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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NOS ESTADOS UNIDOS, UM CONTROLE EMINENTEMENTE DIFUSO Por: Dyonisio Bassi Neto Orientadora Professora Mariana Monteiro Rio de Janeiro 2014 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NOS ESTADOS

UNIDOS, UM CONTROLE EMINENTEMENTE DIFUSO

Por: Dyonisio Bassi Neto

Orientadora

Professora Mariana Monteiro

Rio de Janeiro

2014

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NOS ESTADOS

UNIDOS UM CONTROLE EMINENTEMENTE DIFUSO

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Público e Tributário.

Por: . Dyonisio Bassi Neto.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por

tudo que a mim Ele tem dado,

principalmente minha saúde. A minha

família e àqueles que de uma forma

ou de outra, estiveram comigo nesta

jornada e desta forma, ajudaram-me a

ampliar o meu conhecimento.

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DEDICATÓRIA

À minha esposa, Ana Cláudia, que é

principalmente minha amiga, minha

cúmplice, meu porto seguro, pela

confiança em acreditar em mim.

Aos meus maravilhosos filhos, Henrique e

Matheus, obrigado pela força.

A vocês, dedico essa conquista como

gratidão.

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RESUMO

Este trabalho tem como escopo analisar o controle de constitucionalidade

difuso, visto pelo ângulo de sua entrada no ordenamento jurídico. Onde,

realizado pelo Poder Judiciário como um todo, utilizado por qualquer juiz ou

tribunal a fim de evitar que uma determinada espécie normativa, contrária a

Constituição, seja utilizada em um determinado caso concreto, bem como, o

quanto este método influenciou no artigo 52, inciso X da nossa Constituição

posta. Esta análise traz como ponto de partida uma evolução histórica, que

visa demonstrar a trajetória do controle de leis realizado nos Estados Unidos,

bem como a sua inserção no processo americano de aferição de

constitucionalidade, desembocando no caso Marbury vs. Madison (1803) que

será analisado nos seus por menores e o caso drad sco

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO 1 - ABORDAGEM CONSTITUCIONAL SOBRE O TEMA 11

1.1 - Constituição e Estado 13

1.2 - Constituição, o desespero dos vencedores 15

1,3 - Controle de constitucionalidade 20

CAPÍTULO 2 – PARADIGMAS DO CONTROLE AMERICANO 22 2.1 - O Caso Marbury versus Madison 22 2.1.1 – Origem do problema 23 2.1.2 – Procurando a solução 25 2.1.3 – Solucionando o problema 30

2.2 - O caso Dred Scott versus Sandford 33

2.2.1 - Entendendo o case 33 2.2.2 – O caminho da justiça 35 2.2.3 – O julgamento da Suprema Corte 37

CONCLUSÃO 38

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42

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INTRODUÇÃO

Este trabalho tem o seu alfa, início, o objetivo de demonstrar sob quais

aspectos ocorreu o Controle de Constitucionalidade americano. Quais foram as

suas nuances e o caminho percorrido.

O constitucionalismo americano introduziu, forjou na prática, uma

estrutura nova, diferente e inovadora na forma de Estado. Até aquele momento

histórico e jurídico não existia, neste cenário, Constituição em sua acepção

formal, um único documento escrito e não, espalhado por todo o ordenamento,

que regesse o Estado, trouxesse limites aos seus governantes e desse

segurança ao seu povo.

Touxe a baila, um embrião para as Constituições rígidas, uma vez que a

rigidez é conditio sine qua non para o controle de constitucionalidade, quer

difuso,quer concentrado, como bem ensina Pedro Lenza 1 :

Rígidas são aquelas constituições que exigem, para a sua alteração (daí preferirmos a terminologia alterabilidade), um processo legislativo mais árduo, mais solene, mais dificultoso do que o processo de alteração das normas não constitucionais.

Complementa o ilustre mestre Sylvio Motta 2:

A Constituição rígida é aquela que estabelece um procedimento diferenciado para a alteração dos seus dispositivos, de maior solenidade e complexidade que aquele fixado para a alteração da legislação ordinária. Só se pode analisar a rigidez ou não de uma Carta Constitucional se a mesma for escrita (codificada num único documento), pois o procedimento especial, acaso

1 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo: 12 Ed. Saraiva, 2013. p.106 2 MOTTA, Sylvio. Direito Constitucional. Série Provas & Concursos. São Paulo 24 Ed. Campus, 2013. p.128

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existente, tem de abranger todas as normas constitucionais, o que não é exequível se elas estiverem disseminadas por várias fontes (leis, decretos, costumes etc.)

E mais além conclui o eminente professor Sylvio Motta 3:

Constituição flexível, por sua vez, é aquela que pode ser modificada pelo mesmo processo legislativo instituído para a reforma da legislação infraconstitucional. De regra são flexíveis as Constituições não escritas (cujas normas não estão fixadas num documento único), embora existam exemplos de Constituições escritas flexíveis, como a Constituição francesa de 1830.

Como visto, não é possível se falar em controle de constitucionalidade

quando este objeto são Constituições flexíveis, uma vez que nestas, fazer lei é

o mesmo que fazer Constituição na lição do mestre Jorge Miranda 4 :

Saber se toda a Constituição implica ou permite um conceito de inconstitucionalidade equivale a saber se sofre gradações a força vinculante das suas normas, consoante as qualidades que umas tenham e outras não tenham, em virtude dos sistemas em que estejam integradas. É neste ponto que ocorre falar (quanto mais não seja para obviar prováveis equívocos) na tão usada classificação das Constituições em rígidas e flexíveis. Na verdade, o critério desta distinção — para o seu grande autor, James Bryce, a distinção principal a fazer entre todas as Constituições — está na posição ocupada pela Constituição perante as chamadas leis ordinárias. Se ela se coloca acima destas, num plano hierárquico superior, e encerra características próprias, considera-se rígida; ao invés, se se encontra ao nível das restantes leis, sem um poder ou uma forma que a suportem em especial, é flexível. Apenas as Constituições rígidas, e não também as Constituições flexíveis, são

3 Idem., p.129 4 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional, Coimbra: Ed. Coimbra, 1996.p. 37

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limitativas, porque ultrapassam as leis e prevalecem sobre as suas estatuições.

Partindo desta premissa, este trabalho tem como escopo principal a

análise do controle de constitucionalidade dentro do modelo difuso. De origem

tipicamente judicial, modelo este implementado, consolidado e moldado pelos

Estados Unidos no celebre caso Marbury vs. Madison.

Esta espécie de controle não teve início no caso Marbury vs. Madison,

uma vez que muito outros já tinham pairado anteriormente nas Cortes

americanas, mas sim, pelo que este case estabeleceu, ou seja, a aferição, o

controle da constitucionalidade de uma lei por todo e qualquer juiz ou Tribunal.

