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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” ARTETERAPIA COMO UM CAMINHO PARA INCLUSÃO PSICOSSOCIAL DE PESSOAS COM TRANSTORNO MENTAL. POR DENISE COELHO ARÊAS ORIENTADORA SIMONE FERREIRA Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

ARTETERAPIA COMO UM CAMINHO PARA INCLUSÃO PSICOSSOCIAL DE PESSOAS COM TRANSTORNO

MENTAL.

POR DENISE COELHO ARÊAS

ORIENTADORA

SIMONE FERREIRA

Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

ARTETERAPIA COMO UM CAMINHO PARA INCLUSÃO PSICOSSOCIAL DE PESSOAS COM TRANSTORNO

MENTAL.

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista em Arteterapia em Educação e Saúde. Por: Denise Coelho Arêas

Rio de Janeiro

2011

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AGRADECIMENTOS

Agradeço em especial a minha família pelo incentivo e apoio inestimável durante toda minha especialização.

Aos usuários do Caps II, Três Rios que foram instrumentos para meu aprendizado.

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À Deus por toda sabedoria nessa caminhada acadêmica.

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“A arte é uma mentira que nos permite atingir a verdade” (PABLO PICASSO, 2004, p.123)

“A Arte é a mais alta expressão de uma aritmética interior e inconsciente.” (LEIBNIZ apud MALPIQUE, 1941, p.68)

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RESUMO

Esta monografia tem o intuito de investigar a Arteterapia e o processo

arteterapêutico como forma de amenizar o sofrimento dos indivíduos

portadores de transtorno mental, de maneira especial a Esquizofrenia, tendo

como objetivo propiciar a inclusão psicossocial dessas pessoas, para que elas

possam participar de atividades cotidianas de forma mais ativa e criativa,

exercendo inclusive seus direitos de cidadãos. Para alcançar esse objetivo

serão abordadas algumas questões como: a Reforma Psiquiátrica Brasileira,

uma contextualização do atual panorama da Saúde Mental no Brasil, as

definições básicas de Transtorno Mental e Esquizofrenia; como a Arteterapia

pode atuar nesse processo de ressociabilização e como ele pode beneficiar a

inclusão social de pacientes psiquiátricos.

Palavras-chave: Arteterapia – Psicossocial – Transtorno Mental – Saúde Mental.

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METODOLOGIA

A metodologia aplicada neste trabalho será exploratória e bibliográfica

tendo como embasamento teórico alguns autores que vêm estudando sobre

esse assunto como Carl Jung que na década de 20 começa a usar a arte como

parte do tratamento de seus pacientes, para ele a criatividade é uma função

psíquica, daí a arte não ser apenas fruto de sublimação de instituições sexuais

e agressivas. Ela tem a finalidade de materializar em imagens os conteúdos

mais internos e profundos.

Nise da Silveira, médica psiquiatra que dedicou sua vida à psiquiatria e

manifestou-se sempre radicalmente contra as formas agressivas de tratamento,

como os eletros choques e insulinoterapia. Foi pioneira no uso da arte como

processo terapêutico, utilizando a livre expressão artística dos pacientes como

ferramenta na recuperação da saúde mental.

Margaret Naumburg que em 1930 começou a desenvolver Arteterapia

em programas para pacientes psiquiátricos. Naumburg acredita que a arte deu

emocionalmente às pessoas doentes a oportunidade de expressar-se,

liberando conteúdos inconscientes, o que por sua vez, daria aos terapeutas

uma idéia melhor de como ajudá-los.

Ana Cláudia Afonso Valladares que é Arteterapeuta e desenvolve

trabalhos atualmente nessa área, para ela os trastornos mentais de desordem

de origem psíquicas, geram muitas vezes desvitalização e para amenizar esses

fatores a arteterapia pode estimular o paciente a trabalhar com materiais

lúdicos com a finalidade de transformá-los criativamente, em objetos que darão

nova forma e sentido á vida .

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I – SAÚDE MENTAL. 12

CAPÍTULO II - CONHECENDO A ARTETERAPIA 24

CAPÍTULO III – A ARTETERAPIA NA SAÚDE MENTAL 30

CAPÍTULO IV - VAN GOGH 38

CONCLUSÃO 42

BIBLIOGRAFIA 43

ÍNDICE 49

ANEXO 50

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INTRODUÇÂO

O tema abordado nesta pesquisa consiste em refletir sobre o

processo arteterapêutico na Saúde Mental, mostrando a possibilidade que este

trabalho pode proporcionar para o individuo com transtorno mental, ajudando

na inclusão psicossocial.

Pretende questionar se a Arteterapia pode ajudar as pessoas com

transtorno mental. Até que ponto a Arte é um meio de expressão? De que

maneira ela deve ser utilizada para que os pacientes se beneficiem destas

atividades? Mas afinal o que é Arteterapia? Como se dá esse processo?

A questão central deste trabalho é estudar como os pacientes

psiquiátricos nos centros de atenção psicossocial (CAPS) se beneficiam com a

Arteterapia, pois ao se expressarem por meio da arte, o usuário libera

despotencializa e desloca para a consciência conteúdos psíquicos internos

presos, o que permite que sua energia volte a fluir. O símbolo trazido pela

produção de arte libera a energia psíquica inconsciente do usuário, facilita sua

trajetória natural, cria um efeito transformador no organismo em busca do

processo de cura e se esforça para dar equilíbrio e totalidade ao organismo de

seu produtor.

O tema sugerido é de total relevância, pois a Saúde Mental sempre

foi uma questão de suma importância a ser discutida na sociedade, após a

Reforma Psiquiátrica um novo olhar foi direcionado para essas pessoas que

sofrem de transtornos mentais, mudando totalmente a realidade de vida destes.

A arte foi um caminho encontrado para que esses pacientes pudessem

expressar seus sentimentos, suas angústias, ajudando na reorganização

mental.

A Arteterapia que é um processo terapêutico predominantemente

não-verbal quando aplicada à psiquiatria, possibilita por meio das artes, acolher

o ser humano com toda sua complexidade, objetivando a reinserção e inclusão

social do doente mental que por muitos anos foram totalmente excluídos na

nossa sociedade.

Portanto a Arteterapia se torna um veiculo transformador no

tratamento de pessoas com algum tipo de transtorno mental. A arte passa a ser

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um “veículo” capaz de transportar, de dentro para fora, diversas situações,

sentimentos, sonhos, necessidades e anseios que as pessoas, geralmente,

não conseguem expressar verbalmente. Através da arte, as pessoas em

tratamento reconhecem um novo valor em si mesmas, conseguem planejar e

reorganizar sua realidade, porém esse processo foge do padrão estético,

porque traz à tona o inconsciente do indivíduo, que nem sempre é povoado por

belas imagens,elas se expressam sem se importar com o valor estético.

No decorrer do trabalho alguns pontos serão aprofundados, no

primeiro capitulo Saúde Mental, será apresentado um breve histórico sobre a

Reforma Psiquiátrica e que influências isto teve para o tratamento atual dos

pacientes psiquiátricos, a implantação dos Centros de Atenção Psicossocial

(CAPS) na sociedade brasileira ,assim como uma definição de transtorno

psiquiátrico , em especial a esquizofrenia, seus sintomas e tratamento.

No segundo capitulo, Conhecendo a Arteterapia, será apresentado

o conceito de Arteterapia, seus preceitos teóricos, os materiais utilizados, a

formação do arteterapeuta, os benefícios que traz para os pacientes entre

outros aspectos.

Já no terceiro capítulo Arteterapia na Saúde Mental, o enfoque

será como a arte foi inserida no contexto psiquiátrico, a contribuição de alguns

estudiosos como Jung e Nise da Silveira nesse processo. Mostrar como a

Saúde Mental vem ampliando seus conhecimentos e utilizando-se de novas

práticas na assistência a seus usuários como o investimento no trabalho e em

práticas alternativas e criativas, também analisar o processo arteterapêutico

refletindo sobre como os pacientes com transtorno mental principalmente os

portadores de esquizofrenia, que tem uma desestrutura psíquica e pouco

vinculo com o mundo externo podem ser beneficiados com o tratamento da

Arteterapia, ajudando no processo de inclusão psicossocial.

E por fim no último capítulo, Van Gogh; será apresentado um pouco

da vida desse artista que sofreu de transtornos mentais, como esses

momentos foram revelados em suas obras, e como a arte serviu como

instrumento de expressão de seus sentimentos, angústias.

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No entanto o que este trabalho pretende é mostrar que as sessões

de Arteterapia facilitam a expressão da subjetividade dos participantes das

oficinas e auxiliam, sobremaneira, tanto na auto-expressão, como na

elaboração de conteúdos internos, alívio de tensões e na inclusão dessas

pessoas na sociedade.

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CAPÍTULO I

SAÚDE MENTAL

1.1 Um Breve Histórico da Reforma Psiquiátrica

Para entender o que está acontecendo no território de Saúde Mental

no Brasil é preciso conhecer um pouco dessa história. Por isso inicia-se esse

primeiro capítulo com um breve histórico de como ocorreu à Reforma

Psiquiátrica brasileira e quais as influências sofridas do decorrer desse

processo.

