Uma Revisão Sistemática Sobre a Produção Científica

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    Uma revisão sistemática sobre a produção científicacom ênfase na relação entre saúde e meio ambiente

    A systematic review about the scientific productionwith focus on the relation between health and environment

    Silviamar Camponogara 1

    Ana Lucia Cardoso Kirchhof 1

    Flávia Regina Souza Ramos 1

    1 Departamento deEnfermagem, UniversidadeFederal de Santa Catarina.

    Campus Universitário,Trindade. 88040-970Florianópolis [email protected]

    427

    RE VI   S Ã 

     ORE VI  E W

    Abstract The discussion on points li nked to the interface between the envi ronment and health has 

    turned into a very important subject of i nterest 

    nowadays. Thus, thi s art icle aims to show a sur - vey of the nati onal and international scienti fi c 

    production about this subject, in an attempt to 

    ident i fy the most frequent themes of thi s produc- 

    ti on. The data were collected duri ng the months 

    of March and Apr il of 2005, from two homepages 

    where scient ifi c publ ications are available on the 

    web, from whi ch, 603 publicati ons were used as 

    analysis materi al, by means of categori zation. The 

    data showed that there is a very signi ficant num- 

    ber of count ri es with scienti fi c production on this 

    area, being the most frequent the USA and Rus- 

    sia, whose most relevant theme area is related to ri sk evaluation. Brazil appears as the thi rd most 

    frequent countr y in terms of production and most 

    of its work is directed to the study of vectors (trans- 

    mi tters) of infecting-contagious diseases. About 

    the other count ri es, there is a diversi fi cati on of 

    li nes of investi gation. In general, it is perceived 

    that the production of knowledge of this area sti ll 

    occurs in a very isolated and fragmented way, wi th 

    li tt le importance to the diversit y of factors in- 

    volved in the envi ronmental questi ons, as well as 

    with li tt le space to interdi scipl inary and inter sec- 

    torial work, so important in the analysis of the 

    interface health-environment Key words Health, Environment, Production of knowledge 

    Resumo A discussão de questões ligadas àinter- face ent re meio ambiente e saúde têm tomado 

    importante dimensão na atuali dade. Neste sent i- 

    do, este art igo busca apresentar um levantamen- to da produção científi ca nacional e internacio- 

    nal sobre o assunto, visando identi fi car as temá- 

    ticas mais freqüentes da referida pr odução. Os 

    dados foram coletados durante os meses de março 

    e abri l de 2005, junto a dois portais de busca de 

    publ icações científicas disponíveis na web, sendo 

    que 603 foram utili zadas como material de análi - 

    se, por meio de categorização. Os dados evidenci - 

    aram que háum número signifi cati vo de países 

    com produção científica na área, com suprema- 

    cia de produção norte-americana e russa, cuja 

    temática de maior relevância estárelacionada com 

    aval iação de r iscos. O Brasil aparece como tercei- 

    ro maior produtor, sendo que a maioria de sua 

    produção estádi recionada para o estudo de veto- 

    res transmissores de doenças infecto-contagiosas.

    Nos demais países, hádiversificação de linhas de 

    investigação. De uma forma geral, percebe-se que 

    a produção de conhecimento na área ainda ocor- 

    re de forma mui to isolada e fragmentada, sem 

    valori zar a diversidade de fatores envolvidos nas 

    questões ambientais, bem como sem dar espaço 

    para a interdiscipl inaridade e intersetori alidade 

    tão importantes na análise da interface saúde – 

    meio ambiente.Palavras-chave Saúde, Ambiente, Produção de conhecimento 

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       C  a  m  p  o  n  o  g  a  r  a ,

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      t  a

      l .

    Introdução

    Atualmente, a abordagem de questões da inter-face saúde e ecologia têm se tornado uma temá-tica importante para pesquisadores de diversasáreas do conhecimento, ao possibilitar a análisee a intervenção para preservar a vida no planeta.Embora a relação entre saúde e ecologia se façamais presente, quando da divulgação de situa-ções e eventos catastróficos e ameaçadores ou,quando dados alarmantes sobre a degradaçãoambiental são divulgados, percebe-se cada vezmais a necessidade de consolidar um corpo deconhecimentos científicos que permita evidenci-ar as implicações inerentes a este contexto, espe-

    cialmente no que tange a saúde humana.Segundo o entendimento de Freitas1, os pro-

    blemas ambientais são, simultaneamente, pro-blemas de saúde, uma vez que os seres humanose as sociedades são afetados em várias dimen-sões. De acordo com Porto2, alguns processoscolocam a questão ambiental em destaque, comoa crescente degradação ambiental e o reconheci-mento científi co dos chamados riscos ecológicosglobais, especialmente em regiões urbano-indus-triais que têm problemas como a poluição in-dustr ial, a previsão de escassez de recursos natu-

    rais básicos para produção e consumo das soci-edades industriais e a crescente pressão políticade novos movimentos sociais. Nesta direção,Augusto3 reforça o papel do movimento ecolo-gista, que trouxe uma perspectiva de revaloriza-ção do ambiente, inclusive como um componen-te da saúde, pela demonstração de situações denocividade geradas pelos processos produtivos eoutras atividades, que afetam negativamente asaúde e a biosfera e são dependentes dos mode-los hegemônicos de desenvolvimento econômi-co, de ciência e de tecnologia.

    Apesar de várias iniciativas, em nível mundi-al, que visaram à discussão desta temática e aformulação de políticas e estratégias que pudes-sem mobilizar vários segmentos da sociedade,inclusive governantes e pesquisadores, para a de-flagração de um movimento de preservação doplaneta, o que se percebe é que a crise ambientalestá instalada há décadas, com pouca resolutibi-lidade. No que tange a sua interface com a saúdedas populações, percebemos pouco engajamen-to do setor saúde no sentido de refleti r sobre estacrise, bem como de efetivar estratégias de açãono que se refere aos danos por ela provocados.

    Ainda assim, alguns pesquisadores e instituiçõestêm se esforçado em estabelecer esta discussão,tendo em vista a necessidade de buscar respostas

    para este contexto em que se exacerba a proble-mática ambiental.

    O debate está lançado, mas parece que os re-sultados ainda estão longe de serem alcançados.O processo histórico que permeia estas questões,relacionado, principalmente, com a visão dico-tômica entre o ser humano e a natureza, é refor-çado pelo modo de produção e acumulação derecursos econômicos. Além disso, por se tratarde uma questão relacionada com o futuro dahumanidade e do planeta, a discussão sobre saú-de e ecologia também não pode estar alijada desua inerente dimensão ética. De acordo com Bar-reto4, o for talecimento das explicações existentesentre o ambiente e a saúde pode auxiliar a con-

    testar não só a uma visão biologicista do fenô-meno saúde-doença, porém, mais do que isto,ao modelo industrial que se desenvolveu na crençade que a sociedade humana marcha para um pro-gresso isolado da natureza.