Caberá a nós, no entanto, mostrar que não houve neste caso, como

muitos pensam, não deixando de fora o tirocínio de John Marshal, nenhuma

originalidade, veremos isto nos tópicos iniciais. Na sentença proferida pelo

Chief Justice da Casa. Houve sim, um momento político e histórico,

conturbado e adverso, onde o Juiz Marshal se valeu de múltiplos precedentes

existentes. Precedentes estes, que evitaram que o congresso mantivesse

fechada a Suprema Corte Americana, uma vez que esta já estava há dois

anos, bem como pusessem em risco as suas próprias carreiras, além disso,

trouxe uma paz política entre a Casa Suprema Americana e o governo de

Jefferson ou melhor, entre o Poder Judiciário e o Poder executivo

O caso Dred Scott versus Sandford ( na verdade Sanford, uma vez que

o D foi um equívoco do escrevente ao registrar a ação) retira dos salões das

casas grandes das fazendas, bem como, do refúgio das senzalas,

principalmente no sul dos Estados Unidos, um ranço, uma marca que longe

está do ideal de liberdade, que é a escravidão. A diferença, não se dá em

função da cultura, da religião(fé), dos hábitos, da política ou de qualquer outra

diferença, que por si só, já seria hediondo, mas uma diferença, tão antiga

como o próprio homem, baseada na cor de sua pele, a diferença entre negros

e brancos.

Torna-se interessante este case, não apenas pelos aspectos sociais e

jurídicos envolvidos e muito menos pelo desfecho, a decisão proferida pela

Suprema Corte americana, que é um fiasco, dito por toda a comunidade

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jurídica, mas sim, pelo fato deste case funcionar como combustível que vai

culminar com a guerra da Secessão.

No caso Dred Scott vs.Sandford, não está envolvido apenas o direito à

liberdade, pois esta era conseguida, em geral, pela fuga constante dos

escravos, mas pela primeira vez ,um escravo vai a esfera jurídica, ou seja,

utiliza o próprio sistema, para lutar por este Direito.

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CAPÍTULO 1

ABORDAGEM CONSTITUCIONAL SOBRE O TEMA

O controle de constitucionalidade tem como base três princípios

constitucionais: o princípio da supremacia constitucional, o de rigidez

constitucional e o de superlegalidade formal e material.

Tanto os princípios da Supremacia como o da Rigidez estão

intimamente ligados e são indissolúveis. Não há como falar em supremacia

sem falar em rigidez e vice versa como bem ensina o prof. José Afonso da

Silva “é da rigidez que resulta a supremacia da Constituição”. A Constituição se

diferencia de todas as outras normas legais, quer pelo ponto de vista da

quantidade de membros do Poder Legislativo para aprová-la, a que nós

denominamos quorum, bem como os turnos de votação a que é submetida. No

artigo 60 da Constituição da Republica de 1988 está escrito que “a

Constituição poderá ser emendada mediante proposta” e no seu parágrafo 2º

nos informa que “A proposta será discutida e votada em cada Casa do

Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em

ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros”.

Esta forma de apreciação das normas constitucionais, são muito mais

régeis do que a de qualquer outra espécie hierárquica legal em nosso

ordenamento.

Torna-se claro que por esta construção jurídica, que a Constituição está

acima de toda e qualquer espécie legal e todas a Ela devem obediência.

Um outro aspecto pouco discutido, está inserido na sua superlegalidade

formal e material, uma vez que a Constituição é ponto de partida para a

formação de todas as outras espécies legais abaixo ou seja, normas legais

sub-constitucionais e estas com ela devem estar em consonância sob pena de

inconstitucionalidade. A Superlegalidade formal é um identificador da

Constituição como fonte primária da produção normativa, ditando

competências e procedimentos para a elaboração dos atos normativos

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inferiores. É a superlegalidade material que subordina o conteúdo de toda a

atividade normativa estatal à conformidade com os princípios.

Como pode ser observado, os princípios acima estão intimamente

relacionados e norteiam toda a ideia de controle de constitucionalidade no

nosso ordenamento jurídico.

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1.1 CONSTITUIÇÃO E ESTADO

Torna-se necessário delimitar em que contexto o nosso objeto de estudo

está inserido. Para isto é essencial a análise do que é uma CONSTITUIÇÃO.

Deixa-se claro que não é este o objeto do presente trabalho, mas não há como

falar em controle difuso sem falar em Constituição e são muitas as respostas

possíveis para esta pergunta.

A palavra constituição apresenta muitas facetas. Em sentido comum,

constituição significa um conjunto de elementos de um objeto qualquer, uma

mesa, um carro, o corpo humano, ou seja, nada mais seria do que os

elementos que formam e estruturam tais objetos, em sentido jurídico pegamos

emprestado a acepção desta palavra e definimos CONSTITUIÇÃO como

sendo um conjunto de elementos que formam e estruturam determinado objeto

que é o ESTADO. O professor Alexandre de Moraes 5, em sua obra Direito

Constitucional, ensina que “Constituição, lato sensu, é o ato de constituir, de

estabelecer, de firmar; ou, ainda, o modo pelo qual se constitui uma coisa, um

ser vivo, um grupo de pessoas...”. Partindo deste conceito, concebemos a

lógica de que, se é verdade que constituição é o que estrutura e forma o

Estado, logo, a conclusão mais imediata é a de que, sempre que existiu

ESTADO, existiu constituição, uma vez que, mesmo de forma empírica, ele

estava estruturado, formado, de sorte que, materialmente não há ESTADO

sem constituição. Tal assertiva pelo ponto de vista material (sentido material),

como sendo um elemento formador e estruturador do Estado é totalmente

verdadeira. Onde há ESTADO há CONSTITUIÇÃO.

A mesma lógica entretanto é totalmente falsa se analisarmos a

Constituição pelo prisma do sentido formal. Neste caso, em particular, trata-se

de um documento ou uma folha de papel, como diz Lassale, escrito e

formalizado com o nome de CONSTITUIÇÃO. Este prisma é algo

relativamente novo, nasce com a CONSTITUIÇÃO dos Estados Unidos da

5 MORAES, Alexandre de. DIREITO CONSTITUCIONAL, São Paulo: 28 Ed. Atlas, 2012. p.6

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América nos fins do século XVIII, para alguns data de 1787 e para outros,

1891 seria a data exata. Interessante também esta controvérsia, que apesar de

não ser objeto de nosso estudo, quando da edição da constituição norte

americana em 1787, esta não continha um catálogo de Direitos Fundamentais.

Sendo sua importância explícita por ocasião da assembleia geral na França,

da revolução francesa, foi colocado no art.16 da Declaração de Direitos do

Homem e do Cidadão 6 que “A sociedade em que não esteja assegurada a

garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem

Constituição”. Ao lermos a Constituição de 17877 notamos que os Direitos

Fundamentais passaram em branco, tendo sido inserido apenas em 1791,em

especial, nas seis primeiras emendas da constituição americana, que nada

mais é do que uma cópia da Declaração de Direitos, de 12 de janeiro de 1776

do Bom Povo da Virgínia, anterior então, a declaração da independência

americana, que data de 4 de julho do mesmo ano. Podemos inclusive

apimentar a discussão e lançar outra indagação: Há Constituição sem Estado?

