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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
UM PARALELO ENTRE DANÇA E A ARTE
DO CONSUMO DA CALÇA JEANS;
DA MINERAÇÃO À ALTA COSTURA:
DIESEL – UM ESTUDO DE CASO
Por: Silvia Regina Prado dos Anjos
Orientador
Prof. Ms. Nilson Guedes de Freitas
Niterói
2004
2UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
UM PARALELO ENTRE DANÇA E A ARTE
DO CONSUMO DA CALÇA JEANS;
DA MINERAÇÃO À ALTA COSTURA:
DIESEL – UM ESTUDO DE CASO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Marketing no Mercado Globalizado.
Por: Silvia Regina Prado dos Anjos.
Niterói
2004
3AGRADECIMENTOS
A realização desta monografia contou
com a generosa atenção dos colegas,
professores e coordenadores do curso;
e o carinho dos amigos e familiares.
Mui valiosa foi a oportunidade de
estágio, que me foi oferecida pela Cia.
Têxtil Ferreira Guimarães.
A todos, meu agradecimento sincero.
4DEDICATÓRIA
Este trabalho é dedicado aos meus
irmãos e sobrinhos, que continuamente,
me acordam na busca dos valores
humanos de ser.
5RESUMO
Neste momento em que as atenções mercadológicas voltam-se na busca por modos flexíveis de pensar e, considerando como diretriz básica a arte humana da efemeridade, a dança, simbolicamente de origem divina – abordada, através da pesquisa bibliográfica de autores como Rudolf Laban e Maribel Portinari, livre de técnicas, escolas ou estilos particulares – em paralelo com uma análise estratégica sobre o processo de criação de valores de mercado o produto específico: calça Jeans da marca Diesel, esta monografia tem por objetivo geral a proposição de um modo de percepção de determinados valores de consumo, que reflitam a afirmação do ser humano como origem, meio e fim – destino – para o próprio mercado de consumo; portanto, utilizando-se da experiência do movimento do corpo que admite um modo de pensar fluente em forma e imagem simultaneamente, na expressão da dança investiga o processo dinâmico de criação, comunicação e marketing de um corpo-imagem-produto, apoiada, ainda, pela pesquisa virtual (sites da Aberje; da Diesel; da Levis) e pelo conceito de Antropomarketing criado por Clemente Nóbrega, sobre marketing e a natureza humana, que torna possível a verificação da hipótese de uma agregação de valores de transcendência poética ao produto, como uma propriedade paradoxal (tanto de posse material, quanto de uma essencialidade intangível) contextualizada no rito do consumo do Jeans da marca Diesel que, assim, incorpora, no sentido de dar e receber um corpo, o universo da marca ao sistema próprio de valores do consumidor.
palavras-chaves: Diesel. Jeans. consumo. dança. criação.
6EPÍGRAFE
“COMO CONHECERÁS SUA NATUREZA OCULTA?”
ELE RESPONDEU: “SENTO-ME DIANTE DELE EM SILÊNCIO,
E FAÇO DA PACIÊNCIA UMA ESCADA PARA SUBIR MAIS ALTO.
E SE EM SUA PRESENÇA JORRAR DE MEU CORAÇÃO UM DISCURSO
ULTRAPASSANDO ESSE REINO DA ALEGRIA E DO PESAR,
SABEREI QUE ELE MO ENVIOU DAS PROFUNDEZAS DE UMA ALMA ILUMINADA.
O DISCURSO DE MEU CORAÇÃO VEM DAÍ, POIS HÁ UMA JANELA
ENTRE O CORAÇÃO E O CORAÇÃO”.
– JALÂL AL-DÎN-RÛMÎ
7SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
1. TEMPO – ESPAÇO – CORPO – PRODUTO 11
2. “DIESEL FOR SUCCESSFUL LIVING” 18 (DIESEL POR UM VIVER BEM SUCEDIDO)
3. IMANTAÇÃO: O PRODUTO EM TRANSCENDÊNCIA 25
CONCLUSÃO 32
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 35
ANEXOS 37
ÍNDICE 40
FOLHA DE AVALIAÇÃO 42
8INTRODUÇÃO
A realidade atual apresenta imagens, conceitos, pensamentos, palavras
que se tocam, que interagem sob diversos aspectos: estético, científico,
filosófico, mítico, místico e poético.
A imagem da mitologia hindu da dança de Shiva transmite a luz do
conhecimento dinâmico e equilibrado – múltiplo em unidade. Criação e
destruição, em perpétua mudança e toda sua complexidade.
Clemente Nóbrega (2002, p.09) propõe o estudo da natureza do ser
humano, como base ao sucesso dos empreendimentos mercadológicos na era
do digital.”Para ser bom em marketing, você tem de entender os dois “futuros”
– o do desejo e o do destino...Ser humano é destino e desejo.” E complementa,
mostrando que a “chave, é claro, é entender o que o ser humano valoriza, pois
é por essas coisas que ele estará disposto a pagar” (NÓBREGA, 2002, p.33).
No século XVI, Levi Strauss criou uniformes para mineradores de ouro, na
América do Norte. Este produto transformou-se em calça Jeans, entrando para
o mercado de consumo, com um fim utilitário.
Porém, no decorrer de sua trajetória abarcou diversos segmentos de
mercado, inclusive, o da moda de alta-costura. Os dados da Associação
Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção marcam um recorde nas
negociações do setor, em 2003, quando 400 milhões de metros lineares de
tecido (denim) foram transformados em Jeans. Observa-se que a utilização da
tecnologia tem compactuado no reposicionamento deste produto no mercado,
fornecendo o suporte preciso às inovações . “O jeans tornou-se mais leve, mais
confortável e muito mais receptivo à ousadia dos criadores”, diz Fernando
Valente Pimentel, coordenador do Comitê dos Produtos Índigo da Abit”
(ROVERI, 2004, p.112). A marca Diesel criada em fins dos anos 70 teve um
importante papel neste processo.
9Logo, admitindo ser possível traduzir em signos de comunicação a
experiência direta de um ato criador surge a questão norteadora desta
monografia: que tipo de valores pode ser agregado a um produto, sem macular
sua originalidade?
Assim, através da utilização da metodologia de pesquisa bibliográfica e
pesquisa virtual, concentrando as áreas da Mercadologia (Marketing) e
Epistemologia da Arte (Dança – processo de criação) buscar-se-á a resposta
para a pergunta acima formulada. Outrossim, será adotada a hipótese de que
investir na valorização do ser humano, quanto um ser criativo – criador
(transforma o ambiente) e criatura (transforma-se pelo ambiente) – é um fator
imprescindível para que um produto, uma marca, uma empresa permaneçam
prósperos e saudáveis, em meio a tantas imprevisibilidades, do atual mercado
globalizado, conectado em ambientes de rede de informações.
