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UM AJUSTE INJUSTO UMA ANÁLISE DO RELATÓRIO DO BANCO MUNDIAL A Sombra do Monopólio na Indústria Farmacêutica América do Sul na Expo Global de Cooperação Sul-Sul Carina Vance: Uma retrospectiva de 2017 por Ligia Giovanella e Felix Rígoli Rio de Janeiro, Dezembro 2017 . N o 13

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UM AJUSTE INJUSTOUMA ANÁLISE DO RELATÓRIO DO BANCO MUNDIAL

A Sombra do Monopólio na Indústria Farmacêutica

América do Sul na Expo Global de Cooperação Sul-Sul

Carina Vance: Uma retrospectiva de 2017

por Ligia Giovanella e Felix Rígoli

Rio de Janeiro, Dezembro 2017 . No 13

INSTITUCIONAL

ISAGS-UNASULDiretora Executiva: Carina Vance Chefa de Administração e Recursos Humanos: Gabriela Jaramillo Coordenadora de Relações Internacionais: Luana Bermudez

GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃOCoordenadora: Flávia Bueno Editor-Chefe: Manoel Giffoni Reportagem: Carina Vance, Caroline Ignácio, Félix Rígoli, Flávia Bueno, Ligia Giovanella, Manoel Giffoni, Mario CameloColaboração: Ángela Acosta y Gabriela Jaramillo Equipe: Carlos de LimaContato: [email protected] Telefone: +55 21 2505 4400

INSTITUCIONAL

Esse é o informe do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (ISAGS), o centro de pensamento estratégico na área de saúde da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) que visa contribuir para a melhoria da qualidade do governo em saúde na América do Sul por meio da formação de lideranças, gestão do conhecimento e apoio técnico aos sistemas de saúde.

EXPERIENCIAS Y DESAFÍOS DE BRASIL Y COLOMBIA

O Banco Mundial acaba de divulgar um resumo de um relatório sobre a análise da eficiência e da equidade do gasto público no Brasil1. O país recentemente implementou opções políticas com tendências a ajustes econômicos em relação aos gastos de saúde. No entanto, é relevante aos interessados neste campo nos países da UNASUL analisar o relatório em um contexto mais amplo, pois as instituições de alcance global como o Banco Mundial podem ter uma influência decisiva em apoiar políticas de austeridade em países da região.Mesmo que o documento tenha sido divulgado com um aspecto técnico-científico, a natureza do relatório é principalmente política, tentando transformar afirmações ideológicas convenientes às reformas de austeridade em verdades científicas2. O documento propõe uma

concepção de cidadania invertida, na qual o indivíduo só entra em relação com o Estado no momento em que seus direitos falham e ele passa a ser reconhecido como um não-cidadão3. Ao mesmo tempo, embora o título sugira uma análise da eficiência e da equidade, as recomendações estão expressamente dedicadas a estudar o gasto público nos setores sociais, com pouca atenção a outros campos da economia. O objetivo do relatório é recomendar cortes de gastos públicos, especialmente gastos sociais, os chamados gastos primários, sem fazer mais do que sugestões pouco enfáticas de redução de outros custos como o serviço da dívida, por exemplo. As elevadas despesas com interesses são de longe o maior ônus do Estado, no qual, o Brasil possui índices claramente mais altos do que todos os países comparados (ver gráfico).

Fonte: Banco Mundial, 2017

Despesas com serviço da dívida em 2014 como porcentagem do PIB em vários países

9Brasil

OCDE BRICSPares estruturais

Pares Média876

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Pares regionais

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BANCO MUNDIAL: AJUSTES FISCAIS E CORTES DE GASTOS PARA A SAÚDE

3

relação aos países da OCDE, correspondendo a 32% dos gastos públicos per capita de Portugal (US$1717) ou 26% das despesas da Espanha (USD $2090) ou 13% do gasto público de saúde da Alemanha (US$4157). Da comparação internacional de despesas públicas em saúde, não se pode concluir que exista espaço para cortar gastos. Pelo contrário, os gastos públicos em saúde no Brasil deveriam aumentar e até mesmo dobrar. Isso permitiria ao país alcançar os níveis médios das demais nações da OCDE, e cumprir com a taxa de 6% do PIB proposta pela Agenda de Saúde Sustentável para as Américas (ASSA) 2018-2030, aprovada pelos países, incluindo Brasil, na mais recente Conferência Sanitária Pan-Americana, em setembro de 2017. No relatório do Banco Mundial existem indicações de como esses recursos poderiam ser gerados: R$30 bilhões de reais (aproximadamente US$10 bilhões de dólares) de subsídio ao setor privado da saúde. Uma nota de rodapé diz que os resultados “são influenciados pelos prestadores de saúde privados que gastam grandes quantidades com uma pequena parte da população” (p. 111). O documento admite que “os gastos públicos de saúde são progressivos (melhoram a equidade) – ainda que os gastos tributários sejam altamente regressivos”. O relatório utiliza o eufemismo “gastos tributários” para o conjunto de isenções de impostos a farmacêuticas, hospitais privados e planos de saúde. Um ponto positivo a ser considerado é a recomendação de abolição dos subsídios fiscais para os seguros privados e para as despesas sanitárias privadas, com a condição de que esses recursos sejam transferidos ao Sistema Único de Saúde do Brasil (SUS) para melhorar sua oferta. Em relação ao gasto em saúde, o relatório aponta vários aspectos que mostram que o SUS é uma política avaliada como eficiente e de importante efeito redistributivo. Por exemplo, a Atenção Primária no Brasil é muito bem classificada em dezenas de artigos internacionais. O próprio relatório mostra que existe uma eficiência significativa no programa de Saúde da Família, que deveria ser estendido a 100% da população.No entanto, a sugestão principal é o corte de gastos no setor público em 34% utilizando estimativas de ineficiência transformadas em afirmações categóricas. O enfoque do relatório é na eficiência produtiva do sistema de saúde, fazendo inúmeros cálculos (que têm sido questionados tecnicamente pelos profissionais do Ministério da Saúde

