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Um Sonho a Mais

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São Paulo/SP

CEP 05005-000

UM SONHO A MAIS MEIRELES, Fernanda

2ª Edição

Janeiro de 2013

ISBN: 978-85-7961-477-2

Todos os direitos reservados.

É proibida a reprodução deste livro com fins comerciais sem prévia

autorização da autora.

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Eu tinha um sonho e toda minha vida planejada de

forma a não falhar. Tinha um bom amigo que entendia

minhas necessidades e nunca havia me decepcionado. Até

que conheci alguém, apaixonei-me por esse alguém e

acreditei firmemente em tudo o que dizia.

Decepcionei-me.

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al posso acreditar que as férias de inverno já

acabaram. O último ano do segundo grau deveria ser o

melhor de todos, mas para mim até agora foi um completo

desastre.

O primeiro semestre prometia ser maravilhoso, afinal,

somos as únicas duas turmas da Escola Estadual Arabella

Fernandes que tem autorização para modificar o uniforme,

escolhemos um mascote fofo e personalizamos a camisa

escolar. Eu estava ansiosa e orgulhosa por finalmente fazer

parte dos formandos.

Como eu poderia imaginar o que me esperava?

Moro com minha mãe em uma casa pequena alguns

quarteirões da escola. Nasci e cresci naquela casa e minha

mãe é uma das melhores costureiras da região. Desde que se

separou do meu pai, quando eu era um bebê, vivemos

sozinhas e nos ajudando mutuamente. Não tenho notícias

dele faz muito tempo, lembro de pouca coisa daquele breve

período antes que decidisse trocar sua presença por algumas

curtas cartas que eu, ingenuamente, ansiava fervorosamente

todo o mês. Faz uns sete anos que não recebo nem um postal

da parte dele. Não posso dizer que tenho raiva do meu pai,

embora eu tenha sentido muita sua falta quando eu era mais

nova, só gostaria de entender melhor o porquê de nos

abandonar.

Minha mãe é tudo para mim, é amiga, conselheira e

confidente. Uma verdadeira mãezona.

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Entrei no Colégio Estadual Arabella no 5° ano do

ginásio, sempre fui baixinha e até os 13 anos meu apelido era

“palito de dente” ou “cabo de vassoura” e até mesmo

“tábua de passar”, não foram anos muito bons, mas a partir

dos 14 anos as coisas começaram a melhorar. Claro que não

virei nenhuma modelo, mesmo porque não passei dos 1,60 m

de altura, mas comecei a tomar corpo. Continuei magrinha,

entretanto o busto e o quadril, assim como minhas pernas,

começaram a seguir o típico padrão brasileiro. Ou seja, os

apelidos pararam e os rapazes começaram a puxar todo o

tipo de conversa. Não que eu estivesse interessada em algum

deles, porque tenho um grande objetivo na vida: passar no

vestibular.

Assim que entrei no segundo grau comecei a me

dedicar nas escolhas para a faculdade, procurei cursos

interessantes e universidades mais próximas de casa. Foi

nessa época que conheci o Dinho que tinha acabado de entrar

na escola e ficou na minha classe. Lembro até hoje quando

aquele gigante todo desengonçado passou pela porta estreita

da sala, o garoto devia ter 1,90 de altura, fez piada a aula

toda e assim que nos cumprimentamos começamos a

conversar. Antes do intervalo, chegamos a uma mesma

conclusão: poderíamos ser bons amigos.

Dinho morava no centro da cidade, o que dificultava

nos encontrarmos fora da escola, mas íamos para todo canto

juntos, ríamos e conversávamos o tempo inteiro. Minha mãe

o conheceu e cismou que ele gostava de mim, claro que

desdenhei. Aquilo parecia completamente impossível e

inviável, nunca pensei no Dinho dessa forma, mas cheguei a

comentar sobre o assunto achando que ele faria graça. Seria

pouco dizer que fiquei surpresa quando ele ficou sério e

perguntou o clássico “mas se fosse verdade?”

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Simplesmente me apavorei.

Fiquei completamente sem reação, queria muito

acreditar que se tratava de mais uma de suas brincadeiras,

não conseguia me imaginar como sua namorada, muito

menos viver sem sua amizade. Pensei muito sobre o assunto,

depois nos sentamos e conversamos abertamente. Expliquei

que mesmo se gostasse dele “daquele jeito”, não teria tempo

para namoros por causa do vestibular e assim lhe assegurei

que eu não namoraria nem com Brad Pitt se me pedisse, nós

rimos e voltamos a assuntos menos delicados.

Nunca mais falamos sobre isso. Ufa! Por um tempinho

as coisas ficaram meio estranhas entre a gente, mas logo

tudo se normalizou.

Depois de todo aquele papo estranho com Dinho,

decidi que certos assuntos não deveriam ser tratados com ele,

assuntos como Mateus.

