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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A lateralidade e o esquema corporal como um único fator psicomotor
Por: Aline de Amurim da Silva
Orientador
Profª Mary Sue
Rio de Janeiro
2007
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A lateralidade e o esquema corporal como um único fator psicomotor.
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes, como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em
Psicomotricidade.
Por: . Aline de Amurim da Silva
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos aqueles, que em um
trabalho de formiguinhas, onde cada
um tem um papel importante no
funcionamento da colônia, me
ajudaram a realizar este projeto.
6
RESUMO
O presente trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica sobre a
lateralidade e o esquema corporal, objetivando-se analisar se são
componentes psicomotores individuais ou um único componente. A
Psicomotricidade é a integração superior da motricidade, produto de uma
relação inteligível entre a criança e o meio, instrumento privilegiado através do
qual a consciência se forma e materializa-se. A lateralidade é a propensão que
o ser humano possui de utilizar preferencialmente mais um lado do corpo do
que o outro. O esquema corporal, trata-se do conhecimento que o indivíduo
tem das partes do seu corpo. A lateralidade e o esquema corporal
desenvolvem-se na criança de forma concomitante e interdependente, devendo
ser desta forma encarados como um fator psicomotor único e essencial.
7
METODOLOGIA
Na presente monografia, optou-se como metodologia à referência
bibliográfica, buscando o assunto em livros, artigos e na internet. Expondo
desta forma as idéias, opiniões e definições de alguns dos mais renomados
autores em Psicomotricidade.
8
SUMÁRIO
Introdução 9
Capítulo I – A Psicomotricidade 11
Capítulo II – A Lateralidade 18
Capítulo III – O Esquema Corporal 27
Conclusão 34
Bibliografia 35
9
INTRODUÇÃO
A Psicomotricidade é a integração superior da motricidade, produto de
uma relação inteligível entre a criança e o meio, instrumento privilegiado
através do qual a consciência se forma e materializa-se.
A monografia foi realizada por meio de pesquisa bibliográfica, onde se
propôs verficar qual o pensamento dos principais autores, a respeito da
lateralidade e do esquema corporal, como áreas psicomotoras independentes,
ou não.
Para o desenvolvimento deste terabalho, foram levadas em
consideração, primariamente duas Autoras, devido à suas visões diferentes e
intrigantes, além de estimuladoras:
FARIA (2004), afirma que a lateralidade, e a direcionalidade são
características desenvolvimentais que não podem ser dissociadas; enquanto
uma reflete a dominância de uma parte do corpo sobre a outra equivalente, a
segunda representa o sentido de orientação no espaço, sendo que estas duas
características são referência para a estruturação da consciência corporal e da
consciência espaço-temporal. Concomitantemente, HAYWOOD e GETCHELL
(2004), afirmam que a lateralidade é a consciência de que o corpo tem dois
lados distintos, que podem se mover independentemente, tratando-se de um
componente da consciência corporal.
O Primeiro Capítulo relata as mais novas definições de
Psicomotricidade, assim como algumas das mais antigas definições sobre o
tema.
No segundo capítulo foram abordados os pensamentos sobre o
esquema corporal, imagem corporal e imagem do corpo, como sendo um único
fator Psicomotor.
10No terceiro, e último capítulo constam às definições sobre a lateralidade,
a qual é vista como sinônimo do termo lateralização, os tipos de lateralidade, e
as hipóteses para sua definição na criança.
11
Capítulo I
A Psicomotricidade
1.1- Um breve histórico
Em sânscrito a palavra corpo significa embrião - garbhas; em grego,
karpós quer dizer fruto, semente, envoltura; no latim corpus, quer dizer tecido
membranoso, envoltura da alma, embrião do espírito. Apesar dos diferentes
significados, não se registra na história da humanidade, um ser que tenha
existido ou vivido sem um corpo. E pelo fato de o corpo ser tão complexo e
fundamental à existência do homem, que vários poetas, filósofos e estudiosos
se dedicaram a conhecer e desvendar seus prazeres e mistérios.
Descartes (1596-1650) questionou o dualismo corpo-mente, sendo o
corpo uma coisa externa que não pensa, e a alma, a substância pensante que
não participa de nada que pertence ao corpo. Descartes acreditava haver uma
separação entre mente e corpo, mas ambos funcionariam juntos,
aparentemente em perfeita harmonia.
Diferentemente de Descartes, F. Maine de Biran (1766-1824), filósofo e
psicólogo francês, identifica que a alma precisa do corpo para assumir sua
intencionalidade. Afirma que é o corpo que possibilita à alma tomar consciência
de sua existência, sendo o movimento um componente essencial da formação
do Eu.
Mais tarde explode o conhecimento nas áreas voltadas para o estudo do
cérebro e suas funções, período identificado como localizacionista, onde se
atribuia a cada sintoma uma localização cortical correspondente, surgindo
assim o modelo anatomoclínico. Sendo a maior preocupação o mapeamento
cerebral, pois o corpo era visto como uma máquina e o interesse da ciência era
voltado para a estrutura desta máquina. Wernick, em 1900, emprega pela
primeira vez o termo Psicomotricidade.
12 Na França, o psiquiatra Jean Martin Charcot (1888), por meio de
pesquisas realizadas acerca do membro fantasma em amputados, investiga o
imagiário referente à integridade corporal do homem, dando importância ao
conceito de inconsciente, que mais tarde virá a ser definido de maneira mais
rigoroso por Freud.
A França passa a ser, para a Psicomotricidade, o grande centro de
estudos e pesquisas no avanço dessa ciência. E foi na França que Ernest
Dupré (1907), neurologista, estabeleceu uma correlação entre motricidade e
inteligência.