    Assim sendo, o desenvolvimento de pesqui-sas sobre esta temática, levando-se em conside-ração a complexidade que a envolve, tornou-seuma condição sine qua non  para a objetivação demelhor qualidade de vida para a humanidade epara o planeta, obviamente, no sentido de levar acabo a concepção de Morel5, quando afirma que

    tão importante quanto estabelecer prioridadesde pesquisa em saúde é a garantia de que esteconhecimento gerado resulte em intervenções efe-tivas ao nível de políticas públicas e privadas.

    Neste sentido, dada a importância desta te-mática, buscamos com este estudo fazer um le-vantamento da produção científica sobre saúdee meio ambiente, com o intuito de veri ficar temá-ticas mais freqüentes sobre a questão, em nívelnacional e internacional, e tecer reflexões quepudessem auxi liar a explicitar questões relevan-tes sobre a mesma.

    Metodologia

    O estudo caracteriza-se como descri ti vo simples,com fonte de dados documentais. Buscando umacoleta de dados o mais ampla possível, optou-sepor busca de informações, priori tariamente, naBiblioteca Virtual em Saúde (BIREME), por meiodo site www.bireme.br, a qual abarca vasta pro-dução cientí fica e também no banco de disserta-ções e teses do Portal Coordenação de Aperfeiço-amento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),

    por meio do site www.capes.gov.br. O levanta-mento de informações aconteceu durante osmeses de março e abril de 2005, utilizando-se

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    como descritores: meio ambiente, saúde, enfer-magem, desenvolvimento sustentável, ecologia,políticas publicas, ética, em ambas as fontes decoleta. Tais descritores foram cruzados, resultan-do em vasto volume de informações (superior a3.000 resumos). Optou-se, então, por analisarestudos datados entre 1993 a 2004, totalizandocerca de 2.000 resumos.

    Num segundo momento, houve uma apro-ximação com o material coletado, no sentido deverificar a sua apropriação como fonte de estu-do. Assim, foi feita uma leitura individual de cadaresumo, verificando a sua pertinência. Os resu-mos que mantinham relação com o objetivo dapesquisa foram catalogados, fazendo-se uma

    ordenação por tí tulo, tipo de publicação e perió-dico, país e data de publicação e área da publica-ção. No caso das dissertações e teses, estas foramordenadas conforme o título, insti tuição, área depublicação e data. Neste caso, somente foi possí-vel obter dados do Brasil, visto que as bases dedados internacionais não relacionam este tipo depublicação. Os resumos que não continham re-lação com o estudo em questão foram descarta-dos, tendo como motivo principal uma concei-tuação diferenciada de meio ambiente (ambientecomo local de cuidado, ambiente extraterrestre)

    ou não ter qualquer relação com a área da saúdeou meio ambiente. Como limitação, destacamoso fato de algumas publicações não possuíremresumo ou os mesmos não terem uma satisfató-ria descrição do estudo.

    Num terceiro momento, este corpo docu-mental passou por uma leitura ainda mais crite-riosa, a fim de extrair-se dos resumos a temáticaprincipal e sua vinculação, especialmente com aárea da saúde. Uma vez realizado o levantamen-to temático, foi possível fazer uma categorizaçãopor linhas de convergência, levando-se em con-sideração, primeiramente, a sua área, a saber:

    publicações da enfermagem, publicações gover-namentais e demais resumos. Após, face aindaao grande volume, especialmente da categoriageral, foi realizada uma aproximação, conformea quantidade de publicações, por país e/ou conti-nente.

     Esta categorização originou tabelas que per-miti ram fazer uma análise e discussão com a lite-ratura pertinente. No entanto, cabe destacar que,para este momento, foi preciso eleger os dadosprincipais, de modo a descrever a categoria geral,que contempla publicações da área da saúde e

    outras áreas do conhecimento, mas que busca-ram interface com a saúde.

    Apresentação dos resultados

    Num primeiro momento, serão apresentados osdados relativos aos resumos captados do portalda Biblioteca Virtual da Saúde, relativos a publi-cações categorizadas como gerais, uma vez queabarcam todas as publicações da área da saúde,excetuando-se as da área da enfermagem, numtotal de 499 publicações. Posteriormente, serãoapresentados os dados relacionados às disserta-ções e teses defendidas no Brasil e que têm comoorigem de captação o portal da Capes, contendopublicações de diversas áreas do conhecimento,totali zando 104.

     No que se refere ao país de publicação, o

    levantamento de dados permi tiu levantar publi -cações na área de saúde e ecologia produzidasem 42 países, trazidas na Tabela 1 apenas aquelascom maior expressão numérica.

    Verifica-se a posição de destaque do Brasil,em terceiro lugar, com 16% das publ icações, abai-xo apenas dos Estados Unidos e Rússia (23,2%cada um). Cabe destacar que, embora a catego-ria “Outros” abarque 16,6% da produção mun-dial, ela envolve um total de 33 países com menornúmero de publicações. Quanto ao ano de pu-blicação, evidencia-se que houve uma distribui-

    ção mais ou menos eqüitativa das publicaçõesno que se refere ao ano de publicação, havendouma média de 45,8 por ano, entre o período de1993 a 2004.

    Tabela 1. Países com maior número de publicações,na área de saúde e ambiente, durante o período de

    1993 e 2004.

    País

    EuaRússiaBrasilInglaterraHolandaChileCanadáUcrâniaItália

    OutrosTotal

    Número depublicações

    11611680461413111010

    83499

    Percentual

    23,223,216,009,202,802,602,202,002,0

    16,6100

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    A expectativa da pesquisa em verificar quaisas temáticas abordadas nos estudos possibilitouum agrupamento dos dados. No entanto, emface de grande quantidade de resumos seleciona-dos, foi necessário estabelecer um critério quepudesse agregá-los de uma forma mais abran-gente. Neste sentido, optamos por analisá-los apartir do país de publ icação, até para poder veri -ficar as temáticas nos diferentes países de publi-cação. Dado o volume de países e publicações noperíodo, optamos por apresentar os dados maissignificativos nos quatro países de maior publi-cação. O Quadro 1 apresenta as temáticas maisverificadas nos Estados Unidos da América, naRússia e Ucrânia (analisados conjuntamente ten-

    do em vista a proximidade geográfica, a seme-lhança de temáticas de estudo e o contexto políti -co que os aproxima, já que até 1991 integravamum único país), no Brasil e na Inglaterra.