Esta pesquisa visa destacar a possibilidade de uma ‘ligação iônica’ entre
Dança e Marketing. Corpo em movimento e produto – Jeans da marca Diesel
atuando como polaridades de um certo campo de forças, que ao serem
consumidos realizariam a experiência de uma transcendência poética às
limitações formais da matéria. Destarte, propõe uma reflexão sobre tipos de
valores que admitem uma incorporação da especialidade do Jeans da Diesel
para traduzirem-no como um representante de um processo de globalização do
mercado de consumo.
A partir do ponto de vista de Al Ries e Jack Trout (1992) sobre “como a
mídia faz sua cabeça”, o capítulo primeiro focalizará o paralelo entre corpo em
movimento e produto (calça Jeans) como campo de significações.
Apresentando mitos e fatos sobre a origem e história da dança e do
Jeans desenvolver-se-ão diálogos tecendo o tempo no espaço; corpo e
produto, a fim de estabelecer uma fluência de imagens em movimento e
materializar o ato da criação numa dinâmica de comunicação.
10Identificar os múltiplos sistemas de valores de consumo face ao
processo de criação da imagem – corpo para o produto (calça Jeans da marca
Diesel) se tornará o alvo do segundo capítulo. O Marketing da Diesel será
confrontado com a abordagem de McCracken (2003) sobre o “caráter simbólico
dos bens e das atividades de consumo”.
O terceiro capítulo será dedicado à reflexão sobre a relação do produto
com os valores que a ele são agregados. Incluindo o pensamento filosófico de
Langer e de Capra investigar-se-á, a um só tempo, as relações do movimento
do corpo, com o produto, ambos limitados no plano físico e abertos em
comunicação; como um movimento captura a fugacidade do tempo e revela o
sentido de uma fluidez que estrutura. Limites que promovem liberação ao
compreender a unidade em multiplicidade.
Toda uma sucessão de imagens amalgamadas em síntese, transmite ao
corpo-produto em formações vibrantes, o instante do mergulho no cerne de seu
desejo de consumo. Um mergulho em direção à superfície.
Um vácuo de infinito;
A confirmação de vastidão.
111. TEMPO – ESPAÇO – CORPO – PRODUTO
Mas será a mudança capaz de se manter atualizada com a mudança? Novos produtos, novos serviços, novos mercados e até novos veículos estão nascendo constantemente. Atingem a maturidade e entram em declínio. E começa um novo ciclo...A mudança é uma onda no oceano do tempo (RIES, 1993, p.161-162).
A rapidez dos processos contemporâneos põe em xeque valores,
alterando sistemas de crenças e a relação de poderes.
Uma imagem preenche a lembrança de que, todo instante é um ponto
que brilha e se faz remoto na imensidão.
Um mundo em constante mudança exige o retorno a reflexões sobre o
sentido e a origem da vida, em todos os setores da sociedade.
Idéias formam imagens … sentimentos movimentos.
Como tecer a fluência das imagens em movimento?
Marketing tem que sintetizar dados de áreas distintas (demografia, estilos de vida, tecnologia...) em propostas que façam sentido. Isso se faz através de linguagens competentes para gerar respostas; engajar as pessoas em diálogos. Essas mensagens não são apenas “comunicação” no sentido de propaganda. São também formas novas de se oferecer velhos produtos...torná-los novos por meio de novos processos e conceitos de produção...o que eu chamo de mensagem é isto: conceitos, arranjos sistemas, que, por alguma razão motivam as pessoas a comprar (NÓBREGA, 2002, p.27).
A calça Jeans, apresenta uma peculiaridade: apesar de ter sido
confeccionada para ser uniforme de trabalho de mineradores, na sua origem,
este produto rompeu com as limitações dos padrões.
Imagens de liberdade, autenticidade, conquistas parecem uma constante
expressão da calça Jeans junto a seus consumidores. A posição que ocupa no
mercado de consumo sugere o Jeans como um símbolo do processo de
globalização; “o descolado uniforme de ricos e de pobres, homens e mulheres,
jovens e idosos, patricinhas e clubbers, manos e mauricinhos, e no de qualquer
12outra tribo que a imaginação humana seja capaz de batizar” (ROVERI, 2004,
p.110).
A arte da dança perpetua um instante de intensa, ou ainda, de total
adesão dos movimentos corporais – em forma e em imagem, em pensamento
e sentimento – e sua libertação expressiva.
Buscar dados sobre a origem da dança, como um produto do corpo em
movimento e do produto calça Jeans que traduzam a experiência direta de um
processo de criação, em signos de comunicação é o objetivo deste capítulo.
1.1 Tempo-espaço
Através dos tempos, o corpo tem servido para perpetuar e expressar em
movimento, em dança, em produto, impulsos primitivos, indignação e exaltação
dos acontecimentos de uma realidade em ciclos constantes; beleza, harmonia,
a força da natureza, os fatos, os símbolos e mitos, assim como, para criar uma
comunicação entre os diversos povos e, até mesmo, uma comunhão com
dimensões obscuras, sagradas ou profanas.
Austin (1975, p.15) observa que, “In Greek vases and friezes the dance of
that civilization are immortally preserved; they are full of movement...this sense
of movement caught in stillness” (As danças da Grécia Antiga ficaram, até hoje,
imortalizadas em imagens gravadas em vasos e frisos; são imagens repletas
de movimento…expressando o sentido de um movimento apreendido na
imobilidade).
No Japão, a origem da dança vincula-se aos ciclos do cultivo agrícola.
O movimento do ciclo das estações - muito distinto, em certas regiões está
caracterizado na gestualidade metamorfoseante da dança da borboleta.
Danças ancestrais na China utilizavam em sua indumentária mangas
excessivamente longas, que se alongavam além das mãos como uma forma de
extensão, de transcendência do corpo em movimento.
13Na Europa renascentista, as danças clássicas, também conhecidas
como danças de corte surgiram dos movimentos naturais de danças populares,
que contavam histórias dos costumes e modos regionais e que passaram por
um refinamento e um regulamento básico para serem enquadrados nos moldes
do desenvolvimento das artes de tal época.
Diálogos com o ritmo e com o espaço, suas cores, seus tons, seus
sabores produzem uma qualidade de atenção que transfigura o corpo físico,
material em uma unidade dinâmica, sensível e criativa.
1.1.1. Mente sã em corpo são: um símbolo de unidade.
Na Cultura Indiana a dança é concebida como origem divina. O deus
supremo Brahma presenteou o lendário sábio Bharata, (criador mítico das artes
de representação) com a dança, tanto para a alegria, quanto para promover a
disciplina, o respeito e a sabedoria entre os homens. O próprio vocábulo
Bharata representa um acrônimo composto pelas sílabas iniciais dos três
aspectos vitais das artes de representação indianas, que são: Bhavam -
expressão da emoção; Ragam - melodia; Talam - ritmo. Os deuses dançam.