A palavra Psicomotricidade surge no final do século XIX, mas ainda
relacionada com zonas do córtex cerebral; e situada mais além das regiões
motoras, sua definição, inicialmente, tem base nos fundamentos neurológicos.
Entretanto, as contribuições de Dupré, assim como as de Freud e de Wallon,
vêm humanizar o corpo, reduzindo o domínio neurológico e abrindo cada vez
mais espaço para o fortalecimento da Psicomotricidade.
Henry Wallon, em 1925, estuda a relação do movimento com o afeto e
com a formação do caráter para o desenvolvimento infantil, considerando o
tônus como a ponte entre o mundo biológico e o mundo psíquico; e é ao tônus,
que ele atribui a grande importância de ser o primeiro veículo de comunicação
com o bebê. Wallon dá sequência aos seus estudos, propondo etapas
evolutivas para o desenvolvimento infantil.
Com Sigmund Freud, médico e psicanalista, o imaginário do homem
passa a ser valorizado e é introduzido o conceito de inconsciente. Afirma que o
corpo (biológico) é a fonte das pulsões, centro das relações do Ser com o
mundo. Salienta também a importância das relações de afeto para o
desenvolvimento e formação da subjetividade; o corpo passa a ser visto não
somente humanizado, mas singular, único, subjetivado.
Arnold Gesell, na década de 1930, elaborou uma escala de
desenvolvimento infantil, com características motoras, conduta adaptativas,
linguagem e conduta pessoal-social, referente a cada ano de idade.
13 As contribuições de Jean Piaget por meio da psicologia e da biologia
vieram auxiliar na estruturação do desenvolvimento humano em fases,
considerando o processo maturacional do Ser, tanto em nível físico como em
nível cognitivo, afetivo, motor, linguistico, moral e social (MATTOS e
KABARITE, 2005).
Júlio de Ajuriaguerra traz um novo olhar sobre o corpo e sobre os
distúrbios psicomotores. Ele delimita com clareza os transtornos existentes,
une o desenvolvimento psicológico infantil ao neurológico e alerta que o corpo
não é ferramenta ou objeto; afasta definitivamente a Psicomotricidade da visão
do dualismo cartesiano e do período localizacionista. Retira o hífen e dá à
palavra Psicomotricidade uma unidade, e define na época a Psicomotricidade
como:
“Uma técnica que, por intermédio do corpo e do movimento, dirige-se ao ser na
sua totalidade. Ela não visa à readaptação funcional por setores e, muito
menos, à supervalorização dos músculos, mas à fluidez do corpo no seu meio.
Seu objetivo é permitir ao indivíduo melhor sentir-se e , por meio de um maior
investimento da corporalidade situar-se na espaço, no tempo, no mundo dos
objetos e chegar a uma modificação e a uma harmonização com o outro”
(Ajuriaguerra, 1977)
A partir da década de 1970, fizeram a história da interação corpo-mente:
Bérgès, Diatkine, Jolivet, Leibovici, Jean Le Boulch, Germaine Rossel, Dalila
Costallat, André Lapierre, Bernad Aucouturier, Aleksander Luria, Pierre Vayer,
entre outros.
A Psicomotricidade acompanha a história do corpo e da humanidade,
identificando que o homem é o seu corpo, diferente da visão cartesiana que
propunha o homem e seu corpo. O homem, Ser falante, fala de seu corpo e vai
adquirindo consciência disto e atribuindo a si e ao mundo, que o ajuda a se
perceber, significados, isto é, valores (MATTOS e KABARITE, 2005).
14
1.2- Por que Psicomotricidade?
O corpo reflete o orgânico, o emocional, o neurológico, pois sem esta
totalidade, ele não existe.
Um corpo humano de características próprias e únicas, individuais,
organizadas e em organização, prontas a novas adaptações, programador e
processador, disponível à aprendizagem.
Os potenciais humanos são apoiados nas áreas básicas da
Psicomotricidade, seu estudo e pesquisa constantes do esquema e da imagem
corporal, da lateralização, da tonicidade, da equilibração e coordenação, são
enriquecidos instrumentalmente, estimulando o sentimento de competência, de
auto-estima, entendendo o ser humano em constantes e complexas
adaptações, fazendo-o concluir que é amado e aceito, tornando-o
transformador e produtor social.
Psicomotricidade compreende no fundo uma mediação corporal e
expressiva, na qual o reeducador ou terapeuta observa e compensa condutas
motoras inadequadas e inadaptadas em situações geralmente ligadas a
diversos problemas: de desenvolvimento e maturação psicomotora, de
aprendizagem e de âmbito psico-afetivo.
A Psicomotricidade subtende uma concepção holística de aprendizagem
e de adaptação do ser humano, que tem por finalidade, associar
dinamicamente, o ato ao pensamento, o gesto à palavra, o símbolo ao conceito
(http://www.ispegae-oipr.com.br).
1.3- O que é a psicomotricidade?
A Psicomotricidade pode ser definida como o campo transdisciplinar que
estuda e investiga as relações e as influências recíprocas e sistêmicas entre o
psiquismo e a motricidade. Baseada numa visão holística do ser humano, a
15Psicomotricidade encara de forma integrada as funções cognitivas, sócio-
emocionais, simbólicas, psicolinguísticas e motoras, promovendo a capacidade
de ser e agir num contexto psicossocial. (http://www.appsicomotricidade.org).
É a ciência que tem como objeto de estudo o homem através do seu
corpo em movimento, e em relação ao seu mundo interno e externo. Está
relacionada ao processo de maturação, onde o corpo é a origem das
aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. É sustentada por três
conhecimentos básicos: o movimento, o intelecto e o afeto.