Na passagem das décadas de 60 para 80 em diversos países inicia-

se um questionamento sobre a atuação da psiquiatria á respeito do transtorno

psiquiátrico, o pensamento começa a deslocar-se da doença mental para a

Saúde Mental.

Neste período inicia-se na Itália, liderado por Franco Basaglia, o movimento da Reforma Psiquiátrica Democrática que elevou a abordagem da doença mental como sendo um fenômeno complexo que envolve aspectos biológicos, sociais e psíquicos do individuo. Concentrava-se a principal atividade no campo social mais complexo aliando-se a partidos e sindicatos de esquerda, visando o fechamento dos hospitais psiquiátricos através da obtenção da lei 180. O movimento de Trieste e dos modelos abertos de atenção comunitária tornaram-se inspiradores mundiais para as reformas na área, mas também geraram segundo alguns autores, como Guattari, uma ausência de alternativas adequadas a “egressos de grandes hospitais”,assim como aconteceu nos EUA na década de 1960,onde com o” Kennedy Act” uma serie de hospitais foram fechados por razões puramente econômicas, deixando um exército de pacientes desassistidos pelas ruas. (STOCKINGER, 2007, p.57)

Nesse contexto mundial, a partir da década de 80, surge no Brasil

O movimento que propunha a extinção dos hospitais psiquiátricos ganhou contornos específicos em 1987, com a criação do Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA). O MNLA foi resultado da organização dos trabalhadores de Saúde Mental, que propunham reformulação do modelo assistencial e a reorganização dos serviços da área,

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privilegiando as equipes multiprofissionais, o atendimento fora do hospital e, principalmente, um outro lugar ao que nos parece estranho, para que esse não fosse mais higienizado e afastado dos olhos da sociedade. (CRP-RJ, 2010, p.3)

A idéia central era reduzir a indústria da loucura, onde pacientes

eram internados e ficavam por longos períodos asilados, afastados do convívio

social e familiar, sem real justificativa técnica e médica para verdadeira

permanência desses pacientes nos hospitais. Esse pensamento foi tomando

força e começou-se uma luta para mudança no tratamento de pessoas com

transtorno psíquico. Dava inicio o que hoje chama-se de Reforma Psiquiátrica .

A Reforma Psiquiátrica significa esse processo contínuo de reflexões

e transformações no trabalho com a loucura, onde se pretende modificar o

sistema de tratamento clínico da doença mental, eliminando gradualmente a

internação como forma de exclusão social. Este modelo seria substituído por

uma rede de serviços territoriais de atenção psicossocial, visando a integração

da pessoa que sofre de transtornos mentais à comunidade.

Todo esse processo foi fundamental para transformar a relação da

sociedade com o doente.Inspirados no modelo Italiano, de Trieste ,como já foi

mencionado,o Brasil foi fortalecendo suas reflexões sobre a Saúde Mental,

criando portarias federais específicas ,conseguindo investimentos,até

conseguir a regulamentação da lei federal 10.216 .

É somente no ano de 2001, após 12 anos de tramitação no Congresso Nacional, que a Lei Paulo Delgado é sancionada no país. A aprovação, no entanto, é de um substitutivo do Projeto de Lei original, que traz modificações importantes no texto normativo. Assim, a Lei Federal 10.216 redireciona a assistência em saúde mental, privilegiando o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais, mas não institui mecanismos claros para a progressiva extinção dos manicômios. Ainda assim, a promulgação da lei 10.216 impõe novo impulso e novo ritmo para o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil. É no contexto da promulgação da lei 10.216 e da realização da III Conferência Nacional de Saúde Mental, que a política de saúde mental do governo federal, alinhada com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se, ganhando maior sustentação e visibilidade. (BRASIL, 2005 p.8)

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A Reforma Psiquiátrica questiona, portanto, o paradigma asilar e

suas formas de exclusão, propondo novos modos de atenção aos chamados

loucos e principalmente, novos sociabilidades que possibilitem a interlocução

entre as singularidades. O objetivo é que as pessoas que sofrem algum

transtorno mental não sejam vistas como doentes, ou a partir do seu

diagnóstico, mas como pessoas que tem sentimentos, que choram , se

alegram,amam ,tem desejos ,que estudam,trabalham, ou seja, que vivem.É

necessário que a sociedade se prepare para conviver com o diferente,porém

isso ainda é muito difícil,o que acaba gerando muito preconceito,muitas vezes

não através da fala,mas de atitudes, com o jeito de olhar, de se afastar ,de

excluir essas pessoas do convívio social.

É preciso ouvir o sofrimento do outro, procurando criar

possibilidades ao sofredor mental partindo de seu potencial, do seu talento, do

que realmente faz sentido para ele, retirando o estigma de inutilidade dos

loucos, ajudando-o a interagir socialmente, avançando a assistência ao

sofredor mental e sua família.

A Reforma Psiquiátrica, dessa forma, não se restringe à desospitalização, abrangendo a garantia ao trabalho, o acesso à cultura, a efetivação da cidadania e a vida para além do estigma da doença. Tudo isso passa por um novo saber sobre a loucura, que deve ser pensado coletivamente para, assim, chegarmos a uma sociedade que seja realmente sem manicômios. (CRP-RJ, 2001, p.7)

1.2 CAPS- Centro de Atenção Psicossocial

Como foi visto anteriormente a partir da lei 10.216 do deputado

Paulo Delgado o modelo de assistência a Saúde Mental no país começa a ser

reestruturada.

De 1991 a 2005, mais de 40.000 leitos foram descredenciados. Os 253 Caps de 2.000 já chegaram a 1.000 em dezembro de 2006, assim como as residências terapêuticas cresceram de 50 em 2000 para 393 em 2005. Em 2005 detivemos um gasto de 63,86% para custeio de hospitais e de 36,16% das verbas orçamentárias federais para serviços substitutivos,

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demonstrando a velocidade das mudanças numa perspectiva de baixa de 2.000 leitos/ano. (STOCKINGER, 2007, p.66)

Na tentativa de criar formas de superação dos manicômios, serviços

substitutos foram criados para atender a rede de Saúde Mental de cada

município, oferecendo ao paciente um novo modelo de tratamento.

Este processo, com ritmo pactuado entre os gestores do município e do estado, hospitais e controle social, deve incluir o aumento progressivo dos equipamentos e das ações para a desinstitucionalização, tais como CAPS, Residências Terapêuticas, Centros de Convivência e a habilitação do município no Programa de Volta para Casa. (BRASIL, 2005. p.19)

Portanto este trabalho pretende estudar a forma de tratamento

proposto nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), onde é realizado o

atendimento á população com algum tipo de sofrimento mental com o objetivo

de fazer além do atendimento clinico, os usuários desse serviço devem ter

acesso aos diversos seguimentos sociais que o município disponibiliza para

sua população, como cultura, lazer, trabalho. Esse serviço pretende realizar a

reinserção social e o fortalecimento dos vínculos familiares, tão desprezados

no antigo modelo de tratamento que era feito através das longas internações.

Para entender melhor essa nova proposta da Reforma Psiquiátrica;

com a criação do CAPS, o Ministério da Saúde orienta que é função do CAPS:

Prestar atendimento clínico em regime de atenção diária, evitando assim as internações em hospitais psiquiátricos; promover a inserção social das pessoas com transtornos mentais através de ações intersetoriais; regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação e dar suporte à atenção à saúde mental na rede básica. É função, portanto, e por excelência, dos CAPS organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios. (BRASIL, 2005. p.27)

De acordo com o número populacional de cada município ,os CAPS

são classificados em I,II, III.O que diferencia é somente o horário de

atendimento e o número de funcionários ,pois o acolhimento e os cuidados

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sempre com uma equipe multidiciplinar é mantido e essencial para o sucesso

do tratamento.Também existem duas variações que são o CAPSad destinado

para pessoas com alguma dependencia de alcool e ou outras drogas e o

CAPSi que atendem crianças e adolescentes com transtono psiquicos.

O trabalho dos CAPS tem como ponto principal a individualidade do

paciente.É importante considerar o cuidado intra, inter, e transubjetivo,

articulando recursos de natureza clínica , incluindo medicamentos , de moradia,

de trabalho, de lazer, de previdência e outros, através do cuidado clínico

oportuno e programas de reabilitação psicossocial. Deve incluir ações dirigidas

aos familiares e comprometer-se com a construção dos projetos de inserção

social. Ainda trabalhar com a idéia de gerenciamento de casos, personalizando

o projeto de cada paciente na unidade e fora dela, e desenvolver atividades

para a permanência diária no serviço.

Os usuários que usufruem deste serviço deverão receber consultas

médicas, atendimentos terapêuticos individuais e/ou grupais, podendo

participar de ateliês abertos, de atividades lúdicas e recreativas promovidas

pelos profissionais do serviço, de maneira mais ou menos intensiva e articulada

em torno de um projeto terapêutico individualizado, voltado para o tratamento e

reabilitação psicossocial.

