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Um parque sob encantos e desencantos: a Floresta da Tijuca, do reflorestamento a patrimônio paisagístico mundial Elisama Beliani * Nilson Alves de Moraes ** Luiz C. Borges *** Resumo: No Brasil, as ações de proteção da natureza, se iniciam com a criação, em 1861, das Florestas da Tijuca e das Paineiras, no Rio de Janeiro, áreas atualmente conhecidas como Parque Nacional da Tijuca. A reconstituição, por reflorestamento, da cobertura vegetal dessa área dá-lhe um caráter único, já que protege os bens naturais e culturais, a biodiversidade da Mata Atlântica e uma parte da História do Brasil, representada por construções imperiais, ruínas do ciclo do café, além de sítios arqueológicos. O maciço da Tijuca se caracteriza como dêitico de crescimento de uma cidade, uma vez que a ocupação humana e o uso intensivo de monoculturas levaram ao desmatamento da área. A produção agrícola, o aumento da demanda de água e uma série de períodos de seca na cidade apontaram, como solução oferecida pelos cientistas da época, para o reflorestamento das cabeceiras dos cursos d’águas. Major Archer e Barão d’Escragnolle foram os pioneiros nesse processo de recuperação da cobertura vegetal de áreas degradadas e, para isso, utilizaram-se de técnicas diferentes de replantio. Os esforços de reflorestamento, aliados ao processo de regeneração natural, resultaram na floresta atual, muitas vezes chamada de floresta cultural. Porém, muitos animais extintos pela degradação ambiental, nunca retornaram à área. A reconstrução da cobertura vegetal propiciou, o "retorno", em parte, da fauna local; e algumas outras, necessitaram ser reintroduzidas. De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, um dos maiores problemas para a conservação da biodiversidade são as florestas vazias que parecem intactas à primeira vista e, no entanto, apresentam lacunas na cadeia alimentar, por faltarem inúmeros representantes da fauna, o que leva à interrupção de vários processos ecológicos, como dispersão de sementes de grandes árvores, regulação de populações faunísticas e ciclagem de nutrientes. As falhas nesses processos fazem com que o ecossistema de uma floresta vazia não funcione adequadamente, afetando assim a biodiversidade e produzindo o que, em entrevista um morador da comunidade do Vale Encantado chamou de ‘parque sem vida’. O objetivo deste artigo é destacar o processo reflorestamento da Floresta da Tijuca e seus impactos socioambientais, enquanto área natural protegida, bem como realçar a importância de teorias e técnicas científicas que deram e continuam dando sustentação às políticas de proteção da biodiversidade e de gestão socioambiental. Visto em sua historicidade, observa-se que o Parque, além de contribuir para um relativo equilíbrio ecossistêmico, também impacta tanto as populações do seu entorno, quanto a dinâmica do meio ambiente. Enfim, deve-se registrar o empenho de transformar uma paisagem natural degradada por monoculturas, em um Parque Nacional, patrimônio a * UNIRIO, Av. Pasteur, 296, Urca, CEP: 22290-240, RJ, Brasil. [email protected], psicóloga, licenciada em Ciências Biológicas, M.Sc., doutoranda do curso de pós-graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO/MAST). ** UNIRIO, Frei Caneca, 94, Centro, CEP 22211-000, Rio de Janeiro, Brasil. [email protected], cientista social, e D.Sc., professor titular da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e professor do curso de pós- graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO/MAST). *** Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rua Gal. Bruce 586, São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ, CEP: 20921-030; [email protected], historiador da ciência, D. Sc. Pesquisador titular do Museu de Astronomia e Ciências Afins e professor do curso de pós-graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO/MAST).

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Um parque sob encantos e desencantos: a Floresta da Tijuca, do reflorestamento a

patrimônio paisagístico mundial

Elisama Beliani*

Nilson Alves de Moraes**

Luiz C. Borges***

Resumo: No Brasil, as ações de proteção da natureza, se iniciam com a criação, em

1861, das Florestas da Tijuca e das Paineiras, no Rio de Janeiro, áreas atualmente

conhecidas como Parque Nacional da Tijuca. A reconstituição, por reflorestamento, da

cobertura vegetal dessa área dá-lhe um caráter único, já que protege os bens naturais e

culturais, a biodiversidade da Mata Atlântica e uma parte da História do Brasil,

representada por construções imperiais, ruínas do ciclo do café, além de sítios

arqueológicos. O maciço da Tijuca se caracteriza como dêitico de crescimento de uma

cidade, uma vez que a ocupação humana e o uso intensivo de monoculturas levaram ao

desmatamento da área. A produção agrícola, o aumento da demanda de água e uma série

de períodos de seca na cidade apontaram, como solução oferecida pelos cientistas da

época, para o reflorestamento das cabeceiras dos cursos d’águas. Major Archer e Barão

d’Escragnolle foram os pioneiros nesse processo de recuperação da cobertura vegetal de