Se pegarmos a comunidade europeia poderemos responder a tal pergunta

com certa facilidade. Foi tentado lá uma constituição que abrangesse os

Estados membros da União Europeia, com muita resistência de alguns países,

como a França por exemplo, e hoje com todos os problemas econômicos

enfrentados por este bloco, está muito difícil um consenso.

6 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Declara%C3%A7%C3%A3o_dos_Direitos_do_Homem_e_do_Cidad%C3%A3o

7 Declaração de Independencia dos Estados Unidos da América. Disponível

em: http://www.arqnet.pt/portal/teoria/declaracao_vport.html-Declaração

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1.2 CONSTIUIÇÃO, O DESESPERO DOSVENCEDORES

Com certeza as conceituações acima foram de grande valia. Mas, na

verdade, a Constituição foi, antes de tudo, um momento, uma necessidade,

uma invenção daqueles que tinham um Estado na mão, tinham declarado a

sua própria independência e estavam desesperados, uma vez que não sabiam

o que fazer. Para se chegar a esta conclusão basta apenas uma operação

matemática básica. A declaração de independência se dá em 1776 e a

constituição é de 1787.

Até aquela época, todos os países até então existentes detinham

governos monárquicos com base em constituições não escritas. A soberania

reinante era absolutista, se na França “Le etat est moi” o Estado era ele. Traço

aqui minhas singelas críticas a esta tradução, pois na verdade, de fato e de

direito, o Estado não era ele e sim, era dele, um brinquedinho, para que fizesse

o que bem entendesse, o soberano era um deus. A própria vida daqueles que

no interior deste Estado viviam era uma dádiva, na Inglaterra “the king no rong”

o rei não erra, mais impunha as treze colônias inglesas toda a sorte de

arrochos tributários advindos de leis intolerantes, como o Sugar Act (Lei do

Açúcar), o Stamp Act (Lei do Selo) e o Tea Act (Lei do Chá). Estava assim

tramado um verdadeiro conluio entre o Rei e o Parlamento inglês. Note-se que

nesta ambiência, faz-se necessário debelar contra o arbítrio dos reis.

Analisando, é bem claro entender que esta forma de governo absoluto não

seria aceito neste admirável mundo novo. Junte tudo isto num caldeirão, a

ideia de liberdade se torna inevitável.

Na europa borbulhava o movimento iluminista, trazendo as ideias

enibriantes de Locke, Montesquieu, Voltaire, Russeau, este em relação a

separação de poder, igualdade e a mais maravilhosa e deliciosa de todas, a de

liberdade. Tais ideias se coadunavam com a conjuntura americana naquele

momento.

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Surge assim uma ideia inovadora. A da criação de uma forma de

governo diferente de tudo que até então existia era a saída, se não era a mais

perfeita, era a possível. Então, inovaram, criaram um governo onde a nobreza

de berço não teria espaço. Bem como reza a parte final da declaração da

independência americana 8;

“....nós, Representantes dos ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, reunidos em Congresso Geral, suplicando ao Juiz Supremo do mundo pela retidão das nossas intenções, em nome e com a autoridade que o nobre Povo destas Colônias nos conferiu, anunciamos e declaramos solenemente que estas Colônias Unidas são e devem ser por direito ESTADOS LIVRES E INDEPENDENTES; que ficam exoneradas de toda a Fidelidade perante a Coroa Britânica e que qualquer vínculo político entre elas e o Estado da Grã-Bretanha é e deve ser totalmente dissolvido; e que, na qualidade de ESTADOS LIVRES E INDEPENDENTES, assiste-lhes toda a competência para declarar Guerra, assinar a Paz, contrair Alianças, estabelecer Relações Comerciais e levar a cabo quaisquer decisões ou ações, tal como compete aos ESTADOS INDEPENDENTES. E para sustentação desta Declaração, confiando plenamente na proteção da Divina Providência, empenhamos mutuamente as nossas Vidas, os nossos Bens e a nossa Honra sagrada”.

Note que pelo teor desta declaração, o povo americano não desejava ter

“...qualquer vínculo político...”. tornou-se tão grande a ira do povo americano

que na cidade de Nova Iorque após a leitura da declaração de independência,

foi a rua, derrubaram a estátua do rei inglês, Jorge III, fundiram a mesma e

transformaram em balas de chumbo com a qual afundaram navios ingleses.

Não podemos nos esquecer que o Estados Unidos nascem como Estados

livres e independentes ou melhor, nascem como uma Confederação,

8 Declaração de Independencia dos Estados Unidos da América. Disponível

em: http://www.arqnet.pt/portal/teoria/declaracao_vport.html-Declaração

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apresentando esta, uma acefalia em relação a um governo central. Cada

estado tinha a sua lei maior que era a Declaração de Direitos.

Já em guerra aberta contra a metrópole, seis colônias americanas

resolveram proclamar também os seus direitos: Virgínia, Maryland. Carolina do

Norte, Vermont, Massachusetts e New Hampshire. Estas declarações eram

estabelecidas com base em princípios democráticos, que pela primeira vez

ganhavam contorno estatal. Esta enxurrada de declarações dá-se a partir de

1776 até 1784.

Os Estados Unidos da America do Norte eram uma realidade, mas não

eram tão unidos assim. Detinham uma grande dívida contraída pela guerra de

sua independência. E uma pergunta pairava: como pagar?

É necessário visualizar que o Estado Americano foi edificado, ele nasce

sob a égide do regime Confederativo e nesta espécie de regime é impossível

que seja feita qualquer imposição a qualquer destes Estados, uma vez que os

mesmos são Estados soberanos e as antigas treze colônias o eram. Na própria

declaração de independência americana podemos constatar tal regime pela

leitura de um pequeno fragmento 9, quando diz que “...anunciamos e

declaramos solenemente que estas Colônias Unidas são e devem ser por

direito Estados livres e independentes...”.

Impedia-se assim, que qualquer lei que impusesse aquilo pelo qual tanto

lutaram, impostos, não seria vista com bons olhos e, como não havia como

impor, não eram aceitos. No entanto, não havia outro meio para honrar a

imensa dívida contraída com a guerra, ainda que vitoriosa. Alguma fórmula

tinha que ser encontrada, era necessário fazer com que os Estados

Confederados abandonassem a sua soberania e desta forma, arquitetar uma

mudança de regime que contemplasse um Estado federativo, transferindo

9 Declaração de Independencia dos Estados Unidos da América. Disponível

em: http://www.arqnet.pt/portal/teoria/declaracao_vport.html-Declaração

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assim, todas aquelas soberanias para um poder central e tal mudança não

seria fácil. Notem que a liberdade pelo qual tanto lutaram estava conspirando

contra eles e os transformava em escravos dela própria.

Neste contexto entra em cena um grande e inesperado aliado, a

imprensa e dentro dela um soldado chamado “O Federalista 10(the federalist

paper)”. A ideia deste tabloide, era a de argumentar para os Estados

confederados sobre a importância da ratificação da Constituição dos Estados

Unidos, abrindo caminho para uma forma de governo federalista.

