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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO MARIZA CANJIRANO DA COSTA POSSIBILIDADES DE ARTICULAÇÃO DOS OSTENSIVOS E NÃO OSTENSIVOS NO ENSINO DA NOÇÃO DE SISTEMAS DE DUAS EQUAÇÕES LINEARES E DUAS INCÓGNITAS MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA SAO PAULO 2008

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO

MARIZA CANJIRANO DA COSTA

POSSIBILIDADES DE ARTICULAÇÃO DOS OSTENSIVOS E NÃO

OSTENSIVOS NO ENSINO DA NOÇÃO DE SISTEMAS DE DUAS

EQUAÇÕES LINEARES E DUAS INCÓGNITAS

MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

SAO PAULO 2008

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO

CONSELHO DA PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA

MARIZA CANJIRANO DA COSTA

POSSIBILIDADES DE ARTICULAÇÃO DOS OSTENSIVOS E NÃO

OSTENSIVOS NO ENSINO DA NOÇÃO DE SISTEMAS DE DUAS

EQUAÇÕES LINEARES E DUAS INCÓGNITAS

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Universidade Bandeirante de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação Matemática , sob a orientação da Profa.Dra. Marlene Alves Dias .

SAO PAULO 2008

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C874p Costa, Mariza Canjirano Possibilidades de articulação dos ostensivos e não ostensivos no

ensino da noção de sistemas de duas equações lineares a duas

incógnitas/Mariza Canjirano da Costa – São Paulo: [s.n], 2008.

179; il .; 31 cm

Dissertação de Mestrado – Programa de Pós Graduação em

Educação Matemática, Universidade Bandeirantes de São Paulo.

Orientador: Marlene Alves Dias.

1.Sistemas de equações lineares e duas incógnitas 2. Ostensivos

e não ostensivos 3. Níveis de conhecimento 4.Domínio ou Quadros 5.

Pontos de vista I. Título

CDD: 372.7

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MARIZA CANJIRANO DA COSTA

POSSIBILIDADES DE ARTICULAÇÃO DOS OSTENSIVOS E NÃO OSTENSIVOS NO

ENSINO DA NOÇÃO DE SISTEMAS DE DUAS EQUAÇÕES LINEAR ES A DUAS

INCÓGNITAS

DISSERTAÇÃO APRESENTADA À UNIVERSIDADE BANDE3IRANTE DE SÃO

PAULO COMO EXIGÊNCIA DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E M

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Presidente e Orientador

Nome:_________________________________________________________________

Titulação:______________________________________________________________

Instituição:_____________________________________________________________

Assinatura:_____________________________________________________________

2ª Examinador

Nome:_________________________________________________________________

Titulação:______________________________________________________________

Instituição:_____________________________________________________________

Assinatura:_____________________________________________________________

3ª Examinador

Nome:_________________________________________________________________

Titulação:______________________________________________________________

Instituição:_____________________________________________________________

Assinatura:_____________________________________________________________

Nota Final:___________

Biblioteca

Bibliotecário:__________________________________________________________

Assinatura:_____________________________________________Data____/___/___

São Paulo, ____ de _____________________ de 2008.

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Ao meu esposo, Val. Á minha irmã Maurinda e sobrinha Bruna.

Aos meus queridos pais, Mario e Maria.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me concedido esta oportunidade na vida.

A minha orientadora, professora Doutora Marlene Alves Dias, pela extrema

competência, paciência, dedicação e criticas construtivas dessa dissertação e o meu

crescimento com o aprendiz de pesquisador.

À professora Dra.Verilda Speridião Kluth, que participou da minha qualificação dando

sugestões que permitiram melhorar o trabalho aqui apresentado.

Ao professor Dr. Ruy César Pietropaolo e a professora Dra. Tânia Maria Mendonça

Campos pela atenção e compreensão que muito contribuíram para este trabalho.

A minha família pelo apoio e incentivo nas horas que mais precisei.

Agradeço em especial, á minha família. Minha mãe e pai querido, que sempre

acreditaram em meu potencial, apoiando-me em todos os momentos de minha

trajetória. A minha irmã e minha sobrinha pelo estimulo para vencer mais uma batalha e

ao meu esposo Valdete, por compreender minha ausência em alguns momentos, pelo

incentivo, compreensão e estimulo.

Aos colegas e professores do Programa de Mestrado da Uniban, pelo apoio e troca de

experiências.

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“Alguns viajaram pelo mundo todo, mas nunca tiveram coragem ou habilidade para

viajar para dentro de si mesmos...”

(Augusto Cury)

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RESUMO

COSTA, M. C. Possibilidades de articulação dos ostensivos e não ostensivos no ensino da noção de sistemas de duas equações linear es e duas incógnitas. 2008. 179f. Programa de Pós Graduação em Educação Matemática, Universidade Bandeirante de São Paulo, São Paulo, 2008. O objetivo desse trabalho é mostrar as escolhas para o ensino da noção de sistema de duas equações lineares a duas incógnitas, para a sétima série do Ensino Fundamental, nível II, via documentos oficiais e verificar quais os diferentes tipos de tarefas são propostas nas diferentes épocas, desde a década de 50 ao século XXI. Sendo assim, para o desenvolvimento da pesquisa, escolhe-se como referencial teórico central a abordagem antropológica de Chevallard e Bosch (1999) e como referenciais teóricos de apoio os trabalhos de Robert (1997) sobre os três níveis de conhecimentos esperados dos estudantes; Douady (1984,1992) sobre articulações de domínios ou quadros; Rogalski (1995) sobre a noção de pontos de vista e Tavignot (1991) para o organograma de apresentação geral das obras analisadas. Após um rápido estudo do trabalho de Chevallard e Bosch (1999) analisa-se, via Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental (1998) e Proposta Curricular do Estado de São Paulo (1991), o “topos” esperado do professor e do estudante. Na seqüência, constrói-se uma grade de análise para a noção de sistemas de duas equações lineares a duas incógnitas levando-se em conta o referencial teórico escolhido. Essa grade, devendo servir de ferramenta para a análise das escolhas em termos dos ostensivos e não ostensivos, nas diferentes décadas, através de livros didáticos. Para isso, são escolhidos, aleatoriamente, oito livros didáticos para a análise institucional existente nas décadas escolhidas. Na conclusão dessas analises verifica-se a inexistência de um trabalho que tente mostrar o papel que desempenha a noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, principalmente, quando esse serve apenas para facilitar o trabalho matemático em jogo. Palavras-Chave : Sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas. Ostensivos e não ostensivos. Níveis de conhecimentos. Domínio ou quadros. Pontos de vista.

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ABSTRACT

COSTA, M. C. Ostensive and the not ostensive possibilities of jo int of in the education of the notion of systems of two linear eq uations two incognito. 2008. 179f. Master’s Dissertation – Graduated Program in Mathematics Education. University Bandeirante de São Paulo, São Paulo, 2008.

The aim of this paper is to show the choices of two incognitos to the teaching of the notion of the system of two linear equations, to the seventh series of Brazilian basic education, level II, through official documents and to verify which of the different types of tasks are proposed at the different times, since the 50’s to XXI century. Thus, for the development of this research, the anthropological theory of Chevallard and Bosch (1999) was chosen as central theoretical reference. As support references were chosen: Robert (1997) about the three levels of student knowledge; Douady (1984,1992) about articulation of domains or tables; Rogalski (1995) about the notion of point of view and Tavignot (1991) for the organization chart of general presentation of the analyzed reference works. After a fast analysis of the work of Chevallard and Bosch (1999), according National Curricular Parameters of Brazilian Basic Teaching (1998) and Curricular Proposal of the State of São Paulo (1991), the summits of the teacher and the student were done. After this, an analysis scheme was done, regarding the chosen theoretical reference, about the notion of systems of two linear equations of the two incognitos. This scheme was used as a tool for the analysis of the choices of ostensive and the not ostensive terms, in the different decades, through didactic books. Concerning this, eight didactic books were chosen for the institutional analysis in the chosen decades. Concluding, there is not a work that tries to show the role that has the notion of systems of two linear equations of two incognitos, mainly, when this serves only to make the mathematical work easy.

Keywords : Systems of two linear equations of the two incognitos. Ostensive and not ostensive. Levels of knowledge. Domain or tables. Points of view.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................................1

CAPÍTULO 1 .....................................................................................................................6

A abordagem antropológica e sua importância para a análise das articulações possíveis

na introdução de uma noção matemática

1.1 Considerações Iniciais..............................................................................................6

1.2 A abordagem antropológica de Chevallard e Bosch (1999).....................................7

CAPÍTULO 2 ...................................................................................................................39

O “topos” do aluno e do professor via parâmetros curriculares nacionais e Proposta

Curricular do Estado de São Paulo: a noção de sistemas de equações lineares

2.1 Considerações Iniciais.........................................................................................39

2.2 Os Parâmetros Curriculares Nacionais................................................................41

2.3 A Proposta Curricular do Estado de São Paulo...................................................53

2.4 Considerações Finais...........................................................................................63

CAPÍTULO 3 ...................................................................................................................69

Possibilidades de articulação dos ostensivos e não ostensivos no ensino da noção de

sistemas de duas equações lineares a duas incógnitas

3.1 Considerações Iniciais ........................................................................................69

3.2 As noções didáticas utilizadas para construção da grade...................................70

3.3 A grade de análise ..............................................................................................73

3.4 Exemplos de funcionamento da grade ................................................................75

3.5 Considerações Finais ..........................................................................................94

CAPÍTULO 4 ...................................................................................................................98

A evolução do ensino da noção de sistemas de duas equações lineares a duas

incógnitas via análise de livro didático

4.1 Considerações Iniciais ......................................................................................98

4.2 A análise da obra de Iezzi et al 2005 ...........................................................101

4.3 Comentários e Análise........................................................................................102

4.4 A parte do professor e do aluno.........................................................................105

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4.5 A análise da obra de Castrucci et al, 2002 ................................................109

4.6 Comentários e Análise..................................................................................110

4.7 A parte do professor e do aluno...................................................................114

4.8 A análise da obra de Iezzi et al 2000 .........................................................117

4.9 Comentários e Análise..................................................................................118

4.10 A análise da obra Di Pierro Neto 1991 ....................................................119

4.11 Comentários e Análise...............................................................................120

4.12 A parte do professor e do aluno..................................................................128

4.13 A análise da obra de Scipione Di Pierro Netto 1982..............................130

4.14 Comentários e Análise................................................................................131

4.15 A parte do professor e do aluno..................................................................137

4.16 A análise da obra de Scipione Di Pierro Netto 1971 ..............................140

4.17 Comentários e Análise................................................................................141

4.18 A parte do professor e do aluno..................................................................148

4.19 A análise da obra de Osvaldo Sangiorgi 1966 .......................................149

4.20 Comentários e Análise................................................................................150

4.21 A parte do professor e do aluno..................................................................155

4.22 A análise da obra de Sinésio de Farias, 1959 ........................................157

4.23 Comentários e Análise................................................................................158

4.24 A parte do professor e do aluno..................................................................167

4.25 Considerações Finais.................................................................................168

CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS FUTURAS .............................171

CONSULTAS E REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS ..........................................176

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INTRODUÇÃO

No papel de professora do Ensino Fundamental II, é possível observar que,

quando se introduz a noção de sistemas lineares de duas equações e duas incógnitas

para estudantes da sétima série, as tarefas propostas parecem ser as mesmas que se

propunham há pelo menos 20 anos, quando eu era aluna.

A noção de sistemas de equações lineares é uma ferramenta matemática

importante tanto para os estudantes do ensino médio como para os do ensino superior,

pois além de permitir a modelagem de diversas situações matemáticas das outras

ciências e do cotidiano, ela também possibilita a articulação de outras noções

matemáticas, desde o Ensino Fundamental até o superior. Pode-se citar, como

exemplo, sua aplicação em questões da engenharia, de álgebra linear e de equações

diferenciais.

Certamente, essas aplicações não se reduzem aos sistemas de duas equações

e duas incógnitas, mas a escolha dessa noção particular está relacionada ao fato dela

permitir uma introdução da noção de sistemas lineares que quando bem explorada,

permite discutir as possibilidades de soluções dos sistemas de equações lineares,

assim como algumas de suas aplicações.

Sendo assim, procura-se compreender melhor as escolhas para o tratamento

dessa noção na sétima série do Ensino Fundamental II, a fim de verificar como suas

diferentes possibilidades são exploradas nessa etapa da escolaridade.

Dessa forma, estuda-se neste trabalho, a relação institucional esperada, via

análise dos documentos oficiais: Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) e Proposta

Curricular do Estado de São Paulo (1991), e a relação institucional existente em

diferentes décadas, via livros didáticos referentes a essas épocas. Ou seja, o estudo

aqui proposto tenta compreender a ecologia1 das diferentes tarefas e técnicas

encontradas nas diferentes décadas.

Inicia-se, assim, este estudo, a partir do seguinte questionamento: 1 Ecologia de tarefas e técnicas: as condições e os empecilhos que permitem a produção e utilização nas instituições.

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2

- Como se aborda a noção de sistema de duas equações lineares e duas

incógnitas nas diferentes décadas?

- De que instrumentos os professores dispõem para efetuar suas escolhas?

- Quais são os ostensivos e não ostensivos em jogo nas diferentes

abordagens, conforme definição de Chevallard e Bosch (1999)?

- Em que sistema de tarefas e práticas é possível desenvolver os ostensivos e

não ostensivos escolhidos?

- Quais são as condições e empecilhos que favorecem ou atrapalham sua

utilização?

- Quais são as escolhas institucionais para a sua utilização?

Na tentativa de responder às questões acima, após o estudo bibliográfico das

obras encontradas, observa-se a existência de alguns trabalhos de pesquisa sobre as

noções de equações e inequações, mas não encontramos trabalhos específicos sobre

sistemas de equações lineares, em particular, sobre os sistemas de duas equações

com duas incógnitas, o que aumentou o nosso interesse por desenvolver uma pesquisa

específica sobre essa noção matemática.

O estudo bibliográfico conduziu-nos a escolher a abordagem antropológica de

Chevallard e Bosch (1999) como referencial teórico central para a análise das relações

institucionais esperadas e existentes no o ensino da noção de sistemas de duas

equações lineares e duas incógnitas na sétima série do Ensino Fundamental II. Nos

dedicamos, em particular, ao exame dos ostensivos e não ostensivos privilegiados, nas

diferentes décadas para o ensino dessa noção matemática.

Dessa forma, o objetivo do estudo da relação institucional esperada e existente

para o ensino da noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, via

documentos oficiais e, principalmente, livro didático, é verificar quais são os diferentes

tipos de tarefas propostas nas diferentes décadas quais técnicas são privilegiadas e

quais podem ser utilizadas para justificar o trabalho matemático em jogo, isto é, que

discurso tecnológico é empregado para auxiliar o estudante a desenvolver as diferentes

tarefas que lhe são propostas.

Além disso, para compreender melhor que papéis o professor e o estudante

devem desempenhar no processo de ensino e aprendizagem, escolhe-se a noção de

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“topos” introduzida por Chevallard (1997), que permite analisar o que se espera do

professor e do estudante, tanto em relação aos conhecimentos prévios necessários

quando se introduz um novo conceito matemático, como em relação às atividades e

atitudes necessárias para que se desenvolva o trabalho matemático em jogo nas

tarefas que competem a cada um deles.

Escolhido o referencial teórico da pesquisa, em função dos objetivos propostos

acima, fez-se um estudo das diferentes tarefas de aplicação da noção de sistemas de

duas equações lineares e duas incógnitas possíveis de serem exploradas nessa etapa

da escolaridade. Levantou-se assim, um conjunto de seis tarefas que são analisadas

em função de suas variáveis, dando-se ênfase aos ostensivos e não ostensivos

possíveis para a sua solução, às mudanças de quadro ou domínio, conforme

abordagem teórica de Douady (1984, 1992), e aos pontos de vista, conforme definição

de Rogalski (1995), que podem ser utilizados na sua solução e estão relacionados aos

três níveis de conhecimento esperados dos estudantes, conforme abordagem teórica

de Robert (1997).

Para melhor compreender como as diferentes ferramentas didáticas podem

auxiliar o trabalho matemático em jogo no desenvolvimento das tarefas encontradas,

constrói-se uma grade de análise.

Essa grade serve tanto para examinar as necessidades em termos de ostensivos

e não ostensivos possíveis, quando se introduz a noção de sistemas de duas equações

lineares e duas incógnitas na sétima serie do Ensino Fundamental II, como para a

análise dos oito livros didáticos representantes de diferentes décadas, que foram

escolhidos, aleatoriamente, em função das dificuldades de se encontrar materiais

didáticos antigos. Pretendia-se fazer um estudo utilizando as obras de um mesmo autor,

mas somente para três décadas foi possível manter este critério.

Além disso, a grade serve de ferramenta para a análise dos livros didáticos,

permitindo compreender quais tarefas são supostas a cargo do professor e quais são

destinadas aos estudantes, que níveis de conhecimento se espera desenvolver pela

introdução da noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas e qual é

o “topos” esperado do professor e do estudante, para que se atinja o nível de

conhecimento desejado.

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Desta forma, para a apresentação do trabalho desenvolvido, no capítulo 1 faz-se

um estudo detalhado do artigo “La sensibilité de l´activité mathématique aux ostensifs »

de Chevallard e Bosch (1999), ressaltando a importância da análise antropológica que

permite considerar as noções de ostensivos e não ostensivos presentes na atividade

humana, em particular na Matemática. Tais noções são essenciais para a realização de

tarefas associadas a uma determinada prática institucional e permitem compreender a

importância das técnicas, que, por meio de um discurso tecnológico adequado, podem

ser planejadas, justificadas e controladas no desenvolvimento do trabalho matemático

em jogo, que depende das possíveis abordagens de uma mesma noção, em função dos

ostensivos utilizados e dos não ostensivos que as justificam.

No capítulo 2, para analisar e compreender o papel esperado do professor e do

estudante da sétima serie do Ensino Fundamental II, escolhemos-se analisar dois

documentos oficiais, quais sejam, os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) e a

Proposta Curricular do Estado de São Paulo (1991).

Para auxiliar na análise dos documentos acima mencionados, considerou-se a

noção de “topos” introduzida por Chevallard (1997), que permite compreender o papel

esperado do professor e do aluno pelas instituições, tanto em função dos ostensivos e

não ostensivos que devem ser mobilizados para a solução das diferentes tarefas que

lhes são propostas, como para o trabalho pessoal que se espera que cada um deles

seja capaz de desenvolver.

Sendo assim, constrói-se uma grade de análise que é apresentada no capítulo 3

e que serve de instrumento para a análise dos livros didáticos descrita no capítulo 4.

Essa análise é feita com base em um organograma, elaborado conforme

descrição de Tavignot (1991), em que apresentamos uma visão geral do livro didático

analisado, seguida de um comentário e análise do trabalho proposto pelo autor e de

uma tabela em que as seis tarefas propostas são analisadas em função da quantidade

que corresponde ao “topos” do professor - tarefas resolvidas -, e da quantidade que

corresponde ao “topos” dos estudantes - tarefas propostas.

Sendo assim, para a noção de sistemas de equações lineares, objeto

matemático desta pesquisa, considerando as tarefas resolvidas como parte do

professor e as tarefas propostas como parte do aluno, identifica-se, por meio da

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aplicação da grade de análise, quais são os tipos de tarefas que se supõem

privilegiadas pelo professor, se existe uma coerência entre as tarefas resolvidas e as

tarefas propostas e quais são os ostensivos e não ostensivos em jogo que fazem parte

do “topos” do professor e do estudante.

Para esta análise, escolhem-se oito livros didáticos, que variam em função da

década de sua edição, ou reedição. Os livros analisados são aqueles que encontramos

no decorrer do desenvolvimento da pesquisa.

Na conclusão, é possível observar que houve uma melhor delimitação do estudo

da noção de sistemas de equações lineares, em que a ênfase é dada aos sistemas de

duas equações lineares e duas incógnitas, mas esse estudo não se limita apenas ao

caráter ferramenta de solução de tarefas da própria matemática, de outras ciências ou

do cotidiano. Ou seja, seu caráter objeto também é destacado pela exploração e

discussão das possíveis soluções dos sistemas, possibilitando ainda uma mudança de

quadros que visualizar geometricamente essas possíveis soluções.

Observa-se ainda que entre as décadas analisadas, houve um momento (década

de 50) em que se estudavam os sistemas de equações lineares de m equações e n

incógnitas, mas o nível privilegiado era apenas o nível técnico. Essa época é seguida

por uma abordagem na qual se privilegia o objeto matemático e não se consideram as

situações de aplicação do conhecimento em jogo – abordagem característica da época

da Matemática Moderna (década 60).

Pode-se dizer que a partir da década de 70, aqui analisada por meio da obra de

Scipione, se inicia uma articulação entre o caráter ferramenta e o caráter objeto dos

sistemas de duas equações e duas incógnitas, que vem sendo empregado até o

presente.

É importante observar que a articulação considerada é feita por meio de uma

mudança entre os quadros algébrico e geométrico, não exigindo um trabalho

fundamentado nas estruturas de grupo aditivo, multiplicativo, abeliano, anel e corpo,

como se propunha na época da Matemática Moderna.

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CAPÍTULO I

A ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA E SUA IMPORTÂNCIA PARA A

ANÁLISE DAS ARTICULAÇÕES POSSÍVEIS NA INTRODUÇÃO DE

UMA NOÇÃO MATEMÁTICA

1.1 Considerações Iniciais

Esta pesquisa visa estudar abordagens diferenciadas da noção de sistemas de

equações lineares apresentadas em livros didáticos indicados para a sétima série do

Ensino Fundamental II, na tentativa de compreender como as escritas, símbolos,

palavras, grafismos e gestos são mobilizados e explorados nas atividades propostas

por diferentes autores. Faz-se também a análise da dialética que se estabelece entre

noções, conceitos e idéias por meio do desenvolvimento desse conteúdo, dos tipos de

tarefas que são propostas e das técnicas que são privilegiadas pelos autores. São

discutidas outras técnicas que poderiam ser utilizadas e/ou acrescentadas para justificar

o desenvolvimento desse conteúdo nessa etapa escolar2.

Além disso, tentar-se-á verificar que discurso tecnológico pode ser utilizado para

auxiliar o estudante a desenvolver as diferentes tarefas que lhe são propostas, uma vez

que este discurso está associado às tarefas, técnicas, tecnologias e teorias das

diferentes organizações praxeológicas construídas do saber matemático.

Esta relação entre as características material e perceptível da atividade

matemática e as noções, conceitos e idéias que a compõem é encontrada no trabalho

“A sensibilidade das atividades matemáticas aos ostensivos – objeto de estudo e

problemática” de Chevallard e Bosch (1999) que será o referencial teórico central desta

pesquisa.

A seguir, apresenta-se o referencial teórico que fundamentou o desenvolvimento

desta pesquisa e que servirá como ferramenta para a análise das tarefas encontradas

2 Os significados aqui utilizados para tarefas, técnicas, tecnologias ou discurso tecnológico s são os definidos por Chevallard e Bosch (1999) e que serão discutidos ainda neste capítulo.

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nos livros didáticos escolhidos, que, habitualmente, são propostas aos estudantes da

sétima série do Ensino Fundamental.

1. 2 A abordagem antropológica de Chevallard e Bosc h (1999)

Para a realização deste estudo, tomou-se como referencial teórico central o

trabalho desenvolvido por Chevallard e Bosch (1999) sob o título “A sensibilidade das

atividades matemáticas aos ostensivos – objeto de estudo e problemática”, que trata da

relação entre as características material e perceptível da atividade matemática e das

noções, conceitos e idéias que a compõem. Além disso, os autores discutem sobre o

discurso utilizado na proposta e desenvolvimento de tarefas, as técnicas, as tecnologias

e as teorias das diferentes organizações praxeológicas construídas do saber

matemático.

No artigo anunciado acima, Chevallard e Bosch (1999) iniciam definindo a

didática das matemáticas3 por meio dos trabalhos de Brousseau (1986, 1994, 1995),

definições que são apresentadas na citação abaixo, pois permitem compreender melhor

como evoluiu o objeto de estudo desta ciência, lhe dando o status atual. Chevallard e

Bosch evidenciam que a “didática das matemáticas” que a princípio estudava as

práticas matemáticas escolares se estende quando se leva em conta as condições de

difusão dos saberes matemáticos úteis para as instituições da humanidade e seus

membros, como é possível observar no texto a seguir:

A teoria das situações situa a didática das matemáticas “no quadro de uma

ciência das condições da produção e da difusão dos saberes úteis para as

sociedades e para os afazeres dos homens" (BROUSSEAU, 1995, p.4, apud

CHEVALLARD e BOSCH, tradução nossa). Um texto anterior deixa mais clara

a definição: Chamamos “Didáticas das matemáticas" a ciência das condições

específicas de difusão (imposta) dos saberes matemáticos úteis aos membros

e às instituições da humanidade” (BROUSSEAU, 1994, apud CHEVALLARD e

3 Didática das matemáticas : A ciência didática das matemáticas é considerada na França como um campo científico autônomo que estuda os processos de transmissão e aquisição dos diferentes conteúdos da álgebra, da geometria, da aritmética, da análise, etc. se preocupando particularmente com as especificidades destes conteúdos. Existem outras concepções da didática das matemáticas francesa que coexistem com a considerada acima. (ARTIGUE, notas de curso, 1992, tradução nossa).

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BOSCH, tradução nossa), se lembramos que no início a didática se propunha a

estudar “as atividades que têm por objeto o ensino, evidentemente, no que elas

têm de especifico às matemáticas" (BROUSSEAU, 1986, p.35, apud

CHEVALLARD e BOSCH, tradução nossa), vemos quanto a definição do

objeto de estudo se estendeu progressivamente, além das práticas

matemáticas escolares (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.79, tradução

nossa).

Ao considerar esta evolução Chevallard, Bosch e Gascon definem a didática das

matemáticas como “a ciência do estudo e da ajuda ao estudo das (questões das)

matemáticas” (CHEVALLARD, BOSCH e GASCON, 1997, p.79, apud CHEVALLARD e

BOSCH, tradução nossa).

Além disso, Chevallard e Bosch argumentam que o objeto de estudo que permite

caracterizar a didática das matemáticas como ciência, ressaltando que esta não está

centrada no estudo do aluno, nem do professor, mas do saber matemático que eles

pretendem trabalhar em conjunto, isto é, a partir de uma análise detalhada deste saber,

é possível estabelecer um projeto comum de atividades a realizar, como mostra o texto

abaixo.

Acreditamos que o que fundamenta e caracteriza a didática enquanto ciência

não é o fato de propor um projeto de estudo científico dos problemas de

ensino das matemáticas. Sua singularidade originária consiste em considerar

como objeto primeiro a estudar (e portanto, a questionar, modelar e

problematizar segundo as regras da atividade científica), não o sujeito aluno ou

o sujeito professor, mas o saber matemático que eles pretendem estudar em

conjunto, assim como a atividade matemática que seu projeto comum de

estudo lhes conduzirá a realizar. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.79,

tradução nossa)

Considerando o saber matemático como referência para o estudo da didática das

matemáticas, Chevallard e Bosch situam a matemática como sendo a essência dos

fenômenos didáticos, e a didática das matemáticas como a ciência que explicita os

modelos utilizados e os submete à prova criando o que ele chama de “epistemologia

experimental”.

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9

Nesse paradigma anterior4 antes dominante, podemos considerar que o

projeto, que inaugura a teoria das situações criou uma primeira ruptura

colocando a matemática como a essência dos fenômenos didáticos. A vontade

de elaborar uma ciência desses fenômenos constitui então a segunda ruptura,

que conduz a explicitar os modelos utilizados para submetê-los à prova dos

fatos , isto é, as leis de uma verdadeira "epistemologia experimental

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.80, tradução nossa).

Para exemplificar esta epistemologia experimental, Chevallard e Bosch (1999)

utilizam a teoria das situações de Brousseau (1994) explicitando a relação desta teoria

com o conhecimento matemático.

Chevallard e Bosch esclarecem que a noção de situação fundamental é a

principal ferramenta da teoria das situações para caracterizar os conhecimentos

matemáticos, pois é ela que permite descrever o conhecimento matemático:

[...] Somos, muitas vezes, levados a considerar que, na teoria das situações, a

noção de situação fundamental serve, antes de tudo, para descrever e fabricar

situações de ensino, mesmo de ensino escolar na classe. Esquecemos, então

que essa noção constitui - também e sobretudo - o instrumento chave que

propõe essa teoria para caracterizar os conhecimentos matemáticos [...]. Para

analisar o ensino e a aprendizagem de uma noção matemática, a teoria das

situações coloca primeiro o problema de sua descrição, problema que

devemos responder em termos de situações fundamentais. A hipótese da

existência de uma situação fundamental específica de cada conhecimento

matemático não é, aqui, uma declaração de otimismo que queria a engenharia

didática, mas a própria definição do conhecimento matemático que nos propõe

essa teoria. Descrevemos um conhecimento em termos de situação: um

conhecimento é uma situação. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.80 – 81,

tradução nossa)”.

Ao explicitar a relação entre a teoria das situações e o conhecimento

matemático, Chevallard e Bosch consideram um principio teórico fundamentado no que

4 Paradigma anterior : estudo das práticas matemáticas escolares. Paradigma atual : estudo das condições de difusão dos saberes matemáticos para as instituições da humanidade.

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eles chamam de modelo geral das matemáticas, isto é, os conhecimentos matemáticos,

em geral, podem ser descritos por meio de situações fundamentais que permitem a

construção e a difusão dos conhecimentos associados a um determinado conteúdo

matemático.

Temos aqui um principio teórico fundamentado sobre um modelo geral das

matemáticas, segundo o qual os conhecimentos matemáticos podem ser

descritos com a ajuda de situações fundamentais (definidas como jogos

formais). Esse modelo geral deve, então permitir a construção de modelos

locais dos diferentes conteúdos matemáticos que vamos ensinar a fim de

colocar em evidência as condições de construção e de difusão dos

conhecimentos que lhe são associados. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.81,

tradução nossa).

Em seguida, Chevallard e Bosch resumem a teoria das situações de Brousseau

mostrando sua importância na compreensão da transposição didática que coloca o

saber (“sábio", "ensinado" ou “a ensinar") como a origem de toda problemática didática.

Segundo Chevallard e Bosch a teoria das situações supõe que é possível

aprender os conhecimentos matemáticos por meio de atividades.

Observamos enfim que, em relação ao ponto de vista clássico sobre o saber

matemático, a teoria das situações fornece ainda uma nova ruptura

epistemológica fundamental. Ela supõe, com efeito, que se pode aprender os

conhecimentos matemáticos por meio das atividades que elas permitem

realizar, portanto os problemas que elas permitem resolver. (CHEVALLARD e

BOSCH, 1999, p.81 – 82, tradução nossa).

Para Chevallard e Bosch essas atividades são estruturadas e podem ser

trabalhadas nas diferentes fases propostas pela teoria das situações:

[...] As matemáticas não são simplesmente um sistema conceitual, logicamente

consistente e produtor de demonstrações: elas são em primeiro lugar uma

atividade que se realiza em situação e contra um meio. Trata-se, além disso,

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de uma atividade estruturada, que podemos retirar diferentes fases - ação5,

formulação6 e validação7, às quais se juntam devolução e institucionalização8.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.81, tradução nossa)

Após esta breve apresentação da importância da teoria das situações para a

aprendizagem matemática, Chevallard e Bosch mostram como a transposição didática

pode contribuir para a construção do conhecimento e a relevância do saber matemático

(‘sábio”, “ensinado” ou “a ensinar”), pois estes são a origem de toda a problemática da

didática. Segundo eles, esse saber deve ser questionado e as pesquisas em didática

dependem do tipo da teoria ou abordagem da didática da Matemática escolhida, o que

Chevallard e Bosch denominam de modelagem da matemática considerada.

Nesse sentido, a noção de transposição didática deve ser interpretada como a

possibilidade de desenvolver a dupla ruptura epistemológica provocada pela

teoria das situações. Porque sua principal contribuição não é somente

colocar em evidência a distância que separa o saber sábio do saber ensinado,

e portanto as transformações necessárias que deve ser submetido todo objeto

matemático para poder ser ensinado. O que mostra, a noção de transposição

didática, é que o saber matemático (seja “sábio", "ensinado" ou “a ensinar") é a

origem de toda problemática didática. Segue, então, que esse saber não pode

ser tomado como um dado inquestionável e que as pesquisas em didática das

5 Situação de Ação (aquisição de conceitos e procedimentos): São aquelas em que os alunos se engajam em um processo de ação para resolver um problema, isto é, os alunos se apropriam do problema a partir de seus conhecimentos anteriores, utilizam procedimentos implícitos, a finalidade do trabalho do aluno é resolver corretamente a tarefa e a finalidade do trabalho do professor é permitir que os alunos se apropriem de um procedimento. 6 Situação de formulação (aquisição de vocabulário): São aquelas que conduzem os alunos a formular as soluções encontradas assim como os teoremas ou regras que regem a situação, isto é, os alunos explicitam (oral, escrito) os procedimentos e as soluções. 7 Situação de validação (se convencer e convencer os outros): São aquelas em que os enunciados produzidos anteriormente serão submetidos a uma validação, esta se apóia sobre os “feed-backs” fornecidos pelo meio ou por meio de argumentos intelectuais que não dependem da autoridade do professor. Brousseau (1986) observa que mesmo se a validação tem um papel importante na construção dos saberes matemáticos é difícil identificar situações de validação que respeitam os empecilhos indicados acima, e ainda mais difícil e administrá-los. Os alunos devem se convencer e convencer os outros que a solução é válida. 8 Situação de institucionalização (professor): São aquelas para as quais os conhecimentos que os alunos construíram passam ao plano do saber, isto é, ao nível institucional. O professor deve identificar novos saberes e saber-fazer, estabelecer as convenções de linguagem, homogeneizar os conhecimentos da classe, estabelecer os saberes construídos, os que devem ser apropriados pelos alunos e suas formas. Disponível em: <http://icar.univ-lyon2.fr/equipe2/master/data/cours_A3S/Theorie_des_situations_2.pdf>. Acesso em 02/03/2008 às 17h38min.

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matemáticas são condicionadas pelo tipo de modelagens da matemática a que

recorremos [...] (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p. 82, tradução nossa).

Após mostrar a evolução da didática das matemáticas, situar a teoria das

situações e a noção de transposição didática em relação a essa evolução, Chevallard e

Bosch passam a definir as noções que integram o que eles chamam de modelagem

antropológica da matemática. Para eles essas noções são os instrumentos operatórios

para a análise das práticas sociais em matemática.

Em seu artigo “Concepts Fondamentaux de la didactique: perspectives apportées

par une approche anthropologique” Chevallard (1992) já havia proposto o início de uma

axiomática teórica da antropologia do conhecimento, introduzindo a noção de objeto.

Em 1999, tomando como ponto de partida, a mesma noção de objeto e introduzindo os

objetos instituição e posição dos indivíduos na instituição, Chevallard e Bosch situam a

didática das matemáticas no terreno da antropologia cognitiva.

