UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE LETRAS...
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UNIVERSIDADE DE BRASLIA
INSTITUTO DE LETRAS
DEPARTAMENTO DE LINGUSTICA, PORRTUGUS E LNGUAS CLSSICAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LINGUSTICA
O PRESENTE HISTRICO COMO ESTRATGIA ORAL
NA PROSA DE ANDCIDES
CAMILA DE FREITAS SIKORSKI
Braslia
2013
UNIVERSIDADE DE BRASLIA
CAMILA DE FREITAS SIKORSKI
O PRESENTE HISTRICO COMO ESTRATGIA ORAL
NA PROSA DE ANDCIDES
Braslia
2013
Camila de Freitas Sikorski
O PRESENTE HISTRICO COMO ESTRATGIA ORAL
NA PROSA DE ANDCIDES
Dissertao de Mestrado apresentada ao
Programa de Ps-Graduao em
Lingustica, da Universidade de Braslia,
na rea de concentrao: Linguagem e
Sociedade, como requisito parcial
obteno do ttulo de Mestre em
Lingustica.
Orientadora: Sandra Lcia Rodrigues da Rocha
Braslia
2013
Dedico aos familiares, amigos,
professores, Universidade de
Braslia e ao grupo Rhetor pelo
incentivo e ajuda que tanto
contriburam para que a realizao
deste trabalho fosse possvel.
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela sade e fora espiritual para a realizao deste trabalho.
Aos meus pais, irmos e familiares, pelo apoio, compreenso e ajuda ao longo de minha
caminhada.
Ao meu marido, por todo o carinho e pacincia durante o curso.
Aos meus amigos e colegas de curso, por compartilharem comigo as experincias e por
prestarem solidariedade nos momentos de dvida.
Professora e Amiga Sandra, em especial, pela orientao deste trabalho, por compartilhar
comigo seu conhecimento e pelo eterno incentivo ao meu crescimento profissional e
acadmico.
Ao Professor Michael Edwards, por ter aceitado contribuir de forma to engrandecedora para
esta pesquisa.
Professora Helosa, por ter aceitado fazer parte da comisso examinadora deste trabalho e
por suas contribuies iniciais de grande importncia a este estudo.
[...]
.
, 135.
([...] Pois melhor ter escolhido
um ato bom que no leve ao
sucesso, do que ter escolhido um
ato mal por conta do xito.).
Epicuro, 135.
RESUMO
SIKORSKI, Camila de Freitas. O presente histrico como estratgia oral na prosa de
Andcides. Braslia, 2013. Dissertao (Mestrado em Lingustica) programa de Ps-
graduao em Lingustica, Universidade de Braslia, Braslia, 2013.
Andcides foi um orador poltico do sculo V a.C. que pronunciou poucos discursos
diante da assembleia ateniense, e a falta de uma educao formal em retrica lhe conferiu
uma m reputao como orador entre os antigos. Atualmente, entretanto, sua prosa
considerada muito valiosa, pois seus discursos retratam a lngua grega com a fluncia oral da
poca. Levando em conta sua formao e o contexto social de letramento em que estava
inserido, este trabalho analisa o uso do Presente histrico em seus discursos Sobre os
mistrios e Sobre seu retorno. Pretende-se explicar por meio de teorias semnticas
discursivas por que o uso deste tempo verbal pode ser considerado uma marca de oralidade
na escrita. Os resultados da anlise mostram que o uso do Presente histrico nos discursos de
Andcides uma forma de autoinsero do autor na narrativa de modo a chamar a ateno da
audincia para fatos isolados. A concluso revela (1) que, em algumas oraes que o Presente
histrico utilizado, o aspecto imperfectivo caracterstico do presente mantido, j que ele
utilizado para demonstrar uma ao que comeou no passado e ainda acontece ou tem grande
importncia no presente; (2) que Andcides usa o referido tempo para inserir um comentrio
na narrativa sem se fazer perceptvel. De uma perspectiva lingustica, o uso do Presente
histrico pode estar associado aos discursos que foram escritos para serem proclamados,
levando-se em conta a distino entre o estilo dos discursos escritos para serem lidos
( ), como os do gnero epiditico, e dos discursos escritos para serem
pronunciados diante de uma assembleia ou tribunal ( ), caracterstica dos
gneros judicial e deliberativo postulados por Aristteles.
Palavras-chave: Retrica. Oralidade. Presente Histrico. Teorias semnticas discursivas.
Estilo escrito. Estilo agonstico.
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ABSTRACT
SIKORSKI, Camila de Freitas. O presente histrico como estratgia oral na prosa de
Andcides. Braslia, 2013. Dissertao (Mestrado em Lingustica) programa de Ps-
graduao em Lingustica, Universidade de Braslia, Braslia, 2013.
Andocides was a political orator of the fifth century BC who delivered only a few
speeches before the Athenian assembly, and the lack of a formal education in rhetoric gave
him a bad reputation as an orator among the ancients. Currently, however, his prose is
considered to be very valuable, since his speeches portray the ancient Greek language with
the oral fluency of the period. Considering his background and the literacy context to which
he belonged, this work analyses the use of Historical Present in his speeches On the Mysteries
e On his Return. It aims to explain why the use of this tense could be considered a sign of
orality in writing by means of semantic discourse theories. Results show that Historical
Present in Andocides speeches is a form of self-insertion of the author in the narrative in
order to draw the audiences attention to isolated matters. Conclusions reveal that, (1) in
some clauses in Historical Present tense, the imperfective aspect of Present tense remains,
since it expresses an action that started in the past and still happens or has a great importance
in the present; (2) Andocides uses the tense to insert a comment on the narrative without
making himself visible. From a linguistic perspective, this usage of Historical Present tense
could be associated with discourses that were written to be delivered taking into
consideration the distinction between the style of speeches aimed to be read ( ),
that is epideitic, and speeches written to be delivered before an assembly or court (
), as stated by Aristotle as forensic and deliberative genres.
Keywords: Rhetoric. Orality. Historical Present. Semantic discourse theories. Written style.
Agonistic style.
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LISTA DE CONVENES E ABREVIATURAS
1. Seguem abaixo o modelo de referncia para os discursos de Andcides:
Nmero de referncia1 Grego Latim Portugus
1 De Mysteriis Sobre os mistrios
2 De Reditu Sobre seu retorno
3
De Pace Sobre a paz com
Esparta
4 Contra Alcibiadem Contra Alcibades
2. As abreviaes dos nomes dos outros autores antigos e seus discursos2 citados ao longo deste trabalho so as seguintes:
Abreviao
Nome Abreviao Discurso
A.D. Apolnio Dscolo III Da sintaxe
Alcid. Alcidamante Soph. Sobre os sofistas
Aristot. Aristteles De Interp. Da interpretao
Poet. Potica
Phys. Fsica
Rh. Retrica
D.H. Dionsio de Halicarnasso Comp. Sobre a composio literria
Dem. Sobre Demstenes
Lys. Sobre Lsias
Th. Sobre Tucdides
D.L. Digenes Larcio VII Escola estoica
D.T. Dionsio, o Trcio 13 Tchne Grammatik
Hermog. Hermgenes 2 Sobre os tipos de estilo
Philostr. Filstrato 2 Imagens
Plat. Plato Crat. Crtilo
Phaedrus Fedro
Prot. Protgoras
Rep. Repblica
Soph. Sofista
Plut. Plutarco Alc. Alcibades
Them. Temstocles
Vit. Dec. Vida dos dez oradores
Quint. Quintiliano 12 Institutio Oratoria
Thuc. Tucdides 6 Histria da Guerra do
Peloponeso
1 O nmero de referncia servir para designar o discurso e o captulo nos exemplos durante todo o texto. Por
exemplo: Andoc. 1. 15; Andcides, discurso Sobre os mistrios, captulo 15. 2 As abreviaes dos autores e de seus discursos utilizados nesta pesquisa seguem o padro de abreviaturas
acadmico, retirado de: .