The federalist paper nasceu como resultado de reuniões que ocorreram

na Filadélfia por volta de 1787 para a elaboração da Constituição Americana.

Essas reuniões renderam vários artigos publicados em Nova York. A reunião

de todos esses artigos deu origem ao livro "O Federalista".

Estes artigos são publicados primeiramente no “Independent Journal”,

de Nova Iorque, e posteriormente em outros inúmeros jornais ao redor dos

Estados Unidos, sendo que, alguns anos depois da confirmação pelos Estados

Confederados (agora Federados), foram publicados e republicados diversas

vezes em forma de livro.

Integram O Federalista um total 85 artigos. São seus escritores,

Alexander Hamilton, que escreve mais da metade dos artigos, sendo por

muitos considerado o seu principal articulador, James Madison, que escreve

um pouco mais de 20 artigos e John Jay, que escreve apenas 5 artigos.

Neles, são tratados, dos artigos 1-37 problemas e inadequações das

confederações, em particular e em geral; de 38-51 princípios gerais da

Constituição; de 52-61 Câmara dos Representantes; de 62-65 Senado; de 66-

77 Presidência; e de 78-83 Judiciário. Os dois últimos artigos servem como

um apanhado final do texto, uma espécie de conclusão.

Podemos notar que a Constituição formal nasce nos Estados Unidos da

America, e que hoje é uma realidade na maioria dos países, tornando-se um

limite ao poder. Não foi esta, um ovo de colombo. Grande parte da novidade

10 MADISON, James; HAMILTON, Alexander; JAY, John. Os Artigos Federalistas. Apresentação: Isaac Kramnick; tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993

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encontra-se nos textos dos artigos de O Federalista. Alguns conceitos

contidos nestes textos, anteriormente, já havia aparecido em outros autores.

Os mais importantes são o conceito de Constituição (Aristoteles), o de

República e o de Federação. São nestes Artigos que, pela primeira vez, há a

formulação de uma teoria que se baseia no conceito moderno de Constituição,

como documento formal que explicita tanto o passado de uma nação quanto

direciona o seu futuro com base em seus valores maiores. Abandona-se, a

partir de então, a visão Antiga de Constituição, uma visão que consiste apenas

em descrever o modo de ser de um povo. Desta forma, a Constituição nasce

como um consenso de valores é uma invenção revolucionária norte-americana,

ou como indica no tópico, “O DESESPERO DOS VENCEDORES”.

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1.3 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

A idéia de controle de leis segundo alguns doutrinadores já e bem

antigo. No direito ateniense, havia duas espécies de leis: os nómois, que era lei

em sentido estrito eo pséfisma, que era uma espécie de decreto. Os nomóis,

sob certos aspéctos se aproximavam das modernas leis constitucionais uma

vez que para a sua modificação era necessário um processo especial. Para

Aristóteles a lei estava acima das paixões humanas, chegando a formular a

doutrina da supremacia das leis e da ilegitimidade da lei injusta.

De uma forma bem simples. controlar a constitucionalidade nada mais é

do que uma forma de aferir se a norma inferior se compatibiliza com uma

superior, neste caso a Constituição, significa impedir a eficácia da norma

contrária à Constituição.

A constituição está apoiada em um tripé. Rigidez constitucional,

supremacia constitucional e o controle de constitucionalidade. Para o prof.

José Afonso da Silva11- “ a rigidez constitucional decorre da maior dificuldade

para a sua modificação do que para a alteração das demais normas jurídicas

da ordenação estatal”, ele vai além e diz que “ da rigidez, emana, como

primordial consequência, o princípio da supremacia da constituição “ e mais

além completa, “significa que a constituição se coloca no vértice do sistema

jurídico do país...”. Alexandre de Moraes12 afirma que “ a inexistência do

controle de constitucionalidade confere ao legislador ordinário um poder de

constituinte originário permanente, por meio do qual a Constituição poderá ser

contornada, superada, alterada, vencida ou ignorada”.

É esta a ideia de controle de constitucionalidade, impedir que uma lei

inferior incompatível com ela se assente no ordenamento jurídico. O princípio

da exigência de compatibilidade das leis ordinárias com o disposto na

11 SILVA, Afonso José da. Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: 22 Ed. Malheiros, 2003. p.45 12

MORAES, Alexandre de. DIREITO CONSTITUCIONAL, São Paulo: 28 Ed. Atlas, 2012 .p. 645

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Constituição, têm origem na jurisprudência norte-americana, em especial na

celebre decisão do Juiz John Marshal no caso Willian Marbury vs. James

Madison em 1803, no entanto este controle não aparece apenas neste

momento.

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CAPÍTULO 2

PARADIGMAS DO CONTROLE AMERICANO

São dois os Cases que servem como paradigma do controle americano.

O primeiro e mais conhecido é o caso Marbury versus Madison, é este linding

case que dá início ao controle constitucional eminentemente difuso nos

Estados Unidos. O segundo caso é o caso Drad Scot versus Sandfor, este não

é tão conhecido como o primeiro, no entanto muito importante e interessante,

uma vez que pela primeira vez é discutida a questão escravagista nos Estados

Unidos. Este case coloca uma chama dentro de uma fogueira que termina

culminando com a guerra da secessão.

2.1 O CASO MARBURY VERSUS MADISON

Como se evidencia, a idéia de controle de leis está longe de ser uma

novidade, o que não havia, entretanto, era um instrumento legal acima dos

mandatários, fossem eles reis ou imperadores, e ao qual eles seriam obrigados

a acatar e respeitar. Neste ponto em especial começa a fluir a idéia de uma

constituição escrita, uma vez que palavras o vento leva. Temos que levar em

conta que os Estados Unidos era um Estado novo onde os costumes não

estavam presentes, como na Inglaterra por exemplo. Neste contexto, um

documento acima da razão e da paixão era perfeito.

Ocorre que no ano de 1801, notem que pouco depois da sua

consolidação, este documento maior é posto a prova no célebre caso

MARBURY vs MADISON, este lead case pode ser assim entendido:

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23

2.1.1 ORIGEM DO PROBLEMA

Tema muito bem analisado pelo professor e Ministro Luis Roberto

Barroso13. O Presidente americano na época era John Adams, este pertencia

ao Partido Federalista tendo como vice Thomas Jefferson que pertencia ao

recente Partido Republicano. Na verdade, não era apenas o nome dos partidos

que os diferenciava e sim sua ideologia. O Partido Federalista defendia uma

União Federal forte, prestigiando o Governo Central o Partido Republicano, em

via inversa, defendia uma Federação descentralizada, com maior autonomia

para os estados.

Desta forma em 1800 ocorrem eleições e naturalmente o Presidente

Adams concorreu para a reeleição, ocorre que Thomas Jefferson também

concorre ao mesmo cargo pelo Partido Republicano. No final da contagem

Adams perde a eleição para Thomas Jefferson. Não bastasse esta derrota o

Partido Federalista perde a maioria das cadeiras no Congresso para o Partido

Republicano, criando uma atmosfera de pânico político entre os federalistas.