Psicomotricidade, portanto, é um termo empregado para uma concepção
de movimento organizado e integrado, em função das experiências vividas pelo
sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua
socialização( http://www.psicomotricidade.com.br).
Na Psicomotricidade o psíquico e o motor não são uma consequência
linear um do outro, são os dois componentes, complementares, solidários e
dialéticos, da mesma totalidade sistêmica, encarando o corpo e a motricidade
como componentes essenciais da estrutura psicológica do Eu, na medida em
que é na ação que o mesmo toma consciência de si próprio e do
mundo(FONSECA e MARTINS, 2007).
1.4- Definições
Atualmente ainda são utilizadas várias definições sobre a
Psicomotricidade. Ao longo dos anos elas foram se complementando. Cada
grande autor além de citar sua própria definição, não deixa de citar a de seus
mestres. Eis algumas, entre vários autores:
“Psicomotricidade é uma neurociência que transforma o pensamento em
ato motor harmônico. É a sintonia fina que coordena e organiza as ações
16gerenciadas pelo cérebro e as manifesta em conhecimento e aprendizado.
Psicomotricidade é a manifestação corporal do invisível de maneira visível”.
"A Psicomotricidade se conceitua como ciência da Saúde e da
Educação, pois indiferente das diversas escolas, psicológicas, condutistas,
evolutistas, genéticas, etc. ela visa a representação e a expressão motora,
através da utilização psíquica e mental do indivíduo." Prof. Dr. Júlio de
Ajuriaguerra
"A Psicomotricidade em seus meios e fins jamais se esquece da união
psico-afetivo-motora e atua sobre este conjunto, pois os transtornos
psicomotores têm as mais diversas manifestações". Profª. Drª. Gisele Soubiran
"Psicomotricidade é a ciência de síntese, que com a pluralidade de seus
enfoques, procura elucidar os problemas, que afetam as interrelações
harmônicas, que constituem a unidade do ser humano e sua convivência com
os demais". Profª. Drª. Dalila Costallat
"O trabalho psicomotor beneficia a criança no controle de sua
motricidade, utilizando de maneira privilegiada a base rítmica associada a um
trabalho de controle tônico e de relaxação cautelosamente conduzido." Prof. Dr.
Jean Le Boulch.
"A Psicomotricidade é a otimização corporal dos potenciais neuro, psico-
cognitivo funcionais, sujeitos as leis de desenvolvimento e maturação,
manifestados pela dimensão simbólica corporal própria, original e especial do
ser humano". Profª. Drª. Maria Beatriz da Silva Loureiro.
"A Psicomotricidade nos leva a abandonar em reabilitação,a visão
clássica e racional, onde o processo terapêutico é realizado só com a cabeça e
o corpo é visto como objetivo final. O conceito psicomotor emerge sobre o
17princípio de que o indivíduo conhece, comunica, aprende, opera e se adapta a
realidade externa, através de dois tipos de funções corporais que não podem
nunca ser separadas: a função tônica e a função motora. A função motora
através da ação e a tônica através da expressão qualitativa da ação." Prof. Dr.
Franco Boscaini
"A Psicomotricidade visa privilegiar a qualidade da relação afetiva, a
mediatização, a disponibilidade tônica, a segurança gravitacional e o controle
postural, à noção do corpo, sua lateralização e direcionalidade e a planificação
práxica, enquanto componentes essenciais e globais da aprendizagem e do
seu ato mental concomitante. Nela o corpo e a motricidade". Prof. Dr. Vitor da
Fonseca.(http://www.ispegae-oipr.com.br).
Para Picq e Vayer (1977), existe um estreito paralelismo entre o
desenvolvimento das funções motoras e o desenvolvimento das funções
psíquicas, e eles definem a psicomotricidade como a relação entre o
pensamento e a ação, envolvendo também a emoção.
18
Capítulo II
A Lateralidade
2.1- Antes da lateralidade, a linha média.
Ao nascimento, o neonato apresenta tônus flexor fisiológico, com seu eixo
orientado para alinha média. Este padrão é chamado por Beziers (1994) de
enrolamento, pois, quaisquer que sejam os movimentos do recém nascido ele
sempre passa e repassa por esse enrolamento-endireitamento, reagrupando-
se espontaneamente.
Antes de desenvolver a lateralidade, a criança deve estar orientada para a
linha média, onde o eixo corporal é o centro organizador do movimento
voluntário e da postura.
Desde o nascimento há registros das sensações corporais. Do reflexo
motor ao movimento voluntário, o percurso, não somente da construção do eixo
corporal, da orientação para a linha média, pode ser melhor organizado pelo
toque, pelo olhar do outro. Onde é evidente que exista o pressuposto de um
substrato biológico, uma integridade neurológica que permitam esses
acontecimentos (SANTOS, 2002).
Em torno do quarto mês a criança é capaz de levar as mãos à linha média
e contemplá-las, coordenadamente com a atitude da cabeça e do corpo. A
criança brinca com as mãos e é capaz de segurar um objeto, que é trazido à
boca, pode ser largado, o que embora ainda acontece casualmente na maioria
dos casos (FLEHMIG, 2000).
Levar as mãos à linha média para buscar um brinquedo pode ser
chamado de alcance, também denominada coordenação óculo-manual,
começa a se desenvolver no final do segundo e início do terceiro mês de vida
do lactente, estando completo aproximadamente no quarto mês de vida
(BRANDÃO, 1992).