Era muito difícil receber a visita de Dinho em casa,

então se eu não falasse nada, ele jamais saberia da existência

do Mateus, a minha paixão platônica. Aquele garoto que

você fica horas no portão de casa só para ver passar, ou fica

amiga da sua irmã só para ter uma desculpa de ir a casa dele

e fazer dela sua informante. Nunca troquei mais que duas

palavras com ele, mas do mesmo jeito que eu ficava no

portão só para dar uma olhada nele, Mateus sempre passava

na frente da minha casa e quero muito acreditar que era só

para me ver. Às vezes a gente até se encarava, nos

cumprimentávamos de forma rápida, com um aceno de

cabeça ou um discreto sorriso, mas nunca paramos para

conversar.

Em junho foi o meu aniversário de 17 anos, nunca

gostei de festas e minha mãe também nunca insistiu. Esse

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ano ela fez um lindo vestido de presente e tudo parecia ótimo

até o Dinho ter aquela ideia infeliz.

No início do ano ele descobriu um jeito de entrar na

despensa da escola e durante todo semestre foi pegando

alguns engradados de doces ou de suco e levava para nosso

esconderijo. O Arabella é um colégio imenso, no terceiro

andar há muitas salas desocupadas e em uma delas achamos

uma pequena salinha escondida e abandonada. Dinho

arrumou a chave e fizemos dali nosso refúgio. Arrumamos

até uma TV. Sempre que passava o jogo do Brasil ou alguma

coisa que não podíamos perder, íamos para o esconderijo e

ninguém nunca sabia onde estávamos.

Na semana do meu aniversário Dinho teimou que

entraria na despensa para pegar a enorme lata de doce de

leite como meu presente. Tentei convencê-lo que era idiotice

e que aquilo poderia acabar mal, mas ele me ouviu? Não!

Acontece que a diretora, já desconfiada dos estranhos

sumiços de alguns itens do estoque, mandou o vigia ficar de

olho na despensa e não deu outra. Dinho foi pego em

flagrante e suspenso por um tempão. Para piorar, a mãe dele

ficou sabendo que o doce era para presentear a mim e me

julgou uma má influência para seu filho, vê se pode?

Ela decidiu tirar o Dinho da escola e proibiu de nos

vermos. Como as férias estavam próximas, levou meu amigo

para outra cidade. A escola ficou insuportável, na sala os

grupos já estavam formados e fiquei completamente

deslocada.

“Graças a Deus que faltam só alguns dias para as

férias” – pensava.

Só que não foi nada do que imaginei, foram as férias

mais chuvosas e frias que me lembro e, para completar,

Mateus e sua família foram viajar. Soube por uma vizinha

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que foram para a casa de praia de um parente, sei que é

mesquinho, mas torci para que lá estivesse tão frio como

aqui.

Um mês trancada em casa, só com a companhia da

minha mãe. Claro que a amo, mas... NINGUÉM MERECE!

As aulas recomeçariam em breve e eu não sabia o que

esperar do último semestre no Arabella.

Poderia ser ainda pior?

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— om dia mãe.

— Bom dia Fabi, chegou seu cartão de confirmação

para a prova de domingo.

— Já tava na hora! Pensei que ia ter que ir lá.

— Confere para ver se está tudo direitinho... Mas e

você, minha filha, está nervosa?

— Claro que estou, mãe. Mas me sinto preparada,

estudei muito e tenho certeza que vai dar tudo certo. – dei

um beijo no rosto dela e saí para a escola.

Desde o primeiro ano, eu decidi fazer administração.

Meu sonho sempre foi ter meu próprio negócio. Fazia pré-

vestibular desde o ano anterior e naquele domingo faria a

primeira etapa do vestibular para UERJ.

Cheguei à escola em cima do horário, já que não tinha

mais a carona na bike do Dinho. Ele sempre me esperava a

duas ruas de casa, não era muito confortável sentar na barra

da bike, mas era tão gentil da sua parte desviar do seu

caminho só para me fazer companhia.

“Puxa, vou sentir falta do meu amigo!” – pensava.

Fui direto para a sala, o professor de biologia ainda não

tinha chegado e muita gente também parecia ter perdido a

hora, mas não é sempre assim no primeiro dia depois das

férias? O que me chamou a atenção foi a aluna nova que

entrou logo depois de mim. Uma menina alta e muito magra,

agarrando o fichário contra o peito. Tinha os cabelos

castanhos curtos e os olhos bem redondos e arregalados, era

uma criatura muito esquisita.

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Os meninos da minha sala eram os mesmos que

antigamente haviam colocado aqueles apelidos ridículos na

5° série. Pelos risos e burburinhos que a sala ficou fazendo,

deu para perceber que atacariam com tudo a pobre da

menina. Ela se sentou sozinha bem atrás de mim. Senti-me

na obrigação de falar com ela.