Os homens contam suas histórias aprendendo com eles a dançar.
…A dança de Shiva é o universo que dança, o fluxo incessante de energia que permeia uma variedade infinita de padrões que se fundem uns nos outros...Partículas diferentes desenvolvem padrões diferentes em sua dança, demandando quantidades diferentes de energia, razão pela qual possuem massas diferentes. As partículas virtuais, por fim, não são apenas uma parte essencial de todas as interações de partículas e da maioria das propriedades das partículas, mas também são criadas e destruídas pelo vácuo (CAPRA, 1983, p.184-185).
Com sua dança, Shiva manifesta-se sobre o demônio da ignorância. Cria
o mundo iluminado com seu fogo, que revela o conhecimento. E redimensiona
sua graça, por meio de múltiplas mãos — asas, talvez, bem aventurando seus
semelhantes. Shiva Nataraja representa, dentro deste contexto, o senhor da
dança e do universo.
14O templo de Shiva conhecido como Chidambaram ou Thillai, é o teatro
no qual sua dança cósmica se apresenta e simboliza a um só tempo o corpo
humano e o universo; a imagem da unidade em diversidade.
1.1.2. Corpo em poeisis
Para os povos indígenas brasileiros, a dança não encontra possibilidade
de existência fora da música. Corpo, música e dança inserem-se no contexto
mágico e ritualístico da vida da tribo como um todo em que não é possível
delimitar ou separar suas fronteiras. Seria como um organismo único que
separado, simplesmente, não pode mais ser compreendido.
A dança é canto. A dança é corpo. A dança está no canto do corpo.
Por analogia, o corpo seria como uma unidade rítmica de um compasso
musical: inteiro em si mesmo - a nota, e também parte da totalidade absoluta -
o compasso, em que o movimento exterior (pressão sobre a corda), se funde
no movimento interior (vibração da corda) determinando um terceiro
movimento, o movimento da unidade (som) – o corpo que dança.
As limitações da matéria, as forças físicas que incidem sobre suas formas
são forças que contêm seu movimento próprio. Olhar, pensar, sentir o corpo
está na sua dança, que testemunha conhecimentos universais; corpo
potencialmente criador, poeticamente unificador.
Corpo que é história, universo, vida; que é arte, artifício e artefato.
1.2. Corpo-Produto
A calça Jeans, no mercado de consumo, cumpre uma trajetória mágica. É
surpreendente constatar que o Jeans, como um produto de consumo adquire
uma vida, um corpo, continuamente, em ciclos de renovação.
Há mais de um século está presente nas prateleiras, nas vitrines, na
mídia, nos uniformes, nos guarda-roupas, nos hábitos de vestir, na moda que
restringe e no estilo que liberta.
15...a revolução da informação não vai nos levar a nada
‘revolucionário’, vai, isto sim, nos conduzir de volta ao passado. Ela vai é nos aproximar cada vez mais daquilo que nos formou. Sucesso em marketing na era digital vai ter de se basear na descoberta de novos ângulos para apelar à nossa velha natureza humana (NÓBREGA, 2002, p.96).
O produto calça Jeans parece dominar a arte de permanecer vivo, no
mercado de consumo, atravessando os períodos de mudanças sociais,
conservando as características básicas do estilo, que o consagrou.
1.2.1. Origem da palavra Jeans
A cidade italiana de Gênova, conhecida como ‘Genes’ pelos franceses –
cuja pronúncia nas línguas ocidentais soa como ‘jeans’ – no século XVI
produzia um tecido de algodão similar a uma sarja, com o qual eram
confeccionados os uniformes dos marinheiros e camponeses europeus.
A associação do produto (uniformes) ao nome da cidade de sua
procedência parece ter sido, desde então, um modo de incorporação do nome.
1.2.2. A calça Jeans
A calça Jeans surgiu no mercado de consumo quando Oscar Levi
Strauss, vindo da Bavária decidiu vender um produto para os mineradores, que
corriam em busca do ouro, no continente norte-americano.
A mente humana percebeu que podia pegar fatos soltos e desconexos – os dados daquele ambiente em que viviam – e recombiná-los segundo um novo padrão, reconfigurá-los de forma nova e criativa, de modo que gerassem um novo efeito. Um efeito surpreendente (NÓBREGA, 2002, p. 79).
Assim, ele utilizando um tecido similar ao dos uniformes dos marinheiros
europeus desenvolveu calças com estilo específico – com costuras duplas,
para serem resistentes, fortes e com grande durabilidade; e um corte que
acompanha as linhas do corpo.
16Denominado “overalls”, este estilo de calças adotou o nome Jeans,
definitivamente, em 1960, quando já era um dos produtos mais requisitados
pelo público jovem, de então.
O tecido utilizado foi o Denim.
Produzido, a partir de um processo de construção de dois fios 100%
algodão – trama e urdume, este tecido plano recebeu, posteriormente, um
tingimento que lhe deu a coloração azul-índigo ou anil.
Deste modo surgia o Denim Índigo Blue.
O corante índigo é um dos corantes naturais mais utilizados, pela indústria
têxtil. Naturalmente, é preparado a partir da colocação de plantas (indigofera
tinctoria e outras) recolhidas com flores, em tinas com água para fermentar.
Sua síntese, descoberta, em 1880, por Karl Heumann, envolvia a fusão
cáustica da N-fenil-glicina; que podia ser obtida pela reação de ácido cloro
acético com anilina. Está disponível para comercialização, desde 1897.
Este sarjado de algodão teve sua expansão no mercado americano,
graças, à indústria têxtil de Maryland, Nova Inglaterra, que o popularizou em
1792, como um tecido de grande durabilidade. O nome denim é uma referência
ao tecido similar produzido na cidade francesa de-Nimes.
No ano de 1873, Levi Strauss em parceria com Jacob Davis patentearam
o modelo da calça que possuía os rebites, (tachinhas de cobre); necessários
para dar aos bolsos da calça reforço nas costuras e maior resistência ao uso.
A calça Jeans tornou-se uma presença marcante no decorrer das
mudanças dos séculos e dos costumes.
Nos anos 50, o zipper foi incorporado à calça. O Jeans aliava-se aos
movimentos revolucionários do quadril de Elvis Presley; à sensualidade de
artistas como Marilyn Monroe, James Dean e Marlon Brando.
17Por suas características mutantes, a calça Jeans participou ativamente
no movimento hippie dos anos 60. O denim índigo blue, através de seu uso
contínuo, promove um amaciamento das fibras alterando sua textura e cor.
No ano de 1974 são lançados, no mercado, os Jeans pré-lavados.
Em 1975, o jovem empresário Renzo Rosso, nascido na região nordeste
da Itália inicia a manufatura de roupas e Jeans. Ele reúne-se, em 1978 ao
chamado “Genius Group” da região, dando origem a diversas marcas de
sucesso, entre elas, a marca Diesel.