    Ao observar-se a produção no conjunto des-tes países, pode-se verificar a emergência de te-máticas comuns a todos, como os três primeiros,que abarcam 235 produções (127 sobre Exposi-ção/avaliação de risco relacionada à degradaçãoambiental e poluição; 59 sobre Epidemiologia/ controle de vetores/saúde pública e 49 Urbaniza-ção) ou cerca de 34,5%. As maiores freqüênciasno conjunto dos países não coincidem, necessari-amente, com a freqüência em cada um deles e hátemáticas que são exclusivas ou compartilhadaspor apenas dois países. Nos Estados Unidos daAmérica, as investigações atinentes à exposição/ avaliação de risco relacionada a questões da de-gradação ambiental e poluição (27,5%) se focali-

    zam, principalmente, no uso de pesticidas e carci-nogênese, resíduos nucleares, resíduos de chum-bo, surgimento de doenças, desastres ecológicos,crescimento populacional, preservação da água,

    Quadro 1.Temáticas abordadas nas publicações sobre saúde e ecologia, publicadas nos Estados Unidos,Rússia/Ucrânia, Brasil e Inglaterra, no período de 1993 a 2004.

    Categorias

    Exposição/avaliação de risco

    Epidemiologia/controle de vetores

    Urbanização

    Aspectos conceituais e éticos

    relacionados (teorização)

    Políticas públicas/uso de referenciais

    sobre a questão ecológica

    Ecologia humana

    Educação em saúde e meio

    ambiente/ participação social

    Gestão ambiental em instituições

    Condição climática desfavorável

    Educação médica

    Produção científica em saúde e

    ecologia

    Gestão das águas

    Outros

    Total

    Freq

    32

    20

    22

    23

    11

    8

    116

    %

    27,5

    17,2

    18,9

    19,8

    9,48

    6,9

    100

    Estados Unidos

    Freq

    82

    2

    13

    11

    7

    3

    4

    4

    126

    %

    65

    1,58

    10,3

    8,7

    5,5

    2,3

    3,1

    3,1

    100

    Rússia/Ucrânia

    Freq

    4

    21

    5

    13

    20

    4

    8

    4

    1

    80

    %

    5,0

    26,2

    6,25

    16,2

    25,0

    5,0

    10,0

    5,0

    1,25

    100

    Brasil

    Freq

    09

    16

    09

    04

    08

    46

    %

    19,5

    34,7

    19,5

    8,6

    17,3

    100

    Inglaterra

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    expectativa de vida, preservação de recursos na-turais e promoção da saúde. Também aparecemestudos enquadrados como reflexões teóricas eéticas (19,8%), os quais abordam questões como:guerra nuclear, desenvolvimento sustentável, glo-balização, atenção primária, necessidade de pes-quisa na área, aumento populacional, políticaspúblicas. Em terceiro lugar, as produções relacio-nadas à urbanização totalizam 18,9% dos estu-dos, que estão relacionados também à avaliaçãode risco, poluição do solo, radiação e ao movi-mento cidades saudáveis. Cabe ressaltar que, sesomarmos esta categoria relacionada à urbaniza-ção com a primeira, que se refere à avaliação derisco e poluição ambiental, teremos um percen-

    tual de 46,4% dos estudos, representando umagrande maioria do total de produções neste país.Com um percentual menor (17,2%), aparecemestudos relativos à epidemiologia e ecologia devetores e surgimento de novas doenças infeccio-sas, os quais não estavam restritos somente a áreageográfica dos Estados Unidos propriamente dita,mas também envolviam estudos desenvolvidosna Áfr ica e América Latina. Dentre os vetores pes-quisados, podemos citar: Aedes taeni orhynchus,Aedes albopictus, Aedes aegypti , Aspergilus . As ca-tegorias restantes relativas às políti cas sobre eco-

    logia e saúde e utilização de referenciais teóricosdiferenciados sobre a questão ecológica e a cate-goria que abarca uma miscelânea de abordagenstotalizam os 16,38% restantes da produção. Nes-te caso, estão contemplados estudos que utilizamreferencias tais como: ecossocialismo, ecomarxis-mo, holismo e ecologia humana, relação entreecologia e saúde mental, agricultura sustentável,participação comunitária e formação de pessoalda saúde.

    Já na Rússia e na Ucrânia, as produções quese referem à exposição/avaliação risco ambientale a poluição (65%) têm como enfoque questões

    como: saúde ocupacional, risco nuclear, polui-ção por alumínio, mercúrio e outros metais pe-sados, estudos sobre a indústria química e aci-dentes químicos, estudos relacionados ao ozô-nio, efeito da poluição sobre o crescimento deadolescentes, poluição por uso de pesticidas, re-lação entre poluição e aberrações cromossômi-cas, transtorno mental, saúde reprodutiva, efei-tos sobre o sistema imunológico e alterações demucosas, doenças respiratórias, influência sobreo funcionamento endócrino e incidência de pie-lonefrite. No que se refere à relação entre ecolo-

    gia, saúde e urbanização, (10,3%) destacam-se omonitoramento ambiental e saúde e também asaúde da criança. Outros 8,7% dos estudos rela-

    cionam-se com a ecologia humana e 5,5% delesestão relacionados às regiões de condição climá-tica desfavorável, em especial, tendo como lócusà região da Sibéria e locais insalubres. Alguns es-tudos (3,1%) enfatizam a importância da pes-quisa sobre saúde e ecologia e outros 2,3% relaci-onam a educação médica com questões ecológi-cas. Apenas 1,5% dos estudos estão dirigidos paraa abordagem de questões epidemiológicas, rela-cionados à salmonelose e pediculose.

    Há uma diferenciação nas abordagens dosestudos brasileiros, em que 26,25% estão di rigi-dos à abordagem epidemiológica e de ecologiade vetores no que se refere à interface saúde eambiente. Dentre os vetores mais pesquisados,

    podemos citar:Triatoma infestans, Aedes aegypti ,Tri chophyton tonsurans, Aedes albopictus, Lut - zomya whitmani . Dentre as doenças mais evi-denciadas, destacam-se: tripanossomíase ameri -cana, cólera, esquistossomose, malária, leptos-pirose. Também aparecem estudos dirigidos àreflexão sobre políti cas públicas e meio ambiente(25%), os quais relacionam estas questões à qua-lidade de vida, desenvolvimento sustentável, glo-balização, participação social, saneamento e po-líticas para a Amazônia. No Brasil, também sedestacam estudos que se constituem em refle-

    xões teóricas e éticas (16,25%) sobre temas comopromoção da saúde e qualidade de vida, meioambiente e meio rural, interação ser humano-meio ambiente, interdisciplinaridade, alimentostransgênicos. Entre os estudos sobre urbaniza-ção (6,25%), o foco está dirigido para questõescomo qualidade de vida e políticas públicas, sa-neamento, surgimento de doenças infecciosas eatuação em Programa de Saúde da Família. Naseqüência, aparece um grupo de cinco categori-as; cada uma correspondente a 5% das publica-ções do país. Uma delas refere-se a estudos queabordam a questão da educação em saúde e meio

    ambiente, os quais focalizam esta temática doponto de vista da ética, das políti cas públicas e daparticipação comunitária, principalmente. Aquestão da participação social foi categorizadaseparadamente, tendo em vista que alguns estu-dos focalizam diretamente esta questão, comocondição sine qua non  para a efetivação de pro-postas de preservação do meio ambiente e pro-moção da saúde. A exposição a poluentes ambien-tais é foco para outros 5% dos estudos, sendoque questões como exposição ao mercúrio, aoamianto, a resíduos sólidos e praguicidas têm

    sido as mais enfatizadas.A produção bibliográfica da Inglaterra estádirigida, em parte (34,7%), para estudos epide-

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    miológicos e de ecologia de vetores no que tangea relação entre saúde e meio ambiente, emboraestes estudos não tenham como lócus prioritá-rio a Inglaterra, mas sim, países como Serra Leoa,Gâmbia, Moçambique e a questão da migraçãointernacional, direcionados para o estudo dedoenças como cólera e malária e referentes aosurgimento de novas doenças. Questões como aexposição a poluentes ambientais e a urbaniza-ção também aparecem nas publicações, cada umacorrespondendo a 19,5% dos estudos, sendo alvode investigação a guerra química, acidentes quí-micos e poluição radioativa e a exposição a polu-entes ambientais e câncer, desordens psicológi-cas em crianças e adolescentes e mortalidade in-

    fantil na América Latina. Cabe salientar que, sesomadas estas duas categorias, elas chegam aquase 40% da produção inglesa, o que gera umnúmero signif icativo de publicações. Outra par-cela das publ icações (8,6%) foi enquadrada comogestão das águas, relacionadas à construção debarragens e preservação de mananciais. Finali-zando, 17,3% das publicações da Inglaterra cor-respondem a uma diversificada gama de aspec-tos investigados, dentre eles: relação entre ecolo-gia e saúde mental, educação universitária, eco-logia como prioridade de pesquisa.

    Além destes países, outros 38 apresentampublicações na área, as quais estão apresentadasno Quadro 2, a partir de aproximações por con-tinente.

    Os países integrantes do agrupamento daAmérica Latina, excetuado o Brasil, são: Argenti-na, Chile, Equador, Bolívia, Costa Rica, México,

    Peru, Cuba, Porto Rico, Venezuela e Honduras.Estes países apresentam uma grande maioria depublicações (54%) relacionadas a reflexões teóri-cas e éticas sobre a temática saúde e ambiente, asquais enfocam questões como: manipulação dabiodiversidade, educação ambiental, desenvolvi-mento econômico e globalização, desenvolvimentosustentável, políticas públicas. Uma outra parceladas publicações (10,8%) está relacionada com es-tudos epidemiológicos e de ecologia de vetores,cujo direcionamento está apontado para a ecolo-gia doAedes aegypt i. Uma parcela pequena de es-tudos (8,1%) está relacionada com a participaçãopopular na gestão de questões ambientais e, ou-tra parcela igual de estudos, focaliza sua atenção

    para o uso de plantas medicinais. Uma categoriasignificativa de 19% das publicações envolve umconjunto diversificado de estudos relativos a: efei-tos da poluição ambiental sobre a saúde, quali-dade de vida e degradação do meio ambiente, pa-pel das universidades nas questões ambientais,não havendo produção significativa sobre avalia-ção de riscos, diferentemente do bloco europeu.

    O bloco europeu está constituído, neste estu-do, pelos seguintes países: Espanha, França, Ir-landa, Alemanha, Itália, Noruega, Suíça, Holan-da, Bélgica, Suécia, Polônia, Dinamarca, Bulgária,

    Romênia. A maior parte da produção destes paí-ses (44,6%) está relacionada com a categoria ava-liação de riscos, que abarca questões relativas aosefeitos da poluição ambiental sobre a saúde como:malformações, câncer, doenças respiratórias ecardiovasculares, sobre a saúde da criança, de-sastres ecológicos. Uma outra parcela dos estu-

    Quadro 2. Temáticas abordadas nas publicações sobre saúde e ecologia, publicadas na América Latina(exceto Brasil), Europa (exceto Inglaterra) e demais países, no período de 1993 a 2004.

    Categorias

    Avaliação de risco

    Reflexão teórica e ética

    Epidemiologia/ecologia de vetores

    Part icipação popular

    Uso de plantas medicinais

    Outros

    Total

    Freq

    -

    20

    04

    03

    03

    07

    37

      %

    -

    54,0

    10,8

    8,1

    8,1

    19,0

    100

    América Latina

    Freq

    25

    17

    14

    -

    -

    -

     56

      %

    44,6

    30,4

    25,0

    -

    -

    -

    100

    Europa

    Freq

    08

    17

    09

    -

    -

    04

    38

      %

    21,0

    44,7

    23,6

    -

    -

    10,5

    100

    Demais países

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    dos (30,4%), relaciona-se com reflexões teóricas eéticas sobre temas como: desenvolvimento sus-tentável, políticas públicas, degradação ambien-tal, preservação de mananciais de água, qualida-de de vida. Uma parcela menor das publicaçõesdiz respeito a questões ligadas à epidemiologia eecologia de vetores (25%), especialmente no quetange a cólera, malária, tripanossomíase.

    Fazem parte do grupo de países restantesaqueles que possuem poucas publicações e nãopuderam ser agrupados em bloco por área geo-gráfica, dentre eles: Japão, China, Coréia, Aus-trália, Índia, Israel, Egito, Tailândia. A maior partedos estudos publicados por estes países (44,7%)está enquadrada como reflexões teóricas e éticas

    relacionadas a: crescimento populacional, pre-servação ambiental, ação profissional e medici-na de família, conservação de recursos energéti-cos, gerenciamento de resíduos, indicadores derisco, educação em saúde. Uma outra parcela(23,6%) relaciona-se com a abordagem epide-miológica das questões atinentes à saúde e ecolo-gia, seguida por publ icações relacionadas à avali-ação de risco (21%), especialmente no que tangea poluição química e radioativa. Um percentualmenor (10,5%) abarca publicações diversas so-bre educação ambiental e agricultura ecológica.