— Oi, meu nome é Fabiana, mas pode me chamar de

Fabi, e o seu?

— Oi, o meu é Melissa.

— Nossa, que nome bonito e diferente! Legal, você é

nova na cidade?

— Sou.

— Deve ser super chato entrar numa escola nova no

último semestre do último ano.

— É... Mas podia ser muito pior, a vida às vezes é uma

porcaria.

Sei que parece uma coisa estranha de se dizer, mas

pensando bem, esse é um pensamento que a maioria das

pessoas tem, embora não o expressem. Por pura curiosidade

me aproximei da sua cadeira e conversamos o tempo todo, a

aula foi uma espécie de revisão já que muitos haviam

faltado. Descobri que Melissa também tinha 17 anos e que

até recentemente morava na cidade vizinha, seu pai tinha

acabado de falecer assim, ela, a mãe e o irmão estavam

morando agora com o tio. Melissa foi transferida para o

Arabella enquanto o irmão, que tinha 18 anos e também

estava no último ano, continuou no antigo colégio. Pelo

visto, o rapaz tinha um carro e como já estava com a carteira,

ir para o colégio na cidade vizinha não era problema.

Nos demos muito bem. Melissa era uma menina

inteligente, sincera, simples e muito bacana, mas também

muito triste, às vezes ficava calada e meio distante. Na hora

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de ir embora fez questão de apresentar o irmão que vinha

buscá-la. Não queria decepcionar a menina então fui com ela

até o portão, sentamos na escada e esperamos. Demorou um

tempo até ela se levantar e sorrir apontando para a esquina.

Um Monza preto e antigo, mas bem cuidado, vinha na

nossa direção. Continuei sentada observando enquanto ela

seguia até o carro. Um garoto saiu ao seu encontro e fiquei

feliz por estar sentada, porque acredito que se estivesse de pé

cairia, era o garoto mais bonito que já tinha visto! Não tinha

absolutamente nada a ver com a Melissa, a única coisa

parecida era a altura. Tinha o cabelo bem curto e preto, olhos

castanho-amarelados e uma barba rala. Vários garotos da

escola se vangloriavam com uma coisa parecida com

barbicha de bode, mas a dele era de verdade. Aparentava ser

bem mais velho, o corpo era perfeito e o sorriso me cortou o

fôlego. Saiu do carro e foi direto falar com a irmã.

— Foi mal, Mel. O trânsito até aqui tava terrível. –

passou a mão no cabelo da irmã de uma forma muito

carinhosa, ela nem ligou.

— Tudo bem Dane, eu tava conversando com uma

colega. Vêm cá, quero te apresentar a ela.

Meu coração ficou descontrolado, levantei com um

tremendo esforço, fui ao encontro deles torcendo para não

ficar com o rosto que nem tomate.

— Essa é a Fabi, ela é da minha sala e foi muito legal

comigo hoje. Esse é o Daniel, meu irmão.

Apertamos as mãos e demos dois beijinhos no rosto,

foi incrível! Ele usava um perfume muito bom e apertou

minha mão com força, quase fiquei sem ar.

— Prazer em te conhecer. – eu disse — A Melissa

falou bastante de você. – ele me olhou o tempo todo bem nos

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olhos, antes de falar parecia estar pensando em alguma outra

coisa.

— O prazer é todo meu. Pode me chamar de Dane.

Melissa continuou falando como foi seu dia, mas não

conseguia escutar muita coisa, também me descobri incapaz

de parar de olhá-lo, o mais curioso era que ele também

estava me olhando. Antes que Melissa pudesse perceber,

disfarcei e voltei minha atenção para ela, mas pude sentir

que ainda era avidamente observada. Sabia que já tinha

passado da hora de ir embora e que se demorasse minha mãe

ficaria uma fera.

Pensei em me despedir, mas para minha surpresa

Melissa ofereceu uma carona, olhei para o Dane esperando

que falasse alguma coisa, mas ele apenas sorriu. Por mais

tentador que pudesse ser, minha mãe teria um troço se

chegasse em casa de carona com um adolescente.

— Que nada, eu moro aqui pertinho.

— Ah não, eu faço questão, não é, Dane?

— Claro. – ele sorria enquanto abria a porta para irmã

entrar, fez um gesto para que eu passasse também. Cruzei os

braços querendo demonstrar firmeza, mas Dane entendeu

errado.

— Não acredito que você está com medo! – ele parecia

chocado, mas também divertido.

— Não é medo! Eu só prefiro ir a pé. – passou-se um

minuto de silêncio, onde nenhum de nós dois se mexeu e só

nos encaramos, senti que ainda tinha o rosto queimando.

— Ta bem, se você prefere assim. – dane entrou no

carro, já não tão divertido, tive a impressão de que estava

aborrecido.

Despedi-me da Melissa e esperei o carro arrancar. Fui

andando devagar até em casa pensando se não deveria ter