19 O alcance é uma atividade primordial para o desenvolvimento motor,
sensorial, cognitivo e emocional, pois permite a exploração de objetos,
movimentação de segmentos corporais e a conquista exploratória do meio
(CARVALHO, 2004).
A noção de linha média do corpo, que depende da integração bilateral, é
uma aquisição básica à orientação no espaço e um instrumento fundamental
para a organização diferenciada de ações complexas, de onde emergem as
grandes aprendizagens humanas (FONSECA, 1995).
2.2- Histórias sobre a lateralidade
O termo lateralização vem do latim e quer dizer “lado”, e vem sendo
tema de estudo de muitos autores. Desde o “privilégio sagrado” da mão direita
como imperativo moral à rejeição da mão esquerda como “profana”,
“tenebrosa” e “oculta”, até as transcendências mitológicas e bíblicas, “o
universo tem um lado bom, forte e nobre e um lado mau fraco e reles”, “um
lado ativo e másculo e outro passivo e fêmeo, etc, as dicotomias não param de
surgir em várias fontes bibliográficas.
Muitas pessoas não integram que vivemos em um mundo orientado para
a direita; onde a mão sempre foi sinônimo de supremacia e conservação,
ligada desde sempre aos fatores da criação. Em todas as raças, em diferentes
culturas e em diferentes países, os seres humanos em grande parte usam a
mão direita para realizar as tarefas mais “precisas” e mais “nobres”. No Inglês
antigo, por exemplo, a mão direita é denominada como strong hand, e o termo
rigth é sinônimo de correto e de bom.
Em Espanhol, Alemão, Francês e Eslavo, o mesmo ocorre; em espanhol
o termo derecha quer dizer destra, que significa decente e conveniente.
Entretanto um significado bem diferente é dado para o termo esquerda. Sinister
hand, em inglês e em espanhol zurda, significam não ser inteligente. Em latim
20ou italiano, o termo sinistra quer eufemisticamente dizer ameaçadora,
demoníaca, desleal, desafortunada e descoordenada.
Em basco, escuerdi (esquerda) quer dizer “metade de uma mão”. Em
muitas línguas o termo “esquerda” significa oblíquo, virado, torcido, sujo, fraco
ou mau. Nas culturas indo-européias e greco-latinas, a significação da direita e
da esquerda atravessam esta dicotomia, que reflete o dualismo tradicional
(bem-mal, corpo-espírito, motor-psíquico, instinto-intelecto, arte-ciência,
mistério-lógica, magia-religião, emocional-racional, etc).
Vários são os exemplos, do uso do lado direito em inúmeros aspectos da
nossa experiência sócio-histórica, desde os rituais religiosos aos confrontos
nas guerras, à colocação dos talheres, às normas de etiqueta e de diplomacia.
Desde a pré-história, pois desenhos rupestres e egípcios são férteis em evocar
o uso da mão direita. A análise de ferramentas e armas paleolíticas, sugerem
que foram feitas por e para a mão direita (FONSECA, 1995).
A preferência de uma das mãos, é em grande parte condicionada
culturalmente e poderia ter sido também historicamente condicionada. Uma
pessoa sinistra teria tido uma desvantagem considerável quando as espadas
eram usadas do lado esquerdo. Ainda existe um pouco deste costume no
posicionamento europeu da mulher em relação a seu acompanhante
masculino, estando a mulher sempre do lado direito, sendo que isto era para
prevenir que a espada do homem fosse enrolada nas volumosas saias
femininas (ECKERT, 1993).
Estudos feitos em utensílios usados pelo homem na idade da pedra,
mostram que estes não utilizavam uma preferência manual particular, e que
havia um número igual de canhotos e destros. Foi na idade do bronze que
começou a surgir uma preferência pelo lado direito. Isto é explicado pelo fato
de que os camponeses tiveram que se adaptar a ferramentas que não eram
mais feitas por eles, mas por pessoas específicas.
Outra explicação para a predominância da destralidade, seriam as
técnicas de guerra, onde se ensinavam aos homens a pegar a espada ou a
21lança com a mão direita, enquanto a esquerda protegia o coração com o
escudo ( OLIVEIRA, 2001).
2.3- Lateralidade
A lateralidade é a propensão que o ser humano possui de utilizar
preferencialmente mais um lado do corpo do que o outro em três níveis: mão,
olho e pé. Isso significa que existe um predomínio motor, ou melhor, uma
dominância de um dos lados. O lado dominante apresenta maior força
muscular, mais precisão e mais rapidez. É ele que inicia e executa a ação
principal. O outro lado auxilia esta ação e é igualmente importante. Na
realidade os dois não funcionam isoladamente, mas de forma complementar.
Quando pregamos um prego em uma parede, a mão auxiliar segura o
prego enquanto a outra, com precisão e força muscular suficiente, bate o
martelo; quando escrevemos, uma mão segura a folha enquanto a outra
escreve, entre outros diversos exemplos(OLIVEIRA, 2001)
A lateralização manual surge no fim do primeiro ano, mas só se
estabelece por volta dos 4/5 anos (FONSECA, 1995).
Jocian (1998), afirma que a lateralidade é a capacidade motora de
percepção integrada do dois lados do corpo, sendo o elemento fundamental de
relação e orientação com o mundo exterior.
A leteralidade liga-se ao desenvolvimento do esquema corporal. A
predominância de um dos lados do corpo se faz em função do hemisfério
cerebral.
Só a partir do momento em que os movimentos se combinam e
organizam numa intenção motora é que se impõe e justifica a presença de um
lado predominante que irá ajustar a motricidade. A lateralidade da criança irá
impor-se com as experiências de complexidade crescente com que se defronte
(COSTE, 1977).
