UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Faculdade de Educação ......Não poderia esquecer de você professora...

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Faculdade de Educação Programa de Pós-Graduação Mestrado em Educação CONTRIBUIÇÕES DA TELENOVELA À INCLUSÃO SOCIAL DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA: UM ESTUDO DE CASO A PARTIR DA RECEPÇÃO DA TELENOVELA AMÉRICA Rosimary Maria Linhares Brasília-DF Fevereiro-2008

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Faculdade de Educação Programa de Pós-Graduação Mestrado em Educação

CONTRIBUIÇÕES DA TELENOVELA À INCLUSÃO SOCIAL DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA: UM ESTUDO DE CASO A PARTIR DA

RECEPÇÃO DA TELENOVELA AMÉRICA

Rosimary Maria Linhares

Brasília-DF Fevereiro-2008

CONTRIBUIÇÕES DATELENOVELA À INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA: UM ESTUDO DE CASO A PARTIR DA TELENOVELA

AMÉRICA

Dissertação de mestrado apresentada como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, na área de concentração: Tecnologia da Educação à comissão examinadora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, sob a orientação da professora Drª. Ângela Alvares Correia Dias.

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Faculdade de Educação

Área de Concentração - Tecnologia da Educação

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________ PROFª.DRª. Ângela Alvares Correia Dias (UnB)

Orientadora

_____________________________________________________________ PROFª.DRª. Maria da Glória Noronha Serpa (UniCEUB)

Examinadora

_____________________________________________________________ PROFª.DRª. Laura Maria Coutinho (UnB)

Examinadora

_____________________________________________________________ PROFª.DRª. Raquel de Almeida Moraes (UnB) - Suplente

Examinadora

Dedicatória

Aos meus familiares que sempre

estiveram presentes em todos os

momentos da minha vida, em especial

meu filho Victor que me ensinou o

verdadeiro amor e à minha irmã Vânia

Leila com seu exemplo de fé, coragem e

determinação; sobretudo, seu incentivo e

apoio incondicionais para que eu chegasse

até aqui!

AGRADECIMENTOS

A Deus Criador e Doador de toda a vida pela permissão de poder realizar

este trabalho, sempre me iluminando e fortalecendo nos momentos mais difíceis.

Aos meus pais Adilson e Lindaura que me ensinaram o verdadeiro valor de

uma boa educação na construção de um mundo melhor. Obrigada por me amarem tanto!

Aos meus parentes distantes, no Rio de Janeiro, pelo apoio, incentivo e principalmente

pela demonstração de orgulho em cada etapa vencida. Amo vocês!

Professora Vânia Lúcia, obrigada por iniciar minha jornada pelos labirintos

da academia e por motivos de força maior trilhar outro caminho. Mas saiba que sempre

serei grata pelas palavras amigas e os conhecimentos compartilhados enquanto

estivemos juntas.

Não poderia esquecer de você professora Laura, primeiro por ser uma das

responsáveis por eu estar aqui, pois foram suas palavras durante a entrevista de seleção

que aguçaram ainda mais meu desejo de participar da vida acadêmica. E depois, por

aceitar tão carinhosamente meu convite para compor minha banca examinadora.

Família linda, grata pelo apoio e compreensão de minha inúmeras ausências

nos eventos sociais devido aos compromissos acadêmicos, incluindo as longas estadias

nos finais de semana na biblioteca da UnB.

Regi, Simone, Alexandra, Itamar, Fátima, Maria Silva, Renata e Ana Lúcia,

agradecimentos especiais por serem anjos de Papai do Céu que ao me abraçarem todos

os dias no trabalho, sempre transmitiram serenidade e carinho tão necessários para

recarregar as energias e hoje poder estar aqui. Faltam palavras para agradecer Joana

D’arc e Adriana Viegas – diretoras de minha escola – pelo incansável apoio, incentivo e

ajuda para realização deste trabalho.