áreas degradadas e, para isso, utilizaram-se de técnicas diferentes de replantio. Os

esforços de reflorestamento, aliados ao processo de regeneração natural, resultaram na

floresta atual, muitas vezes chamada de floresta cultural. Porém, muitos animais

extintos pela degradação ambiental, nunca retornaram à área. A reconstrução da

cobertura vegetal propiciou, o "retorno", em parte, da fauna local; e algumas outras,

necessitaram ser reintroduzidas. De acordo com o Instituto Chico Mendes de

Conservação da Biodiversidade, um dos maiores problemas para a conservação da

biodiversidade são as florestas vazias que parecem intactas à primeira vista e, no

entanto, apresentam lacunas na cadeia alimentar, por faltarem inúmeros representantes

da fauna, o que leva à interrupção de vários processos ecológicos, como dispersão de

sementes de grandes árvores, regulação de populações faunísticas e ciclagem de

nutrientes. As falhas nesses processos fazem com que o ecossistema de uma floresta

vazia não funcione adequadamente, afetando assim a biodiversidade e produzindo o

que, em entrevista um morador da comunidade do Vale Encantado chamou de ‘parque

sem vida’. O objetivo deste artigo é destacar o processo reflorestamento da Floresta da

Tijuca e seus impactos socioambientais, enquanto área natural protegida, bem como

realçar a importância de teorias e técnicas científicas que deram e continuam dando

sustentação às políticas de proteção da biodiversidade e de gestão socioambiental. Visto

em sua historicidade, observa-se que o Parque, além de contribuir para um relativo

equilíbrio ecossistêmico, também impacta tanto as populações do seu entorno, quanto a

dinâmica do meio ambiente. Enfim, deve-se registrar o empenho de transformar uma

paisagem natural degradada por monoculturas, em um Parque Nacional, patrimônio a

* UNIRIO, Av. Pasteur, 296, Urca, CEP: 22290-240, RJ, Brasil. [email protected], psicóloga, licenciada em

Ciências Biológicas, M.Sc., doutoranda do curso de pós-graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO/MAST). ** UNIRIO, Frei Caneca, 94, Centro, CEP 22211-000, Rio de Janeiro, Brasil. [email protected], cientista

social, e D.Sc., professor titular da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e professor do curso de pós-

graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO/MAST). *** Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rua Gal. Bruce 586, São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ, CEP: 20921-030;

[email protected], historiador da ciência, D. Sc. Pesquisador titular do Museu de Astronomia e Ciências Afins e

professor do curso de pós-graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO/MAST).

ser salvaguardado para as gerações futuras, mediante o uso racional processos

científicos voltados para a proteção da natureza.

Palavras-Chave: Patrimônio, Paisagem, Parque, reflorestamento, socioambiental.

1. Introdução

A área que hoje é o Parque Nacional da Tijuca (PARNA-Tijuca) e que divide a

zona norte da zona sul da cidade do Rio de Janeiro, é uma Unidade de Conservação

(UC), protegida pela Lei nº 9.985 de 18 de julho de 20001. O PARNA-Tijuca detém

uma considerável cobertura de Mata Atlântica, sendo considerado referência no que

tange à proteção da biodiversidade. A área foi estabelecida como Parque Nacional em

19612, e tombada, em 1967, pelo Patrimônio Histórico Artístico Nacional (IPHAN)3

quando, então, recebe o nome de Parque Nacional da Tijuca (Figura 1).

A musealização do Parque foi efetuada por uma equipe multidisciplinar,

coordenada por Alceo Magnanini, diretor dos Parques Nacionais Brasileiros, composta

pela arquiteta Maria Alice Nehab e pelos engenheiros florestais Carlos e Marisa Landini

e Generoso Arruda, e a geógrafa e museóloga Tereza Scheiner. O processo de

musealização foi realizado em duas fases, a primeira de 1973 a 1980 e, a segunda, de

1 A Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000 se refere ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e vem

ordenando as áreas protegidas, nos níveis federal, estadual e municipal. Divide as categorias de unidades de

conservação em dois grupos: proteção integral e uso sustentável. 2 Ao ser estabelecido como parque, em 1961, recebeu o nome de Parque Nacional do Rio de Janeiro. 3 O PARNA-Tijuca foi tombado, através do Processo nº 0762-T-65, no livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e

Paisagístico.

Figura 1. PARNA-Tijuca em setores

Fonte: Instituto Pereira Passos, 2004.

1997 a 2011. Ressaltamos que, em seu conjunto, a musealização também foi importante

para a preservação desse patrimônio4 carioca e nacional, uma vez que logrou catalogar

vários bens existentes no Parque de reconhecido valor histórico, arquitetônico,

arqueológico e natural. Uma amostra desses bens encontra-se representada na exposição

permanente – Uma Floresta na Metrópole – que se encontra no Centro de Visitantes do

PARNA-Tijuca. Vale ressaltar que parte desta exposição revela as três fases, de

encantos e desencantos, pelas quais a área passou: Mata original, Intervenção Humana

e Enfim um Parque5 (Figura 2).