http://en.wikipedia.org/wiki/Alcibiadeshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/abbrevhelp
SUMRIO
INTRODUO ........................................................................................................................ 8
CAPTULO 1 ORALIDADE NA GRCIA: TRADIO E CULTURA ORAL ........ 15
1.1 Escrita na Grcia: os gregos e sua relao com a escrita .......................................... 17
1.2 Retrica e Oratria grega estilo oral e escrito ........................................................ 25
CAPTULO 2 ANDCIDES: O ORADOR E SEU ESTILO NATURAL .................... 30
2.1 Vida e obra de Andcides .............................................................................................. 30
2.2 O estilo de Andcides .................................................................................................... 34
2.3 Sobre os mistrios ...................................................................... 36
2.4 Caractersticas retricas do gnero judicial em Andcides ............................................ 46
2.5 Sobre seu retorno ................................................................ 48
2.6 Caractersticas retricas do gnero deliberativo em Sobre seu retorno ......................... 51
CAPTULO 3 A FALA NA ESCRITA: ESTRATGIAS ORAIS NA ESCRITA DE
ANDCIDES.......................................................................................................................... 54
3. 1 O estilo oral e o escrito .................................................................................................. 57
3.2 Oralidade na escrita ........................................................................................................ 58
CAPTULO 4 O VERBO: A COMPREENSO DOS ANTIGOS SOBRE ESSA
CATEGORIA ......................................................................................................................... 71
4.1 Consideraes sobre verbo grego: o tempo e o aspecto ................................................. 84
CAPTULO 5 O TEMPO: ESTUDO SEMNTICO DOS VERBOS ........................... 90
5.1 O tempo para os antigos ................................................................................................. 90
5.2 A semntica dos verbos no grego antigo ........................................................................ 94
5.3 O Presente histrico no grego antigo ........................................................................... 100
5.4 Estudo semntico-aspectual e temporal do Presente histrico ..................................... 106
5.5 O Presente histrico de Andcides............................................................................... 118
CONCLUSO ...................................................................................................................... 128
REFERNCIAS ................................................................................................................... 130
APNDICE A CASOS DE PRESENTE HISTRICO EM ANDCIDES ................ 136
8
INTRODUO
A Grcia dos sculos IV e V a.C. ainda possua uma cultura tradicionalmente oral na
qual o ensino, as manifestaes artsticas e a poltica eram conduzidos sobretudo oralmente.
A oratria j possua um papel bastante importante na sociedade, ela era o meio utilizado para
mostrar novas ideias, formas de expresso e novos mtodos de argumento (GAGARIN,
1998). Alm disso, a oratria era importante principalmente por ser o instrumento de atuao
poltica, o que reflete o grande valor que a sociedade do perodo clssico atribua fala. A
escrita, apesar de praticada, ainda no apresentava convenes3 gramaticais muito rgidas e
era utilizada, principalmente, para fins de memria, armazenamento e sobrevivncia de textos
considerados importantes na poca.
Nesse momento, a publicao de textos j era uma prtica comumente utilizada.
Surgia o que se chama de oratria prtica, isto , a prtica de escrever os discursos
produzidos para ocasies reais da vida pblica. Esta prtica teve incio nos tribunais e depois
se expandiu para as assembleias de Atenas. Isso, consequentemente, aumentou o nmero de
profissionais que trabalhavam com a escrita, os loggrafos (GAGARIN, 1998). Porm, a
relao dos gregos com a escrita nem sempre se deu de forma natural, ou seja, alguns
pensadores criticavam a prtica da escrita por outros autores, principalmente por considerar
que ela representava certa manipulao de ideias, na medida em que a escrita podia adulterar
a verdade (Plat. Phaedrus, 274-5c). Alm disso, dificilmente um cidado teria a possibilidade
ou a necessidade de ler um livro. Estes eram utilizados pelos historiadores e estudiosos da
poca, j que exigiam muita habilidade para serem decifrados, alm do fato de o servio ser
feito, em geral por escravos (THOMAS, 2005).
Alm disso, criticava-se a escrita como mtodo de ensino e principalmente aqueles
que escreviam discursos para serem lidos e no pronunciados. Existia certo tipo de receio
contra os discursos escritos, estimulado pela suspeita de que a escrita poderia negligenciar a
verdade em favor do artifcio (THOMAS, 2005).
3 A lngua grega clssica apresentava diversos dialetos, como o drico, elico, tico e jnico. No sculo V a.C.,
devido ascenso de Atenas, que passou a ser considerada o centro cultural e poltico da Grcia e, por isso,
atraia intelectuais de todas as partes, o dialeto tico tornou-se o mais difundido na Grcia e permaneceu deste
modo at o final do sc IV a.C., quando surgiu a koin, a lngua comum. Portanto, devido grande mistura de
diferentes dialetos, a escrita do perodo clssico no apresentava uma forte unificao, demonstrando frequentes
diferenas na grafia das palavras entre os autores.
9
A acentuao e a pontuao dos textos ocorreram no sculo III a.C. e apenas por volta
do sculo I a.C./I d.C. surgiu a primeira gramtica. Portanto, no perodo clssico, ao qual se
refere esta pesquisa, no existia ainda uma normatizao da escrita, o que evidencia ainda
mais o carter oral da escrita na Grcia Clssica. At mesmo as inscries pblicas de Atenas
registravam os decretos da assembleia tal como eles eram passados, ou seja, em sua forma
falada, do mesmo modo que eram lidos na assembleia (THOMAS, 2005).
Apesar de no existir uma gramtica da lngua grega, isto , um livro normativo sobre
a lngua, no perodo clssico, a escrita possua diferentes graus de formalidade. Por exemplo,
a escrita utilizada no contexto judicial possua um grau de formalidade e uma rigidez muito
maior do que aquela das poesias. H ainda diferentes graus de oralidade nos textos escritos
para serem pronunciados (agonistik lexis) e naqueles feitos para serem lidos (graphik lexis)
(Aritot. Rh. 3). Portanto, possvel identificar traos de oralidade presentes na escrita grega
por meio de algumas estruturas, expresses, estilo e at mesmo por partculas e verbos.
Durante essa poca, viveu um orador poltico chamado Andcides, que nasceu por
volta de 440 a.C. e pertenceu a uma famlia rica e antiga de Atenas que, alm da fortuna, era
conhecida pela longa trajetria poltica. Seus antepassados participaram ativamente de
diversas expedies e embaixadas na Grcia.
Andcides ingressou na vida poltica aproximadamente aos vinte anos, em 415 a.C.,
ao participar das , um grupo poltico de carter oligrquico formado por jovens
aristocratas, responsvel por escndalos como a mutilao das esttuas de Hermes4 e, a
tentativa de derrubar a democracia em 411 a.C. Acredita-se que Andcides tenha participado
ativamente da vida pblica de Atenas ao logno de sua vida, j que em 392/1 a.C. foi um dos
membros da embaixada de paz a Esparta na tentativa de reconcili-la com Atenas. Aps esta
data, no h mais registros sobre a vida do orador.
Sobreviveram apenas quatro discursos de Andcides: Sobre seu retorno (409 a.C.),
Sobre os Mistrios (400 a.C.), Sobre a paz com Esparta (392 a.C.) e Contra Alcibades (415
a.C.). Juntos, esses discursos compem a maior fonte biogrfica de Andcides atualmente e
esto entre os mais antigos do gnero retrico; neles podem ser encontradas diversas
evidncias histricas do perodo clssico na Grcia, alm de aspectos culturais e sociais de
4 Na mitologia, Hermes era considerado o deus dos viajantes. Em Atenas, as esttuas de Hermes ficavam nas
portas das casas para simbolizar boa sorte. A mutilao das esttuas causou grande tenso e pnico na cidade e
os cidados atriburam este acontecimento como a causa do fracasso da expedio Siclia em 411 a.C.