Chevallard e Bosch iniciam definindo objeto9 e, em particular os objetos

instituição10, indivíduos11 e posições dos indivíduos nas instituições12 como mostra o

texto abaixo.

Os desenvolvimentos anteriores, que inscrevem definitivamente a didática no

terreno da antropologia do conhecimento (ou antropologia cognitiva), afinam a

axiomática de teorização enriquecendo notadamente o domínio de realidade

que essa ambiciona levar em conta. O ponto de partida permanece o mesmo:

tudo é objeto. Mas, distinguimos, apesar disso, os tipos de objetos particulares:

as instituições, os indivíduos e as posições que estes ocupam nas instituições.

Ocupando essas posições, os indivíduos tornam-se os sujeitos das instituições

- sujeitos ativos que contribuem em fazer viver as instituições pelo fato mesmo

9 Objeto : Em seu artigo “Concepts fondamentaux de la didactique”, Chevallard introduz sua teoria sobre os conceitos fundamentais da didática considera que os objetos ocupam uma posição privilegiada nesta teoria, pois eles são o material e a base desta. Observando que para ele tudo é objeto. (CHEVALLARD, 1992, p.86, tradução nossa) 10 Instituição : As instituições são tipos particulares de objetos. (CHEVALLARD, 1992, p.86, tradução nossa) 11 Individuos : Os individuos também são tipos particulares de objetos. (CHEVALLARD, 1992, p.86, tradução nossa) 12 Posição dos indivíduos nas instituições : “Um objeto existe no momento em que uma pessoa X ou uma instituição I reconhece esse objeto como existente (para ela). Mais precisamente, diremos que o objeto O existe para X (respectivamente, para I) se existe um objeto, que indicarei R(X, O) (resp.RI(O)), que denominarei relação pessoal de X a O (resp. relação institucional de I a O). Em outros termos, o objeto O existe se existe pelo menos uma pessoa X ou uma instituição I, isto é, pelo menos uma pessoa ou uma instituição tem uma relação com este objeto.” (CHEVALLARD, 1992, p.86, tradução nossa)

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de estarem sujeitos a essas instituições. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999,

p.83, tradução nossa).

Em seguida, Chevallard e Bosch (1999) consideram a noção de relação com,

mostrando que esta noção permite analisar as práticas sociais que se realizam em uma

instituição.

O conhecimento13 - e o saber14 como uma certa forma de organização dos

conhecimentos - entra, então, em cena com a noção de relação: um objeto

existe, se existe uma relação com esse objeto, isto é, se um sujeito ou uma

instituição o " (re)conhecer" enquanto objeto. Sendo dado um objeto (por

exemplo, um objeto do saber) e uma instituição, a noção de relação com envia

às praticas sociais que se realizam na instituição e que colocam em jogo o

objeto em questão, ou seja, " o que se faz, na instituição, com esse objeto".

Conhecer um objeto é ter o que fazer com - e sempre ter o que fazer com -

esse objeto. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.83, tradução nossa)

Para o caso particular do saber matemático, Chevallard e Bosch consideram que

a atividade matemática pode ser condicionada por instrumentos materiais, visuais,

sonoros e tatuais que ela utiliza, isto é, uma atividade em que se utilizam os diferentes

sentidos.

Para esses autores, o saber matemático, como forma particular de

conhecimento, é fruto das práticas sociais das matemáticas e necessita de um método

que permita estudar e descrever as condições de realização dessas práticas como se

observa no texto abaixo.

O saber matemático, enquanto forma particular de conhecimento, é, portanto,

fruto da ação humana institucional: é qualquer coisa que se produz, se utiliza,

se ensina ou, mais genericamente, se transpõe nas instituições. Mas, a

matemática, é, ainda, um termo primitivo, substância de algumas práticas

institucionais – as práticas sociais das matemáticas. O que falta, é a

elaboração de um método de análise das práticas institucionais que permitem

13 Conhecimento : “ [...] conhecer um objeto O, no sentido da teoria apresentada (e não no sentido das diversas instituições que ele deve nos permitir estudar), é – para uma pessoa como para uma instituição – ter uma relação com O.” (CHEVALLARD, 1992, p.87, tradução nossa) 14 Saber: (explícitos, conscientes, públicos) institucionalizados. (CHEVALLARD, 1992, p.86, tradução nossa )

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a descrição e o estudo das condições de realização. (CHEVALLARD e

BOSCH, 1999, p.83, tradução nossa)

Dessa forma, Chevallard e Bosch introduzem os primeiros termos da

antropologia cognitiva, isto é, as noções de (tipo de) tarefa, (tipo de) técnica, tecnologia

e teoria, observando que estas noções permitem modelar as práticas sociais, em geral

e, em particular, à atividade matemática.

Para esses pesquisadores o termo técnica é considerado em um sentido amplo,

como uma “maneira particular de fazer”, e não segundo a acepção comum de

procedimento estruturado e metódico, mesmo algorítmico – que é um caso particular da

técnica. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p. 84, tradução nossa). Já para as

tecnologias ou discurso tecnológico das tarefas ou das técnicas eles tomam o

seguinte significado: “um discurso descritivo e justificativo das tarefas e técnicas que

denominamos de tecnologia da técnica” (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.86,

tradução nossa).

Esses autores consideram as teorias das técnicas como construções por meio

de um discurso descritivo e justificativo das tecnologias. (CHEVALLARD e BOSCH,

1999, p.86, tradução nossa). Já as organizações praxeológicas “se associam às

condições que pesam sobre sua construção e sua “vida” normalizada tanto nas

instituições de ensino como nas de produção, utilização ou transposição” (ARTAUD,

1998, apud CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.87, tradução nossa).

Os autores se baseiam na idéia de que toda prática institucional pode ser

analisada de maneiras e pontos de vista distintos, por meio de instrumentos teóricos,

num sistema de tarefas bem definidas. Nesse sentido, se expressam dizendo que:

Os primeiros termos da antropologia cognitiva que nos lembramos acima vem

aqui se juntar às noções de (tipo de) tarefa, (tipo de) técnica, tecnologia e

teoria. Essas noções permitem modelar as práticas sociais em geral e, em

particular, às atividades matemáticas. Partimos para isto de um primeiro

postulado segundo o qual toda prática institucional é possível de ser analisada

de diferentes pontos de vista e de diferentes maneiras, em um sistema de

tarefas relativamente bem circunscritas, que se dividem no fluxo da prática.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.84, tradução).

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A seguir, os autores mostram a necessidade restringir a noção de tarefa e

introduzir a idéia de técnica, para a qual consideram alguns exemplos em matemática e

não matemáticos, habitualmente utilizados no cotidiano.

Observam também a questão da delimitação das tarefas em uma determinada

prática institucional.

O problema da delimitação das tarefas em uma determinada prática

institucional fica aberto e variará segundo se adota o ponto de vista da

instituição onde se desenvolve a prática ou ainda aquele de uma instituição

exterior para a qual observamos a atividade para descrevê-la com um objetivo

preciso. A semântica da palavra fica, portanto, aberta e engloba atividades

culturalmente diversas como as de tocar uma peça de Mozart no piano,

calcular o produto de dois naturais [...] (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.84,

tradução nossa)

Para Chevallard e Bosch a noção de técnica é ampla e por meio de exemplos

eles mostram que executamos várias técnicas cotidianamente.

Tudo, portanto, não é tarefa, existe em toda instituição atividade não analisada

em tipo de tarefa, e cuja menção por meio de verbos de ação de acepção mais

ampla (por exemplo “calcular”, “demonstrar”, etc.) deixa o conteúdo mal

definido – falamos então de gênero de tarefa. A noção de tarefa vai se tornar

restrita, com efeito, pelo segundo postulado, que supõe que o cumprimento de

toda tarefa resulta da operacionalização de uma técnica. Aqui, ainda, pode-se

entender o termo técnica no sentido amplo, como uma “maneira particular de

fazer”, e não segundo a acepção comum de procedimento estruturado e

metódico, mesmo algorítmico – que é um caso particular da técnica. Existe,

com efeito, técnicas para resolver equações do segundo e do terceiro grau,

mas também para fazer demonstrações por recorrência, para abrir portas, para

se procurar uma informação por telefone (ou na Internet), para ler um jornal,

para escrever um artigo de pesquisa, para rever sua lição, para fazer ficar

quietos os alunos no início das aulas, etc. Colocamos assim em execução,

cotidianamente, um grande número de técnicas, com um sucesso mais ou

menos grande. Pois toda técnica tem uma extensão limitada, uma vez que ela

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nos permite agir em certos casos e não em outros (tal equação não pode ser

fatorada, a maçaneta desta porta é ao contrário, hoje os alunos estão muito

falantes, etc.) (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.84, tradução nossa).

Após definir tarefa e técnica, os autores observam que existe um amplo conjunto

de tarefas que sobrevivem nas instituições e para as quais, normalmente existem

técnicas que lhes são associadas, como é possível observar no texto que segue.

A vida institucional é feita de um amplo conjunto de tarefas, cumpridas

segundo “maneiras de fazer” institucionalizadas, lei do mínimo que tende a

identificar todo tipo de tarefa à técnica normalmente utilizada na instituição

para cumprir tarefas deste tipo.” (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.84,

tradução nossa).

Além da definição de técnica e da apresentação de exemplos, Chevallard e

Bosch estabelecem o que eles denominam relação institucional a um objeto para uma

dada posição institucional, o que lhes permite considerar a noção de relação pessoal a

um objeto, ou seja, essa relação depende do conjunto das tarefas que devem ser

cumpridas e das técnicas que lhes são associadas em uma determinada instituição.

[...] a relação institucional a um objeto, para uma dada posição institucional é

elaborada e (re)elaborada pelo conjunto de tarefas que devem ser cumpridas,

por técnicas determinadas, pelas pessoas ocupando esta posição. É assim que

o cumprimento das diferentes tarefas que a pessoa se vê conduzida a realizar

ao longo de sua vida nas diferentes instituições, em que ela é o sujeito

sucessivamente ou simultaneamente, conduzirá a fazer emergir a relação

pessoal ao objeto considerado. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.85,

tradução nossa).

Verifica-se assim, que a relação pessoal a um objeto depende da instituição em

que o sujeito se encontra num determinado momento, o que poderá conduzir a várias

relações de um mesmo sujeito com um mesmo objeto ou de diferentes sujeitos com um

mesmo objeto.

Segundo os autores, o par: tarefas e técnicas institucionais gera um fenômeno

de naturalização, pois as tarefas, em geral, são rotineiras e as técnicas utilizadas para

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cumpri-las, mesmo que um dia tenham sido construídas, terminam também se tornando

rotineiras, não existindo qualquer problema para sua utilização.

Mas, mesmo nesta rotina institucional aparecem tarefas problemáticas, para as

quais não existem técnicas apropriadas. Isto, em geral, ocorre para novos tipos de

tarefas (para o sujeito e para a instituição) ou para aquelas que a técnica habitualmente

empregada não funciona.

Sendo assim, é necessária a construção de uma técnica adequada ou a

adaptação de uma técnica antiga ou ainda a criação de uma técnica inédita, o que

resulta numa evolução ou num progresso imposto pelo fato de se encontrar uma tarefa

problemática.

Segundo Chevallard e Bosch, em geral, a situação antropologicamente mais

freqüente é abandonar a problemática da tarefa ao invés de estudar o problema com o

objetivo de encontrar a técnica que falta. A esse respeito, a proposta dos autores é a de

não abandonar o problema, mas de partir justamente de tarefas problemáticas e tentar

produzir uma técnica que permita resolvê-la como é possível verificar no texto abaixo.

[...] Partimos assim de um tipo de tarefas problemáticas – por exemplo ”Como

resolver uma equação do segundo grau?” , “Como medir o tempo?”, ”Como

contar o número de pessoas em uma multidão?”, Como introduzir a noção de

número decimal?”. Se isto ocorrer, chegamos, após um processo de estudo

mais ou menos longo, a produzir as técnicas que permitem fornecer as

respostas às questões inicialmente colocadas. Um novo “saber-fazer” é

construído, que devemos ainda organizar para lhe assegurar um

funcionamento regular nas instituições. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.85,

tradução nossa).

Com base nessa idéia, os autores consideram o terceiro postulado antropológico

que concerne à ecologia das tarefas e técnicas, isto é, as condições favoráveis e os

empecilhos que permitem a utilização, nas instituições, de novas técnicas que foram

produzidas ou adaptadas para a resolução de tarefas problemáticas. Essas condições e

empecilhos levam à necessidade de se estabelecer um discurso descritivo e justificativo

das tarefas e técnicas ou discurso tecnológico, que Chevallard e Bosch denominam

tecnologia das técnicas.

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[...] Supomos que, para poder existir em uma instituição, uma técnica deve

aparecer como compreensível, legível e justificável. Trata-se aqui de um

empecilho institucional mínimo para permitir o controle e garantir a eficácia das

tarefas cumpridas, que são geralmente, tarefas cooperativas, supondo a

colaboração de vários atores. Este empecilho ecológico implica então na

existência de um discurso descritivo e justificativo das tarefas e técnicas que

denominamos de tecnologia da técnica. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.86,

tradução nossa)

Ao justificar o postulado acima enunciado, Chevallard e Bosch definem a noção

de teoria ou justificativa das tecnologias, isto é, as teorias são construídas por meio de

um discurso descritivo e justificativo das tecnologias, o que lhes permite ressaltar que a

distinção entre técnica, tecnologia e teoria é funcional e está associada a uma tarefa.

[...] O postulado anunciado implica que toda tecnologia tem necessidade de

uma justificação, que denominamos teoria da técnica e que constitui seu último

fundamento. A distinção técnica/ tecnologia/ teoria é funcional e deve sempre

se referir ao tipo de tarefas que tomamos como ponto de referência.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.86, tradução nossa)

Os exemplos dados, a seguir, por Chevallard e Bosch permitem compreender o

funcionamento da ferramenta (tarefa, técnica, tecnologia e teoria) e sua dependência

em função da tarefa analisada.

Assim, a determinação do sinal do discriminante de uma equação do segundo

grau pode ser um elemento de uma técnica de resolução deste tipo de

equações, mas ele pode também ser considerado como um ingrediente

tecnológico visando explicar e justificar um tipo de técnica mais elementar

fundamentada na escrita e fatoração de uma diferença de dois quadrados.

Inversamente, o que, num dado momento ou numa dada instituição, aparece

como a justificação de uma certa técnica, pode também ser considerado, em

outro momento, como uma tarefa (a tarefa consistindo em justificar uma

técnica), que supõe execução de uma técnica particular e a elaboração de um

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ambiente tecnológico-teórico conveniente. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999,

p.86, tradução nossa)

Após definir tarefas, técnicas, tecnologias e teorias, Chevallard e Bosch

explicitam a noção de organização praxeológica (ou praxeologia) pontual, local, regional

ou global que são o conjunto de técnicas, tecnologias e teorias para as praxeologias

pontuais. As praxelogias locais correspondem ao amálgama das praxeologias pontuais

conforme seu elemento amalgamante esteja associado às tecnologias para as locais,

às teorias para as regionais e posição institucional para as globais como definição e

exemplos apresentados no texto a seguir.

Um complexo de técnicas, tecnologias e teorias organizadas em torno de um

tipo de tarefa forma uma organização praxeológica (ou praxeologia) pontual. O

amálgama de várias praxeologias pontuais criará uma praxeologia local, ou

regional ou global, segundo o que o elemento amalgamante é,

respectivamente, a tecnologia, a teoria ou a posição institucional considerada.

Se consideramos, por exemplo, o ensino das matemáticas no “collège15” (na

França), podemos falar de uma organização praxeológica pontual em torno da

resolução de tal tipo de problema de proporcionalidade – organização que

poderia responder à questão “Como resolver um problema deste tipo?”, de

uma organização local em torno da resolução de diferentes tipos de problemas

de proporcionalidade (isto é, do tema da proporcionalidade), enfim de uma

organização regional em torno por exemplo da noção de função numérica (que

corresponde a todo um setor das matemáticas ensinadas no secundário)

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.86, tradução nossa).

Após introduzir estas novas noções Chevallard e Bosch retomam a noção de

saber para associá-la a estes novos termos, ou seja, o saber é considerado como uma

organização praxeológica particular que lhe permite funcionar como um aparelho de

produção de conhecimento, conforme se observa a seguir.

A noção de saber pode agora ser associada a estes novos termos: um saber

reconduz a uma organização praxeológica particular, constituído de uma certa

“generatividade” lhe permitindo funcionar como aparelho de produção de

15 Corresponde ao Ensino Fundamental II no Brasil.

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conhecimentos, isto é, de novas praxeologias. Esta visão das coisas amplia o

ponto de vista usual que tende a olhar um saber somente como o par

tecnologia / teoria da organização completa, o qual permite, com efeito,

geralmente, gerar (ou reconstruir) o conjunto de técnicas da praxeologia, isto é,

o “saber-fazer” correspondente. Nos lembraremos, apesar disso, que

genericamente, são freqüentemente as necessidades da prática, isto é as

necessidades das técnicas, que estão na origem das praxeologias.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.87, tradução nossa).

Finalmente, Chevallard e Bosch explicitam como a abordagem antropológica

responde à questão de modelagem das práticas sociais, de suas componentes e de

seus produtos para a matemática. A esse respeito, os autores dizem que:

[...] Para as matemáticas, consideradas como atividade humana estruturada

em organizações praxeológicas, podemos dizer que elas nascem da

problematização de certos tipos de tarefas, logo vistas como tipos de

problemas cujo estudo dá lugar à construção de organizações praxeológicas

locais. A articulação de algumas destas praxeologias em torno de uma

tecnologia comum permite formar organizações regionais que, elas próprias, se

articulam em organizações mais amplas até constituir o que denominaremos,

globalmente, “o saber matemático”. A descrição destas organizações e o

estudo de sua ecologia institucional 16estão no coração do programa de estudo

da didática das matemáticas. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.87, tradução

nossa).

Após explicitar como a abordagem antropológica modela o saber matemático,

em termos de objetos e relação entre os objetos, Chevallard e Bosch colocam a

seguinte questão: Qual é a “natureza” dos objetos matemáticos que chamamos de

noções ou conceitos? E, utilizando a noção de “primitiva de uma função” prosseguem

propondo ainda as questões: Como é constituído este conceito? Do que ele é

composto? Como é possível descrever suas componentes? Esse questionamento

proposto por Chevallard e Bosch (1999, p..88) nos parece importante quando se deseja

analisar a relação institucional de um determinado objeto matemático para as diferentes 16 A ecologia de uma organização praxeologica se associa às condições que pesam sobre sua construção e sua “vida” normalizada tanto nas instituições de ensino como nas de produção, utilização ou transposição (ARTAUD, 1998, apud CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.87, tradução nossa).

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instituições e em diferentes épocas, pois para Chevallard e Bosch, ”a questão da

natureza do objeto conduz ao problema da descrição das práticas institucionais em que

o objeto está engajado [...]” (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.88, tradução nossa).

No texto a seguir, Chevallard e Bosch consideram o exemplo de um objeto

matemático e da forma como ele sobrevive nas instituições de ensino. Este exemplo

permite compreender melhor a abordagem proposta pelos autores que, ao

considerar a forma como as noções podem ser trabalhadas nas diferentes

instituições de ensino, assinalam a importância do discurso oral e escrito para sua

sobrevivência, pois é este discurso que auxilia na manipulação dos objetos pelos

diferentes atores.

Se partimos da pesquisa do objeto ”primitiva de uma função”, o que

encontraremos não será jamais o próprio objeto – “em si e por si” – mas as

atividades onde serão colocados em jogo outros objetos. Encontraremos, por

exemplo, as declarações sobre o objeto procurado, que organizaremos na

rubrica “definições” ou “teoremas” [...], declarações que por si são atividades

consistindo em dar uma definição ou enunciar um teorema. Encontramos

assim as escrituras deste objeto, como o nome do objeto ou outros objetos

gráficos correlacionados, ou seja as atividades onde escrevemos, lemos,

entendemos ou pronunciamos esses “objetos” (CHEVALLARD e BOSCH,

1999, p.88, tradução nossa).

Além disso, os mesmos autores apresentam, como exemplo, o método do pivô

de Gauss, aqui escolhido por se tratar de um método de resolução de sistemas

lineares que, para sistemas com duas equações e duas incógnitas, está associado

ao método da adição.

[....] Da mesma forma, descobriremos que o objeto ’método do pivô de Gauss’

só existe por meio da manipulação de certos objetos no quadro de certas

práticas onde encontraremos os atores que manipulam certos grafismos,

fazendo certos gestos e pronunciando certas frases – em um discurso oral ou

escrito. Mas não colocaremos jamais as mãos no próprio objeto. Assim,

quando procuramos o que pode ser um tal objeto, descobrimos que ele se

compõe de outros objetos, de natureza sempre material, em particular sonora

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(discursiva), gestual, escritural (gráfica) e com muito ’vazio‘ em torno.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.88, tradução nossa).

Desta forma, Chevallard e Bosch prosseguem revendo sua teoria em que

um objeto existe, quando existem instituições ou pessoas que estabelecem uma

relação com esses objetos, e a questão de sua natureza conduz ao problema da

descrição das práticas institucionais em que ele está engajado, e que só pode ser

respondido por meio de organizações praxeológicas. Ou seja, ao procurar compreender

o que é um objeto, é preciso buscar que tipos de tarefas e técnicas compõem as

praxeologias institucionais em que ele intervém e que tecnologias e teorias permitem

justificar as práticas existentes por meio de um discurso sobre este objeto.

Chevallard e Bosch (1999, p. 88) justificam que a distinção entre tarefas,

técnicas, tecnologias e teorias permite compreender a organização do saber

matemático, mas não determina a “natureza” de suas componentes. Dessa forma, eles

consideram as questões abaixo que permitem uma reflexão sobre a atividade

matemática.

[...] De que são feitos os ingredientes que compõem uma técnica, uma

tecnologia, uma teoria? Como, em que termos podem-se descrever o

funcionamento de uma técnica? Segundo que critérios e quais índices poderão

constatar este funcionamento em uma situação particular? Como distinguir

uma técnica da outra? Haveriam invariantes que seriam de certa forma, trans-

institucionais? (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.88, tradução nossa).

Justificando o primeiro questionamento dessa citação a respeito dos ingredientes

que compõem técnica, tecnologia e teoria, Chevallard e Bosch observam que não se

pode esconder a vertente metodológica, ou seja, estudar as condições de

desenvolvimento da atividade matemática e os entraves que regem seu ensino e

aprendizagem, que, na realidade, é a proposta de estudo da didática.

Partindo ainda da constatação de que a cultura ocidental estabelece para o

conjunto de práticas humanas uma oposição entre as atividades consideradas como

manuais e as atividades intelectuais, que espontaneamente levam à classificação das

matemáticas como atividades intelectuais, em que materiais e representações são

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apenas suportes ou sinais que se utilizam para representar os objetos, e que desta

forma, não fazem parte da própria atividade, os autores afirmam que

[...] trabalhamos a matemática principalmente ”com a cabeça”, com a ajuda de

ferramentas como noções, raciocínios, idéias, intuições e muito pouco com

elementos materiais. Com efeito, alguns instrumentos materiais utilizados

(papel e lápis, quadro e giz, régua e compasso, calculadoras, computadores)

são geralmente considerados como simples suportes, ajudas muitas vezes

indispensáveis, mas que em nenhum caso fariam parte da própria atividade.

Os outros objetos, se não materiais, pelo menos sensíveis, que o matemático

utiliza (escrituras, formalismos, grafismos, palavras, discurso, etc) podem às

vezes se beneficiar de algumas especificidades: se supõe que eles

intervenham nas atividades apenas como sinais, ocupando o lugar de outros

objetos que eles representariam. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.89,

tradução nossa).

Chevallard e Bosch observam que a atividade matemática tende a desconsiderar

as ferramentas materiais que utiliza, levando em conta apenas os objetos

particularmente sensíveis que são os discursos, escritas e grafismos para se centrar no

sentido que ajudam a construir e não nos próprios objetos e na maneira de manipulá-

los. Ou seja, segundo Chevallard e Bosch (1999, p. 90.), para fazer matemática

necessitamos do discurso, das figuras e dos símbolos, mas o que é importante está

além das palavras e das escrituras, isto é, a atividade matemática concretamente

observável está na sua função significante e produtora de conceitos.

Após essa constatação Chevallard e Bosch propõem que se investigue como a

atividade matemática está condicionada pelos instrumentos materiais, visuais, sonoros

e táteis que ela utiliza, e afirmam que a falta desses instrumentos pode dificultar o

desenvolvimento de uma atividade, da mesma forma que a ausência de um conceito

pode bloquear a evolução do pensamento matemático como se observa no texto

abaixo.

Sabemos que a ausência de um conceito pode bloquear a evolução do

“pensamento” matemático, tanto no nível histórico de uma comunidade como

no nível individual do pesquisador ou do aluno. Poderíamos nos perguntar até

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que ponto esta ausência seria a ausência de uma idealidade, de uma maneira

de “pensar” ou de “conceber” o mundo, e não aquela de um complexo de

ferramentas de trabalho. A maioria de natureza material, cuja disponibilidade –

ou, ao contrario, a ausência – poderia modificar de maneira catastrófica o

desenvolvimento da atividade. Acreditamos que a análise didática do

desenvolvimento do saber matemático – capturada no tempo histórico, na

historia de vida de uma pessoa, ou na vida de uma classe – não pode

considerar como secundaria esta dimensão da atividade, lhe atribuindo apenas

uma função instrumental na construção dos conceitos. (CHEVALLARD e

BOSCH, 1999, p. 90, tradução nossa)

Dessa forma, Chevallard e Bosch, explicitando a questão da “natureza” dos

objetos matemáticos e de sua “função” nas atividades matemáticas, são levados a

considerar dois tipos de objetos: os objetos ostensivos e os objetos não ostensivos. A

esse respeito, os autores se expressam da seguinte forma:

[...] Falamos de objetos ostensivos – do latim “ostendere” mostrar, apresentar

com insistência” – para nos referir a todo objeto tendo uma natureza sensível,

uma certa materialidade, e que, por esta razão, adquirem para o sujeito

humano uma realidade perceptível. Assim, acontece para qualquer objeto

material e, principalmente, para os objetos materiais particulares como os sons

(entre os quais as palavras da língua), os grafismos (entre os quais os

grafemos permitindo as escrituras das línguas naturais ou constitutivos das

línguas formais) e os gestos. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.90, tradução

nossa).

Sobre os objetos não ostensivos, dizem que:

Os objetos não ostensivos são todos estes objetos que, como as idéias, as

intuições ou os conceitos, existem institucionalmente – no sentido em que lhes

atribuímos uma existência – sem que para tanto possam ser vistos, ditos,

entendidos, percebidos ou mostrados por eles mesmos: eles podem apenas

ser evocados ou invocados pela manipulação adequada de certos objetos

ostensivos que lhes são associados (uma palavra, uma frase, um grafismo,

uma escritura, um gesto ou um longo discurso) (CHEVALLARD e BOSCH,

1999, p.90, tradução nossa).

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O exemplo permite compreender a distinção entre ostensivo e não ostensivo,

proposta por Chevallard e Bosch, esclarecendo como se efetua a manipulação dos

ostensivos e como esta é guiada e controlada pelos não ostensivos.

Assim, os objetos “função” e “primitiva de uma função” são objetos não

ostensivos que aprendemos a identificar e a ativar por meio de certas

expressões, escrituras e grafismos particulares utilizados em práticas e

situações também particulares. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.90,

tradução nossa).

Após definir objetos ostensivos e não ostensivos e dar exemplos que permitem

compreender como estes se manifestam nas atividades matemáticas, Chevallard e

Bosch mostram que estes objetos estão unidos por uma dialética que considera os não

ostensivos como emergentes da manipulação17 dos ostensivos e que são os não

ostensivos que guiam e controlam as manipulações permitidas pelos ostensivos,

ressaltando ainda que estes sejam objetos institucionais cuja existência raramente

depende de uma única pessoa.

[...] os objetos não ostensivos não devem ser entendidos como entidades

“mentais”, pessoais e individuais, que existiriam unicamente “nas nossas

cabeças” ou no nosso espírito. Ostensivos e não ostensivos são sempre

objetos institucionais cuja existência depende raramente de uma única pessoa.

[...] os objetos ostensivos e os objetos não ostensivos estão unidos por uma

dialética que considera os segundos como os emergentes da manipulação dos

primeiros e, ao mesmo tempo, como meios de guiar e controlar esta

manipulação. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p. 90-91, tradução nossa)

Para ilustrar as definições e permitir uma melhor distinção entre os objetos

denominados por Chevallard e Bosch de ostensivos e não ostensivos e também para

explicitar como se efetua a manipulação dos ostensivos e como estes são guiados

17 Por exemplo, na resolução de um sistema de duas equações lineares e duas incógnitas pelo método da adição é importante a disposição das incógnitas que serão manipuladas por meio dos não ostensivos que as guiam e controlam, ou seja, as noções de grupo aditivo e multiplicativo e a noção de espaço vetorial sobre um corpo K.

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pelos não ostensivos, os autores consideram o exemplo abaixo sobre a noção de

logaritmo.

É pelo fato de poderem ser concretamente manipulados que os objetos

ostensivos se distinguem dos não ostensivos. A notação log e a palavra

”logaritmo” são objetos ostensivos. Ao contrário, a noção de logaritmo é um

objeto não ostensivo que não é possível manipular no sentido precedente.

Podemos somente “tornar presente” – representá-la – pela manipulação de

certos objetos ostensivos associados, como a notação log, por exemplo. Na

maioria dos casos, os objetos institucionais se vêem associados a um objeto

ostensivo privilegiado, seu nome, que permitirá uma evocação mínima.

Observamos, aqui, o jogo metafórico pelo qual os atores são freqüentemente

conduzidos a utilizar como se os objetos não ostensivos se mostrassem, e

pudessem ser efetivamente manipulados.” (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.

90, tradução nossa).

Utilizando o caso particular de uma equação exponencial os autores mostram

como a noção de logaritmo funciona como uma ferramenta que pode ser

concretamente manipulada, fazendo uma analogia com o martelo cuja função é fixar um

prego.

Diremos, por exemplo, que para resolver a equação 2x = 10, “utilizamos o

logaritmo”, da mesma forma que utilizamos um martelo para fixar um prego,

isto é, como se o objeto ostensivo que é a noção de logaritmo fosse

concretamente manipulável, mesmo que na realidade o que será efetivamente

manipulado pelo sujeito humano, são as palavras e as notações. Seremos, por

exemplo, conduzidos a pronunciar a palavra logaritmo e escrever: 2x = 10 ⇒

(“tomamos os logaritmos”) x.log2 = log 10 => x= 2log

10log. Se no lugar de dizer e

escrever, nos limitamos a “pensar” a palavra e a escrita precedente, veríamos

como uma outra forma de manipulação – interiorizada – dos objetos

ostensivos. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p. 91, tradução nossa).

Chevallard e Bosch (1999, p. 92.) observam que toda atividade humana se

descreve, aparentemente, por meio da manipulação de objetos ostensivos, mas o

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operador humano só é capaz de efetuar esta manipulação, evocando ou invocando os

objetos não ostensivos que não aparecem como específicos da atividade. O exemplo

abaixo mostra uma forma de como se efetua esta manipulação.

[...] Escrever 2 + 3 = 5 pode ser visto como uma simples manipulação de

objetos ostensivos, mas não se saberia efetuar intencionalmente sem a

intervenção de certos objetos não ostensivos específicos, tal como a noção de

adição (ou, se existe somente cópia de um “modelo” de escritura, a noção de

“reprodução” ou de “cópia”). Mais genericamente, consideramos o principio

que, em toda atividade humana, existe co-ativação de objetos ostensivos e de

objetos não ostensivos (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p. 92, tradução

nossa).

Após considerar a importância dos ostensivos e não ostensivos nas atividades

humanas, Chevallard e Bosch retomam as noções fundamentais da análise

antropológica e mostram como se opera a presença dos ostensivos e não ostensivos

na realização das tarefas associadas a uma determinada prática institucional e a

importância dos ostensivos, pois são eles que permitem visualizar o trabalho realizado

na solução da tarefa proposta, por sua acessibilidade aos nossos sentidos, mas não

depende unicamente destes, pois quem os guia e controla são os não ostensivos que

lhes são associados e também o produto de uma construção institucional, sendo desta

forma, fruto de uma aprendizagem.

[...] a utilização de uma técnica se traduz por uma manipulação dos ostensivos

regrados por não ostensivos. Os ostensivos constituem a parte perceptível da

atividade, isto é, o que na realização da tarefa, pode ser visto, tanto pelo

observador como pelos próprios atores. Na análise do trabalho matemático, os

elementos ostensivos fazem parte do real empírico, acessível aos sentidos. Ao

contrário, a presença de tal ou tal não ostensivo em uma determinada prática

só pode ser induzida ou suposta a partir das manipulações dos ostensivos

institucionais associados. A observação precedente não deve sugerir que

nossa relação com os ostensivos, se dependente da percepção, seja

puramente empírica e, de alguma forma, trans-institucional. Os objetos

ostensivos, mesmo que diretamente acessíveis aos sentidos, não são dados

puros. Como não existe ostensivo sem não ostensivo, tanto os objetos

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ostensivos como nossa relação com eles (em particular nossa capacidade de

identificá-los, antes mesmo de manipulá-los) são o produto de uma construção

institucional – e, portanto, o fruto de uma aprendizagem. (CHEVALLARD e

BOSCH, 1999, p.92, tradução nossa).

Na seqüência, Chevallard e Bosch insistem na importância dos ostensivos e no

fato de que estes objetos devem ser frutos da aprendizagem, mostrando, por meio de

exemplos, a importância da dialética entre ostensivos e não ostensivos 18e que ambos

precisam ser levados em conta pelo ensino.

O exemplo abaixo sobre “adição de polinômios” deixa evidente como se opera a

dialética entre ostensivos e não ostensivos e que esta depende da ordem em que estes

são considerados.

É conveniente se fixar sobre as relações que unem, na atividade humana,

objetos ostensivos e não ostensivos. A intervenção dos objetos não ostensivos

na práxis manipulativa dos objetos ostensivos pode conduzir a dar aos não

ostensivos ativados o status de condições de uma manipulação adequada dos

instrumentos ostensivos. Assim, a existência, para mim, segundo uma relação

idônea, do objeto não ostensivo “adição de polinômios” pode aparecer como

uma condição para que eu escreva: (x3 +x +1) + (x2 + 4x – 2) = x3 + x2 +5x – 1.

Analogamente, pelo fato que, contrariamente ao hábito gerado pelo ensino

secundário, eu escrevo (x3 + x +1) + (x2 + 4x – 2) = – 1 +5x + x2(1 + x)

levantará a hipótese de que existem para mim certos objetos não ostensivos

que condicionam a tarefa realizada, motivando-a, regrando seu

desenvolvimento e propondo um critério para finalizar a transformação operada

– poderia se tratar, neste caso, do objeto não ostensivo “desenvolvimento

limitado de ordem 1”, por exemplo. A análise do papel de não ostensivos como

condições de manipulação dos ostensivos aparece como ambivalente. Ela

pode conduzir, seja a considerar primeiro os não ostensivos, como se a

“administração ostensiva” devesse necessariamente segui-lo, seja a considerar

primeiro os ostensivos, como se o condicionamento pelos objetos não

ostensivos pudesse ser considerado não essencial. (CHEVALLARD e BOSCH,

1999, p.93, tradução nossa).