No entanto, antes de Adams deixar a presidência, para o republicano e

inconformado com a derrota, aliou-se ao Congresso para aprovar uma lei que

reestruturasse o Poder Judiciário, dando-lhe uma nova cara, desta forma foi

aprovado o "Judiciary Act" de 1801" modificando o ”Judiciary Act" de 1789.

Com a aprovação desta lei, ele consegue que seja diminuído o número de

Ministros da Suprema Corte, não dando chance para a nomeação de novos

pelo Presidente que seria empossado. Além disso, a nova lei aumentava o

número de juízes criando dezesseis cargos de juiz federal, que seriam

ocupados por seus aliados.

Adams, dias antes de deixar a presidência aponta diversos

correligionários do Partido Federalista como juízes, notem que desde aquela

época já temos o trem da alegria. No entanto, para que valessem os proclamas

(eram certidões de investidura) e para que a posse nestes cargos fossem

13 BARROSO, Luis Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 6. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2012

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realizadas, estes teriam que ser entregues aos seus destinatários, não havia

publicação na época, teria que ser feito de mão em mão.

O Presidente Adams deu esta incumbência para seu Secretário de

Estado James Marshal, que também foi agraciado como Juiz da Suprema

Corte Americana, para que este entregasse os proclamas a seus destinatários.

No entanto,chega ao fim o governo de Adams.

Jefferson toma posse em 04/03/1801 e os proclamas dados a Marshal

não são todos entregues. Jefferson, agora Presidente, nomeia James Madison

como seu Secretário de Estado dando-lhe uma ordem direta para que não

fosse entregue mais nenhum proclama, quem não ganhou, não ganha mais.

Dentre estes proclamas está o de William Marbury que tinha sido

investido como Juiz de Paz em Washington, distrito de Columbia e ante a

recusa de Madison em lhe entregar, Marbury impetra o Writ of Mandamus,

uma espécie de Mandado de Segurança, perante a Suprema Corte Americana

no final de 1801 para obrigar Madison, que tinha foro de prerrogativa de

função, a entregar os proclamas. No entanto, não é apenas Marbury que

ajuíza o Writ, todos os que não receberam fazem o mesmo.

O Congresso, para apoiar o ato de Jefferson edita o "Judiciary Act" de

1802 que altera a composição do Judiciário novamente, desta vez voltando as

alterações do "Judiciary Act" de 1789.

O Writ impetrado tem como base o artigo 13 do Judiciary Act de 1789,

sendo este uma lei ordinária, que estabelecia a competência originária da

Suprema Corte para julgar atos do Secretário de Estado. Esta ação caiu no

colo de Marshal, exatamente para ele, agora Chief Justice da Suprema Corte

americana, o mesmo que quando Secretário de Estado do governo de John

Adams, não entregou os proclamas.

Estava criada a crise entre o poder executivo e o poder judiciário

americano e como o congresso tinha como maioria o Partido Republicano, este

fecha a Suprema Corte por dois anos.

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25

2.1.2 PROCURANDO A SOLUÇÃO

É necessário enfatizar que Constituição dos Estados Unidos da

América, ainda estava em consolidação. Não haviam passado sequer duas

décadas desde que ela entrara em vigor e já um juiz – considerado por muitos

o mais célebre de todos a ter integrado a Suprema Corte – enfrentava um caso

melindroso, no qual injunções políticas se combinavam com razões jurídicas,

como acontece nas questões maiores da república.

Sendo profundo conhecedor destas questões, o Chief Justice da

Suprema Corte americana, Marshall, fez a si mesmo três perguntas.

a) Marbury tem direito a impetração do Mandamus

b) Permitiria as lei americanas o ajuzamento do mandamus na Suprema

Corte

c) Se permitido fosse, pode uma lei ordinária obrigar a Suprema Corte para

decidir em tal situação.

Após a identificação dos fatores, era primordial a resposta a tais

questionamentos. Neste caso, a Constituição, ou é uma lei superior e

predominante, e lei imutável pelas formas ordinárias, ou está no mesmo nível

conjuntamente com as resoluções ordinárias da legislatura e, como as outras

resoluções, é mutável quando a legislatura houver por bem modificá-la.

Se é verdadeira a primeira parte do dilema, então não é lei a resolução

legislativa incompatível com a Constituição; se a segunda parte é verdadeira,

então as constituições escritas são absurdas tentativas da parte do povo para

limitar um poder por sua natureza ilimitável.

É necessário entender que apesar do Novo Estado Americano em nada

querer se parecer a sua antiga metrópole, ainda carregava em si vários

aspectos desta. Uma prova bem clara se consolida na sua base jurídico-

processual alicersada em casos anteriores, oriundo da tradição do povo anglo-

saxão, fincando-se assim a ideia dos precedentes (Common Law).

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Partindo desta premissa, o Juiz Marshal se lança a procura das

respostas. Encontra-as primeiramente nas palavras de Alexander Hamilton14,

estas contidas no artigo 78 de O Federalista. Neste artigo em particular,

Alexander Hamilton discorre não apenas sobre a importância do Judiciário mas

faz uma abordagem sobre o judicial review para mantenedura da própria

democracia. Não havia até aqui nenhum embrião sobre a ideia da guarda da

Constituição, nem se a interpretação das leis segundo a própria constituição

deveria ser dada aos tribunais ou a um tribunal especialmente composto para

tal com poderes especiais. No entanto parece importante notar que Hamilton

parte de uma lógica simples. Se em qualquer sistema normativo assim como

em qualquer regime de governo cabe aos juízes a responsabilidade pela

interpretação das leis, porque não o poderiam ser também, pela guarda da

Constituição. Esta, lógica estaria longe de transformar o judiciário em um super

poder, apesar de Hamilton se preocupar com a situação frágil do poder

judiciário frente aos outros dois poderes naquele momento.

O poder Executivo, diz Hamilton15, é o que detém "a espada", ou seja, é

aquele que realmente age; o poder Legislativo é aquele que detém "a bolsa",

ou seja, é o poder que controla como as riquezas do país serão aplicadas,

através das leis. Já o poder Judiciário não possui nenhuma iniciativa e,

portanto, é o poder mais fraco de todos. Necessita-se, desta forma, de

mecanismos que fortaleçam a sua ação. Estavam aí a respostas de Hamilton e

estas convinham muito bem a John Marshal e ao Partido Republicano. Não

havia que se falar de uma superioridade do Judiciário sobre os demais. O

controle judicial apenas colocava o poder do povo acima de ambos, ou seja,

sempre que a vontade do Legislativo, representada nas leis, se opusesse à do

povo, os juízes deveriam obedecer a esta e não àquela. O dever de obediência

à Constituição encontra fundamento na sua superioridade normativa,

porquanto representa a base dos interesses da sociedade. Essa idéia tomou

14MADISON, James; HAMILTON, Alexander; JAY, John. Os Artigos Federalistas. Apresentação: Isaac Kramnick; tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993

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força e marcou o modelo norte-americano de controle de constitucionalidade,

judicial e difuso por excelência.