Os locais terapêuticos de atendimento em Saúde Mental constituem

um importante aspecto a ser considerado nos projetos de reabilitação da

Reforma Psiquiátrica, tornando-os protagonistas e responsáveis pelo processo

de tratamento do doente mental.

1.3 A Esquizofrenia

Pode-se dizer que a loucura é fascinante, não faltam literaturas,

filmes, obras de artes com esse tema, mas na realidade ela é bastante

assustadora e talvez por isso tantos estudiosos, pesquisadores e especialistas

tem a preocupação em estudar as manifestações, sintomas e tratamentos dos

transtornos mentais. O objetivo aqui será definir o transtorno psiquiátrico, em

especial a esquizofrenia, seus sintomas e tratamento.

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O sofrimento psíquico quase sempre se mantém durante anos, não

só para o paciente, mas também para a família.

As síndromes psicóticas caracterizam-se por mudanças no comportamento, identificadas por agitação psicomotora, presenças de delírios, alucinações, discurso incompreensível, incontinência social, prejuízo sócio-ocupacional e ausência de critica na presença de lucidez de consciência. Elas podem ser agudas ou crônicas. As síndromes psicóticas que estão não estão relacionadas a um fator causal bem estabelecido constituem os transtornos psiquiátricos propriamente ditos. Dentre as psicoses, destaca-se o transtorno da esquizofrenia. Em geral, o seu aparecimento é mais insidioso e sua resposta ao tratamento é variável, sendo que 70% dos pacientes precisam de acompanhamento medico continuo. (SCHOR, 2002, p.159)

A esquizofrenia é uma doença crônica que se caracteriza

principalmente por distúrbios do pensamento, com idéias de perseguição e

perda das conexões lógicas, que também se manifestam na linguagem. É um

transtorno grave, pois altera todas as relações do sujeito consigo mesmo e com

o universo que o cerca. É como se os elementos do inconsciente dominassem

o sujeito e se tornassem verdades absolutas, o que o torna incapaz de

distinguir entre fantasia e realidade. Devido a isso o paciente portador de

esquizofrenia tem graves prejuízos na sua vida social, no seu cotidiano.

È uma doença mental complexa e especialmente incapacitante, uma vez que geralmente interfere na capacidade de trabalhar, de se relacionar com os outros e cuidar de si mesmo. De uma maneira geral, os sintomas da esquizofrenia se manifestam durante a adolescência ou no inicio da idade adulta, mas podem também surgir mais tarde. Tais sintomas podem incluir delírios (crenças falsas, ás vezes de natureza paranóide: o individuo se imagina perseguido ou em perigo), alucinações (o individuo ouve vozes que não são reais), distúrbios de fala (discurso desorganizado ou incoerente), retraimento em relação ao mundo exterior, sentimentos inadequados á situação ,atividade psicomotora anormal (o individuo fica se balançando,dando passos sem sair do lugar ou permanece imóvel, catatônico). Embora algumas pessoas que apresentam um episodio esquizofrênico se recuperem completamente, a esquizofrenia é uma doença crônica (prolongada)ou recidivante(que se repete)na maioria dos casos. (LIMGRUBER, 1997, p.39)

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Conforme Melo (1979) na maioria das vezes o processo

esquizofrênico se instala autonomamente sem cooperação de fatores externos,

mas em alguns casos observa-se que os primeiros sintomas aparecem a partir

de um acontecimento, sendo um fator desencadeante de um processo até

então lactente. Independente de um fator externo ser desencadeador dos

sintomas, o que nota-se é a tendência dos familiares do paciente em buscar

explicações para o advento casual da doença.

A ciência ainda não descobriu todas as explicações para essa

doença, mas sabe-se que um maior número de recaídas compromete muito a

evolução e as possibilidades de recuperação em longo prazo. Portanto, a

prevenção de recaídas, através de um tratamento regular e abrangente que

contemple as esferas bio-psico-sociais do indivíduo e de sua família, é

fundamental.

Os métodos de tratamento e medicamentos, hoje muito mais refinados, modificaram alguma coisa nesse prognóstico. Segundo estatísticas, aproximadamente a metade das pessoas afetadas pela patologia apresenta melhora após vários anos de tratamento, desde que, além de tomar a medicação adequada, participe ativamente do próprio tratamento, tenham acompanhamento psicológico e sejam acolhidas em grupos que incentivem a desenvolver atividades lúdicas, sociais e ate profissionais. Em condições bem próximas das idéias, um quarto desses pacientes é capaz de ate mesmo levar uma vida que pode ser considerada normal. (PAULUS, 2010, p.41)

Atualmente as possibilidades de recuperação são enormes. Os

recursos que dispomos para tratamento são muito superiores aos existentes há

vinte ou trinta anos atrás. A esquizofrenia precisa perder o estigma de doença

degenerativa, em que a pessoa vai perdendo aos poucos sua vitalidade. A

ciência já mostrou que não ocorre degeneração. Pelo contrário, é possível

recuperar muitas funções adoecidas pela doença. Ainda que não exista uma

cura, é possível tratá-la a ponto de estabilizar e preparar a pessoa para uma

vida ativa e plena. Tudo depende da esperança e da energia que conseguimos

reunir em torno do paciente para ajudá-lo a encarar este desafio.

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1.3.1 Sintomas

De acordo com Dr. Leonardo Figueiredo Palmeira, editor do portal

entendendo a esquizofrenia, os sintomas da esquizofrenia não são os mesmos

de indivíduo para indivíduo, podendo aparecer de forma insidiosa e gradual ou,

pelo contrário, manifestar-se de forma explosiva e instantânea.

Como foi visto anteriormente a esquizofrenia manifesta-se

habitualmente a partir dos 15 anos , no periodo da adolescência e por se tratar

de um período de grande ebulição emocional e de constantes mudanças de

comportamento, observar sinais de que o adolescente pode vir a desenvolver a

Esquizofrenia é difícil e delicado, pois se corre o risco de confundir

os comportamentos rebeldes naturais da fase com uma doença mental; tanto

amenizando ou ignorando a doença, como exagerando a instabilidade habitual

da adolescência.

O critério de diagnóstico para a esquizofrenia depende de vários

fatores,a história clinica,os prejuizos sociais,a utilização ou não de alcool ou

drogas e pelo menos dois ou mais sintomas que estejam classificado de acordo

com a Classificação Internacional de Doenças (CID 10) .

O CID 10 apresenta uma série de grupos de sintomas considerados

importantes para o diagnóstico de esquizofrenia,são eles :

-eco de pensamento,inserção ou roubo do pensamento,irradiaçao do pensamento. -delirios de controle,influencia ou passividade claramente referindo-se ao corpo ou movimentos dos membros,ou pensametos especificos ,ações ou senseções,percepções delirantes. -vozes alucinatórias ,comentando o comportamento do paciente ou discutindo entre elas sobre o paciente ou outros tipos de vozes alucinatórias vindo de outras partes do corpo. -delírios persistentes de outros tipos que são culturalmente inapropriados e completamente impossivéis,tais como identidade politica ou religiosaou poderes e capacidades sobre humanas ( por exemplo: ser capaz de controlar o tempo,ou se de comunicar com alienigenas de outro planeta)

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-alucinações persistentes de qualquer modalidde,quando acompanhadas por delirios”superficiais” ou parciais,sem claro conteúdo afetivo,ou idéias sobrevalorizadas persistentes ou quando ocorrem todos os dias durante semanas ou continuamente. -intercepções ou interpolações no curso do pensamento resultante em discurso incoerente ,irrelevante ou neologismo. -comportamento catatônico ,tal como ecitação,postura inadequada ou flexibilidade cérea,negativismo,mutismo ou estupor. -sintomas “negativos” ,tais como apatia marcante,pobreza do discurso e embotamento ou incongruêcia das respostas emocionais,usualmente resultante em retraimento social ediminuição do desempenho social,deve ficar claro que esses sintomas não são decorrentes de depressão ou medicação neuroléptica. -uma alteração significativa e consistente na qualidade global de alguns aspectos do comportamento pessoal,manifestada por perda de interesse,falta de objetivos,inatividade,uma atitude ensimesmada e retraimento social . (LIMGRUBER, 1997, p.48-49)

Alguns desses sintomas citados estão presentes com maior

visibilidade na fase aguda da doença ,como os delírios, pensamentos e

percepções irreais e as alucinações.Sendo caracterizados pelos surtos

psicóticos .