18 Por exemplo, quando consideramos a noção de sistemas de duas equações lineares a duas incógnitas é possível verificar, conforme grade de análise apresentada no capítulo 3, a dialética existente entre os ostensivos e não ostensivos e como os não ostensivos guiam, controlam e justificam as manipulações efetuadas.

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Tendo mostrado a necessidade da dialética entre ostensivos e não ostensivos

para a solução de uma tarefa, os autores explicitam como a escolha de um trabalho

centrado primeiramente sobre os não ostensivos seguidos dos ostensivos prioriza a

compreensão, deixando a atividade em segundo plano e um outro trabalho em que se

considera os ostensivos, que permitem realizar a tarefa, seguidos dos não ostensivos,

pode empobrecer os aspectos “conceituais”, que permitem controlar a tarefa realizada.

Sendo assim, os autores concluem que não é possível dissociar os ostensivos e os não

ostensivos, não importando a escolha.

O primeiro caso corresponde em matéria de ensino, a colocar na frente a

“compreensão” em detrimento da própria atividade; o segundo caso, a colocar

na frente os elementos ostensivos que permitem “fazer” – com um

empobrecimento correlativo dos aspectos “conceituais” que supostamente

permitem compreender e controlar o que se faz. Observamos, em oposição,

que a co-ativação de ostensivos e não ostensivos é sempre presente e

aparece em todos os níveis da atividade, tanto no plano técnico como em seu

meio tecnológico teórico (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.93, tradução

nossa).

Assim, observando que não existem ostensivos sem os não ostensivos e que a

ordem em que eles são considerados depende das escolhas, que podem ser realizadas

quando se deseja ensinar uma determinada noção matemática, os autores apresentam

um exemplo que permite separar os ostensivos escritos, orais e gestuais, assim como

os não ostensivos que os guiam e controlam e que permitem justificar e explicar as

ações, isto é, o que os autores denominam tecnologia das técnicas.

A técnica que conduz a escrever (x3 +x +1) + (x2 + 4x – 2) = – 1 +5x + x2(1 + x)

supõe uma manipulação de ostensivos escritos (parênteses, letras, algarismos,

etc.), orais (pequeno discurso do tipo “x mais 4x, 5x...”) e gestuais (por

exemplo, para agrupar os termos de mesmo grau e verificar que não

esquecemos nenhum). Esta manipulação é guiada pelos não ostensivos, entre

os quais a noção de organização dos termos em ordem decrescente dos

expoentes, a noção de termos (ou monômios) de mesmo grau, a de “fatoração

por x2”, ou ainda a noção de “resto de ordem 2”, etc. Essa evocação de não

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ostensivos nos aproxima, culturalmente, dos ingredientes supostos

necessários, não para agir, mas para justificar e explicar as ações, da

tecnologia da técnica.” (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.94, tradução nossa).

A partir da noção de tecnologia da técnica, os autores situam os conceitos e

noções que permitem compreender e controlar as atividades matemáticas, mostrando a

necessidade de um discurso tecnológico que acompanhe estas técnicas de forma a

explicitá-las e justificá-las. Os autores vão além, mostrando a importância tanto do

discurso oral quanto do escrito, pois são eles que permitem materializar as explicações

e as justificativas utilizadas no desenvolvimento de uma determinada tarefa. Eles

observam ainda que, sendo as teorias um discurso sobre as tecnologias, estas também

estão condicionadas a uma materialização por meio de um discurso oral e escrito.

É, com efeito, no nível tecnológico que podemos ser tentados a situar os

conceitos e noções permitindo compreender e controlar a atividade

matemática. Todo discurso tecnológico se realiza concretamente pela

manipulação de objetos ostensivos, em particular, discursivos e escritos, que

permitem materializar as explicações e justificações necessárias para ao

desenvolvimento de uma tarefa, e isto é análogo no nível teórico, [...] A

distinção ostensivo e não ostensivo se refere aos próprios objetos e não ao

papel que eles desempenham nas práticas. Uns e outros servem tanto para

fazer como para justificar o que se faz. [...] isto é, uma manipulação ostensiva

supõe o não ostensivo e, inversamente, o não ostensivo só pode viver por

meio do ostensivo, restando apenas que esta necessidade se realize de uma

maneira arbitrária nas instituições e em um determinado tempo de sua história,

para dar lugar a uma grande variabilidade de formas de associação.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.94, tradução nossa).

Dessa forma, Chevallard e Bosch partem do princípio de que toda atividade

supõe uma co-ativação de ostensivos e não ostensivos, mostrando como é concebida a

análise da atividade matemática segundo a dialética ostensivo/não ostensivo e a

importância da função semiótica dos ostensivos, isto é, estes objetos são para os

autores, os sinais que dão significado aos não ostensivos. Além disso, os autores

comparam os ostensivos da matemática com os de lingüística e, por analogia, mostram

a tendência a privilegiar a dimensão não ostensiva da atividade.

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Na análise da atividade matemática, a dialética ostensivo e não ostensivo é

geralmente concebida em termos de sinais de significação: os objetos

ostensivos são os sinais dos objetos não ostensivos que lhes constituem o

sentido ou significação. Os ostensivos utilizados em matemática são muito

parecidos, materialmente, com os ostensivos utilizados na atividade lingüística.

E, se acreditamos, quando falamos, não são as palavras que importam, mas o

que elas permitem comunicar, somos da mesma forma conduzidos a desprezar

o papel dos ostensivos na prática matemática, fazendo prevalecer a dimensão

não ostensiva da atividade (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.95, tradução

nossa).

Na seqüência, os autores justificam que as técnicas são consideradas com os

primeiros ingredientes, ou ainda, as ferramentas materiais da atividade matemática,

assim, que a função semiótica dos ostensivos não está separada de sua função

instrumental, ou seja, o sinal que permite integrar e manipular técnicas, tecnologias e

teorias.

Quando, ao contrário, consideramos como nós o fazemos, que os objetos

ostensivos são os constituintes praxeológicos matemáticos, os primeiros

ingredientes (e primários) as técnicas, as tecnologias e as teorias, podemos

olhá-los em primeiro lugar como os instrumentos da atividade matemática, as

ferramentas materiais sem as quais a ação não pode se realizar. A função

semiótica dos ostensivos, sua capacidade de produzir o sentido, não pode

estar separada de sua função instrumental, de sua capacidade de se integrar

nas manipulações técnicas, tecnológicas e teóricas (CHEVALLARD e BOSCH,

1999, p.95, tradução nossa).

Antes de mostrar a dupla função dos ostensivos, isto é, servem como

instrumento de produção de sentido e como ferramenta de manipulação das técnicas,

tecnologias e teorias em função do registro a que eles pertencem, Chevallard e Bosch

caracterizam os diferentes objetos ostensivos, dizendo:

[...] caracterizamos os diferentes objetos ostensivos pelo registro (oral, escrito,

gráfico, gestual, material) ao qual eles pertencem, distinção motivada pelo fato

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de que a função atribuída espontaneamente aos objetos ostensivos depende

da “maneira” como eles se compõem (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.95,

tradução nossa).

Após caracterizar os objetos ostensivos Chevallard e Bosch consideram a

pluralidade dos registros ostensivos existentes na cultura ocidental, observando que

estes são articulados de maneira complexa. Para a melhor compreensão desta

complexidade, os autores apresentam diversos exemplos para mostrar sua importância

no desenvolvimento da atividade matemática.

Colocamos na frente a espessura ostensiva do trabalho matemático – que

evolui sempre entre diferentes registros articulados de maneira complexa. E

mostramos, também, que no caso particular do discurso oral e escrito, que a

função culturalmente associada aos diferentes objetos ostensivos está muito

influenciada pelos registros aos quais ela pertence. Existe uma axiologia

cultural que nos conduz a desprezar gestos e objetos materiais que não

pertencem ao campo das matemáticas, assim como a reduzir as manipulações

das escritas a uma atividade mecânica regrada unicamente por regras da

sintaxe estrita. É na produção de figuras e, principalmente, no discurso oral,

que o olhar logocêntrico irá procurar a prova de que a atividade escrita é

“significante”, “provida de sentido”. A evolução da atividade matemática, tanto

no plano individual como institucional ou histórico, irá encontrar esta visão das

coisas e do sistema de valores que ela promete (CHEVALLARD e BOSCH,

1999, p.103, tradução nossa).

Referindo-se à evolução histórica da matemática, Chevallard e Bosch mostram

como a atividade matemática tende a abandonar os diversos registros, privilegiando o

registro escrito. Para isto, eles consideram como marco os trabalhos de Viète19 , que é

considerado como criador da álgebra por alguns historiadores.

Se as primeiras atividades de contagem deviam recorrer a uma ampla

variedade de objetos materiais, gráficos e gestuais, se os primeiros raciocínios

19 Viète : Considerado como o matemático que introduz a álgebra, por alguns historiadores, pois é ele que efetua a passagem do conceito de “arithmos” (faz referência imediata às coisas e as unidades enquanto que os símbolos (letras) [...] enviam ao conceito de “número em geral” ), ao de símbolo genérico. (PIAGET E GARCIA, 1983, p.171, tradução nossa)

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dedutivos da geometria euclidiana se realizam sobre objetos gráficos traçados

sobre a areia e por meio de discursos e manipulações materiais com a ajuda

de instrumentos diversos de traçados (efetivamente realizados ou evocados

pela linguagem), não podem ignorar que, pelo menos após Viète, os

matemáticos progrediram pelas vias do simbolismo escrito, de tal forma que

podemos quase que seguir toda a história deste progresso ficando apenas

sobre o registro escrito. As tendências formalistas nascidas da crise de

fundamentação do fim do século XIX levaram esta evolução ao seu extremo,

como se a escrita simbólica pudesse substituir todos os outros registros, seria

somente para a formulação e demonstração das verdades matemáticas

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.103, tradução nossa).

Para mostrar a importância dos registros ostensivos no desenvolvimento de uma

atividade que envolve noções de álgebra, os autores discutem os exemplos sobre o

produto de matrizes, soluções de uma equação e desenvolvimento de uma expressão

algébrica.

Toda matematização, mais genérica, supõe uma redução ostensiva dos

instrumentos do trabalho matemático, que ”projeta“ os diferentes registros

inicialmente ativados sobre aqueles que podem ser escritos. Consideremos

assim, os gestos necessários quando do produto de duas matrizes, da solução

de uma equação ou do desenvolvimento de uma expressão algébrica. Estes

gestos são visíveis sob forma de grafismos, sem dúvida provisórios e um

pouco ilegítimos, que indicam sobre o papel as associações dos termos ou as ”

transposições “ a efetuar (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.104, tradução

nossa).

Na seqüência os autores mostram a importância do registro escrito sobre o oral,

pois é a escrita que permite a manipulação e a projeção do registro gestual sobre o

papel, que, segundo os autores, é um processo que faz aparecer novos ostensivos

orais para explicar os gestos.

[...] Contrariamente ao discurso oral, a escrita imobiliza os objetos sobre o

papel e permite manipulá-los, da mesma forma que o medieval que utilizava o

ábaco manipulava os cálculos sobre a tábua de contar. Estes exemplos

simples são suficientes para ilustrar as possíveis formas de ”projeção“ do

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registro gestual sobre a folha de papel, processo que é sempre completado

pela aparição de novos ostensivos orais para designar estes gestos (“fazemos

passar o termo 3x para o outro lado”, “multiplicamos as linhas pelas colunas”,

etc.) ou para indicar os objetos sobre os quais efetuamos estes gestos (“o

termo da direita”, “os extremos”, “as linhas”, “o fator comum”, etc.)

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.104, tradução nossa).

Continuando o raciocínio, Chevallard e Bosch justificam como os ostensivos

provisórios terminam integrando o formalismo algébrico dando lugar a novos objetos

matemáticos que podem ser representados pelo registro escrito, eliminando todos os

traços gestuais. Como exemplo os autores utilizam o produto de duas matrizes.

Se seguirmos esta evolução, veremos estes ostensivos provisórios se integrar

no próprio formalismo algébrico para dar lugar a novos objetos matemáticos

que, poderão ser inteiramente escritos sobre a folha de papel. Assim, a

definição usual de produto de matrizes terminará por eliminar todos os traços

da atividade gestual graças à utilização do formalismo escrito como o seguinte:

(aij)mxn X (bij)nxp = (cij)nxp com cij = ∑=

n

rrjirba

1

. A “leitura” desta escrita não

consiste mais numa simples oralidade: deve-se poder recompor, a partir destas

escrituras, a pluralidade de ostensivos que constituem a técnica de

multiplicação. Observamos, aqui, somente que esta evolução supõe a criação

de novos ostensivos escritos que, como o sinal de ∑ ou os sub-índices,

apareceram mais tarde no conjunto de ferramentas matemáticas e continuam a

ser objeto de pequenas re-elaborações para facilitar a manipulação.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.104, tradução nossa).

Os autores observam também que a gênese20 de uma técnica para resolver um

determinado problema é constituída de uma grande quantidade de ostensivos, ou seja,

os registros discursivo, gestual, gráfico, escrito até que se torne estável, reduzindo as

necessidades de alguns ostensivos que permitiram a construção da técnica.

Podemos mostrar, mais genericamente, que a “microgenese” individual de uma

técnica para resolver um dado tipo de problema supõe, em um primeiro

20 Gênese : Conjunto de formas e/ou elementos que contribuíram na produção de alguma coisa.

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momento, uma proliferação ostensiva importante: a técnica se constrói sobre

uma base de objetos emprestados de universos diversos da atividade humana

e recorrendo a numerosos pontos de apoio ostensivo – discursivo, gestual,

gráfico, escrito. Mas a evolução da atividade – que terminará em uma técnica

estável – conduz em seguida a uma redução ostensiva mais e mais evidente, a

utilização da técnica tende a colocar como detrito todo aquecimento ostensivo

que permitiu a construção (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.106, tradução

nossa).

Em analogia com a gênese de uma técnica os autores utilizam as praxelogias

matemáticas normalizadas as quais irão desaparecer assim como os múltiplos

ostensivos iniciais. Esta redução se efetua por um processo no qual os objetos e

materiais se transferem para o registro oral e escrito, que podem ser transcritos na folha

de papel.

Acontece o mesmo quando o processo de criação observado afeta uma

praxeologia matemática, por exemplo, aquilo que o professor tenta recriar em

sua classe ou um autor de livro didático, com a suposta colaboração dos

alunos ou dos leitores. O desenvolvimento da atividade matemática seja na

utilização normalizada das praxeologias disponíveis ou na criação de novas

organizações de objetos – irá desaparecer tão rápido quanto a pluralidade dos

ostensivos que caracterizam seu estado inicial, por um fenômeno geral de

redução xilográfica (do grego kheir, “mão”) dos registros ostensivos ativados,

processo pelo qual os objetos e materiais se “transferem” aos registros da

oralidade e do grafismo, isto é, aos registros que a mão pode transcrever no

espaço da folha de papel. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.106, tradução

nossa).

A partir da análise da evolução dos ostensivos, os autores discutem como na

mobilização desses objetos na atividade matemática é possível identificar os que estão

associados ao registro escrito, oral e gráfico, considerando ainda que os gestos,

desenhos e outros grafismos não são, em geral, levados em conta, pois se supõe que

estes fazem parte da própria atividade.

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É conveniente então distinguir, na análise dos objetos ostensivos mobilizados

em uma atividade matemática concreta, aqueles que, como as notações, os

simbolismos e certas expressões verbais adquirem um status matemático claro

e têm o papel de instrumentos da atividade, daqueles que, mesmo funcionando

como meios indispensáveis do trabalho matemático, são considerados como

um acompanhamento quase contingente da atividade. Os desenvolvimentos

anteriores podem se traduzir dizendo que a matematização conduz a relegar

os objetos materiais, os gestos e certos grafismos ao simples status de meios

do trabalho matemático, dando o status de instrumentos somente aos

ostensivos pertencentes ao registro escrito e, de forma menos clara, aos

registros gráfico e oral.” (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.105, tradução

nossa).

Após observar a importância dada ao registro escrito em função de seu papel na

apresentação dos resultados dos trabalhos dos matemáticos, os autores consideram

que os objetos ostensivos dependem do registro a que pertencem e que, além disso, o

status do registro escrito está associado ao fato de que este integra os outros registros,

o que faz com que seja visto como o verdadeiro instrumento da atividade,

principalmente quando se considera o formalismo da matemática.

O status variável atribuído aos objetos ostensivos em função de sua

pertinência a tal ou tal registro conduz a uma situação paradoxal. De um lado,

o registro da escrita, aquele que integra ao mesmo tempo o discurso escrito e

o formalismo matemático, não somente como o mais constantemente

solicitado, mas como aquele, aonde virá se integrar os diferentes meios

ostensivos pertencentes aos outros registros quando eles serão objetos de

uma matematização lhes atribuindo o status de verdadeiros instrumentos da

atividade. A matematização – que induz sempre, na etapa final, a uma

formalização – reduz as palavras em escritas, os gestos em índices, as figuras

em equações, as manipulações gráficas em manipulações algébricas, etc.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p. 105 – 106, tradução nossa).

A diferenciação do status atribuído aos objetos ostensivos leva os autores a

considerar o discurso verbal e os grafismos como uma relação do matemático com a

matemática, isto é, estes são atividades que cada um pode fazer funcionar de

diferentes formas, em função de suas necessidades, e que não precisam aparecer

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quando se apresentam os resultados. Isto conduz Chevallard e Bosch a considerar o

paradoxo entre a redução ostensiva e a necessidade da utilização dos registros oral e

gráfico para restituir o sentido dessa redução.

Nesse processo, o discurso verbal e os grafismos, mesmo que fazendo parte

dos registros xilográficos, são considerados em um grau intermediário da

matematização, como se eles se revelassem quase que inteiramente da

componente privada da relação do matemático com a matemática. Ao mesmo

tempo – a coisa pode parecer paradoxal – esses registros não ou pouco

matematizados são freqüentemente vistos como emblemáticos do trabalho

matemático “autêntico”. Com efeito, mais o processo de algebrização avança e

mais o trabalho matemático torna-se “puro cálculo e pura sintaxe”: o discurso,

mais e mais se afasta da escrita, terminando por parecer como a única prova

de raciocínio, ajudado pelos modelos gráficos (ou a componente gráfica).

Parece, então, quando os ostensivos discursivos e gráficos perdem seu status

de instrumentos para o privilégio dos ostensivos escritos, eles tendem a

parecer, para a cultura corrente (matemática ou não matemática) como os

meios mais significativos do trabalho matemático, pois eles permitem restituir o

“sentido” perdido quando da redução ostensiva. Este paradoxo tem sem dúvida

sua funcionalidade ecológica: a pejoração cultural do escrito aproveita dos

registros oral e do grafismo contribuindo para restituir à atividade matemática a

espessura ostensiva mínima necessária para sua gestão e sua realização.

(CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.106, tradução nossa).

Chevallard e Bosch apresentam diversos exemplos que mostram a importância

dos ostensivos para a formalização e generalização em matemática, assim como a

descoberta de novos objetos e consideram ainda a instrumentalidade dos ostensivos21

observando que os mesmos possuem duas valências, uma valência instrumental22 e

uma valência semiótica23

21 Instrumentalidade dos ostensivos: Um objeto ostensivo é considerado como um instrumento possível da atividade humana, isto é, como uma entidade que permite, associando com outras, dar conformidade às técnicas que possibilitam cumprir certas tarefas, de conduzir bem um certo trabalho. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.107, tradução nossa). 22 Valência instrumental ou instrumentalidade: Valência que existe tanto nos símbolos escritos (em matemática, por exemplo) como nas palavras que pronunciamos ou nos gestos que fazemos. [...] Podemos

dizer, por exemplo, que na sua utilização algébrica usual, a notação por um lado, e a notação de expoente fracionário ½ por outro lado, têm um rendimento vizinho quando as utilizamos para efetuar o seguinte trabalho:

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Chevallard e Bosch observam ainda que a redução dos ostensivos na atividade

matemática e sua valorização cultural, que os considera indispensáveis, não podem ser

resolvidas por meio dos contratos didáticos24 habituais, mas necessita de certa

“desmatematização” da atividade.

Para compreender melhor as mudanças propostas para o ensino de matemática

e, mais particularmente, para o ensino da noção de sistemas de duas equações

lineares e duas incógnitas, bem como o comportamento esperado dos professores e

alunos do Ensino Fundamental II, buscaram-se os documentos oficiais disponíveis, que

foram analisados por meio da noção de “topos” introduzida por Chevallard (1997). Essa

análise será apresentada no capítulo que segue, dedicado aos Parâmetros Curriculares

Nacionais e à proposta Curricular do Estado de São Paulo.

32x = 2 x 3 ; ( )2

1

32x = ( )2

1

2 x ( )2

1

3 . Inversamente, para calcular a derivada da função a segunda notação se revela instrumentalmente superior, pois ela permite efetuar um trabalho que não podemos

reproduzir formalmente com a ajuda da primeira: xxxxx

2

1

2

1

2

1)'()'( 2/112/12/1 ==== −−

. Diremos que em relação à técnica de derivação empregada (e vale o mesmo em relação ao cálculo da primitiva da função),

a notação exponencial tem uma maior instrumentalidade que a notação : ela permite a utilização de uma

técnica que não pode se realizar por meio da notação . A instrumentalidade de um ostensivo depende também do número de técnicas nas quais ele pode intervir e ela terá maior importância quanto mais estas técnicas se mostrarem robustas e confiáveis para o cumprimento da tarefa. (CHEVALLARD e BOSCH, 1999, p.109, tradução nossa) 23 Valência semiótica: [...] A ostensividade de um objeto lhe permite funcionar como sinal, ou de preferência

como significante de outros objetos: a notação , a expressão “raiz quadrada” e uma representação gráfica

em um sistema cartesiano podem enviar a este objeto não ostensivo que é a raiz quadrada (ou a função raiz quadrada), a escrita “130” km/h evoca uma grandeza ou uma determinada limitação de velocidade, etc. Mais genericamente, os objetos ostensivos, quando são utilizados em práticas institucionais determinadas, têm o poder de evocar objetos ostensivos e não ostensivos complexos, com os quais eles entram em interação. Como os objetos, no sentido antropológico, são indissociáveis das relações com estes objetos, podemos dizer que o que evocamos (ou podemos evocar em uma determinada situação) os objetos ostensivos é todo conjunto de praxeologias institucionais nas quais eles participam como instrumentos. (Chevallard e Bosch, 1999, p.109). Chevallard e Bosch observam ainda que este conjunto de praxeologias corresponda ao que Godino e Batanero (1994) denominam “significado” de um objeto matemático. 24 Contrato didático : agrupa o conjunto de comportamentos específicos que o aluno espera do professor e o conjunto dos comportamentos específicos que o professor espera do aluno. O contrato didático aparece quase que inteiramente implícito, e ele deve ser implícito, sem o que o ensino não pode funcionar (BROUSSEAU, 1983, p.48, tradução nossa)

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CAPÍTULO 2

O “TOPOS” DO ALUNO E DO PROFESSOR VIA PARÂMETROS CU RRICULARES

NACIONAIS E PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PA ULO: A NOÇÃO

DE SISTEMAS DE DUAS EQUAÇÕES LINEARES E DUAS INCÓGN ITAS

2.1 Considerações Iniciais

Para compreender o que é esperado do professor e dos alunos do Ensino

Fundamental quando se introduz a noção de sistemas de equações lineares, isto é,

para identificar as praxeologias existentes e os objetos ostensivos e não ostensivos

privilegiados, considera-se neste capítulo a análise institucional do que é esperado

como “topos”25 (CHEVALLARD e GRENIER, 1997) dos alunos e do professor, à luz dos

Parâmetros Curriculares Nacionais e da Proposta Curricular do Estado de São Paulo.

A escolha desses documentos se deve ao fato de serem indicações construídas

com a intenção de orientar o professor em sua prática diária e ajudá-lo a efetuar

escolhas que sejam mais adequadas às realidades das classes e das regiões em que

trabalham, isto é, desenvolver as técnicas culturalmente possíveis.

Dessa forma, a análise foi estruturada levando-se em conta o seguinte

questionamento:

1) Como é proposta a abordagem da Matemática para os alunos do Ensino

Fundamental, 5ª a 8ª séries, nos documentos oficiais, isto é, Parâmetros

Curriculares Nacionais e Proposta Curricular do Estado de São Paulo?

2) Como é estruturado o ensino e como se organiza sua progressão quando se

propõe uma primeira abordagem da noção de sistemas de equações lineares

para os estudantes do Ensino Fundamental?

25 Topos: palavra grega que significa “lugar”. O “topos” do aluno é o lugar onde ele opera com relativa autonomia em relação ao professor o papel que lhe é próprio na realização de uma tarefa didática. Este trabalho que reúne professor e aluno exige uma ação orquestrada, em que ambos são chamados a desempenhar seu papel em fases cooperativas. (CHEVALLARD e GRENIER, 1997, p.186, tradução nossa)

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3) Como é proposta a introdução das noções associadas a esta abordagem?

4) Que desempenho se espera do professor e do aluno no desenvolvimento desta

abordagem?

5) Qual é o nível de conhecimento, conforme abordagem de Robert (1997),

esperado dos professores e dos alunos quando do desenvolvimento da noção de

sistemas de equações lineares?

Para responder a essas questões, escolheu-se proceder da seguinte maneira,

para a análise de cada documento:

a. Primeiro apresenta-se o panorama geral dos Parâmetros Curriculares

Nacionais de Matemática ressaltando o “topos” esperado dos

professores e dos alunos.

b. Em seguida, consideram-se as propostas que estão associadas à

introdução do objeto matemático de estudo deste trabalho, isto é, a

noção de sistemas de equações lineares, nos Parâmetros Curriculares

Nacionais, observando quais objetos ostensivos e não ostensivos são

privilegiados.

c. Analisam-se em primeiro lugar os Parâmetros Curriculares Nacionais

observando os conhecimentos prévios esperados dos alunos, quando

se introduz a noção de sistemas de equações lineares. Essa análise

deverá revelar a relação pessoal esperada dos alunos em função da

relação institucional proposta, isto é, para uma organização

praxeológica prevista.

d. O mesmo procedimento é utilizado para a análise da Proposta

Curricular do Estado de São Paulo, isto é, apresenta-se o panorama

geral ressaltando o “topos” dos alunos e do professor, seguido das

propostas para o ensino da noção de sistemas de equações lineares,

na tentativa de verificar que objetos ostensivos e não ostensivos são

privilegiados. A seguir, são feitas observações sobre os conhecimentos

prévios esperados dos alunos, quando se introduz a noção de sistemas

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de equações lineares, para verificar as organizações praxeológicas

previstas.

e. Finalmente, faz-se um comentário sobre as regularidades e diferenças

existentes nestes dois documentos.

2.2 Os Parâmetros Curriculares Nacionais

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino da Matemática de 5ª a 8ª

séries (PCN) foram elaborados no ano de 1998, não sofrendo nenhuma modificação até

a data atual, portanto correspondem, até hoje, às expectativas nacionais para o ensino

desta disciplina, isto é, pode-se considerar que, neste documento, se encontram os

conhecimentos esperados como disponíveis, conforme definição de Robert (1997), ao

final de cada uma destas séries do Ensino Fundamental, ou seja, as praxeologias

pontuais, locais, regionais ou globais que se consideram importantes para serem

desenvolvidas, nas diferentes etapas da escolaridade, com os alunos.

A obra é iniciada com uma apresentação de sua finalidade que é a de ampliar o

debate nacional sobre o ensino da Matemática e socializar informações e resultados de

pesquisas brasileiras da área de educação, em particular, de educação matemática,

sempre preocupada com o educando e com sua formação, pretendo-se que os mesmos

tenham acesso a um conhecimento matemático que lhes permita participar de forma

consciente no mundo do trabalho, sendo capazes de estabelecer relações sociais e

culturais utilizando a Matemática como objeto de leitura e avaliação responsável destas

relações, o que supõe uma utilização dos objetos ostensivos associados aos objetos

matemáticos, de forma a efetuar essas atividades de leitura e avaliação.

Sendo assim, os Parâmetros devem auxiliar na orientação da formação inicial e

continuada do professor, isto é, a estabelecer o “topos” esperado do professor após

estas formações, dando-lhe subsídios para o trabalho em sala de aula.

Em seguida, é apresentada uma breve análise das reformas curriculares que,

para este trabalho serão melhor evidenciadas por meio da análise dos livros didáticos

das décadas de 50 até o século XXI, com a análise de uma obra de cada época, cuja

escolha está associada à sua preservação até o momento, sendo que estas obras

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mostram de forma mais eficaz as regularidades e diferenças associadas às diferentes

escolhas curriculares.

Na seqüência, é traçado o quadro atual do ensino da Matemática no Brasil,

destacando que entre os obstáculos enfrentados em relação a este trabalho, os que

parecem ser consenso entre educadores e pesquisadores da área são: a falta de uma

formação profissional qualificada, as restrições associadas às condições de trabalho, a

ausência de políticas educacionais e as interpretações equivocadas de concepções

pedagógicas.

Vale ressaltar que na obra se observa a existência de projetos educativos que

tentam minimizar estes problemas, alguns com muito sucesso. O objetivo desse

documento é ampliar o debate sobre o ensino da Matemática e socializar informações e

resultados de algumas pesquisas existentes em educação e educação matemática.

Os autores tecem considerações a respeito da natureza do conhecimento

matemático, identificando suas principais características e métodos particulares e

propondo uma reflexão a respeito de seu papel na formação da cidadania.

Apesar de deixar evidente a preocupação com a formação do cidadão, o

documento coloca em evidência a importância da Matemática, tanto do ponto de vista

de sua aplicação, como do seu desenvolvimento, no seio do próprio conhecimento

matemático, o que pode ser considerado como a necessidade dos objetos ostensivos e

não ostensivos presentes nas tarefas em que a Matemática é o instrumento para sua

solução, como é possível identificar no texto abaixo.

Duas forças indissociáveis estão sempre a impulsionar o trabalho em

Matemática. De um lado, o permanente apelo das aplicações às mais variadas

atividades humanas, das mais simples na vida cotidiana, às mais complexas

elaborações de outras ciências. De outro lado, a especulação pura, a busca de

respostas a questões no próprio edifício da Matemática. A indissociabilidade

desses dois aspectos fica evidenciada pelos inúmeros exemplos de belas

construções abstratas originadas em problemas aplicados e, por outro lado, de

surpreendentes aplicações encontradas para as mais puras especulações

(BRASIL, 1998, p. 24 – 25).

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Ao tratar da Matemática e da construção da cidadania, o documento inicia

discutindo o que se entende por cidadania e associando a Matemática à formação da

capacidade de enfrentar as situações de sobrevivência, de inserção no mundo do

trabalho, das relações sociais e da cultura, e do desenvolvimento crítico para um

posicionamento em relação às questões do mundo que nos cerca. A esse respeito, os

autores se expressam, dizendo que:

Falar em formação básica para a cidadania significa refletir sobre as condições

humanas de sobrevivência, sobre a inserção das pessoas no mundo do

trabalho, das relações sociais e da cultura e sobre o desenvolvimento da crítica

e do posicionamento diante das questões sociais. Assim, é importante refletir a

respeito da colaboração que a Matemática tem a oferecer com vistas à

formação da cidadania. A sobrevivência na sociedade depende cada vez mais

de conhecimento, pois diante da complexidade da organização social, a falta

de recursos para obter e interpretar informações impede a participação efetiva

e a tomada de decisões em relação aos problemas sociais. Impede, ainda, o

acesso ao conhecimento mais elaborado e dificulta o acesso às posições de

trabalho. Em função do desenvolvimento das tecnologias, uma característica

contemporânea marcante no mundo do trabalho, exige-se trabalhadores mais

criativos e versáteis, capazes de entender o processo de trabalho como um

todo, dotados de autonomia e iniciativa para resolver problemas em equipe e

para utilizar diferentes tecnologias e linguagens (que vão além da comunicação

oral e escrita). Isso faz com que os profissionais tenham de estar num contínuo

processo de formação e, portanto, aprender a aprender toma-se cada vez mais

fundamental “ (BRASIL, 1998, p. 26 – 27).

Os autores evidenciam a importância de haver um trabalho interdisciplinar e

transdisciplinar, no desenvolvimento do conhecimento matemático. Apresentam, como

sugestão de trabalho, alguns temas transversais como: ética, orientação sexual, meio

ambiente, saúde, pluralidade cultural, trabalho e consumo, dizendo que:

A proposta de trabalhar com questões de urgência social numa perspectiva de

transversalidade aponta para o compromisso a ser partilhado pelos

professores das áreas, uma vez que é o tratamento dado aos conteúdos de

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todas as áreas que possibilita ao aluno a compreensão de tais questões, o que

inclui a aprendizagem de conceitos, procedimentos e o desenvolvimento de

atitudes. Assim, ela traz aos professores de cada área a necessidade de um

estudo sobre tais questões, o que pode ser feito inicialmente por meio da

leitura dos documentos de Temas Transversais, que fazem parte dos

Parâmetros Curriculares Nacionais, e de sua discussão no âmbito da escola. O

trabalho educativo que ocorre na escola é sempre marcado por concepções,

valores e atitudes, mesmo que não-explicitados e, muitas vezes, contraditórios.

Desse modo, é fundamental que os professores planejem não apenas como as

questões sociais vão ser abordadas em diferentes contextos de aprendizagem

das várias áreas, mas também como elas serão tratadas no convívio escolar.

Em termos de operacionalização dos temas em cada área, é preciso levar em

conta que eles precisam se articular à própria concepção da área, o que

significa que isso vai ocorrer de diferentes maneiras de acordo com a natureza

de cada tema e de cada área. Também é importante destacar que a

perspectiva da transversalidade não pressupõe o tratamento simultâneo, e

num único período, de um mesmo tema por todas as áreas, mas o que se faz

necessário é que esses temas integrem o planejamento dos professores das

diferentes áreas, de forma articulada aos objetivos e conteúdos delas.

(BRASIL, 1998, p. 28 – 29)

Quanto às questões associadas ao ensino e aprendizagem de Matemática, o

documento coloca em evidência que o professor deve ter as seguintes relações com a

Matemática e com os alunos:

Identificar as principais características dessa ciência, de seus métodos, de

suas ramificações e aplicações; conhecer a história de vida dos alunos, seus

conhecimentos informais sobre um dado assunto, suas condições sociológicas,

psicológicas e culturais; ter clareza de suas próprias concepções sobre a

Matemática, uma vez que a prática em sala de aula, as escolhas pedagógicas,

a definição de objetivos e conteúdos de ensino e as formas de avaliação estão

intima mente ligadas a essas concepções. (BRASIL, 1998,p-36)

Pode-se dizer que o “topos” esperado, institucionalmente, do professor em

relação ao saber matemático, é explicitado nos Parâmetros Curriculares Nacionais por:

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Ter sólidos conhecimentos dos conceitos e procedimentos matemáticos,

considerando a Matemática como uma ciência dinâmica para a qual sempre é

possível associar novos conhecimentos; ser capaz de transpor o saber

matemático para um saber escolar de forma que possa ser compreendido por

seus alunos; conhecer os obstáculos encontrados na construção dos conceitos

e procedimentos matemáticos; ser capaz de propor situações que sejam

passíveis de ser transferidas e generalizadas possibilitando que os alunos

possam mobilizar e dispor dos conhecimentos desenvolvidos por meio destas

situações em outros momentos e contextos. (Brasil, 1998, p.37)

Em termos da teoria antropológica proposta por Chevallard e Bosch (1999),

pode-se considerar que o “topos” esperado, institucionalmente, do professor em relação

ao saber matemático, é:

- Trabalhar com os objetos ostensivos reconhecendo os não ostensivos que lhes

são associados.