Processos químicos de lavagem industrial e novos acabamentos para o
tecido – desgaste localizado – são desenvolvidos, nos anos 80, tais como:
STONE WASHED – acabamento obtido em peças já costuradas e tingidas ou estampadas, através da lavagem industrial das peças com pedras ou enzimas;
ESTONAGEM – processo de lavagem do artigo em tambores que levam pedras de argila chamadas sinasitas. Durante a lavagem, as pedras entram em atrito com o artigo deixando-o com aparência batida, mais usada. Surge também o aspecto um pouco desbotado e amaciado;
DESTROYED – lavagem parecida com a estonagem, porém utiliza mais enzimas que corroem a fibra levemente, deixando um aspecto destruído, justificando assim a palavra destroyed, que no inglês significa destruído;
DÉLAVÉ – lavagem estonada com aplicação de clareamento e alvejante químico, deixando o tecido com um visual mais macio que o simples estonado;
USED – uso de pistola com produto químico para clarear uma parte determinada;
LIXADO – processo manual de abrasão com lixa para desgastar o tecido;
DETONADO – uso de esmeril na peça antes de lavar, revelando, depois de lavado, marcas localizadas (CUSUMANO, 2003, p.02)
A partir dos anos 90, o Jeans, definitivamente, assume sua posição no
segmento do mercado da moda. Transformado, por estilistas, em peça de
vestuário de alta-costura, o Jeans significa o uniforme e o luxo do século XXI.
182. “DIESEL FOR SUCCESSFUL LIVING”
(DIESEL POR UM VIVER BEM SUCEDIDO)
A calça Jeans é um produto universal, entretanto, consegue estabelecer-
se, ainda, como um produto de alcance restrito, no caso de determinadas
marcas como a Diesel.
Este capítulo pretende analisar estrategicamente como surge uma linha
de produto – calça Jeans – destinada a estilos pessoais de vestir. O que pode
realizar a experiência de um produto em série e único?
2.1. Diesel: a Companhia = a Marca
A Diesel está presente no mercado de consumo a mais de 20 anos.
Fundada por Renzo Rosso, a partir da descoberta de um nicho de
mercado que surgia: moda de alta qualidade com ousadia.
Pode-se estabelecer como marcos na história da Diesel os seguinte fatos:
1978 – criação da marca;
1985 – aquisição total da companhia por Renzo Rosso;
1991 – início de uma estratégia de Marketing internacional;
1996 – inauguração da primeira flagship store (loja-vitrine da marca) na
Lexington Avenue, New York City.
A companhia possui, ainda, um ‘hotel de alta-costuta’. O Pelican Hotel de
South Beach, que possui cinco pavimentos com 28 quartos, desenhados e
decorados para dar a impressão de cenários de filmes surrealistas.
Móveis e objetos reciclados compõem a decoração dos quartos que são
nomeados de acordo com o estilo que representa. Dentre alguns poder-se-ía
19destacar o “Psychedelic Room”, cujos móveis são de plástico; “Me Tarzan,
You Vain”; “African Room”; “Halfway to Hollywood” e “Stars and Stripes Room”.
Rosso buscou criar um modo de vestir mais dinâmico, criativo, que
rompesse com os moldes pré-estabelecidos pela indústria da moda de alta-
costura. O trabalho de sua equipe de estilistas e designers, vindos de
diferentes culturas e backgrounds, com talento para inovar e total liberdade de
criação resultou, principalmente, na confecção de uma coleção de calças Jeans
– Denim Colection, perfeita para todos aqueles que consideram o ato de vestir-
se uma parte essencial na expressão de sua individualidade; sem que para
isso tenham de abrir mão da alta qualidade.
2.2. A estratégia da marca
Marca será eternamente relevante em marketing, pois reduz custos de transação…elimina a necessidade de informação antes de se comprar. A marca contém toda a informação. Só que, agora, marca não será diretamente proporcional ao que você gasta na mídia, mas ao que eu posso verificar a seu respeito, e eu posso verificar tudo. As empresas estarão tendo sua reputação auditada permanentemente pelos clientes, pela sociedade. Culpa do digital (Nóbrega, 2002, p.210).
O universo ‘Diesel’ é um espaço sem fronteiras. Uma macro-cultura
formada por personalidades e nacionalidades diversas que interagem com
dinamismo, inovação e transparência através de suas diferenças.
O foco na qualidade, autenticidade e originalidade dos seus produtos,
com especial atenção à coleção de Jeans expressa a essência da marca.
O site da Diesel está na internet desde 1995, com informações que vão
muito além de um simples comércio virtual.
Busca, sempre, uma integração entre talento artístico e tecnologia de
ponta como suporte às suas coleções, especialmente, de Jeans.
Diesel design does not follow established trends. It is largely unaffected by fads occurring within the fashion circles; it is innovative and at times a bit radical, but always shows a careful attention to detail and a focus on quality in the selection of materials and
20production techniques. ...This focus on independent working methods and strong quality almost seems to translate within the company into an attitude towards living - the Diesel way (ROSSO, 2004, p. 1 -2). (O estilo Diesel não segue tendências. Permanece, firmemente, inalterado pelos caprichos do mundo da moda; é inovador e às vezes carrega uma pitada de radicalismo, porém mostra, sempre, uma cuidadosa atenção aos detalhes focalizando a qualidade na seleção dos materiais e modos de produção…Focalizar sua produção em métodos próprios de trabalho com uma qualidade rigorosa parece traduzir a atitude interna da Companhia como uma atitude para com a vida: O modo Diesel de ser).
O diferencial da qualidade, com ousadia e credibilidade, voltado para um
determinado segmento da sociedade – consumidores de roupa de alta
qualidade, que tornam o ato de vestir uma expressão original – parece
repercutir na expansão do alcance do produto para um público consumidor
diferenciado; que se torna um veículo de divulgação da marca.
A Diesel poderia ser considerada como um ponto de encontro da aldeia
global, que se estabelece no cenário mundial.
Para Renzo Rosso (2004, p.02) “Diesel is a state of mind: it means being
open to new things, listening to one’s intuition and being honest with oneself.
We would like to offer consumers a total look which reflects this attitude”.
(Diesel é um estado de consciência: isso significa estar aberto à novidade,
escutar sua intuição e ser honesto consigo mesmo. Nós desejamos oferecer
aos consumidores uma imagem global que reflita esta atitude).
2.3. Marketing
O publicitário Eloi Zanetti (2003, p. 02) ressalta a importância de um
trabalho meticuloso para a definição de uma bem sucedida comunicação em
marketing: “...é preciso ir fundo, pesquisar, andar atrás do ponto principal,
buscar o conceito, o miolo da idéia. Depois de atingir o conceito principal é que
você vai começar a urdidura da comunicação”.