Entende-se por surto psicótico um estado mental agudo caracterizado por grave desorganização psíquica e fenômenos delirantes e/ou alucinatórios, com perda do juízo crítico da realidade. O delírio não é uma criação intencional da pessoa ou motivada por fatores psicológicos ou de relacionamento. Na esquizofrenia, o delírio surge espontaneamente e invade e domina a consciência da pessoa, tirando dela a capacidade de lutar e vencer sozinha suas próprias idéias. O delírio traz consigo uma sensação de sofrimento e fragmentação da própria personalidade, como se a pessoa perdesse o chão, suas referências básicas, o controle de sua própria vida. Assim como no delírio, o paciente não tem nenhum controle sobre as alucinações. Elas têm igual capacidade de dominar a consciência e influenciar o comportamento. A percepção de uma alucinação é igual a que ocorre para um objeto real, não sendo possível, para o paciente, distingui-la da realidade. (http://www.entendendoaesquizofrenia.com.br/conteudo.php?get_id=190)

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Porém outros sintomas são observados no cotidiano de uma pessoa

que sofre desse transtorno mental são os sintomas que acompanham a

evolução da doença e refletem um estado deficitário ao nível da motivação, das

emoções, do discurso, do pensamento e das relações interpessoais, como a

falta de iniciativa; isolamento social; apatia; indiferença emocional; pobreza do

pensamento.

Pode-se observar que alguns pacientes têm dificuldade em

expressar e demonstrar seus afetos claramente e isso leva, em geral, a uma

dificuldade de interação e comunicação social. Isto não significa que não

tenham sentimentos, que não sejam capazes de reagir emocionalmente ao

ambiente e às pessoas. O que está comprometido é a forma de demonstrar

seus afetos, mas não a capacidade de sentir emoções.

Na esquizofrenia, o funcionamento social pode estar prejudicado

pelo conjunto de sintomas que já foram abordados. É indiscutível que, no

período de surto, o funcionamento da pessoa fique muito comprometido, pois

os sintomas da crise psicótica afetam o equilíbrio e a sensatez da pessoa,

alteram seu comportamento e a capacidade de administrar seus sentimentos e

relacionamentos, gerando conflitos.

Passada a crise, à medida que a pessoa vai se reestruturando, ela

passa a ter mais condições de avaliar e mudar seu comportamento. Entretanto,

na esquizofrenia, alguns pacientes permanecem com dificuldades sociais

mesmo após a fase aguda.

É preciso uma adequação da vida social e laborativa ao real

potencial de cada paciente para sua estabilidade em longo prazo, muitos

conseguem retornar ao trabalho ou à escola após sua recuperação, porém

outros participam de atividades menos exigentes e estressantes.

1.3.2 Tratamento

Embora ainda não se fale em cura para a Esquizofrenia, esta é uma

doença tratável e controlável. O tratamento da Esquizofrenia se faz através de

tratamento com profissionais de psicologia, que pode ser individual ou em

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grupo, e também com remédio para controlar os surtos, e se necessário

internações.

Os medicamentos utilizados são os antipsicóticos ou neurolépticos.

Existem duas classes principais: os antipsicóticos, típicos ou de primeira geração e os atípicos ou de segunda geração. Os antipsicóticos de primeira geração são medicações que bloqueiam preferencialmente os receptores D2 da dopamina nos sistemas dopaminérgicos mesolimbico, mesocortical, nigroestrital e tubero-infundibular. São eficazes para tratar alucinações, delírios, a desagregação de pensamento e agitação psicomotora, e produzem efeitos colaterais ,como sintomas parkinsoniano s e aumento da prolactina .Essas medicações constituem ,hoje ,a segunda escolha para os quadros psicóticos porque apresentam muitos efeitos colaterais ,embora sejam mais baratas e estejam mais disponíveis . Os antipsicóticos atípicos são os neulépticos de segunda geração que atuam em outros sítios da dopamina e que produzem menos efeitos colaterais parkinsonianos. São medicamentos mais bem toleráveis, mais eficazes para sintomas negativos do primeiro episodio psicótico. (SCHOR,2002,p.160-161)

Ainda de acordo com Schor (2002), esses medicamentos estão

ligadas ao Sistema límbico do cérebro, e o seu sucesso constitui uma forte

evidência da importância das alterações bioquímicas na patogenia da doença

conhecida como hipótese dopamínica, o exemplo mais usual de antipsicótico

típico é o haloperidol e a clorpromazina

Além dos recursos mencionados acima, outra forma de melhorar a

qualidade de vida do indivíduo esquizofrênico seria possibilitar a sua

reabilitação psicossocial, ou seja, a retomada das suas atividades cotidianas e

a sua re-inserção na sociedade. Como já foi mencionado o CAPS exerce

grande função fundamental no tratamento da esquizofrenia por proporcionar ao

individuo a reabilitação psicossocial, sempre com o objetivo de melhorar esses

sintomas e resgatar a autonomia, a individualidade e a capacidade de

socialização. O projeto terapêutico deverá ser construído junto com o usuário e

seus familiares, respeitando o potencial e as limitações do usuário. O usuário

poderá falar de suas angústias e dificuldades, melhorando sua auto-estima,

ajudando a compreender sobre sua doença e como monitorar seus próprios

sintomas.

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Esse tipo de tratamento vem contribuindo para a diminuição das

internações psiquiátricas, pois o próprio paciente começa a conhecer os

sintomas e isso ajuda a identificar precocemente sintomas agudos, sem a

necessidade de internação.

Essa abordagem mais nova ajuda muito na reabilitação desses

pacientes, pois utiliza jogos e tarefas que estimulam funções cognitivas, como

memória, atenção, assim como expressões artísticas em toda sua abrangência,

tendo a arte como veiculo facilitador para conectar o mundo interno e o

externo. As oficinas de arteterapia desempenham um papel importante no

tratamento do paciente com esquizofrenia. Essa reflexão será feita nos

próximos capítulos.

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CAPÍTULO II

CONHECENDO A ARTETERAPIA

2.1 Definição

Neste capítulo será feito uma breve apresentação do que é

Arteterapia com o objetivo de mostrar os benefícios da experiência

arteterapêtica.

Mas qual a definição de Arteterapia?

A Arteterapia baseia-se na crença de que o processo criativo envolvido na atividade artística e terapêutica é enriquecedor da qualidade de vida das pessoas. Arteterapia é o uso terapêutico da atividade artística no contexto de uma relação profissional por pessoas que experienciam doenças, traumas ou dificuldades na vida assim como por pessoas que buscam desenvolvimento pessoal. Por meio do criar em arte e do refletir sobre os processos e trabalhos artísticos resultantes, pessoas podem ampliar o conhecimento de si e dos outros, aumentar sua auto estima, lidar melhor com sintomas,estresse e experiências traumáticas,desenvolver recursos físicos,cognitivos e emocionais e desfrutar do prazer vitalizador do fazer artístico. (PHILIPPINI, 2008, p.13)

Expressar-se simbolicamente, através das mais diversas formas

criativas, como a pintura, a dança, o canto e vários outros meios artísticos,

fazem parte da humanidade desde inicio da humanidade. O homem sempre

buscou se comunicar, se compreender e se relacionar através da arte, e esse

fazer artístico carrega em si muitas mensagens subjacentes, capaz de causar

emoção tanto em quem produz com em quem vê.

O fazer criativo sempre está carregado da subjetividade de quem

executa possibilitando uma relação terapêutica quando observado com

cuidado.

De acordo com Coutinho (2007) o fazer criativo geralmente é uma

atividade que provoca prazer, não apenas pelo contato com os materiais, mas

como possibilidade de materializar as imagens que trazemos na mente.

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A arte sendo uma atividade tão complexa em termos de mobilização

de afetos, em vários momentos da história da humanidade, foi percebida como

caminho para fins terapêuticos, pois é fato conhecido da maioria das pessoas

que algumas dramatizações, músicas, pinturas ou esculturas podem atingir

níveis afetivos profundos e provocar que venham à tona emoções guardadas,

tornando-as conscientes, conhecidas, para que possa dialogar com elas,

compreendendo aspectos de nós mesmos antes ocultos, mascarados.

A arte é um “veículo” capaz de transportar, de dentro para fora,

diversas situações, sentimentos, sonhos, necessidades e anseios que as

pessoas, geralmente, não conseguem expressar verbalmente. Através da arte,

as pessoas em tratamento reconhecem um novo valor em si mesmas,

conseguem planejar e reorganizar sua realidade. Esse processo foge do

padrão estético, porque traz à tona o inconsciente do indivíduo, que nem

sempre é povoado por belas imagens. Elas se expressam sem se importar com

o valor estético. Como resultado, temos a arte pura, simbólica, capaz de

despertar grandes talentos.

Cabe salientar que a Arteterapia usa a arte como meio de expressão

pessoal para comunicar sentimentos, em vez de ter como objetivo produtos

finais esteticamente agradáveis a serem julgados segundo padrões externos.

Essa abordagem é chamada de Arteterapia principalmente por que

se desenvolveu mais no campo da Saúde Mental e, sobretudo, em hospitais

para doentes mentais.

A Arteterapia trabalha a Saúde Mental e ressalta-se aqui a saúde

mental do dia-a-dia, de estresses, de psico-somatização, de desequilíbrio

emocional diário devido ao trânsito, aos conflitos familiares, sociais e

profissionais. Portanto, a Arteterapia é indicada para pessoas de todas as

idades, desde de crianças a idosos.

O processo criativo envolvendo as atividades artísticas terapêuticas

é enriquecedor para a qualidade de vida pois oferecem alternativas de ação e

reação ao cognitivo, de lidar mais adequadamente com as emoções e

sentimentos, modificando as formas de pensar sobre situações de estresse e

experiências traumáticas.

