UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do...

84
UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM LINGUÍSTICA A leitura de poesia infantil na escola: o estilo e a expressividade em Ruth Rocha e Tatiana Belinky ROSA MARIA RIOLO XAVIER Orientador: Prof. Dr. Carlos Augusto Baptista de Andrade Dissertação apresentada ao Mestrado em Linguística, da Universidade Cruzeiro do Sul, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Linguística. SÃO PAULO 2015

Transcript of UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do...

Page 1: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM LINGUÍSTICA

A leitura de poesia infantil na escola: o estilo e a

expressividade em Ruth Rocha e Tatiana Belinky

ROSA MARIA RIOLO XAVIER

Orientador: Prof. Dr. Carlos Augusto Baptista de Andrade

Dissertação apresentada ao Mestrado em Linguística, da Universidade Cruzeiro do Sul, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Linguística.

SÃO PAULO

2015

Page 2: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

X23l

Xavier, Rosa Maria Riolo. A leitura de poesia infantil na escola: o estilo e a expressividade

em Ruth Rocha e Tatiana Belinky / Rosa Maria Riolo Xavier. -- São Paulo; SP: [s.n], 2015.

84 p. : il. ; 30 cm. Orientador: Carlos Augusto Baptista de Andrade. Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-Graduação em

Linguística, Universidade Cruzeiro do Sul. 1. Análise do discurso – Leitura 2. Linguística textual 3.

Estilística 4. Poesia infantil - Escola. I. Andrade, Carlos Augusto Baptista de. II. Universidade Cruzeiro do Sul. Programa de Pós-Graduação em Linguística. III. Título.

CDU: 81’42:028(043.3)

Page 3: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

A leitura de poesia infantil na escola: o estilo e a

expressividade em Ruth Rocha e Tatiana Belinky

ROSA MARIA RIOLO XAVIER

Dissertação de mestrado defendida e aprovada

pela Banca Examinadora em 26/02/2015.

BANCA EXAMINADORA:

Prof. Dr. Carlos Augusto Baptista de Andrade

Universidade Cruzeiro do Sul

Presidente

Profa. Dra. Guaraciaba Micheletti

Universidade Cruzeiro do Sul

Profa. Dra. Regina Helena Pires de Brito

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Page 4: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

A Deus, cuja bondade me concedeu harmonia e paciência

para trilhar mais este caminho de vida.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Carlos Augusto Baptista de

Andrade, pelo exemplo e dedicação ao ensino.

À minha família, pelo ânimo e encorajamento, ressaltando

o carinho à Anna Beatriz e à Sarah.

Page 5: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, autor de toda criação, pela oportunidade de

estudar e alcançar novos patamares de conhecimento, dando-me

forças, sabedoria e proteção em todos os momentos.

Ao meu esposo, José Xavier, pela compreensão, companhia e

encorajamento.

Aos meus filhos, Leonardo, Letícia e Leon, que souberam

compreender as minhas ausências.

Aos meus pais, pelos valores que passaram a mim e aos meus

irmãos.

Ao Professor Doutor Carlos Augusto Baptista de Andrade, por ter me

acolhido e direcionado ao longo do trajeto para a realização do

trabalho de pesquisa.

Às Professoras Doutoras Guaraciaba Micheletti e Regina Helena

Pires de Brito, pelas excelentes contribuições no Exame de

Qualificação.

A todos os docentes do Programa de Mestrado em Linguística da

Universidade Cruzeiro do Sul, pelos momentos de convívio e pela

aprendizagem proporcionada.

À Ana Paula, pelas palavras de ânimo e à Priscila, pela atenção dada.

À Karina, que sempre esteve disposta a estar ao meu lado quando se

fez necessário.

À Prefeitura Municipal de Caraguatatuba, SP, representada pela

Secretaria Municipal de Educação, pelo incentivo profissional e

financeiro.

Page 6: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

“A CRIANÇA É CRIATIVA E PRECISA DE MATÉRIA-PRIMA

SADIA, E COM BELEZA, PARA ORGANIZAR SEU ‘MUNDO

MÁGICO’, SEU UNIVERSO POSSÍVEL, ONDE ELA É DONA

ABSOLUTA: CONSTRÓI E DESTRÓI. CONSTRÓI E CRIA,

REALIZANDO TUDO O QUE ELA DESEJA. A IMAGINAÇÃO

BEM MOTIVADA É UMA FONTE DE LIBERTAÇÃO, COM

RIQUEZA. É UMA FORMA DE CONQUISTA DE LIBERDADE,

QUE PRODUZIRÁ BONS FRUTOS, COMO A TERRA

AGRESTE, QUE SE ADUBA E ENRIQUECE, PRODUZ

FRUTOS SAZONADOS”.

BÁRBARA VASCONCELOS CARVALHO

Pesquisadora.

Page 7: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

XAVIER, R. M. R. A leitura de poesia infantil na escola: o estilo e a expressividade em Ruth Rocha e Tatiana Belinky. 2015. 84 f. Dissertação (Mestrado em Linguística)–Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2015.

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo refletir/discutir sobre questões de estilo e de

expressividade na poesia infantil, analisando, nesse momento, a produção de

sentidos que se realiza pela leitura em quatro poemas; dois de Ruth Rocha: Natal de

Madalena e Os direitos das crianças e dois de Tatiana Belinky: Diversidade e Ser

criança. As escolhas lexicais, as estruturas sintáticas dos versos e opção por certa

sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a

compreensão dos diversos temas explorados em cada um dos poemas. A pesquisa

se justifica por considerar relevante o trabalho com esse gênero literário na escola,

fundamental para o exercício de uma leitura desvinculada de um ensino com valores

tradicionais que tinham como perspectiva disseminar questões de cunho

moralizante, para explorar os aspectos polissêmicos, artísticos e culturais da poesia.

No corpus escolhido, os recursos estilísticos foram utilizados pelas autoras,

construindo um fazer poético destinado a um público específico; retratando temas

recorrentes na infância – por vezes polêmicos –, tais como festas, direitos da criança

e diversidade, trabalhando em todos esses a partir de um conteúdo afetivo e

sensível. O presente trabalho fundamenta-se na Estilística Discursiva e está inserido

na linha de pesquisa Texto, discurso e ensino: processos de leitura e de produção

do texto escrito e falado, e no Grupo de Pesquisa Teorias e práticas discursivas e

textuais, do Programa de Mestrado em Linguística da Universidade Cruzeiro do Sul.

Palavras-chave: Estilística, Linguística textual, Poesia infantil, Expressividade.

Page 8: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

XAVIER, R. M. R. Reading and rhymes in school: the style and expressiveness in Ruth Rocha and Tatiana Belinky. 2015. 84 f. Dissertação (Mestrado em Linguística)–Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2015.

ABSTRACT

This work aims to reflect on/discuss questions of style and expression in children's

poetry, analyzing, in this moment, the production of meanings that takes place in the

reading in four poems; two of Ruth Rocha: Christmas of Magdalena and The Rights

of Children and two of Tatiana Belinky: Diversity and Be a Child. The lexical choices,

the syntactic structures of the verses and certain sonorities, reveals significant

aspects of childhood, facilitating the understanding of the various issues explored in

each poem. The research is justified by considering the relevant work with this

literary genre in school, important to the exercise of disconnected reading with

traditional values that did have how perspectives questions of nature moralizing to

explore the polysemic, artistic and cultural aspects of poetry. In the chosen corpus,

the stylistic features have been used by the authors to construct of a behave poetic

destined to specific public, portraying the recurring themes in childhood - sometimes

polemics - such as parties, children's rights and diversity, working all of these from an

emotional and sensitive content. The present work is based on the stylistic discourse

and is inserted in the search line text, discourse and teaching: processes of reading

and text production written and spoken and in the Group of Research, Theories and

discursive and textual practices of the Masters Program in Linguistics of the

University Cruzeiro do Sul.

Keywords: Stylistics, Textual linguistics, Children's poetry, Expressiveness.

Page 9: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................ 11

CAPÍTULO 1

1 POEMA INFANTIL: UM POSSÍVEL OLHAR........................................ 13

1.1 Contextualizando a Literatura Infantil................................................ 14

1.2 Literatura Infantil no Brasil................................................................. 18

1.3 Poesia na Literatura Infantil................................................................ 21

1.4 Ruth Rocha e Tatiana Belinky na poesia infantil.............................. 23

1.4.1 Ruth Rocha: Um Fenômeno Editorial................................................ 23

1.4.2 Tatiana Belinky: da Rússia Para o Brasil.......................................... 25

CAPÍTULO 2

2 LEITURA DE POESIA NA ESCOLA..................................................... 28

2.1 Poesia Na Escola................................................................................. 31

2.2 Poema e Trabalho Didático................................................................. 34

2.3 Alguns Estratos da Linguagem de Que Se Ocupa a Estilística...... 36

2.4 Estilística do Som................................................................................ 38

2.5 Categorias para a Análise dos Poemas............................................. 40

2.5.1 Nível Fônico: Algumas Particularidades........................................... 40

2.5.1.1 Expressividade das Vogais................................................................. 40

2.5.1.2 Expressividade das Consoantes....................................................... 43

2.5.1.3 Aliteração e Assonância..................................................................... 45

2.5.1.4 Métrica.................................................................................................. 47

2.5.2 Nível Morfossintático.......................................................................... 49

2.5.2.1 Expressão Construída Pela Palavra.................................................. 49

2.5.2.2 Expressividade Construída Pela Articulação Entre as Palavras.... 51

2.5.3 Nível Semântico: para Além do Sentido Denotativo........................ 51

2.5.3.1 Metáfora................................................................................................ 52

2.5.3.2 Antítese................................................................................................ 53

Page 10: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

CAPÍTULO 3

3 ANÁLISE DO CORPUS........................................................................ 54

3.1 Natal de Madalena – Ruth Rocha....................................................... 54

3.2 Os Direitos das Crianças – Ruth Rocha............................................ 63

3.3 Diversidade – Tatiana Belinky............................................................ 69

3.4 Ser Criança – Tatiana Belinky............................................................ 76

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................... 80

REFERÊNCIAS.................................................................................................. 82

Page 11: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

11

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente dissertação está inserida na linha de pesquisa Texto, discurso e

ensino: processos de leitura e de produção do texto escrito e falado, do Mestrado

em Linguística da Universidade Cruzeiro do Sul, cujo objetivo é investigar algumas

questões de estilo e expressividade a partir da análise de quatro poemas, dois de

Ruth Rocha e dois de Tatiana Belinky, cujos elementos lexicais e relações sintático-

semânticas são responsáveis pela constituição do gênero na esfera da literatura

infantil.

Os textos que constituem o corpus de análise são: Natal de Madalena e Os

direitos das crianças, de Ruth Rocha; Diversidade e Ser criança, de Tatiana Belinky.

Esses foram escolhidos tendo em vista dois aspectos: o primeiro ligado à expressão

que ambas desfrutam na esfera literária: Ruth Rocha ganhou quatro prêmios Jabuti1

e Tatiana Belinky um prêmio Jabuti e três da Fundação Nacional do Livro Infantil e

Juvenil (FNLIJ)2; o segundo aspecto corresponde ao fato de serem obras de

referência nas escolas brasileiras de Educação Básica.

O objetivo geral da pesquisa é investigar como as autoras levam ao público

infantil temas como a pluralidade cultural, os valores humanos e a diversidade, muito

recorrentes nos dias atuais, valendo-se da poesia, por meio de recursos expressivos

que acentuam as possibilidades interpretativas das obras.

Como objetivos específicos, pretende-se observar os poemas, refletindo

sobre a organização de cada um, pois têm uma unidade própria, constituída por uma

materialidade linguística que faz parte do universo infantil, sustentada pelo valor que

a poesia tem para o desenvolvimento de uma leitura integral em sala de aula,

possibilitando uma constituição mais crítica e criativa da leitura. Discutir-se-ão,

inicialmente, alguns conceitos como estilo e estilística, para dar suporte às análises

que serão realizadas e, posteriormente, sobre a importância de se trabalhar a poesia

1 Ver: <http://www.e-biografias.net/ruth_rocha>. Acesso em: 6 mar. 2015.

2 Ver: <http://www.companhiadasletras.com.br/autor.php?codigo=00035>. Acesso em: 6 mar. 2015.

Page 12: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

12

infantil, pois essa propicia uma leitura mais significativa e que contribui para o

exercício docente mais qualificado.

Para dar conta de tais discussões, o presente trabalho foi dividido em três

capítulos. O primeiro contextualiza o poema infantil na esfera literária, bem como

apresenta as autoras do corpus escolhido. No segundo, reflete-se sobre a leitura e,

especificamente, sobre a leitura de poemas, observando sua materialidade

linguística e suas possibilidades interpretativas, atentando para as escolhas lexicais,

a intertextualidade, a sequência sintática, a sonoridade, entre outros aspectos

ligados a essa produção literária. No terceiro capítulo, faz-se a análise do corpus,

observando as questões apontadas na reflexão teórica do capítulo 2, apresentando,

posteriormente, as considerações finais e as obras de referência.

Page 13: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

13

CAPÍTULO 1 - POEMA INFANTIL: UM POSSÍVEL OLHAR

Há uma diversidade de gêneros discursivos, entre os quais os literários, tais

como o conto, a fábula, o romance e o poema, e outros não literários que fazem

parte da vida cotidiana, tanto pessoal, quanto profissional das pessoas, tais como

carta, bula, propaganda, recibo etc. Todos têm por objetivo atender a uma

necessidade comunicativa entre os interlocutores, além de possuírem traços

próprios que os caracterizam.

Antes de se discorrer sobre poemas, é importante recuperar a própria noção

de poesia, pois há uma complexa diferença entre ambos, dado que muitas vezes

são usados erroneamente como sinônimos. Parte-se, porém, de uma definição

primeira, na qual poesia estaria em comparação com a prosa. Massaud Moisés

(1989, p. 82) afirma que a palavra poesia vem do grego “poesis, de poiein: criar no

sentido de imaginar... em oposição a oratio, prosa, linguagem direta e livre”.

A questão não é tão simples como parece, pois esse mesmo autor, depois de

diversas considerações em uma contextualização das discussões sobre poesia e

prosa, aponta para uma possibilidade mais relativista, que não se trataria de uma

diferença apenas formal, uma vez que há poesia prosaica e prosa poética, mas a

diferença estaria relacionada ao conteúdo. Para esse teórico (MOISÉS, 1989) a

poesia teria por objeto o “eu” e a prosa o “não-eu”. O poeta, ao desenvolver seu

objeto artístico, constitui uma monologia, pois confere o seu ângulo de visão do

mundo, ficando atento apenas para os limites que o relacionam com o exterior,

assim como assegura Moisés (1989, p. 84): “O poeta contempla ideias particulares,

subjetivas, e entretanto, em certo sentido, universais e verdadeiras”. Assim, a poesia

é considerada uma arte ligada à palavra, pela qual o poeta constrói seu mundo

particular, produzindo sentidos com autonomia discursiva, com uma finalidade bem

clara: sensibilizar seu leitor.

Mais adiante, na mesma obra, Moisés (1989, p. 88) introduz sua visão do que

seria o poema. Para esse autor o poema não seria sua apresentação formal, gráfica,

Page 14: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

14

mas sim “a soma de signos mediante os quais o poeta procura comunicar-se”. O

teórico questiona, ainda, qual seria a relação existente entre poema e poesia, e

indica o caminho da poesia, dizendo que “se o poeta se expressa no poema, através

do poema, onde estaria a poesia” (MOISÉS, 1989, p. 89). O próprio aponta para o

leitor, inferindo que é na enunciação, na relação que se estabelece na receptividade

com o leitor que surge a poesia, pois seria impossível essa estar apenas no poema

ou no poeta.

Pensando nisso, torna-se fundamental que, na escola, o docente possibilite

momentos que levem crianças e adolescentes à situação de comunicação

envolvendo uma realidade de leitura e de produção poética, com a finalidade de

propiciar o contato com as nuances da poesia, diretamente relacionadas às

experiências de comunicação e que têm por objetivo sensibilizar para atingir a

melhor forma de dizer algo, por meio das possibilidades que a poesia oferece.

Nessa direção, propõe-se aqui uma reflexão sobre a poesia infantil,

observando o estudo do vocabulário, de algumas figuras de estilo, da construção

sintática e de outras categorias, de maneira a conciliar forma e sentido. Antes e

porém, a fim de contextualizar o corpus, optou-se por discorrer, brevemente, sobre a

literatura infantil.

1.1 Contextualizando a Literatura Infantil

Como o objeto de estudo está inserido no discurso literário infantil, pensar

sobre tal discurso torna-se fundamental.

Nesse sentido, recupera-se o que Lajolo (2003, p. 232) afirmou a respeito de

literatura, pois essa

[...] trabalha na surdina. Enquanto formadora de imagens, a literatura mergulha no imaginário coletivo e simultaneamente o fecunda, construindo e desconstruindo perfis de crianças que parecem combinar bem com as imagens de infância formuladas e postas em circulação a partir de outras esferas, sejam elas científicas, políticas, econômicas ou artísticas.