    Os dados demonstrados a seguir referem-sea publicações coletadas da base de dados do por-tal CAPES, relativas às dissertações e teses pro-duzidas no Brasil, no período de 1993 a 2004.Foram captadas do sistema 104 produções, sen-do 67 (64,4%) dissertações e 37 (35,6%) teses.

    A maior parte destes estudos é oriunda deinstituições públicas do país. A Universidade deSão Paulo (USP) é a instituição que abarca amaior parte destes estudos (26,9%). Além da USP,a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) agrega13,4% das publicações, a Universidade Federalda Bahia (UFBA), 5,7% e a Universidade Federalde Santa Catarina (UFSC) , 4,8%. O restante dasproduções (50,8%) está distr ibuído entre outras25 instituições do país. A maior ia (50%), perten-ce à área da saúde coletiva e epidemiologia. Osdemais fazem parte de diversos programas depós-graduação nas áreas de: engenharia de pro-dução, fisiopatologia experimental, engenhariabiomédica, odontologia, fisioterapia, ecologia,

    ciências biológicas, educação física, psicologia,nutrição, ciências agrárias, arquitetura e urba-nismo, economia, história, filosofia, antropolo-gia, sociologia, comunicação, direito, geociências,geografia, educação.

    Quanto ao ano de publicação, verificou-seque a maior parte dos estudos foram publicadosa partir de 2000, provavelmente pelo incrementode programas de pós-graduação, ampliação donúmero de pós-graduandos ou mesmo valori-zação desta temática.

    A Tabela 2 evidencia as temáticas mais abor-

    dadas nas publicações brasileiras sob a forma dedissertação e tese. Quando a abordagem estáorientada para a epidemiologia e estudo da eco-logia de vetores (33,6%), destacam-se estudos dadengue, malária, enteroparositoses, esquistosso-mose, leishmaniose tegumentar, doença de Cha-

    Tabela 2.Temáticas mais prevalentes nas dissertações e teses sobre saúde e ecologia, publicadas no Brasil,no período de 1993 a 2003.

    Temática

    Epidemiologia/ecologia de vetoresAvaliação de risco e efeitos da poluiçãoReflexão teórica e filosóficaUso de referencias específicos da ecologia para abordar questões de saúdeUrbanizaçãoAgricultura sustentávelEducação em saúdeDestino do lixo

    Preservação ambiental e promoção da saúdeOutrosTotal

    Freqüência

    3517160707040403

    0308

    104

    Percentual

    33,616,315,36,76,73,83,82,8

    2,87,6100

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    gas, tuberculose, raiva humana, leptospirose, han-seníase, dentre outros. Na seqüência, com per-centual de 16,3%, aparecem os estudos que com-portam avaliação de risco no que se refere à po-luição ambiental, especialmente, efeitos sobre afunção respiratória, do uso de pesticidas e sobre asaúde do trabalhador. As reflexões teóricas e filo-sóficas são responsáveis por 15,3% dos estudos eabordam questões relativas à degradação ambi-ental, desenvolvimento sustentável na Amazônia,políticas públicas e participação social, preserva-ção de bacias hidrográficas e qualidade do solo,qualidade de vida. Cabe destacar que, uma parce-la destes estudos (6,7%), traz um arcabouço teó-rico relacionado à Teoria dos Sistemas Ecológicos

    de Bronfenbrenner, especialmente em relação aocrescimento e desenvolvimento infantil, qualida-de de vida do cliente revascularizado, saúde ocu-pacional e gravidez na adolescência. Uma parcelaigual dos estudos aborda questões relacionadas àurbanização e seus efeitos sobre o meio ambientee saúde da população. Questões relativas à agri-cultura sustentável e educação em saúde apare-cem nos estudos em menor escala, cada uma to-talizando 3,8% dos mesmos. Duas outras catego-rias, cada uma totalizando 2,8% dos estudos, re-ferem-se a estudos que abordam o destino do

    lixo e questões atinentes à preservação de áreasambientais e promoção da saúde. Finalizando,7,6% das produções restantes abarcam uma mis-celânea de estudos relacionados a: relação entredegradação ambiental e acidentes ofídicos, rela-ção entre o clima e a prática de atividades físicas,ecologia e desenvolvimento infanti l e uso de plan-tas medicinais.

    A partir destes resultados, verifica-se que aprodução de estudos relacionados a questõessobre saúde e ecologia, no Brasil e no mundotodo, envolve uma série de temas diversificados,embora seja possível desenvolver algumas apro-

    ximações e, a partir delas, fazer algumas inferên-cias. Neste sentido, o próximo item apresentauma análise comparativa sobre algumas catego-rias encontradas, ao mesmo tempo, especifican-do questões importantes em determinados paí-ses, buscando ainda elucidar alguns achados deacordo com a literatura pert inente.

    Discussão

    Da considerável variedade de publicações sobre

    saúde e ecologia no mundo inteiro, boa partedestas publicações está concentrada nos EstadosUnidos da América e Rússia/Ucrânia, conforme

    a Tabela 1. Embora estes países possuam centrosde pesquisa na área específica deste estudo, háque se considerar que possuem também um nú-mero razoável de periódicos que concentram pro-dução científica, não só do país de origem doestudo, como de outros, o que pode levar a umresultado falso no que se refere ao local de reali-zação dos estudos. Note-se que chama a atençãotambém o expressivo número de trabalhos rea-lizados pela Rússia e Ucrânia, países que referen-ciam muito em suas produções riscos relaciona-dos à radiação e o acidente nuclear de Cherno-byl. No caso do Brasil, podemos dizer que houveum aumento significativo das publ icações a par-tir do ano 2000, a exemplo das produções de dis-

    sertações e teses. Podemos pensar que este incre-mento esteja relacionado com maior envolvimen-to de centros e grupos de pesquisa com a ques-tão ambiental, tendo em vista que o debate sobrea temática tem se acirrado com o passar dos anos,bem como os agravos à saúde da população de-corrente dos danos ambientais. Embora a Ingla-terra represente o continente europeu com umaprodução científica de 9,2% do total mundial, osdemais países integrantes deste continente apre-sentam uma produção relativamente tímida di-ante do chamamento mundial que tem sido feito

    sobre a crise ambiental. Da mesma forma, pode-mos dizer que a produção científica mundial so-bre meio ambiente não é significativamente ex-pressiva, pelo menos no que tange a interface coma saúde, na medida em que apenas trabalhos iso-lados são publicados, caracterizando a carênciade centros e grupos de pesquisa realmente enga-