do Brasil, como por exemplo no Departamento de Economia da Saúde, Investimentos e Desenvolvimento em nota técnica 266/2017, de 14 de junho de 2017), sem considerar a chamada eficiência distributiva, ou seja, como se repartem esses recursos em relação ao acesso e à equidade. A pretensão de melhorar a eficiência produtiva (menos recursos por mais produtos) mantendo os subsídios atuais ao sistema privado, só levaria a um sistema menos acessível e mais injusto. O que se procura em um sistema público de saúde como o SUS não é prioritariamente garantir o máximo de competência, mas sim a garantia do direito à saúde e o acesso aos serviços, conforme as necessidades da população. A preocupação do estudo deveria estar focada na identificação de brechas no acesso e demandas não assistidas. A eficiência é um objetivo, porém secundário, subordinado à garantia ao acesso. Neste sentido, considerando que a grande maioria dos municípios brasileiros são pequenos (68% deles possuem menos de vinte mil habitantes e 1200 municípios têm menos de cinco mil), é necessário oferecer serviços acessíveis, que garantam acesso oportuno, inclusive com perda de economia de escala. A garantia de acesso a populações dispersas sempre significará alguma perda de eficiência.Certamente, o melhor uso de recursos públicos e uma designação otimizada desses recursos para alcançar mais e melhores produtos, são alguns dos objetivos de todas as políticas públicas de saúde. No entanto, ao transformar a eficiência no objetivo principal, se perdem todas as perspectivas da garantia do direito à saúde. Embora o relatório declare ter interesse na eficiência e na equidade, na hora de fazer propostas, o detalhe e a ênfase estão no corte de gastos, com foco nos programas sociais. Os subsídios e os custos financeiros do governo (R$600 bilhões de reais ou aproximadamente US$200 bilhões de dólares) poderiam ser reduzidos, mas isso, no ponto de vista dos autores “não é realista, pois os grupos de interesse que atualmente se beneficiam do apoio desses programas são poderosos” (pág. 147). Em outras palavras: não é recomendável reduzir os benefícios dos poderosos; o que parece ser mais conveniente é reduzir os benefícios dos mais frágeis e mais carentes.

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O relatório afirma que “o governo brasileiro gasta muito e gasta mal”. É assim mesmo?Os gastos públicos em saúde no Brasil são baixos. Em proporção ao PIB correspondem a menos de 4%. Nos países da OCDE (grupo ao qual o Brasil solicitou adesão), em média, as despesas públicas em saúde correspondem a 7% do PIB. Os gastos públicos per capita no Brasil são estimados em US$549 dólares, em poder de compra comparável (OCDE, dados de 2013), muito baixos em

Capa do relatório “Um Ajuste Justo”,

publicado pelo Banco Mundial em 2017

Referências:1 - Banco Mundial. Um Ajuste Justo: Análise da eficiência e da equidade do gasto público no Brasil. Grupo Banco Mundial; 2017. Disponible en: http://documents.worldbank.org/curated/en/884871511196609355/pdf/121480-REVISED-PORTUGUESE-Brazil-Public-Expenditure-Review-Overview-Portuguese-Final-revised.pdf Acceso en 7/12/20172 – Cardoso Jr JC. Nem ajuste, nem justo: réplica rápida às estórias que os economistas contam. Plataforma da Política Social. dezembro 3, 2017. disponível em: http://plataformapoliticasocial.com.br/nem-ajuste-nem-justo-replica-rapida-as-estorias-que-os-economistas-contam/3 - Fleury SM. Política social e democracia: reflexões sobre o legado da seguridade social. Cadernos de Saúde Pública, 1985; 1(4), 400-417 4 - Braga Neto FC, Barbosa PR, Santos IS, Oliveira CMF. Atenção hospitalar: evolução histórica e tendências. In: Políticas e Sistemas de Saúde no Brasil, editado por L. Giovanella, S. Escorel, L. V. C. Lobato, J. C. de Noronha e A. I. de Carvalho, 577-608. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012.

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PALAVRAS DO ESPECIALISTAPARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA EM SAÚDE NA AMÉRICA DO SULpor Caroline Ferraz Ignacio, bolsista de Determinação Social da Saúde do ISAGS

A importância da participação comunitária ou de conceitos relacionados, como a participação social, a participação popular e o envolvimento comunitário, é frequentemente mencionada em políticas de desenvolvimento e saúde. Especificamente, os países membros da UNASUL reconheceram a necessidade de uma participação comunitária em saúde e se comprometeram a permitir essa participação por meio de mecanismos institucionalizados, apoiados por marcos legais nacionais. A Declaração de Alma-Ata catalisou esta tendência ao declarar que “O povo tem o direito e o dever de participar individualmente e coletivamente no planejamento e na aplicação da sua atenção de saúde.”1. Como a saúde se relaciona intimamente com o modo de vida e os processos de determinação social, os usuários dos serviços de saúde podem direcionar os processos para atender melhor às necessidades locais. No entanto, não existe um consenso claro sobre o que constitui a participação e nem sobre como ela deve ser implementada.

As várias interpretações levaram a uma grande variedade de abordagens que refletem o conceito de participação comunitária próprio dos grupos de interesse, especialmente de governos, representantes da indústria da saúde, organizações não-governamentais (ONGs) e/ou outros doadores. Os mecanismos de participação comunitária institucionalizados podem ser resultado da pressão comunitária; mas sua institucionalização requer a aprovação de todas as partes interessadas que ocupam posições formais de poder. Assim, os processos de participação inerentemente geram conflito e seus espaços devem permitir que os vários atores identifiquem e façam a mediação desses conflitos entre a comunidade e os interesses institucionais. Ainda que cada país e cada comunidade tenham suas peculiaridades, os espaços formais de participação comunitária em saúde deveriam estar focados em melhorar a saúde e a equidade. Ao permitir colaborações entre os fornecedores de atenção de saúde, autoridades governamentais (não somente do setor saúde, mas também de outros setores), organizações da sociedade civil e as ONGs que atuam no território, esses múltiplos atores podem desenvolver localmente estratégias adequadas para alcançar objetivos.

Quando os residentes estão motivados a identificar os problemas em suas comunidades e a desenvolver soluções, a participação é vista como uma ferramenta de empoderamento. No entanto, o que constitui o empoderamento é relativo, assim como o nível de envolvimento das comunidades para solucionar as prioridades a ponto de serem, de fato, consideradas iniciativas ‘dirigidas pela comunidade’. Quando os membros da comunidade são persuadidos a colaborar com uma atividade pré-definida para suplementar os recursos humanos ou financeiros, são restritas as oportunidades de gerir conflitos ou redistribuir o poder entre as partes interessadas. Além disso, a mera presença de representantes da comunidade na mesa em que se tomam as decisões não significa que a participação está sendo empoderada. Por exemplo, se os membros da comunidade estão presentes

nas discussões, mas se utiliza excessivamente linguagem técnica que limita o diálogo e impõe uma hierarquia de poder, a participação efetivamente se vê frustrada.

Na América do Sul, os exemplos de participação comunitária são muitos e variados. Incluem mais transparência para o intercâmbio de informações, o recrutamento de residentes locais para realizarem a vigilância de doenças e fatores de risco, o controle de vetores através de atividades de limpeza comunitária e a inclusão de voluntários em centros de saúde. Outros exemplos na região incentivam que certos grupos identifiquem problemas em suas próprias comunidades e desenvolvam soluções com o apoio das equipes de Atenção Primária de Saúde. Apesar da variedade, o mecanismo de participação comunitária mais utilizado é o Conselho de Saúde em âmbito local ou nacional, formado por representantes do Estado, da sociedade civil e das ONGs. Os conselhos geralmente identificam as prioridades, orientam o desenvolvimento de políticas e monitoram sua implementação. Mesmo assim, alguns conselhos funcionam como uma junta consultiva formal ou informal, sem poder de decisão; enquanto outros são organismos formais cujas decisões são vinculantes.