O conceito “DIESEL - FOR SUCCESSFUL LIVING” (DIESEL – POR UM
VIVER BEM SUCEDIDO) veicula a imagem ‘Diesel’ de sucesso, em que o
universo da marca é diretamente proporcional ao bem viver; e tem sido bem
21assimilada e apreciada pelos consumidores. A este conceito são tecidos “a
moda casual de alta-costura” (The Haute Couture of Casual) e “o modo Diesel
de ser” (the Diesel way), completando o universo da marca.
Requinte e rebeldia exibem o paradoxo de uma moda que eleva o dia-a-
dia à condição do alto luxo. Os limites passam a ser compreendidos como
valores. Consumir uma calça Jeans da marca Diesel seria a consagração do
trabalho por adquirir um objeto de puro deleite pessoal.
De acordo com as palavras de seu criador, “Diesel isn’t just about making
clothing and accessories. Its design team is creating Diesel ‘spaces’ which help
communicate the message and the feeling of the products it is selling”(ROSSO,
2004, p.02). (Diesel está além da fabricação de roupas e acessórios.
Sua equipe de designers cria ‘espaços’ que ajudam a comunicar
a mensagem e o sentimento essencial dos produtos que vende).
2.3.1. Produto
A Diesel alcançou uma liderança imediata, no desenvolvimento de novos
estilos, tecidos (lavagens), métodos de fabricação e controle de qualidade,
garantindo a suas calças um destaque pelo diferencial da qualidade total.
Toda a produção do Jeans da Diesel está centralizada na Itália.
Sua Denim Collection – para homens e mulheres; e sua especial linha de
Jeans lavados – enfatiza o denim índigo blue. Apresenta a possibilidade de
combinar detalhes (altura da barra da calça; posição do cós; textura e
tingimento do tecido; modelos exclusivos) posicionando a marca como um
expoente, dentro do mercado internacional de consumo do Jeans.
As calças recebem denominações que refletem o espírito de cada
coleção. A identificação do produto para o consumidor está integrada ao
reconhecimento do universo ‘Diesel’ do momento. Por isso, para cada coleção
é lançado um guia (“Diesel Guide for Successful Living”), que comunica ao
público consumidor e consumidor em potencial, sua fonte de inspiração.
222.3.2. Preço
O preço ajuda a dar valor às coisas e representa uma troca pelo esforço feito pela empresa vendedora através da alocação de recursos, capital, mão-se-obra e manufatura dos produtos comercializados. Os preços para os mercadológicos são muito importantes, pois além de representar o retorno dos investimentos feitos no negócio constituem-se em indispensável ferramenta mercadológica (LAS CASAS, 1997, p.192).
De acordo com o empresário Esber Hajli, responsável pela distribuição da
marca Diesel, no Brasil, o preço da calça é alto; em média três vezes acima do
preço da mais cara encontrada no mercado nacional, porém “a diferença de
preço se explica pela qualidade do jeans italiano e pelo tipo de lavagem que ele
apresenta” (ROVERI, 2004, p.113)
2.3.3. Ponto de Venda
Renzo Rosso sempre acreditou na criação de um produto que tivesse um
mesmo significado em todo o mundo. Para isso, tem investido na construção
de uma plataforma de distribuição sólida e extensa que se alonga pelos 5
continentes.
A coleção de Denim, D-Diesel iniciou, em 1997, seus serviços e-
commerce vendendo Jeans online para Finlândia e Suécia.
No mercado brasileiro, atualmente, existem duas lojas Diesel em São
Paulo, sendo que, a loja da Rua Oscar Freire é a terceira em volume de vendas
do Jeans da marca, no mundo inteiro. A presença do Jeans da Diesel está,
ainda, em algumas seletas lojas de multi-marcas no Rio de Janeiro.
Parallel to its wholesale distribution through multi-brand stores…in 1996 Diesel embarked on a new adventure: retail. Flagship stores…and single-brand stores (from Santa Monica to Milan, from Paris to Antwerp) are the ideal vehicle to bring the Diesel concept to life in its entirety, providing enough space to showcase all Diesel collections. While each individual store is unique, they all share a similar atmosphere (ROSSO, 2004, p.02). (Paralelamente, à distribuição de atacado através de lojas de multi-marcas…em 1996 Diesel embarcou numa nova aventura: varejo. Lojas-vitrine... e exclusivas da marca (de Santa Monica a Milão, de Paris à Antuérpia) que são o veículo ideal para preencher de vida, o conceito Diesel de ser, além de permitir que todas as suas coleções sejam expostas
23dentro do espaço necessário. Cada uma de suas lojas é singular, ao mesmo tempo em que, todas compartilham de uma atmosfera similar).
A companhia possui aproximadamente 150 lojas, presente em mais de 80
países com cerca de 10.000 pontos de venda.
2.3.4. Promoção
A Diesel trabalha sua equipe interna de criadores em parceria com
agências publicitárias. Enquanto este restrito grupo de criação e marketing da
companhia cuida de dar corpo aos valores da marca, às agências cabe a
função de viabilizar as idéias do grupo, garantindo total fidelidade à imagem
própria do universo Diesel.
Destacam-se os “Diesel Guide for Successful Living” (catálogos ecléticos,
nos quais o produto é usado como uma ilustração ao modo ‘Diesel’ de ser)
para as estações – Primavera/Verão e Outono/Inverno, de cada ano.
E, ainda, a inserção progressiva da Diesel na mídia interativa, investindo
em campanhas publicitárias sui generis.
As campanhas da Diesel destacam-se no ambiente dos top da
publicidade recebendo prêmios em festivais internacionais, desde 1994.
A atual campanha, veiculada no site da companhia, apresenta “The Diesel
Society of Nature Lovers” (A Sociedade Diesel de Amante da Natureza).
A nova Denim Collection – “Greatest Hips” (uma brincadeira com a
palavra inglesa hits); associa o sucesso da rebeldia dos movimentos de quadril,
da era do rock dos discos de vinil, à imagem do poder das curvas, sobretudo,
as curvas da natureza.
A natureza parece se libertar em curva.
Os bens funcionam também como instrumentos de mudança, de duas maneiras. Uma delas é a capacidade de servir como uma oportunidade de modelar um novo conceito cultural através do uso seletivo, da combinação nova e da inovação
24premeditada dos significados culturais existentes. Neste caso os bens são uma mídia criativa na qual a invenção pode tomar lugar através da experimentação com outros significados culturais existentes. No outro caso, os bens servem como uma oportunidade para um grupo se engajar em um diálogo interno e externo, no qual as mudanças são contempladas, debatidas e, então, anunciadas (McCRACKEN, 2003, p.170).
Através dos ’guias’ de suas campanhas publicitárias, a Diesel promove a
possibilidade de um relacionamento fidelizado com um público diversificado,
que passa a incorporar as proposições de cada temática dentro do código de
valores que este agrega ao produto. O produto passa a ter funções múltiplas;
forma – vestir; informa – comunicar; transforma – seduzir.
