2 – velocidade diastólica final)

    Fonte: Adaptado de CARVALHO et al. (2008a)

    O padrão de fluxo de resistividade intermediária (Figura 20) é

    caracterizado por fluxos de pulsabilidade e resistividade intermediária,

    evidenciados pela presença de picos sistólicos afilados, mais amplos do que os

    das artérias de padrão de alta resistividade e fluxo direcional diastólico sem fluxo

    reverso, como na artéria mesentérica cranial (RIESEM et al., 2002; CARVALHO

    et al., 2008a). O pico de velocidade diastólico é mais baixo do que no padrão de

    baixa resistividade, quando comparado ao pico de velocidade sistólica

    (CARVALHO, 2009).

    FIGURA 20 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo sanguíneo de resistividade intermediária da artéria mesentérica cranial (1 – pico da velocidade sistólica, 2 – velocidade diastólica final)

    Fonte: Adaptado de CARVALHO et al. (2008a)

    O padrão de fluxo venoso (Figura 21) geralmente é laminar. As

    condições de pressão intratorácica e intra-abdominal, durante a inspiração e

  • 39

    expiração, influenciam a velocidade de fluxo sanguíneo nas veias, promovendo

    alterações de fase. A maioria das veias tem baixo grau de plasticidade e

    periodicidade. As veias hepáticas e a região cranial da veia cava caudal têm

    padrão Doppler com forte periodicidade em razão do efeito da pressão arterial

    direta exercida durante o ciclo cardíaco (CARVALHO et al., 2008a; SARTOR &

    MAMPRIM, 2009).

    FIGURA 21 – Traçado espectral do padrão de velocidade de fluxo venoso da veia cava caudal de uma cadela adulta sem raça definida de porte pequenos, utilizando transdutor linear de 7,5 MHz

    Fonte: Arquivos do setor de diagnóstico por imagem do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Goiás

    Alterações no traçado espectral sugerem alteração no vaso avaliado,

    podendo indicar alterações fisiológicas, sistêmicas ou de alguma enfermidade

    local. Alterações fisiológicas incluem a mudança do traçado espectral das artérias

    intraovarianas de um aspecto de alta resistividade para moderada a baixa

    resistividade durante o ciclo estral e posteriormente retorno para alta resistividade

    durante a lise do corpo lúteo (KÖSTER et al., 2001; CARVALHO, 2009; SILVA et

    al., 2012). Já as artérias celíaca e mesentérica cranial alteram seu padrão de alta

    resistividade para baixa resistividade durante o período pós-prandial para garantir

    maior fluxo sanguíneo no trato gastrointestinal durante a digestão (RIESEN et al.,

    2002; CARVALHO, 2009).

    Alterações sistêmicas como hipertensão e doenças cardíacas também

    podem alterar o traçado espectral de vários vasos (GRANATA et al., 2009).

    Desvios porto-sistêmicos podem alterar o traçado espectral da veia porta e na

    região do desvio (Figura 22) (SARTOR & MAMPRIM, 2009; KAMIKAWA &

    BOMBONATO, 2012). A insuficiência renal aguda pode alterar o padrão de baixa

    resistividade da artéria renal para um padrão de alta resistividade (IZUMME et al.,

  • 40

    2000; GRANATA et al., 2009), porém estas alterações no traçado podem ser

    muito discretas sendo detectadas apenas por alterações nos índices

    hemodinâmicos (CARVALHO et al., 2008a).

    FIGURA 22 – Traçado Doppler espectral da veia porta: A – Traçado de um cão normal; B – Alteração do traçado espectral de um cão com desvio porto-sistêmico mostrando presença de turbilhonamento na região do desvio

    Fonte: Adaptado de KAMIKAWA & BOMBONATO (2012)

    c) Índices hemodinâmicos

    Para se obter uma análise quantitativa do traçado Doppler, a maioria

    dos aparelhos tem a capacidade de calcular a média da frequência de

    deslocamento ou a velocidade automaticamente (SIGEL, 1998). O ponto máximo

    alcançado no espectro é denominado velocidade de pico sistólico (VPS) e o ponto

    mínimo na morfologia da onda é o valor da velocidade diastólica final (VDF). O

    fluxo médio pode ser calculado multiplicando-se a velocidade média pela área do

    vaso (CARVALHO, 2009).

    No entanto, informações sobre a impedância vascular não podem ser

    obtidas apenas pela velocidade absoluta, por isso foram desenvolvidos os índices

    Doppler (NOVELLAS et al., 2007). Esses índices comparam o fluxo durante a

    sístole e a diástole, sendo razões das velocidades obtidas do espectro Doppler

    (NOVELLAS et al., 2007; CARVALHO, 2009). Por isso, ao contrário da análise

    isolada da velocidade, os índices têm como vantagem a independência da

    correção do ângulo, sendo usados para avaliação de vasos muito pequenos e

    tortuosos em que é difícil a correção do ângulo (NELSON & PRETORIOS, 1988).

    Os índices Doppler, tais como a proporção sistólica/ diastólica, o índice

    de resistividade e de pulsabilidade, fornecem informações acerca da resistência

    arterial ao fluxo sanguíneo, assim indicam alterações que resultam de uma

  • 41

    variedade de enfermidades (SIGEL, 1998; MERRITT, 1999; NOVELLAS et al.,

    2007). Os índices são utilizados para auxiliar na avaliação de estenose, trombose,

    nos vasos periféricos com fluxo de resistência aumentada (CARVALHO, 2009),

    para avaliar alterações nos fluxos dos órgãos que podem indicar doenças, para

    definir o prognóstico e para acompanhar o tratamento (IZUME et al., 2000).

    Os índices mais utilizados são o índice de resistividade (IR) e o índice

    de pulsabilidade (IP). O IR, descrito por Pourcelot em 1974, relaciona o resultado

    da subtração entre as velocidades de pico sistólico e diastólico final sobre a

    velocidade de pico sistólico (IR = VPS – VDF/ VPS). O IP, descrito por Grosling e

    King em 1975, relaciona o resultado da subtração entre as velocidades de pico

    sistólico e diastólico final sobre a velocidade média (IP = VPS