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UMA REFLEXÃO SOBRE O GÊNERO NOTÍCIA … palavra e a reconheça como função social e, a partir...
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UMA REFLEXÃO SOBRE O GÊNERO NOTÍCIA IMPRESSA: TRABALHANDO COM SEQUÊNCIA DIDÁTICA
A PARTIR DA CONSTRUÇÃO DE UM MODELO DIDÁTICO DE GÊNERO1
Marione Fátima Picini CAREGNATTO2 (PDE – 2008/2009)Terezinha da Conceição COSTA-HÜBES3 (UNIOESTE – Cascavel)
RESUMO: A linguagem, ao longo da História, já foi compreendida como
representação do pensamento, instrumento de comunicação e, hoje, é reconhecida
como forma de interação. Sendo o homem um ser social, que se utiliza da linguagem
para estabelecer interação com o meio e com o outro, faz-se necessário, cada vez
mais, compreendê-la, produzi-la e interpretá-la. Para isso, nada melhor do que o
reconhecimento do lugar de sua materialização: nos gêneros discursivos ou textuais.
Porém, essa “nova” maneira de compreender a linguagem ainda não está totalmente
esclarecida para muitos educadores, inclusive para os que trabalham com a língua.
Até pouco tempo, havia a crença de que tipos textuais eram equivalentes aos gêneros
textuais: trabalhava-se de maneira abstrata apenas a organização interna dos textos,
desconsiderando todo o seu contexto de produção. Tentando romper com esta visão,
as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná – DCE – (PARANÁ, 2008)
estimularam os professores da rede a buscarem novas metodologias, norteando-os e
embasando-os teoricamente, de forma substancial, na abordagem enunciativo-
discursiva de Bakhtin (1999, 2003). Faz-se necessário, então, abrir espaço, nas salas
de aula, para que os gêneros entrem, sejam trabalhados, reconhecidos e
sistematizados. Objetivando tornar o gênero Notícia Impressa, da esfera jornalística,
mais próximo do educador e do aluno, propomos um encaminhamento metodológico
em forma de Sequência Didática (SD), após a elaboração de um Modelo Didático de
Gênero (MDG). Trabalhar um gênero textual exige estudo e pesquisa que propiciarão
o reconhecimento e o uso adequado dos conteúdos trabalhados, minimizando parte
das dificuldades enfrentadas no ensino da Língua Portuguesa.
PALAVRAS CHAVES: Gênero discursivo ou textual. Notícia Impressa. Modelo
Didático de Gênero. Sequência Didática.
1 Artigo Final elaborado como um dos requisitos necessários à conclusão do PDE - Programa de Desenvolvimento da Educação. Parte deste artigo foi apresentado no XIX CELLIP e publicado nos Anais do XIX Seminário do CELLIP, Cascavel: EDUNIOESTE, 2009. ISSN: 2175-25402 Profa. do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE – 2008/2009, do Colégio Estadual “Dr. Eduardo Virmond Suplicy” - EFM, pertencente ao NRE de Francisco Beltrã[email protected] 3 Profa. Dra. do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado em Letras e do Curso de Letras da Unioeste – Campus de Cascavel. [email protected]
ABSTRACT: Throughout History, the language has already been a communication
tool, representation of feelings and, today, is understood as an interaction form. As the
human being is considered a social being that uses the language to establish
interaction with the social environment, with different instruments and with other
people, it is necessary to understand it, to produce it and to interpret it. For that, the
best thing to do is the recognition of its materialization place: in the discursive or
textual genre. However, this "new" way to understand the language is not still totally
explained for many educators, including those that work with the language. Some time
ago, there was the belief that textual types were equivalent to the textual genres: the
intern organization of the texts was done in an abstract way, disrespecting its
production context. Trying to change this point of view, The Paraná State DCEs (2008)
motivated the public teachers to search new methodologies, orientating and giving
them methodological directions, in a substantial way, in the enunciative discursive
approach of Bakhtin (2003). So it is necessary to open space in the classrooms for
those genres to enter and to be worked, recognized and systematized. Aiming to turn
the genre Printed News, from the journalistic sphere, closer to the educator and to the
student, this work intends a methodological direction in form of Didactic Sequence,
after elaboration of a Didactic Model of Genre. To work a textual genre demands study
and research, and certainly, it will propitiate the recognition and the appropriate use of
the worked contents, minimizing part of the difficulties faced in the teaching of the
Portuguese Language.
KEYWORDS: Textual Discursive Genres. Printed News. Didactics Model of Genre.
Didactics Sequence.
1 INTRODUÇÃO
A sociedade espera que a escola, sendo uma instituição legalmente
responsável por ensinar, propicie a formação dos alunos para que os mesmos
enfrentem, com sucesso, os desafios que a sociedade lhes impõe. Mas, para que isso
ocorra, faz-se necessário, também, que os profissionais da educação, em especial os
professores de Língua Portuguesa, sejam orientados para a efetivação de uma
proposta de trabalho que aponte estratégias de como trabalhar com a língua,
garantindo, ao aluno, os domínios necessários para sua interação social. O que se
pretende, na realidade, é encontrar resposta ao seguinte questionamento: qual o
encaminhamento metodológico capaz de garantir uma exploração significativa da
língua, tendo em vista sua funcionalidade?
Analisando os textos produzidos pelos alunos, tanto do Ensino Fundamental
quanto do Ensino Médio, torna-se difícil, muitas vezes, reconhecer o gênero
trabalhado, bem como as sequências discursivas (narrativas, argumentativas,
descritivas, injuntivas ou expositivas) que estruturam internamente o texto. Ao
reorganizar os textos com os alunos – tarefa nem sempre fácil, mas sem dúvida,
indispensável – os resultados normalmente não são os desejados por nós,
professores de Língua Portuguesa. Percebemos, em muitos casos, repetições de
ideias ou de palavras, inferências que fogem ao tema proposto, frases “soltas” ou mal
elaboradas, dificuldades ao pontuar/acentuar e, ainda, claramente observamos que o
gênero solicitado raramente é contemplado na produção. Mesmo após orientações -
individualmente ou em grupo - em seu próximo texto, algumas dessas “falhas” ainda
poderão ser percebidas, mostrando a falta de domínio da língua falada em situações
de uso.
Ansiosos por um resultado mais satisfatório - imediato - poucas vezes paramos
para responder aos seguintes questionamentos: Por que os alunos apresentam tantas
dificuldades ao produzir um texto? Como nós, enquanto professores da língua,
poderemos contribuir um pouco mais para que tais dificuldades sejam dirimidas? É
possível, mesmo esse aluno estando nas séries finais do Ensino Fundamental ou
mesmo do Ensino Médio, ainda ajudá-lo? Faz-se necessário, então, encontrar novas
metodologias para que o aluno sinta-se como parte integrante da língua, como sujeito
da palavra e a reconheça como função social e, a partir dela, aperfeiçoe sua escrita
tornando-se, de fato, agente em sua interlocução. E, para isso, nada melhor que o
trabalho com gêneros textuais, pois é neles que a língua viva se materializa,
organizando os enunciados.
Na sala de aula, dentre os diversos gêneros trabalhados, das mais variadas
esferas, faz-se pertinente que entendamos, mais detalhadamente, quais textos
aparecem no suporte jornal. Saber denominá-los, reconhecer a função social de cada
um, sua temática e sua estrutura composicional são algumas das interpretações
necessárias no trabalho com gêneros da esfera jornalística. Por isso, selecionamos,
para esta pesquisa, em particular, a “notícia impressa”, sobre a qual pretendemos
apontar algumas definições e apresentar um encaminhamento didático-metodológico,
com o intuito de auxiliar o professor (e, consequentemente, o aluno) a trabalhar
melhor com a língua, por meio de um gênero textual.