Frente a todas as transformações ocorridas no Parque, especialmente no setor A

(Floresta da Tijuca) - o que, de fato, mais sofreu impactos com a ocupação humana e

com as alterações causadas pela mesma -, identificamos que o uso dos procedimentos

científicos e legais para a preservação da área, permitiu a regeneração da Floresta da

Tijuca, que atualmente encontra-se recoberta por uma vegetação secundária resultante

do reflorestamento da área ocorrido sob os auspícios de D. Pedro II.

Segundo Menezes, a mata atlântica que recobria o Maciço da Tijuca havia sido

devastada para atender à produção de cana de açúcar, café e outros cultivares, bem

como por conta da extração de madeira para construção e outros fins. Com isso

provocando alterações climáticas que vieram a ser sentidas fortemente por ocasião de

4 Para aprofundar no tema – musealização de áreas naturais – ver Beliani (2102) e Beliani e Scheiner (2012). 5 Para saber mais ver Beliani (2012).

uma severa seca que atingiu a capital do Império e durou alguns anos, provocando

inúmeros problemas à população. Essa situação provocou também uma discussão entre

técnicos, administradores, políticos e cientistas em busca de soluções viáveis para

resolver, dentre outros, a falta de abastecimento de água com o que o Rio de Janeiro

sofria. Assim sendo, “a solução apontada pelos cientistas da época foi o reflorestamento

das cabeceiras dos cursos d’água” (MENEZES, 2010, p. 31). Esta foi a razão que levou

o Imperador a decretar o reflorestamento do Maciço da Tijuca.

2. A ocupação humana, a reconstituição da Floresta da Tijuca e as obras de

embelezamento

O primeiro sinal de ocupação humana no Maciço da Tijuca, acredita-se que

tenha sido o estabelecimento de um engenho de propriedade dos jesuítas, na Serra da

Tijuca, datado de 1569 (SCHEINER, 1976). Em tantas outras partes do Maciço -

especialmente devido ao plantio intensivo de diversas culturas como o café, mandioca,

milho, cana de açúcar e cacau -, ocorreu severo desflorestamento o que levou, por sua

vez, à degradação do ecossistema. Há indicativos para supormos que a ocupação,

entretanto, não parece ter atingido a totalidade da área, já que alguns locais

permaneceram menos alterados. Ao lado da produção agrícola (que contribuiu para a

degradação das nascentes d’água que abasteciam a cidade, uma vez que estas ficaram

desprotegidas por causa do desmatamento intensivo), do aumento da demanda por água

(em vista do crescimento da cidade, notadamente após a chegada da Corte portuguesa

ao Brasil), e de uma série de períodos de seca na cidade (1824, 1829, 1830, 1833 e

1843), que também contribuiu para reduzir o volume de água vindo das nascentes,

tornando a captação de água insuficiente para atender às necessidades da população, o

problema do abastecimento de água6 se torna uma prioridade.

Assim, em 1860, o assunto do replantio e proteção das matas junto as nascentes

ganhou especial atenção. D. Pedro II, em 1861, ordenou o replantio da área degradada

com árvores nativas, com o objetivo de resguardar as nascentes, protegendo legalmente

a área como uma Floresta. Então, podemos concordar com Vieira (2010, p. 10) que diz

que “a história oficial de nossas áreas protegidas começa no ano de 1861 com a criação,

6 Houve uma tentativa, em 1831 de captar cursos d’água com nascentes nas Paineiras e na Serra da Carioca, tendo

sido construídos vários reservatórios, porém a dificuldade permaneceu.

pelo Império, das Florestas da Tijuca e Paineiras”7, áreas que, atualmente, integram o

Parque Nacional da Tijuca.

As instruções provisórias do Decreto para o plantio e conservação das Florestas

da Tijuca e Paineiras dispunham que o replantio da área degradada deveria ser feito com

árvores nativas, por sistema de mudas e sementeiras e em linha reta, começando de

ambas margens das nascentes, cujo objetivo seria a proteção dos mananciais. Todo o

trabalho deveria ser supervisionado por um Administrador – para a Floresta da Tijuca

foi nomeado o Major Archer e, para a Floresta das Paineiras, Tomás Nogueira da

Gama8. Esses administradores deveriam enviar relatórios mensais sobre as tarefas

realizadas que precisariam ser executadas por um feitor e por serventes. Conforme

Menezes (2010), o “Imperial Instituto patrocinou a reflexão intelectual entre a elite

brasileira acerca da serventia das florestas como mantenedoras dos mananciais,

reguladoras do clima fontes de saber botânico e áreas de lazer”9. Este é um dos muitos

exemplos da importância que os saberes científicos tinham no Segundo Reinado10.