Os mecanismos de participação podem ser desenvolvidos para apoiar à sociedade civil no controle e na gestão de processos. Iniciativas de capacitação permanentes para todos os membros do conselho podem ser usadas em um entorno no qual o conhecimento popular e o conhecimento técnico possam ser compartilhados entre a sociedade civil e as outras partes interessadas. Além disso, é necessário estabelecer compromissos para criar processos institucionalizados que sigam para além do intercâmbio de informações e da colaboração, em contextos de processos comunitários vinculantes ainda limitados. Por outro lado, as instituições devem se comprometer a respeitar transparentemente as decisões tomadas para validar os processos participativos dentro dos parâmetros de políticas públicas e de regulações sanitárias.

Finalmente, seria importante refletir sobre o propósito subjacente da participação comunitária em saúde: promover a saúde e a equidade. Como se demonstrou na última edição de Saúde ao Sul, a América do Sul convive com inequidades persistentes, apesar das reduções em indicadores de pobreza, pois tais inequidades se originam na distribuição desigual do poder. Os mecanismos de participação comunitária têm como objeto a redistribuição do poder na tomada de decisões. Portanto, ainda que não exista uma abordagem única para todos os contextos na implementação de mecanismos de participação comunitária em saúde, os esforços devem estar focados em permitir que a sociedade civil tenha mais poder nos processos que a afetem. Para apoiar a participação comunitária em saúde na América do Sul, o ISAGS desenvolverá um estudo aprofundado sobre os mecanismos de participação comunitária nos países membros da UNASUL em 2018.

1 WHO. Declaration of Alma-Ata. International Conference on Primary Health Care, Alma-Ata, USSR, 6-12 September 1978. Alma-Ata: World Health Organization, 1978. Available from: http://www.who.int/publications/almaata_declaration_en.pdf.

5

6

A SOMBRA DO MONOPÓLIO NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA

Nos anais das teorias econômicas liberais, a concorrência aparece como um aspecto fundamental ao funcionamento do capitalismo. Em sua versão perfeita, o mercado seria composto de múltiplos consumidores e múltiplos produtores (a demanda agregada e a oferta agregada, respectivamente), cuja interação seria inclusive responsável pelo estabelecimento de preços e estimularia permanentemente a inovação.

Existem, no entanto, setores da indústria, em particular da indústria farmacêutica, que, repetindo ad nauseam o mantra a favor de um firme respeito aos direitos da propriedade intelectual para incentivar a inovação, convenientemente não dão a mesma importância à livre concorrência. Pelo contrário, fazem uso de malabarismos jurídicos para manter monopólios na produção de medicamentos às custas do bem-estar de milhões de pessoas e da sustentabilidade dos sistemas de saúde.

Nos surpreende, no entanto, que as políticas de defesa da concorrência no setor farmacêutico não sejam utilizadas como um mecanismo a mais para ampliar o acesso a medicamentos, já que os países contam com toda uma legislação sobre o assunto e, frequentemente, órgãos especializados na estrutura dos Estados. Existem ainda previsões relacionadas a essa questão no Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual (ADPIC) no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Tal estratégia foi objeto de uma recomendação formulada pelo Painel de Alto Nível sobre o Acesso a Medicamentos convocado pelo ex-Secretário Geral das Nações Unidas.

Com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre o assunto, socializar as iniciativas que estão sendo desenvolvidas nos países da UNASUL e fomentar o trabalho intersetorial, o ISAGS, junto ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), convidou representantes dos Ministérios da Saúde, de departamentos de compras governamentais, de propriedade intelectual e de defesa da concorrência para uma reunião de trabalho de três dias no Rio de Janeiro, Brasil.

POR QUE É TÃO IMPORTANTE?Além dos representantes de todos os países da

UNASUL, também participaram da reunião especialistas internacionais, consultores do PNUD e membros da sociedade civil, que compartilharam dados transcendentes sobre a questão da concorrência.

Ruth Lopert, consultora independente do PNUD, por exemplo, explicou como o mundo real do mercado farmacêutico se distancia do que os teóricos liberais projetavam.

Em primeiro lugar, o lado da demanda é extremamente inelástico; ou seja, os consumidores que precisam de algum medicamento estão muitas vezes dispostos a adquiri-los a qualquer preço (ou pressionar para que seus governos os adquiram, mesmo por processos judiciais). Por outro lado, se trata de um mercado não necessariamente reconhecido por sua transparência, especialmente no que se refere ao estabelecimento de preços. Lopert mostrou que na Austrália se paga até 30 vezes mais por um mesmo medicamento em comparação à Nova Zelândia, um país muito menor, o que desbanca por completo possíveis explicações relacionadas à escala.

Quanto à propriedade intelectual, ao possuir uma patente, assim como o poder de determinar os preços de maneira pouco transparente, a indústria tem, de fato, monopólios. E não são poucas as tentativas de prolonga-los no tempo garantindo ganhos substanciais, os chamados evergreening.

Os métodos vão desde o patenteamento excessivo (o pedido de patente pelo mesmo produto com pequenas variações na formulação e/ou na dose, por exemplo) e a sham litigation (o ato de usar o Poder Judiciário para julgar ações sem perspectiva de sucesso, para deter a concorrência), até a fixação abusiva de preços, entre outros. O impacto, por sua vez, é muito parecido tanto nos países do Sul quanto nos países desenvolvidos: sistemas de saúde impossibilitados de oferecer os melhores tratamentos, fragilizados caso cheguem a fazê-los ou, pior ainda, cidadãos enfrentando gastos catastróficos.

Como as práticas anticompetitivas garantem lucros exorbitantes ao mesmo tempo que limitam a capacidade dos Sistemas de Saúde de salvar vidas

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Painel de Alto Nível para superar os problemas do comportamento anticompetitivo, está o aumento da transparência. “Os governos deveriam requerer que todos os fabricantes e distribuidores revelem aos entes reguladores e compradores os custos de P+D, produção, marketing e distribuição”, afirma o documento, que recomenda, além disso, o estabelecimento de bancos de preços de medicamentos patenteados, genéricos e biossimilares nos países onde estão registrados.

SITUAÇÃO EM NOSSA REGIÃODurante o evento, basicamente todos os

países tiveram uma história para contar com relação ao comportamento anticompetitivo por parte da indústria farmacêutica. Mesmo assim, compartilharam avanços importantes em relação à regulação de preços, mecanismos de compra, avaliação de patentes, e defesa da concorrência.