Por que essa preocupação? Para mostrar que, assim como outros, os gêneros
da esfera jornalística e, especificamente a notícia, modulam os enunciados,
conferindo às enunciações diferentes cargas ideológicas que, de alguma maneira,
interferem decisivamente em nosso modo de pensar, de entender e de interpretar os
fatos que ocorrem na sociedade. Isso faz com que reflitamos sobre o enfoque dado,
na sala de aula, à notícia impressa, em razão de conhecermos uma prática de escrita
voltada, na maioria das vezes, para o exercício de escrever, desvinculado de sua
função social, sem considerar, portanto, os gêneros como o lugar onde a linguagem
se materializa.
Devido ao fato de o aluno ter poucas leituras e estar alheio aos acontecimentos
corriqueiros e atuais, ou pela própria imaturidade, não percebe, na maioria dos casos,
a real intencionalidade da notícia impressa e as estratégias discursivas utilizadas para
isso. Normalmente o texto – e em especial o texto impresso em jornal – passa
despercebido por eles.
Todavia, acreditamos que, na escola, a representação do gênero, para o aluno,
deve ser em relação ao seu funcionamento nas práticas de linguagem de referência,
devendo, obviamente, ser levada em conta a “decisão didática que visa a objetivos
precisos de aprendizagem, que são sempre de dois tipos: trata-se de aprender a
dominar o gênero [...] e, em segundo lugar, de desenvolver capacidades que
ultrapassem o gênero”. (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004, p. 80), tornando-as acessíveis
a todos. Esse é o nosso propósito ao selecionar a notícia impressa como objeto de
estudo, sobre o qual discorremos nesse texto, apresentando uma proposta de
trabalho organizada segundo a metodologia da Sequência Didática (SD), conforme
propõe Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) e adaptações de Costa-Hübes (apud
AMOP, 2007a) e Costa-Hübes (2008).
2 JUSTICANDO O PROPÓSITO INVESTIGATIVO
O estudo com gêneros torna-se a base dos trabalhos para o interacionismo
sócio-discursivo, que os reconhece como ferramenta para o ensino da Língua
Portuguesa, a fim de mediar e materializar o enunciado. Pela acumulação de textos e
de signos já cristalizados, a linguagem efetua-se na interação e cada ser humano
participa das avaliações sociais, aplicando critérios, julgando a pertinência do agir dos
outros em relação aos mundos representados.
Segundo Bronckart, a linguagem “confere às organizações e atividades
humanas uma dimensão particular, que justifica que sejam chamadas de sociais”
(BRONCKART, 2003, p. 31). Consequentemente, na e pela avaliação das dimensões,
o sujeito se constrói como agente, apropriando-se “das capacidades de ação, dos
papéis sociais e de uma imagem sobre si, isto é, das representações de si mesmo
como agente responsável por sua ação” (BRONCKART, 2003, p. 44). Dessa forma,
ao nos comunicar, fazemos uso de um gênero textual mais adequado para aquele
momento – visto que a língua não existe isolada, mas inserida em contextos reais de
uso.
Nesse sentido, a língua,
[...] é tomada como uma atividade sociointeracionista desenvolvida em contextos comunicativos historicamente situados. Assim, a língua é vista como uma atividade, isto é, uma prática sociointerativa de base cognitiva e histórica. (MARCUSCHI, 2008, p. 61)
Por isso, como atividade interativa, estrutura o conhecimento de cada um nos
textos socialmente produzidos. E se todo texto materializa-se em forma de um
gênero, então, tudo o que produzimos (oral ou escrito) será gênero.
O conceito de gênero, desde Aristóteles, esteve praticamente confinado à área
dos estudos literários e à classificação tradicional que os dividia em três: o lírico, o
épico e o dramático. Em meados do século XX, o círculo de Bakhtin fez uma releitura
da noção aristotélica de gêneros, fazendo uma distinção entre os mesmos,
chamando-os de “primários” (ou livres) quando são construídos na comunicação
verbal simples ou espontânea, portanto, originários de esferas sociais que lidam com
o discurso do cotidiano; e de “secundários” (padronizados) aqueles organizados de
forma mais complexa, como é o caso dos gêneros da esfera literária ou da esfera
jurídica, por exemplo. No entanto, vale destacar que cada esfera social organiza e
utiliza diversos tipos de enunciados (orais ou escritos) que ora se identificam com
gêneros primários, ora com os secundários, cujas características são mais ou menos
estáveis.
Os gêneros textuais tornam-se a base de estudos do interacionismo sócio-
discursivo, que o adota como ferramenta para o ensino da Língua Portuguesa, a fim
de mostrar que a nossa língua é viva, é social, materializando-se em enunciados
concretos que, por sua vez, são organizadores dos gêneros.
Dessa forma, ao nos interagirmos com o(s) outro(s), fazemos uso da língua
que se revela no gênero mais adequado para aquele momento – visto que a língua
não existe isolada, mas reclama um contexto, uma interpretação participativa,
diversa e integradora. Isso significa dizer que os gêneros textuais são formas de
dizer sócio-historicamente construídas, provenientes das necessidades produzidas
em diferentes lugares sociais da comunicação humana, pois produzimos, utilizamos
e nos deparamos diariamente com inúmeros gêneros que se fazem presentes,
atendendo a diferentes necessidades de interação.
Compreendidos dessa forma, questionamos: por que é importante conhecer
os gêneros que se configuram em nossa sociedade?
Baltar considera que
conhecer os gêneros textuais, presentes no intertexto da sociedade letrada contemporânea, com suas configurações contextuais e cotextuais, é condição necessária para desenvolver a competência discursiva dos usuários de uma língua materna (BALTAR, 2004 p.43).
Nesse sentido, Rojo salienta que “a partir das incorporações dos PCN de
Língua Portuguesa houve necessidade de apropriar-se dos gêneros como objetos
de ensino” (ROJO, 2004, p.11), já que a escola não tem essa tradição de trabalho
com a linguagem. Ao contrário, na maioria das vezes, deparamo-nos ainda com um
ensino estruturalista da língua, o qual se sustenta na necessidade de falar e
escrever corretamente. Compartilhando desse pressuposto teórico, as DCE orientam
aos profissionais da língua e esclarecem:
O gênero, antes de construir um conceito, é uma prática social e deve orientar a ação pedagógica com a língua. [...] O trânsito pelas diferentes esferas de comunicação possibilitará ao aluno uma inserção social mais produtiva no sentido de poder formular seu próprio discurso e interferir na sociedade em que está inserido. (PARANÁ, 2008, p.19).
Segundo Dolz e Schneuwly, numa perspectiva bakhtiniana, “todo gênero se
define por três dimensões essenciais: 1) os conteúdos; 2) a estrutura; 3) as
configurações específicas das unidades da linguagem” (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004,
p.52). Portanto, os autores sugerem, a partir da elaboração e das experimentações,
trabalhos planejados em forma de Sequências Didáticas (SD), cujos objetivos se
adaptem “às capacidades e às dificuldades dos alunos nela engajados” (DOLZ e
SCHNEUWLY, 2004, p. 53).
Ter essa percepção é fundamental para que, na ansiedade de trabalhar com
gêneros na sala de aula, não se caia apenas na sua normatização enquanto forma,
estrutura, produto, no que Rojo define como “pedagogia transmissiva das análises
estruturais e gramaticais que dissocia a língua de sua realidade social” (ROJO,
2004, p.35). Nesse sentido, faz-se necessário “valorizar a reflexão sobre a língua,
saindo do ensino normativo para um ensino mais reflexivo” (MARCUSCHI, 2008,
p.55), favorecendo ao falante ou a quem escreve que “deve fazer-se entender e não
explicar o que está fazendo com a língua” (MARCUSCHI, 2008, p.77).
