UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · seus sorrisos e brincadeiras de ... doença...
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A CONTRIBUIÇÃO DA TERAPIA FAMILIAR NO TRATAMENTO
DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA E A EXPERIÊNCIA DO
ASSISTENTE SOCIAL ENQUANTO TERAPEUTA.
Por: Roberta da Conceição Ottoni Trindade
Orientador
Prof.ª Maria Poppe
Rio de Janeiro
2010.
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A CONTRIBUIÇÃO DA TERAPIA FAMILIAR NO TRATAMENTO
DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA E A EXPERIÊNCIA DO
ASSISTENTE SOCIAL ENQUANTO TERAPEUTA.
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial
para obtenção do grau de especialista em
Terapia de Família.
Por: Roberta da Conceição Ottoni Trindade.
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AGRADECIMENTOS
Às minhas colegas da turma pelas
palavras amigas nas horas difíceis,
pelas risadas em sala e pelos
momentos de respeito e generosidade.
À Assistente Social e Terapeuta
Familiar Luciana da Silva Mancinho,
por ter colaborado diretamente na
formação deste projeto de pesquisa.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a Deus, porque
ele guia meus passos e nas horas mais
difíceis, é dele que me vem o socorro;
Aos meus pais que em meio às
dificuldades me transmitem seus
valores, carinhos e amor; Às minhas
irmãs, muito queridas e especiais, que
com suas colaborações e palavras de
estímulos me impulsionaram a ter
força; Aos meus sobrinhos, que com
seus sorrisos e brincadeiras de
crianças, me trazem a alegria e, ao
meu namorado por confiar e acreditar
no nosso amor.
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RESUMO
A partir dos questionamentos do Conselho Federal de Serviço
Social a respeito da atuação do Assistente Social nas práticas terapêuticas,
aumentou-se o interesse em pesquisar essa temática. Focando principalmente
a questão da dependência química, um assunto que muito é questionado
devido a sua complexidade.
A pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de analisar a
contribuição da Terapia Familiar na Dependência Química e a experiência do
Assistente Social enquanto Terapeuta.
Junto a Assistente Social Terapeuta de Família, foi observado
que a influencia da teoria sistêmica no Serviço Social tem se dado na
orientação dos trabalhos com famílias. À medida que a família encontra um
espaço para falar de suas vivências, ela começa a desenvolver mudanças em
suas atitudes, tornando-se consciente e capaz de ver as coisas como
realmente são, encontrando maneiras saudáveis e apropriadas de lidar com
tais situações.
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METODOLOGIA
Para a construção deste trabalho, optou-se pela pesquisa
qualitativa, buscando conhecer as experiências profissionais da Assistente
Social que atua na área de dependência química como Terapeuta Familiar.
Possibilitando assim, que o trabalho fosse construído de forma a conhecer esta
realidade e buscar respostas aos questionamentos.
Foi utilizado para coleta de dados, entrevistas abertas que foram
realizadas com 01 (uma) Assistente Social, especializada em Terapia Familiar.
A entrevista foi individual, com roteiro de questões abertas que interessam à
pesquisa. Composta por uma relação inalterável de perguntas, onde a mesma
expôs de forma livre seus pensamentos sem qualquer restrição.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPITULO I – A Prática da Terapia Familiar 10
CAPITULO II – Dependência Química e suas Expressões 17
CAPITULO III – O Assistente Social “Terapeuta” na D.Q. 23
CONCLUSÃO 31
BIBLIOGRAFIAS 34
ANEXOS 36
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INTRODUÇÃO
Ao discutir sobre drogas e conseqüentemente sobre dependência
química, o uso indevido e abusivo vem afetando assustadoramente toda a
sociedade e muitos estudos têm sido realizados no sentido de compreender os
fatores explicativos em face das relações e vida contemporânea. Vale lembrar
que a noção de dependência química envolve tanto a compulsão por drogas
lícitas e ilícitas.
Reconhecida pela Organização Mundial de Saúde como uma
doença crônica, a dependência química é caracterizada por comportamentos
impulsivos e recorrentes de utilização de uma determinada substância para
obter uma impressão de bem-estar e prazer. Aliviando, assim as sensações de
ansiedade ou medo.
O assistente social atuando com a problemática da dependência
química é um profissional articulado a uma equipe interdisciplinar, onde se
relaciona necessariamente com uma dada divisão social e técnica do trabalho.
A família vem se organizando conforme a dinâmica social. A sociedade
tem uma dinâmica que acaba interferindo em todo resto. O individuo é gerado
pelo que está em torno dele que é a família.
Na terapia de família, o assistente social deixa de ser observador
para ser tornar um articulador, contribuindo nas mediações das conversas.
Entender a família como sistema, significa entender o sintoma
como produto de inter-relação e deslocar o foco do sintoma do indivíduo para
as relações que o produzem e mantém. Portanto, a Teoria Sistêmica está nas
relações e a proposta terapêutica é trabalhar com todos os integrantes da
família ao mesmo tempo, enfocando que cada um dos seus membros tem
funções distintas a desempenhar.
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É dessa maneira que atua os Assistentes Sociais, criando
estratégias que possibilite à promoção e a autonomia da pessoa humana,
respeitando a decisão de cada usuário. É preciso analisar criticamente a
realidade geradora do conflito e buscar formas de intervenção para sua
transformação.
O trabalho está estruturado em três capítulos. O primeiro capítulo
aborda um pouco das transformações familiares, contendo também, a história
da terapia familiar e a sua abordagem sistêmica ao trabalhar com as famílias
de dependentes químicos. No segundo capítulo consiste num embasamento
teórico sobre a dependência química como um fenômeno social, presente na
sociedade contemporaneidade e o seu impacto nas relações sociais e
intrafamiliares. No terceiro capítulo são apresentados as atribuições e o
objetivo do Assistente Social enquanto Terapeuta de Família na problemática
da dependência química. Constará ainda, o depoimento da Assistente Social e
Terapeuta de Família, que foi entrevistada.