A todas as pessoas que fazem parte da Escola Classe 08 de Ceilândia pela

acolhida, interesse e empenho facilitando minha estada durante o processo de pesquisa.

Professora Betânia, obrigada pela confiança e o convívio com seus alunos que tanto me

ensinaram.

Simone, Miriam e Valdenice, o que seria da minha vida sem o colorido de

seus sorrisos e os encontros sempre animados que me faziam esquecer o rigor do

trabalho de pesquisa? Amo vocês meninas bonitas do laço de fita.

Drº. Renato, sua doce sinceridade, seus conselhos sábios e principalmente

seu ombro amigo, contribuíram muito para tornar o final dessa caminhada mais leve,

pois, quando tudo parecia complicado, bastavam seu apoio e incentivo para que eu

superasse mais uma barreira.

Para minhas meninas super-poderosas: Marcinha, Lucélia e Vanesca –

Florzinha, Lindinha e Docinho – só posso dizer um sonoro AMO VOCÊS! Com seus

super-corações, SEMPRE estiveram por perto me salvando dos perigos! Obrigada por

me amarem exatamente como sou, incluindo minhas qualidades e meus inúmeros

defeitos.

Naira, Rosinha e Gabi; meu super obrigada por cuidarem aí no pet tão bem

dos meus pequenos Nuno, Nina e Milo; pois sem este apoio eu não teria como sair e

estudar tranqüila e despreocupada.

Marco Aurélio, as transformações que você me proporcionou foram

fundamentais para minha chegada aqui! Tanto carinho, trabalho e dedicação só

poderiam torná-lo ainda mais especial na minha vida. Amo você!

Agradecimentos Especiais Professora Ângela, minha eterna gratidão por todo seu empenho, dedicação

e carinho para a finalização deste trabalho. Você nunca me deixou desistir, por mais

complicado que tudo parecesse, suas palavras sempre animadoras encontravam de forma

criativa uma solução para os problemas. Muito mais que orientações, nossos encontros

foram terapias que me ajudaram a superar barreiras e vencer os obstáculos; desta forma,

pude retomar novamente o controle da situação e hoje concluir este trabalho.

Obrigada por seu acolhimento num momento tão difícil da minha vida!

Jamais esquecerei sua generosidade.

“Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.” (Caetano Veloso)

RESUMO

A presente pesquisa objetiva refletir como a mídia audiovisual,

especificamente a televisão, pode contribuir na inclusão social de

Alunos com Deficiência a partir da recepção de uma

telenovela?Procuraremos, desta forma, identificar as possibilidades de

contribuição de telenovelas à inclusão social de Alunos com

Deficiência num estudo de caso da telenovela América por estudantes

de uma escola pública de Ceilândia (cidade satélite do Distrito

Federal).Dentro desse objetivo geral que norteará toda a problemática

da pesquisa de campo, buscaremos como objetivos mais específicos:

analisar a representação social que a telenovela veicula sobre a

inclusão social; analisar as representações sociais dos alunos sobre os

personagens com deficiência.

ABSTRACT

The present research aims to reflect as the audiovisual media,

specifically the television, can contribute in social inclusion of pupils

with disabilities from the reception of a soap opera - America - for

students of a public school of Ceilândia (satellite city of Federal

District). Within that general objective that guides the whole issue of the

search field, we intend to analyze as more specific goals: to examine the

social representation that conveys the soap opera on social inclusion; to

analyze the social representations of the students on the characters with

disabilities.

SUMÁRIO

Convite à reflexão 10

Na construção dos conceitos, o grande desafio

23

Revisitar as páginas da história

43

Instrumentos de mudança

51

A construção do roteiro da pesquisa

66

Contextualizando a pesquisa

74

Análise da representação social da telenovela América acerca da Inclusão

Social

77

Análise da representação social dos alunos acerca dos personagens com

deficiência da telenovela América

103

À guisa das Conclusões

112

Referências Bibliográficas

120

Anexos

129

10

Convite à reflexão

“... na nossa festa vale tudo! Vale ser alguém como eu, como você...” (As Frenéticas).