Assim, ao dominar gêneros também se age politicamente, por isso a
necessidade de a escola apresentar e trabalhar, por meio da leitura e da escrita,
uma variedade de gêneros para que os alunos sejam capazes de produzir aquilo
que a sociedade solicita. Se os gêneros estão presentes em todas as atitudes que o
sujeito toma, como a linguagem, fazendo parte de seu cotidiano, reforça-se a
necessidade de dominá-los, embora “nem sempre temos consciência dos gêneros
que usamos” (BONINI, 2003, p. 67).
Dolz e Schneuwly, amparados pelo interacionismo sócio-discursivo, deixam
claros os propósitos do trabalho com os gêneros:
- prepará-los para dominar a língua em situações variadas, fornecendo-lhes instrumentos eficazes;- desenvolver nos alunos uma relação com o comportamento discursivo consciente e voluntário, favorecendo estratégias de auto-regulação;- ajudá-los a construir uma representação das atividades de escrita e de fala em situações complexas, como produto de um trabalho e de uma lenta elaboração. (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004, p.49)
Diante de tais argumentos, ressaltamos a necessidade e a importância de se
adotar o gênero como objeto de estudo e de ensino da língua, reconhecendo-o
como materialidade linguística representativa de diferentes necessidades
interacionais. Assim, se é objetivo da escola ensinar ao aluno a interagir, em
diferentes situações sociais, faz-se necessário ampliar seu repertório linguístico, a
fim de tenha condições de organizar seu discurso para diferentes fins. Nesse
sentido, só o trabalho com os gêneros poderá garantir esse olhar mais amplo para o
uso efetivo da língua.
3 O TRABALHO COM OS GÊNEROS NA ESFERA ESCOLAR
Embora se reconheça, teoricamente, a existência do gênero e da importância
de tomá-lo como objeto de ensino nas aulas de Língua Portuguesa, ainda não está
bem claro para todos os professores o exercício da transposição didática, isto é, o
que fazer com toda essa teoria. Na tentativa de acertar, muitos reduzem o trabalho
com o texto em pretextos para perpetuar as atividades estruturalistas com poucas ou
sem estabelecer nenhuma relação com uma situação real de interação.
Apesar das DCE (PARANÁ, 2008) sugerirem o trabalho com os gêneros como
objeto de aprendizagem e de ensino, a insegurança por parte de alguns professores
em reconhecer e definir determinado gênero vem se destacando, o que se justifica
pela própria especificidade de cada gênero. Mas deve-se ter claro que o gênero,
antes de construir um conceito, é uma prática social e deve orientar a ação
pedagógica com a língua, levando em consideração o discurso que se materializa nas
diferentes esferas sociais. “O trânsito pelas diferentes esferas de comunicação
possibilitará ao aluno uma inserção social mais produtiva no sentido de poder
formular seu próprio discurso e interferir na sociedade em que está inserido”.
(PARANÁ, 2008, p.19). Dentre as inúmeras esferas, destacamos a jornalística, por
apresentar um discurso muito presente no nosso dia a dia, revelado em sua
diversidade de gênero, tais como editorial, artigo de opinião, reportagem, notícia,
charge, classificado, dentre outros. Para garantir um estudo mais detalhado,
selecionamos o gênero notícia impressa, para efetuarmos algumas análises.
Por que o trabalho com esse gênero? O interesse se justifica pelo fato de que
o jornal está muito próximo de todos os cidadãos e, geralmente, as notícias são bem
escritas, porém, mesmo assim, é comum percebermos interpretações inadequadas
em relação ao fato relatado. E as situações ou inadequações são perceptíveis no
trabalho diário com os alunos, tanto do Ensino Fundamental quanto com os do
Ensino Médio que apresentam dificuldades para ler textos desse gênero.
Nesse sentido, trabalhar o gênero notícia impressa em sala de aula se torna
desafiador para o desenvolvimento da leitura e da escrita, visto que “o jornal se
configura como um mecanismo social e de linguagem” (BONINI, 2003, p. 68). Por
outro lado, sabemos que sua leitura é ação pouco realizada pela maioria dos alunos
que, muitas vezes, nem notam as variedades de gêneros presentes no jornal. Então,
torna-se importante, por meio de leituras de notícias veiculadas por órgãos variados,
favorecer a compreensão dos enfoques diferenciados e criar condições de autoria,
manifestando-se publicamente, de maneira clara, objetiva, correta, demonstrando
mais clareza sobre esse gênero e o assunto nele tratado.
Então, para desenvolvermos uma proposta de trabalho pautada em textos do
gênero notícias, trilhamos o seguinte percurso:
1- Aprofundamos conhecimentos sobre o viés que dá sustentação à teoria
dos gêneros (textuais e discursivos), tendo em vista que é essa a vertente
que orienta o trabalho com a linguagem proposto pelos PCN (BRASIL,
1998) e pelas DCE (PARANÁ, 2008), seguindo o sociointeracionismo
pregado por Bakhtin (2003) e o interacionismo sócio-discursivo, conforme
Bronckart (2003);
2- Adotamos uma linha teórico-metodológica, baseando-nos nas leituras de
bibliografias relacionadas aos gêneros textuais/discursivos, pautadas na
linha bakhtiniana, bronckartiana e de seus seguidores, dentre eles, Rojo
(2004), Schneuwly e Dolz (2004), Marcuschi (2006 e 2008), Baltar (2004)
Bonini (2003), além de outros.
3- Traçamos uma metodologia de trabalho, organizando, assim, uma SD com
o gênero notícia, na qual propomos desafios, possibilitando construir e
aprofundar conhecimentos sobre o gênero proposto. Para concretização
da SD, foi necessário, anteriormente, desenvolvermos a construção de um
Modelo Didático de Gênero (MDG), o que propiciou-nos um conhecimento
mais amplo sobre esse gênero.
Ao trilhar todo esse percurso, a preocupação sustentava-se na necessidade
de formar, na escola, sujeitos autônomos, capazes de discernir, tomar posições
diante dos textos lidos. Por que essa preocupação?
Pode ocorrer, em atividades de leitura e escrita, que um aluno não tenha ainda
possibilidades de selecionar o que é mais ou menos importante, o que é principal ou
secundário, pois num texto, muitas informações estão implícitas e o leitor precisa
interagir com essas informações e seu conhecimento de mundo. Para haver
compreensão, Kleiman (2002) esclarece que a leitura que não surge de uma
necessidade para chegar a um propósito, não é propriamente leitura.
Daí a necessidade de propor atividades significativas de leitura, superando as
consideradas mecânicas em sala de aula, por meio das quais o aluno lê ou escreve
porque a professora solicitou, sem reconhecer seu significado e sentido. SOARES
(1998) esclarece que “pessoas que não incorporaram os usos da escrita, não se
apropriaram plenamente das práticas sociais de leitura e de escrita”. Sendo assim, e
preciso inserir, em nossas aulas, práticas sociais que favoreçam o letramento e que
promovam essa conjugação tão necessária da leitura/escrita com situações reais de
interação oral. Para isso, faz-se necessário criar estratégias pedagógicas que
orientem os alunos no sentido de utilizarem o conhecimento produzido socialmente
para a compreensão de texto e vice-versa. Assim, a interação leitor-texto-autor será
mediada por conhecimentos socialmente construídos.
3.1 A notícia impressa como objeto de estudo
Reconhecemos que todo texto é organizado em função de seu interlocutor, o
qual determina o que, o como e o para que dizer. Portanto, o outro não é passivo. Ele
age, tem atitudes responsivo-ativas e está em constante ação: num primeiro
momento, a resposta pode até ser muda; depois, é transformada em eco e, somente
mais tarde, virá a produção dele com eco(s) do(s) outro(s) – essa produção pode ser
imediata ou retardada, a partir de várias análises (polifonia), conforme explicam
Bronckart (2006), Marcuschi (2008) e Koch (2008).
Dessa mesma forma ocorre com os discursos da esfera jornalística, os quais
se materializam em vários gêneros, sempre com função e/ou finalidade diferenciadas.