Um exemplo poderia ser o modo de apresentação online do modelo Fikus
de calça feminino da coleção “Diesel Denim Guide Spring/Summer 2004”.
A calça é metaforizada como uma mulher de negócios, que é artista e
produto, (a ambigüidade soa bastante provocativa) surpreendentemente sexy,
forte e sofisticada.
253. IMANTAÇÃO: O PRODUTO EM
TRANSCENDÊNCIA
Marketing é sobre as escolhas que fazemos...Parte do que escolhemos é fruto de nossa liberdade para fazermos escolhas – é expressão de nosso desejo. Outra parte tem origem nas limitações que a natureza nos impõe – escolhas que nosso destino biológico nos obriga a fazer. Marketing é sobre a natureza humana (NÓBREGA, 2002, p.09).
O mercado de consumo atual é uma estrutura flexível, fluida, orgânica
que requer um pensar de acordo; uma consciência sensibilizada em forma de
ação. Neste sentido, o Marketing indica que existe um caminho objetivo para
atingir o mercado de consumo: o consumo. Por definição o Marketing ocupa
um papel central neste processo “... o desempenho das atividades comerciais
que dirigem o fluxo de bens e serviços do produtor ao consumidor...”
(RICHERS , apud. LAS CASAS, 1997, p.14)
Enfrentar os desafios deste mercado que se move em tempo real, isto é,
através de uma instantaneidade nos processos entre desejo e satisfação, de
uma cultura conectada em rede de informações e comunicação dinamiza os
processos existentes entre bens e consumo (corpo-produto).
De que modo seria possível acompanhar passo a passo tais processos
compreendendo sua própria dinâmica?
Uma reflexão sobre esta questão, através da integração sensível do
movimento do corpo, percebida como uma intimidade transparente na
expressão da dança, será o foco deste capítulo.
3.1. Poderes do Produto
É comum perceber-se que, na tentativa de comunicação de determinados
pensamentos ou sentimentos, muitas vezes, faltam palavras que bem
conduzam aquilo que se quer expressar. Recorre-se, então,
26inconscientemente, na maioria das vezes, ao corpo — gestos, movimentos
— como forma de expressão.
Segundo Clemente Nóbrega (2002, p.35)
Tecnologia é tudo o que possibilita fazer coisas de forma diferente do usual; vai muito além de novos produtos ou ferramentas. É tudo que nos ajuda a reconfigurar os recursos com que trabalhamos e vivemos (matéria-prima, conhecimento, trabalho, capital) em arranjos que produzam mais valor. Tecnologia é a gramática da linguagem do marketing – é ela que nos permite diálogos novos.
O corpo indica modos inéditos de linguagem na sua mobilização. Uma
elevação pode ser sentida num movimento em queda; num simples gesto de
olhar; uma posição sutil de cabeça, no momento exato do ritmo, do compasso
do corpo em movimento.
Forças geram forças sob a forma de fluidez. Movimentos, imagens,
gestos, formas produzem e conduzem a arte que reeduca este mesmo corpo,
transformando diálogos em composições harmônicas, na busca de um
equilíbrio dinâmico.
Planejamento e controle; experimentação, testar e verificar causas e
consequências são fatores indispensáveis a uma ação bem sucedida no
mercado de consumo. Entretanto, é preciso que o produto seja capaz de
dialogar com o mercado, através de um processo dinâmico, que como uma teia
alimenta seu criador em criação.
A tentativa é de tocar a matéria que sustenta a expressão do corpo-
produto em signos de comunicação. Sob esse aspecto, corpo é o limite que
separa, ao mesmo tempo, que integra esse mesmo corpo em produto. Rever e
exibir o corpo-produto em sua intimidade fluida. Como este torna aparente uma
corporeidade outra, transfigurado, metaforizado, como o ‘corpo-alma’ do
produto por ele veiculado.
27Aqui, concede-se à alma uma materialidade, um corpo que atravessa
fronteiras de tempo e espaço e torna-a testemunha do movimento oculto das
paixões. Deste modo, refletindo os valores de sua existência.
3.1.1. Apropriação – Movimento: corpo-imagem-produto
Susanne Langer (1953) reconhece, na dança, ‘poderes’ capazes de
magnetizar os corpos dos bailarinos:
Num pas de deux os dois bailarinos parecem magnetizar um ao outro; a relação entre eles é mais do que espacial, é uma relação de forças; mas as forças que eles exercem, que parecem ser tão físicas quanto as que orientam o ponteiro da bússola em direção ao pólo, na realidade não existem absolutamente em termos físicos. São forças de dança, poderes virtuais (LANGER, 1953, P.184).
Esta imagem sugere o corpo do dançarino como um ponto de atenção
concentrada e ressonante. Corpo e dança como um aprendizado momentâneo,
da criação de um objeto de desejo.
Neste instante, o corpo já não parece feito de ossos ou músculos; o
espaço parece desnudar-se em puro éter onde bailam imagens embebidas de
mistério e prazer.
A calça Jeans da marca Diesel reflete um sistema de valores que torna
possível ao efêmero ocupar uma posição privilegiada no mercado de consumo.
O produto em si está além da matéria-calça que é consumida. Vende-se o
conceito, a imagem que inaugura sua realidade na utilização do produto. Este
passa a ser um elo de ligação entre matéria – qualidade do tecido,
acabamentos, design; o modo de produção e a expressão de uma autêntica
atitude. E, acima de tudo, significa o ingresso do consumidor no universo da
marca; espaços (produtos, pontos de venda, campanhas) onde, diversidade,
em confronto, com personalidades, instauram um modo de solução em uma
imagem-corpo-produto, que compreende todo um processo de criação.
28A publicidade e o sistema de moda movem o significado
do mundo culturalmente constituído para os bens de consumo, enquanto os rituais de consumo o transferem destes para o consumidor. Esta é a trajetória do movimento do significado cultural nas sociedades modernas desenvolvidas (McCRACKEN, 2003, p.120).
Ascender ao paraíso ‘Diesel’ seria um ato muito bem humorado de viver a
vida segundo seus próprios valores.
3.2. Permanente impermanência: transcendência do produto
Rudolf Laban (1978) fala de uma necessidade, de um interesse
expressivo que atrai o espectador aos movimentos do Ballet:
O interesse pelo balé torna-se mais compreensível se percebermos que os momentos de movimento mais profundamente emocionantes de nossas vidas, em geral, nos deixam sem palavras e que, em tais momentos, nossa postura corporal pode bem ter a capacidade de expressar algo que seria inexprimível de outro modo (LABAN, 1978, p.140).
Tal observação poderia ser ampliada ao cosmo que como uma rede
dinâmica mantém o fluxo de suas partículas comunicando a unidade da vida.