Nosso objetivo é tratarmos somente do replantio área da Floresta da Tijuca,

reconstituindo-lhe a cobertura vegetal, fato que, com o auxílio de técnicas e processos

científicos, foi realizado em dois períodos. O Major Archer e o Barão d’Escragnolle11

foram os pioneiros nesse processo de recuperação da cobertura vegetal de áreas

degradadas e, para isso, utilizaram-se de técnicas diferentes de replantio.

Por doze anos (de 1862 a 1874), sob a direção do Major Archer, ocorreu a

primeira etapa de plantio para a recuperação da área. Archer mostrou seu conhecimento

7 O decreto de proteção legal da Floresta da Tijuca foi editado por iniciativa do Ministro do Império Luiz Pedreira de

Couto Ferraz, Barão do Bom Retiro (MENEZES, 2010). 8 Tomás Nogueira da Gama realizou um trabalho de reflorestamento sistemático na área por 26 anos (LEMOS, 2002,

p. 47). 9 O presidente do Imperial Instituto, Luiz Pedreira do Couto Ferraz, seguia a corrente ambientalista europeia, que

naquela época apontava as consequências negativas da Revolução Industrial sobre a qualidade de vida. A ideia deste

momento era espalhar parques pelas capitais do mundo para assim, tornar a vida urbana saudável. 10 Outros exemplos: a participação do Brasil na Exposição Universal da Filadélfia, Estados Unidos, em 1876; a

realização da Primeira Exposição Antropológica, em 1882; a criação, em 1838, do Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro; a criação de algumas sociedades científicas etc. 11 Major Manoel Gomes Archer nasceu no Rio de Janeiro em 21 de outubro de 1821 e era engenheiro. A

historiografia oficial não registra se teve filhos, nem quando e como morreu., ao que se sabe, não era militar. Gastão

Luís Henrique de Robert d'Escragnolle nasceu no Rio de Janeiro em 16 de abril de 1821 e morreu em 16 de junho de

1886. Foi um nobre, militar e político. Foi ajudante de ordens do Duque de Caxias. Abandonou a carreira militar

como tenente-coronel e se dedicou à administração pública.

em silvicultura12 e seguiu as instruções no Decreto, utilizando, para o replantio, mudas

nativas da área das Paineiras e de outras áreas, como das matas virgens de Guaratiba.

Porém, não o fez “em linhas paralelas retas entre si, sendo as de uma direção

perpendiculares às de outra”. Archer optou por um replantio aleatório. Entre as espécies

plantadas incluíam-se: ipê, angelim-rosa, sapucaia, canela e pau-ferro. Lemos (2002, p.

49) salienta que documentos sobre a administração da Floresta, de 1890 a 1894,

anexados ao Arquivo Nacional no Rio de Janeiro, trazem dados sobre as “admissões dos

seis escravos tidos como os pioneiros no reflorestamento da Floresta da Tijuca”,

somente após dois anos do início do replantio, e em tempos diferentes. Archer, com

toda uma equipe – feitor, guardas das matas, operários, pessoal da conservação e reparo

dos caminhos, empregados, serventes e escravos – iniciou o processo de

reflorestamento. Cabe ainda dizer que foi criado um Horto Florestal para a produção de

mudas para o replantio dos maciços, na Fazenda “A Floresta” que pertencia a Guillaume

Midosi (LEMOS, 2002). Apesar de Archer aplicar técnicas de silvicultura, em sua

administração não se priorizou a distribuição racional de mudas, visto que essas foram

plantada sem escolha específica de lugar, sem levar em consideração fatores como

sombra ou sol. Na maioria das vezes, o plantio deixava as mudas com as raízes

expostas, colocadas diretamente nas covas, e sem proceder à aclimatação das mesmas.

Em seu último relatório, foram contabilizadas 61.852 árvores plantadas.

O replantio segue por mais treze anos (de 1875 a 1888), agora sob a

administração do Tenente-Coronel/Barão Gastão Luís Henrique Robert d’Escragnolle.

Este promove um replantio de forma mais disciplinar e metódica, utilizando-se de

técnicas mais ligadas à agricultura. As covas eram abertas em terrenos argilo-silicosos,

expostas ao tempo, para que o ar e a luz criassem um depósito de nutrientes para dar

força às raízes em seus primeiros anos. As mudas ficavam em pequenos cestos no

viveiro, até que estivessem bem aclimatadas. De acordo com Lemos, seguindo a

metodologia prescrita “[...] elas eram postas nas covas dentro dos cestos que se

desfaziam com a umidade e o tempo permitindo, dessa maneira, que a planta se

12 Evidencia-se que o Brasil tenha sido um dos primeiros países no mundo, possivelmente o primeiro da América do

Sul, a implantar a silvicultura com espécies mistas. Cabe ressaltar que a silvicultura é uma ciência dedicada ao estudo

de métodos hábeis a promover a implantação e a regeneração dos povoamentos florestais, em função não apenas de

interesses econômicos, mas também sociais, culturais e ecológicos.