Exemplo disso observamos no suporte jornal: gêneros como a notícia, a reportagem,
o artigo de opinião, a carta de/ao leitor, a charge, dentre tantos outros, cada qual com
uma função específica.
Se cada gênero representa um determinado contexto social, a notícia, em seu
contexto, supõe capacidades de ação do locutor em função do(s) interlocutor(es)
ao(s) qual(is) se dirige e do uso eficaz que este(s) fará(ão) das informações nela
contidas. Todavia, isso dependerá do domínio que o leitor terá em relação ao gênero
e à sua linguagem, para, a partir daí, tecer considerações sobre o fato narrado.
Normalmente a notícia discorre sobre um fato recente, inédito, verdadeiro,
objetivo e de interesse público, que passa por variação de tempo, ou seja, o que
ontem foi importante, hoje poderá não ser. Na notícia impressa, verifica-se um texto
que busca, geralmente, a impessoalidade, a clareza, a objetividade e cuja estrutura
se orienta a partir de respostas àquelas perguntas típicas do lead (quem, o quê, onde,
como, quando e por quê?). No entanto, o suporte e o público alvo também definem
um perfil particular para esses textos, “quebrando”, muitas vezes, sua forma padrão.
Marcuschi classifica, então, o suporte de um gênero como:
[...] um lócus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto. Pode-se dizer que suporte de um gênero é uma superfície física em formato específico que suporta, fixa e mostra um texto (MARCUSCHI, 2008, p.174).
Enquanto o suporte “modela” o texto, as sequências discursivas organizam-no
internamente. Tendo como suporte o jornal impresso, Baltar destaca que a notícia
pertence ao mundo discursivo do relatar (pois aborda fatos reais), estruturado
predominantemente por sequências narrativas que aparecem intercaladas com
sequências descritivas. Para ele,
Notícia – É o gênero básico do jornalismo, em que se relata um fato do cotidiano considerado relevante, mas sem opinião. É um gênero genuinamente informativo, em que, em princípio, o repórter não se posiciona, pois o que vale é o fato. (BALTAR, 2004, p. 133)
No Manual de Redação da Folha de São Paulo observamos que a “notícia
propriamente dita” (2006, p. 31) é mais objetiva. Seu autor deve dispor de elementos
concretos e informações fundamentadas, pois ao “comprar um jornal, o leitor
estabelece com ele um pacto de interlocução, justamente com o objetivo de
enriquecer sua opinião e seu conhecimento dos fatos” (2006, p.23). O mesmo Manual
declara que a notícia impressa, que normalmente não é assinada, é o “puro registro
dos fatos [...], mas vários fatos descritos com exatidão podem ser justapostos de
maneira tendenciosa” (Idem, p.88).
Sendo assim, estudar o gênero notícia para refletir sobre sua função, seu
contexto de produção, sua forma mais ou menos estável e as marcas linguísticas que
o constituem, é uma forma de proporcionar que o estudo da Língua Portuguesa, na
sala de aula, volte-se para questões reais que envolvem o uso da língua. Portanto,
torna-se imprescindível, na formação de sujeitos reflexivos, criar situações que
favoreçam a leitura-responsiva.
Em se tratando desse gênero, o leitor deve entender, pelo menos, que a notícia
é escrita para um público presumido e as questões ideológicas estão presentes
constantemente no ato de escrever, até mesmo porque ela não deixa de ser uma
‘mercadoria’ a ser comercializada por um determinado público a quem se pretende
atingir. Visto que por meio das notícias as pessoas conhecem o mundo que as cerca,
têm contato com ele, percebem sua dimensão central na vida contemporânea,
conforme os interesses ideológicos de seus produtores, reforçamos a necessidade de
se ler atentamente esse gênero.
Nesse sentido, ressaltamos a importância do estudo e do reconhecimento
desse gênero, bem como da metodologia da SD adotada por nós na sua exploração,
a partir da elaboração de um MDG. Mas o que é afinal um MDG? Como construí-lo
tendo em vista o trabalho com determinado gênero? Por que é importante construir
um MDG antes do desenvolvimento de uma SD? Tentaremos esclarecer tais
inquietações à medida que relatamos como foi a construção do MDG que antecedeu
a SD com o gênero notícia impressa.
3.2 A construção do modelo didático de gênero (MDG)
Definido o gênero textual notícia impressa como objeto de ensino de Língua
Portuguesa, selecionamos uma turma de 2º ano do Ensino Médio (posteriormente
optamos por trabalhar com as duas turmas de 2º ano do EM, mais as duas 8ª séries
do Ensino Fundamental. O passo seguinte consistiu na elaboração do MDG. Os
estudos para sua elaboração foram pautados, inicialmente, em Bakhtin (2003) e
Bronckart (2003), em quem se ampara para a definição de gêneros; Dolz e
Schneuwly (2004), além de Cristovão e Machado (2006), Marcuschi (2006, 2007,
2008), Machado (1998), Costa-Hübes (2008, 2009), entre outros, aos quais
recorremos para a organização do MDG.
Dolz e Schneuwly (2004) esclarecem que se deve transformar o conhecimento
científico em conhecimento ensinável. Por isso, propõem a elaboração de um MDG
definido como um conjunto de conhecimentos científicos e práticos, advindos de uma
análise exaustiva de textos do gênero que se pretende estudar. Tal análise funciona
como uma espécie de aporte teórico ou aprofundamento dos conhecimentos sobre o
gênero, a qual servirá como subsídios para a construção de uma SD voltada para o
ensino-aprendizagem daquele determinado gênero.
A elaboração de MDG “compreende três momentos de forte interação e em perpétuo
movimento” (SCHENEUWLY e DOLZ, 2004, p.81), sendo eles:
- princípio de legitimidade (referência aos saberes teóricos ou elaborados por especialistas);- princípio da pertinência (referência às capacidades dos alunos, às finalidades e os objetivos da escola, aos processos de ensino-aprendizagem);- princípio de solidarização (tornar coerentes os saberes em função dos objetivos visados) (SCHENEUWLY e DOLZ, 2004, p 82).
Como duas grandes características do MDG, Schneuwly e Dolz (2004) deixam
claro que, ao elaborá-lo: “1) Ele constitui uma síntese com objetivo prático, destinada
a orientar as intervenções dos professores; 2) Ele evidencia as dimensões
ensináveis, como base nas quais diversas sequências didáticas podem ser
concebidas” (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004, p.82).
Portanto, a construção de um MDG implica na análise de um conjunto de
textos, considerados como pertencentes ao gênero, tendo objetivos estritamente
didáticos e que mostram as dimensões ensináveis desse gênero. Daí a necessidade
de o profissional de Língua Portuguesa reconhecer a importância da construção do
MDG que, segundo Machado e Cristóvão, “permitiria a visualização das dimensões
constitutivas do gênero e seleção das que podem ser ensinadas e das que são
necessárias para um determinado nível de ensino” (CRISTOVÃO E MACHADO,
2006, p. 556-557).
A produção de um MDG antes do desenvolvimento de uma SD é
fundamental, pois mesmo sem atingir todas as situações que compõem um gênero
discursivo, o conhecimento prévio sobre o mesmo é necessário para conduzir as
reflexões com maior propriedade e segurança. Se Bakhtin afirma que o gênero é
“relativamente estável”, na escola podem ser feitas algumas adaptações do gênero
de referência para que o objetivo do professor seja mais facilmente alcançado.