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Com este breve relato sobre a Arteterapia e a sua prática em

psiquiatria e processos terapêuticos pretendeu-se ressaltar a importância das

técnicas artísticas como meio de comunicação entre pacientes e o mundo,

entre a realidade interna e a realidade externa,e que a Arteterapia oferece a

possibilidade de maior compreensão e confronto com os conteúdos

constelados na psique de cada paciente, com variação dos conteúdos

simbólicos em função da história pessoal, cultural e religiosa de cada um.

2.2 História

A Arteterapia surgiu no pós-guerra como iniciativa de vários

profissionais das áreas de Ciências Socias, Psicologia, Arte e Pedagogia, com

o intuito de resgatar os indivíduos traumatizados pela guerra, mutilados físico e

emocionalmente.

A junção desses profissionais utilizando as diversas linguagens

artísticas como instrumento de expressão, seguindo a orientação da psicologia

analítica de Carl Gustavo Jung, provou a grande eficácia do tratamento

psicoterapêutico, reintegrando essas pessoas à vida e à sociedade.

No final do século XIX, alguns psiquiatras passaram a observar

produções plásticas realizadas espontâneamente pelos doentes mentais, e

estudaram-nas sob diferentes ângulos teóricos e verificaram que o uso da arte

como veículo terapêutico poderia beneficiar os pacientes ,então inicia-se esse

trabalho em hospitais psiquiátricos,primeiramente com artistas que ensinavam

técnicas diversas aos pacientes visando acalmá-los.

Portanto fica impossível falar da história da Arteterapia sem

brevemente contextualizá-la no Brasil e no mundo.

Surgiu nos Estados Unidos como profissão após a

Segunda Guerra Mundial. Iniciada por Margareth Naumburg,

professora de arte em escolas de vanguarda em Nova York.

(www.oficiocriativo.com.br)

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Ela percebeu como a arte ajudava crianças e adolescentes em seus

processos de desenvolvimento pessoal. Nas décadas de 30 e 40, explorou a

eficácia do trabalho com arte no campo da psicoterapia e da psiquiatria. Em

1947, publicou sua primeira pesquisa e, desde então, este campo se

desenvolveu e ramificou em várias linhas e escolas

Para Naumburg a Arteterapia dinâmicamente orientada, estimulava

a capacidade criativa do individuo, auxiliava-o a projetar seus conflitos

interiores em formas visuais e posteriormente de forma verbal.(in ANDRADE,

2000)

No Brasil, foi através da Dra. Nise da Silveira, psiquiatra brasileira

que a arte começou a ser utilizada com finalidade terapêutica. As oficinas de

arte buscavam compreender o mundo mental dos pacientes internados a partir

de suas criações.

Nise da Silveira era indignada com as formas de tratamentos

desenvolvidas nos hospitais psiquiátricos, tais como: eletrochoque, lobotomia,

insulinoterapia e confinamentos, inseriu então no tratamento os ateliês de

pintura, escultura, oficinas de literatura. As oficinas de arte ultrapassavam o

limite do lazer e da distração.

As oficinas de pintura e modelagem delineavam caminhos para o

mundo interno do individuo esquizofrênico. Nise se aperfeituava através das

publicações de Jung ,de quem se tornou grande amiga ,ele a instruia a estudar

varias culturas, mitos e contos de fadas, pois assim entenderia melhor os

conteudos expressos pelos doentes mentais.

2.3 O Arteterapeuta

Agora será dado um enfoque no papel do profissional que trabalha

com Arteterapia, como diz Pain e Jarreau (1996), para poder conduzir um

ateliê, tendo como objetivo o tratamento psicoterapêutico de e para

representação, é preciso definir um profissional que tenha disposições e

conhecimentos específicos. E quem seria esse profissional?

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Diversos profissionais interessados no uso da arte de modo pessoal com seus grupos, ainda que este caminho tenha sido construído pelos arteterapeutas. Devido a isso muitas vezes acontece problemas de linguagem, uma vez que diferentes disciplinas desenvolvem diferentes modos de descrever as pessoas e seus problemas. Por exemplo, a área médica fala de doença e de terapia, enquanto a área de serviço social fala de problemas sociais e de apoio, já a área educacional, de ignorância e educação. Os profissionais dessas diversas áreas podem estar desenvolvendo a mesma atividade, como um grupo de expressão pessoal em arte, e chamá-los de nomes diferentes, tais como arteterapia, habilidades sociais ou educação emocional. As pessoas também podem ser denominadas diferentemente, como paciente, cliente, etc. A pessoa que dirige o grupo pode ser chamado de terapeuta, facilitador, monitor. (LIEBMANN, 2000, p.18)

O arteterapeuta serve de guia, facilitador e incentivador da busca,

sugerindo experimentos e auxiliando na descoberta de novos caminhos,

sustentando que o cliente pode ser agente da própria saúde e encontrar

sentidos relevantes de vida. O arteterapeuta pode auxiliar a pessoa a procurar

seus pontos de conflito, tendo o cuidado de não interpretar, nem sugerir

significados, que sempre estão vinculados ao contexto e a história de cada

indivíduo ele apenas ouve do cliente o significado que ele próprio encontra,

provocando e incentivando sua verbalização.

O arteterapeuta, portanto, utiliza recursos artísticos como: artes

plásticas, poesia, dança, música, teatro, modelagem, ou outras formas de

expressão, com o objetivo de proporcionar a melhora do estado emocional do

paciente que o busca como terapeuta. Para isso, é necessário um

conhecimento das técnicas, dos materiais e o treinamento na escuta e

percepção do outro.

Atualmente a formação do arteterapeuta pode ser através de

especialização, pós graduação e já em alguns países através da graduação.

Através desses cursos os arteterapeutas se tornam aptos a utilizarem os

conhecimentos adquiridos.

Outro fator importante na formação do arteterapeuta são suas

próprias experiências com diversos materiais, isso é útil tanto para que possa

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auxiliar seu cliente, quanto para que possa, ele mesmo, habilitar-se a praticar

novas possibilidades de sua própria expressão.

Para transformar-se em observador presente, ativo, empático companheiro neta aventura do construir-se e transformar-se pela via das imagens, precisará o arteterapeuta do contínuo trabalho de auto desvelar expressivo do ateliê. Precisará do aprofundamento da pesquisa em sua linguagem plástica particular, a qual deve ser reciclada e renovada continuamente, para que assegure uma comunicação fluente através de estratégias diversas. Deste modo, estará efetivamente contribuindo para amenizar bloqueios no processo criativo de seus clientes e facilitando que estes possa encontrar e /ou construir suas próprias alternativas de reconhecimento e transformação através da sua produção imagética. E isso será apoiado por sua própria criatividade e fluência expressiva. A necessária complementação advem do continuo estudo no modelo teórico escolhido para nortear sua pratica terapêutica e do persistente trabalho de autoconhecimento em seu próprio processo terapêutico. (PHILIPPINI apud COUTINHO, 2007, p.49)

Portanto “A Arteterapia exige profissionais com coragem o bastante

para derrubar preconceitos, sensibilidade ao ponto de saber conjugar ciência e

sentimento, sem desafinar nem com a arte tampouco com a terapia, e por fim,

o talento “(HORÁCIO apud COUTINHO, 2007, p.10)

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CAPÍTULO III

A ARTETERAPIA NA SAÚDE MENTAL 3.1 Arte e Psiquiatria

Neste capítulo serão esclarecidas algumas das questões sobre a

relação da Arte e a Psiquiatria. Desde fins do século XIX, a ciência psiquiátrica

vem procurando um tratamento mais humanizado para as pessoas com

transtorno mental.

O grande problema para psiquiatria enquadrada nos modelos das ciências naturais era, e ainda hoje é, a questão da determinação das causas das doenças mentais. As neuroses, em particular a histeria, e a demência precoce, hoje reclassificada e nomeada de esquizofrenia, desafiavam o modelo cientifico. É nesse contexto, como cientistas típicos do século XIX, preocupados com a determinação das causas das doenças mentais, que se inserem primeiramente Freud e depois Jung. (REVISTA MENTE E CÉREBRO, v.2, p.18)

Vale à pena ressaltar que no final do século XIX a experiência

psicanalítica inaugurada por Sigmund Freud trazia à tona a questão do

inconsciente e marcava o reencontro da loucura com a linguagem. Desta

forma, os surrealistas, ao se interessarem por conteúdos do inconsciente, já

contavam com as experiências inauguradas por Freud.

A Psicanálise, criada por Freud, no que se refere à metodologia de

intervenção terapêutica, faz uso da Associação Livre em que o terapeuta não

direciona a questão a ser trabalhada, mas deixa com que o próprio paciente

mergulhe em seu inconsciente e traga seus conteúdos. Então, é a partir destes

conteúdos inconscientes manifestados no “setting” clínico que o processo

terapêutico se configura e é estruturado.