10
Atenas. Os textos de Andcides tambm dialogam com grandes autores como Tucdides e
Xenofonte (EDWARDS, 1995).
Nada se sabe sobre a educao de Andcides. Aparentemente, ele no teve educao
formal e aprendeu oratria provavelmente pelo do contato com sofistas de sua poca5.
Andcides no foi um loggrafo e nem um rhetor6, porm sua oratria era extremamente
hbil, o que lhe conferiu um lugar entre os dez maiores oradores ticos7.
Nem sempre o estilo de Andcides agradou os crticos. Na antiguidade, possua uma
reputao bastante desprestigiada, dotado de um estilo ultrapassado, fora do modelo de
oratria tica, e por vezes criticado em tentar ser (orador poltico). At o
sculo XVIII, era considerado pelos estudiosos um amador, porm, hoje, a prosa de
Andcides muito valiosa, pois seus discursos retratam a lngua grega com a fluncia oral do
sculo V e incio do sculo IV a.C., justamente pelo fato de ele falar em pblico apenas
quando necessrio, pela falta de treino, pela despreocupao com a forma e, principalmente,
pela readaptao dos discursos para os leitores (EDWARDS, 1995).
Poucos autores se dedicam ou se dedicaram ao estudo da prosa de Andcides apesar
de seu grande valor, como citado anteriormente. Por isto, esta pesquisa pretende trazer uma
nova abordagem aos textos do orador ao identificar uma marca de oralidade proeminente em
sua escrita, a saber, o Presente histrico8, mais especificamente nos discursos Sobre os
mistrios e Sobre seu retorno, e explicar os motivos e circunstncias em que ocorre.
O primeiro captulo conta com a contextualizao do mundo antigo, desde a Grcia
arcaica Grcia clssica, a fim de se definir os parmetros de uma cultura oral lidando com o
aparecimento de um novo meio lingustico, bem como o surgimento e o papel que a oratria
tinha nessa sociedade de bases orais.
5 Maidment, 1941.
6 Loggrafo e rhetor eram duas profisses comuns da Grcia Clssica. Loggrafo era o nome que se dava ao
profissional que escrevia discursos. Rhetor se refere aos oradores pblicos, ou retricos (LIDELL&SCOTT,
1940). 7 O cnon dos dez oradores foi fixado pelos eruditos da Biblioteca de Alexandria na poca helenstica (sculos
III e II a.C.), para que as geraes futuras pudessem estudar as obras e os estilos dos dez maiores oradores da
Grcia clssica, a saber, Antifonte, Andcides, Lsias, Iscrates, Iseu, squines, Licurgo, Demstenes, Hiprides
e Dinarco. 8 Para fins de anlise, utilizou-se a letra maiscula nos tempos Presente, Imperfeito, Presente histrico, Futuro e Passado para se referir s classes verbais e a minscula para se referir ao tempo cronolgico ou ao
sentido geral dos termos, presente, passado e futuro.
11
No segundo captulo, h toda a histria e trajetria de Andcides, assim como seu
estilo de oratria natural, o que vem sendo fonte de admirao para estudiosos da prosa do
perodo clssico devido a sua vividez e proximidade com a lngua falada da poca. Este
captulo tambm conta com o estudo retrico dos dois discursos de Andcides a serem
analisados nesta pesquisa.
O captulo trs trata das marcas de oralidade na escrita de Andcides. Conta com o
estudo das diferentes estratgias orais que podem aparecer na escrita e a distino entre estilo
oral e escrito apontada por Aristteles. A partir disso, constatado o surgimento do Presente
histrico como uma estratgia oral nos textos do orador.
No quarto captulo, ser iniciado o estudo sinttico diacrnico do verbo na Grcia
antiga para se determinar como ocorria o emprego do Presente histrico e por que o uso deste
tempo pode ser considerado uma marca de oralidade nos discursos de Andcides, levando em
conta as distines temporais e aspectuais deste e dos outros tempos verbais a serem
considerados neste estudo.
O quinto e ltimo captulo traz consideraes sobre o uso e o entendimento do tempo
pelos gregos do perodo clssico sob um ponto de vista semntico. Trata-se do estudo
aprofundado do Presente histrico na lngua grega e traz novas abordagens para a definio
deste tempo dialogando com estudos contemporneos do referido tempo em outros autores na
medida em que traz usos peculiares do Presente histrico em Andcides; contribuindo, desse
modo, para a discusso acadmica de como se deve categorizar o uso desse tempo to
paradoxical para os parmetros lingusticos do perodo clssico.
Objetivo
O presente trabalho tem como objetivo geral investigar a relao entre oralidade e
escrita no sculo V a.C. na Grcia em Andcides. Esta relao ser concentrada no uso do
Presente histrico.
A investigao da oralidade e da escrita no se dar apenas em nvel textual, mas
tambm no mbito cultural, j que se pretende investigar a relao dos gregos com a escrita e
o contexto sociocultural no qual o orador estava inserido. Alm disso, pretende-se fazer um
12
estudo sinttico e semntico dos tempos verbais em grego contemplados nesta pesquisa, sob o
olhar dos gramticos contemporneos e antigos.
As seguintes questes norteiam esta pesquisa:
a. Como o uso do Presente histrico em Andcides fornece elementos para o estudo da
relao dos gregos com a escrita no sc. V a.C.?
b. O Presente histrico pode ser compreendido como marca de oralidade nos discursos
Sobre os Mistrios e Sobre seu retorno?
c. Que fatores determinam o uso deste tempo verbal nos discursos de Andcides?
As hipteses de pesquisa so as seguintes:
a. O Presente histrico uma marca de oralidade na lngua constatada a partir do uso
dos tempos verbais no grego antigo vinculado ideia de tempo cronolgico.
b. O Presente histrico pode manter suas caractersticas aspectuais de Presente, isto , de
imperfectivo e ser compatvel com a durabilidade em alguns casos.
c. O Presente histrico uma forma de autoinsero do orador no discurso sem se fazer
perceptvel.
Justificativa
A escolha de Andcides se d, primeiramente, por causa da falta de estudos e pesquisa
sobre ele de um modo geral, mas, sobretudo, em lngua portuguesa, sobre ele. Atualmente, o
foco dos estudos clssicos no Brasil se volta para nomes da prosa grega mais conhecidos e
reconhecidos no campo da filosofia, histria e medicina. O estudo de um corpus diferenciado
contribui no apenas para o conhecimento do prprio autor, mas tem consequncia direta nos
estudos de retrica e lingustica.
A busca pelo tema partiu da necessidade de se identificar mais aspectos que
contribuam para o estudo da relao entre a oralidade e escrita no perodo clssico e tambm
de se oferecer novas abordagens e novos argumentos para o assunto.
Os estudos sobre o Presente histrico no grego antigo ainda se encontram restritos a
certos autores, o que faz com que sua classificao no seja to abrangente como deveria para
13
que esta categoria fosse includa nas gramticas e manuais de grego antigo. Em portugus, o
estudo do Presente histrico tambm permanece confinado a seu uso erudito, na escrita, no
que se refere a fatos histricos, ignorando-se o seu uso oral, que muito prximo daquele do
grego antigo. Esta anlise, portanto, pretende expandir o conhecimento sobre as
caractersticas fundamentais do Presente histrico que o categorizam como tempo verbal ao
mesmo tempo em que chama ateno dos estudiosos para o seu uso no formal.
Metodologia
A constatao das marcas de oralidade nos textos de Andcides parte de dois fatores;
1) a relao dos gregos com a escrita no perodo clssico, a qual era mais prxima da fala por
conta da falta de uma sitematizao normativa da lngua, o que ser investigado no captulo
1; e 2) a falta de estudo formal por parte do orador, o que um fator decisivo para seu
emprego de figuras retricas tpicas da lngua cotidiana.