- Justificar as diferentes passagens no desenvolvimento de uma técnica por meio

de um discurso tecnológico, ou seja, adaptar os não ostensivos de forma a

justificar os ostensivos utilizados na introdução e desenvolvimento de um

determinado saber escolar.

- Reconhecer os ostensivos e não ostensivos de forma a produzir um discurso

tecnológico que auxilie os alunos a ultrapassar as dificuldades e os obstáculos

encontrados na solução das tarefas que lhes são propostas.

- Mostrar, por meio de um discurso tecnológico, a diferença entre os ostensivos e

sua relação com os não ostensivos e a necessidade de escolhas adequadas que

permitem resolver outras situações em diferentes momentos e contextos.

Quando se considera o “topos” esperado institucionalmente do aluno, em relação

ao saber matemático, pode-se dizer que este é explicitado nos Parâmetros Curriculares

Nacionais por:

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Ser capaz de reconhecer problemas, buscar e solucionar informações e tomar

decisões; relacionar temas matemáticos na própria Matemática, com as outras

disciplinas e com as situações cotidianas. (BRASIL, 1998, p.38)

Pode-se considerar que se espera que, ao final do processo de ensino e

aprendizagem, os alunos sejam capazes de reconhecer os ostensivos e os não

ostensivos nas tarefas que lhes são propostas e aplicá-los na solução de situações e

problemas matemáticos, de outras ciências e do cotidiano.

Em relação ao “topos” esperado do professor, no trabalho com os alunos, são

apontados como elementos fundamentais:

Reconhecer os conhecimentos prévios dos alunos com os quais irão trabalhar;

propor situações para os alunos que permitam que os mesmos sejam capazes

de solucioná-las utilizando seus conhecimentos prévios para a formação de

novos conhecimentos; auxiliar os alunos no desenvolvimento destas situações

propondo as ajudas necessárias em função do estado de desenvolvimento real

destes alunos; avaliar o desenvolvimento destes mesmos alunos, verificando

se ao final do trabalho proposto eles são capazes de pelo menos mobilizar os

conhecimentos desenvolvidos em outras situações e em novos contextos;

mediar a relação entre os alunos, o que é fundamental quando se deseja que o

próprio aluno seja responsável pela construção de seu conhecimento.

(BRASIL, 1998, p. 39)

Dessa forma, o professor é visto como avaliador das possibilidades de

desenvolvimento dos alunos e orientador na construção do conhecimento dos mesmos,

devendo levar em conta a relação pessoal desenvolvida até o momento da introdução

de novas noções, para utilizá-las como meios de auxiliá-los na construção do

conhecimento.

Levando em conta o “topos” esperado do aluno, em relação ao seu próprio

trabalho e ao relacionamento com os outros estudantes, os autores esclarecem que o

aluno deve ser capaz de:

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Construir seu conhecimento utilizando seus conhecimentos prévios a partir da

solução de situações propostas pelo professor; explicitar seu trabalho e o de

seus pares na solução das situações que lhe são propostas; persistir e

estimular seus colegas quando dificuldades se apresentarem. (BRASIL, 1998,

p. 40)

Observa-se assim, a expectativa de que o aluno seja capaz de, não só construir

seu conhecimento, mas de explicitá-lo de forma coerente e auxiliar seus pares quando

apresentarem dificuldades. Ou seja, o aluno deve estar consciente de seu papel e

reconhecer os objetos ostensivos e não ostensivos que permitem resolver as situações

matemáticas propostas pelo professor, de forma a ser capaz de utilizar um discurso

tecnológico que explicite o planejamento, a execução, o controle e a justificativa do

trabalho a ser efetuado para a solução de uma determinada situação.

Continuando a análise proposta, observa-se que os Parâmetros Curriculares

Nacionais apresentam a metodologia de resolução de problemas como uma alternativa

para o desenvolvimento do “topos” dos alunos, sendo esta adequada, uma vez que o

próprio aluno deve construir seu conhecimento, auxiliado pelo professor cujo papel é

organizar e mediar este trabalho.

Os autores indicam, como caminhos para fazer Matemática, em sala de aula, o

emprego de estratégias que utilizem a História da Matemática, as tecnologias da

informação e comunicação e os jogos. Verifica-se aqui, a importância dos cursos de

formação de professores que podem auxiliar no desenvolvimento das estratégias

propostas que exigem um tratamento mais específico em relação aos ostensivos e não

ostensivos que devem ser considerados quando se introduz uma nova noção.

Após apresentar o que se espera do trabalho do professor e do aluno, no

desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem de Matemática, encontram-se

no documento as finalidades do ensino da Matemática para o desenvolvimento da

cidadania nos alunos desta etapa da escolaridade, apresentadas na seqüência.

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• Identificar os conhecimentos matemáticos, como meio para compreender e

transformar o mundo à sua volta e perceber o caráter de jogo intelectual,

característico da Matemática, como aspecto que estimula o interesse, a

curiosidade, o espírito de investigação e o desenvolvimento da capacidade para

resolver problemas.

• Fazer observações sistemáticas de aspectos quantitativos e qualitativos da

realidade, estabelecendo inter-relações entre eles, utilizando o conhecimento

matemático (aritmético, geométrico, métrico, algébrico, estatístico, combinatório,

probabilístico).

• Selecionar, organizar e produzir informações relevantes, para interpretá-las e

avaliá-las criticamente.

• Resolver situações-problema, sabendo validar estratégias e resultados,

desenvolvendo formas de raciocínio e processos, como intuição, indução,

dedução, analogia, estimativa, e utilizando conceitos e procedimentos

matemáticos, bem como instrumentos tecnológicos disponíveis.

• Comunicar-se matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar

resultados com precisão e argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da

linguagem oral e estabelecendo relações entre ela e diferentes representações

matemáticas.

• Estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre

esses temas e conhecimentos de outras áreas curriculares.

• Sentir-se seguro da própria capacidade de construir conhecimentos matemáticos,

desenvolvendo a auto-estima e a perseverança na busca de soluções.

• Interagir com seus pares de forma cooperativa, trabalhando coletivamente na

busca de soluções para problemas propostos, identificando aspectos

consensuais ou não na discussão de um assunto, respeitando o modo de pensar

dos colegas e aprendendo com eles. (BRASIL, 1998, p.47 – 48)

Em seguida, o documento apresenta a seleção dos conteúdos de Matemática

que estão organizados em quatro grandes blocos: Números e Operações, Espaço e

Forma, Grandezas e Medidas e Tratamento da Informação.

O objeto de estudo desta pesquisa, isto é, a noção de sistemas de equações

lineares faz parte do bloco Números e Operações. A respeito dos conteúdos que

compõem esse bloco, os autores explicitam o que se espera do trabalho com as noções

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de números e operações e como se deseja que seja trabalhada a álgebra nesta etapa

da escolaridade, dizendo que:

Embora nas séries iniciais já se possa desenvolver alguns aspectos da

álgebra, é especialmente nas séries finais do Ensino Fundamental que as

atividades algébricas serão ampliadas. Pela exploração de situações-

problema, o aluno reconhecerá diferentes funções da Álgebra (generalizar

padrões aritméticos, estabelecer relação entre duas grandezas, modelizar,

resolver problemas aritmeticamente difíceis), representará problemas por meio

de equações e inequações (diferenciando parâmetros, variáveis, incógnitas,

tomando contato com fórmulas), compreenderá a “sintaxe” (regras para

resolução) de uma equação. [...] Esse encaminhamento dado à Álgebra, a

partir de generalização de padrões, bem como o estudo da variação de

grandezas possibilita a exploração da noção de função nos terceiro e quarto

ciclos. Entretanto, a abordagem formal desse conceito deverá ser objeto de

estudo do ensino médio. (BRASIL, 1998, p.50 – 51)

Uma vez discutido o papel do desenvolvimento das noções de álgebra no Ensino

Fundamental, o documento sugere a análise dos pontos abaixo, para a organização

dos conteúdos.

• A variedade de conexões que podem ser estabelecidas entre os diferentes

blocos, ou seja, ao planejar suas atividades, o professor procurará articular

múltiplos aspectos dos diferentes conteúdos, visando a possibilitar a

compreensão mais ampla que o aluno possa atingir a respeito dos princípios e

métodos básicos do corpo de conhecimentos matemáticos (proporcionalidade,

equivalência, indução, dedução etc.); além disso, buscará estabelecer ligações

entre a Matemática, as situações cotidianas dos alunos e as outras áreas do

conhecimento;

• As possibilidades de seqüenciar os conteúdos são múltiplas e decorrem mais

das conexões que se estabelecem e dos conhecimentos já construídos pelos

alunos do que da idéia de pré-requisito ou de uma sucessão de tópicos

estabelecida a priori. Embora existam conhecimentos que precedam outros, a

hierarquização entre eles não é tão rígida como tradicionalmente é

apresentada;

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• Os conteúdos organizados em função de uma conexão não precisam ser

esgotados necessariamente de uma única vez, embora deva-se chegar a

algum nível de sistematização para que possam ser aplicados em novas

situações. Alguns desses conteúdos serão aprofundados, posteriormente em

outras conexões, ampliando dessa forma a compreensão dos conceitos e

procedimentos envolvidos;

• Os níveis de aprofundamento dos conteúdos em função das possibilidades de

compreensão dos alunos, isto é, levando em conta que um mesmo tema será

explorado em diferentes momentos da aprendizagem e que sua consolidação

se dará pelo número cada vez maior de relações estabelecidas;

• A ênfase maior ou menor que deve ser dada a cada item, ou seja, que pontos

merecem mais atenção e que pontos não são tão essenciais; assim, por

exemplo, o estudo da representação decimal dos números racionais é

fundamental devido à disseminação das calculadoras e de outros instrumentos

que a utilizam. (BRASIL, 1998, p.53-54)

A proposta acima pode ser identificada como a organização praxeológica

esperada, onde é possível identificar que diversas praxeologias podem ser

organizadas, uma vez que o professor tem a possibilidade de tratar as diferentes

noções a serem introduzidas, considerando os conhecimentos prévios dos alunos,

assim como os objetos ostensivos e não ostensivos que serão privilegiados.

A noção de sistemas de equações lineares aparece, implicitamente, no quadro

sobre conceitos e procedimentos, no bloco Números e Operações, a ser trabalhado nas

séries finais do Ensino Fundamental, sem orientações e exemplos mais específicos de

como trabalhar esta noção, pois nem mesmo o conceito de equações e inequações é

explicitado nesta proposta. As indicações dos conteúdos envolvendo os conceitos de

equação, inequação e sistema de equações lineares estão destacadas em negrito a

seguir.

• Constatação que existem situações-problema, em particular algumas

vinculadas à Geometria e Medidas, cujas soluções não são dadas por números

racionais (caso do p, da 2 , 3 etc.).

• Identificação de um número irracional como um número de representação

decimal infinita, e não-periódica, e localização de alguns deles na reta

numérica, com régua e compasso.

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• Análise, interpretação, formulação e resolução de situações-problema,

compreendendo diferentes significados das operações, envolvendo números

naturais, inteiros, racionais e irracionais aproximados por racionais.

• Resolução de situações-problema de contagem, que envolvem o princípio

multiplicativo, por meio de estratégias variadas, como a construção de

diagramas, tabelas e esquemas sem a aplicação de fórmulas.

• Construção de procedimentos para calcular o número de diagonais de um

polígono pela observação de regularidades existentes entre o número de lados

e o de diagonais.

• Identificação da natureza da variação de duas grand ezas diretamente

proporcionais, inversamente proporcionais ou não-pr oporcionais (afim

ou quadrática), expressando a relação existente por meio de uma

sentença algébrica e representando-a no plano carte siano.

• Resolução de problemas que envolvem grandezas diret amente

proporcionais ou inversamente proporcionais por mei o de estratégias

variadas, incluindo a regra de três.

• Resolução de situações-problema que envolvem juros simples e alguns

casos de juros compostos, construindo estratégias v ariadas,

particularmente as que fazem uso de calculadora.

• Tradução de situações-problema por equações ou ineq uações do

primeiro grau, utilizando as propriedades da iguald ade ou desigualdade,

na construção de procedimentos para resolvê-las, di scutindo o

significado das raízes encontradas em confronto com a situação

proposta.

• Resolução de situações-problema por meio de um sist ema de

equações do primeiro grau, construindo diferentes p rocedimentos para

resolvê-lo, inclusive o da representação das equaçõ es no plano

cartesiano, discutindo o significado das raízes enc ontradas em confronto

com a situação proposta.

• Construção de procedimentos para calcular o valor n umérico e efetuar

operações com expressões algébricas, utilizando as propriedades

conhecidas.

• Obtenção de expressões equivalentes a uma expressão algébrica por

meio de fatorações e simplificações.

• Resolução de situações-problema que podem ser resolvidas por uma equação

do segundo grau cujas raízes sejam obtidas pela fatoração, discutindo o

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significado dessas raízes em confronto com a situação proposta. (BRASIL,

1998, p. 87 – 88)

Levando em conta essas orientações, cabe ao professor (ou o professor deve ter

autonomia para) analisar os conhecimentos prévios de seus alunos e propor a

organização praxeológica, em função desses conhecimentos, escolhendo os objetos

ostensivos e não ostensivos que irá privilegiar.

Verifica-se que nos Parâmetros Curriculares Nacionais existe uma intenção de

se levar em conta as diferentes organizações praxeológicas, embora este termo não

apareça no documento, pois transparece no texto o incentivo à reflexão sobre as

diversas possibilidades de tratamento de uma noção matemática, em função do grupo

de alunos com os quais se está trabalhando. Esta possibilidade de diferentes

organizações praxeológicas precisa ser melhor explicitada, por meio de exemplos que

auxiliem o professor no desenvolvimento das tarefas que fazem parte de seu “topos”, e

na escolha dos objetos ostensivos e não ostensivos mais adequados às diferentes

turmas com as quais está trabalhando, possibilitando assim um tratamento diferenciado.

Vale ressaltar que a existência de diversas relações institucionais, dificulta a

avaliação institucional das relações pessoais desenvolvidas pelos alunos por meio de

provas internacionais, nacionais, estaduais, municipais e entre diferentes escolas. Esta

questão da avaliação das relações pessoais em função das relações institucionais

existentes parece interessante, mas será deixada como um objeto de uma nova

pesquisa.

Tendo em vista que os Parâmetros Curriculares Nacionais foram elaborados com

base na Proposta Curricular de Matemática do estado de São Paulo (1987), considera-

se que a análise dessa Proposta poderá trazer mais elementos para este estudo.

2.3 A Proposta Curricular do Estado de São Paulo

No prefácio da proposta curricular os autores identificam a existência de

problemas com o ensino da Matemática nas escolas públicas com base no relato de

alguns professores.

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Preocupação excessiva com o treino de habilidades com a mecanização de

algoritmos, com a memorização de regras e esquemas de resolução de

problemas, com a repetição e a imitação e não com uma aprendizagem que se

dê, inicialmente, pela compreensão de conceitos e de propriedades, pela

exploração de situações-problema nas quais o aluno é levado a exercitar sua

criatividade, sua intuição. A priorização dos temas algébricos e a redução ou,

muitas vezes, eliminação de um trabalho envolvendo tópicos de Geometria. A

tentativa de se exigir do aluno uma formalização precoce e um nível de

abstração em desacordo com seu amadurecimento. (Proposta Curricular

Estado São Paulo, ano 1991, p-7)

Numa tentativa de mudar este panorama, que segundo os professores eram

priorizados pelos livros didáticos, constitui-se uma equipe técnica e elabora-se uma

1a versão da proposta, que após discussão nas delegacias de ensino permite a

elaboração de uma 2a versão do documento apresentado pela equipe técnica. Esta

versão tendo a participação de alguns professores que trabalhavam nas escolas

públicas em 1987.

Nesta versão optou-se pela apresentação dos conteúdos em diferentes níveis

de abordagens, ou seja, cabe ao professor efetuar a organização praxeológica e

escolher os ostensivos e não ostensivos possíveis de serem trabalhados com os

diferentes grupos de alunos.

Neste momento, é importante observar que a Proposta deveria ser utilizada

como referência do trabalho a ser apresentado aos professores, pelos livros

didáticos, e estes corresponderiam a uma determinada organização praxeológica

que supõe que os alunos disponham de determinados objetos ostensivos e não

ostensivos que sustentam este trabalho, não levando em conta os diferentes casos,

como propõe o texto a seguir, extraído da Proposta:

Desse modo, uma mesma noção deverá ser retomada em diferentes ocasiões,

que sejam convenientes, de modo a permitir sua elaboração e reelaboração

por parte do estudante, desde um primeiro contato, onde ele capta

intuitivamente as idéias básicas e as aplica em situações-problema, até a fase

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em que é utilizado o pensamento lógico-dedutivo, permitindo uma progressiva

formalização e sistematização do conceito enfocado. (Proposta Curricular

Estado São Paulo, 1991, p-8)”.

Dessa forma, a Proposta Curricular do Estado de São Paulo considera duas

vertentes básicas, para justificar o ensino da Matemática no Ensino Fundamental

nível II: uma associada a um trabalho centrado nos objetos ostensivos que

sustentam as diferentes noções matemáticas e a outra que trata mais

especificamente dos não ostensivos que justificam os ostensivos utilizados, como

mostra o texto abaixo:

Ela [a Matemática] é necessária em atividades práticas que envolvem aspectos

quantitativos da realidade, como são as que lidam com grandezas, contagens,

medidas técnicas de cálculo etc. Ela desenvolve o raciocínio lógico, a

capacidade de abstrair, generalizar, projetar, transcender o que é

imediatamente sensível. (Proposta Curricular Estado São Paulo, ano 1991, p-

9).

Nessa Proposta, verifica-se que existe a preocupação com a organização do

currículo de forma a atingir as metas existentes nestas duas vertentes, isto é, coloca-

se, ainda em evidência que essas duas funções da Matemática, isto é, a função de

aplicação prática e desenvolvimento do raciocínio lógico são mais simples de serem

aceitas, mas a organização do currículo para atingir tais metas é que apresenta

maior resistência.

Não é difícil entrar em acordo quanto a esta dupla função da MATEMÁTICA: as

aplicações práticas e o desenvolvimento do raciocínio. Já não é tão simples,

no entanto, um acordo sobre o modo como um currículo deve ser organizado

para que tais metas sejam atingidas. (Proposta Curricular Estado São Paulo,

ano 1991, p-9)

Esta dificuldade pode estar associada à falta de exemplos que possam auxiliar o

professor a compreender melhor a possibilidade de existência de diversas

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organizações praxeológicas e de escolha dos ostensivos e não ostensivos que serão

privilegiados, uma vez que esta escolha depende não só das possíveis

organizações, mas dos conhecimentos prévios dos diferentes grupos de alunos.

Além disso, pode-se supor ainda que essa resistência está associada ao fato de

que para atingir essa meta, tanto o professor como o aluno devem desempenhar seu

papel no processo de ensino e aprendizagem, ou seja, existe aqui uma indicação do

“topos” do aluno e do professor do Ensino Fundamental, que pode ser associado à

responsabilidade de cada um em relação às noções que devem ser disponíveis

(Robert, 1997) para que se estabeleça o processo de ensino e aprendizagem, isto é,

que ostensivos e não ostensivos privilegiar em função dos conhecimentos prévios

dos diferentes grupos de alunos.

Deve-se observar ainda, que para que, mesmo que o professor das diferentes

séries tenha a capacidade de retomar conteúdos ainda não disponíveis, que foram

trabalhados em séries anteriores, é preciso que o aluno também seja consciente de

que uma boa parte desse trabalho deve ser executado por ele, que poderá procurar

seus próprios meios de preencher as lacunas de sua formação.

Sendo assim, verifica-se na citação acima, que se espera que os alunos do

Ensino Fundamental sejam capazes de utilizar as noções matemáticas

desenvolvidas em sala de aula de forma autônoma, podendo planejar, desenvolver,

controlar e justificar o trabalho matemático em jogo nas diversas situações-problema

que podem encontrar na sua vida escolar e profissional.

Ainda no prefácio, observa-se que para que o aluno possa representar seu papel

de forma autônoma, contribuindo para o seu desenvolvimento cognitivo, não é

apenas a Matemática que precisa ser repensada, mas as outras disciplinas em que

professores e alunos precisam assumir seu papel como agentes de transformação

do processo de ensino e aprendizagem.

Além disso, é preciso que os professores conheçam os diferentes objetos

ostensivos associados a um determinado não ostensivo, para que possam propor

situações em que é possível articulá-los de forma a conduzir seus alunos à

compreensão das diferentes formas de tratamento de um mesmo objeto matemático.

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Para um trabalho mais especifico sobre a Matemática, os autores da Proposta

escolhem os conteúdos e suas respectivas abordagens apenas para dois assuntos:

Números e Geometria, mostrando a importância de trabalhar esses assuntos, de

diferentes formas, articulando assim os diferentes conhecimentos matemáticos em

jogo. Nas sugestões apresentadas, considera-se primeiro uma abordagem intuitiva,

isto é, utilizando os possíveis ostensivos para o desenvolvimento do trabalho

matemático proposto, levando a uma sistematização do conhecimento que se deseja

construir, o que de certa forma, para a introdução das noções de número e de

geometria corresponde a um trabalho que pode ser mais bem compreendido quando

considera uma análise epistemológica da gênese desses conhecimentos, onde

diversos ostensivos são utilizados para se chegar aos não ostensivos que permitem

definí-los e justificá-los.

Pode-se estudar os NÚMEROS a partir de sua organização em conjuntos

numéricos, passando-se dos Naturais aos Inteiros, aos Racionais, aos Reais,

tendo como fio condutor as propriedades estruturais que caracterizam tais

conjuntos, ou pode-se estudá-los acompanhando a evolução da noção de

número a partir tanto de contagens como de medidas, sem ter ainda as

propriedades estruturais claramente divisadas, deixando-se guiar pelo fio

condutor que a Historia propicia e trocando assim uma sistematização

prematura por uma abordagem mais rica em significados. Nessa proposta,

optou-se por essa última abordagem, conforme será visto adiante. Pode-se

estudar Geometria tendo como meta primordialmente a aprendizagem da

lógica, da organização do conhecimento, partindo-se de pontos, retas e planos

para somente ao final do percurso tratar de objetos tridimensionais. Pode-se

ainda considerar o eixo para o ensino da Geometria o estudo de certas classes

de transformações e das propriedades que elas preservam, desde as mais

gerais que são as topológicas até as mais específicas que são as métricas,

passando pelas propriedades projetivas; ou pode-se partir da manipulação dos

objetos, do reconhecimento das formas mais freqüentes, da sua caracterização

através das propriedades, da passagem dos relacionamentos entre os objetos

para o encadeamento de propriedades, para somente ao final do percurso

aproximar-se de uma sistematização. Aqui a opção pelo último percurso citado

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se evidencia desde os primeiros contatos. (Proposta Curricular Estado São

Paulo, ano 1991, p-11).

Nessa proposta, observa-se mais de uma possibilidade de abordagem, para

justificar a escolha feita pelo grupo (equipe de professores), ou seja, implicitamente é

considerada a possibilidade de diferentes organizações praxeológicas e a escolha

dos ostensivos e não ostensivos mais adequados às turmas com as quais se está

trabalhando. Sente-se falta de exemplos que poderiam auxiliar o professor a

compreender melhor estas possibilidades.

Justifica-se que a Matemática deve ser um instrumento para a vida, e o

desenvolvimento do raciocínio, permitindo a participação do aluno na construção do

conhecimento e na identificação das idéias fundamentais que permitem a utilização

de forma articulada dos conhecimentos matemáticos desenvolvidos nesta etapa da

escolaridade.

De modo geral, em MATEMÁTICA, o conteúdo a ser ensinado é um veiculo

para o desenvolvimento de uma série de idéias fundamentais,

convenientemente articuladas, tendo em vista as grandes metas que são a

instrumentação para a vida e o desenvolvimento do raciocínio. Tais idéias

fundamentais, como são , por exemplo, as de proporcionalidade, equivalência,

semelhanças, têm como suporte, muitas vezes, mais de um assunto da lista de

conteúdos. Elas, no entanto, é que são fundamentais e não os assuntos em si.

Essa distinção é essencial, sendo um fato patente a possibilidade de

constituição de propostas significativamente distintas a partir da mesma lista de

conteúdos. No que se refere à abordagem, nesta Proposta ressalta-se ainda

que o trabalho do professor junto aos alunos deve observar não apenas a

seqüência dos temas e sua interdependência, mas também a participação

ativa dos alunos na descoberta e assimilação de idéias matemáticas. O

recurso à resolução de situações-problema, em que o aluno é desafiado a

refletir, discutir com o grupo, elaborar hipóteses e procedimentos, extrapolar as

aplicações e enfrentar situações novas, não se restringindo apenas àqueles

problemas que conduzem a uma única solução ou que tenham caráter

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repetitivo de aplicação de conceito, é possibilidade de raciocínio e ação.

(Proposta Curricular Estado São Paulo , ano 199, p. 11-12).

Além disso, considera-se a Matemática como uma linguagem que, junto com a

linguagem natural permite interpretar, planejar, executar, controlar e justificar, com

argumentos lógicos, as diferentes situações que o aluno irá encontrar na vida escolar

ou profissional.

“Evidentemente, estamos considerando que aprender a língua natural é mais

do que aprender a descrever o mundo; é também interpretar, criar significados,

construir esquemas conceituais, desenvolver o raciocínio Iógico, a capacidade

de compreender, imaginar, extrapolar.” (Proposta Curricular Estado São Paulo,

ano 1991, p-13).

Apesar de levar em conta, implicitamente, a questão das diferentes

representações, não há na Proposta indicações de trabalho para estudo e pesquisa

do professor o que dificulta a possibilidade de se encontrar outros meios para

desenvolver os respectivos temas com os alunos.

Após a apresentação do papel que deve desempenhar a Matemática no

processo de ensino e aprendizagem, considera-se a questão da avaliação, que deve

levar em conta os conhecimentos prévios dos alunos para incentivá-los a buscar

novos conhecimentos para o seu próprio desenvolvimento cognitivo.

Sendo assim, na estrutura da proposta, ao longo das oito séries consideram-se os

três temas: Números, Geometria e Medidas, que devem permitir avançar no

desenvolvimento da formação em função das duas vertentes estabelecidas

inicialmente.

“[...] No ciclo básico, as atividades preparatórias, envolvendo classificações,

seqüências e simbolizações em sentido amplo, deverão conduzir a uma noção

inicial de número e de sistema de numeração. Pretende-se uma introdução

aos números naturais, através da contagem e das operações básicas. A partir

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de seu significado concreto, sem ter ainda preocupações com a formalização

de propriedades” (Proposta Curricular Estado São Paulo, ano 1991, p.19).

Ao tratar, por exemplo, a Geometria é considerado importante a exploração

sensorial, que pode ser lida aqui como os ostensivos associados ao trabalho a ser

realizado, e a articulação entre os conhecimentos prévios associados às medidas e

ao sistema métrico decimal levando em conta as propriedades numéricas e

geométricas, passando assim do cálculo literal para o estudo, por exemplo, das

equações e inequações sem a preocupação de sistematização e formalismo, mas

que possibilitem as generalizações possíveis, isto é, mesmo não utilizando estes

termos, o que se propõe é um trabalho sobre os ostensivos de forma a estabelecer

apenas um discurso tecnológico que os justifique sem desenvolver os não ostensivos

que os sustentam.

Dessa forma, para auxiliar o professor no desenvolvimento do seu trabalho,

levando em conta a abordagem articulada proposta acima e os conhecimentos

prévios dos alunos, são dadas tabelas com o objetivo de desenvolver diferentes

noções nas diferentes séries e discutem-se as possibilidades de trabalhar estas

noções.

Para a noção de sistema de equações lineares, que é objeto de estudo desta

pesquisa, observa-se que ela integra o tema “números” para o item noção de

equações e inequações do 1º grau com uma incógnita.

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Fonte: Proposta Curricular do Estado de São Paulo, 1991, p. 129

A sugestão de abordagem da noção de sistemas de equações lineares proposta

ao professor segue a seguinte estrutura:

Inicia-se com a proposta de uma abordagem intuitiva das noções de equação e

inequação do 1º grau com uma incógnita envolvendo as operações de adição,

subtração, multiplicação, divisão e potenciação associadas à resolução de problemas

simples, em que diferentes objetos ostensivos podem ser utilizados, passando a

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situações-problema que possam ser traduzidas por equações com mais de uma

incógnita e cujo grau seja maior ou igual a 1. Essas situações devem levar o aluno a

perceber a necessidade de uma técnica para a resolução de equações. Na Proposta

são encontrados alguns exemplos para ilustrar a abordagem acima sugerida.

Após este trabalho de introdução da noção de equação a partir de situações-

problema, passa-se ao tratamento formal desta noção matemática pela proposta de

classificação das equações quanto ao número de incógnitas e quanto ao grau,

estudo das propriedades de uma igualdade numérica, o estudo das técnicas de

resolução de equações do primeiro grau com uma incógnita, o estudo de problemas

para os quais a noção de equação é necessária para a sua solução, o conceito de

inequação do 1º grau com uma incógnita, as propriedades das desigualdades

numéricas, as técnicas de resolução de inequações do 1º grau com uma incógnita,

isto é, a partir da representação da situação por meio de uma equação, são

considerados os ostensivos e não ostensivos em jogo, que por meio de um discurso

tecnológico permitem planejar, executar, controlar e justificar a solução proposta.

Após a introdução das noções de equação e inequação do 1º grau com uma

incógnita é proposta a introdução da noção de sistemas de equações do 1º grau

(lineares) com duas incógnitas.

Sendo assim, verifica-se que o aluno, ao passar para o estudo da noção de

sistemas de equações lineares, já dispõe de conhecimentos sobre equações e

inequações do 1º grau com uma incógnita, ou seja, o não ostensivo - equação e

inequação do 1° grau com uma incógnita - e os osten sivos que lhe são associados,

assim como o discurso tecnológico desenvolvido para justificar as diferentes etapas

de solução de equações devem fazer parte dos conhecimentos prévios dos alunos.

Consideram-se, ainda, alguns exemplos de situações-problema, em que é

possível verificar a necessidade de um discurso tecnológico que justifica a escolha

dos ostensivos e não ostensivos necessários para a solução das mesmas:

Um menino quer cortar um pedaço de barbante de 30 cm de comprimento, em

duas partes não necessariamente iguais. Quanto deverá medir cada parte? Um

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menino quer cortar um pedaço de barbante de 30 cm de comprimento em duas

partes, de forma que uma dessas partes meça o dobro da outra. Quanto

deverá medir cada parte? Um menino quer dividir um pedaço de barbante de

36 cm de comprimento em quatro partes de modo que uma dessas partes seja

igual ao triplo de uma das outras três. Quanto deverá medir cada parte? A

soma de um número com o seu quadrado é igual a 30. Qual é esse número?

De um quadrado feito em papel-cartão, com 10 cm de lado, um menino quer

recortar três outros quadrados iguais de forma que as áreas restantes do

quadrado maior sejam de 88 cm2 . Quanto deve medir o lado de cada um dos

três quadrados recortados?” (Proposta Curricular Estado São Paulo, 1992,

p.129 - 130,).

Certamente, alguns exemplos não necessitam de sua tradução por meio de

equações, podendo ser resolvidos até mentalmente, mas, de acordo com o texto,

espera-se que o professor crie seus próprios exemplos de forma a favorecer a

utilização de outros ostensivos para a introdução da noção de sistemas de equações

lineares.

Observa-se ainda que na situação-problema encontrada na proposta “Um

menino quer cortar um pedaço de barbante de 30 cm de comprimento em duas

partes, de forma que uma dessas partes seja o dobro da outra. Quanto deverá medir

cada parte?” (Proposta do Estado de São Paulo, 1992, p. 130) o aluno não necessita

utilizar a noção de sistemas de equações lineares, pois o exemplo dado exige

apenas a tradução da situação do registro da língua natural para uma representação

em forma de tabela, podendo ser resolvido mentalmente utilizando apenas o registro

oral. Para os alunos que necessitam do registro escrito, pode-se fazê-lo por meio de

uma tabela que permite um discurso tecnológico que justifica o trabalho desenvolvido

e que pode auxiliar na passagem para a representação por meio de uma equação da

situação proposta.

Na seqüência, apresenta-se uma possível forma de construir essa tabela que

poderá ser traduzida por meio de um sistema de equação lineares com duas

incógnitas.

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Parte 1 Parte 2 Soma Total Barbante

2 4 2 + 4 6 cm

5 10 5 + 10 15 cm

10 20 10 + 20 30 cm

x y = x y + x X + y = 30

2 4 2 + 4 6 cm

5 10 5 + 10 15 cm

10 20 10 + 20 30 cm

Na realidade, o exemplo é simples e pode ser resolvido por meio do cálculo

mental, o que torna a transformação em equações um estudo que poderá ser

considerado como desnecessário, para aqueles que dispõem da habilidade de

cálculo mental.

É importante explicitar este papel didático da tarefa para os alunos e o professor

deve estar consciente de que, nas avaliações, o cálculo mental também poderá ser

utilizado para valorizar todos os ostensivos possíveis de trabalho nas tarefas

propostas.

2.4 Considerações Finais

Tanto os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) como a Proposta Curricular

do Estado de São Paulo são documentos que colocam em evidência a existência de

uma grande possibilidade de organizações praxeológicas que devem estar

associadas aos conhecimentos prévios dos alunos e que deixam a cargo do

professor privilegiar diferentes formas de tratamento de uma noção matemática,

escolhendo os ostensivos e não ostensivos que deseja desenvolver com seus

alunos.

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Apesar desta possibilidade de escolhas, existem poucos exemplos e indicações

de trabalhos de educação e de educação matemática que auxiliem os professores na

reflexão sobre o que se está propondo. Certamente, este trabalho é deixado,

propositalmente, como uma sugestão de pesquisa para o professor.

Verifica-se, ainda, que tanto nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) como

na Proposta Curricular do Estado de São Paulo (1991) a noção de sistemas de

equações lineares está centrada numa abordagem que privilegia a representação

algébrica do sistema, mesmo para os casos em que o ostensivo oral permite a

solução da tarefa proposta.