Por isso, além de consultar os MDG já disponíveis nos moldes propostos por
Schneuwly e Dolz (2004); Cristovão e Machado (2006) compartilhamos das
afirmações de Costa-Hübes e Baumgartner:
O modo como ensinamos, as nossas ações na sala de aula são afetadas ideologicamente, pois a forma como concebemos o ensino de língua, as escolhas que fazemos em relação a materiais e métodos podem contribuir para a formação de homens críticos, ou de homens alienados, tendo em vista que as mesmas estão, inevitavelmente, apoiadas em concepções de homem, de sociedade, de linguagem, às quais incorporamos ao longo de nossa constituição sócio-histórica. Para interagir plenamente no mundo letrado, é preciso mais que o domínio do código. Requer que a linguagem seja tratada na sua perspectiva discursivo-enunciativa, em práticas sociais de leitura, de escrita e de fala. (In. AMOP, 2007b, p. 13).
Evidentemente, após o levantamento dos dados, é muito importante que o
professor/pesquisador se questione, diante das diferentes possibilidades de
trabalhos apresentadas:
a) O que os alunos ainda precisam aprender sobre esse gênero?
b) Que capacidades de linguagens já adquiriram em relação a esse gênero?
c) O que é possível ser ensinado nesse nível de ensino?
Para a concretização do MDG que norteou a elaboração da SD com o gênero
notícia impressa, selecionamos e analisamos dez textos do gênero. Neles
destacamos algumas características relativas ao contexto de produção e de
circulação, ao contexto temático e sua estrutura composicional, sem deixar de
destacar aspectos de suas marcas linguísticas.
Abaixo segue o quadro das notícias analisadas por nós.
Quadro 01 - Textos analisados
Título da Notícia
Autor/Locutor Veículo/JornalMomento de
Produção
1“Lei seca” para usuários de remédios
Repórter do jornal (não há referência)
O Estado do Paraná 31/08/08Curitiba – PR –
2Provas para 4 milhões de estudantes
Repórter do jornal (não há referência)
O Estado do Paraná31/08/08Curitiba – PR-
3
Ingrid emocionada por ‘respirar o ar da França’
Repórter Edson Silva Coelho
Correio do Povo05/07/08Porto Alegre – RS -
4Bazar com os bens de Abadia causa tumulto
Repórter do jornal (não há referência)
Gazeta do Povo09/04Curitiba – PR -
5Carros: juros continuam atraentes
Repórter do jornal (não há referência)
Correio do Povo 13/01/08Porto Alegre – RS -
6
Aumentam, para as mulheres, as tarefas domésticas e as famílias para chefiar
Repórter Paula Laboissière
Jornal de Beltrão
08/10/08Francisco Beltrão – PR -
7
Apenas 10% das 80 mil crianças em abrigos estão disponíveis para adoção, aponta AMB
Repórter do jornal (não há referência)
Jornal Hora Popular
28/08/08/Francisco Beltrão-PR -
8
Secretário quer colocar HR em funcionamento até final do ano
Repórter do jornal (não há referência) Jornal Hora Popular
31/07/08/Francisco Beltrão-PR -
9
Decisão sobre anencefalia em novembro
Repórter do jornal (não há referência) Jornal de Beltrão
27/08/08Francisco Beltrão – PR -
10
Reduz em média 24% dos atendimentos do Samu no País
Repórter do jornal (não há referência) Jornal de Beltrão
15/07/08Francisco Beltrão – PR -
A análise propiciada pelo MDG nos permitiu uma visão macro do gênero,
garantindo os conhecimentos necessários para a elaboração da SD. Dentre os
aspectos observados, destacamos, como uma das características deste gênero, que
a informação é rápida e imediata, sempre a partir de uma manchete que, além de
sintetizar o tema central, atrai a atenção do leitor para uma introdução ou lead que
procura dar informações sobre o que aconteceu, com quem, quando, onde, como e
por que. O desenvolvimento dos outros parágrafos, na notícia impressa, apresenta
uma série de elementos articulados que permitem compreender o desenrolar dos
acontecimentos, ampliando-se o tema por meio de alguns detalhes.
Ainda é importante ressaltar sobre a notícia impressa, por exemplo, que seu
público-alvo são leitores múltiplos e, normalmente, desconhecidos. Sabemos que a
notícia atingirá um determinado número de leitores, de uma determinada classe
social, mas não exatamente a quem. Ela também pretende afirmar como
verdadeiros os acontecimentos ou fatos locais ou do mundo, porém, seu objetivo
principal é o de informar o leitor, fazendo-o interessar-se pela matéria. Nos jornais,
frequentemente as notícias são produzidas por jornalistas ou repórteres, mas há
casos em que também recorrem às cópias de notícias enviadas por assessorias ou
retiradas de outras fontes como a internet, ou jornal de maior renome.
Em relação aos mundos discursivos, verificamos, na maioria dos textos
analisados, as marcas do mundo do narrar – mas em alguns casos, há a mescla
com os do expor. Tais marcas linguísticas, nos trechos narrativos, alcançam, com
mais facilidade, a razão do destinatário. Há, também, casos em que a narrativa
passa de apresentação dos fatos para a profecia de resultados, ou seja, da certeza
para a hipótese. Tal prática (a conduta de fugir da certeza) funciona como uma
estratégia argumentativa. A narrativa de fatos como argumento já é condição
indispensável para a eficácia da comprovação de uma tese.
O predomínio das sequências narrativas nas notícias impressas, então, em
se tratando da tipologia, padroniza esses gêneros como textos do tipo
predominantemente narrativo.
Cremos que após pesquisas, estudos e conhecimentos mais aprofundados
sobre o gênero - em especial a partir da construção do MDG – nós, professores,
tenhamos melhores possibilidades para agir como mediadores num processo que
objetiva desenvolver um aluno leitor/escritor competente e autônomo.
3.3 A metodologia da sequência didática (SD)
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), sugerem a elaboração de uma SD como uma das
possibilidades metodológicas de trabalho com determinado gênero. Quanto a esse procedimento, os
autores esclarecem que se trata de “um conjunto de atividades escolares organizadas de maneira
sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito” (DOLZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY 2004,
p.97) e que “a definição dos objetivos de uma SD deve adaptar-se às capacidades e às dificuldades
dos alunos nela engajados” (Idem. 2004, p. 53). Para tal concretização, os autores sugerem o seguinte
encaminhamento:
FIGURA 1 - Esquema da Sequência Didática FONTE: Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004:98)
Conforme explica Costa-Hübes (2009), os autores iniciam o trabalho com os
gêneros com a apresentação de uma situação de interação sócio-comunicativa real,
que visa fundamentar a necessidade de produção e aprendizagem, relacionada a
um gênero selecionado. Em seguida, solicita-se uma produção inicial de um texto do
gênero, momento em que o aluno elabora uma tentativa de responder à situação de
interlocução, proposta anteriormente.
Essa produção inicial, conforme os autores, oferecerá, ao professor, subsídios
para diagnosticar a compreensão (ou não) que o aluno tem do referido gênero.
Enfim, trata-se de um instrumento por meio do qual se pode encontrar elementos
para analisar as capacidades e potencialidades de linguagem já dominadas (ou não
dominadas) naquele momento.
Depois, com base na avaliação diagnóstica, define-se o ponto de intervenção
do processo ensino-aprendizagem, ou seja, a análise servirá para orientar as
atividades a serem trabalhadas nos módulos, de forma a adaptá-los às
necessidades reais dos estudantes envolvidos. Logo, o trabalho com os módulos
consiste em abordar, de forma didática, os problemas que foram revelados na
produção inicial.