A partir disso, recorreu-se ao texto grego para identificar essas marcas, que consistem
na troca repentina de tempos verbais, mais especificamente, de tempos passados para o
Presente histrico nos discursos Sobre os Mistrios e Sobre seu retorno. Para essa etapa, foi
utilizada a edio bilngue mais recente e confivel, a saber, a de Edwards, 1995. Aps a
coleta dos dados, todos os captulos em que aparecerem o objeto de estudo foram traduzidos
para o portugus. Essa traduo literal, ou seja, o mais prxima possvel da lngua grega
para elucidar tanto o objeto de anlise quanto as caractersticas originais das oraes no
grego, como a subordinao e coordenao.
Aps a traduo de todos os casos, partiu-se para a sua contextualizao, o que
envolveu a anlise das motivaes e circunstncias nas quais o tempo ocorre. Aps terem
sido determinadas, foi feito estudo terico e sistemtico sobre os verbos no grego antigo,
considerando sob um ponto de vista sinttico e semntico o tempo e o aspecto no modo
Indicativo dos tempos Aoristo Imperfeito e Presente. O estudo temporal e aspectual do
Presente histrico permitiu a sustentao das hipteses citadas no incio desta pesquisa e,
logo, a refutao de algumas regras estabelecidas para este tempo verbal, alm de contribuir
com a discusso acadmica acerca do tema.
14
Por fim, a interpretao dos dados definiu os motivos pelos quais Andcides se utiliza
dessas expresses particulares e as circunstncias em que ocorre essa marca de oralidade em
sua escrita. Uma vez realizados os objetivos desta pesquisa, eles contriburam para o estudo e
caracterstica do estilo do orador e da oralidade na prosa do perodo clssico como um todo.
Devido semelhana aspectual e temporal entre o portugus e o grego antigo
identificada e explanada neste estudo foram consideradas algumas teorias semnticas do
Portugus a fim de elucidar algumas caractersitcas do Presente histrico no grego ainda no
identificadas.
15
CAPTULO 1 ORALIDADE NA GRCIA: TRADIO E CULTURA ORAL
A Grcia arcaica, que compreende os perodos de 800 a.C. a 480 a.C., apresentava
uma cultura de base oral, isto , uma cultura de comunicao, composio e transmisso
orais. O ensino, as manifestaes artsticas, a filosofia e a poltica eram transmitidos
oralmente. A poesia era cantada e representada e os discursos pblicos no eram lidos, mas
pronunciados diante dos tribunais ou assembleias. Portanto, um grego, para estar inserido em
tal sociedade e deter poderes polticos, tinha de ser capaz de falar bem em pblico
(THOMAS, 2005).
Os textos orais, como as poesias, eram compostos livremente e variavam de acordo
com a resposta dos ouvintes. Os compositores orais refletiam e desenvolviam o tema ao
mesmo tempo em que eram capazes de modific-lo de modo a atrair o interesse dos ouvintes.
Dessa maneira, as expresses artsticas eram transmitidas em suas formas mais vvidas e
fluidas. Porm, h controvrsias sobre o uso da escrita na composio dos poetas, como nos
poemas homricos, que ainda dividem opinies de estudiosos se foram compostos oralmente
ou com o auxlio da escrita9. Sendo assim, para ser considerada poesia oral, esta deve conter
uma das trs caractersticas: 1) ser composta oralmente (por improvisao); 2) ser
comunicada oralmente (performada); e 3) ser transmitida oralmente (memorizada)
(GENTILI, 1988).
Recitao e performance faziam parte do ensino na Grcia. De acordo com Robb
(apud Imber, 2001, p. 211), a tcnica de se recitar poesia pica era mimtica, ou seja, o
estudante no apenas lia em voz alta, mas imitava o autor e algumas de suas figuras picas.
Isto porque as tcnicas de performances de textos orais vinham de uma longa tradio na
qual, ao serem pronunciados, serviam para entreter os ouvintes. A prpria definio de
poesia em Plato engloba o conceito de (audio)10
, que se refere comunicao e
transmisso oral. A atividade do rapsodo11
, tambm relatada por Plato, em on, consiste de
9 Ver: NAGY, Gregory. Homeric Questions. Austin: University of Texas P, 1996; PAGE, Denys L. Historv
and the Homeric Iliad. Berkeley: University of California P, 1959; PARRY, Adam, Ed. The Making of
Homeric Verse: The Collected Pacers of Milman Parry. Oxford: Clarendon, 1971. 10
Plat. Rep. 10, 603b. 11
Recitador, artista ou cantor de poesia profissional.
16
performance com gestos de passagens memorizadas dos poemas homricos (GENTILI,
1988).
Mesmo no perodo clssico, o ensino ainda recorria memorizao, como se observa
em Plato, em Protgoras, ao relatar que, na escola, os alunos recebem os poemas dos bons
poetas para estud-los e aprend-los de cor:
[325e] :
,
,
, [...] (Prot. 325e).
Os mestres, por sua vez, seguem a prescrio e, ento, assim que as crianas
aprenderem as letras e estiverem prontas para compreenderem os textos
escritos do mesmo modo que, at a, compreenderam os sons, colocam-lhes
sobre os bancos poemas de bons poetas, para que os leia e obrigam-nas a
aprend-los de cor, [...] (PINHEIRO, 1999).
Ainda no perodo clssico, a filosofia era estudada e praticada por meio de discusses
orais habituais e os assuntos polticos eram tambm debatidos e proclamados diante de
assembleias. Portanto, percebe-se o grande valor da palavra falada na cultura grega e de seu
impacto sobre a sociedade da poca.
O advento da escrita no suprimiu as bases orais da cultura grega. Durante um longo
perodo, ela permaneceu em segundo plano, utilizada como recurso de memorizao ou
auxlio para a fala e, posteriormente, como a representao desta de modo a preserv-la. A
cultura da Grcia antiga permitia que seus compositores se engajassem no aprendizado da
memorizao de poesias e canes tradicionais transmitidas oralmente e a aquisio desse
novo meio comunicativo um processo demasiadamente lento no modificou
substancialmente o sistema de comunicao nem o modo de pensar da cultura oral grega, que
permaneceu por vrios sculos at mesmo quando a escrita passou a ser considerada uma
atividade literria autntica (GENTILI, 1988).