Page 15: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

15

Nessa perspectiva, a literatura infantil parte do pressuposto de que o discurso

elaborado pelo autor tem o poder de inventar e de construir uma ideia sobre a

criança e seu mundo. Tal construção se fundamenta na imaginação, na capacidade

de criação, na percepção de mundo e no universo de valores e crenças que

constituem o autor. Tendo em vista todo esse universo da autoria, ao levar a poesia

para a sala de aula, pode-se dizer que dois mundos se encontram: o do autor e o da

criança, tais mundos entram em interação e constroem uma nova percepção. A

literatura infantil, dessa maneira, desenvolve-se como uma produção cultural

“comprometida com a ordem formativa”, como indicou Perrotti (1986).

Destinado à criança, o discurso literário infantil, por meio da realidade, da

ficção e da fantasia, constrói proposições para que o leitor possa interpretar o

mundo e desenvolver seus próprios sentidos (CADEMARTORI, 1987). Tal discurso

tem como função, também, promover o acesso da criança à herança cultural,

observando-se uma adequação da idade em que essa se encontra, com o objetivo

de enriquecer o conhecimento na infância e estabelecer relações de harmonia entre

fantasia e realidade, promovendo a aproximação entre as coisas do mundo adulto e

os conflitos internos infantis. Conforme aponta Frantz (2001, p. 16):

A literatura infantil é também ludismo, é fantasia, é questionamento, e dessa forma consegue ajudar a encontrar respostas para as inúmeras indagações do mundo infantil, enriquecendo no leitor a capacidade de percepção das coisas.

Dessa maneira, desde que se constituiu na Europa, a literatura infantil está

diretamente ligada às transformações pelas quais a sociedade passa. Charles

Perrault é considerado o pioneiro da literatura infantil, como discorre Carvalho (1989,

p. 77):

A Literatura Infantil tem seu início através de Charles Perrault, clássico dos contos de fadas, no século XVII. Naturalmente, o consagrado escritor francês não poderia prever, em sua época que tais histórias, por sua natureza e estrutura, viessem constituir um novo estilo dentro da Literatura, e elegê-lo o criador da Literatura da Criança.

Conforme a autora, apesar de se ter registro de vários manuscritos de cunho

pedagógico produzidos pelos protestantes com fins religiosos, foi no século XVII que

Page 16: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

16

Perrault adaptou narrativas populares e lendas da Idade Média, destacando valores

comportamentais da classe burguesa, revestidos pelos chamados contos de fadas.

Cademartori (1987) afirma que o contexto em que Perrault desenvolveu seu

trabalho com contos de fadas foi complexo, pois a circunstância sociopolítica da

época foi marcada pelas transformações e contradições sociais do Fronde,

movimento popular de oposição ao governo absolutista do reinado de Luís XIV, pelo

conflito entre Reforma e Contrarreforma, além da ascensão da burguesia como

classe social. Tais fatos contribuíram para a consolidação de instituições como a

família e a escola, as quais paulatinamente passaram a observar a criança de forma

diferenciada em um processo que era significativamente diferente do anterior.

Segundo esse autor, a criança, antes da ascensão burguesa, era vista como um

adulto em miniatura. Não havia preocupação específica com sua aprendizagem, no

entanto, à medida que essa passou a ser considerada de forma diferente do adulto,

alguém que necessitava de uma educação especializada para a vida, reflexões

sobre como ensiná-la passaram a fazer parte do cotidiano educativo. Para contribuir

com tal perspectiva, Perrault coletava as narrativas populares e as adaptava,

tornando-as viáveis ao novo público, discutindo valores que correspondiam ao

desejo da classe que então aflorava, a burguesia.

Os contos produzidos atendiam a duas condições, a saber: i) vinham do conto

folclórico que, à época, era destinado aos adultos e adaptados ao público infantil; ii)

mantinham um caráter de advertência, ou seja, as personagens que não atendiam a

determinadas regras estabelecidas eram punidas (CADEMARTORI, 1987).

Segundo Coelho (2005), ao adaptar a literatura popular para o público infantil,

Perrault mantinha para os novos textos um modelo educativo delineado pela

Contrarreforma, que era basicamente a cristianização e a valorização do pudor, com

a preocupação de desenvolver seus textos, observando sempre princípios morais.

No início, não se preocupou em escrever para crianças, o que fez a partir de Contos

da Mãe Gansa (1697), que o autor começou a se dedicar inteiramente a uma

literatura destinada à infância. Entre os contos, pode-se citar: A Bela Adormecida;

Page 17: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

17

Cinderela; Chapeuzinho Vermelho; Barba Azul; Henrique do topete; O gato de botas;

As fadas; A gata borralheira; O pequeno polegar.

Outros representantes importantes para a literatura infantil são os irmãos

Jacob e Wilhelm Grimm que, no século XIX, realizaram adaptações infantis de

contos alemães (CADEMARTORI, 1987). Ainda nomes como o dinamarquês Hans

Christian Andersen – assinando contos como O patinho feio e O soldadinho de

chumbo; o italiano Collodi – Pinóquio; o inglês Lewis Carroll – autor de Alice no País

das Maravilhas; o norte-americano Frank Baum – O mágico de Oz; o escocês James

Barrie – Peter Pan; entre outros, são representantes expressivos da literatura infantil

e estão presentes até hoje por meio de outras esferas, tais como a cinematográfica

e a teatral.

A criança está imersa na fantasia e, no seu processo de crescimento, o que

mais desenvolve é a habilidade de contar histórias mirabolantes. Tais narrativas

estão, de certa forma, vinculadas aos contos e fábulas que ouvem, ou que leem. A

esse respeito, Paiva (2008, p. 40) afirma:

Todos nós sabemos que contos e fábulas estão na base de uma literatura voltada para a criança, e, por essa razão, podemos justificar o seu predomínio, ainda hoje, como temática preferencial, com narrativas que procura sempre assegurar a vitória do bem e a derrota do mal... Embora essa perspectiva tenha se alterado, em especial a partir do século XIX, a fantasia veiculada ainda se impõe como uma tradição a ser preservada.

Se na prosa essa é uma tradição, os poemas que serão analisados neste

trabalho mostram as escolhas das autoras em aproximar, pela poesia, as crianças

de temas do cotidiano, alguns polêmicos, outros políticos. Dessa forma, a literatura,

aqui representada pela poesia infantil, vai buscando caminhos que aproximem as

crianças de um fazer artístico que interage com a realidade na qual estão inseridas;

dessa maneira, sentidos diversos podem aflorar a partir de um trabalho consciente

realizado pelo professor na escola.

A seguir, procurou-se apresentar um pequeno panorama da literatura infantil

no Brasil, fundamental para discussões sobre literatura na escola.

Page 18: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

18

1.2 Literatura Infantil no Brasil

Lajolo e Zilberman (2007) indicam que foi a partir da implantação da Imprensa

Régia, em 1808, que a atividade editorial começou a se preocupar com a produção

de livros para crianças. Os textos lidos anteriormente estavam diretamente

relacionados a atividades puramente didáticas e moralizantes. Dessa maneira

surgem

[...] a tradução de As aventuras pasmosas do Barão de Munkausen e, em 1818, a coletânea de José Saturnino da Costa Pereira, Leitura para meninos, contendo uma coleção de histórias morais relativas aos defeitos ordinários às idades tenras, e um diálogo sobre Geografia, cronologia, História de Portugal e História Natural. Mas essas publicações eram esporádicas (a obra que se seguiu a elas só surgiu em 1848, outra edição das Aventuras do Barão de Münchhausen, agora com a chancela da Laemmert) e, portanto, insuficientes para caracterizar uma produção literária brasileira regular para a infância (LAJOLO; ZILBERMAN, 2007, p. 21, grifos nossos).

Lajolo e Zilberman (2007, p. 30) ainda afirmam que Figueiredo Pimentel,

como ficou conhecido Alberto Figueiredo Pimentel foi um dos precursores das

traduções de contos infantis, cronista do jornal Gazeta de Notícias, o tradutor

inaugurou a coleção Biblioteca Infantil Quaresma com o seu Contos da carochinha.

Fez circular, ainda, histórias de Perrault, Grimm e Andersen. Outro autor que se

dedicou à tradução de histórias foi Carlos Jansen, que traduziu e adaptou para a

Editora Laemmert, entre outros, Contos seletos das mil e uma noites (1882),

Robinson Crusoé (1885) e As aventuras do celebérrimo Barão de Münchhausen

(1891).

O primeiro registro da literatura genuinamente brasileira surgiu pelas mãos de

Monteiro Lobato, em 1920, com a obra A menina do narizinho arrebitado.

Cademartori (1987) afirma que Lobato não gostava das traduções europeias

por ser nacionalista, por isso, passou a produzir narrativas com características

brasileiras, procurando registrar os costumes do campo e as lendas folclóricas do

Brasil. Segundo o autor, o trabalho mais conhecido de Lobato é O sítio do PicaPau

Amarelo, que destaca as características da vida rural e da cultura brasileira

(CADEMARTORI,1987, p. 45). Criou suas histórias de forma bem particular e sua

Page 19: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

19

literatura infantil passou a se constituir padrão de texto literário para crianças. Assim,

como indica Cademartori (1987, p. 51), Lobato:

Apresenta uma interpretação da realidade nacional nos seus aspectos social, político, econômico, cultural, mas deixa, sempre, espaço para a interlocução com o destinatário. A discordância é prevista.

Lobato também preocupou-se com adaptações de contos de Perrault, dos

Irmãos Grimm, de Andersen e de outros autores tradicionais. No entanto, suas obras

de autoria ganharam muito mais destaque no Brasil, entre as quais tem-se: A

menina do narizinho arrebitado; Reinações de Narizinho; Fábulas de Narizinho;

Emília no País da Gramática; Memórias de Emília; Jeca Tatuzinho; além de outras.

Ao enfatizar questões da cultura brasileira, pode-se dizer que a literatura infantil

voltou-se para temas que despertavam uma relação entre a ficção e a realidade,

suscitando diferentes sensibilidades, como diz Lajolo (2008, p. 106-107):

É a literatura, como linguagem e como instituição, que confiamos diferentes imaginários, as diferentes sensibilidades, valores e comportamentos através dos quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses, seus desejos, suas utopias. Por isso a literatura é importante no currículo escolar: o cidadão, para exercer plenamente sua cidadania, precisa apossar-se da linguagem literária, alfabetizar-se nela, tornar-se seu usuário competente, mesmo que nunca vá escrever um livro: mas porque precisa ler muitos.

Oportunizou-se, desta maneira, um envolvimento das crianças com contextos

em que tinham mais afinidade, ampliando suas possibilidades de produção de

sentidos a partir do momento que reorganizam tais histórias, enriquecendo, assim,

experiências, linguagem e pensamento.

A literatura infantil ocupa espaços vazios da criança, como explicita Zilberman

(2003, p. 45): “[...] preenche de modo particular, porque, ao contrário da Pedagogia

ou dos ensinamentos escolares, ela lida com dois elementos adequados para a

conquista da compreensão do real”.

Ao preencher tais espaços vazios da criança – história e linguagem –, lida

com aspectos que são especiais para a compreensão do real. A criança não sabe, a

priori, estabelecer relações com os textos, não percebe a forma com que lida com a

Page 20: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

20

linguagem e será pela leitura e discussões/reflexões sobre essa que, por meio da

própria fantasia infantil, é construído o desenvolvimento da história lida e contada.

Pode-se, com isso, apresentar algumas características da literatura infantil na

prosa para, posteriormente, observá-las na poesia. Assim, nos contos maravilhosos,

conforme aponta Coelho (2005, p. 159-161), encontramos:

Onipresença da metamorfose – personagens podem ser encantados por um

ente maléfico;

Uso de talismãs – objetos mágicos;

Destino certo – tudo parece determinado a acontecer;

Reiteração numérica – presença constante, principalmente dos números três

e sete;

Magia e divindade – a magia se confunde com a própria ação divina;

Valores ideológicos com certa predominância dos humanistas, nos quais há

uma preocupação constante com a sobrevivência.

Já nas fábulas, Coelho (2005, p. 146-149) aponta para:

A presença do animal, colocando-o em uma situação humana e exemplar;

Personagens que são sempre símbolos, representando algo do contexto

universal;

O efeito de moral, esse que exprime nos textos uma luta entre o bem e o mal,

caracterizando os personagens enquanto espera de uma sanção positiva ou

recompensa;

A estrutura modal, em que há certa violência ou ofensa, levando o sujeito ao

desejo da reflexão de suas ações.

E como ficaria a poesia infantil nesse contexto? É o que se discute a seguir.

Page 21: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

21

1.3 Poesia na Literatura Infantil

A poesia desempenha um papel importante no desenvolvimento da criança,

sendo uma forma aprimorada da linguagem, com características próprias.

[...] o poema é um texto marcado por recursos sonoros e rítmicos. Geralmente o poema permite outras leituras, além da linear, pois sua organização sugere ao leitor a associação de palavras ou expressões posicionadas estrategicamente no texto. A poesia está presente no poema, assim como em outras obras de arte, que, como o poema, convidam o leitor/expectador/ouvinte a retornar à obra mais de uma vez desvendando as pistas que ela apresenta para a interpretação de seus sentidos (GOLDSTEIN, 2006, p. 22).

A autora reforça também a importância que a leitura da poesia infantil tem

para que a criança venha a se tornar criadora e crítica, destacando que “[...] ler

poesia é um modo de ser: ser criança, ser criativo, ser aberto às sugestões do

poema e às associais dos elementos que o compõem [...]” (GOLDSTEIN, 2006, p.

7).

Em todas as suas manifestações, a poesia apresenta características que

atuam sobre os sentimentos por meio de sua estrutura particular, disposta em

versos ou não. O fazer poético está presente em diferentes manifestações, tais

como: cantigas folclóricas ou de roda, parlendas, adivinhas ou trava-línguas. É em

um contexto de lúdico, de jogo, que as crianças se aproximam de forma espontânea

dos versos, por isso, é fundamental o trabalho com poesia na escola, a fim de

intensificar suas possiblidades educativas, bem como aproximar as crianças do

gênero, para que se perceba a multiplicidade de leituras que essa pode oferecer a

partir das relações dialógicas que realiza com a criança e com o mundo em que

essa se encontra.

Para realizar um trabalho adequado com a poesia na escola, importa ter um

ponto de partida: poesia é arte, assim como aponta Martha (2013, p. 139):

A poesia, como arte deve ser entendida além da simples recriação do real, já que transporta conhecimento de mundo, formando e modificando modos de ver e perceber esse real. [...] as duas principais causas do aparecimento da poesia estão intrinsecamente relacionadas à natureza humana: a tendência à imitação e o gosto pela harmonia e pelo ritmo.

Page 22: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

22

Nesse aspecto, o autor parte de sua própria natureza sensível e manifesta

suas emoções por meio da palavra, construindo representações a partir do seu

conhecimento de mundo, materializando sua poesia na forma de poema.

Otávio Paz (1993, p. 15), poeta mexicano, apresenta seu modo de olhar

poesia, ao dizer que:

A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. [...] Expressão histórica de raças, nações, classes. Nega a história: em seu anseio resolvem-se todos os conflitos objetivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não-dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior, linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras.

Pela ponderação de Paz, é possível perceber que o poeta não traça um

caminho objetivo para desenvolver o poema, vai, durante o processo, procurando a

imagem que possa seduzir, acentuar ou chocar de forma autêntica, por meio de uma

representação simbólica que faça sentido para o trabalho com poesia.

Dito isso, é possível afirmar que a poesia desenvolve e enriquece as

experiências das crianças, orientando-as na apreciação da arte, do belo,

despertando emoções a partir das relações estabelecidas com a poesia. A criança

que ouve e escreve poesia sente-se estimulada a criar e a manifestar,

espontaneamente, suas emoções e sentimentos, um processo de aprendizagem

auxiliará no desenvolvimento de sua sensibilidade e no gosto pelo fazer poético.

É importante lembrar o que foi apontado por Oliani e Neitzel (2010, p. 32),

para quem “a poesia traz como característica marcante sua função estética,

enquanto o texto não literário sua função utilitária: informar, convencer, explicar,

responder etc.”, o que permite observar o mundo a partir de outro prisma,

procurando construir percepções diferentes que vão além da objetividade. O texto

literário, principalmente o poético, refere-se ao mundo possível, não podendo ser

Page 23: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

23

submetido à noção de verdadeiro ou falso, já que o autor utiliza as palavras para

criar um mundo paralelo ao real.

As múltiplas possibilidades de leitura se tornam reais, pois o texto literário é

criado, observando-se, entre outras coisas, as figuras de expressão, tais como as

metáforas e as metonímias, que teriam a tarefa de proporcionar outras leituras do

mundo, diante das possibilidades conotativas.