adaptasse, suavemente, ao novo ‘habitat’” (LEMOS, 2002, p.51). Neste período, o

replantio foi de muda de cedro rosa, cabiúna, aroeira-do-sertão-, aroeira-do-paraná,

canela, ipê, além da introdução de eucalipto, espécie exótica à Mata Atlântica. O grupo

de trabalhadores foi dividido em grupos distintos de auxiliares: pessoal da floresta (20

homens) e pessoal da conservação (15 homens). Aos da floresta foi incumbida a

arborização, e aos da conservação, a abertura de caminhos novos através da floresta

para tratamento de árvores e para o embelezamento e paisagismo da Floresta (LEMOS,

2002). Foram 21.489 mudas plantadas na administração do Barão d’ Escragnolle.

Enfim, ao final dos períodos descritos acima, foram plantadas aproximadamente 90 mil

mudas de árvores na Floresta da Tijuca.

Muitos outros administradores passaram pela Floresta, mas na transição do

Império para a República, a Floresta da Tijuca enfrentou quase meio século de

abandono (com a mudança do regime político, como é sabido, tudo que tinha sido

projetado pelo governo precedente costuma deixar de ser prioridade para nova

administração). O período de 1894 a 1943 é considerado uma época de ostracismo, de

desencanto e abandono para a Floresta, já que ficou um bom tempo sem administrador,

passando do Ministério da Viação, para o Ministério da Saúde e, depois, para o

Ministério da Agricultura.

Ainda neste período, ocorrem obras de embelezamento da área. Foi construído o

mirante da Vista Chinesa, o mirante da Mesa do Imperador foi reformado, realizaram

melhoras na estrada de ferro no corcovado, e houve a abertura de novas trilhas, dentre

outras obras importantes. Enquanto isso, a mata replantada crescia em seu próprio

ritmo, num tempo necessário para a procriação das espécies faunísticas e o adensamento

das espécies florísticas.

No período que se segue, de 1920 a 1943, o processo de embelezamento da

Floresta continua, tornando-a um cartão de visita para as autoridades que vinham ao Rio

de Janeiro, por exemplo: o Rei Alberto da Bélgica esteve na Floresta em 1920, e

Einstein em 1925. O monumento do Cristo Redentor foi inaugurado em 1931, tendo

sido tombado pelo IPHAN em 1973 (Figura 3).

A preocupação com o embelezamento da Floresta era parte de uma política

unilateral que, deste modo, descurava de outros aspectos tais como a reintrodução de

espécies faunísticas nativas que também haviam desaparecido com o desflorestamento;

impedir a invasão da área da floresta, dentre outros. Assim, em dezembro de 1943, na

gestão de Getúlio Vargas, durante o Estado Novo, Raymundo Ottoni de Castro Maya é

nomeado para realizar projetos de requalificação da Floresta13. Castro Maya surge como

“mecenas da Floresta”, e tem como objetivo transformar a Floresta da Tijuca em roteiro

de lazer dos cariocas, melhorando os prédios e estradas:

necessário é então oferecer-se-lhes boas estradas e atrações nos pontos de

parada; donde o requisito de restaurantes bem aparelhados que por si só

constituam objetivo de uma excursão. Para os pedestres, que de certo modo

perpetuam a tradição, foram mantidas as picadas e os atalhos e preparados

outros sítios de permanência (MAYA, 1967, p.12).

O roteiro com os equipamentos de lazer, então existentes, foi pintado pelo

próprio Castro Maya, e encontra-se fixado até os dias de hoje, na área do Restaurante

Cascatinha, acima de uma das bicas (Figura 4).

13 O Presidente Vargas, e o prefeito da cidade, Dodsworth, deram total apoio e liberdade para Castro

Maya trabalhar.

Figura 3. Monumento do Cristo Redentor

Fonte: http://www.parquedatijuca.com.br

Ainda na administração de Castro Maya há uma intervenção que deve ser

destacada. Aproveitando as demolições de prédios e igrejas centenárias devido à

abertura da Avenida Presidente Vargas, Maya introduziu peças de épocas e estilos

diferentes na Floresta. Um exemplo disto foi o fechamento, com grades que foram do

Campo de Santana, da entrada da Floresta para quem vem pela Estrada da Paz. Castro

Maya contou com a colaboração do paisagista Burle Marx e do arquiteto Vlademir

Alves de Souza, possibilitando as reformas paisagísticas e arquitetônicas na Floresta.