11

A inclusão social de pessoas com deficiência tem sido a proposta

norteadora e dominante na Educação Especial nos últimos anos, sendo este

movimento responsável por programas e políticas educacionais e de reabilitação

em todas as sociedades.

A reflexão sobre as práticas de exclusão ao longo da história é

necessária para pensarmos em novas concepções sociais em direção ao

reconhecimento das diferenças para atender as especificidades dessas pessoas.

Marginalizadas socialmente e alijadas de todos os processos culturais,

pessoas com alguma deficiência vêem sendo excluídas até mesmo do sistema

educacional sendo estigmatizadas, rotuladas e classificadas de acordo com suas

necessidades. Para uma sociedade excludente o que conta é o defeito da pessoa, e

não suas potencialidades.

Nas palavras de Martinez (2003, p. 81) uma concepção centrada no

sujeito e não na deficiência permite enxergar os pontos fortes para ancorar ações

educativas que permitam compreender suas potencialidades e suas possibilidades

de desenvolvimento.

O surgimento desse novo paradigma chamado de inclusão (re)

significou não só o papel da sociedade frente às diferenças, mas em especial, o

papel da escola na busca de uma educação de qualidade para TODOS1

proporcionada por um ambiente de respeito e solidariedade frente aos alunos com

necessidades educacionais especiais.

A construção dessa sociedade inclusiva no entendimento de alguns

pesquisadores (Vygotsky, 1983; Stainback e Stainback, 1999; Werneck, 2000;

Carvalho, 2004) só acontecerá efetivamente mediante a convivência dessas

crianças em ambientes menos restritivos e com colegas que não apresentem

deficiências, pois assim, TODOS aprenderão uns com os outros sobre suas

diferenças (independentemente da classe sócio-econômica de origem, idades e

1 A palavra TODOS foi escrita dessa forma, a exemplo de Werneck (2000), com o objetivo de mostrar que qualquer espaço institucional deve incluir as diversidades tornando-se um ambiente sem qualquer tipo de restrição.

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sexo) e das diferenças lingüísticas, étnicas e as defasagens de desenvolvimento

cognitivo.

É no convívio em diferentes esferas sociais que as crianças –

deficientes ou não - se constituem enquanto sujeitos histórico-culturais e adquirem

valores, conceitos, elaborações de idéias e representações do mundo que as

cercam. Para Vygotsky (1991) o desenvolvimento da criança é sempre forjado nas

relações sociais que suas vivências propiciam desde seu nascimento e é no

contexto dessas relações que elas se constroem pouco a pouco. Ressalta-se neste

processo a influência da família, dos amigos, da escola e em especial, dos meios

de comunicação. Pois, ao chegar à escola, estas crianças trazem mediante seu

contato diário com a televisão, um saber próprio com uma forma peculiar de

elaborar seus conhecimentos e re-significar as informações, cabendo ao professor

proporcionar-lhes interações e novas formas de aprendizagens partindo do estudo

da relação educação – televisão.

Coutinho (1998) nos coloca que uma das principais características do

mundo atual consiste no fato de que diferentes espaços se interpenetram. Não se

pode mais pensar em lugares isolados, separados dos demais. Nessa acepção, a sala

de aula sistematizada na sociedade contemporânea não pode mais ser compreendida

como um lugar isolado, mas sim como um lugar impregnado de outros lugares. A TV

não apenas nos traz o mundo para dentro da escola por meio dos diversos programas,

mas, igualmente, situa a escola numa outra perspectiva.