A história da literatura mostra que os poetas, em determinados períodos,

produziam seus poemas utilizando-se de regras rígidas, as quais impunham domínio

sobre determinadas técnicas. Atualmente, muitos poetas passaram a utilizar versos

livres que não estão circunscritos a uma métrica com divisão regular de estrofes.

Como aponta Costa (2009), os poemas com rimas, ritmo e versos regulares

continuaram sendo produzidos, mas outras possibilidades passaram a fazer parte do

repertório expressivo do fazer poético.

Dessa maneira, quando a escola trabalha com poesia, desenvolve uma

prática real de leitura voltada à formação de leitores mais críticos e criativos. A

poesia infantil é rica em construções simbólicas e está relacionada diretamente com

o imaginário da criança, fazendo com que essa mobilize mais do que a simples

decodificação de palavras, promovendo reais relações dialógicas, essas que são

construídas a partir do prazer pela leitura.

Conhecer o gênero poético, tanto em seu caráter estrutural, como em suas

potencialidades e contribuições para o ensino é fator preponderante para trabalhar

com estratégias que contribuam para o desenvolvimento integral da criança.

A seguir, apresenta-se, de forma breve, um contexto das duas escritoras,

cujos poemas escolhidos serão analisados nesta dissertação.

1.4 Ruth Rocha e Tatiana Belinky na poesia infantil

1.4.1 Ruth Rocha: Um Fenômeno Editorial

Page 24: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

24

Ruth Rocha, autora de grande expressividade no cenário nacional, contou até

2013 com 184 obras publicadas, de acordo com Daibello (2013). Nasceu em São

Paulo, no dia 2 de março de 1931. Filha dos cariocas Álvaro de Faria Machado e

Esther de Sampaio Machado. Viveu sua infância repleta de livros e histórias em

quadrinhos. Brasileira, especializada em livros infantis, foi eleita para a cadeira

número 38 da Academia Paulista de Letras. Em 1965 começou a escrever artigos

educacionais para a revista Cláudia e, em 1967, assumiu a orientação pedagógica

da revista Recreio, onde publicou seu primeiro conto, intitulado Romeu e Julieta, em

1969. Formou-se na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1953, e

trabalhou como orientadora educacional no Colégio Rio Branco.

Depois de algum tempo, Rocha dedicou-se à produção literária; inspirada na

sua filha Marina, publicou seu primeiro livro, chamado Palavras muitas palavras, em

1976 e, desde então, a maioria de seus livros foram traduzidos para 25 idiomas.

Seu livro Marcelo, marmelo, martelo vendeu mais de um milhão de

exemplares. Já publicou mais de 130 livros, ao todo vendendo mais de dez milhões

de exemplares.

A própria autora afirmou a influência de Monteiro Lobato em sua obra

(ROCHA, 2004). Iniciou a carreira de escritora em 1976, trabalhando, também, com

conteúdo rico em questões sociais, como por exemplo, o livro Uma história de rabos

presos, lançado no Congresso Nacional brasileiro, em 1989. Em 1990, lançou na

sede das Organizações das Nações Unidas o livro Declaração Universal dos Direitos

Humanos Para Crianças.

Daibello (2013) informa, ainda, que a autora foi condecorada em 1998 pelo,

então presidente, Fernando Henrique Cardoso, com a Comenda da Ordem do

Ministério da Cultura. Ganhou quatro prêmios Jabuti, considerado de grande valor

para quem atua no ramo literário brasileiro, com destaque para o livro Escrever e

criar, lançado em 2002. Ruth Rocha foi escolhida para compor o Pen Club –

Associação Mundial dos Escritores, localizada no Rio de Janeiro.

Page 25: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

25

A autora sempre teve como objetivo expressar ideias, sentimentos e emoções,

dialogando com o leitor, provocando a reflexão sobre questões pessoais e do

mundo, por meio de histórias e poemas que envolvem o cotidiano, fazendo da leitura

uma atividade prazerosa.

1.4.2 Tatiana Belinky: da Rússia Para o Brasil

Tatiana Belinky nasceu na Rússia, em 1919, e viveu no Brasil desde os seus

dez anos de idade. Aqui se casou, teve filhos e netos. Escreveu para teatro e

televisão, além de ter traduzido e escrito inúmeros livros, muitos dos quais

publicados pela editora Paulinas. Além de outros reconhecimentos, recebeu vários

prêmios: em 2008 foi agraciada com a Ordem do Mérito Cultural, pelo Ministério da

Educação e, em 2010, foi eleita membro da Academia Paulista de Letras. Faleceu

aos 94 anos, em São Paulo, no dia 15 de junho de 2013.

Iniciou sua vida literária em 1948, com o apoio de seu marido, Júlio Gouveia.

Seus primeiros projetos literários eram pequenas peças de teatro e textos traduzidos

para crianças, realizados em conjunto com a Secretaria de Cultura da Prefeitura de

São Paulo.

Martins (2011) assinala que a crítica considerou Tatiana Belinky uma das

escritoras de livros infanto-juvenis mais conhecidas no Brasil. Segundo a teórica,

Belinky viveu rodeada de livros. Estudou Filosofia na Universidade Presbiteriana

Mackenzie por um motivo bem prático: trabalhava em um frigorífico de norte-

americanos que ficava próximo à faculdade, no Largo de São Bento. No curso

Superior, conheceu o crítico de teatro Clóvis Garcia que, mais tarde, escreveria

sobre teatro infantil, analisando obras de Tatiana. Garcia assistiu, no Teatro

Municipal, em 1948, à primeira adaptação de Tatiana: Peter Pan, do escocês

Matthew Barrie, com direção de Júlio Gouveia, tecendo crítica positiva do texto

escrito pela colega.

Entre 1951 e 1964, o grupo de teatro coordenado por Tatiana Belinky e Júlio

Gouveia começou a realizar espetáculos de teleteatro ao vivo pela TV Tupi. Os

Page 26: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

26

roteiros, adaptados da literatura nacional e internacional, eram produzidos pela

autora. Assim, surgiria também a adaptação de O Sítio do Picapau Amarelo, obra de

Monteiro Lobato, com cerca de 350 capítulos.

Belinky também escreveu críticas literárias para diversos jornais ao longo da

vida, como O Estado de São Paulo, Folha de S.Paulo e Jornal da Tarde; trabalhou

em diversos programas da TV Cultura.

Em sua biografia, “flui a maior de suas habilidades” – a de contadora de

histórias, propagada por diversos gêneros, entre os quais a poesia.

Roveri (2007, p. 23-24) registra como a escritora se apresentava:

Vim ao mundo no dia 18 de março de 1919, em plena Guerra Civil. A Revolução Russa havia eclodido em 1917, dois anos antes. Quando eu tinha pouco mais de um ano, derrotados pela crise econômica, meus pais voltaram para a Letônia, um pequeno país do Mar Báltico e que era a terra natal deles. Rosa era o nome da minha mãe. Ela se formou em Odontologia na Estônia, em 1914. Ela era comunista dentista. Pouco antes de meu nascimento, meu pai estava estudando Psicologia em um liceu de São Petersburgo. Meu pai era quase três anos mais novo que minha mãe. Ela se formou e ele não teve tempo de concluir o curso por causa da Guerra. Estávamos no início do século XX e meu pai já estudava Psicologia. Meu pai se chamava Aron, um nome bíblico, o irmão de Moisés. O sobrenome Belinky, em russo, quer dizer branquinho. Eles eram prafrentex, meus pais.

Da sua produção poética, destaca-se Um caldeirão de poemas, de 2003.

Tatiana também lançou um livro de poesias e limeriques, livro que possui 63

poemas, quadrinhas, canções, cantigas, acalantos, rimas, odes e versinhos que

abordam aventuras, trabalho, amor e saudade. A autora sempre disse que não se

considerava poeta: “não sou poeta, sou uma traça-rimas”, como declarou em Um

caldeirão de poemas (BELINKY, 2007).

Escreveu mais de 250 obras de literatura infanto-juvenil durante toda a sua

carreira, tendo recebido importantes prêmios nacionais e internacionais, como o

prêmio Jabuti (1989).

Os quatro poemas aqui selecionados para análise podem proporcionar uma

experiência de leitura diferenciada, desde que trabalhados adequadamente pelo

Page 27: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

27

docente. Esse pode valer-se da riqueza temática de cada texto para aprofundar

conteúdos e, mais do que isso, a sensibilidade, aguçar a imaginação e liberar a

emotividade.

Page 28: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

28

CAPÍTULO 2 - A LEITURA DE POESIA NA ESCOLA

Na escola, os alunos se deparam com uma diversidade de gêneros textuais e

práticas culturais os quais, muitas vezes, não fazem parte do contexto social em que

estavam inseridos. Cabe à escola ampliar o universo de tais alunos, a partir das

relações dialógicas que trazem de casa com os conhecimentos que a escola precisa

lhes transmitir, a fim de torná-los aptos para o exercício de sua cidadania.

Assim, instrumentalizar os educandos torna-se fundamental para o exercício

dessa condição, pois esses serão capazes de construir novas possibilidades de

acesso e de envolvimento nas diversas situações sociais que constroem a vida

cotidiana, mais especificamente a letrada, em que passaram a vivenciar tanto em

sua caminhada pela escolarização, quanto em suas práticas sociais e profissionais.

Rocha (2004) pondera que, no ambiente letrado, deve-se respeitar o leitor em

suas capacidades linguísticas, relações interpessoais e éticas. Para isso, torna-se

fundamental a utilização de gêneros diversificados na escola, pois as crianças, com

o tempo, descobriram o sistema da escrita para, posteriormente, passar a refletir

sobre esse e, consequentemente, construir os conhecimentos de que precisam para

ler e escrever. Nesse sentido, a autora assina-la que: “O processo de leitura

possibilita essa operação maravilhosa que é o encontro do que está dentro do livro

com o que está guardado na nossa cabeça” (ROCHA, 2004, p. 6).

Um trabalho consciente de leitura deve privilegiar que o conhecimento prévio

do leitor seja ativado, para que, na sinalização de alguma nova questão a ser

desenvolvida na escola, esse possa confrontar a evidência do novo saber com o que

já possui, fortalecendo o processo de produção de sentidos. Não é diferente com a

leitura de poesia, pois é a partir das relações dialógicas que o texto poético realiza

com a criança o que essa buscará em seu caminho para a análise e a interpretação

do que lerá.

Page 29: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

29

A leitura, como é consenso, traz benefícios inquestionáveis ao ser humano.

Para Soares (2000, p. 19): “Ela é uma forma de lazer e de prazer, de aquisição de

conhecimentos e de enriquecimento cultural, de ampliação das condições de

convívio social e de interação”. Ler com compreensão é uma condição fundamental

para se vencer obstáculos na vida. Ler poesia, no entanto, não é uma tarefa fácil,

pois como diz Micheletti (2004, p. 15):

“A leitura de um texto literário envolve operações complexas que vão do

entendimento da camada superficial até as camadas mais profundas e, portanto,

menos claras. Menos imediatas”.

O entendimento das operações complexas precisa ser compreendido, alerta a

autora, pois somente com o apoio de determinadas teorias, pode-se estabelecer

elementos e/ou categorias que permitam compreender melhor as relações que se

estabelecem no texto poético.

Observando-se questões de estilística, Micheletti (2004, p. 21) aponta que há

relações de ordem interna e externa que precisam ser observadas a partir da

expressidade decorrente da materialidade escolhida pelo autor para a expressão de

determinado tema. Como o conceito de expressividade ainda não é preciso,

recorresse-se a Micheletti (2004, p. 21) para estabelecer tal sentido e que servirá

como base para o presente trabalho:

Entende-se por expressividade um traço sintático, morfológico, prosódico que permita a interação emotiva entre o produtor do discurso e o receptor desse discurso. Ou seja, num poema, a mediação estabelecida por ele entre o leitor e o escritor.

Nessa premissa, a autora apresenta os estratos, a partir dos quais o analista

deve se preocupar em sua análise: “O material gramatical é focalizado em seus

aspectos sonoros, lexicais e frasais, cujas abordagens recebem diferentes nomes,

conforme as perspectivas dos estudiosos” (MICHELETTI, 2004, p. 22).

Assim, a autora aponta para as camadas, especificando-as da seguinte

forma:

Page 30: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

30

Camada sonora: baseia-se nas aliterações, assonâncias e rimas, que

associadas ao significado das palavras são utilizadas para provocar

sensações nos leitores;

Camada da palavra: observa-se desde o léxico, a formação da palavra,

processos derivativos de diversas ordens; além de se observar o uso de

determinadas classes de palavras, bem como seus valores semânticos

ligados às suas referências e figurativização empregada pela natureza

polissêmica da linguagem;

Camada frasal: destacam-se as possibilidades de construção que podem

surgir devido às diversas possibilidades e combinações variadas na estrutura

frasal. Por exemplo, estrofes que sejam formadas por período simples podem

sugerir um ritmo mais ágil e apressado do enunciador.

O ensino de leitura, ou mesmo de produção de poesia deve garantir esses

conhecimentos, a fim de que o aluno possa depreender melhor os sentidos que o

poeta desejou imprimir em seus versos.

Não cabe a este trabalho discutir o conceito de leitura, mas é preciso partir de

um para dar suporte às leituras que são aplicadas aos poemas escolhidos para tal.

Não se pode ficar em um conceito redutor, como simplesmente o de decodificar

sinais gráficos. Ler é atribuir sentidos, uma atividade dialógica, que se instaura por

meio de um processo de interação realizado entre o autor e o leitor, mediado pelo

texto, com todos os elementos da superfície linguística, envolvidos e situados em um

determinado contexto cultural.

Kleiman (2004) acentua que ler é uma atividade complexa, como já foi dito,

por utilizar muitos processos cognitivos. Para construir sentido de um texto, o leitor

busca as relações dialógicas possíveis que pode engendrar. A leitura é um processo

ativo e dinâmico: “o texto tem um potencial de evocar significado, mas não tem

significado em si mesmo” (MOOR et al., 2001, p. 160). É somente pela interação –

essa que se dá mediante a leitura do texto – que se manifesta o discurso, no qual se

Page 31: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

31

constroem sentidos. Dessa maneira, texto e leitor são duas entidades físicas

necessárias para a construção de sentido, pois ambos estão inseridos em um

contexto ideologicamente constituído, que determina a linguagem e o sentido que

essa comunicação promove, conforme lembra Dib (2001).

Assim, pode-se dizer que ler é ultrapassar a ação de decodificação e de

apropriação de determinado significado. Ao realizar sua leitura, o leitor recria e

reconstrói suas ideias.

Sobre a leitura, Soares (2000, p. 18) estabelece uma síntese que clarifica

como se pensa sobre essa de uma forma geral:

Leitura não é esse ato solitário; é interação verbal entre indivíduos, e indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e os outros.

Assim, pode-se destacar que a leitura é um processo dinâmico e social,

resultado de uma informação pré-existente, a que está presente na materialidade

linguística, que entra em interação com o conhecimento prévio do leitor e que

possibilita a construção dos sentidos do texto.

Em seguida, discorrer-se-á sobre como a poesia se constitui enquanto gênero

discursivo e como o docente deve observá-la para que seu trabalho seja mais

coerente, eficiente e eficaz.

2.1 Poesia Na Escola

Gebara (2012) afirma que ao se mencionar poesia, observa-se que essa é

tratada como algo de prestígio e respeito, no entanto e na prática, segundo essa

autora, “o ler e o dizer poesia” não seguiram na mesma direção e quase não têm

lugar na educação para crianças. Duas hipóteses são levantadas por Gebara (2012,

p. 7):

Page 32: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

32

I Fala-se bem devido à aura que a poesia possui, pois já nos textos sagrados

havia exclusiva produção de poesia, a qual com “sonoridade e ritmos

particularmente elaborados”;

II Volta-se para o processo de leitura em si, pois para ler poesia é necessário lê-

la, acostumar-se com sua forma e conteúdo, a fim de captar seus valores

expressivos, como ritmo, musicaliade, entre outras características.

A autora assegura que a poesia:

[...] promove uma ampliação dos modos de ler. A simples decodificação pode ser superada, ganhando novos contornos com a leitura de poemas, pois durante esses eventos não há simplesmente a inserção da criança num mundo criado pelo texto, mas também um perambular pelos próprios processos linguísticos que o constituem (GEBARA, 2012, p. 14).

Com o tempo e o exercíco da leitura, a criança vai aprendendo os estratos

que envolvem o gênero. Assim, vai observando de início a métrica, os acentos, a

contagem silábica, o ritmo e as rimas muito valorizadas até o início do século XX.

Cabe lembrar que o modernismo provocou algumas rupturas, entre as quais o verso

livre, como pode ser observado no poema Convite, de José Paulo Paes:

Convite

Poesia é brincar com palavras como se brinca com bola, papagaio, pião.

Só que bola, papagaio e pião de tanto brincar se gastam.