O autor justifica, ainda, a competência do Judiciário para o controle de

constitucionalidade das leis, nasce no fato de que dificilmente o legislador

corrigiria as leis que tivesse elaborado, pois para Hamilton16:

“o mesmo espírito que predominou em sua elaboração estaria presente quando da interpretação; seria ainda menos provável que homens que infringiram a Constituição, no papel de legisladores, estivessem dispostos a reparar seus erros quando investidos do papel de juízes”.

A nulidade de uma lei que não observasse as limitações impostas pela

Constituição à autoridade legislativa era, para Hamilton17, uma obviedade:

“Não há posição que se apoie em princípios mais claros que a de declarar nulo o ato de uma autoridade delegada, que não esteja afinada com as determinações de quem delegou essa autoridade. Consequentemente, não será válido qualquer ato legislativo contrário à Constituição. Negar tal evidência corresponde a afirmar que o representante é superior ao representado, que o escravo é mais graduado que o senhor, que os delegados do povo estão acima do próprio povo, que aqueles que agem em razão de delegações de poderes estão impossibilitados de fazer não apenas o que tais poderes não autorizam, mas sobre tudo o que eles proíbem”.

Aparentemente o problema estava resolvido, no entanto, Marshal

recorreu a dois precedentes jurisprudenciais, um datado de 1780 onde a

Justiça do Estado de New Jersey declarou nulidade de uma lei que contrariou

a Constituição do Estado e o outro caso ocorreu em Rhode Island em 1786

(Trevett v. Weeden), no qual os juízes declararam uma lei inválida, embora não

conheceram o caso alegando ausência de pressuposto de jurisdição.

15 Idem 16 Ibidem 17 Ibidem

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Além do evidenciado até aqui há um dado muito importante, segundo o

professor e ex Ministro do STJ, Adhemar Ferreira Maciel18:

no Reino de Aragão, na Espanha, no século XIII, existia uma espécie de jurisdição constitucional. Havia uma corte, chamada de Consistorio, presidida por um justicia mayor, que era encarregado de controlar as leis do reino. Entende-se que a Inglaterra, que mantinha relações comerciais frequentes com o Reino de Aragão, deve ter absorvido essas ideias. Um exemplo claro disso está no caso julgado pelo chief justice da Court of Common Pleas da Inglaterra, Sir Edward Coke (1552-1634), ao julgar o caso de um médico preso por ordem da entidade de classe Royal College of Physicians, teve o estatuto da corporação declarado nulo por ser contrário à lei (common law). Segundo Coke, acima do rei e do Parlamento estava a lei, cabendo ao juiz declarar a nulidade de qualquer norma que fosse considerada contra a lei. Sir. Edward Coke escreveu uma coleção de livros (Institutes), que teriam sido trazidos por alguns viajantes do Mayflower (1620) para o novo mundo, e se tornaram literatura fundamental dos advogados ingleses e colonos. Assim, desde muito cedo a idéia do controle de constitucionalidade ou judicial review estava presente nos estudos do norte-americano que estudava as leis.

Vai o prestigiado professor Ferreira Maciel19 mais além quando nos

ensina que:

“entre a Independência (1776) e a promulgação da Constituição (1787), vale dizer, antes de Marbury (1803), registra-se uma vintena de julgados judiciais declarando nulas leis contrárias às Constituições dos Estados da então Confederação dos Estados Unidos da América. Foi o que se deu com Ware v. Hylton (Virgínia), no qual John Marshall, como advogado, defendera tese contrária ao controle de leis pelo judiciário. “Ironia do destino”,

18

MACIEL, Adhemar Ferreira. O acaso, John Marshall e o controle de constitucionalidade. Revista de Informação Legislativa, Brasília, out./dez. 2006.p. 38 19 Idem.p.39

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como frisou Albert J. Beveridge (1862-1927) em The Life of John Marshal”.

O caminho estava aberto, a questão jurídica tinha se resolvido, restava

agora, apenas a questão política e dois anos haviam se passado, era o ano de

1803. Marshal era habilidoso o suficiente para entender que o Presidente

Thomas Jefferson não acataria uma decisão que fosse favorável à Marbury e

contrária a James Madison que era seu Secretário de Estado. Sua certeza

advinha, uma vez que conhecia bem o Presidente pois sua mãe Mary

Randolph Keith era prima de Thomas Jefferson. Por outro lado, Marshal não

seria o pivô de uma crise constitucional que acarretaria o desprestígio da

Suprema Corte e colocando em risco o Poder Judiciário perante o Executivo e

o Legislativo.

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30

2.1.3 SOLUCIONANDO O PROBLEMA

Neste caso concreto e de posse de todas as informações necessárias

ao deslinde, o Juiz John Marshal passa a fundamentar sua decisão. De acordo

com Gustavo Binenbojm20

"a questão de que uma lei em choque com a Constituição possa transformar-se em Direito do País é profundamente interessante para os Estados Unidos e, felizmente, não tão confusa quanto a proposição de seu interesse. Parece apenas necessário reconhecer certos princípios considerados há muito como bem estabelecidos, para decidir. Que o povo tem um Direito originário de estabelecer, para seu futuro governo, tais princípios, que, em sua opinião provavelmente melhor conduzirão à sua felicidade, é a base sobre a qual toda a estrutura americana tem sido erigida. O exercício desse Direito original demanda um enorme esforço; não pode nem deve ele ser freqüentemente repetido. Os princípios, portanto, assim estabelecidos, são considerados fundamentais; e como autoridade da qual promanam é suprema e raramente pode agir, são designados para ser permanentes. Essa vontade original e suprema organiza o governo e determina aos diversos departamentos seus respectivos poderes. Pode parar aqui ou estabelecer certos limites que não devem ser transcendidos por aqueles departamentos. O Governo dos Estados Unidos segue a última idéia. Os poderes do Legislativo são definidos e limitados e seus limites não podem ser controvertidos ou enfraquecidos; a Constituição é escrita. Qual o propósito de serem os poderes limitados e aqueles limites consignados por escrito, se puderem, a qualquer tempo, ser ultrapassados por limites considerados como restritos? A distinção entre um governo com poderes limitados ou ilimitados é abolida, se aqueles limites não contiverem as pessoas sobre as quais são impostos, e se leis proibidas e leis permitidas forem de igual obrigação. É uma proposição demasiadamente clara para ser contestada, a de que a Constituição controla a qualquer ato legislativo em choque consigo, ou que o Legislativo possa alterar a Constituição por lei ordinária. Entre estas alternativas, não há meio termo".

20

BINENBOJM, Gustavo. A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p.32

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Estabeleceu no julgado, que Marbury tinha direito a ser empossado

como juiz, mas a lei que conferia competência originária à Suprema Corte para

o julgamento do caso era inconstitucional, uma vez que a lei ordinária não

pode criar competência para a Suprema Corte, apenas a Constituição tem este

poder.

Atribuiu, por conseguinte, à suprema Corte o poder de extirpar atos

contrários a Constituição, em termos que não poderiam ser recusos por

Jefferson.