A estrutura de ensino da noção de sistemas de equações lineares nos

Parâmetros Curriculares Nacionais é delineada no bloco Números e Operações, em

que são explicitadas as passagens do quadro ou domínio numérico para o quadro

algébrico, embora estes termos não sejam utilizados no documento.

Em relação à Proposta Curricular do Estado de São Paulo, esta estrutura é

definida no bloco Números, em que, da mesma forma, o desenvolvimento da noção

de números e operações permite a passagem do quadro numérico para o quadro

algébrico, não sendo estes termos utilizados, explicitamente, pelos autores.

Verifica-se, na Proposta Curricular, que a abordagem sugerida é seguida de

alguns exemplos de ilustração para o professor, mas não se encontram referências

de outros trabalhos que poderiam auxiliar a compreensão, por exemplo, das noções

matemáticas em jogo e de suas possibilidades de articulação tanto na própria

Matemática como com as outras ciências.

Na realidade, é proposta uma introdução em que se consideram exemplos muito

simples que não necessitam da representação algébrica do sistema em jogo, mas é

esta que é considerada, pois se espera que o aluno, após traduzir o problema por

meio de duas sentenças, seja capaz de levantar as soluções para cada condição,

discutindo a simultaneidade das soluções e efetuando sua representação

geométrica, ou seja, os quadros algébrico e geométrico são privilegiados, mesmo

para as questões que poderiam ser trabalhadas reportando-se apenas ao quadro

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numérico. Percebe-se, desse modo, que o ostensivo escrito é privilegiado pelos

autores, fato já observado por Chevallard (1999).

Assim, quando se consideram exemplos simples, que não necessitam apenas

do quadro algébrico, as tarefas funcionam como exemplos didáticos que podem se

tornar um obstáculo didático26 para o desenvolvimento da noção de sistemas de

equações lineares, pois os estudantes podem considerar que esta noção é uma

ferramenta que se aplica somente para o estudo de tarefas matemáticas não

podendo ser utilizada em outros domínios ou mesmo para solução de situações

cotidianas.

Sendo assim, espera-se, sobretudo, que professor e aluno efetuem apenas um

trabalho de tradução do registro da língua natural para o registro de representação

algébrico e disponha de um método de solução de sistemas de duas equações e

duas incógnitas para encontrar as soluções. As atividades de interpretação e

tratamento das tarefas propostas são privilegiadas, mas não existe uma orientação

mais específica para a justificativa e controle dos resultados.

Dessa forma, as tarefas também privilegiam um trabalho centrado nos ostensivos

e nem mesmo o professor necessitará de conhecimentos mais específicos sobre

alguns dos não ostensivos em jogo nas tarefas propostas.

Sendo assim, é possível inferir que, talvez, os professores que trabalham apenas

no Ensino Fundamental, não percebam a importância dos conhecimentos de álgebra

e álgebra linear para agrupar as tecnologias em jogo, isto é, os não ostensivos que

justificam os métodos empregados para o desenvolvimento das tarefas propostas

nesta etapa da escolaridade. Ou seja, o trabalho proposto aos estudantes fica quase

que exclusivamente centrado na manipulação dos ostensivos considerados, que, em

geral, estão associados ao cálculo literal, pois são tratados como um conjunto de

métodos e leis que permitem executar a tarefa proposta e que podem ser justificados

26 Obstáculo didático : (associado à transposição didática) eles aparecem como conhecimentos resultantes de uma transposição didática antiga ou recente, mas que não é suscetível de uma renegociação pelo professor, pelo menos no quadro restrito de uma classe, que evitaria ter que considerá-las. (BROUSSEAU, 1983, p.45, tradução nossa)

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por meio de um discurso tecnológico adequado sem que para isto seja necessário

recorrer à teoria que os sustenta.

Sendo assim, é importante que o professor disponha de um discurso tecnológico

que justifique as técnicas empregadas, o que torna este trabalho ainda mais difícil

quando a questão pode ser resolvida utilizando apenas o cálculo mental, pois este

exige a tradução da tarefa do registro da língua natural para o registro numérico que

pode ser efetuada por meio da lógica dos alunos.

Dessa forma, pode-se dizer que o nível de conhecimento esperado dos alunos

do Ensino Fundamental quanto à noção de sistemas de equações lineares é o

disponível quando se considera a interpretação da tarefa e a conversão do registro

da língua natural para o registro de representação numérico ou algébrico e o nível

técnico para a solução das equações encontradas, pois se o aluno é capaz de aplicar

qualquer uma das técnicas desenvolvidas poderá encontrar a solução da questão.

Considerando que a noção de sistemas de equações lineares é introduzida no

Ensino Fundamental e que a escolha de sua abordagem está associada à solução

de situações-problema contextualizadas e para um tipo de sistema mais restrito, isto

é, o sistema de duas equações e duas incógnitas, esta abordagem que privilegia um

trabalho sobre os ostensivos e o nível técnico para o desenvolvimento das tarefas

propostas, nos parece que tanto os Parâmetros Curriculares Nacionais como a

Proposta Curricular do Estado de São Paulo apresentam uma orientação correta aos

professores, faltando apenas uma melhor explicitação do trabalho esperado, que

poderia ser feita por meio de referências de trabalhos de Educação e Educação

Matemática existentes, e que tratam mais especificamente da noção de sistemas de

equações lineares, pois o número de exemplos dados parece insuficiente para

considerar as possibilidades em termos de ostensivos possíveis para o tratamento

das possíveis tarefas encontradas nesta etapa da escolaridade assim como da

diversidade de organizações praxeológicas possíveis.

O texto a seguir mostra os exemplos apresentados nos Parâmetros Curriculares

Nacionais, como orientação para os professores no sentido de incentivar a utilização

da álgebra e que ilustra as considerações acima apresentadas.

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Fonte: BRASIL, 1998, p.121

Estes exemplos são gerais e não tratam especificamente da noção de sistemas

de equações lineares, colocando somente em evidência a importância da álgebra e

dos ostensivos em jogo quando se deseja fazer a mudança do quadro numérico para

o quadro algébrico.

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Verifica-se nos exemplos que os ostensivos construção de tabela, manipulação

de tabela, leitura de tabela, visualização de tabela, representação em língua natural,

representação algébrica, registro oral, registro escrito são utilizados como meios para

justificar a passagem ao quadro algébrico como uma forma de simplificar e

generalizar a tarefa proposta. Além disso, os exemplos apresentados propõem que o

professor discuta com seus alunos as noções de variável e incógnita presentes no

trabalho algébrico.

Seria interessante, que tanto os Parâmetros Curriculares Nacionais como a

Proposta Curricular do Estado de São Paulo apresentassem sugestões de leituras ao

professor que poderia compreender melhor o que se espera de seu trabalho em sala

de aula, uma vez que já existem trabalhos que tratam especificamente das questões

levantadas nesses documentos oficiais como, por exemplo, a articulação entre os

conhecimentos matemáticos e os de outros domínios da ciência, como por exemplo:

Física, Química, Biologia, Economia, etc.

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CAPÍTULO 3

POSSIBILIDADES DE ARTICULAÇÃO DOS OSTENSIVOS E NÃO

OSTENSIVOS NO ENSINO DA NOÇÃO DE SISTEMAS DE DUAS

EQUAÇÕES LINEARES E DUAS INCÓGNITAS

3.1 Considerações Iniciais

Neste capítulo se estuda as possibilidades de articulação dos ostensivos e não

ostensivos quando se introduz a noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas no Ensino Fundamental II. Pretende-se com este estudo mostrar a existência

de determinados tipos de tarefas típicas desta etapa da escolaridade, que podem ser

trabalhadas de diferentes formas, em função dos ostensivos escolhidos e que

permitem, ou não, a abordagem dos não ostensivos que lhes são associados. Além

disso, pretende-se identificar um discurso tecnológico que justifique técnicas,

tecnologias ou teorias que sustentam essas tarefas.

Para cada tarefa serão colocados em evidência os quadros ou domínios em jogo,

os ostensivos e não ostensivos que permitem as diferentes abordagens para a sua

solução, deixando claro quando o não ostensivo deve integrar os conhecimentos

prévios dos alunos ou quando faz parte apenas do “topos” do professor.

Para os diferentes níveis de solução da tarefa, isto é, nas abordagens

associadas aos não ostensivos necessários para a sua solução, serão levantados os

conhecimentos prévios dos alunos e o nível de conhecimento esperado para propor

uma ou outra abordagem. Neste caso, os exemplos serão apresentados para justificar

estas abordagens, deixando evidente quando a noção de sistema de duas equações

lineares e duas incógnitas é realmente necessária para a solução da questão proposta.

Finalmente, mostram-se os diferentes pontos de vista em jogo na solução das

tarefas que, em geral, são propostas para a introdução da noção de sistemas de duas

equações lineares e duas incógnitas no Ensino Fundamental nível II.

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Além disso, o estudo das possibilidades de articulação dos ostensivos e não

ostensivos no ensino da noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas deve auxiliar na compreensão das regularidades e diferenças que ocorrem

no ensino desta noção em diferentes décadas, cuja análise será realizada, neste

trabalho, via livros didáticos. Para a análise destes livros constrói-se uma grade e, na

seqüência, são apresentadas algumas das noções de didática da matemática utilizadas

na sua construção e que servem de referencial de apoio.

3.2 As noções didáticas utilizadas para a construçã o da grade

Inicia-se considerando os possíveis quadros ou domínios27 em que a tarefa pode

ser desenvolvida, a saber:

• Quadro numérico : que para o caso dos sistemas de duas equações lineares e

duas incógnitas exige apenas que o aluno disponha de conhecimentos sobre as

noções intuitivas de números naturais, inteiros e racionais, suas operações e as

regras de cálculo associadas a estes conjuntos numéricos.

• Quadro algébrico : que, no caso dos sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas, em geral, é proposto no Ensino Fundamental nível II, associado ao

cálculo literal, pois exige que o aluno represente o problema por meio de letras e

utilize as regras associadas aos métodos que podem ser desenvolvidos para a

solução desse tipo de sistema (método da eliminação, método da substituição,

método da comparação, método da adição, Bezout, artifício).

• Quadro geométrico : que possibilita a mudança do ostensivo representação

algébrica do sistema de duas equações lineares dado para o ostensivo

representação gráfica de equações no sistema cartesiano ortogonal, permitindo

discutir as possibilidades de solução do sistema e exigindo uma mudança entre

os quadros algébrico e geométrico.

27 Quadro ou domínio : [..] constituído de objetos de um ramo das matemáticas, das relações entre os objetos, de suas formulações eventualmente diversas e das imagens mentais associadas a essas relações. Essas imagens têm um papel essencial e funcionam como ferramentas dos objetos do domínio. Dois quadros podem conter os mesmos objetos e diferir pelas imagens mentais e problemáticas desenvolvidas (DOUADY, 1992, p.135, apud ANDRADE, 2006, p.14).

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Consideram-se ainda, os possíveis não ostensivos e ostensivos que podem ser

trabalhados com os alunos nesta etapa da escolaridade.

• Não ostensivos

- Operações de adição e multiplicação, subtração e divisão para os conjuntos

dos naturais, racionais, inteiros e irracionais;

- Um método de resolução de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas;

- Noções de cálculo literal (representação dos elementos por uma letra) e as

regras que lhes são associadas;

- Noções de cálculo algébrico e suas propriedades;

- Propriedades de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano para as

operações de adição e multiplicação em IR (para resolver o sistema pelo método da

substituição);

- Propriedades de estrutura de espaço vetorial (para o método da adição, que em

sistemas de m equações e n incógnitas será trabalhado pelo método do escalonamento

ou método de Gauss).

- Noção de sistemas de equações lineares;

- Noção de equações lineares;

- Noção de representação geométrica de equações lineares em IR2;

- Noção de retas no plano e suas propriedades;

- Noção de porcentagem;

- Noção de regra de três e frações algébricas.

• Ostensivos

- Construção da tabela;

- Manipulação da tabela;

- Leitura da tabela;

- Visualização da tabela;

- Representação em língua natural;

- Discurso oral;

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- Representação escrita;

- Representação algébrica de equações lineares e de sistemas de equações

lineares;

- Representação funcional ou representação implícita de equação linear;

- Representação gráfica de equações no sistema cartesiano ortogonal.

Em seguida, por meio de exemplos, estudam-se as possibilidades de solução da

tarefa em função dos níveis de conhecimento esperados dos alunos28 conforme

definição de Robert (1997).

Para levar em conta os diferentes pontos de vista29, conforme definição de

Rogalski (1995), que podem ser utilizados no desenvolvimento das tarefas possíveis

para esta etapa da escolaridade distinguiu-se os pontos de vista abaixo relacionados:

• Ponto de vista das equações lineares : quando a tarefa exige que o aluno

disponha de conhecimentos sobre a mudança da representação de equações

lineares em língua natural para a representação algébrica, na elaboração de uma

equação que representa o enunciado proposto, e também de conhecimentos

28 Níveis de conhecimento esperados dos alunos: níveis técnico, mobilizável e disponível conforme definição de Robert (1997) a saber: O nível técnico corresponde a um trabalho isolado, local e concreto. Está relacionado, principalmente, às ferramentas e definições necessárias à realização de uma determinada tarefa. Por exemplo: No caso dos sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas pode-se considerar uma tarefa de nível técnico quando se apresenta o sistema, com a indicação explícita do método a ser utilizado em sua solução. O nível mobilizável corresponde a um inicio de justaposição de saberes de um certo domínio, podendo até corresponder a uma organização, em que vários métodos podem se mobilizados. O caráter ferramenta e objeto do conceito estão em jogo, mas o que se questiona é explicitamente pedido. Se um saber é identificado, ele é considerado mobilizado se ele é acessível, isto é, se o aluno o utiliza corretamente. Por exemplo: Para o exemplo acima, cabe ao aluno escolher o método mais adequado para a solução do sistema proposto. O nível disponível corresponde a saber responder corretamente ao que é proposto sem indicações, de poder, por exemplo, saber dar contra-exemplos, encontrar ou criar, mudar de quadro, fazer relações, aplicar métodos não previstos. Este nível de conhecimento está associado à familiaridade, ao conhecimento de situações de referência variadas que o aluno conhece (servem de terreno de experimentação); está ligado ao fato de dispor de referências, de questionamentos, de uma organização. Podendo funcionar para um único problema ou possibilitando fazer resumos. Por exemplo: Para a noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, pode-se considerar a tarefa clássica em que são dados carros e motos, levando em conta que a partir do número total de carros e motos e das rodas dos mesmos, é possível descrevê-la e resolvê-la, quando se dispõe de conhecimentos associados à noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas. 29 Pontos de vista segundo Rogalski (1995) : “ Dois pontos de vista diferentes sobre um objeto matemático são outras maneiras de observá-los, de fazê-los funcionar, eventualmente de defini-los. Nesse sentido, observar um objeto em diferentes domínios, é considerar diferentes pontos de vista. Mas, podem-se considerar vários pontos de vista em um mesmo domínio.” (ROGALSKI. 1995, notas do seminário de São Paulo, PUC-SP, Brasil, apud ANDRADE, 2006, p.25).

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associados à solução de uma equação do primeiro grau que, teoricamente, estão

associados à noção de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano.

• Ponto de vista das tentativas : quando a tarefa é resolvida pela mobilização de

conhecimentos relacionados apenas ao quadro numérico e cujo ostensivo em

jogo é a tabela, exigindo que o aluno construa uma tabela, escolha diferentes

valores para os elementos propostos na situação e efetue as operações

indicadas, chegando ao resultado esperado.

• Ponto de vista dos sistemas de equações lineares : exige que o aluno

disponha de conhecimentos sobre a mudança do ostensivo representação em

língua natural para a representação algébrica de sistemas de equações lineares,

para escrever o sistema que representa a tarefa proposta, e também domine um

método de resolução de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas,

que teoricamente está associado à noção de estrutura de espaço vetorial.

Para melhor compreender as possibilidades de articulação, em termos de

quadros ou domínios em jogo nas tarefas que, em geral, são propostas no Ensino

Fundamental nível II, assim como os ostensivos, não ostensivos e níveis de

conhecimentos necessários em função dos diferentes pontos de vista que as mesmas

permitem levar em conta, constrói-se a grade de análise a seguir. Essa grade tem como

objetivo chamar a atenção sobre a importância de se considerar estas diferentes formas

de tratamento das tarefas propostas, uma vez que, dependendo do caminho escolhido,

são necessários diferentes níveis de conhecimento em relação à noções matemáticas

distintas.

Tentar-se-á mostrar ainda quando o conhecimento deve fazer parte do “topos” do

aluno e/ou do professor.

3.3 A grade de análise

Para examinar as diferentes tarefas que podem ser propostas quando se

introduz a noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas no Ensino

Fundamental nível II, os quadros ou domínios em jogo, os ostensivos e não ostensivos

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necessários para o desenvolvimento das os níveis de conhecimento, assim como os

pontos de vista sob os quais as mesmas podem ser tratadas, é construída a seguinte

grade de análise, cujo propósito é servir de instrumento que permite estudar, mais

particularmente, os ostensivos e não ostensivos possíveis para a introdução dessa

noção, destacando

• as tarefas associadas à noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas, em geral, trabalhadas no Ensino Fundamental nível II;

• as variáveis destas tarefas , para as quais se deu ênfase aos ostensivos e não

ostensivos possíveis para a sua solução e também às necessidades de mudança

de quadro ou domínio em função dos níveis de conhecimentos esperados dos

professores e alunos e em relação ao ponto de vista escolhido para sua solução.

Para especificar as tarefas em relação ao estudo dos ostensivos e não

ostensivos possíveis para a sua solução consideram-se as seguintes variáveis das

tarefas :

• O tipo de situação dada no enunciado da tarefa;

• Os quadros ou domínios em que a tarefa é enunciada;

• Os não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, colocando em

evidência aqueles que devem fazer parte do “topos” do aluno e/ou do professor;

• Os ostensivos possíveis para o desenvolvimento das tarefas;

• Os quadros ou domínios que podem ser utilizados para a solução da tarefa;

• Os níveis de conhecimento esperados para a solução da tarefa, em função do

ponto de vista escolhido;

• Os pontos de vista sob os quais a tarefa pode ser trabalhada, colocando em

evidência aquele que lhe é mais adequado.

Esta grade permite analisar os ostensivos e não ostensivos possíveis de serem

desenvolvidos quando se introduz a noção de sistemas de duas equações lineares e

duas incógnitas no Ensino Fundamental II. Além disso, também serve para analisar os

quadros ou domínios e as mudanças de quadro necessárias em função do ponto de

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vista escolhido, assim como o conhecimento prévio esperado dos alunos e professores

em função do “topos” e do nível de conhecimento esperado de cada um deles para as

diferentes noções em questão.

3.4 Exemplos de funcionamento da grade

Na seqüência, a fim de explicitar o funcionamento da grade de análise,

considera-se a tarefa geral e, em seguida, apresenta-se um ou mais exemplos. Estes

exemplos são os casos particulares que permitirão a análise da relação institucional

existente, via estudo das tarefas encontradas nos livros didáticos para as décadas

escolhidas.

Tentar-se-á compreender melhor as possíveis mudanças em relação ao ensino

proposto, isto é, qual a relação institucional existente nas diferentes décadas e quais as

regularidades e diferenças entre elas, em estudo que está descrito no capítulo 4.

Tarefa 1 : Situação matemática enunciada no quadro numérico.

• Tipo de situação dada no enunciado da tarefa:

Exemplo 1 :

1) Dois números têm a soma 111 e diferença 33. Quais são eles? (IEZZI et al, 2000,

p.259).

Trata-se de situação matemática em que a operação de adição é enunciada por

seu resultado – soma (resultado da adição de dois números) e diferença (adição de um

número ao oposto de outro número).

• Quadro ou domínio em que a tarefa é enunciada

Numérico

• Não ostensivos

- Operações de adição e multiplicação, subtração e divisão para o conjunto dos

números naturais (“topos” do aluno e professor);

- Um método de resolução de sistemas lineares (“topos” do aluno e do

professor);

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- Noções de cálculo literal (representação dos elementos por uma letra) (“topos”

do aluno e do professor);

- Noções de cálculo algébrico (“topos” do professor);

- Propriedades de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo, abeliano e estrutura

de corpo (para resolver o sistema pelo método da substituição) (“topos” do professor);

- Propriedades de estrutura de espaço vetorial (para o método da adição que em

sistemas de m equações e n incógnitas será trabalhado pelo método do escalonamento

ou método de Gauss) (“topos” do professor);

- Noção de sistemas de equações lineares (“topos” do aluno e do professor);

- Noção de equações lineares (“topos” do aluno e do professor).

• Ostensivos

- Construção da tabela;

- Manipulação da tabela;

- Leitura da tabela;

- Visualização da tabela

- Representação em língua natural;

- Discurso oral;

- Representação escrita;

- Representação algébrica de equações e de sistemas.

• Quadros ou domínios que podem ser utilizados para a solução da tarefa

Numérico ou algébrico.

• Níveis de Conhecimento esperados para a solução da tarefa

A tarefa pode ser trabalhada em diferentes níveis dependendo dos

conhecimentos disponíveis dos alunos.

Se os alunos dispõem apenas de conhecimentos sobre as quatro operações

para os conjuntos dos números naturais, inteiros e racionais é possível resolver a tarefa

proposta utilizando uma tabela que indique os cálculos efetuados e o ostensivo

representação em língua natural como mostra o exemplo abaixo:

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77

1º número 2º número soma Diferença 61 50 111 11 65 46 111 19 70 41 111 29 71 40 111 31 72 39 111 33

Nesse exemplo, verifica-se que é possível resolver a tarefa apenas por

tentativas, isto é, escolhe-se um número e identifica-se o outro pela soma. Em seguida,

calcula-se a diferença entre esses dois números, e, se for necessário, repete-se o

processo até encontrar o resultado proposto na tarefa.

Para alunos que dispõem da noção de equação e têm alguma habilidade com o

cálculo algébrico, pode-se mostrar a possibilidade de trabalhar no quadro algébrico,

evidenciando a economia do trabalho efetuado, como mostra o exemplo que segue:

1º número : x

2º número : 111 – x

Equação: x – (111 – x) = 33

x – 111 + x = 33

2x = 144

x = 2

144

x = 72

Portanto, o primeiro número é x = 72 e o segundo número é 111 – x = 111 – 72 =

39, isto é, 39.

É evidente, que esse trabalho exige conhecimentos associados à solução de

uma equação do primeiro grau, isto é, às propriedades de estrutura de grupo aditivo,

multiplicativo e abeliano, que, no Ensino Fundamental II podem ser trabalhadas por

meio de um discurso tecnológico que justifique apenas as diferentes etapas da solução

da equação por meio das leis e regras do cálculo literal, sem especificar propriedades

de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano, ou ainda, de estrutura de corpo

dos racionais e dos reais.

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Ainda no quadro algébrico é possível resolver a tarefa utilizando a noção de

sistemas de equações lineares, que, para esse caso particular, representam apenas

uma economia de trabalho, como mostra o exemplo abaixo:

1º número : x

2º número : y

=−=+

33

111

yx

yx~

−=−=+

782

111

y

yx

Logo, o primeiro número x = 72 e o segundo número y = 39.

Por meio do exemplo verifica-se que as economias de cálculo exigem o

conhecimento de um método de resolução de sistemas de equações lineares.

• Pontos de vista:

A tarefa permite trabalhar diferentes pontos de vista, pois é possível resolvê-la

tanto no quadro numérico, utilizando o ponto de vista ou método das tentativas, como

no quadro algébrico utilizando o ponto de vista das equações lineares ou dos sistemas

de equações lineares. Esse último permite a aplicação de diferentes métodos para a

sua solução, que correspondem ao não ostensivo sistemas de duas equações lineares

e duas incógnitas - noção que se deseja introduzir quando se propõem questões desse

tipo no Ensino Fundamental II.

Observa-se que, dos três pontos de vista considerados para a solução desta

tarefa, o ponto de vista equação linear parece ser o que deve apresentar mais

dificuldade em função dos não-ostensivos necessários para a sua solução.

O ponto de vista tentativa parece ser o mais adequado para a tarefa proposta,

mesmo não sendo, em geral, utilizado no ensino, cujo objetivo é introduzir noções de

álgebra. Dessa forma, exemplos deste tipo de tarefa para a introdução da álgebra

terminam criando uma dificuldade, pois o aluno muitas vezes é capaz de vislumbrar

uma solução sem ter construído conhecimentos relacionados às leis e regras que

justificam os cálculos algébricos efetuados, como pode ser verificado nos exemplos a

seguir.

Exemplo 2:

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A soma de dois números é 110. O maior deles é igual ao triplo do menor mais 18

unidades. Quais são os dois números? (CASTRUCCI et al, 2002, p.170).

Situação matemática enunciada no quadro numérico utilizando apenas as

operações de adição e multiplicação cujos resultados são enunciados, explicitamente,

como soma e identificação de um número e seu triplo. Esta tarefa pode ser trabalhada

sob o ponto de vista das tentativas, embora os pontos de vista de equações lineares e

sistemas de equações lineares são mais econômicos e facilitam o trabalho proposto.

Exemplo 3:

A soma de dois números é 169 e a diferença entre eles é 31. Quais são os dois

números? (CASTRUCCI et al, 2002, p.170).

Trata-se de situação matemática em que a operação de adição é enunciada por

seu resultado – soma (resultado da adição de dois números) e diferença (adição de um

desses números ao oposto do outro). Da mesma forma, que para as tarefas anteriores,

basta construir uma tabela e determinar o resultado por tentativas. Neste caso, a

introdução dos pontos de vista de equações lineares e sistemas de equações lineares

são apenas facilitadores dos cálculos a efetuar. Este caráter puramente facilitador da

álgebra deve ser justificado pelo professor, para que o aluno compreenda que as

estratégias numéricas são tão válidas quanto as algébricas, servindo muitas vezes

como um meio de controle do trabalho algébrico efetuado.

Tarefa 2 : Situação matemática numérica transformada em um contexto cotidiano.

• Tipo de situação dada no enunciado:

Exemplo 1:

Na 7º série C há 32 alunos. Subtraindo o número de meninas do dobro do

número de meninos o resultado é 7. Quantos são os meninos? E as meninas? (IEZZI et

al, 2000, p.259)

Situação matemática transformada no contexto dos alunos, pois trata do número

de meninos e meninas que compõem uma classe. A situação é do mesmo tipo da tarefa

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1, que foi apenas enunciada num contexto cotidiano para mostrar as possibilidades de

aplicação da noção de sistemas de equações lineares. Apesar da diferença entre os

contextos, a grade se aplica da mesma forma que para a tarefa 1.

Exemplo 2:

Em um estacionamento, há 14 veículos, entre carros e motos. Sabe-se que o

número total de rodas é 48. Quantos carros e quantas motos há nesse

estacionamento?

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.153

Trata-se de situação matemática na qual a operação de adição é dada pelo

resultado que é a soma dos carros e motos e a quantidade total de rodas.

Vale ressaltar que esse tipo de tarefa era enunciado por meio de uma situação

com animais e que, para a vida moderna, foi reconstituído utilizando carros e motos,

pois nos grandes centros, em geral, os alunos têm pouco contato com situações que

envolvem inclusive os animais que servem para o seu consumo diário.

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Exemplo 3 :

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.169

Em qualquer torneio de voleibol, o regulamento manda marcar 2 pontos por

vitória e 1 ponto por derrota. Disputando um torneio, uma equipe realizou 9 partidas e

acumulou 15 pontos. Quantas partidas a equipe venceu e quantas partidas ela perdeu

nesse torneio?

Situação matemática numérica transformada em um contexto cotidiano, que

pode ser trabalhada por meio dos pontos de vista de estimativa, equações lineares e

sistemas de equações lineares da mesma forma, que os exemplos anteriores.

Tarefa 3 : Situação matemática algébrica transformada em um contexto cotidiano.

• Tipo de situação dada no enunciado da tarefa:

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Exemplo 1:

Fonte:IEZZI et al,2000, p.259

Exemplo 2:

Fonte:IEZZI et al,2000, p.262.

Situação matemática algébrica transformada em um contexto cotidiano que exige

a mudança do enunciado do ostensivo representação em língua natural para o

ostensivo representação algébrica de equações lineares e de sistemas de equações

lineares, uma vez que as duas equações são enunciadas por relações entre a

quantidade de elementos dos dois grupos considerados.

• Quadro ou domínio em que a tarefa é enunciada

Algébrico

• Não ostensivos

- Operações de adição e multiplicação, subtração e divisão para os números

naturais (“topos” do aluno e do professor);

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- Um método de resolução de sistemas lineares (“topos” do aluno e do

professor);

- Noções de cálculo literal (representação dos elementos por uma letra) (“topos”

do aluno e do professor);

- Noções de cálculo algébrico (“topos” do professor);

- Propriedades de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano para as

operações de adição e multiplicação em R (para resolver o sistema pelo método da

substituição) (“topos” do professor);

- Propriedades de estrutura de espaço vetorial (para o método da adição que,

para sistemas de m equações e n incógnitas, será trabalhado pelo método do

escalonamento ou método de Gauss) (“topos” do professor);

- Noção de sistemas de equações lineares (“topos” do aluno e do professor);

- Noção de equações lineares (“topos” do aluno e do professor).

• Ostensivos

- Representação algébrica de equações lineares e de sistemas de equações

lineares.

- Representação em língua natural.

- Discurso oral.

- Representação escrita.

• Quadros ou domínios que possam ser utilizadas para a solução da tarefa

Algébrico

• Níveis de Conhecimento esperados para a solução da tarefa

A tarefa exige o quadro ou domínio algébrico associado à mudança do

enunciado do ostensivo representação em língua natural para a representação

algébrica de sistemas de equações lineares e também um método de resolução de

sistemas lineares, como mostram os exemplos abaixo:

Exemplo 1:

Número de Garçons : x

Número de Garçonetes: y

Método da substituição

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=−

=−

xy

yx

22

23~

−=−

=−

22

23y

x

yx

Portanto: xx =−−

22

23. Logo

6

263

==−

x

xx e

16

218

2)6(3

==−

=−

y

y

y

Donde se conclui que o número de garçons é x = 6 e o número de garçonetes é y

= 16 .

Método da adição

−=−=−

42

23

yx

yx ~

−=−=−6

23

x

yx ~

−=−−=−−=−

16

412

4)6(2

y

y

y

Donde se conclui que o número de garçons x = 6 e o número de garçonetes é y

= 16.

Exemplo 2:

Número de Macacos : x

Número de Galhos : y

−=

+=

22

1

yx

yx ~

−=−=−

42

1

yx

yx ~

−=−=−

5

1

y

yx

Portanto, o número de macacos é x = 6 e o número de galhos é y = 5.

Nesse caso, é importante observar o caráter puramente algébrico da tarefa

proposta, que exige também a articulação entre noções de equação linear e sistema de

equações lineares antes da aplicação de um método de resolução de sistemas de

equações lineares.

• Pontos de vista

Observa-se aqui que o caráter puramente algébrico da tarefa, reduz as

possibilidades de diferentes formas de tratamento.

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O interesse dessa tarefa está na necessidade de utilização de sistemas de

equações lineares e na articulação com a noção de equação linear. Ou seja, ainda que

todo o trabalho seja desenvolvido apenas por meio de um sistema de equações

lineares, é preciso utilizar a noção de equação e efetuar as transformações necessárias

para representar o sistema por meio do ostensivo representação algébrica explícita de

sistemas de equações lineares

−=−=−

42

23

yx

yx o que corresponde a uma mudança de

pontos de vista, isto é, a passagem do ponto de vista de equações lineares para o

ponto de vista de sistemas de equações lineares.

No caso em que se mantém o ostensivo representação funcional ou

representação implícita de equação (x = y + 1) pode-se utilizar diretamente o método da

substituição. Caso se represente o sistema pelo ostensivo representação algébrica de

equações lineares e sistemas de equações lineares, o método da adição se mostra

mais adequado.

Mesmo se a tarefa apresenta no enunciado todos os elementos para a sua

solução, pode-se considerá-la no nível disponível, pois exige que os alunos a

relacionem com a noção de sistema de equações lineares e, para sua solução,

articulem essa noção com a noção de equações lineares.

Exemplo 3:

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.172.

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Situação matemática algébrica transformada em um contexto cotidiano que exige

a mudança do enunciado do ostensivo representação em língua natural para o

ostensivo representação algébrica de equações e de sistemas de equações lineares.

Exemplo 4:

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.172.

Situação matemática algébrica transformada em um contexto cotidiano que exige

a mudança do enunciado do ostensivo representação em língua natural para o

ostensivo representação algébrica de equações lineares e sistemas de equações

lineares.

Exemplo 5:

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.171.

de cada cor ficará igual. Quantas bolas de cada cor há nessa caixa?

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Situação matemática algébrica transformada para um contexto cotidiano que,

como a tarefa anterior, exige a mudança do enunciado do ostensivo representação em

língua natural para o ostensivo representação algébrica de equações lineares e

sistemas de equações lineares.

Tarefa 4 : Sistema de equações lineares algébrico explícito, indicando, ou não, o

método a ser aplicado.

Exemplo 1 :

• Tipo de situação dada no enunciado

Fonte: IEZZI et al,2000, p.259.

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.171.

Um sistema de equações lineares enunciado por meio do ostensivo

representação algébrica de equações lineares e sistemas de equações lineares, para o

qual é preciso aplicar um dos métodos de solução de sistemas que pode, ou não, ser

pedido explicitamente na tarefa.

• Quadro ou domínio

Algébrico

• Não ostensivos

- Noção de sistema de equações lineares (“topos” do aluno e do professor);

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- Regra de três e frações algébricas (“topos” do aluno e do professor);

- Método de resolução de sistemas de equações lineares (“topos” do aluno e do

professor).

• Ostensivos

- Representação algébrica de equações lineares e sistemas de equações

lineares.

- Discurso oral;

- Representação escrita.

• Quadros ou domínios que possam ser utilizados para a solução da tarefa

Algébrico

• Níveis de conhecimento esperados para a solução da tarefa

Nesse caso, basta o aluno dominar a técnica de resolução de sistemas de

equações lineares e, quando o método é pedido explicitamente, o aluno deve utilizar a

técnica pedida no enunciado.

É importante lembrar que, se o que se espera do aluno é o nível de

conhecimento técnico, a tarefa deve indicar, explicitamente, o método de resolução a

ser aplicado. Por outro lado, se espera um nível de conhecimento mobilizável, não se

especifica o método a ser empregado, deixando a cargo do aluno a escolha da

estratégia que julgar mais adequada à solução da tarefa proposta.

• Pontos de vista

Por se tratar de tarefa que exige a aplicação de um método para a solução do

sistema proposto, poderá haver mudança de ponto de vista em relação a esse método,

sendo necessária a articulação entre a noção de sistema de equações lineares e

equação linear.

Tarefa 5: Articulação entre a noção de sistema de duas equações lineares e duas

incógnitas e a noção de retas no plano IR2.