No início do século XX a Europa era marcada pela tentativa de

renovação da Arte e da cultura ocidental. Ao buscar uma nova forma de criar,

artistas e pensadores da época tentaram fugir aos moldes acadêmicos e

começaram a se interessar pela produção de pessoas consideradas “doentes

mentais” ou à margem da sociedade. Nesta mesma época, o Brasil, que

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também se encontrava em um período de inquietação e de renovação da arte,

tentava se livrar dos moldes europeus e buscava valorizar os traços

característicos de sua própria cultura.

Ao contestar os parâmetros e regras impostos pela sociedade e pela

tradição cultural, o meio artístico, tanto o europeu quanto o brasileiro passou a

valorizar o simples e o primitivo, bem como tudo aquilo que fugisse dos moldes

acadêmicos.

Nesse momento os médicos pensavam ser possível detectar

sintomas de degeneração através da análise da produção plástica dos

alienados, os artistas estavam interessados no processo de criação dos loucos

e seus resultados, tão distantes da tradição plástica européia e muito próximos

da subversão estética buscada pelas vanguardas artísticas.

Foi ai que surgiu a Arte contemporânea que não tem a pretensão de

agradar nem despertar sentimentos agradáveis que acompanham a beleza;

pois muitas vezes são imagens confusas, desordenadas, pois são

conseqüência da passagem da pura emoção para a tela ou qualquer outro

suporte. Pode-se ver isso nas obras dos movimentos de vanguarda, como o

surrealismo que estavam interessados no modo de pensar das pessoas com

transtorno mental , que resultava em obras coincidentes com o que eles

buscavam, ou seja, uma arte que fosse produto de um processo criativo, aonde

vinha à tona conteúdos do inconsciente.

É nesse período que grandes reflexões são feitas sobre o que é Arte

e é nesse ajuste sobre o sentido e a intenção da Arte que a Arteterappia se

beneficia.

(...) a atividade que realiza em nome da arte não é, em absoluto, arte. Na arteterapia, a arte é concebida como uma metáfora, ou melhor, algo que se assemelha à arte, indicada por sua dupla condição: por um lado, aquele que freqüenta o ateliê não se compromete com um aprendizado sistemático das regras do oficio, nem com a criação de idéias plásticas cuja coerência estética seja completa e socialmente reconhecida; por outro lado a arteterapia demanda da arte um serviço útil. Este serviço terapêutico constitui a própria definição de arte, projetando simultaneamente sobre o paciente a tensão contraditória inerente à possibilidade de cura. A atividade artística transforma-se assim em representação dramática da intenção criativa do sujeito. É nessa duplicidade que

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encontramos a eficácia terapêutica dessa modalidade clinica. (PAIN, 2009, p.12)

Contextualizado nesse cenário social em que artistas e médicos

refletiam sobre Ate e loucura, que a Arteterapia inicia seu trabalho no contexto

psiquiátrico. Mas que lugar a Arte tem na psiquiatria?

Na instituição psiquiátrica, ela apresenta-se como um lugar “a parte”, com um enquadramento e uma disciplina contratual. O sujeito vem ao ateliê porque quer passar o tempo, para se divertir, ou porque gosta de pintar. A questão não é essa, pois todas essas motivações são pertinentes e sujeitas a contradições. É através da própria atividade que o sujeito pode descobrir possibilidades das quais nunca suspeitaria. o essencial é que ,louco ou não,ele descubra o papel do artista a quem é tudo permitido ,dentro das restrições materiais e da relação com os outros participantes .O poder do arteterapeuta lhe é conferido não somente pela instituição ,mas também pelos pacientes quando sentem necessidade de ser orientados. Essa delegação de poder é uma astúcia da doença que visa manter alguns sintomas e deixar o sujeito em estado de dependência. É justamente mediante a utilização da arte que a utopia antipsiquiátrica encontra um terreno onde atuar e modificar o olhar dos outros sobre o sujeito. (PAIN, 2009, p.31)

E é com esse olhar que a nova política de Saúde Mental,

implementa o CAPS ,sendo uma instituição aberta ideal para dar aos pacientes

a oportunidade desse encontro com a Arte ,favorecendo a ressocialização do

sujeito e o desenvolvimento de sua autonomia enquanto cidadão,

proporcionando ao indivíduo um maior desenvolvimento de sua personalidade.

A Arteterapia, aplicada à psiquiatria e de acordo com os novos paradigmas de atenção em Saúde Mental, é um processo terapêutico predominantemente não-verbal, por meio das artes plásticas acolhe o ser humano com toda complexidade, dinamicidade, objetivando a reinserção e inclusão social do doente mental. (VALLADARES, 2008, p.98)

O objetivo da Arte é proporcionar que o sujeito possa expressar as

suas potencialidades enquanto pessoas, dando a eles o direito de interagir e

conviver com a sociedade. A única forma de quebrar o preconceito é mostrar

que as pessoas com sofrimento psíquico ou transtorno mental são ainda

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pessoas produtivas e atuantes, e a arte exerce um excelente papel nesse

processo.

3.2 Jung e o Tratamento pela Arte

O psiquiatra Carl Gustav Jung foi um dos pioneiros na utilização da

arte como recurso terapêutico, ele fez a difícil transição do século XIX para o

século XX, tendo grande importância no cenário da psiquiatria, pois seus

primeiros estudos, sua tese inicial tinha como tema a esquizofrenia, teve a

oportunidade de estudar de maneira detalhada os diversos sintomas presentes

nessa doença, com base nas teorias de Freud. Ele dedicou-se aos

experimentos de associação de palavras para chegar ao inconsciente

reprimido. Trabalhou com símbolos, imagens arquetípicas e inconsciente

coletivo. A psicologia junguiana não se restringe a fala, ao corpo, mas ao

processo de cura, que passa pela individuação, ou seja, tornar-se pessoa que

realmente é.E é essa proposta que a Arteterapia faz.

O processo arteterapêutico visa a partir de vivências expressivas,

melhorar a qualidade de vida do sujeito, propiciando um maior equilíbrio

emocional e físico, a melhoria das suas relações consigo mesmo e com o

mundo que o cerca, uma maior satisfação pessoal e harmonia interna e

externa. Tudo isso ocorre através de um processo, de transformação e de

crescimento psíquico, a que chamamos de individuação, graças aos

pressupostos teóricos junguianos.

O processo de individuação não consiste num desenvolvimento linear. É movimento de circunvolução que conduz a um novo centro psíquico. Jung denominou este centro de self (si mesmo). Quando consciente e inconsciente vêm ordenar-se em torno do self a personalidade completa-se.O self será o centro da personalidade total, como o ego é o centro do campo do consciente. (SILVEIRA, 1976, p.87)

Jung em seus atendimentos preferia estimular a vivência simbólica,

ele pedia a seus pacientes que pintassem as imagens para melhor

experimentá-las, ao invés de ficar somente na interpretação verbal.

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Ele observou que seus pacientes diagnosticados como

esquizofrênicos apresentavam um material simbólico de conteúdo arcaico,

profundamente ligado aos arquétipos estudados por ele. Observou ainda que

estes elementos do inconsciente dominavam a vivência desses pacientes e

que eles pareciam viver um grande sonho e a arte dava proporcionava a saída

do estado de imersão permanente no inconsciente em que vivem os

esquizofrênicos.Segundo Jung, seria justamente este excesso de símbolos

coletivos que constituiria a sua estrutura fundamental.

Para Jung (1990) e Silveira (1992), o transtorno mental é um distúrbio que reside no colapso do ego e consiste na invasão de conteúdos do inconsciente ao campo do consciente, fenômeno que ocorre em diferentes graus, depender da fragilidade do ego do ser humano. (...) Assim, a doença mental sobrecarrega o consciente do doente de imagens arcaicas que revelam a existência de um conteúdo coletivo alojado nas camadas mais profundas do inconsciente (TOMMMASI, 2005). Para amenizar este processo, segundo Jung (1990); Silveira (1992) e Tommasi (2005) é necessário induzir a mente do usuário para fora do inconsciente, operação facilitada pela expressão artística; somente assim a imagem ameaçadora e caótica se despotencializará, a tensão dos afetos diminuirá, havendo conseqüente fortalecimento do ego e aumento do relacionamento social do usuário, de acordo com suas possibilidades adaptativas.(...)Então, ao se expressar por meio da arte, o usuário libera despotencializa e desloca para a consciência conteúdos psíquicos internos presos, o que permite que sua energia volte a fluir. O símbolo trazido pela produção de arte libera a energia psíquica inconsciente do usuário, facilita sua trajetória natural, cria um efeito transformador no organismo em busca do processo de cura e se esforça para dar equilíbrio e totalidade ao organismo de seu produtor (VALLADARES, 2008, p.99-100)

Portanto Jung via a Arte como produto fundamental para o se

humano, a criatividade para ele tem a função de um instinto, que ajuda no

desenvolvimento mental, ela não é apenas um produto da cultura. A “Arte dos

loucos “pode nem sempre ter o valor de obra de arte, mas o que importa nesse

trabalho de arteterapia é a demonstração da expressão dos conteúdos do

inconsciente e a sua utilização terapêutica, o que vale é o processo, o fazer

artístico e criativo.