As palavras não: quanto mais se brinca com elas mais novas ficam.

Como a água do rio que é água sempre nova.

Como cada dia que é sempre um novo dia. Vamos brincar de poesia? (fonte: Poemas para brincar).

Page 33: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

33

O seguinte poema, de Ruth Rocha e Otávio Roth, possui um discurso mais

lúdico para atender à esfera da literatura infanto-juvenil, marcado por uma lista

poética:

Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz

Passarinho na janela, Pijama de flanela, Brigadeiro na panela.

Gato andando no telhado,

Cheirinho de mato molhado, Disco antigo sem chiado.

Pão quentinho de manhã, Dropes de hortelã, O grito do Tarzan.

Tirar sorte no osso, Jogar pedrinha no poço, Um cachecol no pescoço.

Papagaio que conversa, Pisar em tapete persa, Eu te amo e vice-versa.

Vaga-lume aceso na mão, Dias quentes de verão, Descer pelo corrimão.

Almoço de domingo, Revoada de flamingo, Herói que fuma cachimbo.

Anãozinho no jardim, Lacinho de cetim, Terminar o livro assim.

Os autores empregam ponto final a cada três versos, frases curtas, obtendo

um ritmo rápido para representar uma espécie de brincadeira para crianças que, ao

associar-se ao conteúdo lúdico, acentua o efeito se sentido.

Uma manifestação literária pode trabalhar com todos os estratos necessários

que possam encantar, estimular a reflexão, ampliar o vocabulário e solidificar o

gosto pela leitura.

Uma vez que se tratou dessas questões, passar-se-á à discussão do poema

no trabalho didático.

Page 34: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

34

2.2 Poema e Trabalho Didático

Levar o poema para a sala de aula promove um processo de expressão

verbal muito importante. Kleiman (2000) diz que, quanto à compreensão e à

interpretação, o professor deve trabalhar com o aluno no sentido de que esse

construa o significado do texto gradativamente, demonstrando que as palavras,

frases e orações interagem com a vida cotidiana. Para tanto, o trabalho de leitura

deve estar em consonância com o contexto sócio-histórico-cultural do qual o

estudante faz parte.

É importante lembrar que o texto poético desdobra-se em várias leituras e,

dessa forma, precisa ser lido de diferentes maneiras. A poesia, como dito, possui

sonoridade que deve ser explorada, pois por si já encanta, dando margem ao

desenvolvimento de habilidades nos campos cognitivo e emocional. É um gênero

que, pode-se dizer, humaniza, faz rir e chorar. A métrica da poesia permite a criação

de uma sonoridade particular e torna possível memorizar o texto com mais

facilidade.

Os poemas infantis são elaborados, geralmente, com estrofes e versos curtos

para que a criança possa olhar para a imagem textual e se sentir atraída pela leitura.

Ao usar o poema para o trabalho didático, o professor não pode deixar de

valorizar o verdadeiro sentido da literatura, que é proporcionar ao leitor o prazer

estético e o gosto pela leitura.

As orientações curriculares para o Ensino Médio retomam o trabalho que

deveria ser desenvolvido já no Ensino Fundamental, ou seja:

A exploração dos efeitos de sentido produzidos pelos recursos fonológicos, sintáticos, semânticos, na leitura e na releitura de poemas poderá abrir aos leitores caminhos para novas investidas poéticas, para muito além desse universo limitado – temporal e espacialmente – de formação (BRASIL, 2006, p. 74).

Page 35: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

35

O que se propõe para o trabalho com a poesia é o rompimento com a

exigência de se enquadrar a prática da leitura em atividades puramente mecânicas,

descontextualizadas e limitadas no tempo, uma vez que se pode oferecer ao aluno a

oportunidade de descobrir o sentido, por meio da apreensão de diferentes níveis e

camadas do poema – lexical, sonoro, sintático –, em diversas e diferentes leituras

desse. É lógico que tal atividade requer do professor dedicação de tempo, para que

possa compreender uma outra lógica de percepção, prevendo que lecionar poesia

não é simplesmente ensinar as técnicas de contar sílabas e classificar versos e

rimas (BRASIL, 2006, p. 78). É preciso chegar aos níveis que extrapolam a

materialidade linguística e que constituem o poema, partindo-se para as questões

que estejam implícitas nesse.

O poema infantil é um gênero discursivo com linguagem que ativa o

imaginário em todas as dimensões, como bem pontuou Jolibert (1994, p. 8). Para

esse autor, antes de tudo, deve-se observar o belo para despertar emoção. Os

poemas devem ser construídos observando-se certas características que encantem

as crianças e, por isso, necessitam ser melodiosos, lúdicos, com movimentos

cadenciados das palavras, com versos livres ou não, com ou sem rimas.

É um gênero especialmente adequado para estimular a criatividade infantil,

promover a beleza estética, o lúdico, o prazer pela leitura e pela escrita, passos

importantes para considerar na formação do público leitor.

A princípio, trabalhar com a poesia exigirá do professor uma leitura bem

executada dessa, pois isso contribuirá no processo de compreensão ao trabalhar

com seus alunos. Ao ler para os quais, essa deve ser expressiva, imprimindo

musicalidade à poesia, que recitada, poderá exprimir exatamente o que os versos

dizem: descrições, lirismo, emoções, medo, cólera, dúvida, alegria etc.

Dessa maneira, escolher bons poemas é uma atividade que deve ser bem

realizada pelo professor. Esse trabalho apresenta um caminho para possíveis

leituras que podem dar suporte para o exercício docente em sala de aula. No

entanto, não se pode esquecer que trabalhar com poesia significa aguçar a

Page 36: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

36

criatividade. É certo que cada leitor que fizer as leituras dos poemas aqui

apresentados poderá dar sentidos diferentes do que foi proposto na análise, mas é

justamente esse aspecto das possibilidades múltiplas de leitura que faz da

interpretação poética um trabalho rico e necessário.

Para o leitor infantil a linguagem simples, bem cuidada e agradável torna o

texto mais claro e intenso. Para discutir algumas categorias de análise para os

poemas escolhidos, é fundamental observar certas noções que estão diretamente

ligadas ao desenvolvimento de poemas.

2.3 Alguns Estratos da Linguagem de Que Se Ocupa a Estilística

Os quatro poemas que compõem o corpus desta pesquisa foram escolhidos

com o objetivo de explorar as possibilidades de abordagem estilística, a fim de

contribuir para uma reflexão sobre as práticas de leitura. Tratam-se de textos que

apresentam temática infantil, sempre utilizada na perspectiva de mudar um

determinado comportamento.

A poesia das autoras enfatiza os recursos da musicalidade, de modo que é

importante compreender alguns aspectos fonológicos, destacando o uso das

assonâncias, aliterações, rimas, palavras e frases. Outra característica importante é

o uso de algumas classes de palavras significativas nos poemas, assim como

determinados aspectos da sintaxe, procurando destacar detalhes semânticos que

possibilitem a expressividade.

Figuras de linguagem, como a antítese, a metáfora, o hipérbato, a anáfora e

outras serão apontadas, observando a ação dessas no contexto dos versos.

Esses elementos fazem parte do escopo da Estilística, disciplina preocupada

com o estudo do estilo. A princípio, o termo estilo designava um instrumento

pontiagudo, usado pelos antigos para escrever sobre tábuas enceradas,

posteriormente designando a própria escrita.

Page 37: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

37

Estilo, conforme Buffon (2011, p. 48),

[...] apenas a ordem e o movimento que se instaura nos seus pensamentos. Se eles forem encadeados de modo apropriado, se forem ajustados, o estilo torna-se robusto, nervoso e conciso; se eles se sucederem de forma lenta e se juntarem apenas por meio das palavras, por elegantes que sejam, o estilo será difuso, desligado e moroso.

Para esse autor estilo se manifesta de maneira mais ou menos intensa e

consciente, mas está sempre associado à identidade de alguém.

Para Câmara Jr. (2004, p. 180) o estilo está presente em todas as

manifestações linguísticas, literárias ou não:

[...] o estilo aparece em qualquer manifestação linguística e chegamos até à conclusão de que entender a estilística como apenas referente à língua literária é restringir indevidamente, e mesmo falsamente, os seus objetivos; mas vimos também que na língua literária é que a estilística encontra um campo mais amplo, porque considera textos que valem principalmente pelo estilo e foram feitos por pessoas que se especializaram em obter efeitos estilísticos.

Nesse contexto, a Estilística, como disciplina crítica, estuda o conteúdo dos

elementos que constituem o estilo, partindo do pressuposto de que forma e

conteúdo não podem ser desvinculados e, assim, considera a obra do ponto de vista

global. A linguagem, tema e processo criador se fundem para constituir o objeto da

investigação literária.

[...] a parte do estudo da linguagem que se opõe à gramática, a qual trata da língua representativa. O papel da estilística é depreender todos os processos linguísticos que permitem a atuação da manifestação psíquica e do apelo dentro da linguagem intelectiva (CÂMARA JR, 2004, p. 137).

A Estilística moderna se consolidou a partir do trabalho de Karl Vossler (apud

YLLERA, 1979), que adotou o termo criado por Charles Bally (1865-1947). Vossler

(apud YLLERA, 1979, p. 22) entende a Estilística como

[...] uma Ciência autônoma que procura explicar e interpretar a natureza da intuição artística, descobrir o princípio e a unidade da obra. Visto que a obra se constitui sobre a dualidade da criação – atividade produtiva – e da aceitação – atividade receptiva –, o método de análise buscar-se-á na consideração de ambos os aspectos, o sistema e o individual.

Ao observar os recursos expressivos dos textos, Georges Mounin (apud

MARTINS, 2011, p. 3) afirma que o estilo:

Page 38: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

38

É um fenômeno humano de grande complexidade. É a resultante linguística de uma conjunção de fatores múltiplos [...]. Se algum dia se chegar a atribuir ao estilo uma fórmula, há de ser uma fórmula extremamente complexa. Todas as reduções lapidares da definição do estilo só podem ser e permanecer como empobrecimentos unilaterais.

O enunciador sempre deixa marcas de seu estilo naquilo que produz. O leitor

poderá perceber seu estilo por meio das escolhas linguísticas que o primeiro faz,

pelas quais mostrará suas preferências e intenções.

Adentrar-se-á em algumas peculiaridades que se constituem como categorias

de análise.

2.4 Estilística do Som

Denominada, também, como Fonoestilística, a Estilística do som é uma

disciplina que trata dos valores expressivos de natureza sonora encontrados nas

palavras e nos enunciados. Os fonemas e prosodemas3 constituem a sonoridade

nas funções emotiva e poética da linguagem.

De acordo com Martins (2008), a matéria fônica desempenha uma função

expressiva na articulação dos fonemas, por meio das suas qualidades de timbre,

altura, duração e intensidade. As impressões e ideias, sensações de agrado ou

desagrado são advindas dos sons da língua. Dessa maneira, o enunciador revela

seu estado emocional e traços de sua personalidade. Essas impressões oferecidas

pela matéria fônica são interpretadas pelos ouvintes de maneira diversa.

Quando a fonologia expressiva ainda estava por ser iniciada, considerando o

avanço da linguística, Bally (apud MARTINS, 2008, p. 101) ponderava que:

Não há dúvida de que na matéria fônica se escondem possibilidades expressivas. Deve-se entender como tal tudo que produza sensações musculares e acústicas: sons articulados e suas combinações, jogos de timbres vocálicos, melodia, intensidade, duração dos sons, repetição,

3 Para Hjelmslev (apud F. NETTO; PERES, 2009, p.11) o texto pode ser fracionado em unidades

cada vez menores, chegando-se ao segmento há os constituintes prosódicos, pois esses são caracterizadores do texto, mas não o constituem. Tais elementos são chamados por Troubetzkoy (1964) de prosodemas, divididos em modulações – ao longo do sintagma – e acento – no interior da palavra.

Page 39: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

39

assonância e aliterações, silêncio etc. Na linguagem, estas impressões fônicas permanecem em estado latente enquanto o significado e o matiz afetivo das palavras em que figuram sejam indiferentes mas opostos a esses valores, mas brotam quando há concordância. Assim, junto à fonologia propriamente dita há lugar para uma fonologia expressiva, que pode trazer muita luz à primeira analisando o que nos diz o instinto: que há uma correspondência entre os sentimentos e os efeitos sensoriais produzidos pela linguagem.

Na mesma linha de pensamento de Bally, Maurice Grammont e Henri Morier

(apud MARTINS, 2008, p. 56) ressaltam que os fonemas apresentam potencial

expressivo, de acordo com a natureza de sua articulação, que são percebidas à

correspondência de significação das palavras ou frase:

A expressividade de um elemento sonoro ou articulatório, provém de um encontro feliz. Um ou outro dos caracteres constitutivos do fonetismo da palavra considerada deve ser a imagem de um ou outro aspecto do significado. É o sentido que serve de filtro, recusando os valores fonéticos em relação com os elementos do significado e exaltando os valores concordes.

Ao citar Grammont, Martins (2008) diz que esse explica a correlação som-

ideia abstrata pela faculdade de nosso cérebro de associar, comparar, classificar

ideias, colocando, em um mesmo grupo, conceitos intelectuais e impressões

fornecidas pelos sentidos, de modo que as ideias mais abstratas são associadas às

graves, ligeiras, negras, luminosas, largas, profundas; pensamentos doces,

amargos; coração leve, tristeza pesada. A comparação é inteligível graças a uma

série de associações. Dessa maneira, uma impressão intelectual é traduzida por

uma impressão sensorial.

A linguagem comum fornece elementos para traduzir impressões audíveis por

meio de impressões dadas por outros sentidos: distingue sons claros, graves,

agudos, duros. Dessa maneira, a autora afirma que as vogais, por exemplo, são

ditas claras, agudas, graves, escuras, brilhantes; já as consoantes são secas, duras,

doces, moles. Assim, uma vogal escura poderá traduzir uma ideia escura e uma

vogal grave uma ideia grave. O que podemos dizer é que se trata de uma hipótese,

de um pensamento engenhoso a respeito de algo que não se pode comprovar com

objetividade.

Page 40: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

40

Com a finalidade de observar marcas expressivas que estão na superfície do

texto, registraremos algumas categorias para análise.

2.5 Categorias para a Análise dos Poemas

Serão elencadas algumas categorias para as análises que serão realizadas

no capítulo três.

Procurou-se separar as categorias de análise em níveis, como sugerem

Cortez e Rodrigues (2009, p. 89):

três níveis de análise poderão ser considerados: o fônico (rima, ritmo, fonemas dominantes, aliterações, alternâncias, repetições, pontuação etc.), o morfossintático (tipos de frases, ligações sintáticas, categorias das palavras, como verbos, substantivos, adjetivos, entre outras) e o nível semântico compreendido pela conotação, denotação, ambiguidade, polissemia, redundância e figuras de estilo. Essas fases complementam-se com a redação de um texto em que se ressaltará claramente a ligação entre cada uma das etapas da análise feita.

A partir dessas considerações, apresentar-se-ão tais níveis, bem como

algumas categorias a serem retomadas nas análises dos quatro poemas que fazem

parte do corpus do presente trabalho.

2.5.1 Nível Fônico: Algumas Particularidades

Conforme afirmado, o nível fônico compreende aspectos ligados aos

fonemas, à métrica, à rima, ao ritmo, às aliterações, às assonâncias etc.

2.5.1.1 Expressividade das Vogais

A Fonoestílistca, ou Estilística do som, trata dos valores expressivos de

natureza sonora observáveis nos vocábulos e nos enunciados. Martins (2008) afirma

que fonemas e prosodemas – acento, entonação, ritmo – constituem um complexo

sonoro muito importante para as funções emotiva e poética. Isso quer dizer que,

como acentua essa autora, a matéria fônica se reveste de uma carga expressiva que

se efetiva na materialidade devido aos diversos fonemas, os quais se articulam de

Page 41: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

41

diferentes formas e com qualidades específicas de timbre, altura, duração e

intensidade.

Retomando rapidamente, as vogais se classificam de acordo com alguns

princípios, a saber:

Quanto à zona de articulação – local na boca em que são articuladas –, as

vogais pode ser: mediais – língua abaixada, quase em repouso, por exemplo:

páscoa; anteriores, em que a língua vai em direção ao palato duro, próximo

aos dentes, por exemplo: pele, pelado; posteriores, quando a língua se dirige

ao palato mole, por exemplo: lodo, loja;

Quanto ao papel da cavidade bucal, podem ser nasais – quando a corrente de

ar sai simultaneamente pela boca e fossas nasais, por exemplo: fantástico; e

orais – corrente de ar que sai pela boca, por exemplo: pata;

Quanto à intensidade, podem ser tônicas ou átonas. A vogal estará na sílaba

tônica, ou em outra chamada de átona, por exemplo: café, café;

Quanto ao timbre, está relacionada ao som aberto, tal como em porta;

fechado, como em porto – lugar onde os navios ficam atracados); e reduzida,

presente nas sílabas átonas, como em fabuloso – com som de u.