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Fonte: IEZZI et al,2000, p.271

Tarefas desse tipo preparam o aluno para o estudo dos sistemas de duas

equações lineares no quadro ou domínio algébrico, em que o sistema não está

associado a uma situação contextualizada. Sua solução depende da articulação entre

os quadros algébrico e geométrico, isto é, a passagem ao quadro geométrico permite

visualizar as diferentes possibilidades de solução para os sistemas de duas equações

lineares e duas incógnitas. A representação do sistema no quadro geométrico permite

associar um sistema de duas equações lineares e duas incógnitas, que tem uma única

solução, isto é, um ponto de IR2, a um par de retas concorrentes. Por outro lado, um

sistema de infinitas soluções é aquele em que, uma das equações é um múltiplo

escalar da outra e as retas que representam essas equações são coincidentes.

Finalmente, o sistema que não tem soluções, isto é, quando as equações não são

proporcionais, terá sua representação no quadro geométrico, por meio de duas retas

paralelas em IR2. No exemplo dado acima, a solução do sistema no quadro geométrico

corresponde a duas retas concorrentes que se intersectam em um ponto.

É importante observar que esta tarefa permite que o aluno visualize as diferentes

possibilidades de solução do sistema e articule os conhecimentos algébricos que estão

sendo introduzidos por meio da noção de sistemas de equações lineares com seus

conhecimentos geométricos sobre a posição relativa de retas no plano.

Outros casos:

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90

- Se a solução algébrica do sistema reduz-se a uma única equação, conclui-se

que o sistema tem infinitas soluções, o que, geometricamente, corresponde a concluir

que as retas são coincidentes.

- Se, após a solução algébrica do sistema, encontra-se uma igualdade do tipo a =

0, sendo a um número qualquer diferente de zero, o sistema não tem solução, o que,

geometricamente, corresponde a concluir que as retas são paralelas.

- Se, após a solução algébrica do sistema, encontra-se uma única solução, isto

é, o par (x, y) que representa um ponto de IR2, o que, geometricamente, corresponde a

concluir que as retas representadas pelas equações que definem o sistema são

concorrentes.

• Quadro ou domínio em que a tarefa é enunciada

Algébrico

• Não ostensivos

- Operações de adição e multiplicação, subtração e divisão. (“topos” do aluno e

professor);

- Um método de resolução de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas (“topos” do aluno e do professor);

- Noções de cálculo literal (representação dos elementos por uma letra) (“topos”

do aluno e do professor);

- Noções de cálculo algébrico (“topos” do professor);

- Propriedades de estrutura de grupo para as operações de adição e

multiplicação em IR (para resolver o sistema pelo método da substituição) (“topos” do

professor);

- Propriedades de estrutura de espaço vetorial (para o método da adição que, em

sistemas de m equações e n incógnitas, será trabalhado pelo método do

escalonamento ou método de Gauss) (“topos” do professor);

- Noção de sistemas de equações lineares (“topos” do aluno e do professor);

- Noção de retas no plano e suas propriedades (“topos” do aluno e do professor);

- Noção de representação geométrica de equações lineares em IR2 (“topos” do

aluno e do professor).

• Ostensivos

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- Representação algébrica de equações lineares e de sistemas de equações

lineares;

- Representação gráfica de equações no sistema cartesiano ortogonal;

- Discurso oral;

- Representação escrita.

• Quadros ou domínios que podem ser utilizados para a solução da tarefa

Algébrico e geométrico.

• Níveis de Conhecimento esperados para a solução da tarefa

O aluno deve dispor de conhecimentos sobre representação gráfica de equações

no sistema cartesiano ortogonal e de um método de resolução de sistemas de

equações lineares.

• Pontos de vista

Passagem do quadro algébrico para o quadro geométrico, que supõe que o aluno

disponha de conhecimentos sobre a representação de uma equação no sistema

cartesiano ortogonal.

Tarefa 6 : Situação envolvendo a articulação de diferentes noções matemáticas e

que exige a passagem do ostensivo representação em língua natural para os

ostensivos tabela e representação algébrica de equações lineares e sistema de

equações lineares.

• Tipo de situação dada no enunciado da tarefa:

Fonte:CASTRUCCI et al, 2002, p.168.

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Trata-se de situação matemática transformada em contexto cotidiano, cuja

solução exige que o aluno disponha de conhecimentos de geometria e porcentagem.

Para resolver a questão o aluno precisa aplicar seus conhecimentos de

porcentagem, podendo desenvolver a tarefa segundo um dos três pontos de vista

considerados - tentativas, equações lineares ou sistemas de equações lineares. A

dificuldade da questão poderá estar associada aos conhecimentos prévios necessários.

• Quadro ou domínio em que a tarefa é enunciada

Numérico e geométrico.

• Não ostensivos

- Um método de resolução de sistemas lineares (“topos” do aluno e do

professor);

- Noções de cálculo literal (representação dos elementos por uma letra) (“topos”

do aluno e do professor);

- Noções de cálculo algébrico (“topos” do professor);

- Propriedades de estrutura de grupo para as operações de adições e

multiplicação em IR (para resolver o sistema pelo método da substituição) (“topos” do

professor);

- Propriedades de estrutura de espaço vetorial (para o método da adição que, em

sistemas de m equações e n incógnitas, será trabalhado pelo método do

escalonamento ou método de Gauss) (“topos” do professor);

- porcentagem;

- Regra de três e frações algébricas.

• Ostensivos

- Construção da tabela;

- Manipulação da tabela;

- Leitura da tabela;

- Visualização da tabela;

- Discurso oral;

- Representação escrita;

- Representação em língua natural;

- Representação algébrica de equações e de sistemas de equações lineares.

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• Quadros ou domínios para a solução da tarefa

Numérico ou algébrico.

• Níveis de Conhecimento esperados para a solução da tarefa

A tarefa pode ser trabalhada em diferentes níveis dependendo dos

conhecimentos disponíveis dos alunos.

Se os alunos dispõem apenas de conhecimentos sobre as quatro operações e

noção de porcentagem é possível resolver a tarefa proposta utilizando uma tabela que

indique os cálculos efetuados para algumas tentativas, como mostra o exemplo abaixo:

Terreno Casa Jardim Porcentagem

1050m2 550 500 90,96%

650 400 61,53%

700 350 50%

750 300 40%

Nesse exemplo, verifica-se que é possível resolver a tarefa apenas por tentativas

e que esta escolha pode facilitar a compreensão da tarefa proposta.

Para alunos que dispõem da noção de equação e têm alguma habilidade com o

cálculo algébrico pode-se mostrar a possibilidade de trabalhar no quadro ou domínio

algébrico evidenciando a economia do trabalho efetuado, como mostra o exemplo que

segue:

=

==+

5

2%40

1050

xy

xy

yx

~

=

==

=+

=+

7507

525052507

525025

10505

2

x

x

x

xx

xx

casa

=

=

=

3005

1500

750.5

2

y

y

y

jardim

Portanto, a área de terreno reservada para a construção da casa é x = 750 m2 e

a área reservada para o jardim é y = 300 m2.

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Verifica-se aqui que a solução algébrica, apesar de facilitar o trabalho

matemático, precisa de um discurso tecnológico que justifique sua relação com a tarefa

proposta. Ou seja, essa questão poderia ser trabalhada, inicialmente, por tentativas,

para em seguida, ser discutida a importância do cálculo algébrico que acaba

amalgamando todas as informações e dificultando as interpretações.

• Pontos de vista

Observa-se que existe a possibilidade de obter a solução por tentativas, mas, em

geral, o quadro algébrico é visto como um facilitador do trabalho matemático. É

importante, porém, destacar que a noção de sistema de equações lineares como

ferramenta para a solução de tarefas deste tipo pode se tornar um obstáculo para a

compreensão da tarefa e para a sua futura aplicação em outras situações pelos alunos.

Embora o enunciado da tarefa apresente todos os elementos para a sua solução,

pode-se considerá-la no nível disponível, pois exige que os alunos disponham de outros

conhecimentos que devem ser articulados com a noção de sistemas de equações

lineares.

3.5 Considerações Finais

O estudo dos ostensivos e não ostensivos possíveis e/ou necessários para a

noção de sistemas de equações lineares, quando se considera uma primeira introdução

desta noção no Ensino Fundamental nível II, permitiu estabelecer um grupo, mesmo

que pequeno, de tarefas usuais que são introduzidas em livros didáticos de Matemática,

destinados à sétima série do Ensino Fundamental nível II, que para esta pesquisa são

considerados como a relação institucional existente, em função da noção que está

sendo considerada, ou seja, a noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas.

Foi possível distinguir seis tarefas que exigem a aplicação de diferentes

ostensivos e não ostensivos e que permitem um trabalho diferenciado em função das

diferentes escolhas institucionais.

Verificou-se que as tarefas 1, 2 e 6 podem ser resolvidas por um dos três pontos

de vista considerados nesta pesquisa (ponto de vista de tentativas, ponto de vista de

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equações lineares e ponto de vista de sistemas de equações lineares) dependendo dos

conhecimentos prévios dos alunos.

As três tarefas são enunciadas no quadro numérico e a distinção entre elas está

no fato de que a tarefa 1 é enunciada num contexto intramatemático30, exigindo que os

alunos utilizem apenas conhecimentos matemáticos e além disso, para qualquer ponto

de vista escolhido pode-se considerar que o nível de conhecimento esperado dos

alunos é o nível mobilizável. O ponto de vista que facilita seu desenvolvimento é o das

tentativas - ainda que este não seja muito explorado - e pode-se supor que o ponto de

vista de equações é o que deve apresentar maior dificuldade para os alunos. Dessa

forma, uma vez apresentados os ostensivos e não ostensivos que permitem justificar o

trabalho matemático efetuado verifica-se que os ostensivos teóricos são destinados ao

professor enquanto que existem ostensivos destinados ao professor e aos alunos, que

estão associados ao discurso que se deve estabelecer para que se possa compreender

as leis e regras do cálculo literal empregadas quando se escolhe desenvolver a tarefa

utilizando os pontos de vista de equações e sistemas de equações lineares.

As tarefas 2 e 6 são enunciadas num contexto extramatemático31, exigindo que

os alunos disponham de conhecimentos associados a esse contexto, isto é, pode-se

dizer que o nível de conhecimento esperado dos alunos para a solução dessas tarefas

é o nível disponível em relação aos conhecimentos matemáticos em jogo e ao seu

caráter extramatemático. Tanto para a tarefa 2 quanto para a tarefa 6 é possível aplicar

um dos três pontos de vista considerados nesta pesquisa. A tarefa 6 pode apresentar

maior dificuldade em função da necessidade de articulação das diferentes noções

matemáticas em jogo.

As tarefas 3, 4 e 5 são consideradas puramente algébricas pois exigem a

utilização dos pontos de vista equações lineares ou sistemas de equações lineares.

Considerando os níveis de conhecimentos necessários para a sua solução pode-

se dizer que para a tarefa 4 é exigido apenas o nível técnico quando se pede o método

30 Intramatemático: quando os conhecimentos em jogo no enunciado e na solução da tarefa são apenas matemáticos. 31 Extramatemático: quando os conhecimentos em jogo no enunciado são tanto matemáticos quanto associados às outras ciências ou a situações cotidianas.

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de solução do sistema e o nível mobilizável quando esse não é pedido e cabe ao aluno

escolher o mais adequado.

As tarefas 3 e 5 são consideradas no nível disponível pois na tarefa 5 é exigida a

articulação entre os quadros algébrico e geométrico o que supõe uma mudança de

representações, ou seja, a escolha dos ostensivos adequados e a utilização de um

discurso tecnológico que justifique essas escolhas.

A tarefa 3 deve apresentar mais dificuldade para os alunos pois é enunciada num

contexto extramatemático exigindo a interpretação do enunciado que deve ser

representado por meio de equações lineares para que se possa utilizar o ponto de vista

de equações lineares ou sistemas de equações lineares. Nesse caso, o nível de

conhecimento esperado dos alunos é o disponível e esses devem ser capazes de

utilizar os diferentes ostensivos em jogo e justificar o trabalho matemático por meio dos

não ostensivos que fazem parte de seus “topos” e que para os professores estão

associados às noções de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano e à noção

de estrutura de espaço vetorial.

Verifica-se assim, que, em geral, existe pouca possibilidade de articulação entre

os quadros geométrico e algébrico quando se introduz a noção de sistemas de

equações lineares, pois a tarefa 5 parece ser a única utilizada com essa intenção.

Das três tarefas (3, 4 e 5) aqui consideradas como algébricas observa-se que 4 e

5 estão diretamente associadas ao estudo da noção de sistemas de equações lineares

e que a tarefa 3, mesmo exigindo a utilização do quadro algébrico, não está

diretamente associada ao objeto sistemas de equações lineares, mas à aplicação

dessa noção como ferramenta explícita de trabalho para a solução de uma situação

contextualizada, ou seja, não existe uma articulação entre o objeto matemático em jogo

e seu papel de ferramenta explícita para o trabalho matemático a ser desenvolvido.

Observou-se ainda que as tarefas 1, 2 e 6 não exigem a utilização da noção de

sistemas de equações lineares, podendo ser trabalhadas apenas por meio do ponto de

vista das tentativas. Nestes casos, a noção de sistemas de equações lineares deve ser

explicitada como uma forma econômica de realizar o trabalho matemático pelo

professor.

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Dessa forma, as diferenças em relação às possibilidades de abordagens para o

ensino da noção de sistemas de equações lineares vão depender da quantidade de

tarefas desenvolvidas pelos professores e propostas aos alunos e das explicitações

consideradas acima.

Além disso, verifica-se que as tarefas propostas são mais adequadas para

desenvolver a mudança do ostensivo representação em língua natural para a

representação algébrica explícita de equações lineares (as equações são apresentadas

com seus coeficientes) e os métodos de resolução destas equações e sistemas de

equações, que neste caso são trabalhados exigindo apenas que os alunos utilizem as

regras e leis do cálculo literal, uma vez que os não ostensivos teóricos, isto é, as

noções de estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano e estrutura de espaço

vetorial que lhes são associados, não são possíveis de serem trabalhados nesta etapa

da escolaridade.

Neste momento, uma questão que se coloca e que exige um estudo mais

detalhado para ser compreendida é a seguinte: Qual é o “topos” esperado do professor,

quando este introduz a noção de sistemas de equações lineares nesta etapa da

escolaridade?

Esta questão pode ser traduzida por: Quais são os conhecimentos esperados

como disponíveis (estrutura de grupo aditivo, multiplicativo e abeliano e estrutura de

espaço vetorial) dos professores que introduzem a noção de sistemas de equações

lineares na sétima série do Ensino Fundamental nível II?

É importante observar que esta pesquisa mostra que embora esses não

ostensivos não sejam necessários aos alunos, é preciso que o professor disponha de

meios para estabelecer um discurso tecnológico que justifique as regras e leis utilizadas

na solução das tarefas que exigem a aplicação dos pontos de vista de equações

lineares e sistemas de equações lineares.

Observa-se ainda que o ponto de vista das tentativas parece representar um

meio importante para mostrar aos alunos a importância da álgebra como ferramenta

facilitadora do trabalho matemático em jogo.

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CAPÍTULO 4

ANÁLISE DAS ESCOLHAS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE

SISTEMAS DE DUAS EQUAÇÕES LINEARES E DUAS INCÓGNITA S

VIA LIVRO DIDÁTICO

4.1 Considerações Iniciais

Para analisar as escolhas para o ensino da noção de sistemas de duas

equações lineares e duas incógnitas entre 1950 a 2005, procuram-se alguns livros

didáticos que contém capítulos destinados à introdução dessa noção no Ensino

Fundamental II, pois esses livros dão uma visão aproximada da relação institucional

existente na época. Certamente, existem outras formas de análise dessa relação, mas

tendo em vista a dificuldade de reunir documentos, optamos por analisar livros

didáticos, embora tenham sido escolhidos sem um critério específico.

Os livros antigos analisados foram aqueles que alguns professores haviam

preservado em suas bibliotecas particulares e, dentre os atuais, foram escolhidos

aqueles que vêm sendo utilizados na escola onde trabalho. Dessa forma, a escolha dos

livros antigos foi aleatória, pois existe uma grande dificuldade em encontrar material

mais antigo, em estado de preservação que permita uma análise global do ensino de

matemática nas diferentes décadas. Analisa-se assim um total de oito obras que serão

apresentadas em ordem decrescente em relação ao ano de sua publicação, conforme a

tabela abaixo.

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Livro Ano Século Década PNLD32 1º Matemática e Realidade Iezzi et al., 7ª série 2005 XXI 2008 2º A conquista da Matemática Castrucci et al., 7ªsérie 2002 XXI 2005 3º Matemática e Realidade Iezzi et al., 7ª série 2000 XXI 2006 4º Matemática Scipione Scipione, 7ª série 1991 90 5º Matemática Conceitos Operações Scipione, 7ªsérie 1982 80 6º Matemática na Escola Renovada Scipione, 3º volume 1971 70 7º Matemática Curso Moderno Sangioge, 3º volume 1966 60 8º Curso de Álgebra De Farias, programas de admissão à Escola Militar e à Escola de Aeronáutica. 1959 50

Para a análise dos livros encontrados, constrói-se um organograma que permite

a descrição global da obra, conforme modelo proposto por Tavignot (1991) em sua tese

sobre a análise do processo de transposição didática para o caso da simetria no

“collège”33. Esse organograma auxilia a compreensão geral da obra assim como a

articulação entre as diferentes noções desenvolvidas na sétima série do Ensino

Fundamental nível II quando se introduz a noção de sistemas de duas equações

lineares e duas incógnitas.

Além desse organograma, faz-se um comentário sobre as articulações entre

noções trabalhadas em conjunto com a noção de sistemas de duas equações lineares e

duas incógnitas, conforme propostas dos autores.

Após esse comentário, considerando como parte do professor (“topos” do

professor) a introdução teórica da noção e os exercícios resolvidos e parte do estudante

(“topos” do estudante) os exercícios propostos, são analisadas as necessidades em

termos de ostensivos e não ostensivos e da própria aplicação da noção de sistemas de

32 PNDL: Programa Nacional do Livro Didático 33 “collège” – corresponde ao Ensino Fundamental nível II brasileiro.

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duas equações lineares e duas incógnitas, tanto para o trabalho suposto como do

professor quanto para o do estudante.

Além disso, verifica-se que tipos de tarefas são privilegiados quando se

consideram as propostas de aplicações das noções desenvolvidas no curso, pelos

estudantes, em função da grade construída.

Uma vez delineada a forma como será apresentada a análise, as questões que a

orientam são:

1) Quais são os conhecimentos prévios necessários ao aluno, para que se

faça a introdução da noção de sistemas de equações lineares?

2) Como se articulam os conhecimentos prévios com os novos

conhecimentos quando se introduz a noção de sistemas de equações

lineares?

3) Que ostensivos e não ostensivos são privilegiados nas décadas

consideradas?

4) Quais são os quadros ou domínios (numérico, algébrico e geométrico)

necessários para o desenvolvimento do trabalho proposto?

5) Quais são as necessidades de articulação em termos de quadros ou

domínios e os níveis de conhecimentos esperados dos estudantes

quando se introduz a noção de sistemas de equações lineares?

6) As tarefas propostas aos estudantes necessitam da noção de sistemas

de equações lineares para a sua solução?

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4.2 A ANÁLISE DA OBRA DE IEZZI ET AL 2005.

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra “Matemática e

Realidade” 7ª série.

Generalizar

Números introduzir

- Noção intuitiva de números naturais - Noção intuitiva de números inteiros - Noção intuitiva de números racionais (representação fracionária, decimal exata, dízima periódica) Observação: utiliza a noção de equação para calcular a fração geratriz de uma dízima. - Noção intuitiva de número real por meio de sua representação na reta numérica utilizando a seqüência: números inteiros, números racionais não inteiros, números irracionais (representação geométrica - lado do quadrado). - Valor absoluto e relação de ordem (as desigualdades). - Operações em R e suas propriedades. - Erros de aproximação.

Segmentos, ângulos e triângulos. Definir e construir

- Segmentos (régua e compasso) - Ângulos (régua e compasso, transferidor) - Retas coplanares (concorrentes e paralelas) - Retas perpendiculares - Ângulos de duas retas com uma transversal (Teorema de Thales). - Triângulos (classificação, construção e propriedades) - Congruência de triângulos (propriedades e construção).

Estatística definir - Médias: aritmética, ponderada e geométrica. - Representação gráfica e representação tabela de dados. - Moda e mediana

Cálculo algébrico

Introduzir

Produtos notáveis e fatoração

aplicar

Quadriláteros

Equações e sistemas lineares

Sistemas de equações

definir

- Expressões algébricas (exemplos algébricos e geométricos) - Valores numéricos - Polinômios - Operações com polinômios

definir

definir -Representação algébrica e geométrica (áreas)

definir -Quadriláteros -Perímetros -Quadriláteros notáveis e propriedades

introduzir - Introduzir equação - Equações impossíveis e indeterminadas - Equações Literais - Equações Fracionárias

Interpretar, resolver e analisar

-Situações-problema com duas incógnitas para introduzir sistemas. -Método de adição -Método de Substituição -Representação Gráfica -Sistemas Impossíveis e Indeterminados

Aplicar

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4.3 Comentários e análise

Os autores iniciam fazendo uma revisão sobre a noção de “número”, articulando,

para isso, o quadro ou domínio geométrico com o numérico e, na seqüência,

apresentam uma definição sucinta de números naturais a partir do processo de

contagem e sua representação (numeral), números inteiros (subtração que resulta em

um número negativo), números racionais distinguindo as representações fracionárias

explícitas (por exemplo: 2/3), as representações decimais exatas (0,3) ou dízimas

periódicas (0,33333....) e as possibilidades de passagem de uma representação a

outra, embora esse termo representação não seja utilizado pelos autores. Nesse

momento, os autores já utilizam a noção de equação para determinar a fração geratriz

de uma dízima periódica.

Na seqüência, para introduzir os números reais, os autores consideram o

ostensivo reta numérica, isto é, utilizam o quadro geométrico para representar esses

números, ou seja, articulam o quadro numérico com o quadro geométrico.

Após o estudo dos números reais por meio dos ostensivos que os representam,

os autores introduzem noções de segmento, ângulo e por meio dos ostensivos

materiais régua, compasso, transferidor e esquadro fazem as construções e

apresentam suas propriedades, isto é, trata-se de uma introdução centrada em

ostensivos materiais que permitem a manipulação e a visualização dos novos conceitos

que se deseja introduzir.

Após introduzir as noções de segmento e ângulo, os autores definem retas

coplanares, suas posições relativas e propriedades. Ainda para essas noções que

estão sendo introduzidas, é possível observar a preocupação dos autores em

representar as propriedades por meio da construção com régua e compasso, o que

possibilita a manipulação e a visualização das noções que estão sendo trabalhadas e a

utilização de um discurso para justificar o procedimento que se está realizando. Ou

seja, a abordagem utilizada pelos autores é centrada na introdução dos ostensivos de

representação da noção em jogo, que necessita de um discurso tecnológico para

justificar os procedimentos adotados nas construções e que permite conjecturar sobre

as propriedades utilizadas nessa construção. Na seqüência, essas propriedades são

demonstradas, por meio de teoremas que representam as teorias dessas tecnologias.

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Em seguida, após definir triângulos, os autores os classificam quanto aos lados e

apresentam as possibilidades de representação dos mesmos por meio da construção

com régua e compasso. São introduzidas as propriedades e a classificação de

triângulos quanto aos ângulos. Os exemplos e exercícios propostos exigem que os

estudantes disponham de conhecimentos sobre equação do 1 o grau , que se supõe

tenha sido trabalhada nas séries anteriores, pois está sendo novamente considerada

como um conhecimento disponível e é o seu caráter ferramenta explícita do

conhecimento matemático que está em jogo. O capítulo exclusivo para seu tratamento

aparece posteriormente, mas como todo o texto é centrado nos ostensivos que

representam as noções em jogo, o trabalho desenvolvido no livro torna-se mais simples,

pois é possível estabelecer um discurso que justifique a aplicação da noção de equação

ainda que esta não tenha sido desenvolvida, tendo em vista todas as possibilidades do

tratamento de suas representações.

Após a introdução dos números reais e de conceitos geométricos e suas

propriedades os autores introduzem noções básicas de estatística, ou melhor, os

ostensivos que permitem representar essas noções, mas não é possível identificar um

trabalho de articulação com os supostos conhecimentos prévios dos estudantes. A

estatística aparece como um capítulo sem conexão com os demais.

Na seqüência do livro, onde se pode considerar a introdução do cálculo

algébrico, os autores apresentam as expressões algébricas, os polinômios com suas

operações e propriedades e, sempre que possível, eles articulam os quadros

numéricos, algébricos e geométricos, apresentando ainda exemplos de aplicações no

cotidiano e nas outras ciências, ou seja, embora seja dada maior ênfase aos ostensivos

que representam as noções em jogo, os autores procuram articular essas noções com

os supostos conhecimentos prévios dos estudantes.

Ao introduzir produtos notáveis e fatoração verifica-se que os autores articulam

somente os quadros algébrico e geométrico, o que é compreensível, uma vez que estas

noções são ferramentas importantes para o estudo de outros conceitos matemáticos,

mas dificilmente são aplicadas diretamente para a solução de problemas cotidianos, ou

seja, nessa etapa da escolaridade o trabalho sobre os ostensivos que as representam

parece ser uma forma adequada de trabalho.

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Voltando à geometria, os autores definem quadriláteros e suas propriedades,

passando aos quadriláteros notáveis, para os quais, as propriedades são apresentadas

e demonstradas, o que representa um salto qualitativo, pois para justificar a aplicação

da definição e a utilização dos ostensivos que as representam, os autores utilizam um

discurso tecnológico como é possível verificar no exemplo abaixo.

Fonte: IEZZI et al, 2005, p.235

O capítulo que segue é destinado ao estudo das equações do primeiro grau e é

nele que se apresenta a noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas, objeto de estudo desta pesquisa. Sendo a noção de equação do primeiro

grau um dos pontos de vista que permitem a solução desses sistemas, ela merece uma

análise mais detalhada que as noções anteriores, quando se considera sua articulação

com as demais noções em jogo, pois ela pode ser um dos pontos de apoio para a

introdução da noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas para a

sétima série do Ensino Fundamental II.

Observa-se assim, que a noção de equação é introduzida via situações

cotidianas que são descritas por meio do ostensivo escrita na língua natural e que

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necessitam de uma passagem para o ostensivo representação algébrica oral e escrita

da equação correspondente. Nesta etapa, as noções introduzidas anteriormente nos

quadros algébrico, numérico e geométrico são utilizadas como ferramentas para a

solução das tarefas propostas e devem estar disponíveis para permitir o

desenvolvimento das tarefas propostas ao estudante. É importante ressaltar que os

ostensivos oral e escrito considerados acima necessitam de um discurso tecnológico

que permite utilizá-los, e que é fundamental para a articulação com outras noções

matemáticas que aparecem nas tarefas apresentadas e propostas aos estudantes.

Passando à noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, os

autores fazem uma abordagem semelhante àquela feita para as equações, o que

também exige que as noções anteriores, descritas no organograma, estejam

disponíveis para que se possam utilizar os ostensivos necessários para a solução das

tarefas e que se disponha de um discurso tecnológico que justifique as articulações

com as diferentes noções em jogo.

Os autores seguem introduzindo as noções de inequação, circunferência, arcos e

ângulos sempre preocupados em articular novos conhecimentos com os conhecimentos

desenvolvidos anteriormente.

Para a noção de sistema de duas equações lineares e duas incógnitas, objeto de

estudo desta pesquisa, apresenta-se abaixo uma análise mais detalhada das tarefas

que correspondem à parte do professor e à do estudante, em função da grade

construída para esse fim.

4.4 A parte do professor e do estudante nas tarefa s apresentadas

Considerando a grade de análise e as tarefas nela classificadas de acordo com

suas possibilidades, apresenta-se a relação entre o que é parte do trabalho do

professor (“topos” do professor), isto é, as tarefas resolvidas que envolvem a noção de

sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, e o que representa a parte do

estudante (“topos” do estudante), isto é, as tarefas propostas no capítulo.

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Tarefas Resolvidas

Tarefas Propostas

Tarefas Quantidade % Tarefas Quantidade %

Tarefa 1 2 22 Tarefa 1 14 14

Tarefa 2 1 11 Tarefa 2 6 06

Tarefa 3 0 0 Tarefa 3 4 04

Tarefa 4 1 11 Tarefa 4 34 34

Tarefa 5 2 22 Tarefa 5 1 01

Tarefa 6 3 34 Tarefa 6 41 41

Total 9 100 Total 100 100

Segundo a escolha anunciada acima, o número de tarefas resolvidas, que

representam o “topos” do professor, permite dizer que, no caso deste livro didático, os

autores privilegiam a tarefa de número 6 (34% das tarefas resolvidas) que corresponde

ao nível disponível, pois exige que os estudantes disponham de conhecimentos prévios

sobre outras noções matemáticas e sejam capazes de compreender seu caráter extra

matemático34. Da mesma forma, verifica-se que o maior número de tarefas propostas

para os estudantes são as de tipo 6 (41%), o que é coerente com a escolha de tarefas

para o professor o que poderia ser identificado como preocupação dos autores no

sentido de articular conhecimentos matemáticos desenvolvidos durante as etapas

escolares anteriores, assim como conhecimentos de outras ciências e do cotidiano.

As tarefas 1 e 5 são consideradas como necessárias pelos autores, pois representam

22% das tarefas resolvidas, mas para o trabalho individual do estudante verifica-se que

a ênfase é dada à tarefa do tipo 1 que corresponde a situações matemáticas

enunciadas no quadro numérico e que não exigem a noção de sistemas de duas

equações lineares e duas incógnitas para serem resolvidas. A tarefa de tipo 5 fica a

cargo do professor uma vez que exige um discurso tecnológico que justifique a

articulação entre os quadros algébrico e geométrico quando esses são, efetivamente,

parte dos conhecimentos prévios dos estudantes. Compreende-se a escolha, uma vez

que se está introduzindo a noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas, pois a tarefa de tipo 5 exige o nível disponível para os conhecimentos

34 Extra matemático: Quando se trabalha com noções de outras ciências ou do cotidiano e que se supõem conhecidas dos estudantes.

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algébricos e geométricos que precisam ser articulados quando se deseja estudar as

possibilidades de solução desses sistemas.

As tarefas 2 e 4 aparecem como sendo da mesma importância para o professor,

mas quando se observa o trabalho proposto aos estudantes verifica-se que a tarefa 4,

que corresponde aos níveis técnico e mobilizável (resolver o sistema com ou sem

indicação do método) é bastante valorizada (34%), em comparação com a tarefa 2 que

representa 6% das tarefas propostas aos alunos.

A tarefa 3 que necessita da interpretação de uma situação extra matemática e

que deve ser resolvida sob o ponto de vista de equações lineares ou sistemas de

equações lineares, isto é, trata-se de uma situação puramente algébrica que exige que

os estudantes disponham de conhecimentos sobre as noções de equações e sistemas

de duas equações lineares e duas incógnitas é deixada a cargo dos estudantes, pois

não há indicações para o professor resolver esse tipo de tarefa, cabendo ao estudante

esse trabalho.

Resumindo, verificou-se que nesta obra 41% (tarefa 6) das tarefas propostas aos

estudantes poderiam ser resolvidas sem a necessidade de trabalho no quadro algébrico

e sua dificuldade pode estar associada à interpretação ou à falta de conhecimentos

prévios por parte dos estudantes. Outros 20% (tarefas 1 e 2) também não exigem a

utilização do quadro algébrico podendo ser trabalhadas apenas no quadro numérico por

meio do ostensivo tabela e sua dificuldade pode estar associada à passagem do

ostensivo representação em língua natural para o ostensivo tabela.

As tarefas 3 e 5 que exigem a utilização do quadro algébrico representam

apenas 5% do trabalho proposto aos estudantes, sendo que a maior parte do tipo 5 fica

a cargo do professor, enquanto que as do tipo 3 ficam totalmente a cargo dos

estudantes.

A tarefa 4 que corresponde ao nível técnico parece ser trabalhada de forma

bastante coerente, pois a utilização de um método para a solução de um sistema

proposto é deixada a cargo dos estudantes por tratar-se de um trabalho de fixação das

técnicas de resolução de sistemas de equações lineares.

Existe assim um equilíbrio tanto no trabalho esperado do professor como do

estudante, mas é importante observar que o ponto de vista das tentativas, que, em

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alguns casos, poderia auxiliar na compreensão da noção de sistemas de equações

lineares, não recebeu destaque neste livro didático.

Pode-se considerar que neste livro os autores esperam desenvolver a

capacidade de interpretação de enunciados de tarefas em que a noção de sistemas de

equações lineares funciona como ferramenta implícita de trabalho uma vez que os

estudantes não dispõem de conhecimentos sobre este objeto, mas apenas de alguns

métodos para a sua solução. Ou seja, os não ostensivos em jogo são as operações

sobre os números reais, os métodos de resolução de sistemas de duas equações e

duas incógnitas, as noções de cálculo literal e suas leis e regras, cálculo algébrico e

suas propriedades, sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas,

representação geométrica de equações lineares em IR2, equações do primeiro grau,

retas no plano e suas propriedades, regra de três e frações algébricas.

Observa-se assim que o trabalho desenvolvido nesta obra é centrado nos

ostensivos representação em língua natural, discurso oral, representação escrita,

representação algébrica de equações lineares e de sistemas de equações lineares e

representação gráfica de equações no sistema cartesiano ortogonal e que os autores,

mesmo não utilizando explicitamente essas denominações, fazem apelo a um discurso

tecnológico para justificar as representações utilizadas, as conversões de

representações necessárias e a articulação das diferentes noções em jogo nas tarefas

resolvidas e propostas aos estudantes.

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4.5 A ANÁLISE DA OBRA DE CASTRUCCI ET AL, 2002.

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra “A

Conquista da Matemática” 7ª série.

definir

definir

Polinômios definir

Números reais introduzir

Determinar

Calculo algébrico introduzir - O uso de letras para representar números - Expressões algébricas ou literais - Valor numérico de uma expressão algébrica. - Uma consideração importante (o que aprendeu)

- Monômio ou termo algébrico. - Polinômios. - Os produtos notáveis

- Raiz quadrada exata de um número racional. - Raiz quadrada aproximada de um número racional. - Noção intuitiva dos números racionais e sua representação decimal. - Noção intuitiva de números irracionais - Noção intuitiva de números reais. - Operação em IR e suas propriedades.

Frações algébricas

aplicar

Equações

- Fatorando polinômios - Cálculo M.M.C. de polinômios. - Polinômios - Operações com polinômios

definir

- Fração algébrica - Simplificação da fração algébrica. - Adição e subtração de frações algébricas. - Multiplicação e divisão de frações algébricas.

definir - Equações de 1º grau com uma incógnita. - Equação fracionária de 1º grau com uma incógnita. - Equações literais de 1º grau na incógnita x.

Equações e Sistemas lineares introduzir - Equações de 1º grau com duas incógnitas. -Sistemas de equações de 1º grau com duas incógnitas. - Resolução de um sistema de duas equações de 1º grau com duas incógnitas.