A presente pesquisa será relevante, pois suas considerações e
resultados irão enriquecer na melhoria e aperfeiçoamento das ações que são
realizadas pelo Serviço Social nas práticas terapêuticas.
Possibilitará também, numa reflexão por parte dos colegas da
categoria referente à realidade em que atuam, criando alternativas de
mudanças práticas e teóricas em seu cotidiano enquanto profissional da área
da dependência química, um assunto ainda pouco discutido no Serviço Social.
É necessária uma prática profissional eficiente diante ao
atendimento às famílias, não só no sentido de atender dentro de suas
especificidades, mas de transformar o cotidiano profissional em uma prática
investigativa. E é através desta investigação que o profissional consegue
propor mudanças que contemplem a avaliação das políticas sociais.
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CAPITULO I
A PRÁTICA DA TERAPIA FAMILIAR
Toda a doutrina social que visa destruir a família é má, e para mais inaplicável. Quando se decompõe uma sociedade, o que se acha como resíduo final não é o indivíduo, mas sim a família. Victor Hugo
A família vem se organizando conforme a dinâmica social. A sociedade
tem uma dinâmica que acaba interferindo em todo resto. O individuo é gerado
pelo que está em torno dele que é a família. A família interfere e é interferida
pela família extensa, a família extensa interfere e é interferida pelo Estado, o
país, o continente, a comunidade, o planeta...
Antes as famílias viviam como bandos, pois eram instintivos. Quando o
homem entra nesse espaço de socialização, de respeito ao próximo, ele perde
seu instinto e começa a se organizar, a construir formações sociais mais
compatíveis com aquela época.
As constantes transformações econômicas, culturais e sociais que
resultaram, através dos tempos, em profundas modificações na estrutura
familiar fizeram com que sempre, em algum momento da história, se pensasse
a família. A primeira vez em que foi utilizado, por volta de 1337, o termo,
derivado do latim famulus, serviu para designar, na Roma Antiga, escravos que
viviam sob o mesmo teto.1
A família não morreu, ela está sendo reinventada no cotidiano social.
As novas organizações e papéis sociais na nova tecnologia estão
proporcionando que as pessoas sejam respeitadas em suas diferenças e,
portanto lidem de maneiras diferentes, junto com a construção de suas
histórias e que com isso a família que é uma das entidades mais atingidas por
essas novas possibilidades ela é convidada a rever os seus padrões e se
modificar.
1 Apontamento da aula História Social da Família, 02/2009. Professora Glória Mosquéra.
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Essas mudanças correspondem a uma ação deliberada, no sentido de
um projeto emancipado que institui novos padrões de comportamento, mas que
só foi possível por mudanças, na realidade exterior à família, que afetaram de
maneira decisiva esta esfera da vida social, transformando-a fatalmente.
Acontece que a família não é uma totalidade homogênea, mas um universo de
convívios diferenciados, e as mudanças atingem de modo diverso cada uma
destas relações e cada uma das partes da relação.
Quando uma crise acontece e um sintoma surge na família é porque há
um significado adjacente, e esse significado e essa crise vieram à tona porque
a família teve prontidão para lhe dar com essa questão. A crise só aparece
porque na realidade a família tem uma prontidão para compreender e entender.
A compreensão da crise como oportunidade para estabelecer mudanças e
fazer o que for necessário para sair dela.
Quando a família entra em crise, ela faz um movimento para saber
entender, ela fará de tudo para resolver. A crise vem como uma possibilidade
enorme de cuidado. O problema não se instala do dia para noite. A família que
entra em crise com relação a um sintoma tem um processo desde lá de trás e
chega uma hora que fica insuportável. A partir daí, inicia a procura pela
TERAPIA FAMILIAR.
Nascida nos Estados Unidos, na década de 50, a Terapia Familiar
trouxe para o tratamento as famílias. Muitos terapeutas desenvolveram
técnicas para trabalhar com diferentes famílias.
Os anos se passam e a terapia familiar vai adquirindo novos aportes
filosóficos, nova linguagem e técnicas. Existem diversas teorias, tais como a
Cibernética, a Teoria da Comunicação e a Teoria Sistêmica.
“A terapia familiar, como modalidade terapêutica, surgiu
da convergência de diferentes áreas do conhecimento
humano. Tal diversidade de influencias no passado
acarretou uma grande heterogeneidade em sua teoria e
práticas atuais.” (SOUZA, 1996, p. 35).
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No ano de 1957, duas grandes associações americanas (American
Orthopsychiatric Association e a American Psychiatric Association), em suas
reuniões, incluíram estudos sobre a família como tema principal. A partir daí se
multiplicaram os trabalhos e os terapeutas passaram a ter mais contatos entre
si, possibilitando a institucionalização da terapia familiar.
O enfoque da terapia familiar não é somente nos conflitos individuais,
se direciona também ao conflito grupal. O terapeuta ao atender uma família
procura diminuir seu sofrimento a partir de novas comunicações, interagindo
com formas adequadas ao bem-estar de todos os membros, levando o grupo
ao insight, onde poderão adquirir um novo conhecimento a respeito de si
mesmo, permitindo-lhes suportar a dor psíquica através do conhecimento e da
compreensão de seu problema ou doença.
“Os aspectos individuais não são negados, o tempo todo
eles se fazem presentes, determinam e condicionam
mecanismos grupais. Entretanto, o objetivo primeiro das
intervenções do terapeuta não é o de levar a uma
reestruturação das personalidades individuais em seus
aspectos mais primitivos e arcaicos. Na terapia familiar, o
caminho segue em sentido inverso: a partir dos conflitos
existentes nos procedimentos e funcionamentos grupais,
modificamos, reformulados ou apenas neutralizados pelas
intervenções terapêuticas, é possível obter uma melhora
de conflitos individuais, pelo menos daqueles que
exercem influencia decisiva no funcionamento grupal, nas
trocas dentro da família.” (SOUZA, 1996, p. 44).
Portanto, os aspectos individuais que vão ser trabalhos pelo terapeuta
familiar, são aqueles relacionados diretamente aos padrões de funcionamento
da família, e não quando se busca melhoria individual.
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O objetivo do profissional terapeuta de família, não é criar condições
favoráveis a mudanças intrapsíquicas e sim, através da pessoa atendida,
promover mudanças no funcionamento do grupo familiar.
O terapeuta precisa ser capaz de perceber as expectativas familiares
em relação a ele e ao processo terapêutico, tendo ainda flexibilidade para se
deixar conduzir, sem impor seus valores e decisões, visto que na terapia
familiar quem traça o caminho é a família.
Em se tratando da Terapia Familiar Sistêmica, a Teoria Geral dos
Sistemas iniciou-se com a revolução cibernética no fim dos anos 40. A partir
desse período, terapeutas e pesquisadores começaram a atender grandes
números de famílias e criaram teorias para essa prática.
Ludwig Von Bertalanffy era biólogo, desenvolveu a Teoria Geral dos
Sistemas, incitando cientistas a pensar na interação. Na abordagem sistêmica,
a totalidade é considerada mais que a soma de suas partes, cada parte só
pode ser entendida no contexto de um todo. Caso haja mudanças em alguma
parte, vai afetar e alterar todas as outras. Isso também ocorre nas famílias, pois
a família funciona como um sistema vivo, complexo de elementos colocados
em interação.
Um sistema é composto de várias partes e que estas partes estão
sempre coerentes com entorno e o próprio sistema também está coerente com
entorno de outro sistema. Há um determinado padrão de funcionamento entre
si, tem sempre algo que emerge que é maior. É preciso explicar a interação
dessas partes.
Os sistemas podem ser:
Fechado = Não vivos. Não tem troca no meio;
Aberto = Organismos vivos. A sustentação vem da troca. A teoria
sistêmica entende a família como um sistema aberto, por que a considera
como um organismo vivo.
Em uma clinica psiquiátrica, a doença mental era considerada uma
doença somente da pessoa. Devido aos dias de visitação, aos pacientes
apresentavam uma regressarão no nível da doença, pois quando a família
participa há um movimento. Será que tem a ver a doença mental com a
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família? Daí os pesquisadores de uma determinada época se questionaram:
Qual era a relação da problemática do indivíduo com aquela família?
Aplicada a teoria de família, o sistema familiar é mais do que a perda
de uma conexão instala. Entretanto é necessário contemplar sinais de
interação de indivíduos na família. Como dentro dessa individualidade as
pessoas se relacionam. Juntando a fala de cada membro, em separado, é
possível concluir o que a família quer dizer.
Família Sistêmica – O olhar sistêmico sobre a família possibilita uma
troca interna, profunda e referencial para poder olhar o mundo da família
diferenciada. Todos os fenômenos que ocorrem no mundo não são isolados em
seu contexto, eles sempre repressão em seu contexto e a resposta dada a
cada fenômeno tem a ver com o TODO.
Quando se juntam dois elementos e se forma um inteiro, a soma das
partes não traça qual é o sistema. Quando o sistema ocorre, seja físico,
biológico ou das relações tem sempre algo que é maior do que aquela junção
das duas partes. É pensar na relação das partes desse sistema e na interação
desse sistema com o entorno. É preciso olhar os fenômenos isoladamente,
mas dentro de um contexto mais amplo.
“O enfoque da família como sistema vivo, a partir dos
postulados da teoria geral dos sistemas significa uma
maneira de compreender o que se passa dentro daquele
grupo, analogicamente é um retrato da família [...].
(SOUZA. 1996, p. 81).
É importante concentrar-se no padrão dos relacionamentos dentro de
um sistema ou entre os sistemas, e não na composição de suas partes, visto
que o ser humano não existe isolado, o tempo todo influencia e é influenciado
por tudo o que existe a seu redor.
O aspecto dinâmico do sistema leva a conceitos como a Cibernética,
ciência que estuda as comunicações e o sistema de controle nos organismos
vivos e não vivos. Este pensamento foi desenvolvido por diversas áreas do
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conhecimento cientifico absorvido pela prática clínica dentro do campo
psicoterapêutico.
Entender a família como sistema, significa entender o sintoma como
produto de inter-relação e deslocar o foco do sintoma do indivíduo para as
relações que o produzem e mantém. Portanto, a Teoria Sistêmica está nas
relações e a proposta terapêutica é trabalhar com todos os integrantes da
família ao mesmo tempo, enfocando que cada um dos seus membros tem
funções distintas a desempenhar.
O pensamento sistêmico já é um pensamento novo em ralação ao
paradigma tradicional. Ao fazer uma revisão de seus pressupostos
epistemológicos, o profissional se torna novo-paradigmático.
No dizer de Esteves de Vasconcellos (2000), essa nova epistemologia
extrapola o contexto das atividades profissionais e implica a pessoa que a
adotou efetivamente numa nova forma de viver. Assim, quem adotou o
pensamento sistêmico novo-paradigmático terá uma nova epistemologia para
seu viver, para seu estar e agir no mundo, baseado em sua única convicção
possível – a da inexistência da realidade e da verdade.
O profissional do novo-paradigma desempenha suas atribuições
visando melhorar as condições de autonomia do sistema, interage com o
sistema sem conduzi-lo conforme as suas convicções pessoais. Atua a fim de
possibilitar que os sujeitos se tornem agentes ativos de suas próprias
mudanças, solucionando suas dificuldades.
É dessa maneira que atua os Assistentes Sociais, criando estratégias
que possibilite à promoção e a autonomia da pessoa humana, respeitando a
decisão de cada usuário. É preciso analisar criticamente a realidade geradora
do conflito e buscar formas de intervenção para sua transformação.
O Código de Ética do Assistente Social (1993), diz o seguinte: “Garantir
a plena informação e discussão sobre as possibilidades e conseqüências das
situações apresentadas, respeitando democraticamente as decisões dos
usuários, mesmo que sejam contrárias aos valores e às crenças individuais dos
profissionais resguardados os princípios deste Código.” (Art. 5º, b).
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De acordo com Souza (1996), a terapia familiar, enquanto
procedimento terapêutico depende de um novo posicionamento do profissional,
que deixa de ter uma visão da realidade dentro de uma causalidade linear, para
considerá-la do ponto de vista de uma causalidade circular, em que as
influencias recíprocas caracterizam todo o processo.
A partir desse novo posicionamento dos profissionais, poderá surgir
uma ajuda mais efetiva. A experiência humana, em se tornando menos sofrida,
abre novos espaços para a beleza da pessoa humana.
Através da terapia familiar busca-se criar novos espaços que permitam
canais de comunicação mais livres, sem tantos ruídos, proporcionando assim,
oportunidades de trocas (idéias, pensamentos e sentimentos), contribuindo em
uma redistribuição de papéis e funções necessários ao bem-estar do todo.
Incorporando essa nova epistemologia às práticas sistêmicas,
implicam-se mudanças no papel do terapeuta e na própria concepção da
terapia. O terapeuta deixa de ser um observador externo e passar a ser visto
como mais um no sistema, um articulador nas conversações. O terapeuta co-
participa do sistema terapêutico, preocupando-se conhecer a organização
daquela família.
É no atendimento familiar, que os membros passam a receber atenção,
não só para suas inquietudes, como também começam a receber informações
fundamentais para a melhor compreensão do quadro de dependência química,
e conseqüentemente melhorar no relacionamento familiar.
Ao trabalhar com famílias o profissional de Serviço Social especializado
em Terapia Familiar, necessita contextualizá-la, sabendo de fato a sua história,
compreendendo o seu contexto sócio - econômico - afetivo e sua diversidade
ética e cultural. Transmitindo inclusive, a eficácia e a efetividade do seu
trabalho. A família conta uma realidade que é dela, e é preciso levar em
consideração.
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CAPITULO II
A DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUAS EXPRESSÕES
Compreender o mal não o cura, mas, sem dúvida alguma, ajuda. Afinal, é muito mais fácil lidar com uma dificuldade compreensível que com uma escuridão incompreensível. Carl Jung
A dependência química é uma das grandes expressões da questão
social que a sociedade tem vivenciado na atualidade. A sociedade
contemporânea, precisamente no século XXI, é marcada por mudanças
culturais, sócio-econômicas e de valores, que implicam necessariamente em
uma re-adaptação do indivíduo em seu meio. Diante de tantas modificações,
interferindo no comportamento do indivíduo em sua unicidade e na própria
coletividade, têm sentido os efeitos desses impactos.
De acordo com os dados da Secretaria Nacional de Políticas sobre
drogas, dependência química é o impulso que leva a pessoa a usar uma droga
de forma contínua (sempre) ou periódica (freqüentemente) para obter prazer.
Alguns indivíduos podem fazer uso constante de uma droga para aliviar
tensões e ansiedades. O dependente se caracteriza por não conseguir
controlar o consumo de drogas, agindo de forma impulsiva e repetitiva.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) em meados da década de
1950 catalogou o uso destas substâncias que conduzem a dependência
química como doença reconhecida como Código Internacional de Doenças
(CID10), pois elevam de forma dramática a mortalidade e a morbidade nas
populações. Dados da Organização Mundial de Saúde indicam o consumo de
drogas nos centros urbanos de todo mundo, independentes de sexo, idade,
nível de escolaridade e classe social, sendo considerado assim, um problema
de saúde pública.
O CID 10 define dependência como: “Conjunto de fenômenos
comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem depois de
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repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao
desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à
utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma maior
prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e
obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado
de abstinência física.”
A dependência química deve ser vista como um fenômeno social, pois
há uma generalização e agravamento de problemas familiares, sociais,
financeiros, legais, doenças, moral, credibilidade, trabalho e sexual.
Tratando-se de um problema social, tem que ser pensado em termos
de sua complexidade. Enquanto fenômeno social, as drogas tornaram-se
objeto de inúmeros discursos, por parte das instâncias do Estado, discursos
esses que visam um maior controle relativamente a uma matéria que, em
imediato demonstra a ineficácia das políticas públicas que têm sido
desenhadas.
A busca pelas drogas pode ocorrer por vários fatores. Assim não
podemos deixar de pensar no consumo de drogas como fenômeno social e
coletivo e que é necessário resgatar a auto-estima destes indivíduos dando um
novo sentido para sua vida pessoal, profissional e social.
“O problema da droga não existe em si, mas seria o
resultado do encontro de um produto, uma personalidade
e um modelo sócio-cultural. Isto quer dizer que qualquer
pessoa, a qualquer momento pode encontrar um produto
tóxico, legal ou ilegal, em seu caminho. Toda a política
sobre drogas deve levar em conta estes pressupostos.
Entretanto, a maioria das pessoas que experimentam
drogas uma ou algumas vezes não se tornará doente, o
que significa dizer que, diante da droga, não existe um
destino igual para todos.” (OLIEVENSTEIN apud
ACSELRAD, 2000, p.176).
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A definição dessas políticas exige competências técnicas e respeito à
popularidade de modelos de tratamento. Os governos devem assumir, sem
exploração política ou ideológica, suas responsabilidades no sentido de
garantir o acesso á orientação e ao tratamento de qualidade, respeitando os
direitos e as liberdades individuais.
Segundo Acselrad (2000), o Estado é responsável pela formulação de
políticas públicas de saúde, educação, juventude, família, previdência social,
justiça, emprego, no nível nacional e local, integrando atividades públicas e
privadas.
A dependência química expressa um sofrimento que leva as
dificuldades físicas, psíquicas e sociais, e mesmo prolongada deve ser
considerada como uma situação transitória. As pessoas nessa situação devem
sempre ter acesso a tratamentos, que respeitem sua dignidade e lhes permitem
inserção social. No que se refere aos direitos trabalhistas, o dependente deve
ter licença para tratamento, como em qualquer outro caso de doença.
“Não basta à informação limitada ao produto em si, é
necessário discutir sobre as políticas públicas, sobre a
organização da cidade, esclarecendo os problemas
vividos pelos diferentes grupos sociais e abrindo
possibilidades reais de intervenção nas condições de
vida.” LAZARUS, (apud ACSELRAD, 2000, p. 176).
Para compreender o processo de construção das drogas, devem ser
levadas em conta as vertentes políticas - que invade todas as atividades
humanas: a educação como ação social, política, sofre as injunções do poder.
Poder este que se sente perturbado, ameaçado pela produção acelerada de
drogas ilícitas e pelo consumo maior dessas substâncias, que se transformam
em ameaça à qualidade de vida social, psíquica e cultural, na medida em que
provoca danos ao meio ambiente, entre os quais a própria disseminação
descontrolada do consumo de drogas. E, a vertente do próprio contexto do
mundo dependente caracterizado pela miséria, instabilidades e crises,
ultimamente marcado pela globalização.
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O efeito da globalização está presente em todas as atividades
humanas, agravando a situação socioeconômica, o aumento do conflito
familiar, desenvolvimento de vícios, envolvimento com o tráfico de drogas e a
situação crônica de desemprego. Essas dificuldades fazem com que centenas
de famílias busquem alternativa de sobrevivência, impossibilitando o
prosseguimento dos estudos e a construção de um projeto digno de vida.
As crises contemporâneas são provocadas na medida em que o
processo produtivo se desenvolve no contexto do mercado e da concorrência.
O aumento da produtividade se impõe a qualquer outra consideração, como o
fantástico desenvolvimento da tecnologia resultante desse processo, tendo
uma dupla conseqüência: aumentar a produtividade e a produção, substituindo
o trabalho humano pela máquina. Cria-se então, a exploração do trabalho, a
baixa qualificação escolar, a miséria e o alto índice de drogas circulando por
todo país devido à competitividade e globalização do mercado capitalista.
Estamos vivenciando em uma sociedade doente e cada vez mais
competitiva, na qual resta pouco tempo e dinheiro para desfrutar do lazer.
O uso da droga tem uma história social que se expandiu de tal maneira
que hoje é veiculada até por ser anuncio publicitário, chegando as nossas
casas de modo enganador, como exemplo o álcool, nas campanhas
publicitárias é exaltado seu consumo nos momentos mais íntimos, em festas
familiares e nos encontros com amigos. Esquecendo-se de seus efeitos
prejudiciais.
“O uso de certas drogas lícitas – tabaco e álcool – é
evocado de forma glamourosa, drogas associadas à
juventude, beleza e sucesso. É imensa a diferença entre a
publicidade dessas substâncias lícitas e os clipes das
campanhas contra as de uso ilícito, onde o prazer é
totalmente negado, predominando imagens de perigo,
doença, escuridão, degradação física, horror e morte.
Dessa forma, permanece a confusão entre o verdadeiro e
o falso, que não contribui para esclarecer as diferenças de
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uso que foram, e continuam sendo construídas
historicamente. O esclarecimento se compromete, assim
como a construção de uma consciência de riscos.”
(ACSELRAD, 2000, p.173).
É preocupante o grande número de adolescentes e jovens iniciando e
envolvendo no caminho das drogas. Levados a usá-las pelo modismo da
época, pelo espírito grupal, pela ausência de perspectiva, pela falta de
oportunidade e, sobretudo, por falta de diálogos entre pais, mães e filhos.
Na tentativa de lidar com o problema das drogas e com suas
conseqüências, as famílias afetadas tendem ao isolamento, seja por sua
iniciativa, pelo sentimento de vergonha que a situação gera, seja pelo
preconceito de outros em relação à problemática. No interior da própria família,
o silêncio sobre o tema se impõe pela impossibilidade de encontrarem uma
solução ou até mesmo para evitar reviver o sofrimento.
Essa projeção dos problemas familiares sobre os jovens da família nos
fala da dificuldade de lidar com conflitos no interior das famílias. A negação ou
a dificuldade de se incorporar e dar algum espaço para o conflito na família,
com os elementos simultaneamente disruptivos e potencializadores nele
contidos, podem favorecer, inclusive, a eclosão da violência, sob distintas
formas, que viria justamente da falta de canais de expressão para os conflitos
próprios das relações familiares.
Entretanto, essas características negativas é preciso mencionar
também suas conseqüências sobre as relações humanas, e com um consenso
em admitir a existência de um mal-estar na sociedade contemporânea. Os
conflitos sociais e muitas vezes familiares resultam em um aumento de
consumo de drogas lícitas ou ilícitas, incentivando o crescimento da violência
social e a atual questão do tráfico de drogas.
Devido ao grande impacto que a dependência química causa nas
famílias, desencadeia uma série de conflitos intrapessoais e interpessoais. Isso
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ocorre por que a maioria das pessoas não tem conhecimento de que a
dependência química é uma doença a ser tratada.
Pensar a família numa dimensão de agente privado de proteção social
requer um esforço de repensarmos em suas funções. Visto que seus papéis
são expectativas de comportamento, de obrigações e de direitos que estão
associados a uma dada posição no meio familiar ou no grupo social.
Esses papéis baseiam-se na socialização das crianças e dos
adolescentes, atividades que possam contribuir para o desenvolvimento das
capacidades mentais e sociais; cuidados físicos e emocionais; dar suporte e
manutenção das relações, incluindo ajudas em situações de crise.
No dizer de Lourenço (2001), em alguns casos a família se comporta
como vítima, sentindo-se frustrados e impotentes ao agir. Não sabem como
buscar ajuda tanto para si, quanto para o usuário, desejam apenas encontrar
uma solução imediata para essa questão.
A família configura um cenário onde o conflito é intrínseco e, sendo
assim, o trabalho com famílias pode se dar no sentido de pensar os limites do
que é ou não negociável nas relações familiares, a partir da indagação sobre o
que constitui conflito para a própria família e não como uma definição externa.
Tratar do dependente não se resume à busca da abstinência2, é
também a construção de um novo estilo de vida, para o dependente e sua
família. O processo do tratamento é demorado, mas sabemos que cuidar de
uma dependência requer empenho do dependente.
Enquanto sistema total, a família funciona como um todo inseparável.
O indivíduo em suas relações influencia e é influenciado pelo seu grupo familiar
e são estes aspectos que devem ser detectados pelo terapeuta familiar.
Devido a esse conceito, é importante ressaltar que o dependente
químico necessita em excesso da família e de seu apoio. Nesse momento, é
necessária uma família que possa interagir com o dependente químico em seu
processo de recuperação, como um núcleo de suporte fundamental.
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CAPITULO III
O ASSISTENTE SOCIAL “TERAPEUTA” NA
DEPENDÊNCIA QUÍMICA
Não se pode ensinar nada a um homem; só é possível ajudá-lo a encontrar a coisa dentro de si. Galileu Galilei
A profissão do assistente social desenvolveu-se no final do século XIX,
a partir dos movimentos de caridade na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos.
Enquanto no Brasil, a primeira Escola de Serviço Social foi fundada em 1936.
As experiências profissionais do Assistente Social, possibilitaram-no
refletir sobre as mudanças ocorridas na sociedade e conseqüentemente suas
repercussões nos indivíduos, nas relações intrapessoais e principalmente
interpessoais .
Os profissionais de Serviço Social estão organizados de forma a atuar
no enfrentamento das expressões da questão social e facilitar a garantia do
acesso aos direitos e serviços para toda a população. Seu objetivo na área da
dependência química, está voltado para implementar ações sócio-educativas e
preventivas.
Segundo Iamamoto (2000), temos a questão social como base de
fundação sócio-histórico do Serviço Social no Brasil, que consiste em
apreender a prática profissional como trabalho e o exercício profissional inscrito
em um processo de trabalho.
Os Assistentes Sociais trabalham com a questão social nas suas mais
variadas expressões cotidianas. Volta-se para o atendimento das
desigualdades que a população sofre nas mais diversas áreas, como a saúde,
a habitação, a assistência social, a educação, entre outras.
A inserção do Serviço Social na área da dependência química se
configura através do conhecimento das expressões da questão social, que se
2 Quando um dependente deixa de usar subitamente uma droga.
24
modificam constantemente, permitindo ao Assistente Social intervir de forma
integrada para promover ações que possibilite ao usuário e sua família, uma
melhoria em seus espaços coletivos. Reforçando ainda, o sentido de cidadania
que culmina com reconhecimento dos seus direitos, o que implica um processo
de questionamento e revisão de suas atuações.
A atitude realizada pelos assistentes sociais é a da compreensão e de
mobilização para executar uma intervenção adequada. Investindo-se num
trabalho motivacional, pela busca da assiduidade em relação ao tratamento dos
usuários. Na etapa de recuperação, deve-se destacar e promover ações de
reinserção familiar e social.
É preciso sensibilizar as famílias quanto aos processos da vida social
seja por conhecimento das leis que os protege, seja pela reinserção no
mercado de trabalho, dando suporte social de medidas e recursos que podem
ser tomados para garantir o exercício da cidadania do dependente químico.
O Assistente Social no campo da dependência química desenvolve
suas atividades junto à equipe interdisciplinar, esse tipo de atuação requer do
profissional uma contribuição a partir das suas competências, visto que as
práticas interdisciplinares são o intercambio entre diferentes práticas
disciplinares, havendo trocas de informações e de conhecimentos.
De acordo com Rodrigues (2000), possibilita tanto a interlocução entre
as áreas dos saberes, quanto impede o estreitamento e a cristalização de cada
uma delas no interior de seus respectivos domínios. Favorece o alargamento e
a flexibilização dos conhecimentos, disponibilizando-os em novos horizontes do
saber.
O Assistente Social atua dentro de uma perspectiva sócio-educativa,
procura transmitir e discutir com os familiares, que a dependência é uma
doença e que precisa ser tratada. Assim, seus membros, que fazem o uso
abusivo das drogas, necessitam de ajuda, não como um “viciado”, e sim como
um doente.
A ação sócio-educativa que buscamos privilegiar no desenvolver do
processo terapêutico está voltada ação/ reflexão/ ação, visando uma ação com
o dependente químico. Nesse, o Assistente Social é um facilitador do processo
25
de autoconhecimento de todos os membros de uma determinada família.
Permitindo que estes se percebam identificando suas posições como seres no
mundo.
Esse processo não se dá somente com atuação do serviço social, mas
sim com uma participação ativa e consciente da família e do próprio
dependente químico.
Conforme Mioto (2002), As ações sócio-educativas estão relacionadas
às ações que, através de informação, da reflexão ou mesmo da relação, visam
provocar mudanças (valores, modos de vida).
As funções do Assistente Social junto ao dependente químico e sua
família são: Elaboração de projetos voltados para o resgate da auto-estima de
ambos; realização de reuniões com o grupo familiar, com a finalidade de
oportunizar espaços de reflexão, onde possam contribuir na melhoria dos
relacionamentos intrafamiliares; sensibilização quanto à necessidade do
tratamento; reflexão sobre as atitudes da família em relação ao dependente e o
comportamento familiar no ambiente doméstico; informação acerca da
dependência química (conceito e conseqüência); acompanhamento e
avaliação; articulações com instituições que possibilitem atendimentos
especializados e encaminhamentos para psiquiatras, psicoterapeutas e
homeopatas.
No Serviço Social, as novas práticas terapêuticas vêm surgindo e
abrindo espaços para discussões e questionamentos diante do Conselho
Federal de Serviço Social. As atuações do assistente social devem estar
apoiadas em uma formação especializada que lhe garanta a competência
técnica para qualificar sua prática ao atender as diversidades que emergem no
campo profissional.
Neste sentido, as práticas terapêuticas no Serviço Social,
compreendidas como processos de intervenção profissional necessitam está
de acordo com os princípios éticos do Serviço Social. Essas práticas
terapêuticas, atuando em intervenções individualizadas e com famílias nos
mais diversos e complexos fenômenos sociais da contemporaneidade,
representam mais um saber a serviço da população usuária.
26
O Serviço Social ao longo dos anos vem desenvolvendo a concepção
do indivíduo enquanto unidade biopsicossocial. Daí a necessidade do
esclarecimento quanto a função do assistente social em atuar como terapeuta
de família junto aos dependentes químicos e seus familiares, excluindo-se,
assim, a idéia de um “agente consolador”, mas partindo para uma atuação
concreta nos fatos que lhe são apresentados, preocupando-se em conhecer a
dinâmica da família que atende.
[...] ao considerar o ser humano como uma “unidade
biopsicossocial” fica evidente o papel decisivo da cultura,
em sentido amplo, na construção da subjetividade. Creio
que a atuação junto à família – Terapia de Família –
implica o conhecimento e a compreensão destes
elementos que influenciam e determinam a formação e
funcionamento familiar a cada momento de sua história.
[...] (SOUZA, 1996, p. 20).
Em grande quantidade, os profissionais de Serviço Social vêm se
especializando nas diferentes áreas no intuito de conquistar novos espaços. O
assistente social é responsável por fazer uma análise da realidade social,
intervindo para melhorar as condições de vida do usuário e disponibilizar
acesso às políticas socais. A adequada utilização desses instrumentos requer
uma contínua capacitação profissional que busque aprimorar seus
conhecimentos e habilidades nas suas diversas áreas de atuação.
O Serviço Social é uma profissão de caráter interventivo. Na sua
prática o Assistente Social, tanto nas ações terapêuticas como em outras
especialidades, enfrenta a necessidade de se capacitar, para exercer um
trabalho interdisciplinar com interface com profissionais de deferentes áreas.
O assistente social em seu exercício profissional, busca atualizar-se e
capacitar-se constantemente, a fim de oferecer respostas profissionais às
demandas oriundas dos processos sociais próprios da dinâmica da sociedade
brasileira.
27
Dessa forma, o exercício da profissão prevê competências teórico-
práticas, ético-políticas, técnico-operativas para defender o seu campo de
trabalho, suas qualificações e funções profissionais. É ir além das rotinas
institucionais e buscar apreender o movimento da realidade para detectar
tendências e possibilidades nela presentes, passíveis de serem executadas.
IAMAMOTO destaca:
“A afirmação de um perfil profissional propositivo requer
um profissional de novo tipo, comprometido com sua
atualização permanente. Capaz de sintonizar-se com o
ritmo das mudanças que presidem o cenário social
contemporâneo, em que “tudo que é sólido, desmancha-
se no ar”. Profissional que, também seja um pesquisador,
que invista em sua formação intelectual e cultural, e no
acompanhamento histórico-conjuntural dos processos
sociais, para deles extrair potenciais, propostas de
trabalhos, ali presentes como possibilidades,
transformando-as em alternativas profissionais” (2000, p.
145).
O trabalho com as famílias de dependentes químicos, nas suas mais
diversas configurações, compõe o cotidiano de trabalho do assistente social na
totalidade de suas intervenções. Entendemos que principalmente o que deve
nortear um trabalho social com famílias é o reconhecimento que as pessoas
são ou pode vir a ser autores e atores de sua própria história a partir do resgate
de seus saberes e quereres, da reconstrução de valores identificação de
habilidade e potencialidades, tendo em vista uma perspectiva emancipatória.
A seguir, depoimentos da Assistente Social e Terapeuta de Família:
28
“O meu objeto de trabalho enquanto Assistente Social e Terapeuta Familiar, é a é a família e/ou dependente químico. E, o meu objetivo é realizar uma escuta qualificada para a identificação do diagnóstico com base nas situações sociais e emocionais que envolvem o desenvolvimento da família assistida que terá como objeto o alcance deste dependente no processo de reinserção social, valorizado pelas nuances que perpassam pelo conceito do ser humano dentro do contexto biopsicossocial.” “Os instrumentos que utilizo no planejamento, na intervenção e na sistematização do meu trabalho é a reunião com a equipe interdisciplinar, sistematizando as ações profissionais. A sistematização contribui para a formulação de estratégias de ação apoiadas na própria reflexão sobre a experiência profissional.” “Os fundamentos teóricos presentes no trabalho profissional que subsidiam as referidas práticas terapêuticas devem seguir os conceitos contidos na didática do Serviço Social, assim como na especificação da formulação psicanalítica da teoria do desenvolvimento.”
Os instrumentos são variados: Entrevistas motivacionais
(questionários) com a família e o dependente químico; atendimento individual
e/ou grupal; formulação de prontuário técnico. Alguns profissionais
desenvolvem a Técnica Cognitivo-comportamental. Através de palestras,
dinâmicas de grupo, sensibilização da família e do dependente químico quanto
a condição de co-dependência.
Nessa metodologia Cognitivo-comportamental, envolve a prevenção da
recaída, o desenvolvimento de estratégias de autocontrole para que o indivíduo
seja o agente de suas próprias mudanças comportamentais.
Vale ressaltar que a qualidade de vida das famílias e dos dependentes
químicos, sempre será um conceito que avalia as condições da existência do
ser humano em relação ao ambiente que o cerca. Com isso, a melhoria da
qualidade de vida se representa como algo mais que um nível de vida particular
29
elevado, pois pressupõe uma infra-estrutura social pública capaz de atuar em
benefício do bem comum.
É necessária uma prática profissional eficaz diante as famílias, não só
no sentido de atender dentro de suas especificidades, mas de atuar em uma
prática investigativa. E é através desta investigação que o profissional
consegue visualizar e propor mudanças que contemplem desde a avaliação
das políticas sociais e programas até a implementação de uma nova gestão de
políticas sociais para dar conta desta situação.
"Assim torna-se prioritário que a família perceba que a
mudança de sua vida depende muito da sua participação
em movimentos reivindicatórios organizados, em busca
de melhores condições de vida" (MIOTO, 1997, p.125).
O fato da família, muitas vezes não saber o que fazer ou como agir
diante das drogas remete-os a uma disfunção no vínculo familiar. Há uma
tendência dos familiares de se sentirem culpados e envergonhados por
estarem nesta situação. Há ainda a inversões dos papéis e funções na família.