Os sons da língua podem provocar sensações específicas, tais como agrado,

desagrado, estados de espírito, ou traços de personalidade. Não se pode deixar de

salientar que essas impressões oferecidas pela matéria fônica podem variar de

acordo com a recepção do interlocutor. Assim, as vogais, por exemplo e como

aponta Martins (2008):

Vogais orais – [a] – fonema mais sonoro, livre, nítido e reforça a impressão

auditiva das consoantes que acompanha. Tal som pode ter um sentido que sugira a

transferência de ideia de claridade, brancura, alegria.

Vejamos a primeira estrofe do poema Natal de Madalena, especificamente

como Ruth Rocha aproveita o potencial dessa vogal:

Page 42: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

42

Quero que vocês conheçam Esta menina morena De olhos muito bonitos Que se chama Madalena... (grifos nossos).

Pode-se destacar na estrofe acima a vogal [a] nesse jogo de sonoridade.

As vogais da série anterior são próprias para exprimir sons agudos,

estridentes, ajustando-se seu valor ao significado de palavras como grito, apito, riso;

o estreitamento do conduto bucal na produção do [i] e [o] é bem aproveitado em

“menina morena”.

A vogal [ê] é mais neutra, discreta, não oferecendo expressividade marcante:

“menina”, “Madalena”.

A série posterior tem a possibilidade de imitar sons profundos, cheios, graves,

ruídos surdos, além de sugerir ideias de fechamento, redondeza, escuridão.

A motivação do significado pela sequência dos vocábulos com vogais

posteriores cabe na seguinte estrofe:

Festinha de aniversário, Com bolas, com bolo e bala Com velinhas pra apagar E os grandes... fora da sala![/] (grifos nossos).

Os versos acima dão ideia de redondeza, enfatizando pela recorrência do

fonema vocálico.

As vogais nasais já apresentam uma corrente de ar que encontra o véu

palatino abaixado e sai principalmente pelas fossas nasais. Torna as vogais aptas a

exprimir sons velados, prolongados.

Quando é Domingo de Páscoa Madalena e o irmãozinho Esperam muito contentes, A chegada do coelhinho...[/] (grifos nossos).

Quanto à intensidade: átonas são aquelas pronunciadas com intensidade

mínima: /a/, /e/, /i/, /o/, /u/, em sílabas átonas:

Page 43: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

43

Um é ligeiro Outro é mais lento Um é branquelo Outro sardento [/] (grifos nossos).

4

Tônicas são aquelas pronunciadas com intensidade máxima: /a/, /e/, /i/, /o/,

/u/, em sílabas tônicas: “branquelo”, “sardento”.

2.5.1.2 Expressividade das Consoantes

Igual as vogais, as consoantes são classificadas conforme o seguinte quadro:

Papel das cavidades bucal e nasal

Orais

Nasais

Modo de articulação Oclusivas

Constritivas

Oclusivas

Fricativas

Laterais

Vibrantes

Papel das cordas vocais Surdas Sonoras Surdas Sonoras Sonoras Sonoras Sonoras

Ponto ou zona de

articulação

Bilabiais /p/ /b/

/m/

Labiodentais

/f/ /v/

Linguodentais /t/ /d/

/n/

Alveolares

/s/ /z/ /l/ /r/

Palatais

/∫/ /Ʒ/ /ג/

/ŋ/

Velares /k/ /g/

/R/

Quadro 1 – Consoantes Fonte: <http://www.mestrando.com/2012/08/classificacao-dos-fonemas-vogais.html>.

Conforme aponta Martins (2008), as consoantes oclusivas, pelo seu traço

explosivo, momentâneo, prestam-se a reproduzir ruídos duros, secos, de batidas,

pancadas, passos pesados. As surdas [p], [t], [k], representam uma força maior que

as sonoras [b], [d], [gu]. Várias palavras iniciadas por consoante oclusiva bilabial são

empregadas como interjeições, exprimindo uma explosão de surpresa, espanto,

raiva, indignação.

4 Do poema Diversidade, de Tatiana Belinky (2007).

Page 44: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

44

Já as constritivas, pelo caráter contínuo, sugerem sons de certa duração.

As labiodentais [f] e [v] imitam sopros, podendo ter valor expressivo em

vocábulos como voz, vento, fala, fofoca.

Vamos, venhamos Isto é um fato: Tudo igualzinho Ai, como é chato

4

Os sons sibilantes podem ser imitados também pelas labiodentais, mas o são,

sobretudo, pelas alveolares [s] e [z]: sibilo, assovio, silvo, suspiro.

Cabelo crespo Cabelo liso Dente de leite Dente de siso

O deslizar, o fluir, o rolar, podem exprimir-se pelas constritivas laterais [l], [lh]

e pelas vibrantes [R] e [r].

Olho redondo Olho puxado Nariz pontudo Ou arrebitado.

No poema infantil Natal de Madalena, Ruth Rocha joga com poucas palavras

em que, além do colorido movimento das vogais, repetem-se as consoantes [l] e [B],

essas associadas a outras consoantes, cujo valor expressivo também é significativo.

Festinha de aniversário, Com bolas, com bolo e bala. Com velinhas pra apagar E os grandes...fora da sala!

As consoantes nasais [m], [n], [nh], ditas moles, doces se harmonizam com as

palavras e enunciados que prevalecem a ideia de suavidade, doçura, delicadeza,

como se vê em ameno, manso, mole, amor, meigo, ninho, sonho.

Quando é Domingo de Páscoa Madalena e o irmãozinho Esperam muito contentes, A chegada do coelhinho[/]...

A suavidade das consoantes nasais leva a uma doçura na estrofe.

Page 45: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

45

Procurou-se expor algumas das possibilidades expressivas dos fonemas, que

podem ser utilizadas visando à análise posterior.

Ainda no que se refere ao aspecto fônico, observar-se-á a aliteração, a

assonância e a onomatopeia.

2.5.1.3 Aliteração e Assonância

A aliteração é representada pela repetição do mesmo som consonantal; já a

repetição vocálica em sílabas tônicas é a assonância; mas a mesma vogal pode

aparecer não acentuada. Ocorre também aliteração entre a sílaba átona final de

uma palavra e a tônica inicial de outra.

Quero que vocês conheçam Esta menina morena Dos olhos muito bonitos Que se chama Madalena

[...]

Festinha de aniversário, Com bolas, com bolo e bala Com velinhas pra apagar E os grandes...fora da sala! (grifos nossos).

5

Martins (2008) aponta para dois outros recursos ligados à estrutura do

poema, o homeoteleuto e a rima.

A repetição de sons ao final das palavras é designada por nomes diversos,

um dos quais é homeoteleuto, que é o aparecimento de uma terminação igual em

palavras próximas, sem obedecer a um sistema regular, ocorrendo ocasionalmente

em uma frase e em um verso. O efeito estilístico é o de realçar a correlação entre as

palavras.

A rima é a coincidência de sons, geralmente ao final das palavras e que se dá

ao final dos versos. Podem ser pobres ou ricas – formadas pelas mesmas classes

de palavras e por classes diferentes, respectivamente –, quanto à disposição na

5 Do poema Natal de Madalena, de Ruth Rocha.

Page 46: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

46

estrofe, as mais comuns são chamadas de paralelas, cruzadas, opostas e

encadeadas.

Os chamados versos regulares são aqueles que possuem o mesmo número

de sílabas, como no seguinte exemplo:

É o /d i/a/ do/ pre/sé/pio, 1 2 3 4 5 6 É a /fes/ta/ da /cri/an/ça 1 2 3 4 5 6 É o /di/a em /que /re/nas/ce 1 2 3 4 5 6 A a/mi/za/de e a es/pe/ran/ça (grifos nossos). 1 2 3 4 5 6

Abaixo um exemplo de rima interna:

Mas durante todo o ano, É a mesma festa afinal! Pois cada criança que nasce É novamente Natal (grifos nossos).

5

À medida que não há regularidade, os versos serão chamados de livres,

como indica Goldstein (2006). Essa autora afirma que historicamente tal verso foi

criado no modernismo e que não segue nenhum tipo de esquema rítmico

preestabelecido, tal qual se vê no seguinte exemplo:

O homem, bicho da terra tão pequeno chateia-se na Terra. Lugar de muita miséria e pouca diversão. Faz-se um foguete, uma cápsula, um módulo. Toca na Lua, Pisa na Lua, Planta bandeirola na Lua, Experimenta a Lua, Civiliza a Lua, Coloniza a Lua, Humaniza a Lua. Lua humanizada: igual à Terra! O homem chateia-se na Lua. Vamos para Marte! Ordena as máquinas (grifos nossos).

6

Outro recurso que pode ser explorado no trabalho com a poesia é a métrica.

6 Do poema O homem, as viagens, de Carlos Drummond de Andrade.

Page 47: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

47

2.5.1.4 Métrica

Goldstein (2006) aponta que a métrica está diretamente ligada ao número de

sílabas que há no verso, lembrando-se de que a sílaba poética pode ser diferente da

gramatical em sua divisão. Na escanção, ou seja, na divisão do verso em sílabas

poéticas, deve-se observar que duas vogais – final e inicial – apresentam elisão e

assim formam uma só sílaba; o ditongo crescente é contado como uma só sílaba e

tal contagem vai até a última sílaba tônica do verso.

De/ pe/le /cla/ra 1 2 3 4 De /pe/le es/cu/ra 1 2 3 4 Um,/ fa/la /bran/da 1 2 3 4 O/ ou/tro, /du/ra

4

1 2 3 4

Quanto ao número de sílabas, os versos variam em diversos tipos – podem

apresentar de uma a doze.

De pele clara De pele escura Um, fala branda O outro, dura (grifos nossos).

Quanto à classificação do verso e o número de sílabas, temos:

Monossílabos – versos com uma sílaba;

Dissílabos – versos com duas sílabas;

Trissílabos – versos constituídos com três sílabas;

Tetrassílabos – versos constituídos com quatro sílabas;

Pentassílabos – versos com uma estrutura de cinco sílabas, chamados

também de redondilhas menores;

Hexassílabos – versos estruturados em seis sílabas;

Heptassílabos – versos constituídos com sete sílabas, chamados também de

redondilhas maiores;

Page 48: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

48

Octossílabos – versos constituídos com oito sílabas;

Decassílabos – versos estruturados em dez sílabas;

Hendecassílabos – versos com onze sílabas;

Dodecassílabos – versos constituídos com doze sílabas, chamados também

de alexandrinos;

Versos bárbaros – versos com mais de doze sílabas.

Além da divisão dos versos apresentada, as estrofes também se classificam

quanto a sua estrutura, a saber:

Monóstico – um único verso;

Dístico – dois versos;

Terceto – três versos;

Quadra – quatro versos;

Quintilha – cinco versos;

Sextilha – seis versos;

Septilha – sete versos;

Oitava – oito versos;

Nona – nove versos;

Décima – dez versos.

2.5.2 Nível Morfossintático

Cortez e Rodrigues (2009, p. 89) apontam que o nível morfossintático seria

constituído por “tipos de frases, ligações sintáticas, categorias das palavras, como

verbos, substantivos, adjetivos, entre outras”.

Page 49: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

49

Já Goldstein (2006) propõe um nível sintático, no qual alguns aspectos seriam

relevantes para a produção de sentidos no poema. Essa pesquisadora afirma que o

leitor poderá depreender sentidos a partir da pontuação, ou seja, dos tipos de

período do texto. Esses poderão ser mais curtos ou mais longos, marcados por

períodos simples ou compostos e que poderão, efetivamente, expressar sentidos

diferenciados. Goldstein apresenta ainda o paralelismo sintático com o qual o autor

poderá propor, por exemplo, a omissão de certos termos, com a finalidade de se

perceber quais sentidos poderia expressar por essa ausência. O autor poderia,

igualmente, valer-se de interrogações, reticências e inversões sintáticas, a fim de

construir caminhos diferentes para a interpretação. Seria essa articulação, segundo

a autora, a responsável pela composição do texto poético e pela articulação das

ideias. Dessa maneira, ao se observar o nível sintático, pretende-se analisar como

as palavras do texto se organizam em sintagmas, frases, orações e períodos.

Tendo em vista as duas proposições para este trabalho, observa-se a

constituição morfossintática, apresentando, neste momento, questões relativas à

morfologia e à sintaxe no mesmo tópico.

2.5.2.1 Expressão Construída Pela Palavra

O plano lexical está ligado diretamente às palavras que compõem o poema,

pois essas se revestem de valores expressivos, os quais podem ser analisados em

função das relações dialógicas que venham a estabelecer no contexto da obra.

Goldstein (2006, p. 88-91) apresenta considerações sobre as seguintes

classes de palavras:

Predominância de verbos de ação podem produzir o sentido de dinamicidade;

a ausência de verbos poderia indicar estaticidade, falta de movimento;

Substantivos concretos indicariam uma particularização, enquanto os

abstratos uma generalização;

Page 50: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

50

Adjetivos, locuções adjetivas e orações adjetivas são caracterizadores,

portanto, suas relações com os substantivos devem sempre ser exploradas

com a finalidade de se observar os valores expressivos que podem

representar no contexto do poema.

Pode-se depreender, ainda, que há substantivos que podem expressar

valores afetivos, utilizados para manifestar a subjetividade que está vinculada ao

poeta.

Já como caracterizadores, os adjetivos são responsáveis por valorar ou

depreciar determinado substantivo. A sua recorrência pode ser observada como

recurso utilizado pelo poeta para enfatizar determinada característica do substantivo

a que se refere, elevando-o a outro patamar de sentido. Azeredo (2010) indica que

certos adjetivos expressam conteúdos de existência objetiva, funcionando como

propriedades classificatórias, como seria o caso de peixe fluvial; já outros estariam

ligados às noções de referência variável ou decorrente de opinião, marcando, como

dito, a ideologia do autor, pois esses estariam diretamente ligados a aspectos

qualificadores ou depreciativos, por exemplo: olhos intensos. De certa forma, os

adjetivos relacionar-se-iam aos aspectos sensoriais, tais como: cor, qualidade,

beleza, tamanho, som, tato, ou às questões mais subjetivas, tais como: bondade,

maldade, pureza, generosidade, mesquinhez, timidez etc., podendo, dessa forma,

tornarem-se descritivos ou valorativos, ou seja, apenas descrevendo o substantivo

ao qual se refere, ou atribuindo um juízo de valor a esse.

Ao discorrer sobre o uso dos verbos, Goldstein (2006) indica que esses

poderão representar uma visão mais ativa ou mais estática da realidade. Seria mais

dinâmica e atuante, com verbos que indicam movimento, como correr, saltar etc.; ou

estática durativa, quando ligados aos verbos de estados: ser, estar, ficar; ou ainda a

uma estática reflexiva, quando apontam para uma ação interior: sentir, encantar,

sofrer, elevar etc.

Exemplificando, no poema de Tatiana Belinky um dos aspectos expressivos

mais utilizados é o de associação por adjetivos que permitem a comparação e

Page 51: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

51

produzem efeitos de sentido a partir de tal associação. A riqueza desse recurso

deriva da emoção e da subjetividade para construir a originalidade da intenção do

autor. Por exemplo:

Um é ligeiro Outro é mais lento Um é branquelo Outro sardento [/] (grifos nossos).

2.5.2.2 Expressividade Construída Pela Articulação Entre as Palavras

Em nível da relação entre as palavras que podem comportar os aspectos de

concordância, regência, organização dos períodos, orações, frases e pontuação,

conforme comentado, podem ser construídos certos efeitos de sentido em função

das relações que estabelecem entre si e com o mundo. Como apontam Cortez e

Rodrigues (2009), trata-se, por exemplo, do uso de exclamações que podem sugerir

a expressão de emotividade, pessimismo, ou outra sensação que o eu-lírico poderia

expressar. Frases curtas, como dito, refletem um ritmo mais acelerado, ou na poesia

infantil, uma forma de construir musicalidade para que os versos possam ser

memorizados com maior facilidade.

Outro aspecto que se observa na organização do verso é, às vezes, a

repetição de certas palavras que podem interferir no ritmo, ou ainda que venham

servir como elemento que reforça uma ideia, um tema. Por exemplo: “As aves que

aqui gorjeiam/ Não gorjeiam como lá” (grifos nossos).

2.5.3 Nível Semântico: para Além do Sentido Denotativo

Ao ser apresentado por Goldstein (2006), o nível semântico revela-se como

um dos mais importantes para a análise de poemas, pois por meio das relações

semânticas, poder-se-á observar os possíveis significados que as palavras em seus

lugares sintáticos podem exprimir. Nesse nível, estudam-se as figuras de linguagem

como estratégias que articulam a linguagem e constroem sentidos múltiplos.