Pesquisas realizadas sobre recepção televisiva (Orozco, 1991; Martín-

Barbero, 1997; Vilches, 1997; Carneiro, 1999) identificaram que o sujeito como

receptor ativo – em oposição ao modelo mecânico2 - pertence a um contexto

sociocultural específico e que por isso, recebem a influência de pais, professores e

colegas durante seu processo de recepção de mensagens. A recepção é parte tanto

de processos subjetivos quanto objetivos, de processos controlados pelo sujeito; e

àqueles relativos a estruturas sociais e relações de poder que fogem ao seu

controle, passando a ser vista – a mediação – como momento privilegiado da

produção de sentido, refutando a concepção reprodutivista e firmando que “mais

2 Considerava a iniciativa da comunicação toda do emissor, ficando o receptor restrito a reagir aos estímulos enviados (Carneiro, 1997).

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do que de meios, a comunicação se faz hoje questão de mediações, isto é, de

cultura (Martín-Barbero, apud Lopes 2002, p.22)”. Dessa forma seus valores

culturais, experiências e comunicações habituais tornam esses espaços televisivos

em produção de sentido e de conhecimentos.

A relevância deste tema de pesquisa relaciona-se com a importância

que os meios de comunicação assumem hoje na vida das pessoas, pois segundo

Leal (1986) a televisão ocupa grande parte do tempo das mais variadas classes

sociais tornando-se assim um dos lazeres fundamentais nestes segmentos que

diariamente ligam seus aparelhos para participarem de histórias que falam dentre

os muitos assuntos; de amores, desafetos, igualdade.

A escolha de uma telenovela como mediadora para a discussão acerca

da inclusão social justifica-se pelo fato de que este gênero televisivo é um

instrumento fundamental de potencialização, demonstrando a fascinação tão

grande que a maioria dos telespectadores conversa sobre o que assistem,

influenciando-se mutuamente na construção dos significados construídos durante

e depois de cada capítulo. Nas palavras de Lopes, Borelli e Resende (2002) a

telenovela mistura a sagacidade do mercado a partir do momento em que conta

histórias que envolvem as maiorias, bem como na persistência de sua matriz

popular ativadora de competências culturais inerentes a ela. Assim, para as

mesmas autoras, a pesquisa de recepção no cenário atual é tida como uma corrente

de renovação dos estudos de comunicação sobre o público.

Não podemos esquecer ainda que o tema da inclusão social faz parte

de uma proposta mundial na busca por sociedades mais justas e igualitárias, onde

TODOS possam exercer sua cidadania, expressa através de documentos

internacionais, tratados, convenções e até mesmo leis que garantam a

concretização deste novo paradigma.

Esta pesquisa apresenta ainda como compromisso, o desejo de

encontrar nos sujeitos à construção sócio-histórica de sua condição existencial

haja vista que muitas vezes ela é perdida quando o homem é transformado em

objeto e, por conseguinte, perde tanto sua identidade como sua história. Nas

palavras de Kramer (2004; p.498) isso significa perceber as pessoas

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reconstituindo-se como sujeitos e, nesse processo, reconstituindo sua história e

cultura, escutando o que não pode ser expresso e levando em consideração o que

foi deixado de fora.

O interesse pelo tema, nasceu de minhas inquietações durante o

trabalho com crianças deficientes que me levaram a realizar um curso tendo como

objetivo capacitar profissionais de escolas públicas de ensino fundamental e

médio para a utilização, no cotidiano escolar, dos recursos proporcionados pelas

tecnologias da informação e da comunicação, com ênfase na linguagem

audiovisual chamado TV na Escola e os Desafios de Hoje realizado pelo

Ministério da Educação em parceria com a Universidade de Brasília. Este curso de

formação representou um espaço de instrumentalização e de reflexão sobre

abordagens pedagógicas da TV em sala de aula resultando em práticas

pedagógicas mais atraentes e prazerosas, mas nem por isso menos desafiadora. No

material a ser estudado faziam-se presentes em seus textos sugestões pioneiras

de uso de telenovela na educação especial exibida na época e que apresentava um

jovem com deficiência, despertando ainda mais minha curiosidade acerca do

trabalho pedagógico no Ensino Especial com a televisão.

Para o trabalho final do curso desenvolvemos em nossa escola um

projeto sobre o uso do vídeo protagonizado pelas crianças. Todos os eventos

realizados na escola foram planejados, gravados e depois exibidos para as turmas.