http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=%5B&la=greek&can=%5B0http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e&la=greek&can=e0&prior=%5bhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e&la=greek&can=e0&prior=%5bhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=eu%29kosmi%2Fas&la=greek&can=eu%29kosmi%2Fas0&prior=%5dhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tw%3Dn&la=greek&can=tw%3Dn0&prior=eu)kosmi/ashttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=pai%2Fdwn&la=greek&can=pai%2Fdwn0&prior=tw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=h%29%5C&la=greek&can=h%29%5C0&prior=pai/dwnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=gramma%2Ftwn&la=greek&can=gramma%2Ftwn0&prior=h)/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=te&la=greek&can=te0&prior=gramma/twnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C0&prior=tehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kiqari%2Fsews&la=greek&can=kiqari%2Fsews0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=oi%28&la=greek&can=oi%280&prior=kiqari/sewshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=de%5C&la=greek&can=de%5C0&prior=oi(http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=dida%2Fskaloi&la=greek&can=dida%2Fskaloi0&prior=de/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tou%2Ftwn&la=greek&can=tou%2Ftwn0&prior=dida/skaloihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=te&la=greek&can=te1&prior=tou/twnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29pimelou%3Dntai&la=greek&can=e%29pimelou%3Dntai0&prior=tehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C1&prior=e)pimelou=ntaihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29peida%5Cn&la=greek&can=e%29peida%5Cn0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=au%29%3D&la=greek&can=au%29%3D0&prior=e)peida/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=gra%2Fmmata&la=greek&can=gra%2Fmmata0&prior=au)=http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ma%2Fqwsin&la=greek&can=ma%2Fqwsin0&prior=gra/mmatahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C2&prior=ma/qwsinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=me%2Fllwsin&la=greek&can=me%2Fllwsin0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=sunh%2Fsein&la=greek&can=sunh%2Fsein0&prior=me/llwsinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ta%5C&la=greek&can=ta%5C0&prior=sunh/seinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=gegramme%2Fna&la=greek&can=gegramme%2Fna0&prior=ta/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%28%2Fsper&la=greek&can=w%28%2Fsper0&prior=gegramme/nahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=to%2Fte&la=greek&can=to%2Fte0&prior=w(/sperhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=th%5Cn&la=greek&can=th%5Cn0&prior=to/tehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=fwnh%2Fn&la=greek&can=fwnh%2Fn0&prior=th/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=paratiqe%2Fasin&la=greek&can=paratiqe%2Fasin0&prior=fwnh/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=au%29toi%3Ds&la=greek&can=au%29toi%3Ds0&prior=paratiqe/asinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29pi%5C&la=greek&can=e%29pi%5C0&prior=au)toi=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tw%3Dn&la=greek&can=tw%3Dn1&prior=e)pi/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ba%2Fqrwn&la=greek&can=ba%2Fqrwn0&prior=tw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29nagignw%2Fskein&la=greek&can=a%29nagignw%2Fskein0&prior=ba/qrwnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=poihtw%3Dn&la=greek&can=poihtw%3Dn0&prior=a)nagignw/skeinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29gaqw%3Dn&la=greek&can=a%29gaqw%3Dn0&prior=poihtw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=poih%2Fmata&la=greek&can=poih%2Fmata0&prior=a)gaqw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C3&prior=poih/matahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29kmanqa%2Fnein&la=greek&can=e%29kmanqa%2Fnein0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29nagka%2Fzousin&la=greek&can=a%29nagka%2Fzousin0&prior=%5d
17
1.1 Escrita na Grcia: os gregos e sua relao com a escrita
O alfabeto grego surgiu no sculo VIII a.C. Neste perodo, apareceram os primeiros
registros de inscries em pedras. Ao longo deste sculo, surgiram tambm as primeiras leis
escritas e inscries privadas de propsitos religiosos. No sculo VII a.C., a escrita comeou
a ser utilizada para marcar propriedade em vasos, tmulos, lpides, rotulagem e,
posteriormente, passou a ser empregada publicamente pelas cidades-estados com sua forma
inicialmente arcaica: letras maisculas, sem diviso entre as palavras ou acentos, e sem
qualquer pontuao. No sculo V a.C., os textos escritos passaram a ser publicados, porm os
livros eram raros e, apenas na segunda metade do sculo, comearam a circular e serem
produzidos. Na realidade, eles eram papiros12
grandes que exigiam muita habilidade e
determinada postura para serem decifrados. Por isso, dificilmente um cidado grego do
perodo clssico leria um livro para entreter-se13
e o hbito de leitura iniciou-se j no final
deste perodo (THOMAS, 2005).
Os autores dos primeiros livros tambm apareceram no incio do sculo V a.C.
Acredita-se que eles tinham apenas uma cpia de seus manuscritos em papiros, por isso, era
comum que o lessem publicamente e seu pblico era limitado aos que compareciam s suas
audincias. Em vista desta limitao, os autores comearam a distribuir cpias de seus
escritos a certos interessados e tambm permitiam que estes fizessem cpias de suas obras.
Desse modo, se deu o incio da produo dos primeiros livros na Grcia (CASSON, 2001).
Ao final do perodo em destaque e incio do sculo IV a.C., provavelmente j havia
uma forma de produo organizada e produtiva para a comercializao de textos escritos
(CASSON, 2001). Surgiram, ento, os primeiros indcios de comrcios de livros. Eles se
tornaram mais comuns e eram utilizados principalmente pelos historiadores gregos. Apenas
12
Os papiros eram rolos de papis fabricados das tiras do caule da planta Cyperus papyrus. Tiras longas e finas
retiradas dos caules recm-colhidos eram postas verticalmente lado a lado. Em seguida, uma segunda camada
era posta horizontalmente e prensada. A propriedade adesiva da seiva natural da planta fazia com que as duas
camadas se aderissem e formassem um papel macio, flexvel e claro, excelente para a escrita. As folhas saam
das prensas em diversos tamanhos diferentes. A partir da, eram coladas em grupos de 20 ou mais e enroladas
para melhor manuseio e armazenamento. O lado horizontal era o mais escolhido para se escreve, por isso, ao
enrolar os papis, ele era voltado para o lado de dentro. Os rolos de papiros variavam em comprimento
dependendo da quantidade de folhas; uma variao comum era de 3,2m a 3,6m, porm h rolos que chegam a 6
metros ou mais (CASSON, 2001). 13
Sobre a litura silenciosa, ver Sandra, 2008.
18
no sculo III a.C., houve a melhora na pontuao e acentuao das palavras, o texto tomou
ento a disposio tradicional da poesia (THOMAS, 2005) e a primeira gramtica da lngua
grega, a de Dionsio, o Trcio, surgiu no sculo I a.C14
.
Por alguns sculos antes do sculo V a.C., a escrita permaneceu nas mos de escribas,
aristocratas, comerciantes e artistas. At o sculo V a.C., ela tambm foi, por vezes, usada
como um elemento extravisual, um adorno para a decorao de objetos a serem apreciados
pelos no leitores. As letras eram usadas livremente e o artista tinha a liberdade de escolher
onde coloc-las dentro do cenrio. No sculo V a.C., j existia a prtica de se escrever
discursos, porm no se tem registro sobre o hbito de leitura dos gregos neste momento.
Havia a prtica da leitura silenciosa de textos pequenos, porm os livros no ofereciam
condies ideais para uma leitura rpida (DA ROCHA, 2008). Apenas no incio do sculo IV
a.C., os documentos escritos passaram a ser aceitos em contextos legais e polticos
(THOMAS, 2005) e, a partir da, firmou-se a revoluo alfabtica na Grcia. Os textos desta
poca foram estocados para reutilizao e memorizao.
Segundo a opinio controvertida de Havelock, 1994, uma vez que os discursos foram
escritos, aliviou-se a carga de sua memorizao e aumentaram as energias para o pensamento
conceitual. Porm, como observado ainda em Protgoras, a prtica de memorizao e
recitao era recorrente e os textos escritos eram, antes de apenas lidos, interpretados para a
audincia de modo a se aproximarem mais da comunicao oral.
A sociedade grega no incorporou completamente o uso da escrita vida pblica e
cotidiana em um primeiro momento. Durante algum tempo, os gregos rejeitaram o seu uso
tanto no ensino como nos tribunais, e, durante a Grcia clssica, parecia haver uma dicotomia
em se tratando do meio escrito. De uma parte, Atenas se orgulhava de ter leis escritas e as
considerava fundamentais para a democracia. De outra, Esparta se orgulhava de no precisar
delas (THOMAS, 2005). De um lado, a grafia era a representao da fala; de outro no servia
como prova nos tribunais, pois poderia ser facilmente negligenciada. Portanto, apesar da
introduo da escrita e de seu uso no mundo grego, a tradio oral ainda permanecia forte
nessa cultura, inclusive influenciando o prprio meio.
Plato foi um dos maiores crticos escrita. Para ele, os textos escritos no
representavam a verdade, apenas uma imagem do conhecimento, e sua leitura no tinha valor
14
A gramtica de Dionsio, o Trcio, ser tratada de forma mais aprofundada no Captulo 4.