Page 52: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

52

Observe-se, por exemplo, a comparação responsável pela aproximação de

dois termos mediante a locução conjuntiva como. Em “o príncipe é como aço”, a

comparação possibilitou perceber o substantivo aço, não com seu valor denotativo,

real, mas aqui esse adjetivo proporcionou a figuratização do substantivo, o qual

passou a representar força. Tal como o aço é forte, o príncipe também o é.

Há, também, a metáfora, que seria o emprego de uma palavra por outra,

desenvolvendo uma comparação indireta entre essas. Dessa maneira, pode-se

compreender a metáfora como a comparação abreviada, ou seja, da qual se retirou

a conjunção de comparação, tal como nos versos de Chico Buarque: “Sua boca é

um cadeado/ E meu corpo é uma fogueira” (grifos nossos).

As figuras são diversas, de modo que optou-se por indicar duas dessas para

a análise que se realizará nos quatro poemas propostos. Importante destacar que

tais figuras são utilizadas para romper com certas estruturas que, por sua vez, estão

articuladas pelas escolhas lexicais, sintáticas e semânticas que o autor estabeleceu

a partir da criação da obra. Não se pode ainda esquecer do aspecto mais

importante: buscar produzir sentidos no poema por meio da leitura e observando o

sentido global do texto.

2.5.3.1 Metáfora

A metáfora é uma figura de linguagem que representa uma comparação sem

estar explicitada na materialidade linguística. Seu valor expressivo pode ser

semelhante ao da comparação. O sentido base e o sentido ao qual se compara

passa por uma complexidade rica.

O sentido não se altera na estrofe do poema Diversidade:

Tudo é humano Bem diferente Assim, assado Todos são gente (grifo nosso).

Page 53: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

53

2.5.3.2 Antítese

É uma figura de construção e de pensamento. Procedimento literário e,

sobretudo, poético, com a ideia de planear os contrastes em construções com

expressões lógicas. Pretende-se com essa trabalhar aspectos ideológicos, cabendo

ao leitor a produção da significação, como se vê no caso exemplar do poema de

Cecília Meireles:

Motivo

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

Irmão das coisas fugidias;

não sinto gozo nem tormento.

Atravesso noites e dias

no vento.

Se desmorono ou edifico,

se permaneço ou me desfaço,

- não sei, não sei. Não sei se fico

ou se passo

Sei que canto. E a canção é tudo.

Tem sangue eterno a asa ritmada

E um dia sei que estarei mudo:

- Mais nada (grifos nossos).

Como se pode observar, há antíteses nos seguintes pares de adjetivos:

alegre/triste; gozo/tormento; noites/dias; desmorono/edifico; permaneço/desfaço;

fico/passo.

Em seguida, após as considerações desenvolvidas, passa-se para o capítulo

três, no qual se fará a análise dos poemas propostos.

Page 54: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

54

CAPÍTULO 3 - Análise do Corpus

Neste capítulo, analisar-se-ão os poemas que formam o corpus deste

trabalho, com a finalidade de perceber algumas nuances interpretativas, a partir das

categorias de análise que foram apontadas. Buscou-se observar o que marca a

literatura infantil nesses poemas, procurando perceber o lirismo e a expressividade

que esse gênero discursivo possibilita para o desenvolvimento de uma leitura mais

crítica e criativa.

Serão analisados, em primeiro lugar, os dois poemas de Ruth Rocha e, em

seguida, os dois de Tatiana Belinky. A ordem foi puramente de agrupamento do

trabalho das autoras, sem constituir, portanto, algum grau de maior importância ou

relevância entre as quatro obras.

3.1 Natal de Madalena – Ruth Rocha

O poema Natal de Madalena, de Ruth Rocha, está inserido na obra

Almanaque Ruth Rocha, publicado pela editora Ática, em 2004.

Figura 1 – Almanaque Ruth Rocha Fonte: <http://bibliolaura.blogspot.com.br/2011/05/almanaque-ruth-rocha.html>. Acesso em: 15 mar. 2015.

Page 55: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

55

Segue o poema:

Festas do ano inteirinho Natal de Madalena

Quero que vocês conheçam Esta menina morena Dos olhos muito bonitos Que se chama Madalena

Ela gosta de brincar De boneca e de casinha. Mas o de que ela mais gosta É de uma boa festinha.

Festinha de aniversário, Com bolas, com bolo e bala. Com velinhas pra apagar E os grandes... Fora da sala!

E festa do carnaval? Com confete e serpentina, Fantasia de palhaço, De havaiana e bailarina...

Quando é domingo de páscoa Madalena e o irmãozinho Esperam, muito contentes, A chegada do coelhinho...

Depois, no dia das mães, Madalena, sorridente, Diz um verso bem bonito Pra mamãe ficar contente.

Quando chega santo Antônio Tem festa lá na chacrinha. A Mada come pipoca Vestida de caipirinha.

São João também tem festa Com foguete e paçoquinha. O quintal todo enfeitado De lanterna e bandeirinha.

Chega o dia do papai. Madalena, de surpresa, Faz, ela mesma, um presente. Fica mesmo uma beleza!

Quando é sete de setembro O irmão da Mada, animado, Faz um chapéu de papel E marcha como soldado!

Page 56: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

56

Então chega a primavera Com sua porção de flores De todo jeito e tamanho E com todas as suas cores.

Durante o ano inteirinho Muitas festas vêm chegando. Mas tem uma, a mais bonita Que a Mada fica esperando...

Festa de Papai Noel Das árvores tão bonitas! É o dia da alegria, Dos presentes, das visitas...

É dia do presépio, É a festa da criança, É o dia em que renasce A amizade e a esperança.

Mas durante todo o ano, É a mesma festa, afinal! Pois cada criança que nasce É novamente natal!

O poema é composto de quinze estrofes, todas formadas por quatro versos,

denominadas quadras. A seguir, transcreve-se a primeira estrofe:

Que/ro /que/ vo/cês/ co/nhe/çam Es/ta /me/ni/na/ mo/re/na Do/s o/lhos/ mui/to/ bo/ni/tos Que/ se/ cha/ma/ Ma/da/le/na (grifos nossos).

Após a escanção dos versos, torna-se possível perceber que são formados

por sete sílabas poéticas, chamadas também de redondilha maior.

Observa-se ainda a alternância de sílabas fortes e fracas, assim como o ritmo

empregado pela autora, a fim de que o poema pudesse ser memorizado com maior

facilidade. Tal aspecto é reforçado pelos versos que são mais curtos, apesar de

formados por períodos compostos, como no exemplo do primeiro verso: “Que/ro

/que/ vo/cês/ co/nhe/çam” (grifo nosso), no qual temos uma oração principal e uma

subordinada substantiva objetiva direta.

Desde a primeira estrofe, a autora concebe a criança como uma pessoa ativa,

que conseguirá dar sentido às proposições apresentadas no poema, pois esse faz

parte do contexto em que a criança vive. A escola trabalha as festas do ano inteiro,

Page 57: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

57

aproveitando para realizar atividades que aproximem as crianças com o sentido de

cada uma das datas comemorativas. Dessa maneira, a autora traçou seu percurso

de produção do poema, a partir do conhecimento de mundo que as crianças têm de

cada festa, tanto do convívio social, quanto escolar.

Ao se ler o poema, percebe-se de imediato que a autora fez escolhas lexicais

que refletem os sentidos da alegria que as crianças sentem com as festas do ano

inteiro, aqui representadas pela menina Madalena, marcada pelos verbos no

presente do indicativo: gosta – primeiro verso, segunda estrofe –, frisado por uma

repetição no terceiro verso da primeira estrofe, que reforça a alegria de participar de

tais momentos.

Nesse poema, os recursos estilísticos e gramaticais utilizados demonstram o

mecanismo que torna expressivo o tema, cuja composição poética dá relevância aos

aspectos sonoros, por exemplo e como já dito, a presença: “esta menina morena...

Madalena”. Tais vogais, como observado por Martins (2008), traduzem uma

sonoridade que promove a sensação de candura, alegria.

Já de início, a autora procura expressar afetividade, ao apresentar

descritivamente a personagem Madalena, enunciado direto ao leitor, tornando-a

personagem comum ao seu convívio.

Quero que vocês conheçam esta menina morena dos olhos muito bonitos que se chama Madalena

Ao usar o verbo quero, a autora indica um estado emocional, demonstrando o

desejo em aproximar a personagem do leitor. É uma menina morena, de olhos

muitos bonitos, o que a torna uma personagem convidativa para se conhecer.

Retomando a segunda estrofe, tem-se:

Ela gosta de brincar de boneca e de casinha. mas o de que ela mais gosta É de uma boa festinha.

Page 58: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

58

Nesse momento, a escolha de diminutivos, tais como casinha e festinha,

aproxima ainda mais o texto do universo da criança.

O pronome pessoal do caso reto ela retoma a personagem e a coloca no

universo infantil ao afirmar que essa gosta de brincar. Não uma brincadeira

qualquer, gosta de brincar de boneca e de casinha, assim como de uma festinha. Os

diminutivos aqui grifados não produzem sentido de diminuição por desvalorização;

ao contrário, levam o leitor ao universo infantil de coisas que fazem parte do

cotidiano das crianças, percebendo o aspecto sensível que as palavras no

diminutivo trazem para o poema.

A autora usa a expressividade, explorando o nível morfossintático – diminutivo

– em várias partes do poema, procurando revelar certa ternura, como é possível

perceber por meio dos substantivos chacrinha, paçoquinha, inteirinho, entre outros.

De início, se fosse perguntado sobre qual seria o tema do poema,

possivelmente a primeira impressão remeteria a de que se travava de um poema

sobre o Natal. No entanto, é no desencadeamento da leitura que se percebe que a

referência ao Natal surgirá praticamente ao final do texto. No seu todo, deixando o

Natal para o final, o poema acaba por promover, a partir da sequência de festas

propostas, uma circularidade, como se depois da última estrofe, tudo começasse

novamente.

A autora explorou o contexto de vários momentos da realidade infantil,

procurando tratar de cada segmento, o que provoca uma intensa relação dialógica

com a imaginação e com o mundo real.

Madalena faz aniversário também, pois os próximos versos tratam justamente

disso:

Festinha de aniversário, Com bolas, com bolo e bala. Com velinhas pra apagar E os grandes... Fora da sala!

Page 59: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

59

Essa estrofe apresenta a mesma estrutura da anterior. Os versos são curtos,

mantendo o ritmo e, novamente, há predominância das vogais a, acabando por

oferecer ao poema a ideia de clareza, de continuidade, de alegria. O uso do

diminutivo acentua a aproximação com a afetividade da infância e fica marcado

pelos substantivos concretos festinha e velinhas. Faz uso de uma derivação

imprópria, quando substantiva o adjetivo grandes, aqui representando as pessoas

que não são crianças, para que entendam que a festa não para si, por isso o

sintagma fora da sala, usando um verbo no imperativo, solicitando que se retirem do

ambiente para dar mais espaço às crianças.

A todo momento a autora vai julgando positivamente a capacidade do leitor

em refletir sobre o tema, aproximando-o sempre de sua realidade. Na sequência,

uma nova festa é relembrada:

E festa do carnaval? Com confete e serpentina, Fantasia de palhaço, De havaiana e bailarina...

Para enfatizar a alegria, surge o carnaval como festa. Pode-se dizer que,

novamente, o uso da vogal a em diversas palavras é utilizado como recurso

expressivo para manter a clareza e a alegria das festas. Os substantivos confete e

serpentina podem não ser tão conhecidos como já foram, pois nas chamadas

matinês, realizadas para as crianças, o primeiro era levado para jogar nos foliões,

enquanto a segunda fazia alusão a uma espécie de corrente que ligaria as pessoas

na festa. Não faltavam as fantasias: as mais conhecidas e usadas são marcadas no

texto pelos substantivos palhaço, havaianas e bailarinas, todos destacando a alegria

que essas promoviam.

Outra festa se anuncia, no sentido mais popular e mercantilista que o

significado da Páscoa acabou tendo ao longo do tempo. Todo aspecto no nível

morfossintático se mantém, observe-se:

Quando é domingo de páscoa Madalena e o irmãozinho Esperam, muito contentes, A chegada do coelhinho...

Page 60: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

60

Apesar de a Páscoa ser uma festa cristã que marca a ressurreição de Cristo e

o seu sacrifício pela humanidade, levando-se em conta a metáfora do cordeiro que

está explicitada no livro do Êxodo, tal questão não é retomada nessa estrofe, que

apenas busca na figura do “coelho da Páscoa” o referencial para essa festa. Os

diminutivos continuam presentes, marcados pelas palavras irmãozinho e coelhinho,

novamente reforçando a questão do universo infantil. O dia da mamãe não poderia

ficar de fora nas festas do ano inteiro, por isso é lembrado pelo seguinte verso:

Depois, no dia das mães, Madalena, sorridente, Diz um verso bem bonito Pra mamãe ficar contente.

Madalena se mostra feliz, sentimento marcado pelo adjetivo sorridente. Há

nesse verso uma valoração da própria poesia, pois o presente que a personagem

oferece à sua mãe é “um verso bonito”. Além da marcação da beleza do verso pelo

adjetivo bonito, há uma confirmação da alegria da festa marcada por outro adjetivo,

contente, estado em que a mamãe, uso carinhoso para o substantivo concreto mãe,

passará a ter, após receber o verso que lhe foi dedicado. O verbo dizer no presente

do indicativo reforça a ideia de que é algo que acontece. Chegando à metade do

ano, há mais uma ocasião que marca o processo de vida e escolar da criança, as

chamadas “festas juninas”, aqui marcadas pelas seguintes estrofes:

Quando chega Santo Antônio Tem festa lá na chacrinha. A Mada come pipoca Vestida de caipirinha.

São João também tem festa Com foguete e paçoquinha. O quintal todo enfeitado De lanterna e bandeirinha

Nas estrofes acima algumas palavras que continuam marcando o universo

infantil foram utilizadas. Os diminutivos são recorrentes, expressos, nesse momento,

pelos substantivos chacrinha, caipirinha, paçoquinha e bandeirinha. Não se enuncia

festa junina, mas se usa a perífrase para fazer a relação dos dois santos

apresentados, Santo Antônio, São João e as festas que acontecem nessa época.

Há, na primeira estrofe da sequência apresentada, o uso da abreviação Mada. Tal

Page 61: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

61

recurso expressivo faz com que o leitor sinta-se mais próximo da personagem e

vivencie com essa seus momentos de festa durante o ano. Reforça-se a beleza da

festa marcada pelo adjetivo enfeitado, pois o lugar em que acontece se enche de

lanternas e de bandeirinhas. As frases continuam curtas e o ritmo se mantém,

conforme já explicitado, possibilitando que a criança memorize a composição da

facilidade. Assim como há o dia das mães, não poderia faltar o dia dos pais:

Chega o dia do papai. Madalena, de surpresa, Faz, ela mesma, um presente. Fica mesmo uma beleza!

Da mesma forma que no dia das mães, para o dia dos pais o substantivo pai

tem a silaba redobrada para se constituir em papai, reforçando o sentido do respeito,

do afeto e do aconchego. A estrofe não indica qual foi o presente que foi dado ao

papai, mas a sua importância é marcada pelo termo que reforça o pronome ela, ou

seja, mesma, valorando o que foi dado, pois constrói um sentido de importância a

partir do momento em que se dedicou tempo para preparar o presente do progenitor.

A questão é reforçada pelo substantivo abstrato surpresa, pois imprime uma relação

subjetiva da personagem que, sem o auxílio de outra pessoa, prepara o presente

que ficou, por sinal, muito bom, marcado pelo adjetivo abstrato beleza. A seguir, em

outra estrofe, a autora reforça a atitude cidadã:

Quando é sete de setembro O irmão da Mada, animado, Faz um chapéu de papel E marcha como soldado!

Não há alusão direta para a Independência do Brasil, mas essa está marcada

pelo dia pátrio sete de setembro. Exige-se que se faça uma relação dialógica que é

marcada pelo dia, com o conhecimento histórico que a criança deve possuir. Chapéu

e soldado são substantivos que reforçam a experiência da data. A ideia é reforçada

pelo verbo marcha, que leva também a outra relação dialógica com o substantivo

papel, ao lembrar a criança de uma canção comum da infância, Marcha soldado,

cabeça de papel. Há, ainda, uma comparação, pois o irmão de Mada é quem realiza

o ato de marchar. Observa-se no verso a preposição como, que estabelece relação

entre irmão e soldado.

Page 62: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

62

As festas vão surgindo em um contínuo, assim como o tempo vai passando

pelo poema. Chega uma nova estação que embeleza a vida cotidiana, a primavera:

Então chega a Primavera Com sua porção de flores De todo jeito e tamanho E com todas as suas cores.

Os versos se revestem de um colorido especial, pois ao lê-los, a criança pode

imaginar toda sorte de flores e cores. Um momento mágico que também aponta para

a diversidade e sua beleza, pois não importa o tamanho ou cor, todas as flores são

necessárias para a magnitude da primavera como um todo. Os quatro últimos versos

referem-se à festa que Madalena e, em geral, as crianças mais esperam:

Durante o ano inteirinho Muitas festas vêm chegando. Mas tem uma, a mais bonita Que a Mada fica esperando...