Até países menores como o Suriname não saem intactos. A sua representante, a coordenadora alterna do Grupo de Acesso Universal a Medicamentos da UNASUL (GAUMU), Miriam Naarendorp, relatou o caso de uma empresa, que publicamente declarava “aplicar estratégias equitativas de preços” e que “havia atualizado seu compromisso em oferecer produtos de insulina humana de menor preço a países menos desenvolvidos”. No caso concreto do Suriname, no entanto, tal empresa introduziu uma nova forma de dosagem (penfill) e, em seguida, quase duplicou seu preço em comparação à versão antiga (de US$ 0,89/ml a US$ 1,57). Além disso, uma investigação realizada no âmbito da Comunidade do Caribe (CARICOM) revelou que o país paga mais pela mesma dosagem de insulina que países com um PIB maior.

Por outro lado, vários países demonstraram preocupação com o chamado evergreening, que retém os limitados recursos jurídicos e financeiros dos governos por vários anos. Em casos de sham litigation, além disso, não está estabelecido como se deve compensar os sistemas de saúde pelos períodos durante os quais tiveram que suportar preços abusivos pela situação de monopólio. Ao apresentar um estudo referente a um pedido de patente da Gilead finalmente rejeitado para o medicamento Tenofovir (TDF 300 mg), a especialista da Fiocruz, Gabriela Chaves, revelou que se o tivessem comprado durante os cinco anos do processo em versão genérica, o sistema de Saúde do Brasil teria poupado cerca de US$ 200 milhões.

Entre as estratégias mencionadas no informe do

A Organização Mundial da Saúde estima (2010) que 100 milhões de pessoas em todo o mundo ficaram abaixo do limite da pobreza por causa de gastos diretos em saúde.

BANCO DE PREÇOS DA UNASULO bloco sul-americano conta com uma base regional de dados sobre o preço de medicamentos essenciais desde 2016, com um total de 34 medicamentos e vacinas identificados como responsáveis por altos custos farmacêuticos.

Sobre isso, Gabriela Chaves considera que tais fontes deveriam ter mais dados sobre, por exemplo, o status da situação da patente (pendente, confirmada, rejeitada) e sobre as suas datas de expiração, para oferecer uma linha de base aos países que, individualmente, nem sempre têm acesso a este tipo de informação.

Outra recomendação se refere à elevação de limites para os pedidos de patentes. Carlos Correa, membro do comitê de especialistas do Painel e um dos responsáveis pela elaboração da Guia de Patenteabilidade da Argentina, uma das mais avançadas do mundo, fez um resumo de vários casos de excessos.

Por outro lado, foi destacada a importância do trabalho intersetorial entre diferentes instâncias do governo, conforme emulado em atividades práticas desenvolvidas durante a reunião entre os Ministérios da Saúde, as entidades responsáveis das compras públicas, as instâncias encarregadas de propriedade intelectual e os organismos de defesa da concorrência.

Neste sentido, o encontro deixou nos participantes uma impressão positiva. “Tendo passado estes três dias com a qualidade das pessoas que aqui estão representando seus países, com o compromisso e a paixão que possuem, com o potencial que possuem de articulação entre si e de encontrar uma forma de trabalhar juntas estabelecendo mecanismos efetivos, estou muito otimista”, concluiu a diretora executiva do ISAGS, Carina Vance.

Fontes de Informação de preços de medicamentos na regiãoPrecios de antirretrovirales de primera línea2000-2010

menor precio del ARV de marca

precio del competidor genérico

Fuente: Medicins Sans Frontieres [MSF]. Untangling the Web of Antiretroviral Price Reductions [UTW], 14th edition, July 2011.

$ 10.439

Brasil $ 2.767

Junio 2000

Sept 01

Junio 02

Junio 03

Junio 05

Junio 06

Junio 10

Julio 07

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Agosto09

Ene05

Dic02

Dic03

Abril04

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$ 281

Hetero$ 87

Cipla $132

Cipla $80

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Aurobindo,Matrix

Cipla $ 67

$ 727

$ 621

$ 555

$ 549$ 331 $ 331 $ 331

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SURSALUD

Em 1º de dezembro se comemora

anualmente o Dia Mundial da AIDS. O

lema da campanha de 2017 é “cada pessoa

conta”, chamando a atenção para a necessidade

do acesso ou cobertura universal a serviços

de atenção, a medicamentos e a outros

produtos de saúde seguros, eficazes,

de qualidade e acessíveis.

AIDS NO MUNDO¹

Em 2016, havia 36,7 milhões

de pessoas vivendo com HIV, 2,1

milhões eram crianças e

jovens com menos de 15 anos

e 1 milhão faleceu devido a doenças

relacionadas à AIDS. No entanto, em

relação a 2005, este número caiu 48%.

1/3 das mortes continua sendo

por causa da tuberculose.

Desde 2010, houve uma redução

de 11% de novas infecções entre

adultos. Entre crianças,

a redução foi de 47%.

ACABAR COM A EPIDEMIAEm 2016, a OMS lançou a Estratégia Mundial do Setor da Saúde contra o HIV, 2016-2021², que estabelece como o setor saúde vai contribuir rumo a essa conquista, em sintonia com o Objetivo 3.3 da Agenda 2030.Entre as metas de alcance mundial, estão:

• reduzir em 50% o número de mortes relacionadas ao HIV;

• reduzir a zero as novas infecções em bebês.

• revogar todas as leis, regulamentações e políticas discriminatórias relacionadas ao HIV e eliminar a discriminação relacionada a esta infecção em todos os entornos;

• garantir que 90% das pessoas infectadas com o HIV conheçam seu estado sorológico; que 90% das pessoas diagnosticadas recebam tratamento com antirretrovirais e que 90% das pessoas infectadas em tratamento consigam a redução das concentrações virais até níveis muito baixos (também conhecida como Estratégia 90-90-90)

AIDS

Em 2016, se evitou que quase 3.000 crianças fossem

infectadas por transmissão vertical. Um total de 98%

das infecções entre mãe e filho podem ser evitadas

com tratamento oportuno e adequado.

O primeiro país do mundo a garantir o acesso público

universal ao tratamento do HIV é da nossa região:

BRASIL4

Em 1996, foi criada a Lei nº 9.313/1996 que instituiu o

acesso universal ao tratamento, fortalecida em 1999

quando se decidiu produzir antirretrovirais genéricos

localmente.

Além disso, em 2007, o país emitiu a primeira licença

obrigatória da região para o medicamento Efavirenz,

um dos principais medicamentos de primeira linha

para o tratamento do HIV.

Até o final de 2017, se estima que

541 mil pessoas estarão em tratamento

com antirretrovirais no Sistema Único de Saúde

(SUS), com um investimento de cerca

de US$300 milhões.

Nos últimos 10 anos, o país conseguiu

uma queda de 34,5% em infecções

de crianças menores de 5 anos.

Entre 2006 e 2016, houve um

aumento de 175% no número de

novas infecções na faixa etária

entre 15 e 19 anos e de 111% na

faixa etária de 20 a 24 anos,

população cujas campanhas e

estratégias futuras do Ministério

da Saúde do país serão focadas.

Além disso, este mês, a população

vulnerável à infecção também terá

acesso ao PrEP – tratamento de

pré-exposição ao HIV.

Referências1 – UNAIDS, 2017. Fact sheet - Latest statistics on the status of the AIDS epidemic. Disponible en < http://www.unaids.org/en/resources/fact-sheet> Acceso en 02-12-2017.2 – OMS, 2016. Estrategia Mundial del Sector de la Salud contra el VIH, 2016-2021. Disponible en < http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/250574/1/WHO-HIV-2016.05-spa.pdf?ua=1 > Acceso en 29-11-20173 - UNAIDS, 2017. AIDS INFO. Disponible en <http://aidsinfo.unaids.org/#> Acceso en 01-12-20174 – MINISTERIO DE SALUD DE BRASIL. PANORAMA 2016: Ampliação de diagnóstico e tratamento reduz casos e mortes por aids no país. Disponible en < http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2017/dezembro/01/Dia-Mundial-de-Combate-a-Aids.pdf> Acceso en 05-12-2017

Em 1º de dezembro se comemora

anualmente o Dia Mundial da AIDS. O

lema da campanha de 2017 é “cada pessoa

conta”, chamando a atenção para a necessidade

do acesso ou cobertura universal a serviços

de atenção, a medicamentos e a outros

produtos de saúde seguros, eficazes,

de qualidade e acessíveis.

AIDS NO MUNDO¹

Em 2016, havia 36,7 milhões

de pessoas vivendo com HIV, 2,1

milhões eram crianças e

jovens com menos de 15 anos

e 1 milhão faleceu devido a doenças

relacionadas à AIDS. No entanto, em

relação a 2005, este número caiu 48%.

1/3 das mortes continua sendo

por causa da tuberculose.

Desde 2010, houve uma redução

de 11% de novas infecções entre

adultos. Entre crianças,

a redução foi de 47%.

Argentina, Colômbia - 0,4

Bolívia, Equador, Peru - 0,3

Brasil, Uruguai, Venezuela - 0,6

Chile, Paraguai - 0,5

Suriname - 1,4

Guiana - 1,6

PREVALÊNCIA DO HIV EM ADULTOS (2016)

AIDS NA AMÉRICA DO SUL³.

Hoje em dia, existe aproximadamente 1 milhão e

420 mil pessoas vivendo com HIV na América do

Sul, com uma média de 48% recebendo tratamento.

Com base nas metas globais, cada país

deve estabelecer objetivos e metas

nacionais para 2020, levando em conta

os contextos nacionais, a natureza e

dinâmica da epidemia do HIV e seu

sistema de saúde

PARA OS PAÍSES

“Não importa se o país é desenvolvido ou não, e também não importa o seu

tamanho. Todas as nações podem cooperar”. Assim afirmou o embaixador Galo Yépez,

representante do Ministério das Relações Exteriores do Equador e do G-77, na última

Expo Global de Desenvolvimento Sul-Sul (GSSD Expo 2017, em inglês). A frase traduz,

de alguma maneira, o sentimento ou a ideia de solidariedade que a modalidade Sul-

Sul na cooperação global costuma despertar. Ainda que a maioria dos países do Sul

tenha menos renda que os países do Norte, e que, consequentemente, não possa

financiar tantas iniciativas, existem outras ferramentas, muito além das financeiras,

que deram resultados expressivos em diversas áreas do desenvolvimento, mediante

esforços conjuntos.

Entre as nações sul-americanas, isso já funciona em muitos campos, seja político,

econômico, e obviamente, no da Saúde. Na GSSD Expo 2017, o mais importante

evento de cooperação Sul-Sul do mundo, organizado entre os dias 27 e 30 de

novembro, em Antália, Turquia, pelo UNOSSC (a agência das Nações Unidas para os

temas relacionados à Cooperação Sul-Sul), o ISAGS compartilhou com os participantes

alguns destes projetos e experiências bem-sucedidas, alcançadas em conjunto

pelos países da UNASUL no campo da Saúde. O Instituto também moderou o painel

“Cooperação entre países para o Desenvolvimento em Saúde”, que contou com a

participação do embaixador Yépez e de representantes de diferentes organismos

como a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS) e o Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que comentaram os principais desafios e

problemáticas para a integração e para a cooperação em Saúde.

“O setor da Saúde representa um dos maiores desafios que temos na Cooperação

Sul-Sul. Portanto, devemos ser criativos e nos enfocar na geração de novos

COOPERAÇÃO SUL-SUL EM SAÚDE: uma importante ferramenta rumo aos ODS

financiamentos, avaliar processos e compartilhar

as melhores experiências”, afirmou Silvia López

Cabana, da Secretaria Geral Ibero-Americana, que

apresentou no painel o Sistema Integrado de Dados

da Ibero-América sobre Cooperação Sul-Sul e

Triangular (SIDICSS), uma plataforma de dados online

desenvolvida e construída a partir do esforço conjunto

dos 20 países que compõem o organismo.

Entre os principais assuntos discutidos na mesa,

está a questão das crescentes dificuldades de

financiamento de projetos de cooperação tradicional e

de como a modalidade Sul-Sul pode ser uma solução

viável. Neste cenário, os organismos sub-regionais

adquirem um papel muito importante. Sabe-se que os

países costumam ter iniciativas de cooperação entre

si, mas as instâncias regionais têm o potencial de

sistematizar, organizar e compartilhar o conhecimento,

ou seja, têm funções estratégicas. “Na tarefa de unificar

as afinidades geográfica e a das temáticas e dos

problemas, eles podem ser muito ágeis e rapidamente

gerar as respostas de Cooperação Sul-Sul necessárias”,

afirmou o argentino Jorge Chediek, diretor do UNOSSC.

A COOPERAÇÃO SUL-SUL E OS ODSNa abertura do encontro, que teve como lema

“Cooperação Sul-Sul na Era da Transformação

Econômica, Social e Ambiental: O caminho rumo ao 40º

aniversário da adoção do Plano de Ação de Buenos

Aires (PABA+40)”, Chediek também lembrou que a

cooperação global vai ser um dos principais mecanismos

para que as metas da Agenda 2030 sejam alcançadas,

inclusive o ODS 17 – “Revitalizar a Aliança Mundial

para o Desenvolvimento Sustentável” – que se refere

diretamente a este assunto e inclui metas que exigem

que os países melhorem seus mecanismos de alianças

de todos os tipos. “Cumprir com a Agenda 2030 para o

Desenvolvimento Sustentável e também com o Acordo

de Paris vai exigir o envolvimento de diferentes setores,

em todos os níveis e em todos os países”, completou o

diretor do UNOSSC.