Tomando-se, por exemplo, o movimento das marés que comunicam-se
com as fases da lua; e, ainda o movimento constante de equilíbrio entre os
opostos, noite e dia; som e silêncio; a constatação de Capra (1983) funcionaria
como uma lente para focar a universalidade da imagem do corpo em
movimento – um produto que permanece ao ser consumido, interligado à, e,
interligando a realidade cósmica:
A visão oriental do mundo é, pois, intrinsecamente dinâmica, contendo o tempo e a mudança como características fundamentais. O cosmo é visto como uma realidade inseparável, em eterno movimento vivo, orgânico, espiritual e material ao mesmo tempo (CAPRA, 1983, p.26)
O universo, portanto, representaria a expressão de uma totalidade
harmônica em movimento contínuo, na qual a unidade de todas as formas
manifesta-se, distintamente. Percebe-se então uma dança cósmica, onde o
29movimento é a unidade que contém e está contida na unidade sensível e
atuante do universo: o corpo.
O corpo representa para o movimento da dança uma ferramenta básica,
um espaço material de construção e desconstrução de uma expressão estética
própria. Poderia ser compreendido como um espaço vertical que perpassa os
espaços corporais de possibilidades de movimentos, gerando linhas múltiplas e
em sentidos vários, que inscrevem esse corpo no espaço, como signos
(valores) de uma linguagem oculta, que revela sua significação ao dançar, ao
desfiar sua intimidade.
O movimento no mercado de consumo poderia ser visto através da
imagem de um mercado que consome a si mesmo em sintonia com o
movimento do corpo que se extingue (adquire o valor de transcendêndia
poética), no momento exato de sua criação.
As palavras de Rosso, sobre a máxima na propaganda citada no site da
Diesel, na página destinada às informações sobre a companhia – “When
advertising is at its best, it understands and expresses the inner feelings
associated with the product and the company” (O ponto máximo da propaganda
é quando esta compreende, expressa e associa sentimentos íntimos relativos
ao produto e à companhia) – comunicam o sentido de unidade que é expresso
pela marca, independente da fugacidade do consumo.
Neste caso consumir uma calça Jeans da marca Diesel reflete não
somente uma ascensão social, mas indica que o valor do produto passa a ser
designado pelo sistema próprio de valores de quem consome.
Grant McCracken (2003) faz uma análise sobre o uso dos bens de
consumo “na construção de si e do mundo”:
Uma das maneiras através das quais os indivíduos satisfazem a liberdade e a responsabilidade de sua autodefinição é pela sistemática apropriação das propriedades significativas dos bens...O sistema de consumo supre os indivíduos com os materiais culturais necessários à realização de suas variadas e mutantes idéias do que é ser um homem ou uma mulher...Todas essas noções culturais estão concretizadas nos bens, e é através de sua posse e
30uso que o indivíduo as assimila em sua própria vida (McCRACKEN, 2003, p.119).
A roupa passa a vestir de significados seu próprio usuário.
O consumidor torna-se nesse processo matéria integrante do produto. É
ele quem vai compor o corpo do produto por ele veiculado.
Ao identificar-se com o produto o consumidor valoriza a si próprio através
do valor que admite ao produto. Portanto, percebe-se a presença humana,
quanto ser que cria e é criação; como uma propriedade, que confere uma
transcendência poética ao produto.
Neste mesmo sentido compreende-se, por analogia, o valor de tal
propriedade que se agrega ao produto, no Brihad-Aranyaka Upanishad, 3.7.15,
citado por Capra (1983):
Aquele que, habitando em todas as coisas,
É, no entanto, diverso de todas as coisas,
Aquele a quem todas as coisas não conhecem,
Cujo corpo é feito de todas as coisas,
Que controla todas as coisas a partir de dentro –
Aquele é a sua Alma, o Controlador interior,
O Imortal (CAPRA, 1983, p. 27).
Uma leitura outra, do valor de transcendência poética, incorporado ao
Jeans da marca Diesel compreenderia que, ao ‘humanizar’ o produto, o
consumidor, ocuparia a posição, imediatamente, acima. Seu desejo de
consumo, que por ser humano seria carnal, instintivo passaria a configurar-se
matéria de sua história anímica, torna-se-ía sagrado; um desejo sensível de
criação. Assim, divino seriam os fios que compõem e mantêm a unidade
sensível do movimento do consumo, sentido e repercutido na pele.
Poderia constatar-se o sentido místico de uma comunhão com o divino
como uma habilidade de responder, inteiramente, a um chamado.
31Ao apropriar-se, com bom-humor, do tema predileto dos publicitários da
década de 50: ”os produtos de consumo fazem nossa vida melhor” (“consumer
products make better living”) – que foi reeditado como “DIESEL – FOR
SUCCESSFUL LIVING” (DIESEL – POR UM VIVER BEM SUCEDIDO) e
incorporado à marca – a Diesel recria a sociedade de consumo através da ótica
do “modo Diesel de ser”; como um parque de diversões.
À batalha por sucesso no, super competitivo, mundo contemporâneo
permanece, sempre, associado o sentimento de que, a vida seria uma trama do
destino, feita por e para cada indivíduo – valor essencial da marca.
32CONCLUSÃO
A extrema mecanização do mundo atual aponta desenhos cênicos de
uma realidade muito detalhada, massificada de informações, sendo a mesma
uma chave para os processos mercadológicos. Um gigantesco quebra-cabeça,
onde imagens geram imagens, como uma experiência que se constrói e
desconstrói em contínua transformação.
O consumo na era digital, da transparência e dos excessos, parece
orientar o Marketing a um retorno aos valores essenciais da natureza humana.
Riquezas estão sendo produzidas por produtos intangíveis (idéias;
experiência compartilhada; conceitos), refletindo uma revisão nos sistemas de
valores da sociedade como um todo. “O digital não nos lança à frente, nos
remete para trás” (NÓBREGA, 2002, p.17).
Máquinas multifacetadas aprisionam seus criadores em suas próprias
criaturas. Gestos partidos, ações, movimentos são repetidos incessantemente
em meio ao caos da busca por uma harmonia, que só existe em totalidade.
A dança – investigada, neste estudo, em paralelo à arte do consumo da
calça Jeans da marca Diesel – é produto de imagens e formas que contêm em
si paradoxos em sutil harmonia. Tensões, oposições, conflitos, desejos que se
resolvem em um instante de criação. Um processo que intermedia e irradia as
polaridades naturais, que suportam no corpo as forças deste ato criador.