Se, conforme os próprios autores, a SD não pode ser vista como algo
fechado, ou seja, como um manual pronto e acabado, optamos pela adaptação
desse procedimento teórico-metodológico (fig. 2), organizada por Costa-Hübes
(apud AMOP, 2007a) e representado no esquema abaixo:
FIGURA 2 - Esquema da SD adaptada por Costa-HübesFONTE: Swiderski e Costa-Hübes (2008)
Módulo 1
Módulo 2
Módulo n
Apresentação da situação
Produção inicial
Produção final
Nessa proposta de adaptação, a autora insere um módulo de “reconhecimento
do gênero” antes da produção inicial, pois entende que por meio de pesquisa, leitura
e análise de textos do gênero, que já se encontram prontos na sociedade, o aluno
terá melhores condições de produzir seu texto inicial. Esse módulo, na verdade, cria
condições para que o aluno leia e tenha contato com textos do gênero, possibilitando-
lhe maior familiarização com o gênero que está sendo trabalhado. Isso pode
favorecer a aprendizagem, pois, conforme Swiderski e Costa-Hübes,
entendemos que antes mesmo de se chegar à produção inicial, o professor tem a oportunidade de criar, para o estudante, várias situações que envolvam a prática de leitura de textos do gênero, já prontos, que circulam na sociedade. O contato com esses textos pode mobilizar, segundo Solé (1998), estratégias diferentes frente aos diversos objetivos que implicam o ato de ler. Além disso, trabalhar com a leitura não implica ignorar os outros eixos do processo ensino-aprendizagem de LP (SWIDERSKI e COSTA-HÜBES, 2009, p 8 e 9).
Assim, o procedimento por nós adotado orienta-se a partir do seguinte quadro:
1. APRESENTAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO (necessidade / motivo de produção).
2. SELEÇÃO DO GÊNERO TEXTUAL (observando o que dizer, para quem, em que local de circulação etc.).
3. RECONHECIMENTO DO GÊNERO SELECIONADO (por meio de)a) Pesquisa sobre o gênero.b) Leitura de textos do gênero, explorando e estabelecendo relações entre: - sua função social, - seu conteúdo temático, -sua estrutura composicional (características, tipologia predominante etc.), - seu estilo (análise linguística).
4. PRODUÇÃO DE TEXTO do gênero, tendo em vista a necessidade apresentada na situação inicial.
5. REESCRITA DO TEXTO produzido, com o objetivo de aproximá-lo, o máximo possível, de seus “modelos” que circulam socialmente.
6. CIRCULAÇÃO DO GÊNERO, tendo em vista o(s) interlocutor(es) definido(s) oficialmente.
Figura 3 – Costa-Hübes (In. AMOP, 2007b, p.17)
A SD, então, define-se como um conjunto de atividades de ensino, focalizando
um gênero específico. É planejada progressivamente, com objetivos delimitados,
elaborados a partir de atividades de linguagem que propiciam a construção de
conhecimento oral ou escrito sobre o gênero abordado.
Para melhor exemplificarmos essa proposta de trabalho, descrevemos, em
seguida, a aplicação de uma SD realizada com alunos do Ensino Fundamental e
Médio, focalizando o gênero “notícia impressa”. Ao mesmo tempo em que
descrevemos as atividades, apresentaremos algumas considerações, destacando
aspectos relevantes dessa experiência teórico-metodológica de ensino.
3.4 Relato de uma experiência de trabalho com o gênero notícia impressa,
conforme a metodologia da SD
Na perspectiva de atender aos pressupostos teóricos dos gêneros e à metodologia
selecionada (SD), a proposta de atividades foi direcionada, inicialmente, a uma turma
de alunos do 2º ano do Ensino Médio (EM), Porém, optamos, posteriormente, por
trabalhar com a outra turma de 2º ano do EM, além de duas 8ª séries do Ensino
Fundamental (EF).
Antes do reconhecimento do gênero notícia impressa, foi proposto aos alunos
– já organizados em trios ou duplas – um trabalho com o suporte jornal e, em
seguida, foi feito uma relação dos mais variados gêneros que o compõem. Para isso,
providenciamos diversos jornais e entregamos para que manuseassem,
observassem, lessem e reconhecessem nele um veículo/suporte de variados
gêneros. Depois disso, foram possíveis alguns questionamentos: Como se organizam
os jornais? O que encontramos na capa do jornal? No jornal, encontramos somente
notícias? Quais gêneros vocês reconhecem num jornal impresso? E uma notícia,
como é reconhecida?
Embora estivessem visualizando outros gêneros, deixamos claro que o objetivo
do nosso trabalho era, em especial, reconhecer as notícias que veiculam nos jornais
impressos.
Após as explicações iniciais sobre as atividades que seriam realizadas, já
apresentamos uma situação real de produção escrita aos alunos: eles fariam o papel
de repórteres e produziriam uma notícia impressa. No nosso caso, após o
reconhecimento dos mais variados gêneros pelos quais são formados os jornais e,
tendo sido aclarada a diferença entre uma notícia e uma reportagem (gêneros que se
aproximam muito), propusemos que, ao término, elaborassem uma notícia cujo fato
seria a Festa Julina do Colégio. Também ficou explicitado que alguns textos seriam
reproduzidos num dos jornais locais, mas que todos os demais seriam expostos no
mural do colégio, bem como postados no site da escola.
Para conduzir a um reconhecimento mais aprofundado sobre este gênero,
após estarem em trios ou duplas, entregamos os jornais previamente separados. Em
seguida, solicitamos que lessem e selecionassem um texto que, para eles, poderia
ser considerado uma notícia. Solicitamos, ainda, que alguns alunos lessem o texto
escolhido em voz alta e que depois apontassem algumas características encontradas
que os levou a classificar aquele texto como notícia e anotamos no quadro as
informações citadas por eles.
Percebendo ainda a insegurança por parte de alguns grupos em classificar o
texto como pertencente ao gênero notícia ou ao gênero reportagem e para maiores
esclarecimentos, retomamos seus conhecimentos prévios sobre o assunto.
Reforçamos a ideia de que a notícia relata os fatos que ocorrem, ocorreram ou
ocorrerão na cidade, no estado, no país ou no mundo, tendo como principal intenção,
informar o leitor com exatidão sobre determinados fatos, sem interferência do autor,
de maneira clara, direta e objetiva. Citamos que apesar de pretender ser neutra e
confiável, em determinados casos, percebe-se na notícia a ideologia e a concepção
de quem a escreve ou do jornal que a publica. Deixamos claro que elas são
impressas no jornal, conforme o grau de importância. A segurança para repassarmos
essas informações foi obtida com a construção do MDG.
Na sequência, pedimos que apontassem as características mais comuns que
perceberam nas notícias analisadas e continuamos anotando essas características no
quadro para, no final, acrescentar outras que porventura faltassem. Após a
caracterização do gênero, entregamos aos alunos uma mesma notícia para que todos
analisassem:
Imagem 1 - Fonte: Jornal Correio do Povo, RS, datado de 13/10/2008
Em um trabalho com gêneros, não se pode perder de vista a análise do
contexto de produção, de sua função social e das características que o definem como
tal, conforme pressupostos bakhtinianos. Neste sentido, os questionamentos
repassados aos alunos, após a leitura da notícia, nos deram a possibilidade de
perceber se eles reconheciam o gênero notícia como tal. Questionamos, então: Quem
produziu a notícia? Quando foi publicada? Em qual veículo ela circulou? Por que e
para quem foi produzida? Que imagem o(a) autor(a) tem do destinatário? Por que se
escreveu uma notícia sobre esse fato? Tal fato afetou sua vida? Por quê? Qual a
posição social do autor, ou seja, qual a sua profissão? Que efeito o autor pretendia
provocar no leitor? Qual o conteúdo temático nela veiculado? Qual o seu suporte?
Que marcas há no texto que o faz reconhecê-lo como notícia? O que é apresentado
no primeiro parágrafo?