Uma questão pendente nesta modalidade de

cooperação é a falta de dados robustos que mostrem a

sua escala e o impacto. A coleta e análise de informação

é um ponto relevante para o monitoramento e para a

prestação de contas da Agenda 2030, além de ser

fundamental no intercâmbio de conhecimento entre os

países. Sem definições precisas nem dados comparáveis,

a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e

Desenvolvimento (UNCTAD, siglas em inglês) estima

que a Cooperação Sul-Sul movimenta entre US$16

e US$19 bilhões (2016). A criação de capacidades

em produção de dados é uma das prioridades para a

PABA+40, conferência que será celebrada na capital

da Argentina em 2019 para comemorar os 40 anos do

Plano de Ação de Buenos Aires.

“Não restam dúvidas de que a Cooperação Sul-Sul

e a cooperação triangular, como complementos da

cooperação Norte-Sul, serão vitais para que alcancemos

os ODS. Neste panorama, os países da América do Sul

têm muito potencial de participação”, conclui Chediek.

ALGUNS PROJETOS E ACORDOS DE COOPERAÇÃO ENTRE OS PAÍSES SUL-AMERICANOS NO ANO DE 2017

Rede de bancos de armazenamento e fornecimento de leite materno: Em maio, Brasil e Equador se reuniram para definir os alinhamentos de um projeto inédito na região: um sistema de informação de doadores e receptores de leite materno de bancos nos países.

Saúde nas fronteiras: Em julho, Paraguai e Argentina ativaram a elaboração de planos na luta contra as doenças vetoriais em suas fronteiras.

Acordo de colaboração: Em julho, os Ministérios do Peru e do Chile assinaram um Memorando de Entendimento, que especifica a criação de uma comissão para realizar o acompanhamento e a avaliação dos compromissos bilaterais e entre fronteiras em matéria sanitária.

Doação de sangue: Em setembro, em um esforço inédito dos Ministérios da Saúde do Brasil e da Colômbia, foi possível transportar um tipo raro de sangue em apenas um dia para salvar a vida de uma menina de um ano.

Intercâmbio de experiências: Em outubro, os Ministérios do Peru e da Bolívia entraram em acordo na elaboração conjunta de diversos planos binacionais para ampliar o intercâmbio de experiências em assuntos como a redução da mortalidade materna e a doação de órgãos, sangue, tecidos e células.

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ENCARREGADO DO SECRETÁRIO GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A COOPERAÇÃO SUL-SUL E DIRETOR DO UNOSSC

REPRESENTANTE DEL ÁREA DE COOPERACIÓN ENTRE PAÍSES DE LA ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPS/OMS)

Quais são os principais desafios e oportunidades da Cooperação em termos de Saúde para os próximos anos?

CE: Um dos principais desafios que enfrentamos nos Estados membros é a disponibilidade de financiamento. Existe vontade política, existe a capacidade técnica entre os países, mas falta esse catalizador para honrar esse compromisso. Há também um grande desafio no que diz respeito à sustentabilidade da Cooperação, tanto para sua versão tradicional quanto para cooperação Sul-Sul. É também uma das áreas de trabalho da OPAS.

Já com relação às oportunidades, elas se relacionam às capacidades existentes nos países. A OPAS está trabalhando justamente para poder capitalizar essa vontade política de cooperar e para que essa abundância de conhecimento entre os países possa ser compartilhada.

Como as diferentes organizações podem se articular para chegar a uma maior sinergia em termos de cooperação Sul-Sul?

CE: Em termos de Cooperação Sul-Sul, há espaço e trabalho para todos. Particularmente com as organizações de integração regional, como a UNASUL, o ISAGS, o ORAS-CONHU, o OTCA, etc. A OPAS está particularmente trabalhando muito este ano na consolidação desse universo regional, em poder se aproximar de todos esses atores para que possamos trabalhar junto. É reconhecido o grande valor agregado que existe nesses organismos para alcançar os ODS e os objetivos nacionais, regionais e globais em Saúde. Assim, nos próximos meses concluiremos na América do Sul a Estratégia Sub-regional de Cooperação. Fizemos uma consulta há cerca de duas semanas em Lima, no Peru, com muitos organismos regionais da América do Sul e vamos continuar trabalhando nesse tema.

Qual a importância da Cooperação Sul-Sul e da Cooperação em Saúde no cenário mundial?

JC: Realmente, o que estamos vendo nesse evento é que a Cooperação Sul-Sul tem uma importância cada vez maior na construção da Agenda Internacional. É um movimento essencial para cumprir com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e, de fato, há um grande entusiasmo para aprofundar e criar novos canais e mecanismos. Isso não se reflete apenas nos números impressionantes da exposição GSSD 2017, mas também nas relações, parcerias e projetos em comum que saem daqui fortalecidos e que certamente darão seus frutos. Em março de 2019, se realizará a conferência PABA+40, para celebrar os 40 anos da assinatura do Plano de Ação de Buenos Aires (documento marco da cooperação Sul-Sul), conforme se decidiu na última Assembleia Geral das Nações Unidas. Vai ser uma oportunidade para refletir sobre tudo o que avançamos desde então e também os próximos passos, no contexto da Agenda 2030.

Qual a importância da atuação de organismos regionais na Cooperação Sul-Sul?

JC: O papel dos organismos sub-regionais é extremamente estratégico. Na tarefa de unificar as afinidades geográfica e a das temáticas e dos problemas, eles podem ser muito ágeis e rapidamente gerar as respostas de Cooperação Sul-Sul necessárias. Nesse sentido, eu gostaria de parabenizar o trabalho do ISAGS-UNASUL, que realmente está fazendo muito para unir e fomentar a cooperação dos nossos sistemas de saúde na América do Sul.

Entre 27 e 30 de novembro, o ISAGS esteve pela terceira vez na Exposição Global de Desenvolvimento Sul-Sul (GSSD Expo 2017), o maior evento de Cooperação Sul-Sul do mundo, que reuniu mais de 120 países e organismos, além de 800 participantes, em Antália, Turquia. Durante a conferência, entrevistamos especialistas que falaram sobre os principais temas da Cooperação Sul-Sul.

JORGE CHEDIEK CARLOS ANDRÉS EMANUELE

ENTREVISTAS:

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DIRETOR REGIONAL DO UNFPA DIRETOR DE RELAÇÕES EXTERNAS DA UNITAID

O senhor poderia comentar o que viu na GSSD Expo até agora? Quais são as principais tendências da Cooperação Sul-Sul?