Com esta fundamentação, Marshal sacramenta de vez a ideia da

supremacia da Constituição sobre as leis subconstitucionais, desta forma,

qualquer lei contrária à Constituição seria imediatamente retirada por esta,

cabendo tal controle a qualquer juiz, em um caso concreto e em qualquer grau

de jurisdição. Inaugura-se assim, o controle constitucionalidade nos Estados

Unidos, um controle difuso.

Podemos identificar toda a trajetória, todo o percurso traçado para

construir o controle de constitucionalidade difuso.

Esta construção levou tempo e neste tempo podemos constatar que

caminha lado-a-lado fatores jurídicos aliado aos políticos, marca

caracterizadora nos tempo atuais. Para entender o jurídico há uma

necessidade de entender o social.

Podemos notar que apesar da separação política com a antiga

metrópole, os Estados Unidos carregaram uma gama muito grande da

juridicialidade inglesa, claro que adaptando a esta as peculiaridades de um

admirável mundo novo.

Todos os questionamentos contidos nos tópicos deste pequeno esboço

foram respondidos. Foram trabalhados árduaente para que o leitor, estudioso,

entendesse e participasse da construção do controle de constitucionalidade.

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32

Pôde o leitor identificar os questionamentos existentes e o caminho

percorrido para a sua solução.

Não pode o controle de constitucionalidade ser visto como algo que

nasceu pronto e acabado, foi sim o fruto principalmente da necessidade e da

engenhosidade em resolver questões gerais que tinham em seu bojo razões

pessoais. É o controle de constitucionalidade o ápice dessa mudança.

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2.2 O CASO DRED SCOTT VERSUS SANDFORD

Alguns doutrinadores entendem que o caso Dred Scott foi o segundo

caso de controle norte americano, e não foi. Antes dele, e não é o nosso objeto

de estudo ocorreu o caso MacCulloch versus Maryland em 1819. Este case foi

muito importante para a teoria dos poderes implícitos. A importância dada ao

caso Dred Scott versus Sandford reside no fato de ser de acordo com H.C,

Allen 21, ” foi talvez o mais odioso julgamento do direito constitucional norte

americano”. Na verdade, Dred Scott se notabilizou por buscar a liberdade pela

via judicia, decorrendo, segundo muitos doutrinadores, a pior decisão da

Suprema Corte americana de todos os tempos.

2.2.1 ENTENDENDO O CASE

Dred Scott foi vendido em 1830 para o médico militar John Emerson,

logo, Dred Scott era escravo. Foi então John Emerson transferido do Estado

do Missouri, onde era permitida a escravidão, para o Estado de Illinois, no Fort

Snelling, para posteriormente ser transferido de novo para o território de

Wisconsin (hoje faz parte do Estado de Minnesota). Ocorre que nestes locais,

segundo HC Allen22, não havia escravos, uma vez que eram signatários do

compromisso do Missouri que limitava as áreas em que a escravidão era

permitida e os Estados de Illinois e Minnesota não faziam parte desta área.

Sendo assim, apesar de ser escravo e viver nesta área, Drad Scott era livre.

Dred Scott conhece em 1836, Harriet Robinson, que era escrava do

major do exército Lawrence Taliaferro. Se casaram e para tanto, precisaram

21 ALLEN, H.C. A Concise History of the U.S.A. London: Ernst Benn, 1970.p.122 22 Idem, p. 122

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da permissão do major, este transferiu a propriedade da escrava para John

Sandford, que era proprietário de Dred Scott. Desta forma, puderam Dred e

Harriet passar a viver sob o mesmo teto. Tiveram duas filhas.

Ocorre que o médico John Emerson se casa em 1842 com Irene

Emerson, sendo mais uma vez transferido, desta vez com a esposa e o casal

de escravos para o Estado do Missouri, onde a escravidão era permitida.

Neste Estado, conhece Dred Scott um advogado que lhe deu uma nova forma

de pensar. Sendo assim, pensou Scott, como poderia ser ele livre, em Illinois

e Minnesota e voltar a ser escravo no Missouri. Inicia assim a sua peregrinação

judicial.

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2.2.2 O CAMINHO DA JUSTIÇA

Em 1847, Dred Scott ajuíza uma ação no Estado Missouri, onde o objeto

era a sua liberdade, Scott vs. Emerson, apesar de perder, uma falha

processual anula o processo. Ocorre que em 1850 morre seu proprietário e

Dred Scott não retorna a juízo, prefere ele entrar em um acordo com Irene

Emerson, viúva de John como intuito de negociar a sua liberdade e de sua

família, o que se revelou infrutífero.

Ajuíza então uma nova ação no mesmo Estado (Missouri), com o

mesmo objeto, liberdade. Em primeira instância ela é reconhecida, uma vez

que, sendo livre nestes dois estados, não havia como voltar a ser escravo, uma

vez livre, sempre livre. Entendeu o juiz que Dred Scott tinha direito à liberdade,

por ter sido ilegalmente mantido como escravo quando viveu em Illinois e

Wisconsin, onde a escravidão era ilegal. No entanto a viúva, em sede de

apelação, em 1852, a Suprema Corte do estado do Missouri cassou a decisão

sob a legação de que o precedente de “uma vez livre, sempre livre” não era mais válido, porque os tempos eram outros. E avisou os “Scotts”, que deveriam

ter movido a ação em Wisconsin, quando estavam lá.

A viúva do médico falecido contrai novo casamento, no entanto, havia

uma regra no Estado do Missouri que, por este motivo, os escravo de John

Emerson passariam para seu irmão, John Sandford que morava em Nova

Iorque, desta forma, Dred Scott e sua família foram para lá.

Em Nova Iorque, com o auxílio dos abolicionistas e entre eles

Montgomery Blair, que tinha um cargo com Abraham Lincoln aliado a uma

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nova equipe de advogados, Dred Scott ajuíza uma nova ação contra Sandford

que tinha como objeto o reconhecimento de sua liberdade.

Na contestação, alega Sandford falta de legitiidade ativa. Dred Scott

não era cidadão por ser negro e escravo. O juiz de primeiro grau , Robert

Wells, entendeu que se Dred Scott tivesse sua liberdade, poderia estar em

juízo, caso contrário, seu mérito seria discutível. Neste mérito, acompanhou o

juiz a decisão da Corte do Missouri. Não restou outra solução, sendo assim,

Dred Scott apela para a Suprema Corte americana.

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2.2.3 O JULGAMENTO DA SUPREMA CORTE

De acordo com Fehrenbacher23

O Chief Justice, Roger Tane, em voto preconceituoso e racista, hoje motivo de escárnio, abordou duas questões: o status dos negros (livres ou escravos) e o poder do Congresso em regular a escravidão nos estados. Perguntou, se os negros, cujos ancestrais teriam sido importados, estariam intitulados a exercer a cidadania. Respondeu negativamente. Agressivamente decidiu-se que os negros eram coisas, objetos de propriedade, comprados e vendidos, antes e depois da independência, antes e depois da Constituição. Além do que, o direto de propriedade de escravos estaria garantido pelo texto constitucional.só poderia ser perdido mediante a aplicação do due process of Law.entendeu também que o Congresso não poderia regulamentar a escravidão nos estados, porque a Constituição não admitia restrições a esse direito de propriedade.red Scott perdeu a causa. A decisão de 54 páginas arrogava-se definitiva, encerrando controvérsias sobre a escravidão nos estados.