Introduzir

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110

4.6 Comentários e análise

Os autores introduzem a obra procurando enfatizar a importância da Matemática

em nossas vidas e acrescentando que, atualmente, a falta de conhecimento das noções

dessa ciência tende a dificultar o convívio social dos indivíduos como mostra o texto:

“Ficar de fora desse processo, ficar a parte do conhecimento matemático é, hoje, estar

à margem das mudanças do mundo” (Castrucci et al, 2002, p.3).

Nesse texto, os autores declaram que o objetivo é apresentar as linhas mestras

por meio de uma linguagem simples, mas respeitando o rigor matemático.

No inicio da obra os autores introduzem a noção de “números reais” por meio de

exemplos do cotidiano, as noções de raiz exata e quadrado perfeito, articulando o

quadro numérico com o geométrico e propondo a utilização da calculadora como

ferramenta para facilitar os cálculos, a fim de favorecer o estudo da raiz aproximada e

introduzir a noção de número irracional.

Verifica-se a preocupação no sentido de utilizar metodologias e estratégias

propostas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998), embora estas não

sejam articuladas de forma satisfatória, como é o caso do texto – apenas descritivo –

que trata das contribuições dos grandes matemáticos, apresentado no capítulo sobre

números reais, conforme mostra a figura abaixo.

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.27

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111

Na passagem ao cálculo algébrico os autores utilizam o exemplo do Índice de

Massa Corpórea (IMC), mostrando a importância da fórmula que permite calcular o

índice, conhecendo-se a massa em quilogramas e a altura em metros.

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.33

Neste exemplo propõe-se a articulação entre o quadro algébrico e o quadro

numérico, que exige, como conhecimentos prévios, noções associadas a números e

grandezas, desenvolvidas nas séries anteriores.

Para introduzir o cálculo algébrico, os autores apresentam tarefas que envolvem

o cálculo do valor de números desconhecidos e, para auxiliar a compreensão, articulam

o quadro algébrico com os quadros geométrico e numérico, o que supõe que os

estudantes disponham de conhecimentos prévios associados a esses dois quadros e

que possam aplicá-los de forma disponível.

Passando ao estudo dos polinômios, os autores introduzem a noção de termo

algébrico, propondo tarefas que envolvem situações do cotidiano. Da mesma forma,

são introduzidas as noções de monômios e polinômios, generalizando propriedades e

operações, pela articulação dos quadros algébrico e geométrico, sempre que possível.

Essa abordagem pode ser observada no exemplo que segue.

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112

Fonte: CASTRUCCI el al, 2002, p.74

Fonte: CASTRUCCI et al,2002,p.75

Além disso, é possível verificar nesse exemplo, que os autores utilizam o

ostensivo língua natural para justificar o desenvolvimento da técnica apresentada e a

articulação considerada, isto é, eles mostram que a representação da área do retângulo

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113

considerado é algebricamente igual a multiplicação de um polinômio por outro por meio

de um discurso tecnológico.

Para as noções de produtos notáveis e fatoração os autores seguem o mesmo

tipo de abordagem, justificando por meio de um discurso tecnológico as mudanças de

quadro e as articulações de diferentes noções.

O estudo das frações algébricas segue a mesma lógica, assim como a

introdução da noção de equação do 1º grau. São resolvidos alguns casos particulares

de equações cujas etapas são justificadas por meio de um discurso tecnológico, uma

vez que essas etapas estão associadas a noções construídas anteriormente, como é o

caso de redução de frações ao mesmo denominador ou das noções relacionadas a

grupos aditivo, multiplicativo e abeliano que são tratadas como princípios para os

estudantes do Ensino Fundamental (“topos” do estudante), mas que devem ser

disponíveis para o professor (“topos” do professor), podendo este utilizar seus próprios

meios para justificar as diferentes passagens como mostra a figura abaixo.

Fonte: CASTRUCCI et al, 2002, p.137

É importante observar que faz parte, tanto do “topos” do estudante como do

“topos” do professor, a justificativa das diferentes etapas da solução das tarefas, por

meio de um discurso tecnológico que explicita a técnica empregada. No caso do

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estudante, o discurso justifica a técnica e no caso do professor o discurso seria outro,

pois se trata da teoria que sustenta este discurso, que inclui as noções de grupo aditivo,

multiplicativo e abeliano.

Nesta obra, após introduzir as equações do 1º grau com duas incógnitas, os

autores passam aos métodos de solução de sistemas - substituição e adição -

utilizando um discurso tecnológico para justificar as técnicas empregadas.

Esse discurso está relacionado aos ostensivos necessários à solução das tarefas

(“topos” do estudante), mas para ser melhor compreendido pelo professor exige que

este disponha de conhecimentos sobre os não ostensivos implícitos nessa justificativa

(“topos” do professor) que estão associados às noções de grupo aditivo, multiplicativo e

abeliano para o método da substituição e à noção de espaço vetorial para o método da

adição.

Os autores finalizam a obra introduzindo as noções geométricas de retas,

ângulos e suas propriedades, polígonos, triângulos, quadriláteros, circunferência e

círculo e suas propriedades. Observa-se que o texto foi construído com o cuidado de

oferecer aos alunos oportunidades de estabelecer a relação entre os novos

conhecimentos e as noções de álgebra construídas anteriormente.

4.7 A parte do professor e do aluno nas tarefas apr esentadas

Levando em conta a grade de análise, o exame das tarefas que compõem o

“topos” do professor e o “topos” do aluno foi realizado com base nos dados registrados

na seguinte tabela:

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidade % Tarefas Quantidade % Tarefa 1 5 34 Tarefa 1 40 49

Tarefa 2 2 13 Tarefa 2 18 22

Tarefa 3 2 13 Tarefa 3 15 19

Tarefa 4 3 20 Tarefa 4 5 6

Tarefa 5 0 0 Tarefa 5 0 0

Tarefa 6 3 20 Tarefa 6 3 4

Total 15 100 Total 81 100

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Neste livro os autores privilegiam a tarefa 1, que representa situações cotidianas

e para resolver esse tipo de tarefa o estudante pode trabalhar em diferentes níveis

dependendo de seus conhecimentos prévios. Se os estudantes dispõem apenas de

conhecimentos sobre as quatro operações, é possível resolver a tarefa proposta

utilizando uma tabela, isto é, o ponto de vista das tentativas.

As tarefas 2 e 3 aparecem na mesma quantidade para o trabalho do professor e

muito próximas para o trabalho proposto ao estudante. Porém na tarefa 2, as situações

matemáticas são transformadas em contextos cotidianos, podendo ser resolvidos por

meio do ponto de vista das tentativas, mas essa proposta não é apresentada na obra.

Observa-se que existe uma proposta equilibrada para o trabalho do professor e

do estudante, na tarefa 3 - situações matemáticas algébricas transformadas em

contextos cotidianos -, que exigem o domínio algébrico associado à conversão do

enunciado em um sistema de duas equações lineares com duas incógnitas e um

método para a sua solução, isto é, trata-se do caso mais adequado para o tratamento

algébrico.

As tarefas 4 e 6, aparecem na mesma quantidade para o professor, sendo que a

tarefa 4, exige apenas o trabalho técnico, isto é, um método de resolução de sistemas

enquanto que a tarefa 6 está mais centrada na proposta de situações de referência em

que não é necessário utilizar a noção de sistemas de duas equações lineares com duas

incógnitas, embora esta facilite a resolução das tarefas.

A tarefa do tipo 5 que exige uma articulação dos quadros algébrico e geométrico

não é contemplada nessa obra.

Pode-se dizer que o trabalho a ser desenvolvido pelo professor é equilibrado e

está de acordo com as exigências encontradas nas propostas para os estudantes. Das

tarefas propostas aos estudantes, 49% são do tipo 1 e 22% do tipo 2, cujas soluções

podem ser obtidas por tentativas, com o auxílio de uma tabela ou do cálculo mental,

antes de passar a equações lineares e sistemas de equações lineares. Dessa forma,

enfatiza-se o caráter facilitador do ponto de vista do ponto de vista de sistemas de

equações lineares.

É importante observar que pouca ênfase é dada ao trabalho sobre as técnicas de

resolução de sistemas, podendo dificultar a fixação desta ferramenta para aplicações

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futuras. Essa escolha não é compreensível pois o objetivo para a introdução da noção

de sistema de duas equações com duas incógnitas é seu caráter de ferramenta

facilitadora para a solução de tarefas desse tipo.

Sendo assim, é importante observar que, os estudantes, além de dispor das

situações de referência propostas, precisam desenvolver as técnicas de solução desses

sistemas o que pode exigir uma atenção maior ao nível de conhecimento técnico.

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117

4.8 A ANÁLISE DA OBRA DE IEZZI ET AL 2000.

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra

“Matemática e Realidade”, 7ª série.

Aplicar

Determinar

Cálculo algébrico introduzir - O uso de letras para representar números - Expressões algébricas ou literais - Valor numérico de uma expressão algébrica.

Polinômios definir

- Monômio ou termo algébrico. - Polinômios. - Os produtos notáveis

Números reais introduzir

- Raiz quadrada exata de um número racional. - Raiz quadrada aproximada de um número racional. - Noção intuitiva dos números racionais e sua representação decimal. - Noção intuitiva de números irracionais - Noção intuitiva de números reais. - Operações em IR e suas propriedades.

Introduzir

Frações algébricas

aplicar

Equações

definir - Fatoração de polinômios - Cálculo M.M.C. de polinômios. - Operações com polinômios

definir

- Fração algébrica - Simplificação da fração algébrica. - Adição e subtração de frações algébricas. - Multiplicação e divisão de frações algébricas.

definir - Equações de 1º grau com uma incógnita. - Equação fracionaria de 1º grau com uma incógnita. - Equações literais de 1º grau na incógnita x.

Equações e Sistemas lineares introduzir - Equações de 1º grau com duas incógnitas. - Sistemas de equações de 1º grau com duas incógnitas. - Resolução de um sistema de duas equações de 1º grau com duas incógnitas.

definir

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118

4.9 Comentários e análise

A obra dos mesmos autores cuja análise foi apresentada anteriormente segue a

mesma forma, como é possível verificar pela comparação dos organogramas e poucas

mudanças foram feitas em relação ao seu desenvolvimento, o que permite manter os

comentários e análise já efetuados.

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidades % Tarefas Quantidades % Tarefa 1 2 22 Tarefa 1 14 14

Tarefa 2 1 11 Tarefa 2 6 06

Tarefa 3 0 0 Tarefa 3 4 04

Tarefa 4 1 11 Tarefa 4 34 34

Tarefa 5 2 22 Tarefa 5 1 01

Tarefa 6 3 34 Tarefa 6 41 41

Total 9 100 Total 100 100

As tarefas resolvidas e propostas aos estudantes são as mesmas da edição já

apresentada com pequenas mudanças no layout.

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4.10 A Análise da Obra de Scipione Di Pierro Netto, 1991.

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra

“Matemática Scipione” 7ª série.

Introduzir

Os Conjuntos Numéricos introduzir

- Noção intuitiva de números naturais - Noção intuitiva de números inteiros relativos - Noção intuitiva de números racionais (representação fracionária, decimal exata, dízima periódica) - Noção intuitiva de número real através de sua representação na reta numérica pela seqüência: números inteiros, números racionais não inteiros, números irracionais. - Valor absoluto e relação de ordem. - Operações em IR e suas propriedades.

Expressões Algébricas e Polinômios

Definir - Expressões algébricas - Valor numérico de uma expressão algébrica - Polinômios - Operações com polinômios.

Definir - Representação algébrica e geométrica (área)

Produtos Notáveis e Fatoração

Equações e Inequações

Introduzir

Sistemas de equações do 1º grau

definir -Equação fracionária. -Equações literais -Inequações do 1º grau -Resolução de inequações.

Definir e construir

- Plano cartesiano RXR. - Sistemas do 1º grau. - Problemas do 1º grau. - Sistemas de equações fracionarias. - Sistemas de equações literais

Introduzir

Aplicar

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120

4.11 Comentários e análise

O autor inicia fazendo uma revisão sobre os conjuntos numéricos e explora os

conceitos de números naturais, inteiros relativos, números racionais, números

irracionais e as noções intuitivas de conjuntos numéricos para ilustrar esses conjuntos

por meio do diagrama de Venn, ostensivo (gráfico) que permite uma melhor

visualização de noções que estão sendo abordadas.

Cada tópico é seguido de exercícios e no final desse primeiro capítulo o autor

utiliza o jogo de damas para apresentar os números naturais, suas operações e

propriedades. Nesse caso, para justificar cada procedimento ele faz apelo a um

discurso tecnológico que justifica a utilização dos diferentes ostensivos: escritas

(representação por número de peças distribuídas nos tabuleiros) e sua relação com o

processo de contagem e as possibilidades de operações entre os elementos

representados, como mostra a figura abaixo. É importante observar que, no discurso

empregado, o autor articula os quadros numérico e geométrico supondo que o

estudante disponha de conhecimentos geométricos, o que lhe permite articular

números, operações e formas geométricas como mostra o extrato abaixo.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.18

Na seqüência, para introduzir as noções de álgebra, o autor utiliza uma tabela

para discutir e representar as "expressões algébricas" que foram definidas

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anteriormente. Essa discussão é feita a partir da simulação de uma aula em que ocorre

um possível diálogo entre professor e estudante, conforme ilustração a seguir. Nesse

desenvolvimento, o autor utiliza um discurso tecnológico para definir novas noções

matemáticas.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.21

O tópico seguinte, que trata do cálculo do valor numérico de uma expressão

algébrica, é introduzido pela proposta de uma situação-problema (figura abaixo), cuja

discussão mostra a preocupação dos autores no sentido de justificar a introdução de

um novo conhecimento por meio de um contexto cotidiano. Essa abordagem é seguida

de uma série de exercícios de identificação de expressões algébricas e cálculo do valor

numérico destinados à fixação das técnicas possíveis de trabalho com a nova noção

que foi introduzida.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.22

Dando continuidade o autor introduz as noções de termos semelhantes,

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122

operações com monômios, grau de um polinômio e operações com polinômios.

Em seguida, introduzindo a operação denominada pelo autor como "bolinha", é

apresentado um discurso tecnológico que justifica as propriedades, mostrando alguns

exemplos numéricos como ilustra o exemplo abaixo.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.42

A abordagem das noções de produtos notáveis e fatoração também é feita pela

articulação dos quadros algébrico e geométrico, permeada de um discurso tecnológico

que justifica cada procedimento.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.45

No caso da fatoração o autor apresenta um ostensivo (esquema) para facilitar o

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123

discurso tecnológico que o acompanha, como é possível verificar na figura abaixo:

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.54

No final de cada tópico o autor propõe ao estudante uma série de exercícios e

testes. Como foi feito nos capítulos anteriores, o autor termina o capítulo com o

exemplo de uma situação da natureza. Neste caso, por meio do exemplo, é possível

reconhecer os números de Fibonacci, o que permite que o autor desenvolva uma breve

discussão sobre a produção matemática na Idade Média, articulando assim, as noções

que estão sendo introduzidas com seu desenvolvimento histórico e com possibilidades

de aplicações no cotidiano, como mostra o extrato abaixo.

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124

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.60

Na seqüência são introduzidas as noções de Maximo Divisor Comum e Mínimo

Múltiplo Comum de polinômios e frações algébricas, supondo que essa noção já tenha

sido construída para os números. Ao final desse tópico também é sugerida uma série

de exercícios de fixação. No final do capítulo o autor introduz uma nova aplicação da

série de Fibonacci em situações cotidianas que podem servir de exemplos de referência

para o desenvolvimento de outros conhecimentos, nas séries posteriores.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.74

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125

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.75

O exemplo acima deixa evidente que, para articular conhecimentos matemáticos

com situações cotidianas, é preciso dispor de conhecimentos sobre Matemática e sobre

outras ciências para que se possa utilizar um discurso tecnológico adequado que

justifique sua aplicação e permita compreender o raciocínio empregado.

Finalmente, são introduzidas noções de equações e inequações do primeiro

grau, que darão subsídios para o estudo das equações fracionárias.

Na abordagem das noções relativas a equações literais, o discurso tecnológico

utilizado pelo autor, para justificar cada passagem, está presente no diálogo fictício

entre um professor e um estudante, conforme se observa no excerto a seguir.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.80

A abordagem das inequações do 1º grau é feita a partir da noção de intervalo em

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126

IR representado na reta numérica e da expressão algébrica correspondente,

favorecendo ao estudante o trânsito entre os quadros numérico e algébrico. No final do

capítulo, o autor propõe uma série de exercícios de aplicação e introduz uma

curiosidade para incentivar os estudantes e mostrar a importância da Matemática.

Neste caso, trata-se de um jogo cujas regras são definidas por meio de conceitos

matemáticos.

Na seqüência, o autor introduz sistemas de equações do 1º grau com duas

incógnitas, iniciando pela representação, no sistema cartesiano ortogonal, das retas

correspondentes às equações que compõem os sistemas.

Assim, o autor apresenta estratégias de solução de um sistema de duas

equações e duas incógnitas, articulando os quadros numérico, algébrico e geométrico,

considerando as três possibilidades:

- sistema possível e determinado, em que a solução gráfica é um ponto, ou

ainda, quando as retas que o representam são concorrentes;

- sistema impossível, em que a solução gráfica é composta de duas retas

paralelas;

- sistema possível e indeterminado representado por uma única reta no sistema

cartesiano ortogonal.

Para essa discussão, o autor apresenta exemplos como os que foram indicados

para a Tarefa 4, introduzindo os métodos de substituição e adição, cujo planejamento,

execução e controle são justificados por meio de um discurso tecnológico. A figura que

segue mostra esse desenvolvimento.

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127

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.99

Finalizando, o autor introduz os sistemas de equações literais, fazendo distinção

entre as noções de incógnitas e parâmetros, por meio de um discurso tecnológico,

como mostra o exemplo abaixo.

Fonte: SCIPIONE, 1991, p.103

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Verifica-se que o autor, faz apelo a um discurso tecnológico para justificar as

diferentes técnicas introduzidas assim como as definições e propriedades utilizadas.

Quanto aos exercícios resolvidos, o discurso utilizado pelo autor permite

compreender como a solução da tarefa foi planejada, executada, controlada e

justificada. Quando possível, faz-se a articulação entre quadros ou domínios distintos e

pontos de vista, utilizando os ostensivos adequados.

Para a noção de sistema de duas equações lineares com duas incógnitas, o

ostensivo escrito utilizado é a representação gráfica das retas que representam as

equações e dessa forma o autor introduz o conjunto solução, estudando as

possibilidades de intersecção dessas retas.

Dessa forma, o autor faz a discussão dos sistemas, quanto ao número de

soluções, antecipando a construção de conhecimentos que posteriormente serão

desenvolvidos em séries posteriores.

4.12 A parte do professor e do aluno nas tarefas a presentadas

A seguir, é feita a análise do “topos” do professor e do estudante, levando em

conta as tarefas resolvidas e propostas na obra analisada.

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidades % Tarefas Quantidades % Tarefa 1 2 14 Tarefa 1 22 25

Tarefa 2 2 14 Tarefa 2 20 22

Tarefa 3 4 26 Tarefa 3 6 07

Tarefa 4 2 14 Tarefa 4 13 14

Tarefa 5 4 26 Tarefa 5 10 12

Tarefa 6 1 06 Tarefa 6 17 20

Total 15 100 Total 88 100

Verifica-se que a tarefa 1 - situação matemática enunciada no quadro numérico,

que pode ser trabalhada em diferentes níveis dependendo dos conhecimentos prévios

dos estudantes - representa 14% do trabalho esperado do professor e 25% do trabalho

esperado dos estudantes.

Para a tarefa 2 - situação matemática transformada em contexto cotidiano, que

favorece a discussão a respeito da facilidade dos pontos de vista equações lineares e

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129

sistemas de equações lineares -, a distribuição das tarefas é a mesma observada para

a tarefa 1. Observa-se que para essa tarefa os trabalhos do professor e do estudante

estão “equilibrados”

As tarefas do tipo 4, que exigem a aplicação de um método para a solução de

sistemas, estão bem distribuídas entre professor e estudante.

O autor privilegia as tarefas 3 e 5. A tarefa 3, que tem um caráter puramente

algébrico e reduz as diferentes formas de tratamento consideradas nesse trabalho,

permitindo mostrar a importância dos pontos de vista de equações lineares e sistemas

de equações lineares. Embora as tarefas deste tipo apresentem, no enunciado, todos

os elementos para a sua solução, podem ser consideradas de nível disponível, pois

exigem que os estudantes as relacionem com a noção de sistemas de equações

lineares e disponham de um método para resolvê-las. A tarefa 5, que exige a

passagem do quadro algébrico para o quadro geométrico, possibilita a articulação entre

esses quadros.

Para a tarefa 6, o autor apresenta apenas uma situação, o que pode dificultar o

trabalho do estudante, pois embora não exija conhecimentos específicos sobre as

noções de equações e sistemas de equações lineares, pois pode ser solucionada por

tentativas, observa-se que neste tipo de tarefa, a interpretação do enunciado e a

articulação entre outros conhecimentos matemáticos são habilidades fundamentais.

Verifica-se que o autor propõe ao aluno 25% de tarefas do tipo 1 e 22% de

tarefas do tipo 2, que não exigem a utilização das noções de equações lineares e

sistemas de equações lineares.

O autor é coerente na proposta de tarefas para os estudantes, pois privilegia o

trabalho que se supõe realizado pelo professor.

As tarefas dos tipos 3 e 6, que podem ser solucionadas por tentativas ou por

sistemas de equações lineares, permitem que os estudantes disponham de situações

de referência para aplicações futuras. Elas são tratadas de forma equilibrada pelo autor,

mostrando a intenção de desenvolver um trabalho de pesquisa de soluções de

situações que ultrapassam a simples aplicação direita das noções matemáticas em

jogo.

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130

4.13 A ANÁLISE DA OBRA DE SCIPIONE DI PIERRO NETTO 1982

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra

“Matemática Conceitos e Operações” 7ª série.

Definir

Números reais introduzir

- Noção intuitiva do conjunto dos Naturais e suas propriedades. - Noção intuitiva do conjunto dos inteiros e suas propriedades; - Noção intuitiva do conjunto dos racionais e suas propriedades; - Noção intuitiva do conjunto dos reais e suas propriedades. - Expressões algébricas. - Monômios e polinômios.

- Operação com monômios e polinômios.

Produtos Notáveis Definir e articular - Articulação algébrica e geométrica - Fator comum - Agrupamento ou decomposição em grupo - Trinômio - Máximo divisor comum e Mínimo múltiplo comum.

Frações algébricas - Propriedade fundamental das frações.

- Operações algébricas.

Polinômios

Fatoração

Equações

Introduzir

Sistemas do 1º grau com Duas variáveis

Aplicar

Problemas do 1º grau com duas variáveis

- Equação fracionaria. - Equações Literais - Inequações do 1º grau numa variável em R (Intervalo sobre R)

Introduzir e Discutir

- Processo de substituição. - Processo de comparação. - Processo de adição. - Sistema impossível e indeterminado. - Interpretação gráfica de um sistema de duas equações do 1º grau com duas variáveis. (articulação álgebra e geometria)

- Sistema de equações fracionaria. - Sistemas de equações literais.

Definir

- Triângulo e propriedades - Congruência de triângulos - Perpendicularismo de retas, simetria, translação, paralelismo de retas; - Axiomas e propriedades. - Polígonos convexos e propriedades. - Quadriláteros - Circunferência e circulo. -Justificar os métodos de resolução de sistemas por meio da articulação algébrico e geométrico.

Aplicar

Aplicar

Geometria

Definir, construir e demonstrar

Apêndice

Articular

Definir

Definir

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131

4.14 Comentários e análise

O autor apresente o objetivo e o desenvolvimento de sua obra, considerando

cinco etapas, a saber:

A primeira parte se refere à exposição dos conceitos, operações e propriedades

que são introduzidos por meio de exemplos e situações concretas simples.

A segunda parte se refere aos primeiros exercícios a serem trabalhados em

classe e na terceira os exercícios de fixação, que são propostos como atividades extra-

classe.

A quarta parte corresponde a uma revisão para melhorar o conhecimento médio

dos estudantes, isto é, para os estudantes que desejam ir além.

Na quinta parte, propõem-se questões objetivas para preparar o estudante para

concursos, que, em geral, utilizam esse tipo de questões.

A primeira noção introduzida pelo autor é o conceito de números reais,

retomando as noções intuitivas de números naturais, inteiros, racionais e suas

propriedades e por extensão introduzindo os números reais e suas propriedades, isto é,

mesmo não utilizando esse termo, o autor considera a estrutura de corpo dos números

reais, conforme mostra a figura abaixo.

Fonte: SCIPIONE, 1982, p. 8

Finalizando o capítulo, o autor introduz a noção de intervalo em IR, por meio de

suas representações, supondo que os estudantes já tenham construído a noção de

desigualdade em IR.

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132

Na seqüência, o autor aborda a noção de polinômios, identificando e definindo

expressões algébricas por meio de exemplos e apresentando a seguinte classificação

para essas expressões:

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.1 8

Segue calculando o valor numérico das expressões algébricas e define

monômios e polinômios e suas operações. Sempre que possível, o autor apresenta um

discurso tecnológico para justificar a nova técnica que está sendo introduzida, como

mostra o exemplo abaixo:

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.31

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133

A introdução de cada nova noção é sempre seguida de uma série de exercícios

de fixação, sendo que a maior parte requer a aplicação das técnicas introduzidas.

A abordagem de produtos notáveis é feita pela articulação entre os quadros

algébrico e geométrico, permitindo uma melhor visualização e compreensão da

igualdade algébrica. Um discurso tecnológico serve de sustentação para a articulação

considerada, conforme pode ser visto no excerto a seguir.

Fonte: SCIPIONE, 1982, p. 45

Ao introduzir as noções de máximo divisor comum e mínimo múltiplo comum de

polinômios, o autor articula o quadro numérico com o quadro algébrico e mais uma vez

utiliza um discurso tecnológico para justificar esta articulação e mostrar que as mesmas

técnicas se aplicam aos dois casos.

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134

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.69

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.70

Após definir frações algébricas, são identificadas as suas propriedades e

apresentadas as operações acompanhadas de suas técnicas, por meio de um discurso

tecnológico que justifica as etapas e permite articular este conhecimento com noções

desenvolvidas anteriormente.

Para o estudo de equações do 1º grau, o autor relaciona sua solução à noção

intuitiva de número real introduzida no primeiro capítulo, discutindo as diferentes

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135

técnicas que podem ser utilizadas para determinar o conjunto solução de equações

fracionárias, literais e inequações do 1º grau com uma incógnita.

O exemplo abaixo para as inequações mostra a articulação entre as noções

introduzidas anteriormente e o discurso utilizado pelo autor para justificar os

procedimentos com base nas propriedades e leis estudadas anteriormente.

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.91

Finalizando, o autor introduz a noção de sistemas de equações do 1o grau com

duas incógnitas, apresentando o método da determinação de dois pontos par cada

equação, o método gráfico e o método do escalonamento de Gauss, denominado

resolução algébrica, para a sua solução dos sistemas propostos. Essa abordagem

exige a articulação entre os quadros algébrico e geométrico e propicia a solução de

problemas que envolvem equações do 1o grau com duas incógnitas. Os extratos

apresentados a seguir mostram a presença do discurso tecnológico utilizado pelo autor,

para justificar cada passo dessa abordagem.

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136

Fonte: SCIPIONE,1982, p. 108

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.109

No final do livro, são introduzidas as noções de geometria articuladas às noções

anteriormente apresentadas, mostrando a importância das equações na resolução das

situações geométricas propostas.

A apresentação dos conteúdos neste livro didático está coerente com a proposta

inicial do autor, permitindo articular diferentes quadros da própria Matemática para

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137

desenvolver e justificar as técnicas necessárias ao trabalho matemático que será

desenvolvido nas séries subseqüentes.

Fonte: SCIPIONE, 1982, p.118

Fonte: SCIPIONE, 1982, p. 119

4.15 A parte do professor e do aluno nas tarefas ap resentadas

Conforme as tarefas da grade de análise, o ”topos” do professor e o “topos” do

estudante foram examinados por meio da tabela abaixo:

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138

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidades % Tarefas Quantidades % Tarefa 1 9 40 Tarefa 1 35 35

Tarefa 2 4 18 Tarefa 2 32 32

Tarefa 3 4 18 Tarefa 3 11 11

Tarefa 4 2 10 Tarefa 4 17 18

Tarefa 5 3 14 Tarefa 5 4 04

Tarefa 6 0 0 Tarefa 6 0 0

Total 22 100 Total 99 100

Na década de 80, observa-se que o autor privilegia as tarefas do tipo 1, em que a

noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas funciona como

ferramenta matemática para facilitar a resolução, mas é importante observar que essa

tarefa pode ser resolvida sem esse recurso.

Quanto às tarefas do tipo 2: “situação matemática numérica transformada em um

contexto cotidiano” e do tipo 3: “Situação matemática algébrica transformada em um

contexto cotidiano”, que exigem níveis de conhecimentos diferentes, pois a primeira

pode ser trabalhada apenas sob o ponto de vista das tentativas enquanto que a

segunda exige pontos de vista de equações lineares e sistemas de equações lineares,

permitindo que o professor mostre a importância desses dois últimos pontos de vista,

pois em conjunto elas representam 36% do trabalho suposto como do professor e 43%

da parte considerada como a ser trabalhada pelos estudantes.

Antes de propor tarefas do tipo 4, o autor apresenta as técnicas de resolução de

sistemas, por meio de dois exemplos. Quanto à tarefa 5 é apresentado um exemplo

para justificar a passagem do quadro algébrico para o quadro geométrico e mostrar a

importância de se trabalhar esta passagem quando deseja dar um significado

matemático para as noções de equações e sistemas de equações

Observa-se que o autor é coerente, pois exige dos estudantes o que supõe que

tenha sido desenvolvido pelo professor, isto é, contempla a proposta de análise em que

os exemplos são considerados como a parte do professor e as tarefas propostas como

a parte dos estudantes. Certamente essa classificação é utilizada como recurso para

encaminhar o trabalho de pesquisa.

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139

Verifica-se ainda, que o autor não trata as tarefas de tipo 6 cuja dificuldade maior

está associada à sua interpretação e aos conhecimentos prévios dos estudantes.

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140

4.16 A ANÁLISE DA OBRA DE SCIPIONE DI PIERRO NETTO, 1971. O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra

“Matemática na Escola Renovada” 3º volume.

Operações algébricas fundamentais

Primeiras idéias sobre números reais introduzir - Os números racionais e a reta numerada.

- Os polinômios, adição e subtração; - Valor numérico dos polinômios; - Multiplicação e divisão de polinômios; - Fatoração algébrica; - Frações algébricas. - Equações racionais fracionárias redutíveis ao 1º grau; - Equações literais do 1º grau; - Sistemas de duas equações redutíveis ao 1º grau em x e y; - Problemas redutíveis ao 1º grau; - Sistemas de inequações. - Noção intuitiva de conjuntos, operações e relações.

Triângulos, paralelismo, quadriláteros. Enunciar e demonstrar

- O ponto, a reta, o plano; - Os subconjuntos do plano. - Regiões convexas e côncavas; - Congruência de triângulos; - Ângulos formados por retas coplanares e uma transversal; - O postulado de Euclides; - Paralelogramos e trapézios.

Lugares geométricos e circunferência

Enunciar e demonstrar

- Lugares geométricos planos; - Retas concorrentes nos triângulos; - Primeiras definições, propriedade das cordas; - Posições relativas de uma reta e uma circunferência e de duas circunferências; - medidas dos ângulos de uma circunferência ou círculo.

Introduzir

Equações e Sistemas de Equações - Inequações

Definir

Introdução aos conjuntos Definir

Os entes fundamentais da Geometria Introduzir

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141

4.17 Comentários e análise

O livro Matemática na Escola Renovada, de Scipione Di Pierro Netto, para o

curso ginasial (atual Ensino Fundamental II), datado de 1971, é dividido em duas partes

consideradas, pelo autor, como fundamentais para a série a que se destina, a saber: os

elementos do cálculo algébrico até as equações e os sistemas do 1º grau e a geometria

elementar desde os entes fundamentais até o estudo da circunferência.

O autor faz algumas considerações sobre as notações para reta:↔

AB , semi-

reta:→

AB , para segmento: AB e para indicar medida do segmento:AB, dando

uniformidade à notação geométrica e considerando, implicitamente, a noção de vetor

por meio das representações apresentadas.

Esclarece ainda que a seriação dos exercícios pretende estabelecer uma ordem

crescente de conhecimento e de dificuldades.

No capítulo 1, o autor introduz os quantificadores universal e existencial por meio

de exemplos da vida e utiliza as representações de conjuntos, suas propriedades,

operações e relações. Em seguida, utilizando a reta numérica, o autor retoma a noção

de números racionais para introduzir os números irracionais, demonstra as

propriedades desses números por meio da articulação entre os ostensivos de

representação, isto é, representação em língua natural, representação lógica

(quantificadores) e representação algébrica, relacionadas às propriedades dos números

racionais como mostra o exemplo abaixo.

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.5

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142

Verifica-se que, nesta obra, o autor utiliza um discurso bastante diferente dos

anteriores, pois se trata da época da Matemática Moderna em que a proposta era

desenvolver os conhecimentos matemáticos articulando com a lógica e a teoria de

conjuntos.

No capítulo 2, o autor introduz a noção de polinômios segundo a mesma lógica

dos livros atuais, isto é, definição de monômios, polinômios e expressões algébricas,

valor numérico e operações.

A abordagem de produtos notáveis é feita, inicialmente, com o auxílio do quadro

algébrico. A seguir, utilizando um esquema (ostensivo), o autor estabelece a relação

entre quadro algébrico e quadro geométrico, justificando cada etapa por meio de um

discurso tecnológico.

Fonte: SCIPIONE, 1971,p.55

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143

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.56

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.57

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144

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.58

No capítulo 3, são introduzidas as noções relativas a equações fracionárias e

equações literais redutíveis a uma equação do 1º grau. São também discutidos

métodos de solução dessas equações, por meio de um discurso tecnológico que

justifica as noções e técnicas empregadas e analisa os resultados obtidos, como é

possível observar no texto que segue.

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.83

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145

Nesse mesmo capítulo o autor introduz a noção de sistemas de duas equações

redutíveis ao primeiro grau em x e y.

Partindo de duas equações, o autor mostra que existem infinitos pares

ordenados (x,y) que satisfazem às duas equações ao mesmo tempo, isto é, utilizando

um ostensivo diferente do ostensivo tabela considerado nesse trabalho, ele introduz a

noção de sistema de duas equações lineares e duas incógnitas por meio do ponto de

vista das tentativas como mostra a texto abaixo.

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.87

Fonte: SCIPIONE, 1971,p.88

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146

Uma vez introduzida a noção de sistema de duas equações do 1º grau com duas

incógnitas, o autor apresenta os métodos de resolução desses sistemas utilizando um

discurso tecnológico que justifica as estratégias utilizadas nessa resolução.

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.88

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.89

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.90

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147

Para estudar as possibilidades de solução dos sistemas de duas equações

lineares com duas incógnitas, o autor permanece apenas no quadro algébrico, e por

meio de um discurso tecnológico justifica a existência de sistemas indeterminados e

impossíveis, dando recursos para o professor e para os estudantes para justificar o

estudo algébrico desses sistemas como é possível observar no texto que segue.