IM: Em primeiro lugar, trata-se obviamente de um evento muito significativo. Acredito que a Cooperação Sul-Sul por si mesma é um mecanismo e um movimento muito importante. E a tendência é que se torne cada vez mais, não apenas por conta do volume de recursos que faz girar, mas também pelo mundo em que vivemos, onde precisamos prestar atenção às questões do Sul. Então, existem várias experiências relacionadas à adaptação a novas realidades que devem ser compartilhadas entre países com objetivos e desafios similares. Um exemplo: a dinâmica populacional está mudando rapidamente nessa parte do mundo, conforme as pessoas vão envelhecendo. Essa é uma boa notícia porque significa que as pessoas estão mais saudáveis e vivem mais, embora também existam muitas implicações, por exemplo, à economia. Como os países se adaptam a essa nova realidade? Essa é uma das áreas em que o UNFPA trabalha e muito precisa ser feito em termos de cooperação.

Qual seria o aspecto mais desafiador para essa modalidade de cooperação?

IM: Certamente são as questões não resolvidas, muitas das quais estão presentes no contexto da Agenda de Desenvolvimento Sustentável. Entretanto, existem muitos objetivos nos quais falhamos na Agenda de Desenvolvimento do Milênio e é preciso olhar eles de perto. Até hoje, milhares de mulheres morrem ao dar à luz. Acredito que o espírito de solidariedade, que talvez seja a característica mais peculiar da Cooperação Sul-Sul, pode ser um catalizador importante para a abordagem desse tipo de questão. Como uma comunidade global, temos a obrigação moral de fazê-lo.

Também entendo que esse espírito está muito presente nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, já que se enfocam nos que ficaram mais para trás. Teremos que reunir todos os recursos disponíveis, seja da cooperação tradicional Norte-Sul, seja através da Cooperação Sul-Sul, seja dos próprios recursos nacionais. A maneira como vamos nos articular ainda é uma questão em aberto, mas vejo muito potencial na modalidade Sul-Sul.

Qual a importância da GSSD Expo 2017 para a Cooperação Sul-Sul?

MC: A GSSD Expo 2017 é um evento que reúne não apenas as organizações, mas também todos aqueles que praticam a cooperação Sul-Sul, um instrumento bastante utilizado, mas muito pouco discutido. Trata-se de uma maneira pela qual os países do Sul (ou de forma triangular) se ajudam mutuamente em um complemento à cooperação tradicional. Sem dúvidas, todas as discussões do evento, principalmente no contexto da Agenda de Desenvolvimento Sustentável, são muito relevantes porque já sabemos que existem limitações no que se pode conseguir com a cooperação tradicional. Creio que, nesse sentido, a Cooperação Sul-Sul tem um grande potencial.

Existem dados ou números que expliquem essa importância?MC: Para dar um exemplo, a cooperação global em

2016 acumulou cerca de US$140 bilhões. Estima-se que seria necessário entre US$ 400 e US$ 600 bilhões para a consecução dos ODS. Essa brecha nunca será totalmente preenchida apenas com a cooperação tradicional. Precisamos acionar todos, seja através do aporte de recursos ou da troca de conhecimento e experiências, o que tem um impacto real para a realização de políticas bem-sucedidas.

IAN MACFARLANE MAURICIO CYSNE

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SURSALUD

CONQUISTAS E PERSPECTIVAS DO ISAGSA visão que os países sul-americanos tiveram ao

criar o Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde foi a de contar com um espaço de geração e difusão de conhecimento em políticas de saúde e apoio à formação de líderes em saúde da região. Desde 2011, as contribuições do ISAGS incluem publicações diversas, como três livros que atualmente são referência no campo da saúde sul-americana, além do desenvolvimento de dezenas de workshops e conferências com centenas de representantes dos Ministérios de Saúde da região. Na trajetória do ISAGS, o ano de 2017 foi histórico já que os países da UNASUL optaram por consolidar sua estrutura e incorporar quatro reconhecidos especialistas em saúde da região, que têm levado a instituição a um novo momento, ampliando sua capacidade de produção e abordando as temáticas de saúde regionais e globais com a integralidade resultante do compartilhamento de visões das áreas de Vigilância em Saúde, Sistemas e Serviços de Saúde Universais, Acesso a Medicamentos e outras Tecnologias Sanitárias e Determinação Social, as mesmas priorizadas pelo Conselho de Saúde Sul-Americano.

Em 2017, o ISAGS desenvolveu workshops de trabalho e conferências especializadas sobre assimetrias dos sistemas de saúde da região, gestão de riscos de desastres, vigilância de doenças emergentes e reemergentes, introdução de novas tecnologias sanitárias e os riscos que esses processos apresentam, comunicação em saúde e práticas anticompetitivas no setor farmacêutico como um elemento que limita o acesso universal a medicamentos, etc. Estas oportunidades de intercâmbio entre os países, e de conhecer a visão de especialistas internacionais nos diversos assuntos abordados, contaram com a participação de mais de uma centena de atores da saúde regional.

Neste ano, o ISAGS publicou ainda cinco estudos técnicos inéditos sobre processos de compra de medicamentos na região, medicamentos em risco de desabastecimento e a resposta dos países, situação regional sobre gravidez adolescente não planejada, mapeamento de políticas de saúde intercultural nos países da UNASUL e um levantamento de políticas e enfoques regionais relacionados ao envelhecimento populacional na região. Estas contribuições

alimentam os esforços para entender melhor avanços, potencialidades e desafios da região em matéria de saúde, além de se constituir num catálogo de boas práticas em governança da saúde como insumo para os processos de integração sul-americana.

Outro processo inovador e bem-sucedido foi o desenvolvimento do primeiro curso virtual de Diplomacia da Saúde, executado conjuntamente com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Brasil, e com a FLACSO Argentina. O curso contou com 60 inscritos dos Ministérios da Saúde e das Relações Exteriores da região, e com a participação de 29 especialistas de diversas universidades em âmbito mundial. Como produto final, os estudantes desenvolveram um trabalho prático de elaboração de projetos de integração regional em saúde, que serão colocados à disposição dos países membros.

Um grande marco de 2017 foi o lançamento da revista mensal “Saúde ao Sul”, a primeira do seu tipo ao abordar os temas prioritários em saúde da América do Sul, chegando aos Ministérios da Saúde da região, instâncias acadêmicas e organizações sociais relacionadas à temática. Procuramos examinar e compartilhar temas relevantes sobre a saúde e chegar à população em geral, como ferramenta de empoderamento sobre o direito à saúde e de impulso à participação social.

Depois de um breve destaque do que foi 2017 para o ISAGS, cabe compartilhar nossas perspectivas para o próximo ano. Por decisão unânime dos 12 Ministérios da Saúde da UNASUL, em 2018 implementaremos uma nova edição do curso virtual, desta vez em Governo em Saúde, com o objetivo de realizar atualizações anualmente com distintos enfoques. E assim, após um primeiro ano de um bem-sucedido posicionamento regional, continuaremos analisando e difundindo os assuntos mais importantes na saúde da região por meio da revista “Saúde ao Sul”, procurando ampliar ainda mais a sua difusão. Finalmente, realizaremos o lançamento da nossa plataforma online de monitoramento de assimetrias dos sistemas de saúde, transformando o novo website do Instituto em um instrumento vivo de informações e análises sobre como avançamos rumo à vigência plena do direito à saúde na América do Sul. No ISAGS, continuamos acompanhando os processos de integração regional em saúde com convicção.

AO PONTOPor Carina Vance

CONSELHO DIRETIVO

CURSO DE DIPLOMACIA DA SAÚDE TERMINA COM

INSTITUCIONAL

Nos dias 29 e 30 de novembro, se realizou a II Reunião Ordinária do Conselho Diretivo do ISAGS, na sede do Instituto. Participaram do encontro representantes da Argentina – país que presidiu a reunião como Presidência Pro Tempore da UNASUL – Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname e Venezuela.

Uma das funções do Conselho é definir e orientar as ações do ISAGS, aprovando seus planos e projetos. Também é uma oportunidade para o instituto de socializar seu trabalho e os resultados alcançados no ano, por isso, cada área apresentou as atividades desenvolvidas e seus principais avanços.

Em 2017, entre os projetos abordados estão as investigações desenvolvidas pela nova equipe de especialistas em Saúde, além de importantes iniciativas de trabalho em rede que culminaram, por exemplo, na aprovação por parte do Conselho de Saúde Sul-Americano do projeto para o Fundo de Iniciativas Comuns (FIC) do bloco que prevê a criação de um observatório regional de mudanças climáticas e seus impactos na saúde.

O trabalho que o ISAGS vem desenvolvendo, desde 2011, para o apoio à participação dos países em fóruns internacionais como a Assembleia Mundial da Saúde foi destacado como um importante gerador de insumos para a tomada de decisões dos países membros. Também se enfatizou a importância da cobertura que o ISAGS realiza da participação dos países nestes fóruns.

Finalmente, foram debatidos os projetos e atividades propostos para o Plano Operativo Anual (POA) do Instituto para 2018. O ISAGS sugere atividades na área de Comunicação, um estudo sobre o impacto epidemiológico das mudanças ambientais, judicialização da saúde, a realização de um workshop sobre avanços no fortalecimento de Modelos de Redes Integradas de Serviços de Saúde, entre outros. Todas as propostas foram aprovadas pelo Conselho Diretivo e serão desenvolvidas durante o próximo ano.

PÍLULASNOVO ESTUDO DO ISAGS

O ISAGS apresentou a publicação “Situação em Medicamentos Essenciais com Risco de Desabastecimento com Ênfase nos Países Sul-Americanos”, desenvolvida pela especialista em Medicamentos e Tecnologias de Saúde do Instituto, Ângela Acosta, em colaboração com o ORAS-CONHU. Na investigação, foram identificadas as causas do desabastecimento na região com uma lista de medicamentos desabastecidos, de acordo com dados fornecidos pelos Ministérios de Saúde da América do Sul. Também foram apresentadas possíveis estratégias para abordar o problema.

O estudo pode ser acessado em http://bit.ly/DesabastecimientoISAGS

O ISAGS irá lançar no início de 2018 este e outros três estudos. Um sobre as políticas de Interculturalidade na América do Sul, coordenado por Francisco Armada (Determinação Social da Saúde), que também coordena junto a Félix Rígoli (Sistemas e Serviços de Saúde) um estudo sobre o Envelhecimento Saudável. Em sua área, Ângela Acosta coordena outra pesquisa sobre os mecanismos de compra de medicamentos (realizado junto ao SERCOP-Equador). Siga nossas plataformas e redes sociais para acompanhar o lançamento desses estudos.

APRESENTAÇÕES DE PROJETOS FINAISPela primeira vez, os representantes dos países da América do Sul tiveram

a oportunidade de participar de um curso sobre Diplomacia da Saúde com um olhar da nossa região. No dia anterior à reunião do Conselho Diretivo, participantes, tutores e outros convidados se reuniram no ISAGS para assistir à apresentação das propostas de projetos finais dos grupos.

O dia começou com a conferência de abertura do ex-chanceler do Brasil e atual diretor geral da UNITAID, o embaixador Celso Amorim, que participou como Ministro de Relações Exteriores da criação da UNASUL. Durante sua fala, Amorim destacou a importância da saúde para a Cooperação e afirmou: “Vivemos em um mundo de blocos. Neste mundo, temos que pensar na América do Sul”.

Após a conferência, os grupos apresentaram seus projetos de forma presencial e virtual. Foram mais de dez propostas, que serão desenvolvidas no formato de projetos para o FIC, e formarão um banco de ideias para projetos futuros do Conselho de Saúde.

Foram registrados 60 participantes de todos os 12 países membros da UNASUL, que assistiram aulas com 29 docentes de alto nível divididos em seis módulos. O curso foi organizado pelo ISAGS em colaboração com a Rede de Escritórios de Relações Internacionais da UNASUL (REDSSUR-ORIS), a Fiocruz e a área de Relações Internacionais da FLACSO Argentina.

CONVOCATÓRIA DE ARTIGOS PARA A REVISTA PAN-AMERICANA DE SAÚDE PÚBLICA

A Revista Pan-Americana de Saúde Pública, publicação científica da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS), anunciou a convocatória para o próximo número especial sobre “Atenção Primária de Saúde nas Américas: Quarenta anos depois de Alma-Ata”, que será publicada em 2018. A ideia da publicação é fazer um balanço dos projetos implementados nos últimos 40 anos, além de perspectivas para o futuro sobre o acordo assinado pelos países membros para proteger e promover a saúde de todas as pessoas na articulação da Atenção Primárias de Saúde, como princípio orientador de um Sistema Integral.

ONU LANÇA PREMIAÇÃO PARA RECONHECER INICIATIVAS INOVADORES NO MARCO DOS ODS

A Campanha de Ação das Nações Unidas para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável abriu uma convocatória para o programa inaugural de premiação no marco dos ODS. O programa tem como objetivo encontrar indivíduos, organizações da sociedade civil, governos locais e outros atores de todo o planeta que estejam trabalhando em iniciativas inovadoras no movimento internacional de desenvolvimento sustentável e, por conseguinte, rumo a alcançar os ODS. As inscrições e sugestões vão até o dia 15 de janeiro. Mais informação em http://bit.ly/2BVtDKp.

DO ISAGS APROVA O POA 2018