     jados com a questão.Além do exposto, outro aspecto que merece

    destaque são os direcionamentos que têm sidodados pelos diferentes países. Convém, é claro,ressaltar que as produções científicas, normal-mente, estão voltadas para as necessidades e de-

    mandas locais, no sentido de possibilitar a alme- jada intervenção prática. Entretanto, notam-sealgumas disparidades que podem estar relacio-nadas com outras questões subjacentes. Se anali-sarmos a produção científica americana, vere-mos que está mais direcionada à avaliação derisco relacionada à degradação ambiental e po-luição, semelhantemente a produção prevalecentena Rússia/Ucrânia e nos países do bloco euro-peu. No entanto, enquanto nos Estados Unidosa pesquisa sobre avaliação de risco está pulveri-zada entre diferentes riscos a que a sociedade está

    exposta, na Rússia e na Ucrânia, há um enfoqueprioritário para os efeitos da radiação sobre asaúde da população e, em especial, dos trabalha-

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    dores. Já a produção científi ca do Brasil e da In-glaterra está apontando para estudos e pesqui-sas que valorizem o enfoque epidemiológico ea ecologia de vetores, lembrando-se que a pro-dução inglesa a este respeito tem como lócus deinvestigação países da África. A produção priori-tária na América Latina e nos demais países nãoestá relacionada com investigações científi cas so-bre situações ou fatores determinados, mas cons-titui-se em reflexões teóricas e éticassobre aquestão, de forma mais abrangente.

    De uma forma geral, podemos considerar quealguns países assumem a prerrogativa de que vi-venciamos atualmente um novo estado de mo-dernidade – a sociedade de risco – como defen-

    dem alguns sociólogos modernos. Um deles,Beck6, identifica a sociedade de risco com umasegunda modernidade ou modernidade reflexi-va, que emerge de processos como a globaliza-ção e a individualização, tornando difusos os ris-cos globais, que se caracterizam por ter conseqü-ências de alta gravidade, desconhecidas em longoprazo e que não podem ser avaliadas com preci-são. Franco et al.7afi rmam que estamos na dire-ção da expansão progressiva dos riscos locais eglobais, que não obedecem a fronteira geopolíti -ca dos países, dado que suas conseqüências po-

    dem atingir todo o planeta.Tabellini8 reforça que os resultados científi-cos sobre as relações produção/ambiente/saúdemostram que hoje estão mais e orientados paraa questão da produção e do ambiente do quepara a saúde, mostrando que houve mudança defoco de atenção da doença e do sofrimento con-creto para a possibilidade de prever o sofrimen-to, sob orientação de teorias de risco. Ainda nes-te sentido, Porto2 constata que o debate cientí ficoem torno da questão ambiental e, mais especifi -camente, da relação saúde e ambiente, vem sen-do marcado pela tradicional divisão entre os en-

    foques oriundos das ciências naturais e da tecno-logia, de um lado, e das ciências sociais e huma-nas, por outro, revelando as limitações de qual-quer disciplina ou enfoque isolado para umacompreensão abrangente e articulada da relaçãoentre ambiente e saúde. Freitas1 reitera que há,na atualidade, uma espécie de formalização dosproblemas ambientais, os quais acabam por serreduzidos ao conceito de resolução através docálculo e tratados dentro da lógica das ciênciasnaturais. Argumenta que, embora tenham sidoobservados avanços do movimento ambiental

    nos países industrializados e da saúde coletivano Brasil, os quais incorporaram novas dimen-sões, ainda há uma predominância das ciências

    naturais na pesquisa e produção de conhecimentosobre o tema, com pequena incorporação dasciências sociais. Tambellini et al .9 concordam aoenfocar que o provável afastamento da área dasaúde ambiental das questões relativas à subjeti-vidade e às ciências sociais seja o responsável pelaquase exclusão da mesma no âmbito da saúdecoletiva, no Brasil. Sob um ponto de vista maisprático, enfatizam também que há uma série dequestões que dificultam o desenvolvimento deações na esfera da questão ambiental, tais como:baixa produção científica, déficit de recursos fi-nanceiros, desinformação da população e umaresistência interna do setor em ampliar respon-sabilidades.

    Com base nestes argumentos, questionamosa forma como estas produções têm sido, concei-tual e metodologicamente, encaminhadas, ten-do-se como pressuposto que a análise isolada deum determinado risco pode determinar um en-foque fragmentado do estudo, descontextuali-zando-o de toda a complexidade que o envolve.Este é o enfoque que parece prevalecer nas publi-cações brasileiras e inglesas, que além de aindapriorizar a epidemiologia e a ecologia de vetores,tendem a abordá-la de forma isolada, e, comomuitos dos próprios trabalhos referem, sem

    grandes repercussões em termos de efetiva inter-venção junto à população ou ao nível de polí ti caspúblicas. Segundo Augusto3, no caso do Brasil,isto pode ser explicado pela ausência de experi-ência e tradição da saúde pública em atuar porproblemas, restr ingindo-se praticamente ao efeito(por exemplo: doença, morte), reforçada poruma estrutura fragmentada e levando a umacompartimentalização das ações em saúde eambiente. Argumenta, entretanto, que o estudodos problemas socioambientais requer aborda-gens de tipo interdisciplinar e intersetoriais, comoforma de fazer frente à fragmentação do saber,

    que, historicamente, tem balizado as práticas depesquisa e as ações das políticas públicas. Segun-do a autora, enfrentar essa questão exige umareforma do pensamento que depende de ummodo novo de produzir conhecimento, um de-safio para a política de ciência e tecnologia emsaúde. Também nesta direção, Porto2 asseguraque uma das principais contribuições da questãoambiental reside justamente na possibilidade deavançar esta compreensão mediante abordagensinterdisciplinares e transdisciplinares, visandointegrar os aspectos qualitativos e quantitativos

    envolvidos nos problemas ambientais.No caso dos países que têm como publica-ções predominantes reflexões teóricas, podemos

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    tecer considerações com relação a sua disposiçãoem atingir as reais necessidades e demandas dapopulação. Embora estas reflexões sejam de sumaimportância, e apareçam como produção cientí-fica na maioria dos países, há que se ressaltar anecessidade de estudos que gerem intervençõesefetivas sobre a prática, a part ir de estudos inter-disciplinares que envolvam os vários setores atin-gidos pela questão de estudo. De acordo comJacobi10, a produção de conhecimento deve ne-cessariamente contemplar as inter-relações domeio natural com o social, incluindo a análisedos determinantes do processo, o papel dos di-versos atores envolvidos e as formas de organi-zação social que aumentam o poder das ações

    alternativas de um novo desenvolvimento, comênfase na sustentabilidade socioambiental.