A importância da Floresta da Tijuca reside, ao mesmo tempo, por ser uma

unidade de conservação da biodiversidade, hoje conhecida e estabelecida como

PARNA-Tijuca, em conjunto com outras florestas, e também pelo pioneirismo da

recuperação da área. Assim, a reconstituição, por reflorestamento, da cobertura vegetal

dessa área confere-lhe um caráter único, já que protege os bens naturais e culturais da

Mata Atlântica e uma parte da História do Brasil, representada por construções

imperiais, ruínas do ciclo do café, além de sítios arqueológicos. Por fim, a Floresta da

Tijuca é um exemplo de que medidas de proteção ambiental e cultural foram

implementadas desde o século XIX, trazendo benefícios à cidade.

Os esforços de reflorestamento, aliados ao processo de regeneração natural,

resultaram na floresta atual, muitas vezes chamada de floresta cultural, uma vez que

toda a intervenção humana e todas as transformações ali verificadas revelam a estreita

relação da ocupação humana com a floresta.

Trata-se aqui de uma questão importante no que concerne a algumas questões

terminológicas e teóricas em relação ao patrimônio. Em geral e para fins de distinção, a

categoria patrimônio é subdividada ou subcategorizada em patrimônio cultural

(referente àquilo que é produzido pelo trabalho humano) e patrimônio natural

(concernente àquilo que, existindo independentemente do homem, é, no entanto,

socialmente valorizado). Para além de discussões teóricas acerca da sustentação

epistemológica dessa divisão, uma vez que se algo é considerado patrimônio significa,

em suma, que se trata de algo simbolizado ou culturalizado.

A Floresta da Tijuca é, em todos os sentidos, uma floresta cultural, ou seja, uma

floresta que foi integralmente reconstituída tanto botânica quanto zoologicamente. De

mais a mais, sendo o resultado do engenho e da intervenção humana, a Floresta da

Tijuca adere ao imaginário social e, consequentemente, à memória e ao que significa ser

carioca. A questão que se coloca, tendo em vista a divisão terminológica acima

mencionada, é: enquanto bem patrimonial, a Floresta da Tijuca é patrimônio natural ou

patrimônio cultural? Se considerarmos que se trata de um ente florestal reconstituído,

qual seja, não natural, por ter sido planejado e executado a partir de políticas, legislação

e protocolos elaborados para esse fim, com base no conhecimento científico da época,

não há dúvidas de que se trata de um patrimônio cultural. Assim podemos considerá-la

uma floresta antropogênica, uma vez que resultou diretamente de um ato de cultura.

Trata-se, sem dúvida, de um bem patrimonial que supera a dicotomia cultural-

natural que vem sendo aplicada ao patrimônio. Levando-se, ainda, em conta que o termo

patrimônio refere-se, quase simultaneamente, a dois sentidos diversos, conquanto

associados – um, o patrimônio instituinte ou valor em-si ou valor de uso, e outro,

patrimônio instituído, ou aquele que, sendo reconhecido por uma comunidade como

relevante, passa a ser igualmente reconhecido e protegido por órgãos estatais e

paraestatais, investido, então, de valor de troca -, consideramos que a Floresta da Tijuca

se torna patrimônio a partir do momento em que, sendo objeto de preocupação do poder

público, a área antes devastada é reflorestada e, posteriormente, embelezada. É

justamente esse conjunto de mediadas que, a rigor, criam a Floresta da Tijuca, que a

torna em bem patrimonial, tanto em termos jurídico-administrativos, quanto no que

concerne à aderência da população.

3. Floresta vazia – ‘parque sem vida’!

Na seção anterior dizíamos que, no período de 1894 a 1943, a Floresta cresceu

sem interferência humana, o que foi importante para seu adensamento, tanto das

espécies florísticas, quanto das faunísticas. Sabemos que todo o trabalho de recuperação

da Floresta da Tijuca tem sua importância, e seu peso frente às atividades precursoras de

preservação de áreas naturais, e que, além disso, foi a partir de sua recuperação, que foi

possível iniciar o resgate da fauna local. Porém, muitos animais extintos pela

degradação ambiental, nunca retornaram à área. Vieira destaca que:

a fauna atual do Parque tem um número baixo de espécies quando

comparada a áreas mais preservadas de Mata Atlântica. No entanto,

graças à migração da avifauna e aos projetos de reintrodução, cerca de

30 espécies de mamíferos, 100 de aves, vários répteis, anfíbios e

borboletas voltaram ao Parque (VIEIRA 2010, p.21).

Desta forma, identificamos que a reconstrução da cobertura vegetal propiciou o

"retorno", em parte, da fauna local (afinal, a reconstituição da cobertura vegetal

proporcionou a atração de algumas espécies terrestres e aéreas); e algumas outras,

necessitaram ser reintroduzidas14, resultado de uma ação ambiental realizada a partir de

processos científicos.

A International Union for Conservation of Nature (IUCN) define como

reintrodução a tentativa de restabelecer uma espécie numa área na qual ela já fora

comum, mas encontra-se extinta atualmente. De acordo com o Instituto Chico Mendes

de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), um dos maiores problemas para a

conservação da biodiversidade são as florestas vazias que parecem intactas à primeira

vista e, no entanto, apresentam lacunas na cadeia alimentar, por faltarem inúmeros

representantes da fauna, o que leva à interrupção de vários processos ecológicos, como

dispersão de sementes de grandes árvores, regulação de populações faunísticas e

ciclagem de nutrientes.