22Para Le boulch (1992), a lateralidade é função da dominância
hemisférica, tendo um dos hemisférios a iniciativa da organização do ato motor,
que incidirá no aprendizado e na consolidação das praxias; e que esta
capacidade funcional, suporte da intencionalidade, será desenvolvida de
maneira fundamental nessa época da atividade de investigação, durante a qual
a criança vai confrontar-se com seu meio.
Romero (1988), define a lateralidade como predomínio de um lado do
corpo sobre o outro, sendo utilizada com maior regularidade para referir-se à
predominância de uma mão sobre a outra, por ser mais frequente.
Para Negrine (1986) a lateralidade é por um lado uma bagagem inata, e
por outro, uma dominância espacial adquirida; e enfatiza que a lateralidade é
vista apenas quanto à habilidade da mão, do pé e do olho; e que a lateralidade
deve ser propiciada pela experiência vivida, sem influências que possam vir a
contrariar a dominância original. Já Romero (1988), coloca que a lateralidade
deve ser considerada também a nível auditivo. E segundo Negrine (1986) a
lateralidade corporal relaciona-se ao esquema do espaço interno do indivíduo,
que capacita a utilizar um lado do corpo com maior facilidade que o outro, em
atividades que exijam habilidade, caracterizando-se por uma assimetria
funcional.
Faria (2004) acredita que a lateralidade tem um determinante genético,
porém se estabelece de acordo com a educação, e que a definição da
lateralidade está diretamente relacionada com o conhecimento corporal, pois
entende por lateralidade o predomínio de um lado do corpo sobre o outro.
A lateralidade e a direcionalidade são duas características
desenvolvimentais que não podem ser dissociadas. Enquanto a primeira reflete
a dominância de uma parte do corpo sobre a sua outra parte equivalente, a
segunda diz respeito ao sentido de orientação no espaço, como conhecimento
de direita esquerda, de cima e de baixo, entre outros. Essas duas
características são, por sua vez, referência para a estruturação da consciência
corporal e da consciência espaço temporal (KREBS, 2004).
23Para Ajuriaguerra (1980), lateralização é a expressão de um predomínio
motor relacionado com as partes do corpo que integram suas metades direita e
esquerda, predomínio es te que por sua vez se vincula à aceleração do
processo de maturação dos centros sensório-motores de uma dos hemisférios
cerebrais.
Harrow (1983), define que lateralidade é a consciência interna que a
criança tem dos lados direito e esquerdo de seu corpo, não se tratando de um
conceito adquirido, mas de programas de atividades cuja finalidade é o
desenvolvimento de acuidades sensoriais e habilidades motoras, já que a
criança é exposta a uma grande quantidade de estímulos que aumentam esta
consciência. Como ela utiliza ambos os lados de seu corpo em muitos tipos de
atividades, desenvolve a eficiência nos movimentos e aumenta seu vocabulário
motor. Dominância lateral diz respeito ao lado do corpo que tem primazia em
uma determinada atividade. O hemisfério dominante do cérebro é oposto ao
lado dominante o corpo.
Coste (1992) coloca que é somente a partir do momento em que os
movimentos se combinam e se organizam numa intenção motora que se impõe
e justifica-se a presença de um lado do corpo predominante, que ajustará a
motricidade.
Fonseca (1995), afirma que a identificação da predominância seletiva de
um dos lados do corpo reflete a qualidade da integração sensorial, quer
intracorporal (vestibular e tátl-cinestésica), quer extracorporal (visual e
auditiva), daí sua importância na organização funcional da psicomotricidade e
na atividade mental superior; afirma também que a lateralização é
consequentemente um produto final da organização sensorial e um processo
central psicomotor, na medida em que o cérebro tem de processar primeiro
cinco sensações, antes de processar informações mais complexas – símbolos.
De acordo com Ayres (1977), a disfunção da integração bilateral pode
comprometer o desenvolvimento da dominância manual. Quando uma criança
não atinge a dominância manual numa idade adequada, a presença de sinais
disfuncionais intra ou inter-hemisféricos pode interferir com o desenvolvimento
24psicomotor e com o potencial cognitivo. A criança percebe seu próprio corpo
por meio de todos os sentidos.
Meur e States (1989), destacam a existência de três tipos de
lateralidade:
a) lateralidade homogênea – a criança é destra ou canhota do olho, ouvido, da
mão e do pé;
b) lateralidade cruzada – a criança é, por exemplo, destra do olho e da mão, e
canhota do pé.
c) ambidestra – a criança é forte tanto do lado direito quanto do lado esquerdo.
Coste (1992) define quatro tipos de lateralidade:
a) destralidade verdadeira – a dominância cerebral encontra-se à esquerda;
b) sinistralidade verdadeira – a dominância cerebral está à direita;
c) falsa sinistralidade – é o caso em que o indivíduo adota a sinistralidade em
consequência de uma paralisia ou de uma amputação, que tornou impossível a
utilização do braço direito;
d) falsa destralidade – é o caso em que a organização é inversa da observada
na falsa sinistralidade
2.4- Hipóteses sobre a prevalência manual
2.4.1 – Hereditariedade
Esta teoria tenta explicar a preferência lateral pela transmissão
hereditária.
Chamberlein fala em uma predisposição herditária. Trankell acredita em
uma hereditariedade do tipo mendeliano, tendo a destralidade um caráter
dominante, embora cientificamente não tenha sido provada esta hipótese.
25Zazzo estudou gêmeos homozigóticos e, segundo sua teoria, deveriam
ter a mesma dominância, só que isto não foi verificado em todos os casos. Aqui
há a questão, se a ação educativa poderia ter exercido influência sobre eles.