19
para o real conhecimento, principalmente para a filosofia, pois a filosofia escrita perde sua
flexibilidade e a existncia de livros filosficos causa a deteriorao da memria se forem
usados como substitutos do conhecimento (KRAUT, 2006). Em seu dilogo, Fedro,
possvel encontrar vrias passagens em que o filsofo critica a escrita. Entre elas, seguem as
mais expressivas:
A fala de Scrates sobre a inveno do deus egpcio Teuth no palcio do rei Tamos e
a concluso de que a escrita fornece apenas a iluso do aprendizado:
[275a] , , .
,
,
:
. , :
[275b] ,
, ,
. (Plat. Phaedrus, 275a-b).
Tu, neste momento e como inventor da escrita, esperas dela, e com
entusiasmo, todo o contrrio do que ela pode vir a fazer! Ela tornar os
homens mais esquecidos, pois que, sabendo escrever, deixaro de exercitar a
memria, confiando apenas nas escrituras, e s se lembraro de um assunto
por fora de motivos exteriores, por meio de sinais, e no dos assuntos em si
mesmos. Por isso, no inventaste um remdio para a memria, mas sim para
a rememorao. Quanto transmisso do ensino, transmitistes aos teus
alunos no a sabedoria em si mesma, mas apenas uma aparncia de
sabedoria, pois passaro a receber uma grande soma de informaes sem a
respectiva educao! Ho de parecer homens de saber, embora no passem
de ignorantes em muitas matrias, e tornar-se-o, por consequncia, sbios
imaginrios, em vez de sbios verdadeiros! (GOMES, 2000).
Scrates compara a escrita a uma pintura, como uma imagem do real, sem vida
prpria e que no fala por si mesma:
http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=%5B&la=greek&can=%5B0http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=%5D&la=greek&can=%5D0&prior=ahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=su%2F&la=greek&can=su%2F0&prior=%5dhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=path%5Cr&la=greek&can=path%5Cr0&prior=su/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%29%5Cn&la=greek&can=w%29%5Cn0&prior=path/rhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=gramma%2Ftwn&la=greek&can=gramma%2Ftwn0&prior=w)/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=di%27&la=greek&can=di%270&prior=gramma/twnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=eu%29%2Fnoian&la=greek&can=eu%29%2Fnoian0&prior=di'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tou%29nanti%2Fon&la=greek&can=tou%29nanti%2Fon0&prior=eu)/noianhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ei%29%3Dpes&la=greek&can=ei%29%3Dpes0&prior=tou)nanti/onhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=h%29%5C&la=greek&can=h%29%5C0&prior=ei)=peshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=du%2Fnatai&la=greek&can=du%2Fnatai0&prior=h)/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tou%3Dto&la=greek&can=tou%3Dto0&prior=du/nataihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ga%5Cr&la=greek&can=ga%5Cr0&prior=tou=tohttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tw%3Dn&la=greek&can=tw%3Dn0&prior=ga/rhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=maqo%2Fntwn&la=greek&can=maqo%2Fntwn0&prior=tw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=lh%2Fqhn&la=greek&can=lh%2Fqhn0&prior=maqo/ntwnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=me%5Cn&la=greek&can=me%5Cn0&prior=lh/qhnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29n&la=greek&can=e%29n0&prior=me/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=yuxai%3Ds&la=greek&can=yuxai%3Ds0&prior=e)nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=pare%2Fcei&la=greek&can=pare%2Fcei0&prior=yuxai=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=mnh%2Fmhs&la=greek&can=mnh%2Fmhs0&prior=pare/ceihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29melethsi%2Fa%7C&la=greek&can=a%29melethsi%2Fa%7C0&prior=mnh/mhshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%28%2Fte&la=greek&can=a%28%2Fte0&prior=a)melethsi/a|http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=dia%5C&la=greek&can=dia%5C0&prior=a(/tehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=pi%2Fstin&la=greek&can=pi%2Fstin0&prior=dia/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=grafh%3Ds&la=greek&can=grafh%3Ds0&prior=pi/stinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29%2Fcwqen&la=greek&can=e%29%2Fcwqen0&prior=grafh=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=u%28p%27&la=greek&can=u%28p%270&prior=e)/cwqenhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29llotri%2Fwn&la=greek&can=a%29llotri%2Fwn0&prior=u(p'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tu%2Fpwn&la=greek&can=tu%2Fpwn0&prior=a)llotri/wnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ou%29k&la=greek&can=ou%29k0&prior=tu/pwnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29%2Fndoqen&la=greek&can=e%29%2Fndoqen0&prior=ou)khttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=au%29tou%5Cs&la=greek&can=au%29tou%5Cs0&prior=e)/ndoqenhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=u%28f%27&la=greek&can=u%28f%270&prior=au)tou/shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=au%28tw%3Dn&la=greek&can=au%28tw%3Dn0&prior=u(f'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29namimnh%7Cskome%2Fnous&la=greek&can=a%29namimnh%7Cskome%2Fnous0&prior=au(tw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ou%29%2Fkoun&la=greek&can=ou%29%2Fkoun0&prior=a)namimnh|skome/noushttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=mnh%2Fmhs&la=greek&can=mnh%2Fmhs1&prior=ou)/kounhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29lla%5C&la=greek&can=a%29lla%5C0&prior=mnh/mhshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=u%28pomnh%2Fsews&la=greek&can=u%28pomnh%2Fsews0&prior=a)lla/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=fa%2Frmakon&la=greek&can=fa%2Frmakon0&prior=u(pomnh/sewshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=hu%28%3Dres&la=greek&can=hu%28%3Dres0&prior=fa/rmakonhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=sofi%2Fas&la=greek&can=sofi%2Fas0&prior=hu(=reshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=de%5C&la=greek&can=de%5C0&prior=sofi/ashttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=toi%3Ds&la=greek&can=toi%3Ds0&prior=de/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=maqhtai%3Ds&la=greek&can=maqhtai%3Ds0&prior=toi=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=do%2Fcan&la=greek&can=do%2Fcan0&prior=maqhtai=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ou%29k&la=greek&can=ou%29k1&prior=do/canhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29lh%2Fqeian&la=greek&can=a%29lh%2Fqeian0&prior=ou)khttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=pori%2Fzeis&la=greek&can=pori%2Fzeis0&prior=a)lh/qeianhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=poluh%2Fkooi&la=greek&can=poluh%2Fkooi0&prior=pori/zeishttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ga%2Fr&la=greek&can=ga%2Fr0&prior=poluh/kooihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=soi&la=greek&can=soi0&prior=ga/rhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=geno%2Fmenoi&la=g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20
[275d] [...] , , ,
. ,
, . :
, ,
. [275e] ,
,
, .
:
. (Plat. Phaedrus, 275d-e).
O maior inconveniente da escrita parece-se, caro Fedro, se bem julgo, com a
pintura. As figuras pintadas tm atitudes de seres vivos, mas, se algum as
interrogar, manter-se-o silenciosas, o mesmo acontecendo com os
discursos: falam das coisas como se estas estivessem vivas, mas, se algum
os interroga, no intuito de obter um esclarecimento, limitam-se a repetir
sempre a mesma coisa. Mais: uma vez escrito, um discurso chega a toda
parte, tanto aos que entendem como aos que no podem compreend-lo e,
assim, nunca se chega a saber a quem serve e a quem no serve. Quando
menoscabado, ou justamente censurado, tem sempre necessidade da ajuda de
seu autor, pois no capaz de se defender nem de se proteger a si mesmo.
(GOMES, 2000).
Scrates revela que o homem sbio aquele que considera a escrita apenas como
mero instrumento para relembrar aquilo que ele j conhece:
[277e] [...]
,
,
,
[278a] ,
:
, ,
, [278b]
:
, ,
. (Plat. Phaedrus, 277e-278b).