Nasce aí o porquê de ser esta a decisão mais odiosa da Suprema Corte

americana. No entender de Robert Burt24, “o caso Dred Scott dividiu o país”.

23 FEHRENBACHER, Dom E. Slavery, Law e politics – the Dredd Scott Case in Historical Perspective. New York. Oxford University Press. 1981 24 BURT, Robert. The Contitution in Conflict.Cambridge. Harvard University Press.1955. p.2

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CONCLUSÃO

O advento do Controle de Constitucionalidade não nasceu de um acaso

ou teve o fator sorte na sua ingerência. Surgiu como conseqüência prática de

uma Constituição formal. Esta, limitando o Poder do governante, instituindo o

Estado democrático de Direito e a necessária organização deste mesmo

Estado.

Podemos identificar toda a trajetória, todo o percurso traçado para

construir o controle de constitucionalidade difuso. Esta construção levou tempo

e neste tempo podemos constatar que caminha lado-a-lado fatores jurídicos

aliado aos políticos, marca caracterizadora nos tempos atuais. Para entender o

jurídico há uma necessidade de entender o social

Todos os questionamentos contidos nos tópicos deste pequeno esboço

foram expostos e respondidos. Partimos de premissas claras, onde o Controle

de Constitucionalidade é o tema central, nos entanto, caminhamos pelos

elementos que formaram ou que ajudaram a formar este controle, como que

embutido na própria Constituição.

Foi um árduo trabalho para que o leitor, estudioso, entendesse e

participasse da construção do controle de constitucionalidade.

Tem o controle a função principal de manter o ordenamento jurídico,

assim como, garantir autonomia e segurança ao Estado. Há que ter na

constituição, uma necessidade premente de cuidado para que nela não

penetre qualquer lei a afrontá-la, devendo ser assim, defendida contra

eventuais abusos como assevera o grande mestre e Ministro do Supremo

Tribunal Federal, Luis Roberto Barroso25:

25 BARROSO, Luis Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 6. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2012. p.436

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O controle de constitucionalidade consiste na verificação da compatibilidade entre uma lei ou ato normativo infraconstitucional e a Constituição. Ocorrendo o contraste, o ordenamento jurídico provê um conjunto de mecanismos destinados à pronúncia de invalidade da norma e paralisação de sua eficácia.

Vimos como se deu este controle na primeira Constituição escrita, que

foi a dos Estados Unidos da América. Pudemos analisar o seu nascimento. Na

verdade, analisamos toda a sua gestação antes mesmo de nascer.

Na Constituição americana só existe o controle difuso, ou melhor, é o

controle americano eminentemente difuso, pulverizado por todo o judiciário,

formando-se reais precedentes, onde qualquer juiz ou Tribunal pode, no cotejo

entre a lei e a Constituição, decidir pela constitucionalidade ou não daquela.

Não podemos nos esquecer, deixar de lado, a idéia de que o controle de

constitucionalidade só poderá firmar como uma eficaz arma quando tratarmos

de Constituições rígidas. Nas Constituições flexíveis não há como se falar em

controle, uma vez que fazer lei é o mesmo que fazer Constituição, como ensina

o prof..e também Ministro Gilmar Mendes26

Distinção relevante é a que se faz entre constituições rígidas e flexíveis (agregando-se ao binômio as constituições semirrígidas, para designar constituições, como a do Brasil-Império, em que parte da Carta era rígida, e parte, flexível). A rigidez ou flexibilidade da Constituição é apurada segundo o critério do grau de formalidade do procedimento requerido para a mudança da Lei Maior. A estabilidade das normas constitucionais, em uma Constituição rígida, é garantida pela exigência de procedimento especial, solene, dificultoso, exigente de maiorias parlamentares elevadas, para que se vejam alteradas pelo poder constituinte de reforma. Em oposição, as constituições flexíveis permitem a sua reconfiguração por meio de um procedimento indiferenciado do processo legislativo comum. Não se cobra, na Constituição flexível, uma supermaioria para que o Texto seja modificado.

26

MENDES, Gilmar Ferreira e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. São Paulo: 7 Ed. Saraiva.2012. p.68

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40

A rigidez é atributo que se liga muito proximamente ao princípio da supremacia da Constituição. A supremacia fixa o status hierárquico máximo da Constituição no conjunto das normas do ordenamento jurídico. Essa superioridade se expressa na impossibilidade de o legislador ordinário modificar a Constituição, dispondo em sentido divergente do que o constituinte estatuiu. Se a Constituição pode sofrer transformações pela mesma maneira como se elaboram as demais leis, não se assegura a supremacia da Carta sobre o legislador ordinário. A rigidez distingue o poder constituinte dos poderes constituídos e positiva uma hierarquia entre as normas jurídicas, em que a Constituição aparece como o conjunto de normas matrizes do ordenamento jurídico, em posição de prevalência sobre todos os atos normativos que hão de nela encontrar fundamento último. A rigidez, expressando a supremacia da Constituição, demanda, também, a instituição de um sistema de controle de validade dos atos praticados pelos poderes constituídos, em face das normas do Texto constitucional. A rigidez, para ser efetiva, requer um sistema de controle de constitucionalidade das leis e atos normativos, como garantia eficaz da supralegalidade das normas constitucionais.

Verificamos, como e porque o case Marbury vs. Madison inaugura esta

forma de controle. Pôde o leitor identificar os questionamentos existentes e o

caminho percorrido para a sua solução. Identificamos os elementos jurídicos e

políticos inerentes a este linding case, bem como as questões gerais e reais

que tinham em seu bojo razões pessoais,, transformando o Chief Justice da

Suprema Corte, John Marshal, no juiz mais importante da história jurídica

americana.

Antagonicamente, também temos no juiz Roger Tane, o juiz mais odioso

da história da Suprema Corte. Este ódio está relacionado ao caso Dred Scott

vs. Sandford.

Através deste case podemos notar como a época tratava-se os negros,

eram este uma verdadeira e constitucional propriedade. Vimos como o juiz

Tane, privilegiou o direito fundamental à propriedade em detrimento do direito

fundamental à liberdade.

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Neste contexto, é interessante perceber o que faz um homem,um ser

humano, para adquirir o status de livre. Liberdade para si e sua família.

Percebemos, como desta luta aflui de o que era liberdade apenas para

si e sua família, passa para um contexto nacional, um estopim para a guerra

mais sangrenta de todos os tempos, que foi a guerra da Secessão ou, guerra

Civil americana.

.

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MOTTA, Sylvio. Direito Constitucional. Série Provas & Concursos. São Paulo 24 Ed. Campus, 2013 SILVA, Afonso José da. Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: 22 Ed. Malheiros, 2003