Nos questionamentos detectamos que os alunos do Ensino Fundamental - 8ª
séries - participaram com mais afinco que os do Ensino Médio – 2º anos -
provavelmente por estes acharem as questões muito óbvias, porém os acertos foram
nas mesmas proporções. Aos que não apresentavam uma resposta adequada,
solicitamos que outro grupo respondesse; e assim, sucessivamente, até que uma
resposta satisfatória emergisse. Porém, quando preciso, auxiliamos nas respostas
Indagações orais foram realizadas para observar a atenção dos mesmos ao
procederem à leitura da notícia: desde palavras na manchete: “Carros: juros
continuam atraentes” até expressões como “... grandes bancos comerciais e de
montadoras, fabricantes e concessionárias de veículos decidiram voltar a irrigar o
crédito para compras de carros.” Questionamos o porquê de terem sido empregadas
as palavras em destaque e não outras que também poderiam ter sido utilizadas pelo
autor. No EM, um grupo de alunos acabou brincando com o emprego das palavras
“atraente” e “irrigar”, comentando que normalmente elas têm outra utilização e
significado e citaram alguns exemplos. A maioria dos alunos do EM conseguiu
atender rapidamente ao que foi proposto, mas alguns alunos do EF tiveram mais
dificuldade para as questões interpretativas, porém após reformulação de algumas
indagações e respostas de outros grupos, também entenderam o real significado.
Algumas questões serviram para deixar claro se eles sabiam a diferença entre
notícia e manchete e se conheciam o termo lead. Novamente comentamos que lead é
uma palavra inglesa e que significa “guiar”, “encabeçar”, sendo exatamente essa a
função do primeiro parágrafo de uma notícia. Também esclarecemos sobre o “olho da
notícia”, ou “chamadinha” que vem abaixo do título, deixando claro que o objetivo é
criar no leitor o interesse pela notícia, através de uma síntese; que se distingue do
título/manchete por apresentar um tamanho de letra menor do que as da manchete,
mas que, normalmente, também vem destacado em negrito ou itálico, fazendo com
que se diferencie do corpo do texto. Dissemos, ainda, que nem todas as notícias
possuem “olho” ou “chamadinha”, pois não há obrigatoriedade, diferentemente do
título ou da manchete, que são obrigatórios. Esclarecemos que cada texto deve ser
compreendido como uma unidade de sentido e como uma ferramenta de
comunicação pertencente a determinado gênero, conforme pressupostos teóricos de
Marcuschi (2006, 2007, 2008).
No que se refere à análise linguística, a mesma também não foi esquecida por
nós e várias atividades foram trabalhadas com as equipes no intuito de analisar a
polifonia presente na notícia, as retomadas aos termos já apresentados, os dêiticos,
os pronomes e a quem exatamente eles faziam referências, os tempos verbais, os
modalizadores, as características das frases, dos períodos e parágrafos, as
características lexicais e de coesão seqüencial, bem como os argumentos e contra-
argumentos utilizados pelo autor de uma notícia. Nesta etapa, os alunos mostraram-
se muito interessados e participaram das atividades com afinco.
Perguntamos, por exemplo, por que os grandes bancos decidiram voltar a
irrigar o crédito para compras de carros e a resposta da maioria foi aceitável, mas
houve equipes (aqui em proporções praticamente iguais entre os alunos do Ensino
Fundamental e do Médio) que tiveram dificuldade para entender o porquê da ajuda.
Continuando, perguntamos com quais afirmações a conjunção “mas” estabelecia
relação e qual era essa relação. Ao receber as respostas, avaliamos que eles haviam
adquirido conhecimento suficiente para responderem, embora os alunos do EM foram
mais precisos na resposta. Quanto à relação de sentido estabelecida pela conjunção,
fizemos uma reflexão sobre as relações já vistas e os conduzimos a uma conclusão;
nesse caso, a relação é de “oposição”, assim, também pudemos falar das outras
conjunções adversativas, aprofundando mais com os alunos do EM.
Nossa análise, mais uma vez, pautou-se nas Diretrizes Curriculares do Estado
do Paraná (PARANÀ, 2008), que reforçam e orientam aos profissionais da língua
quanto a importância do trabalho com a análise linguística em sala de aula.
Esclarecem que,
considerando a interlocução como ponto de partida para o trabalho com o texto, os conteúdos gramaticais devem ser estudados a partir de seus aspectos funcionais na constituição da unidade de sentido dos enunciados. [...] O professor poderá instigar, no aluno, a
compreensão das semelhanças e diferenças, dependendo do gênero, do contexto de uso e da situação de interação, dos textos orais e escritos; a percepção da multiplicidade de usos e funções dalíngua; o reconhecimento das diferentes possibilidades de ligações e de construções textuais; a reflexão sobre essas e outras particularidades linguísticas observadas no texto, conduzindo-o às atividades epilinguísticas e metalinguísticas, à construção gradativa de um saber linguístico mais elaborado, a um falar sobre a língua. (PARANÁ, 2008, p.78).
Na análise linguística, certamente, muitos elementos poderiam ser analisados
no texto, os quais são tão importantes quanto àqueles por nós explorados.
Lembramos, portanto, que não esgotamos, de forma alguma, as possibilidades de
análise e sugerimos a elaboração de outras atividades, porém, sem perder de vista o
gênero em questão.
Retomando as questões sobre as características do gênero notícia,
percebemos a facilidade dos alunos (tanto do EF quanto do EM) em responderem ao
que foram indagados. Constatamos, assim, que as intervenções anteriores serviram
para que eles adquirissem esse domínio para as respostas.
Em seguida, solicitamos que relembrassem, na notícia já trabalhada, o assunto
abordado, a estrutura e a organização do texto. Dissemos que para escrever uma
notícia, o/a autor/a necessitaria de várias informações sobre o assunto, além de que
as pesquisas e fontes deveriam ser fidedignas. Lembramos ainda que,
provavelmente, muitas vezes o texto foi reescrito antes de ser publicado e que o/a
autor/a também precisa ter claro que todo texto é produzido tendo em vista um leitor
potencial que é determinado pela época e local de sua produção. O texto possui um
autor que tem/teve um objetivo para a sua escrita e tem em vista o veículo em que
essa notícia irá circular.
Logo após, reforçamos o desafio proposto a eles: o de se colocarem no lugar
de jornalistas e escreverem uma notícia sobre a Festa Julina do Colégio. Lembramos
aos alunos que já havíamos estudado o gênero entrevista e que havia a possibilidade
de a equipe de direção participar de uma coletiva por meio da qual eles, como
repórteres, poderiam questionar e receber as informações sobre o referido fato.
Vale ressaltar aqui a expressão de contentamento em muitos alunos, inclusive
com comentários de que seu sonho era ser jornalista ou repórter. Antes e após a
entrevista com a direção do estabelecimento de ensino, orientamos as equipes a
procederem à escrita das respostas obtidas na entrevista para, posteriormente,
subsidiar o texto notícia, lembrando sempre o que já fora trabalhado: manchete,
“olho”, lead. Durante a entrevista, a postura de alguns alunos chamou nossa atenção,
pois além de terem elaborado muito bem as questões, indagaram desde assuntos
mais sérios que envolvem a organização de uma Festa Julina, até situações
históricas do evento, mesmo sendo esta uma festa interna em nosso colégio. Este
momento da entrevista foi muito interessante, pois serviu como o “norte” para que o
texto fosse posteriormente organizado.
De posse das informações colhidas, os alunos prepararam-se para a primeira
escrita da notícia. Mais uma vez foram lembrados para quem iriam escrever, sobre o
local de produção, a manchete, o “olho’ caso assim definissem, o lead, enfim, sobre a
estrutura de um texto do gênero notícia impressa. Ao término da aula, recebemos os
textos dos alunos produzidos pela primeira vez (os rascunhos). Neles não fizemos
nenhuma anotação ou sugestão, pois esse ainda era o momento dos alunos. De eles
escreverem e organizarem suas ideias, pois entendemos, assim como Menegolo e
Menegolo, que “a reescrita permite a apropriação dos gênero textuais, fazendo com
que o aluno consiga diferenciá-lo e melhor aplicá-lo em contextos situacionais de
escrita (MENEGOLO e MENEGOLO, 2005, p. 75)
No encontro seguinte com as turmas, distribuímos os rascunhos às equipes,
deixando claro que não havíamos feito nenhuma interferência por escrito, mas que
iríamos, de equipe em equipe, para orientá-los, caso assim quisessem. Neste
momento, foi perceptível que muitos grupos reorganizaram praticamente toda a
notícia e que alguns fizeram poucas alterações, mas a maioria das equipes solicitou
ainda nossa orientação. Ao término da aula, recolhemos novamente os textos e só
voltamos a trabalhar com eles na semana seguinte, mesmo tendo mais duas aulas
naquela semana com as turmas. Por que isso? Para criar um distanciamento dos
alunos em relação ao texto produzido.