Quanto ao outro, ao orador que ambos gostaramos de imitar, pensaria que
um discurso escrito, seja sobre que assunto for, contm necessariamente uma
grande soma de motivos de fantasia, pois nenhum discurso, seja em verso,
seja em prosa, merece o dispndio de um grande esforo para a sua
composio, o mesmo se podendo dizer dos discursos recitados pelos
http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=deino%5Cn&la=greek&can=deino%5Cn0&prior=*swkra/thshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ga%2Fr&la=greek&can=ga%2Fr0&prior=deino/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=pou&la=greek&can=pou0&prior=ga/rhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%29%3D&la=greek&can=w%29%3D0&prior=pouhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=*fai%3Ddre&la=greek&can=*fai%3Ddre0&prior=w)=http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tou%3Dt%27&la=greek&can=tou%3Dt%270&prior=*fai=drehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29%2Fxei&la=greek&can=e%29%2Fxei0&prior=tou=t'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=grafh%2F&la=greek&can=grafh%2F0&prior=e)/xeihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C0&prior=grafh/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%28s&la=greek&can=w%28s0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29lhqw%3Ds&la=greek&can=a%29lhqw%3Ds0&prior=w(shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=o%28%2Fmoion&la=greek&can=o%28%2Fmoion0&prior=a)lhqw=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=zwgrafi%2Fa%7C&la=greek&can=zwgrafi%2Fa%7C0&prior=o(/moionhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C1&prior=zwgrafi/a|http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ga%5Cr&la=greek&can=ga%5Cr0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ta%5C&la=greek&can=ta%5C1&prior=ga/rhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29kei%2Fnhs&la=greek&can=e%29kei%2Fnhs0&prior=ta/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29%2Fkgona&la=greek&can=e%29%2Fkgona0&prior=e)kei/nhshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%28%2Fsthke&la=greek&can=e%28%2Fsthke0&prior=e)/kgonahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=me%5Cn&la=greek&can=me%5Cn0&prior=e(/sthkehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%28s&la=greek&can=w%28s1&prior=me/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=zw%3Dnta&la=greek&can=zw%3Dnta0&prior=w(shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29a%5Cn&la=greek&can=e%29a%5Cn0&prior=zw=ntahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=d%27&la=greek&can=d%270&prior=e)a/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29ne%2Frh%7C&la=greek&can=a%29ne%2Frh%7C0&prior=d'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ti&la=greek&can=ti0&prior=a)ne/rh|http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=semnw%3Ds&la=greek&can=semnw%3Ds0&prior=tihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=pa%2Fnu&la=greek&can=pa%2Fnu0&prior=semnw=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=siga%3D%7C&la=greek&can=siga%3D%7C0&prior=pa/nuhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tau%29to%5Cn&la=greek&can=tau%29to%5Cn0&prior=siga=|http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=de%5C&la=greek&can=de%5C0&prior=tau)to/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C2&prior=de/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=oi%28&la=greek&can=oi%280&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=lo%2Fgoi&la=greek&can=lo%2Fgoi0&prior=oi(http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=do%2Fcais&la=greek&can=do%2Fcais0&prior=lo/goihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=me%5Cn&la=greek&can=me%5Cn1&prior=do/caishttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29%5Cn&la=greek&can=a%29%5Cn1&prior=me/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%28%2Fs&la=greek&can=w%28%2Fs0&prior=a)/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ti&la=greek&can=ti1&prior=w(/shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=fronou%3Dntas&la=greek&can=fronou%3Dntas0&prior=tihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=au%29tou%5Cs&la=greek&can=au%29tou%5Cs0&prior=fronou=ntashttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=le%2Fgein&la=greek&can=le%2Fgein0&prior=au)tou/shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29a%5Cn&la=greek&can=e%29a%5Cn1&prior=le/geinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=de%2F&la=greek&can=de%2F0&prior=e)a/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ti&la=greek&can=ti2&prior=de/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29%2Frh%7C&la=greek&can=e%29%2Frh%7C0&prior=tihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tw%3Dn&la=greek&can=tw%3Dn0&prior=e)/rh|http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=legome%2Fnwn&la=greek&can=legome%2Fnwn0&prior=tw=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=boulo%2Fmenos&la=greek&can=boulo%2Fmenos0&prior=legome/nwnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=maqei%3Dn&la=greek&can=maqei%3Dn0&prior=boulo/menoshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%28%2Fn&la=greek&can=e%28%2Fn0&prior=maqei=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ti&la=greek&can=ti3&prior=e(/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=shmai%2Fnei&la=greek&can=shmai%2Fnei0&prior=tihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=mo%2Fnon&la=greek&can=mo%2Fnon0&prior=shmai/neihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tau%29to%5Cn&la=greek&can=tau%29to%5Cn1&prior=mo/nonhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29ei%2F&la=greek&can=a%29ei%2F0&prior=tau)to/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=o%28%2Ftan&la=greek&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l=a%28%2Fma&la=greek&can=a%28%2Fma0&prior=a)delfoi/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29n&la=greek&can=e%29n0&prior=a(/mahttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29%2Fllaisin&la=greek&can=a%29%2Fllaisin0&prior=e)nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29%2Fllwn&la=greek&can=a%29%2Fllwn0&prior=a)/llaisinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=yuxai%3Ds&la=greek&can=yuxai%3Ds0&prior=a)/llwnhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kat%27&la=greek&can=kat%270&prior=yuxai=shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29ci%2Fan&la=greek&can=a%29ci%2Fan0&prior=kat'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29ne%2Ffusan&la=greek&can=e%29ne%2Ffusan0&prior=a)ci/anhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=tou%5Cs&la=greek&can=tou%5Cs0&prior=e)ne/fusanhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=de%5C&la=greek&can=de%5C0&prior=tou/shttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29%2Fllous&la=greek&can=a%29%2Fllous0&prior=de/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=xai%2Frein&la=greek&can=xai%2Frein0&prior=a)/lloushttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29w%3Dn&la=greek&can=e%29w%3Dn0&prior=xai/reinhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ou%28%3Dtos&la=greek&can=ou%28%3Dtos0&prior=e)w=nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=de%5C&la=greek&can=de%5C1&prior=ou(=toshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=o%28&la=greek&can=o%280&prior=de/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=toiou%3Dtos&la=greek&can=toiou%3Dtos0&prior=o(http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29nh%5Cr&la=greek&can=a%29nh%5Cr0&prior=toiou=toshttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kinduneu%2Fei&la=greek&can=kinduneu%2Fei0&prior=a)nh/rhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=w%29%3D&la=greek&can=w%29%3D0&prior=kinduneu/eihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=*fai%3Ddre&la=greek&can=*fai%3Ddre0&prior=w)=http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=ei%29%3Dnai&la=greek&can=ei%29%3Dnai0&prior=*fai=drehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=oi%28%3Don&la=greek&can=oi%28%3Don0&prior=ei)=naihttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29gw%2F&la=greek&can=e%29gw%2F0&prior=oi(=onhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=te&la=greek&can=te1&prior=e)gw/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C1&prior=tehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=su%5C&la=greek&can=su%5C0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=eu%29cai%2Fmeq%27&la=greek&can=eu%29cai%2Fmeq%270&prior=su/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=a%29%5Cn&la=greek&can=a%29%5Cn0&prior=eu)cai/meq'http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=se%2F&la=greek&can=se%2F0&prior=a)/nhttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=te&la=greek&can=te2&prior=se/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=kai%5C&la=greek&can=kai%5C2&prior=tehttp://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=e%29me%5C&la=greek&can=e%29me%5C0&prior=kai/http://www.perseus.tufts.edu/hopper/morph?l=gene%2Fsqai&la=greek&can=gene%2Fsqai0&prior=e)me/
21
rapsodos, sem meditao e sem instruo, unicamente destinados a servir de
instrumento de persuaso. Os melhores de todos os discursos escritos so os
que tm por fim servir de memorandos aos que conhecem tais discursos e
somente nas palavras cujo fito a instruo, assim se gravando na alma,
sobre o que justo, belo e bom, somente nessas encontramos uma perfeio
digna dos nossos esforos. Apenas estes discursos, e s estes, merecem o
nome de filhos legtimos do orador, primeiro, porque ele mesmo os gerou
sob a fora da inspirao, segundo, porque so capazes de gerar, nas almas
dos outros homens, irmos que se mostram dignos da famlia de que
descendem, quanto s demais espcies de discursos, tanto tu, Fedro, como
eu, bem os podemos desprezar... (GOMES, 2000).