Chamou-nos a atenção o grande interesse dos alunos pelo vídeo e como era

importante para eles se verem ali na televisão.

A partir dessa experiência resolvi inserir essa atividade na minha sala

de aula usando o vídeo, antes restrito às festividades e agora passamos, dessa

forma, a gravar também momentos corriqueiros, realização de exercícios e

conversas sobre os mais diferentes assuntos. Constatei mudanças no

comportamento dos alunos, pois a cada exibição das imagens, sentiam sua auto-

estima mais elevada e que suas realizações (pintura, escrita, vocabulário...)

estavam sendo valorizadas transformando assim a televisão em ferramenta de

ensino-aprendizagem.

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A busca por aprofundar os estudos e avançar as práticas, bem como

minhas pequenas descobertas e angústias pela falta de respostas aos vários

questionamentos surgidos durante a realização deste curso, me motivaram a

ingressar no programa de pós-graduação da Faculdade de Educação-UnB, na

expectativa de refletir e discutir novos procedimentos teóricos – metodológicos

que poderiam transformar e recriar minha prática pedagógica.

Como pesquisadora–iniciante, muitas vezes procurei negar o meu

“eu” preocupada apenas com o rigor dos procedimentos científicos; mas ao longo

da jornada percebi que é impossível dissociar sonhos, emoções, esperanças e

interesses pessoais para realizar uma pesquisa exclusivamente objetiva, pois

segundo Lüdke e André (1986) como atividade humana e social, a pesquisa traz

consigo, inevitavelmente, a carga de valores, preferências interesses e princípios

que orientam o pesquisador.

Para Laville e Dione (1999, p.35) o pesquisador é como um ator,

agindo e exercendo sua influência, pois em ciências humanas os fatos raramente

podem ser considerados como coisas uma vez que os objetos de estudo, também

como atores, pensam, agem e reagem, assim como o pesquisador. Frente aos fatos

sociais, ele tem preferências, inclinações, interesses particulares. Dizem eles: “Em

ciências humanas, o pesquisador é mais que um observador objetivo: é um ator aí

envolvido”.

A mídia pode contribuir na construção de uma sociedade inclusiva

uma vez que os meios de comunicação de massa constituem-se, em sua grande

maioria, como propagadores de conceitos e idéias que influenciam toda uma

sociedade. Embora muitas vezes esses veículos de comunicação sejam

responsáveis pela desinformação levando os cidadãos ao preconceito e à

discriminação, dificultando assim a criação de espaços para o exercício pleno da

cidadania de TODOS.

Este estudo apresenta como instrumento de pesquisa a recepção de

capítulos reeditados da telenovela “América” da Rede Globo de Televisão, que foi

ao ar nacionalmente de 14 de março a 04 de novembro de 2005 por volta da 21h –

16

apesar de receber o nome de novela das oito3 – de segunda a sábado, sendo

apresentada em 203 capítulos.

A escolha do gênero telenovela para a realização deste trabalho deve-

se ao fato de ser este o programa de maior audiência no país, dominando o horário

nobre das emissoras e caracterizando em fenômeno de mobilização diante da TV.

Torna-se com isso, na opinião de Almeida (2003, p.24), não apenas um produto

responsável por gerar lucros, mas também por fazer parte de conversas que tecem

o conjunto de referências sociais de crianças, adolescentes e adultos, pois é

presença constante no cotidiano do povo brasileiro.