A poesia da figurinista Sílvia Sangirardi (1996, p.60) ilustra com bom-
humor a trajetória dinâmica o, “Darma”, da calça Jeans, quando ordena, no
poema abaixo, que:
garimpar
os astros
é o que manda
o figurino
33No intuito de refletir a unidade dinâmica do corpo – imagem – produto
frente à multiplicidade de valores de consumo levigou-se, num primeiro
momento, dados contidos na história da origem da dança, e do Jeans que
permitissem a configuração do produto e do corpo em movimento, como signos
de um processo de comunicação. O corpo, que desenhando no espaço
palavras de um alfabeto íntimo busca sua tradução, ao dançar sua criação.
Passos contínuos de um presente sempre renovado pelo movimento que
interioriza o corpo e o atualiza sob uma consciência sensibilizada em ação.
T.S.Eliot (1971), no primeiro quadrante de “Four Quartets” revela uma,
especial imobilidade dinâmica, que integra uma totalidade, um centro irradiante.
At the still point of the turning world.
Neither flesh nor fleshless; Neither from nor towards;
at the still point, there the dance is... (ELIOT, 1971, p.15)
(No ponto imóvel do mundo que gira,
Nem carne, nem descarnado; Nem vindo de, nem indo para;
No ponto imóvel, ali é a dança...)
O movimento do corpo faz vibrar uma interioridade repercutida numa
aparência, expressa pela dança. Impressões que vislumbram, no devir a
mística do processo criador: o paradoxo de uma permanente impernamência.
Portanto, reflete um sistema de valores que torna possível ao efêmero
ocupar uma posição privilegiada no mercado de consumo.
A calça Jeans da marca Diesel representa, como um produto, a
materialização, a um só tempo, do universo de libertação, expresso pelo Jeans
e do universo em que a marca está inserida, abordado no capítulo 2.
Pretendeu-se, ao investigar como se estende a materialidade do produto
para além do aparelho sensitivo fornecer uma estrutura flexível para pensar um
modo de comunicação a partir de um estado de consciência sensível.
34Seria o fato de modelos de Jeans rasgados estarem, hoje, entre
produtos de alto luxo, uma alusão à liberdade total que é a expressão do
produto; liberdade das tramas – destino do tecido?
Esta questão foi aprofundada no capítulo 3.
O produto, estrategicamente posicionado no mercado promove uma
abertura, um modo de ser percebido, que possibilita o reconhecimento de
valores de transcendência, na comunicação de seu equilíbrio de formas, sua
qualidade, leveza e ainda, seu poder de discursividade aberta. E, além,
provoca a revelação do consumidor como o agente essencial, da determinação
do código de valores que a ele são agregados.
Destarte, verificou-se, que, o corpo ao preencher de contornos o Jeans
confere-lhe uma nova forma de existência; este vivificado, no instante em que é
consumido, faz-se presente; se presente é, é real.
Corpo, espaço, imagem, forma, produto comunicam-se por uma
sensibilidade dinâmica. Uma transmissão direta do instante em que a dimensão
do sensível compreende a dimensão do formal.
E, para concluir este trabalho um pensamento sintetizado em forma de
poesia vem ilustrar a idéia central da arte do consumo, neste estudo verificada:
chuvisco no lago; água na água; circulação.
35REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LAS CASAS, Alexandre Luzzi. MARKETING: Conceitos, exercícios, casos. São Paulo: Atlas, 1997.
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MISRA, Susheela. INVITATION TO INDIAN DANCES. United Kindom: Lucas Books, 1989.
36NÓBREGA, Clemente. ANTROPOMARKETING. Dos Flintistones à Era Digital: Marketing e a Natureza Humana. Rio de Janeiro: Senac, 2002.
PORTINARI, Maribel. HISTÓRIA DA DANÇA. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
RIES, Al e TROUT, Jack. POSICIONAMENTO: como a mídia faz sua cabeça. São Paulo: Pioneira, 1992.
RODRIGUES. Rodrigues -1875. http:// biblio/tratados/rodrig.htm#ANIL, 2004.
ROSSO, Renzo. Company Information. www.diesel.com. 1-4 p., 2004.
ROVERI, Sérgio. O INSUBSTITUÍVEL.In: Revista VOGUE Brasil: edição 307, 2004. P.110-113.
SANGIRARDI, Sílvia. CURVA DO TEMPO. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1996.
www.levis.com. Levi Strauss & Co., History, 1 -6 p., 2004
ZANETTI, Eloi. Definir um Conceito de Marketing e Comunicação. www.aberje.com.br. 1-4p., 2003
37ANEXO 1
Índigo
Composição química
Origem
Natural: Indigofera tinctoria e outras plantas.
Artificial: Sintetizado em 1870.
Disponível comercialmente em 1897.
Em 1913, já substitui em grande parte o índigo natural.
Outros nomes: Anil
Período de utilização
Utilizado desde a Antiguidade clássica, teve pouco uso em pintura depois do século XVII. Propriedades
Corante insolúvel em água.
Frequentemente encontra-se adulterado com outros materiais, que aumentam a quantidade de
cinzas.
Segundo Cennini, a mistura de índigo e branco de S. Giovanni era utilizada na pintura a fresco
como imitação do azul ultramarino.
Em geral, é estável à luz e ao ar, no entanto, por acção de luz intensa, pode perder cor.
É muito utilizado em tinturaria.
Preparação
O índigo natural é preparado a partir de plantas recolhidas com flores que são colocadas a fermentar em tinas com água.
Referências : http://biblio/tratados/rodrig.htm#A Rodrigues, 1875
40 ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
EPÍGRAFE 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
1. TEMPO – ESPAÇO – CORPO – PRODUTO 11
1.1. Tempo – Espaço 12
1.1.1. Mente sã em corpo são: um símbolo de unidade 13
1.1.2. Corpo em poesis 14
1.2. Corpo - Produto 14
1.2.1. Origem da palavra Jeans 15
1.2.2. A calça Jeans 15
1. “DIESEL FOR SUCCESSFUL LIVING” 18 (DIESEL POR UM VIVER BEM SUCEDIDO)
2.1. Diesel: a Companhia = a Marca 18
2.2. A estratégia da marca 19
2.3. Marketing 20
2.3.1. Produto 21
2.3.2. Preço 22
2.3.3. Ponto de venda 22
2.3.4. Promoção 23
413. IMANTAÇÃO: O PRODUTO EM TRANSCENDÊNCIA 25
3.1. Poderes do Produto 25
3.1.1. Apropriação – Movimento: corpo-imagem-produto 27
3.2. Permanente impermanência: transcendência do produto 28
CONCLUSÃO 32
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 35
ANEXOS 37
ÍNDICE 40
FOLHA DE AVALIAÇÃO 42
42FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes – Niterói
Título da Monografia: Um Paralelo entre Dança e a Arte do Consumo da
Calça Jeans; da mineração à alta-costura: Diesel – um estudo de caso
Autor: Silvia Regina Prado dos Anjos – Mat. 70256
Data da entrega: 24 de Julho de 2004
Avaliado por: Conceito:
Avaliado por: Conceito:
Avaliado por: Conceito:
Conceito Final: