UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO …que defendia a função vital das florestas...

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A EVOLUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL E AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Por: Fernanda Sant´Ana Duarte Orientador Prof. Dr. Francisco Carrera Rio de Janeiro 2009

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  • UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

    PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

    PROJETO A VEZ DO MESTRE

    A EVOLUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL E AS UNIDADES DE

    CONSERVAÇÃO

    Por: Fernanda Sant´Ana Duarte

    Orientador

    Prof. Dr. Francisco Carrera

    Rio de Janeiro

    2009

  • 2

    UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

    PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

    PROJETO A VEZ DO MESTRE

    A EVOLUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL E AS UNIDADES DE

    CONSERVAÇÃO

    Apresentação de monografia à Universidade

    Candido Mendes como requisito parcial para

    obtenção do grau de especialista em Direito

    Ambiental

    Por: Fernanda Sant´Ana Duarte

  • 3

    AGRADECIMENTOS

    Agradeço è Deus por permitir a

    existência humana e sobrepor a sua

    força sobre todas as coisas; aos meus

    pais, Vânia e Roque; ao meu irmão

    Rodrigo; e ao meu amor, Rodrigo.

  • 4

    RESUMO

    A presente monografia tem por assunto a análise do processo histórico

    ambientalista e a criação de Unidades de Conservação como instrumento de

    proteção ambiental.

    A priori, faz-se uma breve análise sobre os aspectos históricos da

    legislação ambiental, da maneira a permitir a percepção do nascimento da

    proteção ambiental, como isso se inseriu no Brasil Colônia e se desenvolveu

    ao longo das décadas, chegando a real necessidade de conservação.

    No segundo momento, discorre-se sobre os conceitos de meio

    ambiente, passando pelos seus diversos aspectos, sejam eles naturais,

    artificiais e culturais, concluído numa definição ampla e abrangente.

    Posteriormente, chega-se ao objeto desta obra, as Unidades de

    Conservação. O trabalho visa conceituar e descrever a forma de criação,

    gestão, manejo e espécies de áreas protegidas estabelecidas na categoria de

    Unidades de conservação, regulamentada pela lei 9.985/200 e o Decreto

    4.340/2002.

  • 5

    METODOLOGIA

    Como metodologia, são utilizadas as pesquisas doutrinária e legislativa.

    As referências bibliográficas não se limitam apenas aos autores da área do

    Direito, sendo utilizadas também outras áreas do conhecimento.

    Contudo, as principais bibliografias variam em doutrinas específicas em

    Direito Ambiental, como: Direito do Ambiente de Édis Milaré; Direito Ambiental

    do Paulo de Bessa Antunes; Direito Ambiental Brasileiro de Paulo Afonso

    Leme Machado; e A evolução do Direito Ambiental no Brasil de Juracy Perez

    Magalhães.

    .

  • 6

    SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO 07

    CAPÍTULO I - A Evolução das Normas Ambientais 09

    CAPÍTULO II - O Conceito de Meio Ambiente 24

    CAPÍTULO III – Unidades de Conservação 31

    CONCLUSÃO 64

    BIBLIOGRAFIA 65

    ÍNDICE 66

    FOLHA DE AVALIAÇÃO 67

  • 7

    INTRODUÇÃO

    A obra tem como objeto analisar as Unidades de Conservação a partir

    do processo de evolução do pensamento preservacionista até a criação do

    Sistema Nacional de Unidades de Conservação. O dever de se definir, em

    todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a

    serem especialmente protegidos, ocupa hoje o status de garantia

    constitucional.

    A escolha do tema foi motivada não apenas pelo fato de a problemática

    ambiental ser um tema recorrente, mas pela suma importância que exerce

    sobre a sociedade. O meio ambiente traz consigo o poder de influência

    desde a sobrevivência humana até o desenvolvimento econômico e social.

    O Direito Ambiental, então, por meio de princípios e normas coercitivas

    reguladoras das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam

    afetar o meio ambiente, visa o desenvolvimento sustentável e a preservação

    da natureza para as presentes e futuras gerações. Contudo, para que as

    finalidades do direito do ambiente sejam conquistadas, são criados

    instrumentos de preservação, dentre eles as Unidades de Conservação.

    Ao longo da evolução normativa brasileira, os espaços dotados de

    importância ecossistêmica, de beleza natural cênica e de atributos de

    relevante interesse ecológico, passaram a ser protegidos e conservados de

    acordo com a sua característica especial. No entanto, foi com o advento da

    Lei 9985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de

    Conservação- SNUC, que as Unidades de Conservação se tornaram

    instrumentos consolidados com objetivos de conservação e limites definidos,

  • 8sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias

    adequadas de proteção.

    É nessa linha de raciocínio que o presente trabalho acadêmico será

    elaborado, com base no Direito Ambiental, nas normas jurídicas de proteção

    ao meio ambiente tendo por objeto as Unidades de Conservação.

  • 9

    CAPÍTULO I

    A EVOLUÇÃO DAS NORMAS AMBIENTAIS

    O contexto histórico-cultural deve ser analisado para ser possível

    compreender de onde emergiu a preocupação com o meio ambiente.

    Através da história, percebe-se a ação do homem, inclusive no que se

    refere à intervenção na natureza, que afetou, direta e indiretamente, de forma

    nociva o meio ambiente. As atividades degradantes são muito antigas, devido

    à necessidade do homem de produzir energia, bens de consumo, urbanização,

    alimentação etc. Ele recorreu aos recursos naturais, transformando-os, porque

    almejava o desenvolvimento social e econômico. Essas transformações dos

    recursos naturais produziram efeitos na vida prática, gerando conflitos de

    interesses e novas relações jurídicas, as quais passaram a carecer de

    regulamentação que visasse ao equilíbrio ambiental e social. Neste sentido,

    observa-se que, ao explorar a natureza, o homem produz conseqüências que a

    lei julga relevante para a proteção do direito.

    1.1- Um Breve Panorama da Proteção Ambiental Pelo Direito

    A necessidade social de se regularizar as novas relações surge na

    própria evolução da sociedade.

    Nas mais antigas civilizações, já se têm registro das relações jurídicas

    ambientais. Nas civilizações datadas antes de Cristo, já se tem registro, da

    dinastia Chow do ano de 1122 AC até 255AC e revelou uma recomendação

    imperial para a preservação das florestas1. Outras dinastias sucessivas

    também expuseram a preocupação com a meio ambiente, e somaram ao

    1 Pereira,

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  • 10caráter preventivo a idéia de restauração, como reflorestamento de áreas e

    criação de estações experimentais.

    Juraci Perez Magalhães apresenta importantes dados sobre a proteção

    de recursos naturais ao longo dos séculos, chamando atenção para o fato de

    que em outras culturas da antiguidade também prezavam o papel ambiental,

    como, por exemplo, a Grécia no século IV AC, por meio do pensador Platão

    que defendia a função vital das florestas para regular o ciclo da água e

    defender o solo da erosão. Cícero, patriota e exaltador dos valores romanos,

    considerava inimigos do Estado aqueles que cortavam as florestas da

    Macedônia. Nestas civilizações antigas existiam leis de preservação do meio

    ambiente. A própria Lei das XII Tábuas, de 450 AC, continha em seu texto

    prevenções de devastação de florestas. No entanto, não era só a flora o foco

    da proteção, pois se sabe que em 242 AC o imperador Osaka da Índia

    promulgou um decreto de proteção aos animais terrestres e peixes. E, Kubli

    Kan, Senhor Mongol, proibiu a caça durante o período de reprodução de

    mamíferos e aves. Na áfrica, devido à grande diversidade da fauna, os reis

    instituíram há séculos verdadeiros santuários de fauna. A floresta de

    Bialowieza, na Polônia, hoje um Parque Nacional, foi a primeira reserva de

    fauna fundada no mundo.2

    Édis Milaré comenta que em 1446, baseado no Direito Canônico e no

    Direito Romano, sob reinado de Dom Afonso V, foi concluída a compilação do

    considerado primeiro código europeu por Portugal, chamado de Ordenações

    Afonsinas. Estas continham em seu corpo proibição de abatimento deliberado

    de árvores frutíferas (suposto crime de injuria ao rei) e proteção a aves.3

    Juraci Perez completa que na França, devido à exploração desenfreada,

    a madeira se tornou escassa, e, em 1669, Colbert, considerado a pai do

    2 ��)�*+,'&������ �-

    3 MILARÉ, Edis. Direito do meio ambiente.4° edição. Editora Revista dos Tribunais, São Paulo: 2005, p.135.

  • 11mercantilismo, promulgou o muito conhecido decreto das águas e floresta para

    combater a escassez.4

    Ao longo dos séculos o homem vem explorando os recursos naturais e

    hoje há uma grande preocupação com graves problemas ambientais que a

    humanidade enfrenta. Torna-se, portanto, relevante fazer uma breve referência

    ao movimento ecológico.

    1.2- O Movimento Ecológico

    Na década de 1960, explica Carlos Walter Porto, começam a emergir

    os movimentos sociais, dentre eles o movimento ecológico. A intenção de

    proteger a natureza começa a partir dos movimentos sociais, dentre eles os

    das mulheres, dos negros e das minorias étnicas.5

    Esses movimentos, portanto, diferentemente do movimento operário,

    que criticava o modo de produção, vêm criticar o modo de vida, a situação de

    vida concreta dos jovens, mulheres, anti-racistas, e exigir modificações dessas

    condições. Um pertinente exemplo dessa postura são os beatnik e os hippies.

    O movimento ecológico cuja participação cresce na cena política, ganha

    espaço entre as camadas da sociedade, e leva a sério as indagações acerca

    das presentes condições de vida, desenvolvendo-se, então, lutas em torno de

    assuntos variados: urbanização desenfreada, desmatamento, poluição da água

    e do ar, erosão do solo, extinção de espécies, explosão demográfica, uso de

    agrotóxicos, contaminação de alimentos, diminuição das terras agriculturáveis

    devido à construção de barragens, guerra bacteriológica etc. Afirma Carlos

    Walter Porto Gonçalves: “Não há, praticamente setor de agir humano onde

    4 MAGALHÃES.ob.cit.p.2. 5 GONÇALVEZ, Carlos Walter Porto. Os (des) caminhos do meio ambiente. 4° edição. São Paulo: Editora Contexto, 1993, p.11/12.

  • 12ocorram lutas e reivindicações que o movimento ecológico não seja capaz de

    incorporar”.6

    Segundo Édis Milaré, com a emergência do movimento ecológico na

    década de 60 contribuiu-se para novas regras e regulamentos legislativos no

    ordenamento brasileiro, alimentadas por normas mais diretamente ligadas à

    prevenção e ao controle da degradação ambiental.7

    O fato é que tal movimento deu início a reflexões que visavam a outros

    valores culturais e referenciais de vida. O efeito conjunto desse movimento

    provocou o surgimento de novos valores que priorizaram melhores condições

    de vida à humanidade e não apenas os problemas do consumismo, a

    institucionalização operária e a organização social e política.

    1.3- A evolução do Direito Ambiental no Brasil

    A preocupação em proteger o meio ambiente no Brasil vem de tempos

    muito remotos, pois aqui se encontravam recursos naturais riquíssimos e uma

    grande biodiversidade. Nossas florestas significavam, e até hoje significam,

    um patrimônio de grande valor. E os recursos naturais aqui presentes são a

    garantia de sobrevivência, e de qualidade de vida para nossa população. Eis,

    então, a razão pela qual existe a necessidade de se proteger o meio ambiente

    brasileiro.

    1.3.1- As normas Ambientais no período Pré-Republicano

    Este período pode-se dividir em dois momentos: Do descobrimento do

    Brasil até o Governo Geral, e 1548, no qual se aplicavam leis da legislação do

    Reino, sem as adaptarem para a realidade do Brasil Colônia. E a partir do

    6 Idem.p.12.

  • 13Governo Geral, no qual são criados instrumentos legais próprios, tais como

    Regimentos, Alvarás, Ordenações de acordo com a realidade do Brasil

    Colônia.8

    No Brasil, é incontestável e óbvio que as primeiras normas de

    preservação da natureza foram importadas dos nossos colonizadores

    portugueses, atuando de forma originária para as relações jurídicas ambientais

    presentes aqui.

    No período Colonial, por motivo do descobrimento do Brasil, foram

    inseridas as Ordenações Afonsinas, contendo o mesmo teor que vigorava em

    Portugal. Anos depois, em 1514, foram instituídas as Ordenações Manuelinas.

    Enquanto isso a monocultura avançava e começava-se a devastação no

    Nordeste brasileiro, o que importava era o aspecto econômico das florestas.

    No entanto, as ordenações defendiam o meio ambiente por interesses de

    cunho econômico e, também, para resguardar as riquezas naturais, aqui

    existentes, da cobiça estrangeira. Por isso, esse regime que implantou as

    sesmarias, foi o grande responsável pela devastação do território brasileiro.9

    Édis Milaré ressalta que com a tomada do Reino Português pela

    Espanha, em 1603, foram adotadas as Ordenações Filipinas que mantiveram a

    tipificação do crime de corte de árvores de fruto, a vedação de sujar as águas

    dos rios e lagoas e a previsão de pena para o infrator que matasse animais

    “por malícia” 10

    Isabella Franco Guerra ressalta que além do cultivo de cana-de-açúcar,

    o ciclo degradante envolvia a exploração de madeiras, principalmente o Pau-

    7 MILARÉ, Édis. Op.cit.p.139. 8 MAGALHÃES.op.cit.p.27. 9 MAGALHÃES. Ob.cit.p.25-26. 10 MILARÉ. Op.cit.p.135-136.

  • 14Brasil. A preocupação com os recursos naturais era econômica e visava

    proteger os bens da Coroa Portuguesa. Diante disso, destaca-se a primeira lei

    de proteção florestal no Brasil, o Regimento do Pau-Brasil editada em 1605

    teve vigência até o ano de 1859 11. E, em 1799, surgiu o primeiro regimento de

    cortes de Madeira que fixava severas regras para o abatimento de árvores.

    Todavia, o grande marco foi a criação da primeira unidade de

    conservação em 1808, trata-se do Jardim Botânico, uma área de proteção

    ambiental, criada antes do Império, designada à preservação de espécies e

    aos estudos científicos, observando–se nesse momento uma visão menos

    econômica e mais conservacionista do meio ambiente.

    No Império, ocorreram algumas mudanças no sistema fundiário. O

    Regime das Sesmarias foi extinto, em 1822, pelo Imperador, de maneira que a

    nova estrutura fundiária se dava por meio de ocupação pura e simples,

    prosseguindo a exploração desenfreada, devastação das florestas e destruição

    de recursos naturais iniciadas no período colonial. A ocupação se fazia de

    forma agressiva e indisciplinada.12

    Em 1824, é instituída a nossa primeira Constituição. Mesmo diante do

    panorama de degradação ambiental no cenário brasileiro, a norma maior não

    incluiu no seu texto nenhum artigo que dispusesse sobre proteção ambiental.

    Paulo de Bessa Antunes opina que na ocasião da outorga o país era

    essencialmente exportador de produtos minerais e agrícolas, e a intenção

    predominante eram as atividades econômicas.13 Somente em 1830, o primeiro

    11 GUERRA, .��%�� ����� �#�� /�"�� 0%���� ��� �$%��� ��� � ������� ����� ������ 12

    12 MAGALHÃES.ob.cit.p.33-34. 13 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.p.59

  • 15Código Criminal inclui no diploma legal pena para o corte ilegal de madeira. A

    preocupação ainda era de natureza patrimonial e não ambiental.14

    No entanto, a lei mais importante da fase colonial foi a Lei n° 601, de 18

    de setembro de 1850, a famosa Lei de Terras, regulamentada pelo Decreto n°

    1.318/54. Tal lei, fruto dos planos de José Bonifácio 15·, lembrou do papel

    ambiental da terra e propiciou avanços significativos para a causa ambiental, a

    fim de evitar a agressão ao meio ambiente através da utilização da terra,

    punindo as atividades predatórias.16 De acordo com o exposto no Art. 2° da

    referida lei:

    “Os que se apossarem de terras devolutas ou de alheias, e nelas derrubarem matos ou lhes puserem fogo, serão obrigados a despejo, com perda de benfeitorias, e demais, sofrerão as penas de dois a seis meses de prisão e multa de cem mil reis, além da satisfação do dano causado. Esta pena, entretanto, não terá lugar nos atos possessórios entre heréus confinantes” 17

    Dar-se-á destaque à iniciativa do Imperador Pedro II, de rearborizar a

    floresta da Tijuca, uma unidade de proteção ambiental situada na cidade do

    Rio de Janeiro, criada em 1861.18

    1.3.2 - As normas ambientais no período Republicano

    14 MILARÉ.ob.cit.p.137. 15���3 ����45��� � ������� &��"�� � 6 �������� �� .�����7����8 � ����� ������������94��� :��9���� ��$ ������ ���������� �� '����� ��3 �� 0���$�� ���� �� .$�3���� 4��$������� ;�����"� � ������ �������� ���� ��� � �$%������ �����"� ���� ����$���$����� ���� � �����#�� ��� ������ ����� �����4���#�� �!��� ��������� ��������� �������� �����"�$ � ��9� ���� � ������#�� �� $�� �$%��� ���

  • 16No início da República, como herança dos nossos colonizadores,

    guardava-se a preocupação com as florestas enquanto riqueza nacional. O que

    se observava era uma depredação ambiental impune.

    Institui-se uma República, e com elas algumas relevantes mudanças de

    cunho ambiental. Foi instituída, em 1911, a primeira reserva Florestal do Brasil

    no território da Acre, esta de grande extensão. Fundada por força do Decreto

    8.843, destacamos o artigo 2°: “É vedada a entrada nas áreas da reserva

    florestal e nelas proibia a extração de madeira ou de quaisquer produtos

    florestais, bem assim o exercício da caça e da pesca”. Vale observar que tal

    reserva florestal não foi implementada, porém já acusa uma pequena

    preocupação em criar áreas de proteção. Outra significativa contribuição foi

    criar Órgãos de defesa ambiental. Em 28 de dezembro de 1921, foi instaurado

    o Serviço Florestal Brasileiro, tal qual deu origem ao atual IBAMA – Instituto

    Brasileiro da Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis.19

    Foi criado, também, em 1934 o primeiro Código Florestal brasileiro.20

    E, ainda em 1934, foi promulgada nova Constituição, carta esta que

    omitia o aspecto ambiental, muito embora esta tenha sido uma Constituição

    efêmera, já que em 1937 veio uma nova Constituição. Contudo, seu texto

    oferecia algumas novidades e envolvia o direito ambiental em evolução. Por

    exemplo, o art. 10°, alínea “c”, que atribuía competência concorrente à União e

    aos Estados-Membros para cuidarem da saúde e assistência pública e

    protegerem as belezas naturais e os monumentos de valor histórico ou artístico 21·. No mesmo ano foi criado o Código de águas (Decreto 24.643/34).22

    18 MAGALHÃES.ob.cit.p.37. 19 idem.ob.cit.p.41-46. 20 MILARÉ.ob.cit.p.139. 21 MAGALHÃES.ob.cit.p.43. 22 MILARÉ.ob.cit.p.139.

  • 17Juraci Perez destaca-se também nessa fase: a I Conferência Brasileira

    para Proteção da Natureza, realizada no Rio de Janeiro; a criação do primeiro

    Parque nacional do Brasil, em 1937, o Parque Nacional de Itatiaia no Rio de

    Janeiro, e posteriormente, no ano de 1939 foram criados o Parque Nacional do

    Iguaçu e o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, criados com base legal

    disposta no Código Florestal de 1934. 23 E em 1943, através do Decreto

    Legislativo n° 3, foi aprovada a participação na Convenção para proteção da

    Flora, Fauna e das Belezas Cênicas Naturais das Américas, que estabeleceu

    no ordenamento brasileiro outras espécies de unidades de conservação.24

    Conduzidos ao Regime Democrático, foi criada uma nova Constituição,

    a de 1946, a qual não tratava da matéria ambiental. No entanto, trazia em sua

    carta o assunto “desapropriação por interesse social” (art. 141, § 16). Diante da

    regulamentação da lei, em 1962, entende-se como interesse social a proteção

    do solo e a preservação de cursos mananciais de água e de reservas

    florestais.25 E, de acordo com Paulo Affonso Leme Machado, a Constituição de

    1946 previa o estabelecimento de “normas gerais pela União”, contudo não

    previa normas gerais sobre o meio ambiente.26. Paulo de Bessa cita o artigo

    5°, inciso XV, alínea 1, da Constituição de 1946, que fixava a competência da

    União para legislar sobre águas, pesca florestas, caças e pesca, por

    exemplo.27

    Em 1965, criou-se a Lei n.º 4.771, de 15 de setembro, alterada pela lei

    n.º 7.803/89, instituiu o Código Florestal vigente até hoje. Entre suas

    disposições, pode-se citar a criação de áreas de preservação permanente e

    reserva legal (art. 2°, incisos II e III), trazendo como grande inovação a

    definição de áreas utilizáveis e áreas que não permitiam utilização, já

    23 MAGALHÃES.op.cit.p.44. 24 ANTUNES.ob.cit.p.626. 25 idem.o.b.cit..p.45. 26 MACHADO, Paulo Afonso Leme.Direito Ambiental Brasileiro. 14° edição. Malheiros Editores, São Paulo, 2006, p.105. 27 ANTUNES.op.cit.p.62.

  • 18incorporando como instrumento de defesa da natureza o modelo de espaços

    territoriais protegidos.28

    E em 1967, podemos evidenciar: a lei de Proteção a Fauna (lei 5.197); o

    Código de pesca (Decreto-lei 221); o Código de Mineração (Decreto-lei 227); a

    Política Nacional de Saneamento (lei 5.318). 29

    Juraci Magalhães afirma que em 1971 foi elaborado o I Plano Nacional

    de Desenvolvimento, a ser executado de 1972 a 1974, o qual contribuiu

    negativamente para o cenário ecológico nacional. Os programas de

    desenvolvimento ligados ao Plano levaram a uma extensa devastação e

    destruição dos recursos minerais. O I Plano de Desenvolvimento por ter sido

    um desastre, ocasionou a mobilização da opinião pública.30

    E no mesmo momento começou a repercutir muito tenuemente o

    Movimento Ecológico no Brasil, iniciado na Europa no início da década de 60.

    Segundo Carlos Walter Porto três foram as fontes que deram início ao

    movimento ecológico aqui no Brasil: o Estado, que atraído por investimentos

    europeus ficou condicionado às exigências dos estrangeiros de se seguir aqui

    uma política preservacionista de preocupação com meio ambiente; o

    movimento social gaúcho e fluminense, que encarou lutas que reuniam

    ecologistas de todo o país, mas que tiveram sua raiz no Estado do Rio Grande

    do Sul, onde foi fundada a AGAPAM- Associação Gaúcha de proteção ao Meio

    Ambiente; e por fim, a colaboração dos diversos exilados políticos, que viveram

    de perto as experiências do movimento ecológico na Europa, e chegaram ao

    Brasil no fim da década de 70, e que posteriormente, juntaram-se ao

    28 ANTUNES. ob.cit.p.626. 29 MILARÉ.op.cit.p.139. 30 MAGALHÃES.op.cit.p.46-47.

  • 19movimento social gaúcho e fluminense31. Mas Paulo de Bessa Antunes ainda

    destaca como contribuidor para esse movimento, o “empate”, movimento dos

    seringueiros que impediam a derrubada de florestas com a finalidade de

    preservar os seringais e seu próprio modo de vida e de produção, que teve sua

    maior liderança em Chico Mendes.32

    Sebastião Gomes situa que em 1972, sofremos a influência da

    Conferência das Nações Unidas sobre o meio Ambiente Humano, uma

    importante reunião da ONU realizada na Suécia, também conhecida como

    Conferência de Estocolmo que e gerou documentos interessantes os quais

    objetivavam a preservação e melhoria do ambiente humano. Esta declaração

    não foi um tratado, pois não possuí a força obrigatória para os signatários,

    constituindo mera afirmação de princípios. 33 Édis Milaré em monografia

    produzida registra seu pensamento sobre a questão. 34

    É, então, a partir da década de 80 que a matéria ambiental em torno de

    sua tutela jurídica começa a se desenvolver de forma consistente, global e

    sistêmica.

    Importante frisar o marco dessa época, a Lei n.º 6.938 de 31 de agosto

    de 1981, considerada compatível com os incisos VI e VII do art. 23 e art. 225

    da Constituição de 1988 (pois aquela foi recepcionada por esta), que e dispõe

    sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, a qual estabelece princípios bem

    conceituados e fins e mecanismos de formulação e aplicação. Instituiu o

    SISNAMA –Sistema Nacional do Meio Ambiente – e como seu órgão consultivo

    foi criado o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente. Vale citar que a

    31 GONÇALVEZ.op.cit.p.16. 32 ANTUNES, ob.cit.p.63. 33 GOMES, Sebastião Vadir. Direito Ambiental Brasileiro. Porto Alegre. Editora: síntese, 1999.p.26. 34 “ os governos de então, dos países do chamado Terceiro Mundo, dentre os dentre os quais o Brasil (à época governado por um regime militar cujo poder era exercido e constituído a partir de sucessivos atos institucionais) de início resistiram aos comandos de tais normas internacionais, sob o argumento de que os países ricos, depois de desenvolverem-se à custa de seus recursos naturais, queriam agora estabelecer

  • 20lei trouxe como um dos seus objetivos a definição de áreas prioritárias de ação

    governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico (art.. 4° II), além

    de instituir como um dos seus instrumentos a criação de espaços territoriais

    especialmente protegidos, tais como áreas de proteção ambiental e reservas

    extrativistas.

    De grande relevância, também, foi a Lei n° 7.347/85, que foi criada

    diante da necessidade de uma ação específica como meio processual de

    legitimar alguém para defender o meio ambiente. Portanto, a mencionada lei

    criou a Ação Civil Pública, modo de provocar a atividade jurisdicional para

    defender o ambiente, evitar um dano ecológico e obrigar o degradador a

    reparar o dano, e outros interesses difusos e coletivos. Isabela Franco Guerra

    opina:

    “A lei de Ação Civil pública trouxe em seu bojo uma série de

    inovações técnico-processuais, permitindo um alargamento no Direito Processual e estabelecendo alterações consideráveis capazes de delinear uma mudança na ótica privatística do processo civil.” 35

    Finalmente, é promulgada em 5 de outubro de 1988 a vigente

    Constituição da República, considerada uma das mais adiantadas do mundo.

    As Constituições anteriores omitiram um tratamento específico sobre o meio

    ambiente. Entretanto, a Constituição de 1988 prevê em seu texto um capítulo

    integralmente dedicado ao meio ambiente, o capítulo VI, do título VIII, da

    Ordem Social, no texto do artigo 225.

    O meio ambiente ecologicamente equilibrado é tratado, pela

    Constituição Brasileira, como bem de uso comum do povo e como peça

    essencial à sadia qualidade de vida, cabendo ao Poder Público e à

    coletividade a obrigação de defendê-lo e preservá-lo para as atuais e futuras

    gerações. No art. 225, parágrafo 1°, a Constituição estabelece outras

    incumbências do Poder Público, como, por exemplo, o dever de regulamentar

    exigências de qualidade ambiental que retardariam e encareceriam os processos de desenvolvimento dos demais países.” Apud GOMES, ob.cit. p. 26. 35 GUERRA.op.cit.p.9.

  • 21espaços territoriais especialmente protegidos, de exigir o estudo prévio de

    impacto ambiental para instalação de atividades potencialmente causadoras e

    o de promover a educação ambiental. E os demais parágrafos também fixam

    normas de gestão ambiental, tais como: a limitação na exploração de minerais

    (§ 2°); a imposição de sanções aos que conduzirem atividades lesivas ao meio

    ambiente (§ 3°); a enumeração dos ecossistemas que são considerados

    patrimônio nacional (§ 4°);

    A redação Constitucional ainda fez referência ao meio ambiente em

    outros dispositivos. O art. 5 °, LXII, que concede ao a qualquer cidadão a

    legitimidade para propor ação popular a fim de evitar ato lesivo ao meio

    ambiente, o art. 170, que julga a defesa do meio ambiente como princípio de

    uma existência digna, nos ditames da justiça social. E dispõe em relação à

    propriedade o dever da função social desta, que tem como requisito a

    “utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio

    ambiente” (art. 186, II).

    A partir desse avanço sistematizado no corpo da Constituição, o Direto

    Ambiental Brasileiro só se aperfeiçoa, e vários acontecimentos vêm fortalecer

    esse novo ramo do direito moderno.

    Acontece, em 1992, um encontro no Rio de Janeiro, a Conferência das

    Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, mais conhecida

    com Rio Eco 92, evento que refletiu mundialmente, tendo em vista o número

    alto de países participantes em prol da defesa do meio ambiente e da salvação

    da natureza. E como frutos desse encontro surgem cinco acordos: a

    declaração de princípios sobre o Uso das Florestas; a Convenção da

    Diversidade Biológica; a Convenção sobre Mudanças Climáticas; a Declaração

    do Rio, que declara 27 princípios orientadores do desenvolvimento sustentável;

    e o mais importante deles, a Agenda 21, um documento de 40 capítulos cuja

    tentativa é de promover a cooperação em escala planetária, um novo padrão

  • 22de desenvolvimento e a qualidade de vida humana tendo em vista aspectos

    sociais, ambientais, institucionais e jurídicos.

    Veio contribuir para o aperfeiçoamento da tutela ambiental outra lei

    considerada um marco, a Lei n.º 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, chamada

    Lei de Crimes Ambientais. Instituem-se “sanções penais e administrativas

    derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente” de forma

    unificada, penas uniformizadas e legislação sólida. Ela trouxe inovações para o

    tema, uma delas foi a inclusão da responsabilidade da pessoa jurídica como

    parte ativa do crime. 36

    Como meio de promover a conscientização ambiental da sociedade, a

    educação ambiental é designada como componente permanente e essencial

    da educação nacional, formalizada pela Lei 9.795 de 1999, que institui a

    Política Nacional de Educação e dispõe acerca da Educação Ambiental.

    Diante do dever constitucional, que cabe ao Poder Público, de definir

    espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos,

    cria-se no ano 2000 a Lei 9.985, que institui o Sistema Nacional de Unidades

    de Conservação da Natureza –SNUC- e preceitos e formas de criação,

    implementação e gestão dessas unidades.

    Para ilustrar mais um dispositivo que reflete o adiantamento da

    problemática ambiental, destaca-se o novo Código Civil de 2002 que

    estabelece que uma propriedade, para cumprir sua função social, deve ser

    utilizada de forma a atender às exigências de ordem pública, sem

    comprometer a segurança ambiental.

    E para reafirmar o avanço das regulamentações sobre o meio ambiente,

    a legislação brasileira, por meio da Lei 11.105 de 2005, ordenou a Lei de

    Biossegurança. Esta lei versa sobre a segurança e mecanismos de fiscalização

    36 MILARÉ.ob.cit.p.142.

  • 23de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados (OGM),

    cria o Conselho Nacional de Biossegurança e dispõe sobre a Política Nacional

    de Biossegurança.

    Através da história, observamos, desde sua existência, a ação

    predatória do homem com a natureza, e, então, a necessidade de se criar

    meios que regulassem e acima de tudo protegessem as condições e os

    recursos naturais em busca de qualidade de vida. De fronte ao progresso

    social, às mudanças de valores, aos movimentos sociais e aos avanços de

    cunho educacional, científico e tecnológico, essa necessidade de tutelar o

    meio ambiente passa a evoluir e se dar, não mais de forma teórica e ineficaz, e

    sim de maneira prática, efetivamente real e uniformizada. Eis que se chega ao

    Direito Ambiental moderno e consolidado.

    Vale enfatizar que, mesmo possuindo a melhor exposição Constitucional

    do mundo sobre meio ambiente e legislação infraconstitucional apta, a atual

    realidade brasileira acerca do meio ambiente é triste, desoladora, pois o que se

    vê são prioridades retóricas, descompasso entre a lei e sua aplicação, falta de

    conscientização ecológica da sociedade e o descaso com a natureza em prol

    de lucro pecuniário, que envolvem políticos, empreendimentos imobiliários,

    atividades industriais, exploração turística etc. Por isso, pode-se afirmar com

    propriedade, que a tutela do meio ambiente ainda está em evolução, visto a

    afirmação de Michel Prieur. 37

    37 “o Direito do Ambiente, mais do que a descrição do ambiente existente, é o Direito portador de uma

    mensagem, um Direito do futuro e da antecipação, graças ao qual a homem e a natureza encontrarão um

    relacionamento harmonioso e equilibrado (..). Mais do que um novo ramo do Direito com seu próprio

    corpo de regras, o Direito do Ambiente tende a penetrar todos os sistemas jurídicos existentes para

    orientar num sentido ambientalista” Apud MACHADO. Ob.cit.p.149.

  • 24

    CAPÍTULO II

    O CONCEITO DE MEIO AMBIENTE

    “Meio ambiente” conceito fácil de compreender por intuição, porém difícil

    de limitar, devido à grande complexidade e a diversidade de definições,

    opiniões e visões. O meio ambiente tem que ser encarado como uma

    totalidade para assim ser analisado e estudado.

    Paulo Afonso Leme Machado discorre que o termo ambiente tem

    procedência latina: ambiens, entis: “que rodeia”. Dentre suas denotações

    encontra-se "meio em que vivemos". Escritores portugueses salientam que a

    expressão meio ambiente não é a mais apropriada, pois forma um pleonasmo.

    Ocorre que ambiente e meio são palavras sinônimos, pois meio é justamente

    aquilo que envolve, ou seja, o ambiente.38

    2.1- Conceitos Filosófico, Social e Técnico de Meio Ambiente

    Em primeira análise, em paridade com a inexatidão do tema por

    via da abstração, dar-se-á uma definição filosófica ao significado de ambiente.

    Einstein define ambiente como sendo “tudo que não seja eu” 39, de uma forma

    simples, porém dificultosamente compreensível. Em segundo plano e sentido

    menos abstrato, dar-se-á uma visão sociológica, em que o ambiente é visto

    como provedor da sociedade humana, constituindo saúde, sobrevivência e

    sustento da sociedade através dos recursos naturais. Em uma visão mais

    dilatada, Weston insiste que “o ambiente é muito mais do que ‘ natureza’; é o

    mundo social, político, econômico e físico em que vivemos” 40

    38 MACHADO. Ob.cit.146-147. 39 GREGORY Derek, MARTIN, Ron, SMITH, Graham. Geografia Humana–sociedade, espaço e ciência social. Editora: Jorge Zahar, Rio de Janeiro: 1996, p.126 40 Apud idem.p.127.

  • 25Paulo de Bessa Antunes entende que o conceito de meio ambiente é,

    evidentemente, cultural: “é a ação criativa do ser humano que vai determinar

    aquilo que deve e o que não deve ser entendido como meio ambiente.” 41

    Acerca de um parâmetro técnico, consequentemente uma visão de

    biólogos, geólogos e geógrafos, pode-se dizer que o meio ambiente é um

    conjunto de todas as coisas de ordem física e biológica que cercam e

    influenciam os seres vivos e a própria relação entre eles. Envolvendo

    diretamente o metabolismo, a vida, o comportamento, o desenvolvimento de

    um organismo ou espécie, tanto dos fatores abióticos que compreendem os

    fatores ambientais sem vida, ausentes da presença dos seres vivos -

    propriedade físicas e químicas da biosfera, a luz, o ar, o solo, a água,

    atmosfera- quanto dos fatores bióticos que são os seres vivos e os fatores

    ocasionados pela presença deles e das suas relações. O meio ambiente

    compreenderia a inter-relação dos elementos bióticos e abióticos.42

    2.2- Conceitos Jurídicos de Meio Ambiente

    Sob um aspecto jurídico geral, a Constituição Federal Brasileira de

    1988 traz uma definição ampla. No capítulo que trata de meio ambiente em

    seu art. 225, caput, diz: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

    equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

    impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

    preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

    Logo, conclui Sebastião Valdir Gomes, que: “tendo o texto constitucional

    estabelecido que a tutela ambiental é direito essencial à saúde (e à sadia

    qualidade de vida), e entendendo-se esta, nos termos da Organização

    41 ANTUNES.op.cit.p.240. 42 ODUM, Eugene. Ecologia. Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro: 1988.p.7-8.

  • 26Internacional de Saúde, como” estado de bem-estar físico, mental e social”, tal

    tutela ganha conotação significamente ampla, também em tal aspecto. 43

    Entende-se que a Constituição conceitua meio ambiente como “um bem

    de uso comum do povo”, ou seja, considerando o direito difuso ao meio

    ambiente protegido, trata o meio ambiente como patrimônio da coletividade,

    sendo o Poder Público o gestor desse patrimônio- ar, solo, flora, fauna e

    águas.

    Tal concepção vem afirmada na Lei 6.938 de 31 de agosto de 1981,

    razão pela qual foi recepcionada pela Constituição de 1988, que dispõe da

    Política Nacional de Meio Ambiente, no artigo 2°, I e disserta alguns princípios

    que devem ser atendidos diante dos objetivos da Política nacional do Meio

    Ambiente: “ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico,

    considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser

    necessariamente assegurado e protegido tendo em vista o uso coletivo;”

    Sob o aspecto legal, o meio ambiente é tratado como um bem coletivo,

    um interesse difuso, ou seja, direitos plurindividuais, ele não pertence a

    ninguém particularmente, mas cada pessoa tem direito a ele, logo pertencendo

    a todos em geral.

    Isabela Franco Guerra explica:

    “Os interesses transindividuais, ou metaindividuais ou supra-individuais, não faz diferença o uso de qualquer uma destas denominações, pois todas refletem ser estes interesses pertencentes a uma pluralidade titulares, a um número indeterminado de pessoas.” 44

    43 GOMES.op.cit.p.29 44 GUERRA.op.cit.p.35.

  • 27Em seus ensinamentos, Paulo Affonso diz: “O meio ambiente é um bem

    coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo. O direito ao meio

    ambiente é de cada pessoa, mas não só dela, sendo ao mesmo tempo

    transindividual.” E completa: “é um direito subjetivo de titularidade coletiva” 45

    Paulo Bessa reafirma que o direito ao meio ambiente ecologicamente

    equilibrado é de natureza difusa, pois o seu destinatário não pode ser

    identificado.46

    Todavia, o conceito legal de definição mais precisa e delineada,

    encontra-se na a lei específica 6.938/81, já citada acima, no artigo 3°, I, que

    define e entende Meio Ambiente como: “conjunto de condições, leis,

    influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,

    abriga e rege a vida em todas as suas formas;

    Em uma primeira tendência, incluem-se no sentido de meio ambiente

    apenas os bens naturais. Entretanto, Édis Milaré traça um conceito jurídico

    com uma distinção entre a visão estrita e a visão ampla. A visão estrita dá a

    noção exatamente do que foi conceituado anteriormente que meio ambiente é

    "a expressão do patrimônio natural e as relações entre os seres vivos", tal

    concepção exclui o que não está contido dentre os recursos naturais. A visão

    ampla diz respeito a uma meio ambiente como um todo, ou seja, envolvendo

    natureza natural e artificial e patrimônios culturais. 47

    O ambiente natural fica estabelecido como aquele ambiente de

    influências de ordem física, química e biológica. Já a idéia de meio ambiente

    artificial engloba um ambiente como todo, ou seja, envolve também tudo que

    faz parte dele que tenha sido por força ou alteração produzida pelo o homem -

    construções, assentamentos, edificações. O doutrinador Édis Milaré, conclui

    45 MACHADO.op.cit.p.116. 46 ANTUNES.op.cit.p.49. 47 MILARÉ.ob.cit.p.99.

  • 28que tal entendimento traz a idéia de que existe não só os "ecossistemas

    naturais", mas também os “ecossistemas sociais”. 48

    De forma contundente, vale destacar o pensamento de Ávila Coimbra,

    pois faz referência ao ecossistema natural e ao social, e ainda, antecipa a

    ligação dessas relações com o desenvolvimento sustentável. 49

    2.3- Meio Ambientes Cultural, Artificial e do Trabalho

    A Constituição de 1988 ampliou o conceito de meio ambiente, através

    de dispositivos expressos, que integram ao sentido tradicional a idéia do meio

    ambiente natural, cultural, do trabalho e o artificial.50

    O meio ambiente natural, já supracitado, é formado pelos elementos

    naturais, sendo os seres vivos e o meio que vivem, ou seja, solo, água, ar,

    flora, fauna dentre outros.

    O meio ambiente cultural compreende o patrimônio artístico, histórico,

    científico, turístico, paisagístico, arqueológico, e ainda, os sinais culturais que

    englobam práticas sociais e relações entre a natureza e o homem, pode ser

    encontrado legalmente no art. 215 e art. 216 da Constituição Federal.51

    48 Idem. 49 "meio ambiente é um conjunto dos elementos abióticos (físicos e químicos) e bióticos (flora e fauna), organizados em diferentes ecossistemas naturais e sociais em que insere o Homem, individual e socialmente, num processo de interação que atenda ao desenvolvimento das atividades humanas, à preservação dos recursos naturais e das características essenciais do entorno, dentro das leis da natureza e de padrões de qualidade definidos” Apud MILARÉ.op.cit.p.99-100. 50 GOMES.op.cit.p.29. 51 “Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V - os

  • 29O meio ambiente Artificial, tratado no art. 21, inciso XX, art.182 e

    seguintes, e art. 225, da Constituição Federal, tem a ver com a ação humana,

    ou seja, edificações, rodovias, equipamentos, calçadões, estradas,

    construções, elementos que compõem o espaço urbano em si. Edis Milaré

    define o meio ambiente artificial como sendo aquele: “formado por edificações,

    equipamentos e alterações produzidas pelo Homem, enfim, assentamentos de

    natureza urbanística e demais construções.” 52

    E por fim o meio ambiente do trabalho, disposto com fulcro no art. 200,

    inciso VIII da Constituição Federal, que é definido por Sebastião Vadir Gomes

    como: “meio integrado pelo conjunto de bens, instrumentos e meios de

    natureza material e imaterial, em face dos quais o ser humano exerce as suas

    atividades laborais.53 Logo, o ambiente do trabalho pode ser considerado o

    ambiente social que engloba modos e condições de natureza material e

    imaterial onde o homem pratica o que diz respeito à sua profissão ao seu

    trabalho. Paulo de Bessa Antunes opina:

    “O meio ambiente do trabalho, em minha opinião, é uma expressão que visa ressaltar as condições de salubridade e higiene nas quais um contrato de trabalho é cumprido pelo empregado, não se transformando em uma subcategoria do meio ambiente, tal qual tratado pelo artigo 225 da Constituição Federal” 54

    Meio ambiente é tudo aquilo que envolve a existência, sendo

    considerados os aspectos naturais, artificiais e até culturais. Tal conceito tem

    diversas abordagens, tratando-se de uma idéia ampla e entendimento vasto.

    Entretanto, para dar prosseguimento a este trabalho, é necessário que

    as atenções se voltem para o meio ambiente natural, no entanto, não

    descartando os conceitos mais abrangentes que atentem para atributos

    conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. “ 52 MILARÉ.op.cit.p. 102. 53 GOMES.op.cit.p.30. 54 ANTUNES.op.cit.p.50-51.

  • 30bióticos, abióticos, estéticos e culturais, tendo em vista as peculiaridades e

    potencialidades da natureza em forma de flora, fauna, e ecossistemas de

    relevância ecológica e beleza cênica.

  • 31

    CAPÍTULO III

    UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

    Embora existissem áreas de proteção desde 1937, sob o resguardo do

    Código Florestal e da Política Nacional de meio ambiente (Lei. 9638/81) foi

    possível, mesmo sem uma política ativa definitiva, construir um conjunto de

    unidades de conservação.

    Mas com advento da Constituição de 1988 e a inclusão do Capítulo sobre

    Meio Ambiente (art.225), inúmeras exigências foram atribuídas ao Poder

    Público, no sentido de assegurar o direito humano ao meio ambiente

    equilibrado. E dentre essas atribuições, logrou-se à esfera governamental

    definir, institucionalizar e criar espaços territoriais protegidos.

    A criação do instituto constitucional denominado espaços territoriais

    especialmente protegidos foi um dos grandes passos concretos em direção à

    proteção ambiental. A lei 9.985 de 18 de julho de 2000, além regulamentar o

    art. 225, §1°, incisos I, II, II e IV da Constituição Federal, ainda instituiu o

    Sistema Nacional de Unidades de Conservação, que deu vida à uma categoria

    de espaços territoriais a serem protegidos devido as suas características

    especiais.

    Diante da evolução ambiental e do processo histórico preservacionista pelo

    Direito, as unidades de conservação vem viabilizar os objetivos nacionais de

    conservação.

    3.1- Garantia Constitucional

    A criação de espaços territoriais especialmente protegidos, com o

    advento da Constituição de 1988 ganhou a status de instituto constitucional. A

    Constituição preceitua que para assegurar a efetividade do direito ao meio

  • 32ambiente ecologicamente equilibrado, incube ao poder público, nos termos do

    art. 225, § 1°:

    “I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III- definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;” VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. “

    Portanto, cabe ao Poder Público a preservação e proteção dos

    processos ecológicos, da fauna e da flora e da diversidade genética, e ainda a

    demarcação de áreas territoriais de proteção especial. Para Paulo de Bessa

    Antunes a norma constitucional fixa ao Poder Público uma obrigação de fazer,

    que envolve não só o dever de definir as áreas especialmente protegidas como

    o de indicar quais os componentes existentes no seu interior não merecem

    especial proteção.55

    Quanto à definição dos espaços territoriais, a norma constitucional

    determina que a supressão e alteração desses espaços territoriais são

    permitidas somente através de lei, não admitindo qualquer exceção. Observa-

    se uma preocupação cautelosa do legislador, pois admiti que o Poder Público

    defina as áreas a serem protegidas, porém atos como extinguir ou modificar

    são permitidos apenas com consentimento do Congresso Federal. 56

    Acerca da questão, Paulo Afonso Leme Machado realiza comentário

    grandioso, no qual afirma que estando a supressão e alteração dos espaços

    protegidos nas mãos do Poder Legislativo, a participação democrática e os

    55 ANTUNES. ob.cit. 621 56 Idem. p.622.

  • 33interesses em prol do meio ambiente se fazem presentes, em detrimento dos

    atos do Poder Executivo, que são isentos de contribuição popular.57

    O dispositivo constitucional em epígrafe possibilita que os espaços

    territoriais especialmente protegidos sejam utilizados e explorados

    economicamente, no entanto, proibi explicitamente que essa utilização fira a

    totalidade dos atributos que fundamentaram a proteção especial. Vale destacar

    a lógica desta vedação, pois seria extremamente incoerente criar uma área

    protegida pautada uma determinada característica natural, cênica ou cultural, e

    permitir que esse atributo pudesse ser utilizado de qualquer forma, permitindo

    a deteriorarização do elemento justificador da proteção.

    O preceito constitucional de se definir espaços protegidos atribuída ao

    Poder Público, no art. 225 da Constituição/88, materializa-se através de quatro

    categorias essenciais, quais sejam: as áreas de preservação permanente, a

    reserva legal, as áreas de proteção especial e, o objeto desta obra, as

    unidades de conservação.

    Esses espaços são áreas geográficas especiais dotadas de

    características ambientais significativas, que por representar papel estratégico

    na proteção da biodiversidade existente no Brasil, exigem um regime de

    interesse público através da restrição ou impedimento do uso dos recursos

    ambientais pelas atividades econômicas.58

    57 “Não se pode ter a ilusão de que esses espaços tornaram-se perenes pelo sistema constitucional ora introduzido, mas sendo a alteração e a supressão somente através de lei, abrem-se tempo e oportunidade para que os interesses pró - meio ambiente se façam presentes perante os parlamentares. Como se sabe, procedimento de elaboração dos atos do Poder Executivo não prevê debate público e um lapso de tempo antes da sua edição. Não se quer sobrecarregar o Poder Legislativo, mas sem uma intensa participação democrática, as áreas protegidas serão mutiladas e deturpadas ao sabor do imediatismo e de soluções demagógicas, às vezes intituladas como de interesse social ou de interesse público” MACHADO, ob.cit.p.136 58 MILARÉ.ob. cit.358

  • 34Portanto, as unidades de conservação compõem uma das categorias de

    espaços especialmente protegidos, previsto no texto Constitucional. E Édis

    Milaré explica:

    “toda unidades de conservação é área especialmente protegida, mas a recíproca não é verdadeira, pois a própria Constituição traz exemplos de biomas que recebem tutela especial, nem por isso são, na sua totalidade, unidades de conservação.”59

    As unidades de Conservação dividem-se e dois grupos: de Proteção

    Integral e de Uso Sustentável.

    Diante do objetivo deste trabalho acadêmico, não é necessário abordar

    o conceito de cada espécie de áreas especialmente protegidas, devendo as

    atenções voltarem-se para as unidades de conservação e suas sub-categorias.

    3.2- O SNUC, Objetivos e Diretrizes

    À luz da Constituição Federal de 1988, após longo processo de

    tramitação, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei 9.985/200, que

    regulamenta o art.225, §1°, I, II, III e VII, institui o Sistema Nacional de

    Unidades de Conservação da Natureza- SNUC e dá outras providências. Além

    disso, em 22 de agosto de 2002, foi promulgado o Decreto 4.340 que

    regulamenta alguns dispositivos e intuitos da lei do SNUC.

    Édis Milaré entende o SNUC como sendo um conjunto organizado de

    espaços naturais conservado na forma de unidades, que diante de

    planejamento, manejo e administração é capaz viabilizar os propósitos de

    conservação da política nacional.60 Além disso o autor admite que o SNUC

    embora prevaleça em forma de Sistema devido seu sentido ecossistêmico,

    possui características de uma política nacional, que por mais peculiares que

    59 Idem. p.364. 60 MILARÉ. Ob.cit.p.363

  • 35sejam as unidades de conservação não podem ser tidas como seres isolados

    e auto-suficientes. 61

    É fato evidente na norma infraconstitucional (Lei 9.985) a atenção em

    conceituar elementos aplicáveis às unidades de conservação. E em primeiro

    lugar define o que são essas unidades (art.2°, I):

    “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”

    Observa-se que diante de tal definição, a unidade de conservação

    passa a ter delimitação e exatidão legal, a diferenciando das outras

    modalidades de espaços territoriais especialmente protegidos. Logo, para ter

    forma jurídico-ecológica uma unidade de conservação deve conter: regime

    especial de administração e de proteção; o caráter oficial; a relevância natural;

    a delimitação territorial; e o objeto preservacionista.62

    De acordo com Paulo Afonso, as unidades de conservação se inserem

    no conceito de área protegida fixada na Convenção de Diversidade Biológica,

    ratificada pelo Brasil através do Decreto 2.519/98, levando-se em conta sua

    definição: “Área protegida significa uma área definida geograficamente que é

    destinada, ou regulamentada, e administrada para alcançar objetivos

    específicos de conservação.”

    Paulo de Bessa as define como áreas com características especiais que

    devem permanecer protegidas, nas quais o grau de proteção é variável,

    considerando-se o tipo de conservação legal específica e a classificação

    jurídica enquadrada, podendo variar do uso diário até a intocabilidade. 63

    61 Idem.p.385/386. 62 MILARÉ. Ob.cit. 365. 63 ANTUNES. Ob.cit. p. 625/626

  • 36Além do essencial conceito evidenciado acima, a legislação em tela

    dispõe de outros importantes conceitos. Visto que as unidades de conservação

    são instrumentos legais que visam garantir a conservação da natureza

    destaca-se:

    “Art. 2° II - conservação da natureza: o manejo do uso humano da natureza, compreendendo a preservação, a manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a recuperação do ambiente natural, para que possa produzir o maior benefício, em bases sustentáveis, às atuais gerações, mantendo seu potencial de satisfazer as necessidades e aspirações das gerações futuras, e garantindo a sobrevivência dos seres vivos em geral;”

    A idéia de conservação está diretamente ligada a de sustentabilidade,

    pois a base ambientalista social e legal não só do Brasil, mas do mundo, está

    pautada no uso sustentável da natureza, de maneira que as atividades

    humanas estejam em harmonia com a preservação dos recursos naturais.

    Logo a lei estabelece no art. 2°, XI: uso sustentável: exploração do ambiente

    de maneira a garantir a perenidade dos recursos ambientais renováveis e dos

    processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e os demais atributos

    ecológicos, de forma socialmente justa e economicamente viável;

    Vale ressaltar que a lei 9.985, embora traga uma consolidação

    conceitual, institui uma política organizacional em forma de Sistema Nacional.

    Segundo o art. 3°, o Sistema é constituído pelo conjunto das unidades de

    conservação federais, estaduais e municipais. Logo, para que o Sistema

    Nacional de Unidades de Conservação tenha seu propósito maior garantido e

    uma composição igualitária entre os três entes da Federação, é necessário

    que se estabeleça objetivos e diretrizes.

    Dentre as metas, fixadas no art. 4°- SNUC, que envolvem proteção e

    conservação da natureza ressaltam-se: a manutenção da diversidade

    ecológica, a proteção de espécies, elementos paisagísticos e características

    naturais, assim como prima pela promoção do desenvolvimento sustentável,

    dos princípios da conservação e da educação ambiental.

  • 37

    É muito importante que ao instituir um Sistema os objetivos e diretrizes

    sejam bem traçados, pois asseguram que as finalidades e execuções

    caminhem no mesmo sentido, ou seja, no que pré-determina o fundamento

    preservacionista.

    O Sistema Nacional de Unidades de Conservação está regido pelas

    seguintes diretrizes (art. 5°, lei 9985/00):

    “I - assegurem que no conjunto das unidades de conservação estejam representadas amostras significativas e ecologicamente viáveis das diferentes populações, habitats e ecossistemas do território nacional e das águas jurisdicionais, salvaguardando o patrimônio biológico existente; II - assegurem os mecanismos e procedimentos necessários ao envolvimento da sociedade no estabelecimento e na revisão da política nacional de unidades de conservação; III - assegurem a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das unidades de conservação; IV - busquem o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das unidades de conservação; V - incentivem as populações locais e as organizações privadas a estabelecerem e administrarem unidades de conservação dentro do sistema nacional; VI - assegurem, nos casos possíveis, a sustentabilidade econômica das unidades de conservação; VII - permitam o uso das unidades de conservação para a conservação in situ de populações das variantes genéticas selvagens dos animais e plantas domesticados e recursos genéticos silvestres; VIII - assegurem que o processo de criação e a gestão das unidades de conservação sejam feitos de forma integrada com as políticas de administração das terras e águas circundantes, considerando as condições e necessidades sociais e econômicas locais; IX - considerem as condições e necessidades das populações locais no desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável dos recursos naturais; X - garantam às populações tradicionais cuja subsistência dependa da utilização de recursos naturais existentes no interior das unidades de conservação meios de subsistência alternativos ou a justa indenização pelos recursos perdidos; XI - garantam uma alocação adequada dos recursos financeiros necessários para que, uma vez criadas, as unidades de conservação possam ser geridas de forma eficaz e atender aos seus objetivos; XII - busquem conferir às unidades de conservação, nos casos possíveis e respeitadas as conveniências da administração, autonomia administrativa e financeira; e

  • 38XIII - busquem proteger grandes áreas por meio de um conjunto integrado de unidades de conservação de diferentes categorias, próximas ou contíguas, e suas respectivas zonas de amortecimento e corredores ecológicos, integrando as diferentes atividades de preservação da natureza, uso sustentável dos recursos naturais e restauração e recuperação dos ecossistemas.”

    3.3 - Gestão, Criação e Manejo

    O SNUC analisado a partir das diretrizes bem claras e precisas e de

    objetivos delimitados de acordo com o fundamento maior de manutenção do

    equilíbrio ecológico, tem conteúdo ricamente doutrinário e conceitual. Contudo,

    o Sistema também se preocupa em instituir aspectos operacionais, a fim de

    que as unidades de conservação sejam concretizadas e desempenhem, de

    fato, a sua finalidade. Portanto, o primeiro passo é entender como se dá a

    estrutura gestorial.

    3.3.1- Gestão

    Para atuar como órgão consultivo ou deliberativo, com atribuições de

    acompanhar a implementação do Sistema elegeu-se o CONAMA –Conselho

    Nacional do Meio Ambiente, conforme art. 6°, I, da lei 9985.

    Segundo Paulo Afonso, além das funções determinadas na Lei 6.938/81

    de inspecionar as unidades de conservação e transmitir aos órgãos

    competentes as avaliações, o CONAMA também acompanhará o

    funcionamento do SNUC, podendo requisitar informações ou visitar as

    unidades. E prossegue afirmando que, excepcionalmente, o CONAMA terá

    função decisória sobre a classificação de uma unidade, porém não detém

    competência para criar e nem fixar regras de funcionamento, ou seja, não é

    permitido que o Conselho usurpe o papel do legislador e do Chefe do Poder

    Executivo no que se refere às Unidades de Conservação. 64

    64 MACHADO. Ob.cit. p. 815

  • 39 Já na posição central e responsável pela Coordenação do Sistema está

    o Ministério do Meio Ambiente. Entretanto, tal função não concede ao

    Ministério a supremacia hierárquica sobre as unidades, apenas lhe é outorgado

    o papel de participar diretamente do planejamento e incentivos das unidades

    de conservação.

    E por fim, no art. 6°. II da lei 9985, são estabelecidos como órgãos

    executores o Instituto Chico Mendes e o IBAMA, em caráter supletivo, e os

    órgão estaduais e municipais com função de implementar o SNUC, subsidiar

    propostas de criação e administras as unidades federais, estaduais e

    municipais, nas suas respectivas esferas de atuação,

    Além disso, segundo o art. 23 da lei 9985, os órgãos executores devem

    articular-se com a comunidade científica, no sentido de incentivar o

    desenvolvimento de pesquisas sobre a ecologia e as formas de uso

    sustentável dos recursos naturais das unidades, e valorizar o conhecimento

    das populações tradicionais. É importante que os responsáveis pela execução

    mantenham políticas de incentivo à pesquisas, pois os conhecimentos

    científicos possibilitam a implementação de medidas ideais para a preservação

    específica da área.

    Contudo, a lei específica (art.29) também estabelece que cada uma das

    unidades de conservação do Grupo de Proteção Integral disporá do seu

    próprio Conselho Consultivo, presido pelo órgão responsável por sua

    administração e composto por representantes de órgãos públicos, de

    organização de sociedade civil, e quando for o caso, por proprietários de terras

    localizadas em Refúgios de Vida Silvestre ou Monumento Natural.

    Quanto às representações do Conselho Consultivo, o Decreto 4.340/02

    preza por uma participação paritária dos representantes, e estabelece que os

    representantes dos órgãos públicos devam, quando couber, contemplar os três

    níveis da Federação e órgãos de áreas afins. Já as organizações de sociedade

  • 40civil devem contemplar as comunidades científicas e organizações não

    governamentais ambientalistas com atuação comprovada na região da

    unidade.

    O Decreto visa fixar uma paridade entre a representação pública e

    social, embora não haja qualquer obrigatoriedade de que seja assim, sendo

    adotado como critério a conveniência e oportunidade, evidencia Paulo de

    Bessa Antunes.65

    Em concordância com o art. 20 do Decreto 4340, os Conselhos

    Consultivos detém diversas funções na gestão da unidade, destacando-se: o

    dever de elaborar o regimento interno; o dever de avaliar o orçamento da

    unidade e o relatório financeiro anual; o dever de manifestar-se sobre obra ou

    atividade potencialmente causadora de impacto na unidade; e otimizar a

    relação com a população do entorno ou no interior da unidade.

    Édis Milaré observa que os grandes traços da composição do SNUC,

    estão delineados com clareza, existindo um ponto central no qual partem

    ramificações que chegam até a origem das diferentes unidades, sejam elas

    federais, estaduais ou municipais. E acrescenta que o Sistema inicia de

    princípios e norma gerais e se ramifica na gestão cotidiana de cada uma das

    unidades.66

    A gestão das unidades tanto em relação à gestão estrutural como a

    gestão cotidiana de cada unidade, está bem resguardada pela normas

    regulamentadoras. No entanto, o legislador foi ainda mais além, posto que

    permitiu que as unidades de conservação fossem também geridas por

    organizações da sociedade civil de interesse público – OSCIP (art. 30- lei

    9.985).

    65 ANTUNES. op.cit.p.659. 66 MILARÉ.ob.cit.p.369.

  • 41As OSCIPs somente poderão gerir uma unidade se entre os seus

    objetivos institucionais estiver a proteção ambiental e a promoção do

    desenvolvimento sustentável, e ainda, comprovar a realização de atividades

    ligadas a esses objetivos, preferencialmente na unidade de conservação ou no

    mesmo bioma. Édis Milaré analisa que a imposição desses requisitos afasta a

    possibilidade dessa administração ficar a cargo de uma empresa com fins

    lucrativos.67

    Portanto, o decreto reconheceu um modelo gerencial participativo,

    determinando que a gestão compartilhada será regulada por termo de parceria

    firmado com o órgão executor e a OSCIP, na qual a escolha da organização é

    feita mediante a publicação de edital.

    O art. 7° da lei 9.985/00 também admite, à critério do CONAMA, a

    integração de unidades de conservação estaduais e municipais concebidas

    para atender as peculiaridades locais, desde que possuam objetivos de

    manejo que não possam ser satisfatoriamente atendidas por nenhuma

    categoria prevista em Lei e que as características especiais permitam uma

    clara distinção com as já existentes. Paulo de Bessa justifica a liberdade

    concedida pelo artigo: “Trata-se de um reconhecimento da diversidade de

    situações ecológicas do país, bem como dos diferentes níveis de organização

    administrativa dos diversos entes federativos.”68

    3.3.2 - Criação

    Dando continuação aos aspectos operacionais das Unidades de

    Conservação, de acordo com o art. 22 da lei 9985/2000, a criação de uma

    unidade deve ser feita através de ato do Poder Público, no entanto a lei não

    estabelece qual a natureza do ato instituidor. Paulo Afonso afirma que nada

    impede que a lei seja o instrumento usado para a criação69, porém o meio mais

    67 Idem. p.392 68 ANTUNE. ob.cit.p.635. 69 MACHADO.ob.cit.p.787.

  • 42utilizado tem sido o Decreto70, a exemplo do Decreto nº 86.392, de 24 de

    setembro de 1981 que criou, no Estado de Mato Grosso, o Parque Nacional do

    Pantanal Mato-Grossense.

    Paulo de Bessa acredita que em relação à criação das unidades de

    conservação deve-se haver uma reflexão mais profunda, pois por muitas vezes

    elas são instituídas em áreas privadas. E analisa que as unidades do grupo de

    Proteção integral, nas quais, em sua maioria, não se permite utilização

    econômica e são consideradas de utilidade pública para fins de

    desapropriação, a criação somente se concretizará após o ajuizamento das

    ações expropriatórias e feito o depósito correspondente. 71

    De acordo com o art. 2° do Decreto 4340/02 que regulamenta o SNUC,

    o ato de criação de uma unidade de conservação deve indicar:

    “I - a denominação, a categoria de manejo, os objetivos, os limites, a área da unidade e o órgão responsável por sua administração; II - a população tradicional beneficiária, no caso das Reservas Extrativistas e das Reservas de Desenvolvimento Sustentável; III - a população tradicional residente, quando couber, no caso das Florestas Nacionais, Florestas Estaduais ou Florestas Municipais; e IV - as atividades econômicas, de segurança e de defesa nacional envolvidas.”

    Visando atender aos objetivos de SNUC, e acima tudo, cumprir com

    preceitos constitucionais, a criação as unidades de conservação será

    precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam a

    identificação da localização, da dimensão, e dos limites mais adequados para

    a unidade. Ademais, a lei obriga o Poder Público a fornecer informações

    adequadas e inteligíveis à população local e à outros interessados. Paulo de

    70http://www.ibama.gov.br/siucweb/mostraDocLegal.php?seq_uc=78&seq_tp_documento=3&seq_finaliddoc=7- Consulta: 04/10/2009. 71 ANTUNES. ob.cit.p.657

    http://www.ibama.gov.br/siucweb/mostraDocLegal.php?seq_uc=78&seq_tp_documento=3&seq_finaliddoc=7-http://www.ibama.gov.br/siucweb/mostraDocLegal.php?seq_uc=78&seq_tp_documento=3&seq_finaliddoc=7-

  • 43Bessa opina: “A inexistência de tais procedimentos prévios, em minha opinião,

    torna nulo qualquer ato instituidor de unidade de conservação.” 72

    O Decreto 4.340/2002 determina que nas consultas realizadas em

    reuniões públicas, o órgão executor deve indicar, de modo claro e em

    linguagem acessível, o que a criação da unidade implicará para a população

    residente.

    Ressalta-se, de acordo com o §4° do art. 22 da lei 9985/00, que a

    criação de Estação Ecológica ou de Reserva Biológica não tem

    obrigatoriedade de ser precedida de consulta pública.

    O parágrafo seguinte do artigo supracitado, também permite que as

    unidades de conservação do grupo de Uso Especial possam ser

    transformadas, total ou parcialmente, em unidades do grupo de Proteção

    Integral, através de instrumento normativos do mesmo nível hierárquico de

    criação da unidade, desde que atendidos as exigências de consulta e estudos.

    Ou seja, caso uma Área de Proteção Ambiental criada por Decreto, tenha

    atributos que justifiquem a sua transformação em Monumento Natural, esse

    ato deve também ser feito através de um Decreto.

    Por conseguinte, o §6° do mesmo artigo permite a ampliação de uma

    unidade, sem modificação dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo

    proposto, pode ser realizada por normas do mesmo nível hierárquico também

    atendendo as obrigações antecessoras a criação.

    Em primeira análise, pode-se questionar a constitucionalidade do

    dispositivo, visto que a Constituição permite a alteração somente através de lei.

    Contudo, Paulo Afonso explica: “Conservando-se os limites originais, e só

    havendo ampliação dos limites da unidade de conservação, sem que haja sua

    72 ANTUNES.op.cit.p.657

  • 44desnaturação ou deteriorização, é razoável entender-se que essa alteração

    possa ser feita por decreto e não por lei específica.” 73

    A desafetação ou a redução dos limites de uma unidade de conservação

    poder ser aprovada somente mediante lei específica, conforme expõe o §7° do

    citado art.22. Evidencia-se que a desafetação consiste no ato em que o Poder

    Público desclassifica a qualidade de coisa pública, para autorizá-la

    apropriável.74

    3.3.3 - Implementação e Manejo

    Após a identificação dos atributos que justifiquem a proteção, o

    enquadramento de categoria e o a sua criação através de ato do Poder

    Público, é hora de tornar a unidade de conservação realidade concreta, e

    estabelecer as formas de uso.

    Consoante com Edis Milaré a implantação das unidades de conservação

    comporta três figuras essenciais contempladas pela lei 9.985/200: a zona de

    amortecimento, o mosaico de unidades de conservação e o plano de manejo.75

    A legislação específica (art.2°, XVIII, Lei 9985) conceitua a zona de

    amortecimento como sendo: “o entorno da uma unidade de conservação, onde

    as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o

    propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade.” Ou seja, a

    zona de amortecimento não faz parte da unidade, no entanto, contém regras

    de uso e limitações do aproveitamento dos recursos naturais a fim de que

    impactos externos sejam amenizados e não atinjam a unidade em si.

    O doutrinador Edis Milaré alerta que a área da zona de amortecimento é

    de propriedade particular, logo, não cabe indenização posto que o imóvel não

    73 MACHADO.op.cit.p. 788 74 De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico. 15e. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.255 APUD MILARÉ. op. cit. 387 75 MILARÉ. op.cit. p.388

  • 45tem sua dominialidade modificada e aceita usos econômicos, admitindo

    apenas algumas restrições e regulamentações de forma bem mais amenas

    que nas unidades de conservação.76 E Paulo Afonso completa que:

    “A limitação ao direito de propriedade pode ser impostas nas zonas de amortecimento e nos corredores ecológicos, de tal ordem que não inviabilize a propriedade, sob pena de acarretar apossamento administrativo com conseqüente dever de indenizar o proprietário, por parte do Poder Público.”77

    Com exceção das Áreas de Proteção Ambiental e das Reservas

    Particulares do Patrimônio Natural, todas as unidades de conservação devem

    possuir uma zona de amortecimento, e quando conveniente, corredores

    ecológicos, conforme disposto no art.25 da lei 9.985/2000.

    Os corredores ecológicos, de acordo com o art. 2° da lei 9.985, são

    partes de ecossistemas naturais ou semi-naturais que ligam unidades de

    conservação, possibilitando o fluxo de genes e o movimento da biota, no

    sentido de facilitar a dispersão de espécies e recolonização de áreas

    degradadas, bem como a manutenção de populações que para sobreviver

    demandam de um espaço maior do que aquela da unidade individual. Em

    síntese, essas áreas são realmente corredores formados entre uma unidade e

    outra, que permitem a interação genética e ecossintêmica.

    Será a administração da própria unidade que fixará a regulamentação

    da ocupação e do uso da zona de amortecimento e dos corredores ecológicos,

    podendo tanto as normas como os limites serem definidos no ato da criação da

    unidade, ou posteriormente, assim como dispõe o §2° do art. 25- Lei 9985.

    Já o mosaico de unidades de conservação é um instituto bem mais

    complexo, pois consiste num conjunto de unidades de conservação de

    qualquer categoria, sobrepostas ou justapostas, públicas ou privadas, com

    gestão integrada.

    76 Idem.

  • 46

    Paulo de Bessa evidencia que o mosaico é uma figura jurídica

    inteiramente nova e sem precedente no ordenamento brasileiro cuja idéia é

    trazer ao Sistema de Unidades de Conservação uma experiência de gestão

    com destaque na França. E completa que o mosaico de unidades de

    conservação tem por intuito permitir que diferentes atores se comunique e

    determinem meios capazes de garantir uma gestão positiva para o conjunto de

    unidades.78

    Portanto, a lei específica (art.26- Lei 9.985) brasileira estabeleceu que

    existindo um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou

    não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas

    ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de

    forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de

    conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a

    valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto

    regional.79

    As unidades contidas no mosaico conservam sua integral

    individualidade, não tendo a obrigatoriedade de serem estritamente contínuas,

    porém próximas geograficamente, de certa forma, interagentes. Por isso,

    surge a necessidade de estarem submetidas à um mesmo mecanismo de

    manejo, estando tal determinação intensamente relacionada com a

    implementação, e não com a gestão comum.

    Para tanto, o Decreto 4340/2002 traz um Capítulo voltado à

    regulamentação desse instituto, e prevê que o mosaico de unidades de

    conservação será reconhecido por ato do Ministério do Meio Ambiente, a

    pedido dos órgãos gestores, devendo dispor de um conselho de mosaico, com

    77 MACHADO. op.cit. p.803 78 ANTUNES. Op.cit. p. 664/665. 79 Lei 9.985/200, art.26.

  • 47caráter consultivo e a função de atuar como instância de gestão integrada, e

    ainda ser presidido por um dos chefes das unidades que o compõe.

    Para que as unidades de conservação tomem corpo, e efetivamente

    sejam regidos de acordo com as suas necessidades, criou-se o Plano de

    manejo. Édis Milaré tece pertinente comentário: “É oportuno dizer que, em

    muitos casos, o Plano de Manejo pode integrar a gestão como parte do

    processo, ou pelo contrário, pode precedê-la como um documento normativo.

    É o caso da Lei 9.985, que faz do Plano de manejo um pródromo da gestão.”80

    Segundo o art. 2° da lei do SNUC, o plano de manejo consiste no:

    “documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de

    uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas

    que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a

    implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade;”

    O Plano de manejo nada mais é que o documento que regerá as formas

    de uso da unidade de conservação, prevendo a maneira da utilização dos

    recursos naturais, visitação, pesquisas, estrutura e estabelecimento da unidade

    como um todo.

    Tanto a lei 9985/200 quanto o Decreto 4340/2002 versam sobre o plano

    de manejo. Determina-se que todas as unidades de conservação devem dispor

    de um Plano de manejo, com as seguintes especificidades:

    a) o Plano deve abranger a área da unidade de conservação, sua zona de

    amortecimento e os corredores ecológicos, incluindo medidas com o fim de

    promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas.

    (art. 27 §1°- lei.9985)

    80 MILARÉ. op.cit.p.391.

  • 48b) na elaboração, atualização e implementação do Plano de Manejo das

    Reservas Extrativistas, das Reservas de Desenvolvimento Sustentável, das

    Áreas de Proteção Ambiental e, quando couber, das Florestas Nacionais e das

    Áreas de Relevante Interesse Ecológico, será assegurada a ampla participação

    da população residente. (art. 27 §2°- lei 9985)

    c) deve ser elaborado no prazo de cinco anos a partir da data de sua criação.

    (art. 27 §3°- lei 9985)

    d) pode dispor sobre as atividades de liberação planejada e cultivo de

    organismos geneticamente modificados nas Áreas de Proteção Ambiental e

    nas zonas de amortecimento das demais categorias de unidade de

    conservação. (art. 27 §4°- lei 9985)

    e) são proibidas, nas unidades de conservação, quaisquer alterações,

    atividades ou modalidades de utilização em desacordo com os seus objetivos,

    o seu Plano de Manejo e seus regulamentos. (art. 28- lei 9985)

    f) será elaborado pelo órgão gestor ou pelo proprietário quando for o caso,

    será aprovado: I - em portaria do órgão executor, no caso de Estação

    Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural, Refúgio

    de Vida Silvestre, Área de Proteção Ambiental, Área de Relevante Interesse

    Ecológico, Floresta Nacional, Reserva de Fauna e Reserva Particular do

    Patrimônio Natural; II - em resolução do conselho deliberativo, no caso de

    Reserva Extrativista e Reserva de Desenvolvimento Sustentável, após prévia

    aprovação do órgão executor. (art.12- decreto 4340)

    Contudo, até que seja elaborado o Plano de manejo da unidade de

    conservação, todas as atividades desenvolvidas devem ser formalizadas e

    implementadas ações de proteção e fiscalização. E quando o fato ocorrer em

    uma unidade contida no grupo de Proteção Integral tais atividades devem

    limitar-se a garantir a integridade dos recursos protegidos.

  • 49

    Vale destacar que o plano de Manejo aprovado deve estar disponível

    para consulta do público na sede da unidade de conservação e no centro de

    documentação do órgão executor.

    Édis Milaré comenta sobre o Plano de manejo: “A lei atribui-lhe ações ou

    cometimentos de grande alcance, revestindo-o, por assim dizer de um duplo

    caráter: preventivo e normativo. Com efeito, cada unidade de conservação

    deve possuir um Plano de manejo.” 81

    E Paulo de Bessa conclui que “é importante observar que o Plano de

    manejo é a materialização concreta das unidades de conservação, que sem a

    sua ex