A telenovela chegou ao Brasil na década de 40 tendo a radionovela

como antecessora, uma década depois – 1950 com a implantação da TV – TUPI

(primeira emissora comercial brasileira). Sua expansão ocorre entre 1950 e 1969

proporcionada pelo grande desenvolvimento técnico; assim, no final da década de

50, Rio e São Paulo já contavam com algumas emissoras, mas a televisão ainda

constituia-se numa aquisição recente e o teleteatro significa um gênero que

impulsiona a modernidade cultural, diante do conservadorismo estético e político

das elites estando a meio caminho entre a radionovela e a telenovela, dando sua

contribuição, numa televisão nascente. Para Martín-Barbero e Rey (2001, p. 41) a

ligação da telenovela com a cultura oral terá a radionovela como grande

mediação, pois dela conservará a predominância do contar a e conservará também

a abertura indefinida do relato. Da Matta (1985; p.196) a telenovela é um relato

no qual o autor, o leitor e as personagens trocam constantemente de posições,

construindo e reconstruindo significados.

No Brasil, segundo Ortiz (1991) a telenovela chega ao início dos anos

60 marcado pelo desprestígio, mas com certa presença, conseguindo atravessar

mais de uma década no vídeo sendo possível neste momento captar uma mudança

de atitude do público em relação a este gênero, pois, na medida em que a televisão

se populariza, a novela tende a superar a antiga preferência pelos programas

culturais como o teleteatro, por exemplo. 3 Este termo faz referência a um nome mais do que a uma descrição, sendo usado inclusive no senso comum e na mídia impressa ajudando a manter um padrão de referência que é muito estimulado pela emissora. A “novela da oito” é vista como uma espécie de “instituição nacional” pela sua grande audiência e presença cultural (Almeida, 2003; p.64).

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A partir da virada dos anos 60/70, a telenovela se encontra imersa

num processo cultural cada vez mais atravessado pelos influxos modernizadores

da sociedade e coercitivos do Estado constituindo para Ramos e Borelli (1991) um

momento de consolidação definitiva da televisão brasileira enquanto indústria,

pois sua produção em escala acaba por subordinar-se tanto às determinações

empresariais como às econômicas. Aqui, percebe-se que seu fio narrativo desta

matriz, de acordo com Carneiro (2001) enlaça-se racionalidade técnica e a lógica

de mercado com emoções e desejos de um cotidiano vivido pelos receptores.

A evolução da telenovela na década de 70 tem na tecnologia sua

abordagem principal, pois sem o desenvolvimento tecnológico não haveria a

novela, da forma como ela é atualmente. A técnica permitiu à novela – através do

editor eletrônico e da câmera e do TV portáteis – sair dos estúdios e ganhar a rua.

Hoje, seu espaço é o mundo e isso determinou uma mudança na concepção da

telenovela, sobretudo, na temática. O videoteipe (VT) constituiu-se no divisor de

águas na história da televisão em todo o mundo, dando-lhe o sentido de obra

duradoura, como a do cinema (Távola, 1985). Para Melo (1988, p.28-29) a

inexistência dessa limitação geográfica, proporcionou à telenovela cumprir um

papel de integração nacional e de desvendamento de realidades até então

desconhecidas pela maioria da nossa população.

Segundo Carneiro (1999) nos anos 70 surgem às tentativas de se fazer

um trabalho ficcional “não alienado” fundamentadas no ideário politizado dos

debates sobre cultura brasileira nos anos 50 e 60, as telenovelas brasileiras

começam a introduzir referências a questões políticas e culturais, inovando o

gênero e dando origem à linha de crítica social e política definida como realismo,

sendo essa característica pioneira denominada hoje de marketing social ou

também chamada de merchandising social (Carneiro, 1999). De acordo com

Ramos e Borelli (1991) essas alterações do padrão ficcional nos anos 70 estão

combinadas também com acomodações na preferência do público em relação ao

gênero uma vez que havia concebido anteriormente como “coisa de mulher”,

conceito herdado com a radionovela. Apesar de atraírem, sobretudo as mulheres,

também passaram a interessar um número considerável de homens.

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É também nos anos de 1970, segundo Hamburger (2000, p.25-26) que

na recém-criada Rede Globo de Televisão, as novelas começaram a ocupar de

maneira consistente a posição de programa mais assistido, de acordo com os

índices do Ibope (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), posição

que o gênero ainda mantém até hoje.