    Entretanto, especificamente, enfocando a di-mensão ética dos estudos e reflexões, gostaría-mos de fazer um chamamento no sentido de queesta dimensão importante da questão ambientalaparece de forma isolada, como se não fosse umaquestão inerente a toda e qualquer discussão queenvolva a atual crise ambiental, independente-mente do país, do local ou do fato que esteja emevidência na publicação. Da mesma forma, po-demos refletir sobre a base conceitual que ancora

    esta ética, tendo em vista que, na atualidade, jánão devemos dar lugar a uma ética antropocên-trica, que perpetue a herança de dominação danatureza pelo homem. Devemos, sim, encontraro caminho da ética da revalorização do ambientenatural, em que ser humano e natureza sejamparte de um mesmo sistema complexo, dinâmi-co e interdependente.

    Ainda no que tange a esta questão, podemosfazer uma associação com a categoria de análisereflexão sobre políticas públicas, que apareceem países como os Estados Unidos, e, compara-tivamente, até de forma expressiva no Brasil, de

    forma a problematizar como estas reflexões têmsido feitas, e com que objetivo. Talvez, no casodo Brasil, estas reflexões sejam fruto de uma ne-cessidade de evidenciar que há uma lacuna noque se refere à existência de polí ticas públicas efe-tivas sobre saúde e meio ambiente; entretanto,também devemos considerar o nível de partici-pação social interposto nesta discussão e o im-pacto que ela terá junto a órgãos reguladores elegisladores da questão ambiental. Ainda nestesentido, merece maior destaque o fato de quesão raros os trabalhos no Brasil que buscam in-

    terfaciar esta discussão com o setor saúde, comose as pol íticas públicas sobre saúde e meio ambi-ente fossem uma prerrogativa apenas de outros

    setores da administração pública. Além disso, deacordo com Augusto3, os dados das publicaçõescientí fi cas disponíveis, referentes aos efeitos ob-servados na saúde, decorrentes de problemasambientais, em geral, são resultados de proces-sos de investigação científica desconectados deprogramas instituídos na esfera pública, tendocomo conseqüência estudos que, embora valio-sos, servem apenas como indicativos da pontado ‘iceberg” da realidade nacional. Freitas11 refereque há pouca associação entre problemas de saú-de, ambiente e suas dimensões sociais, políticas eeconômicas, estando as políticas mais centradasnos aspectos biológicos e biofísicos.

    Dentre os dados coletados, podemos igual-

    mente evidenciar a categoria urbanização, quese faz presente também na grande maioria dasproduções científi cas, especialmente nos EstadosUnidos, o que é considerado um dos fatores demaior impacto dos efeitos do meio ambiente so-bre a saúde das populações. No Brasil, notamosque a produção cientí fi ca sobre os efeitos da ur-banização ainda pode ser considerada tímida,fato que é mais notável ainda em países da Amé-rica Latina, Europa e demais, os quais não abor-dam a questão ou o fazem de forma muito inci-piente . De acordo com o entendimento de Au-

    gusto3

    , o atual perfil epidemiológico brasileirodestaca problemas de saúde relacionados com aurbanização e a industrialização, os quais ga-nham importância, tendo em vista que impõemàs populações novos padrões de consumo, con-dições sociais, econômicas e culturais; tratando-se de contextos complexos que, por sua diversi-dade, iniqüidade e estratégias de vida, afetamprofundamente a saúde humana.

     Finalizando esta análise sobre a produçãocientífica internacional, chamamos a atenção paraalgumas categorias presentes em publicações daRússia e Ucrânia, como ecologia humana, que

    aparece de forma mais evidente apenas neste país(aparece no Brasil, mas em pequena escala); e ascategorias pesquisa em saúde e ecologia e edu-cação médica e relação entre ecologia e saúde,sendo que estas últimas puderam ser agrupadascomo categoria somente nestes países. Nos de-mais, não há estudos que explicitem tal direcio-namento em seus descritores; no máximo, fo-ram encontradas discussões sobre a importân-cia da educação ambiental direcionada a escola-res ou público leigo em geral. Este fato é passívelde reflexão e análise, tendo-se em vista o impor-

    tante papel a ser desempenhado pelos profissio-nais da saúde no que se refere à satisfação denecessidades de saúde relacionadas a fatores

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    ambientais. Ao que parece, esta questão não temsido alvo de estudos para uma ampla maioriados pesquisadores mundiais. Talvez, esta neces-sidade ainda não tenha sido adequadamente evi-denciada pelos próprios trabalhadores da saúdee população em geral, ou por que persiste na pro-dução cientí fica internacional a tendência de en-focar o problema, a doença, o risco, e não o con-texto social em que ele se desenvolve, nem os re-cursos, de diversas naturezas, que são necessári-os para abordá-los (incluímos como recursos,neste caso, os profissionais da saúde, que sãoparte do micro e do macro contexto em que aproblemática ambiental está inserida).

    Neste sentido, Tambellini8 enfatiza, ao relaci-

    onar questões ambientais e saúde, que não deve-mos nos afastar do diálogo que a vida nos impõecomo trabalhadores da ciência e da saúde, o dia-logo entre as questões teórico-conceituais, as ques-tões da técnica, ou do método e da técnica, e asquestões da intervenção, que devemos retomarde forma a articular os aspectos que as compõem.Um entendimento semelhante é compartilhadopor Porto2, que enfoca a necessária busca de umdiálogo entre profissionais das áreas ambientais eda saúde e outros atores sociais, por meio de prá-ticas interdisciplinares e intersetoriais, como for-

    ma para a construção de um novo modelo dedesenvolvimento. Deduz-se daí uma estratégiapara a consolidação de novas formas de percebera interação entre sociedade e ambiente e, portan-to, de análise e superação dos problemas de saú-de e ambientais. Freitas11, ao realizar uma análiseda produção científica sobre saúde e meio ambi-ente em alguns periódicos nacionais, veri ficou quealguns textos apresentam, como estratégia paraviabilização de mudanças, um esforço dos pro-fissionais da saúde e meio ambiente em buscardiálogo com demais envolvidos, de forma parti-cipativa, interdisciplinar e intersetorial.

    Focalizando nossa análise, neste momento,para as dissertações e teses produzidas no Brasil,podemos evidenciar que há um aumento numé-rico, após o ano 2000, que tem como local prio-ri tário de desenvolvimento as insti tuições públi-cas do país, na área de saúde pública/coletiva,que historicamente tem se preocupado mais comestas questões. No entanto, podemos denotar agrande variedade de áreas do conhecimento quetêm buscado alguma forma de tangência com aquestão da interface entre saúde e meio ambien-te/ecologia.