Este tipo de transmissão ainda permanece desconhecido. Para muitos
pesquisadores com Ajuriaguerra e Guillarme o fator hereditário não deve ser
rejeitado, mas também não se pode considerá-lo como desempenhando um
papel único (OLIVEIRA, 2001).
2.4.2 – Hipótese da dominância cerebral
Segundo esta teoria, existe uma dominância em um dos lados do
cérebro, e que funciona de forma cruzada. Isto quer dizer que, no destro,
encontramos uma dominância do córtex cerebral esquerdo; e no canhoto, o
hemisfério cerebral direito controla e coordena as atividades do lado esquerdo.
Esta conclusão foi tirada dos estudos realizados por Broca em indivíduos
afásicos; onde afasia significa a perda da capacidade de usar e compreender a
linguagem oral e escrita. Ele verificou que um distúrbio no hemisfério cerebral
esquerda provocaria um prejuízo na linguagem e uma paralisia do lado
direito(hemiplegia). Existiria, portanto, uma correlação entre a preferência
lateral e domínio hemisférico (OLIVEIRA,2001).
2.4.3 – Influência do meio
Segundo esta hipótese, a preferência por uma determinada lateralidade
se dá através do aprendizado. Aprendemos a escrever com a mão direita ou
esquerda, de acordo com o nosso meio, seja por imposição, por imitação, por
questão afetiva, etc. Segundo este raciocínio, então, não deveria haver
problema algum oriundo da escolha da mão preferencial, o que não se verifica
(BUENO,1998).
26
2.5 - Diferença entre a lateralidade e o conhecimento esquerda-
direita.
A lateralidade é a dominância de um lado em relação ao outro, a nível de
força e precisão , e conhecimento esquerda/direita é o domínio dos termos
direito e esquerda.
O reconhecimento direita-esquerda, refere-se ao poder discriminativo e
verbalizado que a criança tem do seu corpo, como um universo espacial
interiorizado e socialmente mediado.
A criança para poder aprender, necessita de uma noção do corpo
interiormente conscientizada dos dois lados do corpo e das suas diferenças e
posições relativas. Não basta ter aprendido que um lado é direito e o outro é
esquerdo, é preciso manter as relações entre ambos De forma controlada e
discriminada.
Sem a noção do corpo reconhecida na sua lateralidade interna e externa
não é possível estabelecer relações corretas com o mundo em redor. Tem de
se dar no interior do corpo a conscientização da noção de direita e esquerda
para projeta-la fora do organismo e, consequentemente, para a orientar
direcionalmente e espacialmente (FONSECA, 1995).
27
CAPÍTULO III
O Esquema corporal
A de Meur e States (1989), relatam que a criança percebe-se e percebe
os seres e as coisas que a cercam, em função de sua pessoa. Sua
personalidade se desenvolverá graças a uma progressiva tomada de
consciência de seu corpo, de seu ser, de suas possibilidades de agir e
transformar o mundo à sua volta, com isso a criança se sentirá bem na medida
em que seu corpo lhe obedece, em que o conhece bem, em que pode utilizá-lo
não somente para movimentar-se, mas também para agir.
Logo uma criança que se sinta bem disposta em seu corpo, e capaz de
situar seus membros uns em relação aos outros, fará uma transposição de
suas descobertas: progressivamente localizará os objetos, as pessoas, os
acontecimentos em relação a si, depois entre eles.
Toda evolução é marcada por uma conscientização progressiva do
próprio corpo, como uma realidade distinta do meio circundante. Até os 6
meses, a criança sente prazer em descobrir por acaso as partes do seu corpo
tocando nelas; aos 10 meses, a criança situa um objeto colocado sobre as
partes móveis do seu corpo (mão, perna), mas é incapaz de localizá-lo sobre
as partes imóveis; a sua sensibilidade ainda está muito pouco elaborada. É
graças às manipulações a que os outros submetem o seu corpo que a criança
o identificará gradualmente; ela realiza os seus primeiros movimentos através
do movimento do outro, depois é em virtude da imagem do outro em
movimento que ela aprende a mover-se. Assim, o esquema corporal é
resultado da experiência do corpo do qual o indivíduo toma pouco a pouco
consciência e da maneira como o corpo se põe em relação ao meio (COSTE,
1992).
Para Vayer (1984), “esquema corporal é a organização das sensações
relativas ao seu próprio corpo, em relação com os dados do mundo exterior”.
28 Le Boulche (1992) relata que a maioria dos autores utilizam dois
conceitos, o de esquema corporal e o de imagem corporal, partindo de
posições dualistas.. Afirma que a ambiguidade trazida por esta dupla
terminologia cria a impressão de que existiria um corpo neurológico e um corpo
espiritual, e teria que se fazer um esforço para unir os dois corpos; e que
alguns psicanalistas, em especial os seguidores de Melaine Klein, preferem
usar o conceito “imagem do corpo” como propriedade da psicologia, deixando
aos neurologistas a expressão “esquema corporal”, de ressonância mais
mecanicista. Entretanto, Leboulch não aceita esta alternativa; ele acredita que
a confusão já existe quando se usa o termo imagem do corpo, sendo evidente
que o corpo material e subjetivo é o centro deste conflito.
Le Boulch, citado por Oliveira (2001), propõe três etapas do esquema
corporal:
1ª Etapa – Corpo Vivido (até 3 anos de idade)
Esta etapa corresponde à fase da inteligência sensorio-motora de
Jean Piaget. Um bebê sente o meio ambiente como fazendo parte dele mesmo.