Ressalta-se a importância desta emissora ao desempenhar um papel

decisivo na popularização da telenovela a partir do momento em que a transforma

do gênero folhetinesco, melodramático e estrangeiro numa novela ligada à

realidade brasileira.

Enquanto produto cultural, a telenovela produzida pela TV Globo

assume características singulares que, na análise feita pelo crítico Artur da Távola

(1985), a torna diferente de outras dramaturgias. É importante reproduzir o seu

perfil.

1. Destina-se a um consumo indiscriminado, chegando ao culto e ao não-culto e

tal realidade molda-lhe forma e conteúdo.

2. Vive da aceitação do mercado e está em íntima relação com quem a consome,

por isso, o telespectador é pesquisado, conhecido; logo sua opinião tem peso.

3. Seu mercado se manifesta ao longo dos capítulos e precisa ser permanentemente

“consultado” por pesquisas.

4. A produção precisa obedecer ao veloz andamento e na sua realização a

telenovela possui um ritmo industrial.

5. As proposições estéticas e culturais devem-se enquadrar no repertório

conceitual do público não podendo seu autor jamais fazer um discurso isolado,

sem estabelecer pontes de relacionamento com o público.

6. Dificilmente a telenovela é obra de um criador isolado, pois seu resultado final

depende da equipe realizada.

Nos anos 80 a novela domina a programação nacional e compete com

a produção importada de filmes tornando-se um gênero fundamental, superando a

audiências dos shows de auditório e noticiários, nesta fase de acordo com vários

pesquisadores (Ramos e Borelli, 1991; Hamburger, 2000) as novelas passam a

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acompanhar o processo de democratização e passam a privilegiar temas e imagens

nacionais.

Na década de 90, as representações nacionais consolidadas

anteriormente se transformam e a novela chega a intervir diretamente na

conjuntura política e social, podendo ser exemplificada através de pesquisas

realizadas sobre a telenovela “O Rei do Gado” por Hamburger (2000) e Almeida

(2003) demonstrando que o folhetim eletrônico capta e expressa os paradoxos de

uma sociedade em que o desgaste crescente da política institucional leva à busca

de mecanismos informativos e formadores de opinião alternativos.

A análise da telenovela passa pelo exame da relação do produto com

o usuário verificado por meio das unidades que o representam: os capítulos.

Segundo Távola (1996, p.39) nela não há a idéia de obra, pois quando esta se

conclui acaba também o espetáculo e é por isso que só se pode considerar o

capítulo que se torna assim seu representante, ou seja, o único elemento palpável,

considerado a obra diária, a sua materialização progressiva é a medida de sua

qualidade.

A popularidade da ficção televisual no Brasil começou quando as

novelas descobriram a realidade brasileira e a desvendou em capítulos diários

oferecidos para o deleite e distração do público telespectador, fascinados com a

possibilidade de exercitar a sua fantasia cotidiana através de produções artísticas

em que podiam reconhecer-se e ao seu meio ambiente, estabelecendo com esse

gênero, identidades e representações. Este fascínio das multidões que seguem

estes capítulos se alimenta também pela consciência de que estão participando de

um passatempo, de um divertimento. A criação de suspenses diários motiva os

telespectadores a retornarem o fio da meada no dia seguinte, criando o que Melo

(1988, p. 53) chama de “catarse coletiva”.

Desta forma, os capítulos das telenovelas caracterizam-se por uma

redundância de acontecimentos, onde um início é sempre um final no dia anterior,

e o final será o início no dia seguinte e de acordo com Leal (1986, p. 48) a

repetição reforça o apelo identitário que se baseia na mobilização de afetos.

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A penetrabilidade da telenovela em todos os lares pode ser constatada

através de pesquisa realizada pela antropóloga Leal4 que discute em seu trabalho a

premissa de que não é só a classe popular que vê novela, segundo a autora, a outra

classe (os ricos) também o faz.