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A psicologia analítica não pretende nunca opinar sobre o valor estético das obras de arte nem explicar o fenômeno arte. Estas áreas pertencem aos críticos de arte. Seus pronunciamentos limitam-se a pesquisas concernentes aos processos da atividade criadora e ao estudo psicológico da estrutura da produção artística. Sua contribuição maior será decifração das imagens simbólicas que tomam forma na obra de arte, trazendo luz sobre significações que encerram e que exedem as possibilidades comuns de compreensão da época em que adquiram vida. (SILVEIRA, 1976, p.155)

3.3 Nise da Silveira e a Arteterapia

Nise da Silveira era psiquiatra brasileira, foi pioneira nos estudos

junguianos e na utilização da Arte como tratamento para pessoas com

transtorno mental.

Na década de 50, Nise da Silveira desenvolveu técnicas expressivas no tratamento de pacientes psicóticos internados no Hospital do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, empregando principalmente a pintura. Com o passar do tempo, observou que muitos pacientes pintavam imagens circulares. Buscando o seu significado, encontrou um trabalho de Jung sobre a mandala e escreveu para ele solicitando sua interpretação em casos de psicose. (...) Jung interessou-se ainda mais, pois não só as mandalas, como outras pinturas mostravam claramente tratar-se de imagens arquetípicas, que podiam ser perfeitamente mitológicas. (REVISTA MENTE E CÉREBRO, v.2, p.14)

Nise percebeu a riqueza simbólica contida nas obras dos pacientes

e a possibilidade de encontrar um veiculo de comunicação com os

esquizofrênicos a partir das imagens.

Além de expressar imagens arquetípicas na psicose, a obra pioneira de Nise da Silveira, através de anos, mostrou claramente que mesmo psicóticos graves, considerados caos perdidos e amontoados como dementes nas enfermarias,quando solicitados a expressar suas fantasias,não só podem fazê-los exuberantemente, como ate mesmo, demonstrar um desenvolvimento simbólico criativo característico do processo de individuação. (REVISTA MENTE E CÉREBRO, v.2, p.14)

Com a criação das oficinas terapêuticas no hospital psiquiátrico, os

pacientes excluídos tiveram a oportunidade de expressarem seus sentimentos

e conflitos através da arte, através de meios de expressão para a subjetividade

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dos pacientes. Após observar o funcionamento de diversas atividades, ela

percebeu que o desenho, a pintura e a modelagem facilitavam o acesso ao

mundo interno do esquizofrênico.

Dispensou a lobotomia, o eletorchoque, o choque de insulina. Estimulou os internos a pintar; pôs ao seu lado cães e gatos, os quais consideravas co-terapeutas, para que pudessem dar e receber afeto.construiu o Museu do inconsciente ,local de guardar o acervo das tantas obras que começavam a produzir,e a casa das palmeiras ,onde pacientes recuperados podiam se preparar para voltar ao convívio social.Nise se recusava ,alias ,a usar termos como louco,interno ou paciente para designar aqueles de quem cuidava,considerava-os clientes ,chamava-os pelo próprio nome.(REVISTA MENTE E CÉREBRO,ano 2,nº 15,p.42)

Nise acreditava na arte como meio de conhecimento e de tratamento

para o portador de transtorno mental e é neste ponto que ela se aproxima da

Arteterapia – pela ênfase dada aos trabalhos expressivos em seu método

terapêutico. Por consideramos que suas experiências têm afinidades com os

processos de Arteterapia – embora fosse psiquiatra e chamasse o seu trabalho

de Terapêutica Ocupacional.

3.4 Arte como Caminho de Inclusão Psicossocial

Como foi visto anteriormente a Arte é um grande aliado do

tratamento de pessoas com transtorno mental, pois no processo criativo, no

fazer artístico, na produção da obra, o inconsciente se alia ao consciente

produzindo o símbolo tanto estudado por Jung. Essa comunicação que permite

que o inconsciente deixe emergir os seus símbolos, podendo assim o sujeito

dar significado a essas imagens. Esse processo é muito benéfico para os

pacientes, principalmente os esquizofrênicos, onde muitas vezes a

comunicação verbal é quase impossível.

Considerando esse tratamento mais humanizado do doente mental,

essa nova maneira de olhar a Saúde Mental, a partir da Reforma psiquiátrica,

com a diminuição das internações e da reinserção psicossocial do doente

mental, a Arte é um grande aliado nessa luta da desinstitucionalização. A Arte,

através das oficinas terapêuticas de arteterapia, disponibiliza novos métodos

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através de resgate da cidadania, da auto-estima com a possibilidade de

melhora e nova motivação dos pacientes.

A saúde mental vem ampliando seus conhecimentos e utilizando-se de novas práticas na assistência a seus usuários, assim, o investimento no trabalho e em práticas complementares e criativas, com pessoas com transtornos mentais, é fator importante no novo cenário da atenção em saúde mental. Este tipo de atendimento, no qual se incluem as sessões de Arteterapia, permite que se valorize o potencial existente em cada ser humano, objetivando melhorar sua saúde e qualidade de vida. (VALLADARES, 2008, p.105)

Portanto, vale lembrar que o objetivo da Arte não é resolver o

problema para o indivíduo, mas ajudar a desenvolver-se de tal modo que o

usuário possa enfrentar o problema atual e outros que venham a surgir, de

maneira menos confusa, mais organizada e de modo independente. Como diz

Santana, “o processo criativo, trabalhado nas sessões de Arteterapia, ajuda a

romper o movimento de repetição trazido pela psicose” (VALLADARES, 2008,

p.104)

A contribuição da Arte nesse processo de inclusão psicossocial é

amplo de recursos terapêuticos, proporcionando aos profissionais variados

tipos de oficinas, porém apesar dos recursos serem simples, exigem do

profissional muita flexibilidade e observação para aplicá-los, pois a arte não

deve ser aplicada sem capacitação, cabendo ao profissional perceber a

necessidade e a demanda de seus pacientes.

A Arteterapia considera o usuário um ser humano complexo, dinâmico e o impulsiona a encontrar novos “sentidos” e viabilidade de um constante ressignificar da sua vida como um todo. Apregoa, ainda, que os usuários com transtornos mentais devem ser respeitados nos aspectos afetivos, culturais, cognitivos, motores, sociais, de saúde e físicos, entre outros. O arteterapeuta, ao utilizar as técnicas da Arteterapia, é capaz de compreender o que o usuário expressa por meio da comunicação não-verbal, de forma ampla, e o auxilia na sua instrumentalização, almejando a busca de soluções para alguns de seus sofrimentos (VALLADARES, 2008, p.100)

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CAPÍTULO IV

VAN GOGH

4.1 A Arte como Instrumento de Expressão

Este capítulo tem o objetivo de ressaltar a vida de Vicent Van Gogh,

um génio, autodidacta, marginalizado, sujeito a acessos de loucura, com uma

carreira fulgurante, concentrada apenas nos seus últimos 5 anos de vida.

Mas que doença atormentava um dos artistas mais brilhantes de

todos os tempos?As respostas a estas perguntas nos levam a uma fascinante

viagem no tempo.

Ao estudar e conhecer um pouco da história de vida de Vincent Van

Gogh percebe-se que sua vida foi marcada por muita angústia e sofrimento,

mas também por uma busca incessante pelo equilíbrio interior e pela

satisfação.

Por um período Vincent acreditou ter alcançado na vocação religiosa

a satisfação, seu interesse pela religião nesse momento era bem mais forte

que pela pintura, talvez por ser filho de pastor protestante, vindo de antiga

família de rígida tradição calvinista. Porém logo ele viu que a religião não

preenchia seu vazio, a crise religiosa culmina por volta de 1880. Após inicia

uma procura de prazer e reconhecimento através de seus inúmeros desenhos

e pinturas, procurando no imediatismo expressivo, representar o tortuoso

mundo interior. (VALSECHTJ, 1972)

Nascido em 30 de março de 1853, em Zundert, na aldeia holandesa de Brabant, Vincent foi um menino sonhador e tímido. Sensível e ligado à família, amava passear pelos campos planos de paisagem holandesa, geralmente sozinho, ou às vezes na companhia de Theo, o seu irmão quatro anos mais jovem. Esse relacionamento tão próximo duraria, enquanto vivessem. Vicente abandonou cedo a vida escolar. A família era grande e, como o filho mais velho, ele tinha de ganhar seu sustento. (VAN GOGH, 1997, p.3)

Durante toda a vida Vincent registrou para seu irmão Theo todas as

suas idéias, suas angústias, esperanças através de cartas, que podem ser

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lidas como um diário, ficando comprovada a enorme ligação afetiva que ambos

tinham .