A importância do ato de reescritura de texto reside no fato de que provoca o diálogo do sujeito-autor com o seu produto-criado, possibilitando um relacionamento mais interativo com seu próprio texto [...] O aluno sai, ao reescrever, do estágio emocional (inspirativo), que gera a primeira escrita, e passa ao estágio de maior racionalização sobre o que foi materializado. (MENEGOLO e MENEGOLO, 2005, p. 75)
A reescrita, portanto, possibilita ao aluno que veja o que antes ele não via em
seu texto. Para Bakhtin, “a reprodução do texto pelo sujeito [que se dá num processo
de volta ao texto, releitura, nova redação] é um acontecimento novo, irreproduzível na
vida do texto, é um novo elo na cadeia histórica da comunicação verbal.” (BAKHTIN,
2003, p. 332)
Sendo assim, ao retornar com os textos na semana seguinte, devolvemos a
cada grupo o seu, orientando-os para uma releitura, após ter feito algumas
observações por escrito. Novamente os jornais estavam à disposição dos alunos,
caso ainda precisassem observar alguns detalhes.
Para facilitar esse processo de revisão, distribuímos o quadro que seguinte a
cada equipe.
QUADRO DE CONSTATAÇÕES
Verificando o texto produzido Sim Não Manchete: o verbo aparece no tempo presente?
Procura dar informações sobre o que aconteceu, quando aconteceu, onde, como e por quê?
Os parágrafos estão devidamente organizados?
Empregou adequadamente os sinais de pontuação?
Apresenta como verdadeiro os acontecimentos ou fatos, sendo que seu objetivo principal é o de informar o leitor, fazendo-o interessar-se pela matéria?
Há o predomínio de sequências narrativas?
A informação é rápida e imediata?
As frases são curtas e objetivas?
Os pronomes foram empregados na terceira pessoa?
Faz retomadas de palavras, expressões ou ideias por meio de pronomes ou outros recursos coesivos referenciais?
Emprega adequadamente os conectivos?
Figura 4 – Quadro elaborado com o auxílio da Profª. Orientadora
Ao término desta atividade, destacamos a euforia dos grupos ao constatar que
seu texto aproximava-se muito das características do gênero notícia impressa e de
um bom texto. Ficou perceptível, nestes casos, que as equipes construíram o
conhecimento, apresentando no texto de sua autoria as características específicas
desse gênero. Houve, certamente, a incorporação dos conteúdos trabalhados, pois o
desempenho da maioria dos grupos foi satisfatório – mesmo que ao término da SD
alguns alunos já se diziam cansados de tanto ‘estudar’ notícias em jornais.
Durante a última aula com o gênero, as equipes, ainda orientadas por nós,
procederam à reescrita da versão definitiva da notícia e na sequência, a digitação
das mesmas para circulação por meio de postagem no site da escola e
encaminhamento a um dos jornais locais, bem como a exposição no mural do
colégio de todos os textos escritos pelos alunos. Este foi o momento em que se
consolidou a compreensão da função social da escrita, especialmente, aos do EF ao
verem a reação dos amigos lendo seu texto exposto no mural.
4 Considerações finais
Com a aplicação da SD, após construção de um MDG, procuramos responder
aos questionamentos: qual o encaminhamento metodológico capaz de garantir uma
exploração significativa, tendo em vista a funcionalidade do gênero? É possível
trabalhar com gênero textual, mais especificamente com o gênero notícia impressa,
em sala de aula?
Ficou comprovado que a SD serve “para dar acesso aos alunos a práticas de
linguagem novas ou dificilmente domináveis” (DOLZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY,
2004, p.98) e pode ser, sim, uma prática pedagógica metodológica a ser empregada
nas aulas, já que é baseada na exploração de elementos textuais específicos deste
gênero, auxiliando no crescimento do nível de compreensão dos alunos e levando-os,
inclusive, a elaboração de textos do gênero com o máximo de acertos.
Aos alunos ficou clara a compreensão de que todo texto possui uma função
social, um suporte, um formato, um destinatário, um objetivo, enfim, relacionaram este
gênero às suas situações de uso e apreenderam aspectos relacionados à micro e à
macroestrutura do texto, relacionadas ao gênero em questão. Entretanto, devemos ter
em mente e compreender que o texto vai além da identificação do autor e do
destinatário do texto, da identificação do gênero, da identificação do suporte, do
objetivo ou do assunto do texto. Foi preciso considerar, antes de tudo, o texto como a
materialização de um discurso, constituído sócio-histórico e ideologicamente,
determinado tanto pelo querer dizer quanto pela necessidade de se dizer em
determinado contexto de interação.
Nos estudos dos pressupostos teóricos, observamos os mais variados
aspectos relacionados ao gênero notícia. Salientamos, então, após essa análise, que
na notícia nem sempre há a divulgação do fato com neutralidade, visto que as
diferentes vozes sócio-histórico-ideológicas interferem na construção dos enunciados,
colocando o autor com intencionalidade em relação ao que escreve, pois escolhe as
palavras para que tenham e provoquem o efeito esperado. Isso acontece porque o
indivíduo vive numa sociedade e no contexto de uma instituição, portanto, o agir
comunicativo em diferentes tipos de textos deve-se à definição da representação
interna do contexto de produção – o mundo físico, social e subjetivo, enfim, à situação
material de produção e à mobilização das representações referentes aos conteúdos –
ou seja, à situação de interação social.
Também ficou perceptível a importância do professor trabalhar com o suporte
jornal, pois nele os alunos têm condições de conhecer múltiplos gêneros, dada a sua
diversidade cultural e a possibilidade de, em contato com esses gêneros, inclusive a
notícia impressa, desenvolver e aprimorar sua capacidade de leitura, análise e, assim,
compreender o valor social da escrita, tendo claro que no texto jornalístico,
normalmente dá-se ênfase ao texto como instrumento de análise política, sociológica
e histórica.
Esse trabalho propiciou-nos, por fim, a compreensão efetiva do gênero
trabalhado e que, dessa forma, enquanto educadores, estaremos abrindo caminhos
para a formação de cidadãos ativos e conscientes, visto que auxiliaremos os alunos
na construção do conhecimento em relação ao gênero trabalhado, sem perder de
vista, no entanto, os conteúdos relativos à leitura, à oralidade, à análise linguística e à
produção escrita
Dessa forma, pela SD, o ensino da língua, baseado na exploração de
elementos específicos do gênero, auxiliou no crescimento do nível de compreensão
dos alunos, tanto no EF quanto no EM.
REFERÊNCIAS
AMOP, Associação dos Municípios do Oeste do Paraná. Sequência Didática: uma proposta de ensino de Língua Portuguesa para as séries iniciais. [Organizadoras: Carmem Terezinha Baumgärtner; Terezinha da Conceição Costa-Hübes]. Cascavel: Assoeste, 2007. Caderno 1.
AMOP, Associação dos Municípios do Oeste do Paraná. Sequência Didática: uma proposta de ensino de Língua Portuguesa para as séries iniciais. [Organizadoras: Carmem Terezinha Baumgärtner; Terezinha da Conceição Costa-Hübes]. Cascavel: Assoeste, 2007. Caderno 2.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
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