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.93

As situações matemáticas e cotidianas são tratadas como “problemas redutíveis

ao 1º grau” e para esse caso, o autor mostra que pela interpretação do enunciado, é

possível planejar (armar), resolver (executar) o problema e verificar (controlar) o

resultado encontrado como mostra o excerto a seguir.

Fonte: SCIPIONE, 1971, p.100

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148

Verifica-se, no texto apresentado acima, que o autor utiliza um discurso escrito

que justifica suas escolhas e permite controlar o resultado encontrado. Essa

característica não se encontra nos textos do mesmo autor analisados anteriormente.

Em seguida, o autor introduz a noção de sistemas de inequações, passando ao

capítulo 4, trata da noção de conjuntos, propriedades, operações e relações. No

capítulo 5, o autor introduz o quadro geométrico e após considerar as noções de ponto,

reta, plano, ângulos e suas propriedades ele considera os subconjuntos das retas e dos

planos articulando a noção de conjunto com essas noções de geometria.

Na seqüência o autor introduz as noções de triângulo, polígonos, quadriláteros,

lugares geométricos, circunferência e círculo e suas propriedades.

4.18 A parte do professor e do aluno nas tarefas ap resentadas

Considerando a grade de análise e as tarefas indicadas no capítulo 3, relaciona-

se abaixo cada tipo de tarefa com o número delas encontrado no livro didático da

década de 70.

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidades % Tarefas Quantidades % Tarefa 1 4 17 Tarefa 1 18 19

Tarefa 2 2 08 Tarefa 2 6 06

Tarefa 3 2 08 Tarefa 3 9 09

Tarefa 4 6 25 Tarefa 4 36 38

Tarefa 5 0 0 Tarefa 5 0 0

Tarefa 6 10 42 Tarefa 6 27 28

Total 24 100 Total 96 100

Verifica-se que as tarefas do tipo 1, 4 e 6 são privilegiadas pelo autor e que a

tarefa do tipo 5 não é tratada neste livro.

Existe uma coerência entre o trabalho suposto do professor e o proposto para o

estudante. Tanto no desenvolvimento das técnicas de solução de sistemas como para

as possíveis aplicações e situações matemáticas, das outras ciências e do cotidiano.

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149

4.19 A ANÁLISE DA OBRA DE OSVALDO SANGIORGI 1966

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra

“Matemática Curso Moderno” 3º volume.

Cálculo algébrico

Números reais introduzir - Os números racionais, irracionais, reais; - Reta real; - Operações no conjunto IR; - Adição e multiplicação, estrutura de corpo. - Potenciação e radiciação. - Expressões literais, operações em IR; - Expressões equivalentes, uso do quantificador; - Termos semelhantes, expressões literais; - Cálculo com termos semelhantes, reduções; - Técnica para o cálculo algébrico;. - Técnicas usuais na multiplicação, produtos notáveis; - Técnica de fatorações e expressões. - Equações, inequações e sistemas do primeiro grau; - Equações e inequações com uma variável, redutíveis ao primeiro grau; - Sistemas de duas equações simultâneas; - Elemento moderno dos polinômios; - Conceito de polinômio e variável, igualdade de polinômios e operações com polinômios. - Os conjuntos.

Estudo das figuras geométricas Definir e construir

- Objetivo da geometria; -Figuras geométricas planas, curva fechada simples; - Relações e operações com conjuntos de pontos no plano; - Semi-reta, segmento de reta, semiplano; - Medida de segmentos, segmentos congruentes; - Conceito de ângulo, medidas de ângulos; - Ângulos complementares, ângulos suplementares - Ângulos formados por duas retas coplanares e uma transversal. - Ângulos formados por retas coplanares e uma transversal; - O postulado de Euclides; - Paralelogramos e trapézios.

Estudo dos polígonos e da circunferência Definir

-Conceito de polígonos, diagonais; -Estudo dos triângulos; -Construção lógica da geometria, postulados e teoremas da geometria; -Quadriláteros, Paralelogramos, Trapézio e teoremas fundamentais; -Circunferência, circulo, posição relativa da reta e circunferência.

Primeira parte

Cálculo algébrico Segunda parte

Cálculo algébrico

Terceira parte

Cálculo algébrico Quarta parte

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150

4.20 Comentários e análise

Na obra Matemática Curso Moderno, de Osvaldo Sangiorgi, 1966, destinada à 3ª

série do ginásio (atual 7ª série do Ensino Fundamental II), o autor inicia descrevendo as

três etapas a cumprir:

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.xv

Aborda a noção de números reais, considerando a representação decimal dos

racionais e introduzindo os irracionais. Mostra a diferença entre eles, para concluir que

a união de todos esses números constitui o conjunto dos números reais, passando

assim para o estudo das operações sobre esses números e suas propriedades. Em

seguida, considera a representação de um número real na reta numérica e, articulando

os quadros algébrico e geométrico, representa um número irracional sobre a reta

numérica, como mostra o texto abaixo.

Fonte: SANGIORGI,1966, p.19

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151

No capítulo 2, o autor introduz o cálculo literal, isto é, o trabalho com as letras e

as leis que regem esse trabalho, explorando, em seguida, as possibilidades de

aplicação do cálculo literal no quadro geométrico, com mostra a tarefa abaixo.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.51

Ainda neste capítulo o autor apresenta a estrutura algébrica de corpo dos

números reais, mas da forma como é enunciado parece mais um lembrete dirigido ao

professor e ao estudante que deseja se aprofundar, pois não interfere diretamente no

trabalho proposto.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.54

Para apresentar as técnicas utilizadas no cálculo algébrico, em especial,

em operações com polinômios, o autor utiliza um novo ostensivo “esquema” (figura com

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152

bolinhas) indicando como dispor os elementos após a operação. Um exemplo da

multiplicação de polinômios é apresentado na figura abaixo.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.58

Em seguida, introduzindo os produtos notáveis o autor articula os quadros

algébrico, geométrico e numérico, utilizando um discurso tecnológico para justificar o

trabalho efetuado e mostra também a importância dessa noção para o cálculo mental.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.66

Após desenvolver noções relativas à fatoração de expressões algébricas, cuja

abordagem inclui a proposta de uma seqüência de exercícios de fixação, o autor

introduz equações e inequações, com uma variável, redutíveis ao primeiro grau.

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153

Na seqüência, o autor introduz os sistemas de duas equações do primeiro grau

com duas incógnitas, bem como as técnicas de solução desses sistemas. . Para

desenvolver um discurso tecnológico adequado, que justifique essas técnicas, o autor

necessita de uma linguagem matemática que envolva noções como par ordenado,

variável, coeficientes, membro de uma equação ou inequação.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.85

O autor introduz também o que ele denomina de sistemas de três equações

simultâneas do primeiro grau com três incógnitas e utiliza a técnica da substituição para

a sua solução.

As noções de polinômios, operações e propriedades são discutidas, com o

objetivo de mostrar que o conjunto dos números reais é um anel comutativo o que

permite analisar outros conjuntos conhecidos dos estudantes que têm a mesma

estrutura.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.103

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154

Finalmente, passa-se ao estudo das figuras geométricas, introduzindo as noções

de ponto, reta e plano e suas propriedades, por meio de abordagem que o autor

denomina construção lógica da Geometria, que lhe dá recursos para utilizar o ostensivo

organograma representado abaixo.

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.251

Para completar esse trabalho, o autor propõe um apêndice que trata dos grupos

de transformações planas, para as quais são apresentadas as estruturas

correspondentes, pela articulação do quadro geométrico com o algébrico, mostrando

que o conjunto das translações no plano, munido da operação de adição tem uma

estrutura de grupo comutativo ou abeliano, assim como o conjunto das rotações no

plano em torno de um ponto, munido da operação de adição de rotações no plano tem

essa mesma estrutura e, dessa forma, concluindo que essas duas transformações

pertencem ao grupo de transformações geométricas planas.

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155

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.305

Fonte: SANGIORGI, 1966, p.309

4.21 A parte do professor e do aluno nas tarefas ap resentadas

Verifica-se que o autor trabalha apenas com tarefas do tipo 4 dando ênfase às

técnicas de resolução de sistemas de equações lineares. Esta escolha é coerente, pois

na época considerada, a proposta era trabalhar apenas as questões matemáticas de

forma a desenvolver as ferramentas necessárias para aplicações futuras.

Sendo assim, as tarefas que exigem a aplicação de outras noções matemáticas,

em contextos do cotidiano ou retirados de outras áreas do conhecimento são deixadas

a cargo dos estudantes ou dos professores de outras disciplinas que necessitam dessa

ferramenta.

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156

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidades % Tarefas Quantidades % Tarefa 1 0 0 Tarefa 1 0 0

Tarefa 2 0 0 Tarefa 2 0 0

Tarefa 3 0 0 Tarefa 3 0 0

Tarefa 4 8 8 Tarefa 4 36 36

Tarefa 5 0 0 Tarefa 5 0 0

Tarefa 6 0 0 Tarefa 6 0 0

Total 8 1 Total 36 1

Dessa forma, o autor propõe apenas tarefas para fixação dos métodos de

solução dos sistemas de equações lineares considerados.

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157

4.22 A ANÁLISE DA OBRA DE SINÉSIO DE FARIAS, ANO 1 959.

O organograma abaixo apresenta uma visão geral da o bra “Curso de

Álgebra”, programas de admissão à Escola Militar e à Escola de

Aeronáutica.

Idéias Gerais

Identidade e Equação

Sistema de equações

Classificação das equações

Classificação dos sistemas

Transformação das equações

Transformações dos sistemas

Equação linear a uma incógnita Ax =B

Sistemas lineares Condições de solução dos

sistemas de n+p, equações a n incógnitas .

- Método de substituição (2x2; 3x3; 4x3) generalizar para n equações e 3 incógnitas. - Método da comparação (2x2; 3x3; 4x3; generalizar) para n equações e 3 incógnitas. - Método da adição (2x2; 3x3; 4x4, generalizar para n equações) n incógnitas. - Método de Bezout ou dos multiplicadores (2x2; 3x3; 4x4, generalizar para n equações e n incógnitas). - Método de Gergogne (2x2; 3x3; 4x4 generalizar para n equações e n incógnitas). - Reflexão para aplicação dos métodos. - Método de Cramer (2x2; 3x3 generalizar para n equações e 2 incógnitas).

Definir Classificar

Transformar Classificar

Transformar Resolver

Resolver

Generalizar

Introduzir Resolver

Definir

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4.23 Comentários e análise

O livro Curso de Álgebra, de Sinésio de Farias, 1959, foi escrito de acordo com

os programas de admissão à escola militar e à escola da aeronáutica. A obra foi

lançada em 1946 e sua 9ª edição, analisada nesta pesquisa, data de 1959. O objetivo

central do autor era apresentar uma obra que servisse de guia para professores e

estudantes.

O autor inicia com a noção de “números qualificados” 35 e distingue números

aritméticos ou absolutos36 utilizando exemplos como, altitude, tempo, temperatura,

posição de um ponto sobre uma reta, descrevendo-os por meio do ostensivo

representação em língua natural para justificar o emprego do sinal negativo que

representa o sentido oposto. O autor introduz as operações e propriedades dos

números inteiros relativos sempre justificando, por meio de um discurso tecnológico as

técnicas utilizadas.

Essa abordagem é complementada por “noções sobre os números complexos”,

apresentando definições para esses números e suas propriedades, seguidas de séries

extensas de exercícios de aplicação.

Na seqüência, o autor introduz “notações algébricas” definindo como sendo o

conjunto dos sinais empregados na álgebra e, por meio de um discurso tecnológico,

considera sinais de quantidade, ou seja, quantidades conhecidas e desconhecidas ou

incógnitas, que se dividem em constantes e variáveis. Além disso, o autor tem o

cuidado de especificar as letras que serão utilizadas para representá-las, deixando

clara a função de cada letra, como representante de uma constante ou variável,

levando em conta a questão dos índices que permitem representar várias quantidades.

35 Número qualificado é um número aritmético precedido do sinal + ou do sinal -. Assim, 7 , 5

3, 2

9

4 e 5 ,

são números aritméticos; + 7, + 5

3, + 2

9

4, + 5 , -7 , -

5

3, - 2

9

4e - 5 , são números qualificados

(De Farias, 1959, p.29). 36 Valor absoluto de um número qualificado é o valor que ele possui independentemente do sinal. Assim o

valor absoluto de + 5 é 5 e o valor absoluto de - 6 é 6 (De Farias, 1959, p.30).

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O mesmo discurso é utilizado para o sinal das operações, como mostra o

exemplo.

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.54

Em seguida, são introduzidos os sinais das relações de igualdade, desigualdade,

congruência e o que ele denomina sinais auxiliares que são parênteses, colchetes e

chaves.

A partir dessa explicitação das diferentes representações de quantidade,

operações e relações, o autor introduz as expressões algébricas que são classificadas

em algébricas e transcendentes, racionais e irracionais, inteiras e fracionárias e

expressões com mais de uma variável. São introduzidos os monômios e polinômios, em

que cada elemento é explicitado por um discurso que justifica sua representação.

O discurso empregado para justificar a representação permite que o autor

defina as variáveis livres ou independentes e as variáveis dependentes, introduzindo a

noção de função. Nesse momento, o autor faz apelo a um discurso que justifica as

diferentes representações em função dos não ostensivos em jogo, como mostra o texto

abaixo:

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.66

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Fonte: DE FARIAS, 1959, p.68

No capítulo sobre produtos notáveis observa-se que o autor introduz a noção de

potência e suas propriedades, e a partir desses conhecimentos faz a introdução das

potências de monômios, produto de polinômios, produtos notáveis e fatoração. Nesses

casos, o autor introduz a técnica e a justifica por meio de um discurso, que na realidade

é a leitura do resultado obtido após a multiplicação. O mesmo raciocínio e a mesma

justificativa são utilizados para a divisão. Em ambos os casos, o autor descreve os

procedimentos da técnica empregada, estudando caso a caso.

O estudo das potências e raízes permite introduzir as frações irracionais e as

técnicas de cálculo com estas frações. Após o desenvolvimento das técnicas de cálculo

com os polinômios são introduzidas as equações e inequações do primeiro grau.

Os sistemas de equações lineares são definidos por meio de um discurso

tecnológico fundamentado em noções previamente trabalhadas, como mostra o texto

abaixo.

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Fonte: DE FARIAS, 1959, p 326

Na seqüência, é apresentado um método de resolução de equações lineares

com uma incógnita (Ax = B ) - o método da eliminação para sistemas lineares - em que

as equações são representadas por uma forma linear que necessita de um discurso

tecnológico que justifique a articulação entre a noção de equações e formas lineares e

a passagem do conceito genérico de um sistema de n equações e n incógnitas para o

caso particular de 4 equações e 4 incógnitas e 3 equações e 3 incógnitas, como mostra

o texto abaixo.

Fonte: DE FARIAS, 1959, p. 351

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Fonte: DE FARIAS, 1959, p.352

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.353

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Outros métodos são apresentados, por meio de casos particulares e com

sistemas de duas ou mais equações e duas ou mais incógnitas como o método da

substituição, método da adição, método de Bezout, método de Gergogne.

No final, o autor faz um discurso que orienta professor e estudante na escolha do

método mais adequado como mostra o texto abaixo.

Observações sobre os métodos . Os métodos mais simples são o de

substituição e o de adição, principalmente o de adição, quando o sistema é

literal. Quando há incógnita com coeficiente unidade, é vantajosa a aplicação

do método de substituição. Quando os coeficientes da incógnita a eliminar são

iguais, impõe-se o método de adição. Quando há incógnita com todos os

coeficientes iguais à unidade, o emprego do método de comparação torna-se

fácil, porém muito mais cômodo se torna a aplicação do método de adição. Nos

sistemas de equações incompletas, o método de substituição é muito

vantajoso, porque torna mais simples e isenta de dúvidas a fase da resolução

propriamente dita. O método de Bezout é muito cômodo em alguns casos,

principalmente quando o número de equações é grande e basta obter o valor

de uma das incógnitas, sendo os outros deduzidos por analogia. O hábito de

cálculo e a sagacidade do operador, permitem escolher, em cada caso

particular, o método de eliminação mais vantajoso. O gosto do operador

também influi na escolha do método. Na eliminação sucessiva das incógnitas,

pode-se empregar mais de um método, segundo as vantagens peculiares a

cada um. A escolha depende da natureza dos sistemas que vão surgindo

durante a eliminação. Por questão de uniformidade, que é importante,

aconselho sempre a aplicar o mesmo método na eliminação de todas as

incógnitas (De Farias, 1959, p.376,377).

São propostos ainda sistemas gerais e o método de Cramer, com discussão das

possibilidades de solução.

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Fonte: DE FARIAS, 1959, p.382

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.383

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Fonte: DE FARIAS, 1959, p.384

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.385

Para finalizar a introdução de noções de sistemas lineares são considerados os

sistemas de n+p equações e n incógnitas com suas possibilidades de solução

discutidas por meio de um discurso tecnológico sobre as tecnologias possíveis que

representam uma teoria sobre essas técnicas. É importante observar que se trata de

um livro específico, em que são trabalhados vários métodos para a solução de sistemas

mxn e todas as possibilidades de solução desses sistemas. Nesse caso a noção de

sistemas de equações lineares é considerada apenas no quadro algébrico sem levar

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em conta as possíveis articulações com outros quadros ou com outras noções

matemáticas.

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.403

Fonte: DE FARIAS, 1959, p.404

Em seguida, o autor introduz a noção de desigualdade do primeiro grau,

equações do segundo grau com uma incógnita, trinômio do segundo grau, equações

biquadradas, sistemas do segundo grau, equações irracionais, equações recíprocas,

equações binômias, equações trinômias, e as idéias gerais sobre problemas do primeiro

e segundo graus, análise combinatória, permutações simples, arranjos simples,

combinações simples, permutações com repetições, arranjos com repetições,

combinações com repetições, binômio de Newton, potenciação dos polinômios, raiz

quadrada dos polinômios, determinantes, frações contínuas, progressões aritméticas,

progressões geométricas, conceito aritmético de logarítmo, conceitos algébricos e

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propriedades gerais dos logarítmos, cologarítmos, mudança de sistema, sistema

neperiano, sistema decimal, equações exponenciais e logarítmicas, sistemas de

equações exponenciais, limites, derivadas, estudo elementar das séries, caracteres de

convergência, números complexos e teorema de Rouché.

Verifica-se que o autor, apesar de propor tarefas para desenvolver apenas as

técnicas de resolução de sistemas, necessita de um discurso tecnológico que permite

introduzir as teorias associadas a essas técnicas. O teorema de Rouché, apresentado

no apêndice, representa a teoria sobre as técnicas para a solução de sistemas lineares

consideradas no capítulo que trata dessa noção.

Finalmente, é feita a avaliação do trabalho do professor e do estudante quando

desenvolvido por meio dessa obra.

4.24 A parte do professor e do aluno nas tarefas ap resentadas

Neste livro da década de 50 o autor focaliza o trabalho sobre sistemas lineares

nas técnicas para sua solução, isto é, seu objetivo era desenvolver as ferramentas

matemáticas para a aplicação na própria Matemática e em outras ciências, uma vez

que o livro era destinado a preparar o estudante para as escolas técnicas da época.

Tarefas

Resolvidas Tarefas

Propostas

Tarefas Quantidades % Tarefas Quantidades % Tarefa 1 0 0 Tarefa 1 0 0

Tarefa 2 0 0 Tarefa 2 0 0

Tarefa 3 0 0 Tarefa 3 0 0

Tarefa 4 44 100 Tarefa 4 80 100

Tarefa 5 0 0 Tarefa 5 0 0

Tarefa 6 0 0 Tarefa 6 0 0

Total 44 100 Total 80 100

O ensino da noção de sistemas de equações lineares para a década de 50 era

centrado no desenvolvimento dos diferentes métodos de resolução de sistemas de

equações lineares, isto é, privilegiava-se o nível técnico e o quadro algébrico que

permite o desenvolvimento de uma ferramenta explícita para o trabalho em Matemática

e nas outras ciências.

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Sendo assim, o autor propõe apenas tarefas de fixação para os métodos

apresentados, o que é compreensível uma vez que seu objetivo é desenvolver apenas

ferramentas matemáticas para o trabalho na própria Matemática e nas outras ciências.

4.25 Considerações Finais

Ao iniciar a obra Matemática e Realidade, Iezzi et al (2005) introduzem os

conjuntos numéricos por meio de seus ostensivos de representação e o discurso

tecnológico por eles utilizado permite observar que a noção de equação do primeiro

grau é considerada como conhecimento já construído.

Além disso, fica evidente a preocupação dos autores em articular os quadros

numéricos, geométrico e algébrico ainda que as noções sejam introduzidas por meio

dos ostensivos que as representam, o que exige que os autores apresentem um

discurso tecnológico que justifique as passagens de uma representação para a outra,

assim como a aplicação dos conhecimentos prévios necessários para o

desenvolvimento das tarefas.

Nessa obra é evidente a importância da noção de equações do primeiro grau que

funcionam como uma ferramenta explícita de trabalho para a introdução de novas

noções, em particular, a noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas, que podem ser resolvidos por meio do ponto de vista de equações.

Para a noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas verificou-

se que os autores privilegiam as tarefas 6,1 e 5 sendo que a ênfase para o trabalho dos

estudantes é dada para as tarefas 6 e 1, para as quais é necessária uma articulação

com as noções matemáticas introduzidas na série ou anteriormente e que aqui são

consideradas disponíveis, ou seja, se espera que os estudantes às utilizem sem que

para isso seja necessário fazer nenhuma menção ou mesmo revisões.

Existe também uma valorização dos trabalhos dos estudantes sobre os métodos

de solução dos sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas; por exemplo, há

34 tarefas do tipo 4 destinadas aos estudantes e 1 destinada ao professor. Quanto às

tarefas do tipo 3 que são consideradas puramente algébricas e exigem que os

estudantes dominem as noções de equações e de sistemas de duas equações lineares

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e duas incógnitas servindo como situações de referência para aplicações futuras, são

deixadas a cargo dos estudantes, o que pode dificultar a possibilidade de aplicação

desse conhecimento em outros contextos, no futuro.

Ao contrário da obra de Iezzi et al (2005, 2000), que mesmo sendo da mesma

época e avaliada pelo Programa Nacional do Livro Didático, observa-se que o livro “A

Conquista da Matemática” de Castrucci et al (2002), embora coerente com a proposta

do autor, parece não considerar a necessidade da fixação das técnicas de solução de

sistemas lineares, pois apresenta um número reduzido de tarefas de fixação dessas

técnicas.

Além disso, a obra focaliza a resolução de sistemas de duas equações lineares e

duas incógnitas com uma única solução, dando ênfase ao seu caráter ferramenta para

a solução de problemas cotidianos e de outras ciências. Não favorece a discussão

sobre suas possibilidades de solução, isto é, não explora o caráter de objeto do

conhecimento matemático.

Quando se considera as obras de Scipione (1991, 1982, 1971) é possível

verificar que tanto o caráter ferramenta quanto o caráter objeto para a noção de

sistemas de duas equações lineares são considerados pelo autor. Na obra de 1971,

embora o autor dê ênfase ao nível técnico, é possível verificar que já se considera as

tarefas de aplicação em situações do cotidiano, da própria matemática e de outras

ciências. Esse trabalho fica mais evidente na obra de 1991, em que todas as tarefas

são levadas em conta de forma equilibrada, ou seja, tanto para o trabalho suposto do

professor como para o do aluno encontram-se tarefas dos diferentes tipos propostos no

capítulo 3..

É importante observar as diferenças, mesmo que sutis, nas três obras do mesmo

autor, o que permite verificar que existe uma adequação que respeita tanto as

propostas institucionais das diferentes épocas em que essas obras foram editadas,

como a necessidade de manter o rigor e a coerência com a teoria matemática que as

sustenta. Essa adequação é melhor compreendida por meio dos ostensivos utilizados

pelo autor e pelo discurso tecnológico que os acompanha e permite associar as

técnicas empregadas às teorias que as sustentam.

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Examinando a obra de Sangiorgi (1966) que corresponde à época do Movimento

da Matemática Moderna no Brasil e comparando com a obra de Scipione (1971) é

possível compreender a grande diferença entre essas duas épocas, pois enquanto em

1966 era proposta apenas a tarefa 4, que envolve a aplicação de um método de

resolução para um sistema de duas equações, em 1971 verifica-se que já se propunha

aos estudantes um trabalho de aplicação de sistemas de duas equações lineares e

duas incógnitas, o que supõe a articulação entre os níveis técnico, mobilizável e

disponível e que exige que os estudantes disponham de conhecimentos prévios

associados às noções em jogo nas tarefas que lhes são propostas, como é possível

identificar por meio dos exemplos apresentados no capítulo 3 para os diferentes tipos

de tarefas.

Na realidade, observa-se que entre 1959, que corresponde à obra de De Farias,

e 1966 que corresponde à obra de Sangiorgi, ambas analisadas neste trabalho, a maior

diferença está no caráter objeto da noção de sistemas de equações lineares utilizado

para sua definição e propriedades. Esse trabalho ficava apenas a cargo do professor e

o que se tinha como objetivo era apenas o domínio dos métodos de resolução de

sistemas de equações lineares e a escolha dos métodos adequados.

Pode-se dizer que para as diferentes obras analisadas existe uma preocupação

em desenvolver tanto o caráter ferramenta quanto o caráter objeto da noção de

sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, mas que esse trabalho não

depende apenas do professor exigindo um trabalho conjunto entre professor e

estudantes.

Pode-se também considerar que as escolhas estão associadas ao “topos” do

professor e do estudante, uma vez que variam em função do tipo e da quantidade de

tarefas que ficam a cargo de cada um deles.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS FUTURAS

Ao iniciar a pesquisa, foram consideradas as questões abaixo que serviram como

orientação para a escolha do referencial teórico e da metodologia adotada na pesquisa.

1) Como se aborda a noção de sistema de equações lineares nas diferentes

décadas?

2) De que instrumentos os professores dispõem para efetuar suas escolhas?

3) Quais são os ostensivos e não ostensivos em jogo nas diferentes abordagens,

conforme definição de Chevallard e Bosch (1999)?

4) Em que sistema de tarefas e práticas podem se desenvolver os ostensivos e não

ostensivos escolhidos?

5) Quais são as condições e empecilhos que favorecem ou prejudicam sua

utilização?

6) Quais são as escolhas institucionais para a sua utilização?

Sendo assim, verificou-se que a abordagem teórica de Chevallard e Bosch

(1999) escolhida para a análise da ecologia dos ostensivos e não ostensivos presentes

no ensino da noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas para a

sétima série do Ensino Fundamental II mostrou-se um instrumento muito eficaz para a

análise do saber e do conhecimento matemático esperado de professores e de

estudantes, nessa etapa da escolaridade. No entanto, foi necessário introduzir outras

teorias para auxiliar na compreensão das diferentes abordagens desse conteúdo nas

épocas consideradas e na análise dos instrumentos que os professores dispõem para

efetuar suas escolhas.

Dentre elas, a noção de “topos”, introduzida por Chevallard (1997), permitiu

identificar as possibilidades de escolhas do professor em função dos conhecimentos

prévios dos estudantes.

Dessa forma, no capitulo II é analisado o “topos” do estudante e do professor,

quando se introduz a noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas

na sétima série do Ensino Fundamental II, com base nos Parâmetros Curriculares

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Nacionais (1998) e na Proposta Curricular do Estado de São Paulo (1987). Para essa

análise é considerado o seguinte questionamento:

1) Como é proposta a abordagem da Matemática para os alunos do Ensino

Fundamental, 5ª a 8ª séries, nos documentos oficiais, isto é, Parâmetros Curriculares

Nacionais e Proposta Curricular do Estado de São Paulo?

2) Como é estruturado o ensino e como se organiza sua progressão quando se

propõe uma primeira abordagem da noção de sistemas de equações lineares para os

estudantes do Ensino Fundamental?

3) Como é proposta a introdução das noções associadas a esta abordagem?

4) Qual é o papel esperado para o desempenho do professor e do estudante, no

desenvolvimento desta abordagem?

5) Qual é o nível de conhecimento, conforme abordagem de Robert (1997),

esperado dos professores e dos alunos quando do desenvolvimento da noção de

sistema de equações lineares?

Verifica-se que, para a noção de sistemas de equações lineares no Ensino

Fundamental II, a abordagem proposta está associada à solução de situações-

problema cotidianas e para um tipo de sistema mais restrito, isto é, o sistema de duas

equações e duas incógnitas.

Essa abordagem considera importante o trabalho sobre os ostensivos e o nível

técnico para o desenvolvimento das tarefas propostas e está de acordo com as

orientações e sugestões propostas nos Parâmetros Curriculares Nacionais e na

Proposta Curricular do Estado de São Paulo.

Apesar dessa orientação ser considerada adequada, observa-se que falta uma

melhor explicitação do trabalho esperado, que poderia ser feita por meio da indicação

de trabalhos de pesquisa sobre a noção de sistemas de duas equações lineares e duas

incógnitas para o Ensino Fundamental, pois o número de exemplos dados parece

insuficiente para explorar as possibilidades de ostensivos no tratamento das diferentes

tarefas encontradas nesta etapa da escolaridade.

Pode-se dizer ainda que o nível de conhecimento esperado dos estudantes da

sétima série do Ensino Fundamental II, em relação à noção de sistemas de equações

lineares, é o disponível quando se considera a interpretação da tarefa e a passagem do

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ostensivo de representação escrita em língua natural para o ostensivo escrito numérico

ou algébrico e o nível técnico para a solução das equações encontradas, pois, se o

estudante é capaz de aplicar qualquer uma das técnicas desenvolvidas poderá

encontrar a solução da tarefa proposta.

Sendo o ensino da noção de sistemas de equações lineares considerado apenas

para o caso específico dos sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas na

sétima série do Ensino Fundamental II, verificou-se que existe um número reduzido de

tarefas que permitem a introdução dessa noção matemática, e as escolhas em função

dos quadros ou domínios que se desejam articular, dos pontos de vista que se desejam

levar em conta e do nível de conhecimento que lhes são associados.

Em função dessas tarefas e da grade de análise construída, foi possível

observar, por meio da análise dos livros didáticos escolhidos, que nas obras atuais

como Matemática e Realidade de Iezzi et al (2005), Iezzi et al (2000) e “A Conquista da

Matemática” de Castrucci et al (2002), que foram avaliadas como satisfatórias pelo

Progama Nacional do Livro Didático (PNLD), considera-se a noção de equação do 1º

grau, como conhecimento já construído quando se introduz a noção de sistemas de

duas equações lineares e duas incógnitas. Essa escolha pode justificar o fato de não se

utilizar o ponto de vista das tentativas na sétima série do Ensino Fundamental II.

É evidente, também, a preocupação dos autores das três obras em articular os

quadros numérico, geométrico e algébrico, mesmo quando as noções são introduzidas

por meio dos ostensivos que as representam, o que exige a utilização de um discurso

tecnológico para justificar as passagens de uma representação à outra, ou a aplicação

de conhecimentos prévios, no desenvolvimento das tarefas propostas.

Nessas obras é evidente a importância da noção de equações do primeiro grau,

que funciona como uma ferramenta explícita na resolução de sistemas de duas

equações lineares e duas incógnitas.

A maior diferença entre as obras de Iezzi et al (2205, 2000) e Castrucci et al

(2002) é que esta última, embora seja coerente com a proposta do autor, parece não

considerar a necessidade de fixação das técnicas de solução de sistemas lineares, pois

apresenta um número reduzido de tarefas com esse objetivo. Além disso, nesta obra

privilegia-se a resolução de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas com

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uma única solução dando ênfase ao seu caráter ferramenta para a solução de

problemas cotidianos e de outras ciências. Ou seja, esta obra não favorece a discussão

de sistemas lineares, em relação ao número de soluções, e assim, não enfatiza o

caráter objeto desse conteúdo.

Para as obras de Scipione (1991, 1982, 1971) é possível verificar que tanto o

caráter ferramenta quanto o caráter objeto da noção de sistemas de duas equações

lineares são considerados pelo autor. Na obra de 1971, embora o autor dê ênfase ao

nível técnico, é possível verificar que explora também as tarefas de aplicação em

situações da própria Matemática, de outras ciências e cotidianas.

É importante observar as diferenças, mesmo que sutis, nas três obras do mesmo

autor, o que permite verificar que existe uma adequação às propostas institucionais das

diferentes épocas em que essas obras foram editadas e a preocupação no sentido de

manter o rigor e a coerência em relação à teoria matemática que as sustenta. Essa

adequação é melhor compreendida por meio dos ostensivos utilizados pelos autores e

pelo discurso tecnológico que os acompanha, associando as técnicas às teorias

correspondentes.

Comparando a obra de Sangiorgi (1966) que corresponde à época do Movimento

da Matemática Moderna no Brasil com a obra de Scipione (1971), é possível

compreender a grande diferença entre essas duas épocas, pois enquanto em 1966 era

proposta apenas a tarefa 4, que envolve a aplicação de métodos de resolução de

sistemas de duas equações, em 1971 verifica-se que já se propunha aos estudantes a

aplicação da noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas na

resolução de problemas, o que supõe a articulação entre os níveis técnico, mobilizável

e disponível, e que exige que os estudantes disponham de conhecimentos prévios

associados às noções em jogo nas tarefas que lhes são propostas.

Na realidade, observa-se que entre 1959, que corresponde à obra de De Farias e

1966 que corresponde à obra de Sangiorgi, ambas analisadas neste trabalho de

pesquisa, a maior diferença está no caráter objeto da noção de sistemas de equações

lineares utilizado para sua definição e propriedades. Esse trabalho ficava apenas a

cargo do professor e o que se esperava dos alunos era apenas o domínio de métodos

de resolução de sistemas de equações lineares e a escolha dos sistemas adequados.

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Pode-se dizer que nas obras de Iezzi et al. (2005, 2000), Scipione (1991, 1982)

existe uma preocupação em desenvolver tanto o caráter ferramenta quanto o caráter

objeto da noção de sistemas de duas equações lineares e duas incógnitas, mas que

esse trabalho não depende apenas do professor, exigindo um trabalho conjunto entre

professor e estudantes.

Consideramos que as escolhas estão associadas ao “topos” do professor e do

estudante, uma vez que variam em função do tipo e da quantidade de tarefas que ficam

a cargo de cada um deles. Dessa forma, parece que nas obras atuais analisadas existe

a preocupação de se levar em conta os seis tipos de tarefas consideradas nesta

pesquisa.

Tendo em vista o fato de que pouca ênfase é dada ao estudo da noção de

sistemas de equações lineares, nas diferentes etapas da escolaridade, embora seja

conhecimento fundamental para a articulação de diferentes domínios da própria

Matemática, de outras ciências e também para a modelagem de situações do cotidiano,

consideramos que este estudo poderia servir como ponto de partida para o

desenvolvimento de outras pesquisas que proponham seqüências didáticas a fim de

favorecer a construção desse conhecimento.

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