“O ar francês limpa o cérebro e faz bem,um mundo de bem,” escreveu ele.Morava com seu irmão ,que gerenciava uma galeria em Montmartre.Continuava a estudar desenho,copiava moldes de gesso e trabalhava com modelos vivos no ateliê do pintor Cormon.Começou a pintar flores.”Tenho pintado... papoulas vermelhas,centaureas azuis,lírios do vale rosas vermelhas e brancas,crisântemos amarelos “,escreveu ele numa carta, Buscando contrastes de azul com laranja,vermelho com verde ,amarelo com violeta.( VAN GOGH, 1997, p.5)

Em 1888, Vincent vai para o Sul da França, cansado e desesperado.

Iniciam os sintomas de um grave transtorno psíquico, manifestando-se com

crescente nitidez. Períodos de atividade febril alternam-se com apatia e

esgotamento total, sinais típicos de depressão maníaca. Inicia-se o período de

internações psiquiátricas, mas ainda tinha intervalos lúcidos.

No hospital Saint-Paul, aonde foi levado nesse episódio, ele foi atendido por um jovem, o Dr.Rey que se tornou um de seus maiores admiradores. Depois da convalescença, Vincent pintou um retrato do médico. No plano moral e psicológico, contudo, as feridas de seu colapso nervoso não estavam cicatrizadas... durante um ano passado lá ,ele tinha produzido cerca de duzentos quadros e cem desenhos. (VAN GOGH, 1997, p.6)

No hospital, o primeiro diagnóstico foi de psicose grave. O médico

Rey também suspeita de epilepsia. Em compensação, imperam outras

ocorrências psíquicas e o paciente oscila entre euforia extrema e depressão

profunda, acompanhadas de angústia e insônia. Alucinações e mania de

perseguição integram o quadro dos sintomas, bem como profunda emotividade,

e solicitude exagerada ou religiosidade extrema. Seu estado psíquico é tão

instável que, interna-se espontaneamente algumas vezes. Durante as

internações Vincent tinha toda liberdade para andar pelos arredores da clínica,

foi então que começou a pintar os locais por onde passeia a clínica, os

pacientes, o enfermeiro e até mesmo a cidade.

Apesar dos episódios de uma grave psicose, ele nunca deixou de

pintar, era através da pintura que ele expressava todo seu sofrimento, a pintura

comunicava a exaltação mental do artista, como ele próprio dizia

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(...) as emoções são, às vezes, tão fortes que trabalho sem ter consciência de estar trabalhando... e as pinceladas acodem com uma sequência e coerência a idênticas às de palavras numa fala ou numa carta.A comparação não podia ser mais clara.Em tais momentos,Van Gogh pintava como homens escrevem.Assim como o aspecto de uma página manuscrita,os traços deixados pela pena sobre a folha de papel,revela algo dos gestos de quem escreve,de modo que sentimos instintivamente quando uma cartas foi escrita sob grande tensão emocional – também as pinceladas de Van Gogh usara a respeito do seu estado mental.Antes dele,nunca um artista usara esse meio com tanta consistência e efeito.(GOMBRICH,1993,p.436)

Pode-se dizer que existe algo que liga a genialidade e doença

mental, basta observar a capacidade artística, a energia fabulosa que pessoas

com algum transtorno mental apresentam, caracterizada pelas fases criadoras

de pintores, escultores, escritores e poetas, onde muitos deles varam noites

escrevendo ou passam horas sem fim no ateliê, sem dormir.

A biografia de Vincent Van Gogh que aos 27 anos, decide ser pintor

e lança-se ao trabalho com enorme intensidade, produzindo diversas obras,

podendo-se ver algumas no anexo deste trabalho, todas as obras com enorme

valor de mercado atualmente é uma referência importante para os estudiosos

que querem compreender as possibilidades terapêuticas do trabalho criativo

em relação aos transtornos mentais.

Portanto será qual o verdadeiro diagnóstico de Van Gogh? Vincent

era louco?

Vincent, que explorou a noite junto ao Ródano, que adivinha nas estrelas tantos mundos como pontos que apontam cidades nos mapas, deve explorar agora a loucura, a angústia, o ódio de si. Vincent, que conheceu o meio-dia zenital da luz, explora a noite sombria do homem. Sabe tudo do homem, roça constantemente os seus limites. Van Gogh louco? É, talvez, saudável, esse mundo cinzento, neutro, aborrecido, incolor que lhe rodeava?É louco quem identifica beleza com realidade, quem resgata a realidade em seus quadros? Nos loucos os primitivos viam o homem possuído pela sabedoria lúcida dos espíritos. Van Gogh, em mãos de psiquiatras, é a profanação do mistério, a dissecação da profecia. (PIQUE E LA PUENTE, 1996, p.100)

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Porque sua doença se agravava?

Cabe, por fim, ressaltar que Cornelius, irmão de Van Gogh, também se suicidou e que sua irmã Wilhelmina morreu louca, internada em um hospício, reforçando a idéia de que havia um componente familiar genético na doença de Van Gogh a psicose maníaco-depressiva, hoje chamada de distúrbio bipolar do humor. (http://www.portalmedico.org.br/include/biblioteca_virtual/belas_artes/cap14.htm)

Mas de que maneira a Arte ajudou no tratamento do transtorno

mental de Vincent? Apesar de toda a dor que a consciência da doença lhe

causava, a pintura era o seu melhor remédio. O trabalho sempre o absorveu

completamente e sua paixão interior encontrou na Arte a válvula de

descompressão, o que lhe permitiu seguir adiante. Pode-se dizer que a Arte foi

estruturante na vida de Van Gogh, como o próprio Dr.Gachet dizia: ”que via na

pintura a melhor terapia para Vincent.” (VAN GOGH, 1997, p.6)

Na epóca em que Vincent viveu , os estudos sobre os transtornos

mentais eram ainda bastante precários ,e se quer imaginava-se que anos mais

tarde se utilizaria a Arte para tratar pessoas com transtornos psíquicos.Portanto

Dr. Gachet ,um dos médicos de Van Gogh ,talvez intuitivamente , utilizou com

Vincent essa terapia ,ou seja,a terapia através da Arte,que hoje denominamos

de Arteterapia .Sem dúvida é visivel nas obras de Van Gogh e reforçada nas

cartas escritas por ele ao seu irmão Theo ,como a Arte o ajudou passar pelas

diversas crises e internações .Vincent definiu sua própria forma de pintar,suas

pinceladas praticamente falavam sobre o que estava a sentir e pensar.

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CONCLUSÃO

Como se pode observar ao longo desta pesquisa, o novo olhar sobre

as pessoas que sofrem de transtorno mental, a partir da Reforma Psiquiátrica,

da implantação do Caps, o doente mental passou a ser olhado não só a partir

de seu diagnóstico, mas sendo um sujeito completo, que tem desejos,

sentimentos e deve ser acolhido e tratado com todo respeito.

Foi mostrado neste trabalho, que a Arteterapia pode ser de grande

auxílio nesse tratamento e na manutenção do equilíbrio de pessoas com

transtorno mental e que, ao propiciar ao sujeito uma nova relação com a

realidade, distinguindo-a dos conteúdos do seu inconsciente, propicia uma

melhor qualidade de vida tanto para o paciente como para seus familiares e

realiza a sua inclusão social.

Portanto, acredita-se que a Arteterapia atue como uma ponte que

pode manter viva a possibilidade de recuperação dos indivíduos; trabalhando

de forma doce, sensível, criativa, caminhando lado a lado, tanto em direção ao

fortalecimento da sua identidade, como em direção ao resgate dos

relacionamentos familiares e sociais. A Arteterapia vem sendo cada vez mais

utilizada como uma forma eficaz de auxiliar no tratamento de pessoas com

transtornos mentais, propiciando também a sua inclusão social.

Entende-se que essa pesquisa não alcança toda a complexidade do

tema, e que é apenas uma pequena amostra do que pode ser feito no campo

da Arteterapia em relação aos sujeitos com sofrimento mental, da mesma

maneira que a Esquizofrenia é uma doença com muitas nuances e diversas

subdivisões de acordo com suas características.

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ÍNDICE AGRADECIMENTOS 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 6

METODOLOGIA 7

SUMÁRIO 8

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I – SAÚDE MENTAL.

1.1 Um Breve Histórico da Reforma Psiquiátrica 12 1.2 CAPS-Centro de Atenção Psicossocial 14

1.3 A Esquizofrenia 16 1.3.1 Sintomas 19

1.3.2 Tratamento 21 CAPÍTULO II – CONHECENDO A ARTETERAPIA.

2.1 Definição 24 2.2 Histórias 26 2.3 O Arteterapeuta 27 CAPÍTULO III – A ARTETEPAIA NA SAÚDE MENTAL 3.1 Arte e Psiquiatria. 30 3.2 Jung e o Tratamento pela Arte 33 3.3 Nise da Silveira e a Arteterapia 35 3.4 Arte como Caminho de Inclusão Psicossocial 36 CAPÍTULO IV – VAN GOGH 4.1 A Arte como Instrumento de Expressão 38

CONCLUSÃO 42

BIBLIOGRAFIA 43

ÍNDICE 49

ANEXO 50

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ANEXO

Auto-retrato Retrato do Dr. Félix Rey

Jardim do Asilo de Loucos de Saint-rémy

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Campos De Trigo Com Corvos

A Noite Estrelada