Não tem a consciência do “eu” e se confunde com o espaço em que vive. À
medida em que cresce, com um maior amadurecimento de seu sistema
nervoso, vai ampliando suas experiências e passa, pouco a pouco, a se
diferenciar de seu meio ambiente. Nesse período a criança tem uma
necessidade muito grande de movimentação e através desta vai enriquecendo
a experiência subjetiva de seu corpo e ampliando a sua experiência motora.
Suas atividades iniciais são espontâneas, isto é, não pensadas.
De início, portanto, a criança passa pela fase de vivência corporal.
Ela corre, brinca, trabalha seu corpo. Essa etapa é denominada pela
experiência vivida pela criança, pela exploração do meio, por sua atividade
investigadora e incessante. Ela precisa ter suas próprias experiências e não se
guiar pelas do adulto, pois é pela sua prática pessoal, pela sua exploração que
se ajusta, domina, descobre e compreende o meio. Este ajuste significa que a
criança mesmo sem a interferência da reflexão, adequa suas ações às
29situações novas, isto é, desenvolve uma das funções mais importantes que é a
“função de ajustamento”. A criança adquire também uma verdadeira memória
do corpo a qual, por sua vez, é responsável pela eficácia dos ajustamentos
posteriores.
2ª etapa – Corpo Percebido ou descoberto (3 à 7 anos):
Corresponde à organização do esquema corporal devido à
maturação da “função de interiorização”, aquisição esta de imensa importância
porque auxilia a criança a desenvolver uma percepção encontrada em seu
próprio corpo.
A função de interiorização permite também a passagem do
ajustamento espontâneo, citado na primeira fase, a um ajustamento controlado
que por sua vez, propicia um maior domínio do corpo, culminando em uma
maior dissociação dos movimentos voluntários. A criança com isso passa a
aperfeiçoar e refinar seus movimentos adquirindo uma maior coordenação
dentro de um espaço e tempo determinado.
A criança percebe as tomadas de posições e associa seu corpo
aos objetos da vida cotidiana. Ela chega a representação metal mental dos
elementos do espaço e isto é possível graças à primeira fase de descobertas e
experiências vividas pela criança. Ela descobre sua dominância e seu eixo
corporal. Passa a ver seu corpo como ponto de referência para se situar e
situar os objetos em seu espaço e tempo. Este é o primeiro passo para que ela
possa, mais tarde, chegar à estruturação espaço-temporal.
A criança passa a ter acesso a um espaço e tempo orientado à
partir de seu próprio corpo, chegando assim à representação dos elementos do
espaço, descobrindo formas e dimensões. Neste momento assimila conceitos
como embaixo, acima, direita, esquerda.
303ª etapa: Corpo Representado ( 7 a12 anos).
Nesta etapa observa-se a estruturação do esquema corporal. Até
este momento, a criança já adquiriu as noções do todo e das partes do seu
corpo (que é percebido através da verbalização e do desenho da figura
humana), já conhece as posições e consegue movimentar-se corretamente no
meio ambiente com um controle e domínio corporal maio. A partir daí, ele
amplia e organiza seu esquema corporal.
No início desta fase a representação mental da imagem do corpo
consiste numa simples imagem reprodutora. É uma imagem do corpo estática e
é feita da associação estreita entre os dados visuais e cinetésicos. A criança só
dispõe de uma imagem mental do corpo em movimento a partir de 10/12 anos,
significando que atingiu uma representação mental de uma sucessão motora.
Neste período a imagem do corpo passa a ser antecipatória, e
não apenas reprodutora, revelando um verdadeiro trabalho mental, devido à
evolução das funções cognitivas. Logo, a imagem do corpo representado,
permite a criança de 12 anos dispor de uma imagem de corpo operatório, que é
o suporte que a permite efetuar e programar mentalmente suas ações em
pensamento. Torna-se capaz de organizar, de combinar as diversas
orientações.
Le Boulch apresenta outro fator, correspondendo ao estágio das
operações concretas, que é a passagem da centralização do corpo, isto é, da
percepção de um espaço orientado em torno do corpo próprio à
descentralização, à representação mental de um espaço orientado, onde o
corpo está situado como objeto; quer dizer, os pontos de referência não estão
mais centrados no corpo próprio, mas são exteriores ao sujeito, podendo ele
mesmo criar os pontos de referência que irão orientá-lo (OLIVEIRA, 2001).
De acordo com Fonseca (1995) o esquema corporal deve ser
reconhecido como resultante da organização do input sensorial tátil-
31cinestésico, vestibular e proprioceptivo, numa imagem interiorizada e
estruturada, de onde emerge uma representação mental, que em si, constitui-
se num marco de referência que precede todas as relações com o exterior. O
autor relata também a importância da propriocepção, pois com uma
propriocepção difusa, desintegrada e vulnerável exige que os movimentos se
realizem com mais vigilância e com mais controle visual.
Para Henry Wallon, a emoção é o elemento inicial para a consciência,
considerando a emoção manifestações orgânicas eliciadoras de significados.
Desta forma, as sensações do corpo vão permitindo ao indivíduo despertar sua
sensibilidade para um mundo externo a si próprio, que vai sendo incorporado à
sua consciência por meio da crescente apreensão de suas partes corporais.
Onde, embora reconhecidas e individualizadas, as partes do corpo não são
imediatamente integradas pelas crianças em sua individualidade física, e ao
individualizar seus próprios órgãos, a criança sabe apenas justapô-los a si
mesma.