Por meio dessas passagens e da anterior sobre o ensino em Protgoras, nota-se que
Plato interpretava a aprendizagem como rememorativa, levando em conta dois fatores: o
contedo que se aprende, vindo de uma fonte exterior como uma figura, um livro, uma lio
oral etc.; e o ato de aprendizado, o momento em que o aluno compreende a demonstrao que
tem diante de si e que se torna um saber para ele. Plato considera, ento, o fenmeno do
aprendizado como a recuperao de uma recordao, ou seja, aprender equivale a relembrar e
colocar a memria em ordem (TRABATTONI, 2003). Sendo assim, a maior crtica de Plato
quanto escrita de que ela no provoca a recorrncia memria e ao saber de cada um, e
sim torna o aluno dependente do que est escrito para expressar o conhecimento.
Para o filsofo, a fixidez da escrita negativa, pois tanto simula o saber quanto retira
do ensinamento a capacidade de persuadir que prpria da situao oral (TRABATTONI,
2003), ou seja, pelo meio escrito, no h a troca do conhecimento nem a persuaso entre
leitor e escritor como ocorre com o falante e o ouvinte nos dilogos. Na Grcia clssica,
importante se ter em mente um leitor-ouvinte devido tradio de recepo dos discursos em
falas pblicas. Portanto, ele deve estar atento ao que ouve tanto quanto precisa recorrer
memria para ter um posicionamento crtico diante de uma discusso (DA ROCHA, 2010).
Alm de criticar a escrita, Plato tambm no aprovava a atividade dos loggrafos. No
mesmo discurso, Fedro, 257d, o pensador relata que os polticos mais importantes tinham
medo de escrever seus discursos e serem chamados de sofistas15
, ou seja, profissionais do
15
Sofistas eram como professores, geralmente estrangeiros, que ensinavam prticas de oratria para estudantes
em troca de um pagamento. Foram duramente criticados pelos filsofos por no se aterem verdade: a
principal acusao formulada por Plato bem como por Aristteles pode ser inscrita no termo pseudos. Pseudos
objetivo, o falso: o sofista diz o que no , o no-ser, e o que no verdadeiramente ente, os fenmenos, as
aparncias. Pseudos subjetivo, a mentira: o sofista diz o falso na inteno de enganar, utilizando, para obter
22
discurso, que se concentravam inteiramente no objeto que deveriam confeccionar, no objetivo
do contratante e que no possuam a inteno de comunicar algo interior e que concebiam
como verdadeiro (TRABATTONI, 2003). A depreciao dos loggrafos parecia ser um
consenso por parte da sociedade grega do perodo clssico. Em Alcidamante16
, Demstenes17
e squines18
, possvel encontrar indcios de que os loggrafos eram considerados sofistas
por alguns autores (INNES, 2007).
Os loggrafos entregavam a seus clientes um script de um discurso que deveria ser
utilizado pelo orador diante de uma audincia. Os oradores talentosos eram capazes de recitar
ou recriar os textos memorizados, estabelecer uma relao com a audincia e provocar a
iluso de um discurso espontneo. Porm, se utilizados por amadores, o script poderia se
tornar montono. Em tal situao, o orador poderia sentir-se constrangido e prejudicar a
efetividade de seu discurso (MUIR, 2001).
Alcidamante criticou tanto o trabalho dos loggrafos como tambm o uso demasiado
da escrita como auxlio da fala diante do pblico. Para ele, era necessrio estabelecer um
contato real com a audincia e a aparncia do discurso espontneo era vital para o orador
diante dos tribunais ou da assembleia. Por isso, ele dedicou um discurso a esse tpico, Sobre
os sofistas ou Sobre aqueles que escrevem discursos escritos. O seu propsito foi convencer
o pblico de que um discurso improvisado, adaptado, direcionado para cada ocasio e cada
tipo de pblico, se pronunciado, superior quele que se limita escrita.
Percebe-se a constante depreciao da escrita em favor da fala, como na passagem que
segue:
(3) ,
.
,
,
xito rentvel, todos os recursos do logos, simultaneamente lingusticos (homonmia dos termos), lgicos
(raciocnio falso, sofismas), e racionais propriamente ditos (inaptido para o clculo e para a estratgia, tolice do
outro). (CASSIN, 2005). 16
Sobre os sofistas, 1, 6 e 13. 17
19. 246. 18
1. 94, 2. 180, e 3. 173.
23
. (Alcid.
Soph. 3).
First, then, one would look down on writing from this point of view, that it is
easy to acquire and simple and readily available to the natural disposition of
anyone who happens to want it. For speaking on the spot in a fitting way
about whatever presents itself, and employing a swift richness of argument
and vocabulary, and following with a sure track the critical moment in affairs
and peoples inclinations, and using appropriate language is not a universal
natural gift nor does it come from just any sort of training. (MUIR, 2001).
Por outro lado, havia aqueles que faziam o uso profissional da escrita, para
disseminao e memorizao de seus discursos, porque eram impedidos de falarem em
pblico, como o caso de Lsias que, por no ser cidado residente de Atenas, no tinha o
direito de participar da vida pblica, restando-lhe apenas contribuir escrevendo discursos para
os outros proferirem.
De maneira semelhante, Iscrates no era capaz de argumentar oralmente diante de
uma assembleia por conta de uma deficincia. Isso fez com que ele escrevesse discursos para
que outros os lessem. Antifonte era outro intelectual do sculo V a.C. que tinha averso em
falar em pblico e, por isso, no aparecia diante da assembleia ou de qualquer cena pblica, a
no ser em sua prpria defesa. Ele comeou a escrever discursos inteiros para que outros
memorizassem e os proferissem por volta de 430 a.C. Por causa dessas prticas, surgiu a
tradio dos grandes loggrafos que continuaram pelos sculos seguintes (GAGARIN, 1998).
Antifonte considerado um dos primeiros a ter em mos um texto escrito enquanto
falava diante do tribunal19
. Acredita-se que ele o tenha utilizado como um lembrete, e a partir
de ento, este ato tornou-se mais comum, porm, cr-se que a prtica habitual era aquela
relatada por Plato, em Fedro, de memorizar e proferir o discurso (MUIR, 2001).
Apesar de sua opinio a favor da supremacia da fala em relao escrita, Plato no a
rejeitou completamente, j que seus dilogos foram escritos por ele mesmo. Ainda em Fedro,
276d, ele declara que a escrita pode ajudar na memria dos mais velhos e auxiliar os
estudantes no estudo da filosofia se utilizada propriamente. A preferncia de Plato pela
19
A tradio acadmica se divide entre Antifonte ou Precles serem o primeiro orador portando consigo o texto
escrito como auxlio memria.
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oralidade independe da inteno de divulgao dos textos filosficos, j que a escrita lhe era
necessria para construir seus textos.
Portanto, a escrita poderia servir a um propsito, desde que acompanhada pelo dilogo
filosfico (KRAUT, 2006). Por outro lado, acredita-se que Plato no tenha escrito seus
pensamentos mais importantes20
, deixando-os apenas para a discusso filosfica. Assim, mais
uma vez, pode ser vista a dicotomia de uma sociedade de tradio oral lidando com a vinda
do letramento.
A preferncia de Plato pelo discurso oral surge de sua incapacidade de compreender
as implicaes histricas dos dois modos de comunicao o oral e o escrito coexistindo
no momento de t