“A família que solicita ajuda é aquela que, por si só, não
se sente em condições de viver dentro de níveis de
angustia suportáveis, parecendo já haver tentado todas as
alternativas de solução a seu alcance.” (SOUZA,
1996:163).
Os critérios de ajuda e doença são extremamente variáveis e
subjetivos, sofrendo influencia determinante dos valores individuais como de
todo o contexto cultural. A compreensão do eu se passa com aquela
determinada família é o primeiro e decisivo passo no processo de ajuda.
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Para finalizar, citamos então, estratégias de ações que podem ser
realizadas pelo Serviço Social junto às famílias:
ü Abordagem familiar inicial (coleta de dados, aspectos socioeconômicos,
composição familiar e relações familiares);
ü Avaliação médica especializada (neuro ou psiquiatra) para verificarmos
possíveis comprometimentos orgânicos e justificar o comportamento
apresentado pelo dependente químico;
ü Construção da rede social e do genograma como instrumento para
identificar as relações interpessoais dos genitores. Com o intuito de
observar seus históricos familiares devido a falta de vínculos familiares;
ü Verificar as condições socioeconômicas da família para possível
encaminhamento aos benefícios necessários existentes;
ü Acompanhamento contínuo à família mediante visitas domiciliares,
visando conhecer sua dinâmica familiar;
ü Inserção da família em ciclo de palestras sócio-educativas e preventivas
que abordem questões como: higiene, doenças, hábitos alimentares,
etc.
Enquanto terapeuta de família, o assistente social, busca cada vez
mais uma visão global da realidade familiar para que diferentes
contribuições se tornem necessárias, buscando alternativas pra
minimizar os conflitos familiares.
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CONCLUSÃO
Pelo presente estudo, percebe-se que as problemáticas envolvendo a
dependência química atingem e interferem nas relações familiares e sociais
que perpassam todas as classes sociais e independem de idade, escolaridade,
cor, raça e nacionalidade.
Nas famílias, onde há dependentes químicos, percebe-se uma
fragilidade emocional, física, psicológica e financeira, trazendo implicações à
vida dos usuários e em suas relações familiares, impulsionando níveis de
desigualdade, afetando as relações intrafamiliares. É nesse contexto que o
Serviço Social é chamado a intervir.
Segundo a abordagem da terapia familiar sistêmica que se fundamenta
na inter relação das partes de um todo, intuímos que o dependente químico
não poderá ser visto, ouvido ou tratado de forma isolada, desconectado dos
subsistemas onde está inserido.
Na Teoria Sistêmica, um sistema é composto de várias partes e que
estas partes estão sempre coerentes com entorno e o próprio sistema também
está coerente com entorno de outro sistema. Há um determinado padrão de
funcionamento entre si, tem sempre algo que emerge que é maior. É preciso
explicar a interação dessas partes.
Em relação a atuação do Assistente Social enquanto Terapeuta de
Família, entendo a preocupação do Conselho Federal de Serviço Social, visto
ser o órgão julgador de primeira instância, tendo a competência de fiscalizar a
prática exercida pelos profissionais, instituições e organizações que fazem
parte da categoria.
A terapia familiar é justamente, um espaço de oportunidades, para que
possam discutir assuntos abordando a dependência química e sua
32
complexidade, onde cada família apresenta suas necessidades e dificuldades
em seu convívio familiar. A intervenção do assistente social junto às famílias
deve incluir ações direcionadas à formulação e à implementação de políticas
sociais que dêem condições para a sobrevivência do grupo familiar.
Ao Serviço Social cabe uma intervenção dinâmica e transformadora,
pois a sua atuação tem como meta buscar novas formas de lidar com as
demandas apresentadas nessa área de dependência química.
Junto a Assistente Social Terapeuta de Família, foi observado que a
influencia da teoria sistêmica no Serviço Social tem se dado na orientação dos
trabalhos com famílias. À medida que a família encontra um espaço para falar
de suas vivências, ela começa a desenvolver mudanças em suas atitudes,
tornando-se consciente e capaz de ver as coisas como realmente são,
encontrando maneiras saudáveis e apropriadas de lidar com tais situações.
É preciso acompanhar o movimento da sociedade e visualizar os novos
espaços de especialização e atuação, como possibilidades de intervir sobre
uma realidade social concreta, ampliando sua ação profissional.
Isto significa assumir o pressuposto da ação investigativa como novas
possibilidades de intervenção, na medida em que desvela o contraditório e
produz as condições necessárias para o enfrentamento e superação das
questões sociais que se apresentam cotidianamente.
Uma atitude investigativa permite revelar a essência do problema e
pensar o novo, e por isso, teoria e método mesmo sendo elementos distintos,
devem ser coerentes entre si. A teoria fundamenta a prática e encontra-se no
nível da abstração e, o método, por sua vez norteia a prática. Ambos devem
ser incorporados no agir profissional.
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A pesquisa permitiu compreender que o trabalho destes assistentes
sociais terapeutas de família deve ser realizados sob a perspectiva da
totalidade, não visualizando apenas o indivíduo, mas as relações mais amplas,
buscando formas de intervenção para sua transformação, a partir de
atendimentos às demandas mais imediatas que se fazem presente no cotidiano
do profissional.
34
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35
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VASCONCELOS, E.M. Saúde Mental e Serviço Social: o desafio da
subjetividade e da interdisciplinaridade. São Paulo: Cortez, 2000.
36
ANEXOS
• Qual o objeto do trabalho do Assistente Social?
• Qual o objetivo do trabalho profissional?
• Quais os instrumentos utilizados pelo Assistente Social no planejamento, na sistematização e na intervenção do trabalho profissional?
• Quais as atribuições do Assistente Social nas práticas
terapêuticas?
Perguntas feitas para Assistente Social e Terapeuta Familiar, Luciana da Silva Mancinho, que trabalha no Hospital de Guarnição da Vila
Militar/ RJ.
*perguntas questionadas pelo CFESS.