Considerando que ecossistema é qualquer comunidade de seres vivos, cujos

processos vitais interagem entre si e com o ambiente físico e químico em uma dada

área, e que por muitos anos a preocupação dos responsáveis pelo projeto de

reconstrução da área estava centrada somente em reflorestar a área da Floresta da

14 A reintrodução de espécies teve como ponto de partida o estudo de mestrado de Bruno Cid, com apoio da UFRJ,

UFRRJ, Rio Zoo e PARNA-Tijuca.

Tijuca, podemos avaliar que acabaram por aparecer falhas no processo de reconstituição

da floresta. A principal falha, em nosso entender, consistiu no fato de, embora tenha

sido bem sucedido o reflorestamento, este deu-se unilateralmente, uma vez que não

houve a mesma sistemática no que tange a reintrodução de espécies zoológicas. Esta

falha resulta em que, do ponto de vista ecossistêmico, a Floresta da Tijuca seja

caracterizada como uma floresta vazia, ou seja, que não funcione adequadamente por

lhe faltar inúmeros elementos que, numa floresta integral, contribuem para manter o

equilíbrio ecológico, o que faz com que a biodiversidade seja bastante afetada.

Ademais, tanto do ponto de vista ecossistêmico, quanto patrimonial, essa falta de

elementos termina por produzir o que Otávio Barros15, morador da comunidade do Vale

Encantado16, chamou de ‘parque sem vida’. O termo ‘parque sem vida’, aplicado ao

conjunto do PARNA-Tijuca, constitui um desafio teórico para pesquisas, sejam

ecológicas, sejam patrimoniais. De fato, algumas espécies de fauna e flora estão

retornando ao seu lugar, mas ainda assim, há um vazio de indivíduos que antes faziam

parte do ecossistema.

4. A Floresta cultural: patrimônio paisagístico mundial

O que agora é Parque, antes fora uma floresta habitada, desvastada,

posteriormente reflorestada e, com a sua elevação a Parque Nacional, musealizada. Com

o reflorestamento, conforme vimos, a Floresta foi embelezada e preparada para receber

visitantes. Vieira (2010, p.22) destaca que, “ainda no século XIX, o substituto do Major

Archer, o Barão d’Escragnolle, levou a cabo o arremate paisagístico da área,

transformando-a em um belo parque para uso público, com locais de lazer, fontes e

lagos”, e, já no período republicano sob o Estado Novo de Vargas, Castro Maya

continuou com o projeto de embelezamento, desta vez, tendo como objetivo criar áreas

e ambiências para o lazer. O PARNA-Tijuca já nasce dando ênfase a um dos objetivos

de um parque, porquanto estava quase que totalmente organizado para o deleite e

recreação. Claro que a função precípua deste Parque é proteger a maior floresta urbana

replantada do mundo, com uma extensão total de 3.953ha de Mata Atlântica. A função

15 Otávio Barros tem se sobressaído como liderança na comunidade. 16 Parte da pesquisa-tese, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio (PPGPMUS) –

UNIRIO/MAST, está sendo realizada em campo, no Vale Encantado, comunidade do entorno do PARNA-Tijuca, no

Alto da Boa Vista.

de parque de visitação e recreação continua sendo, entretanto, o que mais atrai os

visitantes, prova disso é que o PARNA-Tijuca vem sendo considerado o Parque mais

visitado do Brasil, recebendo em torno de três milhões de visitantes por ano.

A diversidade natural, ainda em regeneração, principalmente no que tange à

fauna, é sem dúvida um dos atributos importantes para tornar a área um Parque

Nacional. Além disso, a ocupação humana ao longo de quatro séculos disponibilizou

uma herança histórico-cultural, constituindo um acervo a céu aberto que precisa ser

preservado. Assim, a área passa ser reconhecida, em 1961, como patrimônio a ser

preservado, já que a Floresta da Tijuca acompanha a história da cidade do Rio de

Janeiro desde a colônia e o Império. Seu tombamento, em 1967, indica o cuidado do

estado em relação a essa área natural-cultural, como um todo, e lhe confere, por meio do

instrumento legal do tombamento, o status de patrimônio protegido.

Em 2012, o Rio de Janeiro passa a ser a primeira cidade do mundo a ter

reconhecido o valor universal da sua paisagem urbana com sua candidatura a

Patrimônio Mundial, com o projeto "Rio de Janeiro: Paisagens Cariocas entre a

Montanha e o Mar", tendo recebido o título concedido pela Organização das Nações

Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) de Paisagem Cultural17. Esta

paisagem está integrada por quatro componentes localizados desde a Zona Sul do Rio

de Janeiro até a porção oeste da cidade de Niterói. Os Setores Floresta da Tijuca, Pretos

Forros e Covanca do PARNA-Tijuca; Setor Pedra Bonita e Pedra da Gávea do PARNA-

Tijuca; Setor Serra da Carioca do PARNA-Tijuca e Jardim Botânico do Rio de Janeiro,

dentre ouros, fazem parte desta paisagem cultural, agora uma categoria patrimonial

reconhecida e patrocinada pela UNESCO.

A certeza de que o PARNA-Tijuca é um patrimônio, e que seu reflorestamento

ratifica e valoriza as políticas e ações de proteção e preservação, por meio de uma

interação única entre a cultura e a natureza, lhe confere o direito de integrar a Paisagem

Cultural, conforme destaca o IPHAN;

a paisagem cultural da cidade do Rio de Janeiro é única no mundo e

representa um exemplo excepcional dos desafios, das contradições e

da criatividade do povo brasileiro. A harmonia entre a paisagem

17 A partir de 1992, o conceito de paisagem cultural é adotado pela Unesco e incorporado como uma nova tipologia

de reconhecimento dos bens culturais.

natural e a intervenção do homem, incluindo o uso e as práticas em

seu espaço e suas manifestações culturais, tornou o Rio de Janeiro

internacionalmente conhecido (IPHAN)18

5. Considerações finais

A Floresta da Tijuca, enquanto unidade, e o PARNA-Tijuca, enquanto um todo,

apresentam, no que concerne à pesquisa, questões que interessam a biologia, ecologia,

museologia, administração, urbanismo, sociologia, dentre outras. Em nosso caso,

enfocamos como objeto de estudos patrimoniais e sobre políticas públicas.

A principal questão que a Floresta da Tijuca nos propõe concerne ao seu estatuto

patrimonial. Pode parecer óbvio que, tendo sido reconhecido e tombado como

patrimônio, não restam dúvidas quanto a ser um patrimônio carioca e nacional.

Contudo, como dissemos anteriormente, há uma questão relativa à tipologia patrimonial

em que se enquadra tanto a Floresta quanto o PARNA-Tijuca. Não está sob análise o

conjunto do PARNA-Tijuca, dada a sua diversidade e sua complexidade. Mas no que

concerne à Floresta da Tijuca, como vimos, o questionamento se justifica. Trata-se

efetivamente de um patrimônio natural? Em nossa concepção, não. Trata-se, por sua

história, de um patrimônio cultural, ainda que seja uma floresta.

Também constitui questão relevante a afirmação de que, em seu todo e

comparada a florestas naturais, teríamos um exemplo de floresta vazia ou sem vida.

Obviamente, estritamente falando, a floresta nem é vazia, nem tampouco morta. E, no

entanto, dado o seu desequilíbrio ecossistêmico, provoca essa percepção de que algo

nela falta e falha. E se tomarmos essa floresta como uma amostra viva, ou uma floresta

em exposição, essa sua característica de ser vazia ou morta nos permite relacioná-la ao

conceito de memória morta de que fala Castoriadis, morta porque, de certa forma e por

conta de determinados processos sócio-políticos e até mesmo formativo-educativos,

ocorre uma decomposição da cultura levando a “perda de uma relação substancial [...]

com o seu passado, com sua história [...]” (CASTORIADIS, 1983, p. 304). Com todas

as ressalvas, podemos dizer que se trata de uma floresta de memória morta, justamente

porque nada tem a ver com seu passado e, igualmente, dado ter-se tornando um

18 Disponível em <http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/45/>. Acesso em 10 de setembro de 2016.

espetáculo de si mesma e da mata atlântica que um dia fora, por ter sido erigida em

objeto de culto e espaço de recreação.

Em que pese tudo isso e visto em sua historicidade, observa-se que o Parque,

além de contribuir para um relativo equilíbrio ecossistêmico, também impacta tanto as

populações do seu entorno, quanto a dinâmica do meio ambiente. Enfim, deve-se

registrar o empenho de transformar uma paisagem natural degradada por monoculturas,

em um Parque Nacional, patrimônio a ser salvaguardado para as gerações futuras,

mediante o uso racional processos científicos voltados para a proteção da natureza.

Referências

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tese sobre a Comunidade do Vale Encantado. Rio de Janeiro, 2015.

BELIANI, E. As contribuições da museologia para a preservação e musealização do

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Estado do Rio de Janeiro/PPG-PMUS/MAST, Rio de Janeiro, 2012.

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Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9985.htm>. Acesso em 12

de agosto de 2016.

CASTORIADIS, Cornelius. Socialismo ou barbárie. O conteúdo do socialismo. São

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IPHAN. Bens Móveis e Imóveis Inscritos nos Livros do Tombo do Instituto do

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Iphan. Disponível em <http://portal.iphan.gov/pagina/detalhes/45>. Acesso em 7 de

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