Festa de Papai Noel Das árvores tão bonitas! É o dia da alegria, Dos presentes, das visitas...

É dia do presépio, É a festa da criança, É o dia em que renasce A amizade e a esperança.

Mas durante todo o ano, É a mesma festa, afinal! Pois cada criança que nasce É novamente natal!

É a festa que Madalena mais gosta, pois é a que Mada “fica esperando”. Há

um misto de significações aqui, pois há o sentido comercial do Natal, marcado pela

árvore presentes, representados no poema pela figura de “Papai Noel”. No entanto,

há também a alusão à festa cristã do nascimento do Messias, marcada pelos

substantivos presépio, criança, esperança.

Ao dizer, no segundo verso da quarta estrofe, “É a mesma festa, afinal”, a

autora procura mostrar que o Natal pode existir durante o ano inteiro, sempre que

uma criança nasce, pois a nova vida representa a renovação da amizade e da

esperança. Importante destacar que o advérbio novamente propõe o sentido de que

Page 63: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

63

há uma recursividade, ou seja, as festas do ano todo aconteceram sempre e o último

verso acaba, de certa forma, propondo a releitura do poema, pois se estabelece uma

circularidade, uma vez que o ano começará novamente.

Os versos são leves, pertinentes ao poema infantil. A figura da personagem

representa as crianças com o sonho de renovação, a alegria por poderem participar

de tantas festas. Ou seja, há em todo o poema uma recorrência à satisfação das

festas, levando o leitor a mergulhar em doces lembranças de costumes que vivencia.

3.2 Os Direitos das Crianças – Ruth Rocha

Em 2014, a editora Salamandra publicou o livro intitulado Os direitos das

crianças, que faz parte do corpus escolhido para análise neste trabalho.

Figura 2 – Os direitos das crianças Fonte: <http://www.salamandra.com.br/main.jsp?lumPageId= 4028818B2F212E9B012F2C6BF30801C2&itemId=8A8A8A8244063757014407E4B4BD6265>. Acesso em: 15 mar. 2015.

Page 64: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

64

O seguinte poema conta com 21 estrofes de quatro versos cada uma:

Os direitos das crianças

Toda criança no mundo Deve ser bem protegida Contra os rigores do tempo Contra os rigores da vida

Criança tem que ter nome Criança tem que ter lar Ter saúde e não ter fome Ter segurança e estudar.

Não é questão de querer Nem questão de concordar Os diretos da criança Todos têm de respeitar.

Tem direito à atenção Direito de não ter medos Direito a livros e a pão Direito de ter brinquedos.

Mas criança também tem O direito de sorrir. Correr na beira do mar, Ter lápis de colorir...

Ver uma estrela cadente, Filme que tenha robô, Ganhar um lindo presente, Ouvir histórias do avô.

Descer do escorregador, Fazer bolha de sabão, Sorvete, se faz calor, Brincar de adivinhação.

Morango com chantilly, Ver mágico de cartola, O canto do bem-te-vi, Bola, bola, bola, bola!

Lamber o fundo da panela Ser tratada com afeição Ser alegre e tagarela Poder também dizer não!

Carrinhos, jogos, bonecas, Montar um jogo de armar, Amarelinha, petecas, E uma corda de pular.

Pão lambuzado de mel, Um passeio de canoa,

Page 65: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

65

Ficar um pouquinho à toa... Contar estrelas no céu...

Ficar lendo revistinha, Um amigo inteligente, Pipa na ponta da linha, Um bom dum cachorro quente.

Festejar o aniversário, Com bala, bolo e balão! Brincar com muitos amigos, Dar pulos no colchão.

Livros com muita figura, Fazer viagem de trem, Um pouquinho de aventura... Alguém para querer bem...

Festinha de São João, Com fogueira e com bombinha, Pé-de-moleque e rojão, Com quadrilha e bandeirinha.

Andar debaixo da chuva, Ouvir música e dançar. Ver carreira de saúva, Sentir o cheiro do mar.

Pisar descalça no barro, Comer frutas no pomar, Ver casa de joão-de-barro, Noite de muito luar.

Ter tempo pra fazer nada, Ter quem penteie os cabelos, Ficar um tempo calada... Falar pelos cotovelos.

E quando a noite chegar, Um bom banho, bem quentinha, Sensação de bem-estar... De preferência um celinho.

Uma caminha macia, Uma canção de ninar, Uma história bem bonita, Então, dormir e sonhar...

Embora eu não seja rei, Decreto, neste país, Que toda, toda criança Tem direito a ser feliz!!!

Assim como o Natal de Madalena, o poema, como pode ser observado na

seguinte escanção, possui também sete sílabas poéticas, ou seja, é um

Page 66: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

66

heptassílabo, ou redondilha maior. Neste poema as rimas são intercaladas e os

versos são regulares:

To/da /cri/an/ça /no /mun/do De/ve /ser/ bem /pro/te/gi/da Con/tra os/ ri/go/res /do /tem/po Con/tra os/ ri/go/res /da /vi/da (grifos nossos).

É possível perceber nessa e em outras estrofes uma estrutura paralelística,

construída para reforçar alguns aspectos. Nessa, em específico, observa-se a

manutenção no início dos dois últimos versos da expressão contra os rigores, como

se último verso pretendesse reforçar o aspecto do rigor sobre o tempo e sobre a

vida.

Do ponto de vista sintático, os versos curtos mantém um ritmo frequente,

para, como no poema anterior, facilitar uma melhor memorização por parte da

criança.

Do ponto de vista do conteúdo, o poema apresenta aspectos relevantes para

uma reflexão e questionamentos acerca dos direitos da criança e do adolescente,

sobre a infância, o combate ao trabalho infantil etc. Traz um tema muito importante

para a sensibilização das práticas sociais a favor do pleno desenvolvimento da

criança, observando seus aspectos sociais, afetivos e cognitivos.

Há uma intertextualidade com temas como princípios éticos, respeito, justiça,

solidariedade, amizade, paz e a própria tolerância, marcados por substantivos em

todo o poema, tais como: nome, lar, aniversário, saúde, segurança, atenção,

afeição, aventura, bem-estar, entre outros.

A autora convida a todos para discutir/refletir sobre o direito de viver com

dignidade e que tenham plenas condições de passarem pela vida adulta com suas

necessidades básicas atendidas.

O poema aponta para as necessidades vitais, como alimentação, amparo,

lazer e educação, de modo que já na primeira estrofe diz:

Page 67: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

67

Toda criança no mundo Deve ser bem protegida Contra os rigores do tempo Contra os rigores da vida

Ao escolher o pronome indefinido toda, a autora já fez a opção pela totalidade

e estabeleceu o lugar em que essa totalidade de crianças vive por meio da locução

adverbial no mundo, não deixando nenhuma de fora. O verbo dever institui uma

norma, pois a criança deve ser protegida, como diz o poema, contra os rigores do

tempo e da vida. Além disso, a criança deve ser um sujeito instaurado no seu tempo

e espaço:

Criança tem que ter nome Criança tem que ter lar Ter saúde e não ter fome Ter segurança e estudar.

De acordo com essa estrofe, tem de ter nome e lar. A repetição do termo

criança nos dois primeiros versos e o verbo ter nos dois últimos mantém a estrutura

paralelística que trabalha, neste caso, como marcadores de reforço. Há uma elipse

do substantivo criança nos dois últimos versos, acentuando a importância, pela

presença do infinitivo ter, o rigor que se deve dar ao atendimento das necessidades

infantis. Há apenas uma negação na terceira estrofe, a fim de fortalecer o sentido da

necessidade de serem alimentadas – não ter fome –, condição inalienável para a

vida, principalmente em seus primeiros anos, ou seja, após o nascimento.

Assim, os versos vão salientando os direitos fundamentais da criança, como o

direito à vida, à alimentação, à saúde, à moradia e outros, assegurados para essas

por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei n.º 8.069, de 13 de

julho de 1990, que visa regulamentar modos de viver a infância, dando ênfase ao

fato de que o direito à felicidade e à construção de uma vida digna devem ser

preservados sempre. O poema, ainda, estabelece uma intertextualidade com outros

textos equivalentes, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, por exemplo, é

um dos quais.

Para reforçar questões da infância, brincadeiras, essas articuladas com

alimentação, há as seguintes acentuações:

Page 68: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

68

Descer no escorregador, Fazer bolha de sabão, Sorvete, se faz calor, Brincar de adivinhação.

Morango com chantilly, Ver mágico de cartola, O canto do bem-te-vi, Bola, bola, bola, bola!

Os versos acima estão ligados diretamente ao direito de brincar, ou seja, em

contraposição ao uso abusivo de crianças que trabalham em lugares completamente

inviáveis. No último verso, a repetição do substantivo bola imprime um ritmo que

pode ser comparado a uma partida de futebol, nesse caso, a autora usa a metonímia

como recurso expressivo.

Como no primeiro poema, há o uso do diminutivo para marcar o universo

infantil, aqui as palavras amarelinha, pouquinho, festinha, bobininha e bandeirinha

reforçam tal ideia.

O poema inteiro é construído em torno do tema direitos, de modo que a

poesia termina com a seguinte estrofe:

Embora eu não seja rei, Decreto, neste país, Que toda, toda criança Tem direito a ser feliz!!!

Essa enfatiza a condição de legislação, marcada pelo verbo decreto, que é,

em seguida, enfatizado pela expressão tem direito. O valor que se dá a esses

direitos está representado pelo substantivo rei, quem decreta que a palavra é lei.

Dessa maneira e por decreto, toda criança deveria ser feliz, tal expressão traduziria

o sentido da própria lei à qual o poema se dirige de forma intertextual.

Page 69: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

69

3.3 Diversidade – Tatiana Belinky

O poema foi publicado em forma de livro, pela primeira vez em 1999.

Figura 3 – Diversidade Fonte: <https://plus.google.com/photos/100794385556 116506601/albums/5310904255569568961?banner=pwa>. Acesso em: 15 mar. 2015.

Diversidade é um poema voltado para o público infanto-juvenil, que desenvolve tema

muito recorrente nos dias atuais, retomando a importância do respeito às diferenças,

convidando o leitor a acentuar seu olhar em relação às pessoas com quem convive em seu

contexto, seja na família, na rua ou na escola. Reflete sobre a importância de cada um

possuir características próprias, enfatizando a proposta da autora de que seria muito chato

se todo mundo fosse igual. Com mensagem profunda e atual, segue o poema em sua

integra:

Diversidade

Um é feioso, Outro é bonito Um é certinho Outro, esquisito.

Um é magrelo, Outro é gordinho Um é castanho Outro é ruivinho.

Page 70: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

70

Um é tranquilo, outro é nervoso Um é birrento Outro dengoso

Um é ligeiro Outro é mais lento Um é branquelo Outro sardento.

Um é preguiçoso, Outro, animado Um é falante Outro é calado.

Um é molenga Outro forçudo Um é gaiato Outro é sisudo.

Um é moroso, outro esperto Um é fechado Outro é aberto.

Um carrancudo Outro, tristonho, Um divertido Outro, enfadonho.

Um é enfezado, Outro é pacato Um é briguento Outro é cordato.

De pele clara, De pele escura Um, fala branda O outro, dura.

Olho redondo, Olho puxado Nariz pontudo Ou arrebitado.

Cabelo crespo, Cabelo liso Dente de leite Dente de siso.

Um é menino, Outro é menina (pode ser grande Ou pequenina)

Page 71: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

71

Um é bem jovem Outro, de idade, Nada é defeito Nem qualidade.

Tudo é humano, Bem diferente Assim, assado Todos são gente.

Cada um na sua, E não faz mal Di-ver-si-da-de É que é legal.

Vamos, venhamos, isto é um fato: Tudo igualzinho Ai, como é chato!

O poema Di-ver-si-da-de contém dezessete estrofes de quatro versos cada.

Em seguida, a escanção do primeiro verso:

Um/ é /fei/o/so, Ou/tro é/ bo/ni/to Um/ é/ cer/ti/nho Ou/tro, es/qui/si/to (grifos nossos).

Há quatro sílabas poéticas, portanto, é tetrassílabo em todos os versos. Como

será observado, possui uma estrutura paralelística que se mantém pela antítese,

bem como é constituído de versos curtos para possibilitar a memorização, conforme

os dois primeiros poemas. É construído em pares de adjetivos, marcados também

pela antítese, como pode-se observar em:

Um é magrelo, Outro é gordinho Um é castanho Outro é ruivinho (grifos nossos).

O par um e outro, outra antítese, encontra-se em várias estrofes do poema,

marcando a questão comparativa que a autora pretendeu explorar. Além de criarem

uma estrutura paralelística que facilita a leitura e a memorização, promove o efeito

de sentido de que existem pessoas e coisas diferentes, para posteriormente se

discutir como trata-las.

Page 72: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

72

É o efeito dessa construção de sentidos para a mensagem do poema, o qual

estabelece uma relação entre a construção dos versos e o próprio título, diversidade.

Os versos são livres e não há uma sequência de rimas, às vezes essas são

retomadas, outras vezes não.

Os substantivos, ou classe que esteja no lugar desses – pronomes – e o

adjetivo de referência reforçam a ideia da diversidade e provocam a discussão de

saber conviver com tais diferenças.

O texto é composto de rimas, com efeito sonoro agradável, chamando a

atenção do leitor para as questões sociais do cotidiano, com o objetivo de atingir a

sensibilidade desse com relação às diferenças pessoais, comportamentais e de

níveis sociais.

As características físicas abordadas tentam enaltecer as qualidades de cada

um, a personalidade para o respeito às diferenças, assim como desfazer os padrões

de beleza, atualmente vigentes. Observe a seguinte estrofe:

Um é feioso,

Outro é bonito

Um é certinho

Outro, esquisito.

A oposição construída pelos adjetivos feioso e bonito, certinho e esquisito,

apontam para certa discriminação muito conhecida socialmente, ou seja, as crianças

já sofrem tal preconceito que, muitas vezes, é traduzido em discriminação na própria

escola. Além disso, o diminutivo certinho marca, também, uma escolha lexical que

está em oposição às crianças que seriam esquisitas, acentuando uma maneira de

ser que seria a privilegiada socialmente.

Ao longo de todo o poema os pares de adjetivos vão trabalhando com a

diversidade, mostrando as diferenças existentes, como é o caso de magros e gordos

– o primeiro empregado em uma forma de uso pejorativo magrelo e o outro no

diminutivo gordinho, não como um modo carinhoso, mas provocando uma espécie

Page 73: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

73

de eufemismo semântico, pois a pessoa é magra ou gorda. Observe essa questão

na seguinte estrofe:

Um é magrelo

Outro é gordinho

Um é castanho

Outro é ruivinho.

A repetição do artigo indefinido um marca, ainda, que não se refere a uma

única pessoa, mas todas que se enquadram nas características apontadas. Da

mesma sorte, o pronome indefinido outro marca o sujeito que recebe a predicação.

A próxima estrofe apresenta outra oposição que caracteriza as pessoas que são

discriminadas. Observe-se:

Um é ligeiro Outro é mais lento Um é branquelo Outro sardento

Em um mundo tecnológico e corrido, ser lento é ser colocado de lado, ainda

que se tenha capacidade, pois o mundo é do ligeiro, independentemente se houver

mais erros pela falta de reflexão, atividade mental que só o tempo proporciona.

Outro adjetivo pejorativo é o branquelo que, normalmente, é usado pelos negros

para discriminar os brancos. Há no par formado por essa antítese não o termo

negrinho, que estaria no campo da polarização, mas o adjetivo sardento, outra

marca que foge aos padrões de beleza da sociedade, mas que está presente,

devido à rima pobre que faz com lento. Há outra estrofe que também trata da

questão racial, no entanto, essa foi desenvolvida observando a antítese que se

conhece socialmente:

De pele clara, De pele escura Um, fala branda O outro, dura.

Os adjetivos que caracterizam o substantivo pele marcam a diferença racial

que não deveria ser discriminada: clara e escura. Houve, ainda, uma elisão da

palavra fala no último verso, o que poderia representar uma espécie de eufemismo

semântico do aspecto de reprovação da fala mais dura. O artigo indefinido um e o

Page 74: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

74

pronome indefinido outro continuam aparecendo, ambos marcando uma diversidade

de pessoas, ou seja, cada uma das características representa um coletivo e não

apenas um ser específico. Para mostrar a questão da discriminação do idoso, a

autora usou outro par de adjetivos:

Um é bem jovem Outro, de idade, Nada é defeito Nem qualidade.

O substantivo jovem faz par em oposição à locução de idade, dizendo-se que

ambos são importantes. Afirma-se que ser mais jovem ou mais velho não é

demérito e nem virtude, à medida que tanto pelo pronome indefinido nada, quanto

pela conjunção nem há a atribuição de valores iguais ao ser humano,

independentemente da idade.