    Podemos verificar que as temáticas acompa-nham uma propensão para estudos relacionadoscom a epidemiologia e ecologia de vetores, confe-

    rindo a tendência encontrada nas publicações doPortal Bireme. De acordo com Augusto3, no Bra-sil há um déficit de informações sistemáticas earticuladas que tratem dos riscos ambientais paraa saúde, bem como de outros agravos relaciona-dos com situações de risco ambiental, sendo osistema de vigilância epidemiológica para as do-enças infecto-parasitárias de notificação compul-sória e intoxicações agudas o único recurso decontrole disponível. Além disso, comparti lham domesmo enfoque metodológico e analítico, o quereduz a problemática ambiental brasileira, emgrande parte, ao viés epidemiológico, centrado nadoença, na maioria das vezes de forma alheia aocontexto social em que se insere.

    A análise destas produções brasileiras permi-te verificar também que há uma tendência empesquisar questões relativas à avaliação de riscosobre a saúde, fato não verificado na produçãodisponível no Portal Bireme, talvez devido aobaixo índice de publicação, mas que acompanhauma tendência mundial. De acordo com Augus-to3, a insuficiência de dados de investigações ci-entíficas sobre agravos à saúde decorrentes doscomponentes abióticos (poluição e liberação deenergia) no contexto brasileiro é responsável porimportantes lacunas de conhecimento, que pre-

     judicam a formulação de políti cas públicas paraa promoção, proteção e recuperação da saúde.No entanto, Camara12 revela uma espécie de aber-tura ao referir que, no Brasil, os estudos anteslimitados aos pesticidas hoje incorporam outrassubstâncias tais como: metais pesados (mercú-rio e chumbo), benzeno, situações causadas pe-los desastres químicos e acúmulo de resíduosperigosos, além dos poluentes atmosféricos.

    Reflexões teóricas e filosóficas aparecem en-tre as produções, bem como o uso de referenci-ais específicos para abordar a questão, tal como:Teoria dos Sistemas Ecológicos de Bronfenbren-

    ner, que evidenciamos como mais uti lizado, o quedenota a busca por um arcabouço teórico quepossa auxi liar a refleti r sobre os resultados e, tal-vez, pela superação da histórica dicotomia que,além de separar o homem da natureza, o colocanuma situação de dominador em relação a ela.Outras questões relacionadas à destinação do l ixo,agricultura sustentável, educação ambiental epromoção da saúde são pouco expressivas, per-mit indo inferi r que, embora muito importantes,ainda não refletem uma preocupação efetiva paraos pesquisadores. Heller13, ao comentar os estu-

    dos sobre o destino do lixo, enfatiza que a rela-ção entre resíduos sólidos domiciliares e saúdeconstitui uma área onde poucos pesquisadores

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    se debruçaram em entender, em demonstrar,como essa associação ocorre, quais são as situa-ções de risco.

    De uma forma geral, segundo a FundaçãoNacional de Saúde (FUNASA)14, as ações especí-ficas do setor saúde tradicionalmente se concen-tram sobre os efeitos dos problemas ambientais,bem como sobre a sistematização e análise dessasinformações, por exemplo, por meio de estudosepidemiológicos descritivos sobre a distribuiçãode certas doenças na população. No entanto, es-ses efeitos são apenas as conseqüências finais paraa saúde humana de um longo processo, onde vá-rios determinantes e condicionantes gerais atua-ram sobre certas regiões e grupos populacionais.

    A superação deste modelo requer uma ampliaçãode ações em favor da promoção, possibilitandorelacionar os efeitos à saúde com determinadosfatores ambientais, antes mesmo que os efeitospossam surgir; e a integração destes resultadoscom ações de promoção, proteção e prevenção,contribuindo para a construção de um desenvol-vimento humano que incorpora as necessidadesambientais e sanitárias às dimensões econômicase sociais. Conforme Augusto3, a ausência aindade uma política institucionalizada e de um siste-ma de vigilância em saúde e ambiente, no âmbito

    do Sistema Único de Saúde, tem sido um fatorlimitante para a operacionalização de ações efeti-vas em relação aos problemas ambientais que afe-tam a saúde.

    Considerações finais

     A análise da produção científica sobre saúde eecologia, em nível nacional e internacional, permi-tiu-nos ter uma visão abrangente das temáticasque têm direcionado os estudos sobre esta ques-tão tão importante na atualidade, bem como das

    limitações e possibilidades que lhe são inerentes.De uma forma geral, podemos reiterar a com-

    plexidade que envolve a crise ambiental e a pro-ximidade com a área da saúde, a partir de umavisitação aos inúmeros espaços e atores que elapermeia no extenso tecido social. Infelizmente,verificamos que ainda existem muitas lacunas aserem preenchidas, no sentido do desenvolvi-mento de estudos e pesquisas que possam darrespostas efetivas sobre determinados problemasambientais e, o que é mais importante, que pos-sam repercutir em termos de viabilidade de es-tratégias e ações eficazes. Além disso, esta inves-tigação possibil ita confirmar o fato de que mui-tos estudos ainda se valem, exclusivamente, deum modelo de investigação centrado no proble-ma, na conseqüência, de forma fragmentada e

    reducionista. Ainda não encontramos o cami-nho da investigação que possa contemplar, mi-nimamente, um olhar que integre as várias di-mensões que envolvem a questão ambiental, bemcomo de dar vozes aos diversos atores sociaisenvolvidos. Parece que a integração entre as ciên-cias naturais e as ciências humanas, a interdisci-plinaridade e a intersetorialidade ainda está dis-tante de nossa prática de pesquisa.

    Com isso, cabe destacar a pouca ênfase quetem sido dada, nestes estudos, ao papel do setorsaúde e dos seus profissionais no que se refere à

    crise ambiental. De acordo com Augusto3

    , a com-plexidade é apontada como fundamental comoperspectiva de mudança no modelo clássico deabordagem desta questão, o que, juntamente coma internalização do ambiente como inseparávelda saúde, se constitui em demanda planetária noséculo XXI.

    Neste sentido, com este estudo, reafirma-se aimprescindibilidade de incorporar a dimensãoambiental como inerente ao desenvolvimento deações de saúde, a qual deve ser revista desde aformação profissional, como forma de possibi-litar a sua concretização em ações cotidianas em

    saúde, incluindo a participação efetiva na for-mulação de políticas públicas.

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