Wallon refere também, que a sensibilidade cutânea parece ser
fundamental para a constituição do esquema corporal. A criança entre os
quatro meses e um ano e pouco parece sentir um grande interesse em apalpar
a si mesma. Em primeiro lugar leva as mãos à boca, após três ou quatro
semanas ao peito e por volta dos nove meses às coxas. Ao descobrir dessa
maneira seus órgãos, tratando-os muitas vezes como objetos estranhos, como
no caso de crianças que mordem o próprio braço e gritam assustadas pela dor
sentida.
Antes de andar, entre nove e dezenove meses, a criança faz dos pés
brinquedos, demonstrando que, enquanto não descobre e faz uso de uma parte
de seu corpo, este tem para ela uma espécie de exterioridade e
individualidade. A criança apresenta curiosidade e alegria nas suas
aprendizagens perceptivas e motoras conseguidas por meio de investigações
sobre si própria e sobre os objetos que a rodeiam. Não pode haver
identificação do próprio corpo sem identificação simultânea dos objetos
exteriores a ele. Para delimitar seu domínio, o desenvolvimento cinestésico tem
32necessidade de referências no desenvolvimento visual. Embora distintos, os
dois processos são complementares no domínio das formações psíquicas.
Com isso, Wallon afirma, que para cada indivíduo certos sistemas sensoriais
de referência podem prevalecer sobre outros, originando grandes diferenças
individuais, e conclui que o domínio do esquema corporal pode ser
considerado, como alongando-se do domínio cinestésico ao domínio visual,
resultando das relações do indivíduo com o meio, sendo sua extensão
correspondente à diversidade das experiências vividas por cada indivíduo
(AZEVEDO, 2002). Wallon refere-se ao esquema corporal não como uma
unidade biológica ou psíquica, mas como uma construção, elemento de base
para o desenvolvimento da personalidade da criança (FONSECA).
O esquema corporal não é um conceito aprendido, que se possa
ensinar, pois não depende de treinamento. Ele se organiza pela experenciação
do corpo da criança. Ele é uma construção mental que a criança realiza
gradualmente, de acordo com o uso que faz de seu corpo. É um resumo e uma
síntese de sua experiência corporal (OLIVEIRA, 2001)
O conhecimento do próprio corpo não depende unicamente de
desenvolvimento cognitivo, mas também da percepção, formada tanto de
sensações visuais, táteis, sinestésicas e, também, em parte da contribuição da
linguagem, que ajuda a precisar os conceitos, estabelecendo a distinção entre
seu eu e o mundo exterior. Paralelamente ao conheciento e à interiorização do
resto do esquema corporal, aparece e se define a lateralidade.
“O esquema corporal é um elemento básico indispensável para a
formação da personalidade da criança. É a representação relativamente global,
científica e diferencia da que a criança tem de seu próprio corpo.”
WALLON, 1968.
HAYWOOD e GETCHELL (2004), afirmam que a lateralidade é a
consciência de que o corpo tem dois lados distintos, que podem se mover
independentemente, tratando-se de um componente da consciência corporal.
33 Jocian Bueno (1998), resume as características do esquema corporal e
da lateralidade, como ocorrendo em conjunto:
• Com dois anos a criança começa a adquirir a noção de sua totalidade
corporal, adquirida por meio da experiência sensório motora típica da
idade. Começa a integrar a noção de seu corpo e nomear suas partes.
• Com três anos começa a apresentar sua tendência à dominância do
hemisfério cerebral.
• Com quatro anos tem consciência do seu eixo e de que possui dois
lados, como também membros superiores e inferiores. Já tem noção de
sua frente e costas. Consegue reproduzir a figura humana de forma
compreensível. Orienta-se no espaço em diversos sentidos e diferentes
posições, reproduzidos em novos movimentos.
• Com seis anos já é capaz do conhecimento de direita e esquerda em si
mesma e de executar movimentos e atividades com os membros
superiores e inferiores. Já brinca com os jogos de orientação simples e
com pontos de referência diferentes, começando a cruzar instruções e
transpor para o papel. Na fase de cinco a sete anos, em relação ao
esquema corporal, consegue expressar diferentes posições no corpo,
relacionar objetos a partes do mesmo e reproduzir movimentos e
atividades de mímica.
• Aos sete anos começa a projetar a noção de lateralidade no espaço.
• Com oito anos consegue projetar a lateralidade no outro, atingindo a
reversibilidade.
34
Conclusão
A criança conhece e descobre o mundo Através do corpo, é por ele que
ela experimenta sensações e as demonstra. Ela necessita de uma boa entrada
das percepções para responder adequadamente aos estímulos, e com uma
integração sensorial adequada terá uma maior capacidade de interagir com o
meio que a cerca.
Concluímos, após uma ampla pesquisa bibliográfica, que a criança
precisa assimilar que tem dois lados em seu corpo, “duas mãos” que podem
agir juntas ou separadas, antes de definir qual a melhor “perna para chutar
aquela bola”. A lateralidade e o esquema corporal desenvolvem-se na criança
de forma concomitante e interdependente, devendo ser desta forma, encarados
como um fator psicomotor único e essencial.
35
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38
Índice
Folha de Rosto 2
Agradecimentos 3
Dedicatória 4
Epígrafe 5
Resumo 6
Metodologia 7
Sumário 8
Introdução 9
CapítuloI
1- A Psicomotricidade 11
1.1- Um breve histórico 11
1.2- Por que Psicomotricidade? 14
1.3- O que é a psicomotricidade? 14
1.4- Definições 15
Capítulo II
2- A Lateralidade 18
2.1- Antes da lateralidade, a linha média 18
2.2- Histórias sobre a lateralidade 19
2.3- Lateralidade 21