As três últimas estrofes concluem o poema e reforçam o tema da não

discriminação:

Tudo é humano, Bem diferente Assim, assado Todos são gente.

Cada um na sua, E não faz mal Di-ver-si-da-de É que é legal.

Vamos, venhamos, isto é um fato: Tudo igualzinho Ai, como é chato!

O pronome indefinido tudo é neutro e faz referência, nesse caso, ao ser

humano, cabível aos dois gêneros, reforçando a ideia de distinção pelo próprio

adjetivo diferente, reforçado pelo advérbio intensificador bem. A expressão assim,

assado é um clichê para dizer não importa, pois todos são gente.

Na estrofe seguinte, outra expressão muito usada aparece para reforçar o

tema: cada um na sua, apontado para a necessidade de olhar-se e deixar o outro

viver com a sua diferença. O substantivo abstrato diversidade aparece na mesma

Page 75: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

75

estrofe, mas agora escrito com hifens separando as sílabas, provocando dois

efeitos de sentido: o primeiro marcando o ato do dizer com certa pausa, a fim de

que a palavra fique bem salientada, clara; o segundo para afirmar a unidade

temática do poema, a partir de uma ênfase gráfica.

No último verso a autora reforça a ideia da importância do ser diferente,

trazendo a reflexão de que é a diferença que torna o mundo um lugar melhor, pois

se tudo fosse igual, seria muito chato.

É importante salientar que os versos do poema mantêm uma relação formal

da métrica em quartetos, as rimas são interpoladas e cruzadas, fazendo sobressair o

valor rítmico do poema por meio das palavras carregadas de afetividade.

O uso dos adjetivos alongados, tais como branquelo, sardento, enfadonho,

falante, briguento, auxilia a estrutura da métrica, reforçando o ritmo. A autora teve a

preocupação de trabalhar com palavras antônimas para enfatizar aspectos das

diferenças.

É um poema que pode ser usado para a reflexão de temas importantes. Na

escola, partindo-se de questões referentes à inclusão, cada vez mais dá-se ênfase à

integração social e a sua real necessidade diante de um mundo que deva ser mais

plural. O trabalho com literatura que aborde tal pluralidade se torna um canal aberto

para a sensibilização sobre a necessidade de respeito ao próximo. Para a criança, o

tema é de grande importância, pois, historicamente, a escola tem dificuldades para

lidar com a diversidade. Ao invés de oportunidades para produzir saberes em

diferentes níveis de aprendizagem, as diferenças tornam-se problemas.

Nesse poema, a autora apresenta tais discussões, buscando quebrar tabus

sobre diversidade de forma geral. Trata com esmero o “diferente”, construindo

versos que promovem uma reflexão acerca do homem como indivíduo em meio a

um contexto sócio-histórico que precisa fomentar atitudes contra o preconceito,

valorizar a tolerância, dizer não à violência e formar cidadãos que se respeitem e

respeitem ao outro.

Page 76: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

76

O poema se apresenta de forma bem-humorada, principalmente pela

linguagem com recursos variados, esses que levam a atenção do leitor aos efeitos

de sentido produzidos pela leitura. A autora teve o devido cuidado para que sua

escrita tivesse um efeito lúdico, aspecto tão importante às crianças.

3.4 Ser Criança – Tatiana Belinky

Não há muita diferença em ser criança no Brasil ou na Rússia. Uma vida que

deveria envolver brincadeiras, tais como amarelinha, bola de gude, corda, brincar na

chuva etc. Para exprimir o que significa “ser criança” para Belinky, este poema foi

publicado pela editora Companhia das Letras no livro homônimo, em 2012. As

ilustrações foram elaboradas especialmente para esta publicação pela artista Leda

Catunda, obra que também é uma homenagem à alma de menina que Tatiana

Belinky sempre teve.

Figura 4 – Ser criança Fonte: <http://renatodasilvacoelho1978.files.wordpress. com/2013/11/ser-crianc3a7a-tatiana-belinky.jpg>. Acesso em: 14 abr. 2014.

Page 77: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

77

Belinky escreveu este poema no final de 2012, como um tributo à infância.

Como livro, porém, tornou-se uma homenagem à própria escritora, que nunca

deixou sua irreverência e simplicidade, ambas infantis, para trás. Vale ressaltar a

beleza nas obras de Tatiana Belinky com relação à literatura infantil, especialmente

em sua primeira publicação, intitulada Os limeriques7, assim como nos dois poemas

escolhidos como corpus desta dissertação.

Em seguida, apresentar-se-á o poema e sua análise:

Ser criança

Ser criança é dureza Todo mundo manda em mim Se pergunto o motivo, Me respondem “porque sim”!

Isto é falta de respeito, “Porque sim” não é resposta, Atitude autoritária Coisa de que ninguém gosta!

Adulto deve explicar Pra criança compreender Esses “podes” e “não podes”, Pra aceitar sem se ofender!

Criança exige carinho, E, sim! Consideração! Criança é gente, é pessoa, Não bicho de estimação!

O poema é constituído de quatro estrofes, denominadas quadras. Observe a escansão da primeira estrofe:

Ser/ cri/an/ça/ é/ du/re/za To/do /mun/do man/da/ em /mim Se/ per/gun/to/ o/ mo/ti/vo, Me/ res/pon/dem/ “por/que/ sim”! (grifos nossos).

7 Limerique é um gênero poético. Foi Tatiana Belinky quem o apresentou aos brasileiros, importando-

o da Irlanda via Inglaterra, mais exatamente de seu maior cultor, Edward Lear. Chamou-o limerix e constituiu inesgotável fonte de onde brotaram mandalix, bregalix, cacolix, que reunidos a outros formaram O livro dos disparates limeriques (1987), de Tatiana Belinky. Tratam-se de estrofes de cinco versos; primeiro, segundo e quinto com nove sílabas rimadas; terceiro e quarto mais curtos, embora também com rimas. Limeriques têm ritmo saltitante e humor non sense, o que agrada em cheio as crianças que começam a descobrir a musicalidade e o caráter lúdico da linguagem. Em um de seus livros, essa escritora assim os define: “Os limeriques são historinhas contadas em só cinco linhas ritmadas, ligeiras com rimas brejeiras: histórias bem maluquinhas”.

Page 78: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

78

Os versos são de sete sílabas – heptassílabos –, com rimas apenas entre os

segundos e quartos versos.

Os versos curtos de orações diretas possibilitam memorização mais tranquila,

aproximando a produção do poema ao universo infantil, conforme os demais

analisados neste trabalho.

Nas estrofes, em todas as quadras, a autora explica o contexto ideológico do

tema proposto e a necessidade da reflexão: “Ser criança é dureza,/ Todo mundo

manda em mim,/ Se pergunto o motivo/ Me respondem ‘porque sim’”. Logo de início,

portanto, a autora introduz o leitor em um mundo de conflito, já que chama a atenção

para que se entenda a infância na perspectiva da criança. Já no primeiro verso:

Ser criança é dureza Todo mundo manda em mim Se pergunto o motivo, Me respondem “porque sim”.

Ao atribuir à criança certa característica por meio do adjetivo “dureza”, a

autora aponta para a relação da vida infantil com a adulta, em uma percepção de

que a criança não precisa ter suas questões respondidas de maneira clara, pois o

adulto se vê em uma posição de que o seu dizer é definitivo e que ao pequeno resta

apenas aceitar a resposta adulta. Dessa maneira, o clichê “porque sim” reforça a

conduta humana, quando não se dá a devida importância ao diálogo com a criança.

Há uma antítese, um jogo de palavras marcado pelos verbos perguntar e

responder, a fim de indicar um possível diálogo que é logo transformado em

monólogo pela resposta que não estimula a continuidade do diálogo: porque sim.

A estrofe seguinte apresenta uma crítica aos olhos da própria criança à forma

de resposta que o adulto lhe dá:

Isto é falta de respeito, “Porque sim” não é resposta, Atitude autoritária Coisa de que ninguém gosta!

Page 79: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

79

Ao usar o adjetivo autoritária, o enunciador demonstra com firmeza que

“porque sim” não é a resposta adequada, e vai além, à medida que coisifica a

resposta para que se entenda que qualquer proposição que se coloque após a

pergunta, deve garantir a sua compreensão.

A estrofe seguinte acentua o que se disse, afirmando que o adulto deve

explicar com clareza para que a criança consiga compreender:

Adulto deve explicar Pra criança compreender Esses “podes” e “não podes”, Pra aceitar sem se ofender!

No terceiro verso – “Esses ‘podes’ e ‘não podes’” – há uma personificação do

verbo poder, marcada pela presença do pronome possessivo esse, articulando a

oposição entre poder e não poder.

A autora utiliza ainda o diacrítico de exclamação ao final dos últimos versos, a

fim de reforçar a importância de certa admiração diante da indignação que se tem

pelas respostas evasivas. A última estrofe vem como ultimato:

Criança exige carinho, E, sim! Consideração! Criança é gente, é pessoa, Não bicho de estimação!

O verbo exigir acentua a posição de que é um dever oferecer carinho. A

presença da conjunção aditiva e marca a continuidade das exigências – também

consideração. Parece que o advérbio de afirmação sim tem um efeito de

contradição, dado que é importante lembrar que há uma vírgula depois de e, de

modo que tal advérbio possui apenas o valor enfático de confirmação.

Page 80: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

80

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi estudar as possibilidades de leitura de poemas

escritos para crianças, observando algumas discussões sobre a literatura infantil.

Procurou-se, para tanto, contextualizar a literatura infantil, bem como sua possível

utilização em sala de aula.

Optou-se por buscar as marcas de expressividade nos textos que formaram o

corpus desta dissertação, tendo em vista as possibilidades interpretativas que

poderiam ser realizadas mediante a utilização de algumas categorias desenvolvidas

no trabalho.

Os quatro poemas escolhidos não apresentaram muita diferença na questão

de organização dos versos, prevalecendo as escolhas lexicais do universo infantil,

bem como o uso de adjetivos, marcando substantivos para produzir efeitos de

sentido específicos, assim como indicando a pluralidade cultural, a necessidade de

respeito aos direitos da criança, entre outras discussões.

Com exceção do último poema, os demais são marcados por um paralelismo

sintático.

Versos breves são mantidos em todos os quatro poemas, com a finalidade de

tornar a leitura mais acessível para a compreensão e memorização das obras.

Pela produção dessas duas autoras e relação estreita que estabelecem com o

universo infantil, ambas discutindo aspectos fundamentais para a aprendizagem,

esses sobressaltados em seus poemas, Ruth Rocha e Tatiana Belinky demonstram

temas de diversas naturezas e que estão diretamente ligados ao mundo da criança.

Ressalta-se a importância de levar para a sala de aula a leitura da poesia,

pois essa oferece um universo rico de possibilidades interpretativas, permitindo que

o leitor vá para além do que está escrito, buscando as diversas relações dialógicas

com o mundo e com a vida cotidiana da própria criança, além de favorecer:

Page 81: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

81

O exercício da subjetividade para a compreensão;

O despertar da sensibilidade;

O estímulo para análises mais criativas e críticas;

A contribuição para uma formação leitora mais eficaz e eficiente.

Espera-se que o presente estudo colabore, ainda que de forma parcial, para a

reflexão da temática abordada, elevando a leitura da poesia na escola como uma

importante atividade a ser desenvolvida pelos docentes com seus discentes.

Page 82: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

82

REFERÊNCIAS

AMORA, A. S. Introdução à teoria da literatura. São Paulo: Cultrix, 2004.

AZEREDO, J. C. de. Gramática Houaiss da língua portuguesa. São Paulo: Publifolha, 2010.

BELINKY, T. Um caldeirão de poemas. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2007.

BRASIL. Lei n.º 8.242, de 12 de outubro de 1991. Estatuto da criança e do adolescente. Brasília, DF, 1991.

______. Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da criança e do adolescente. Brasília, DF, 1990.

______. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Orientações curriculares para o ensino médio: linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília, DF, 2006. v. 1.

BUFFON, G.L. L. de. Discurso sobre o estilo. Trad. Artur Morão. Portugal: Covilhã, 2011.

CADEMARTORI, L. O que é literatura infantil. 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.

CÂMARA JR, M.; UCHÔA, C. E. F. Dispersos. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004.

CARVALHO, B. V. A literatura infantil: visão histórica e crítica. 6. ed. São Paulo: Global, 1989.

COELHO, N. N. Literatura infantil, teoria análise didática. 7. ed. São Paulo: Moderna, 2005.

CORTEZ, C. Z.; RODRIGUES, M. H. Operadores de leitura da poesia. In: BONNICI, T.; ZOLIN, L. O. (Org.). Teoria literária: abordagens históricas e tendências contemporâneas. 3. ed. Maringá, MG: Eduem, 2009.

COSTA, C. L. Português: ensino fundamental. São Paulo: Edições SM, 2009.

DAIBELLO, C. de. O. Ruth Rocha: produção, projetos gráficos e mercado editorial. 2013. Dissertação (Mestrado)–Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, 2013.

DISCINI, N. O estilo nos textos. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2013.

Page 83: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

83

FERREIRA NETTO, W.; PERES, D. O. A variação tonal no português brasileiro a partir de frases espontâneas e textos lidos. Estudos Linguísticos, São Paulo, v. 38, n. 1, p. 9-19, jan./abr. 2009.

FRANTZ, M. H. Z. O ensino da literatura nas séries iniciais. 3. ed. Ijuí, RS: Unijuí, 2001.

GEBARA, A. E. L. A poesia na escola: leitura e análise de poesia para criança. [S.l.: s.n.], 2012.

GOLDSTEIN, N. Versos, sons, ritmos. 14. ed. São Paulo: Ática, 2006.

JOLIBERT, J. Formando crianças produtoras de textos. Trad. Walkiria Setteneri; Bruno C. Magne. Porto Alegre, RS: Artes Médicas, 1994.

KLEIMAN, A. B. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 9. ed. Campinas, SP: Pontes, 2004.

______. O processo de aculturação pela escrita: ensino da forma ou aprendizagem da função? In: ______; SIGNORINI, I. (Org.). O ensino e a formação do professor: alfabetização de jovens e adultos. Porto Alegre, RS: Artmed, 2000.

LAJOLO, M. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 6. ed. São Paulo: Ática, 2008.

______. Infância de papel e tinta. In: FREITAS, M. C. de. História social da infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 2003.

______; ZILBERMAN, R. Literatura infantil brasileira: história e histórias. São Paulo: Ática, 2007.

MARTHA, A. A. P. Literatura infantil: a poesia. 2013. Disponível em: <http://www.acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/40361/3/01d17t10.pdf>. Acesso em: 18 nov. 2013.

MARTINS, E. M. A. Espaços da imaginação no processo criativo de Tatiana Belinky. 2011. Dissertação (Mestrado)–Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, 2011.

MARTINS, N. S. Introdução à estilística: a expressividade na língua portuguesa. 4. ed. rev. São Paulo: Edusp, 2008.

MICHELETTI, G. Estilística: um modo de ler poesia. São Paulo: Andross, 2004.

MOISÉS, M. A criação literária: poesia. 11. ed. São Paulo: Cultrix, 1989.

MOOR, A. N. et al. O ensino colaborativo na formação do professor de inglês instrumental. Disponível em: <http://minerva.ufpel.edu.br/~anne.moor/texto_enple.htm>. Acesso em: 12 abr. 2014.

Page 84: UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS … · sonoridade revelam aspectos significativos do universo infantil, facilitando a ... discursive and textual practices of the Masters

84

OLIANI, R. de C.; NEITZEL, A. de A. A formação cultural de professores: o poema pede passagem. In: PINO, A.; SCHLINDWEIN, L. M.; NEITZEL, A. de A. (Org.). Cultura, escola e educação criadora: formação estética do ser humano. Curitiba, PR: CRV, 2010.

PAIVA, A. A produção literária para crianças: onipresença e ausência das temáticas. In: ______; SOARES, M. (Org.). Literatura infantil: políticas e concepções. Belo Horizonte, MG: Autêntica, 2008.

PAZ, O. O arco e a lira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

PERROTTI, E. O texto sedutor na literatura infantil. São Paulo: Ícone, 1986.

ROCHA, R. O escritor por ele mesmo: leituras de Ruth Rocha. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2004.

ROVERI, S. Tatiana Belinky: e quem quiser que conte outra. São Paulo: Imprensa Oficial, 2007.

SOARES, M. As condições sociais da leitura: uma reflexão em contraponto. In: ZILBERMAN, R.; SILVA, E. T. (Org.). Leitura: perspectivas disciplinares. São Paulo: Ática, 2000. p. 18-29.

YLLERA, A. Estilística, poética e semiótica literária. Coimbra: Livraria Almedina, 1979.

ZILBERMAN, R. A literatura infantil na escola. 11. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Global, 2003.