Sendo a telenovela um produto informal de formação social, sua

utilização em sala de aula pode proporcionar importantes momentos na construção

das representações; transformando-a em caráter educativo, ou seja, em objeto de

estudo capaz de levar à reflexão sobre o seu uso e os valores que veicula.

Para Immacolata (2002, p. 23) a telenovela é entendida como um

constructo que ativa na audiência5 competências cultural e técnica na montagem

de um repertório que a princípio constitui-se em individual, mas que

posteriormente passa a ser compartilhado por representações identitárias. Segundo

a mesma autora, a telenovela permite pensar a subjetividade como lugar de

formação de identidades e sensibilidades que a interpelam e são por ela

interpeladas na forma de auto – reconhecimento, nas relações entre “o real” e “o

ficcional”, nos valores compartilhados ou contestados, nas subjugações e

distanciamentos, assim como no contraste entre as mais diferentes representações

sociais.

A novela América a ser utilizada na pesquisa de campo pode ser

entendida de acordo com a proposta de Amália Martinez (1989; apud Vilches,

1999; p. 156-157) que sugere a telenovela de tipologia aberta baseada nas

seguintes características:

1) Estruturas já definidas desde o começo, mas que permitem um grande número

de combinações narrativas.

2) Os personagens não estão definidos totalmente o que supões grande

mobilidade dentro da telenovela.

3) Estas obras são redundantes e suas intrigas seguem uma própria alimentação:

os desenlaces de um acontecimento dramático servem para iniciar outros.

4 Leal, Ondina Fachel. A leitura social da novela das oito. Petrópolis: Vozes, 1990 2ª edição. 5 Conjunto segmentado a partir de suas interações mediáticas de sujeitos sociais, ativos e interativos, que não deixam de ser o que são enquanto travam alguma relação sempre situada com o referente mediático, seja esta direta, indireta ou deferida (Orozco, 2001; p. 23).

21

4) Os personagens são muito estereotipados e para isso utilizam os gestos e as

vestimentas como marcas fortes de reconhecimento.

5) Os argumentos são múltiplos e podem coincidir ou separar-se arbitrariamente

seguindo as necessidades da produção ou da audiência.

6) “Os finais do capítulo deixam sempre uma situação dramática para o capítulo

seguinte”.

Assim, para Martín-Barbero e Rey (2001, p. 151-152) mais do que um

gênero dramático, a telenovela resultou em uma matriz cultural que alimenta o

reconhecimento popular, sociocultural constituindo-se num âmbito do desfazer-se

e do refazer-se das identidades coletivas através das representações.

Sendo as representações sociais responsáveis por nos permitirem dar

significado/sentido a um objeto, tornando as relações mais complexas, trazendo

embutidas em si uma história, a história de cada sujeito; este estudo mediado pela

telenovela busca justamente a análise de processos que fazem o sujeito reagirem

sob a influência de diversos contextos aos quais está inserido quando da

construção do seu conceito acerca da deficiência, bem como da inclusão. Para

tanto, faz-se necessário conhecer um breve histórico sobre a evolução destes

conceitos ao longo de nossa história.

Ao buscar apoio nos estudos de Vygotsky fiz minha opção em refletir

acerca das concepções apresentadas pelos sujeitos no que se refere à deficiência,

na tentativa de analisar seus discursos pautando-me na perspectiva sócio –

histórica ancorada pela teoria da representação social cunhada por Moscovici.

Pautando-se nas premissas de que o trabalho com o audiovisual,

especialmente a TV, permite uma infinidade de atividades e que um programa não

precisa ser especificamente educativo para o trabalho em sala de aula é que esta

pesquisa encontra seu objeto de estudo por meio da seguinte pergunta: Como a

televisão pode contribuir na inclusão social de Alunos com Deficiência a

partir da recepção de uma telenovela?

Procuraremos desta forma identificar as possibilidades de

contribuição de telenovelas à inclusão social de Alunos com Deficiência num

22

estudo de caso da telenovela América por estudantes de uma escola pública

de Ceilândia (cidade satélite do Distrito Federal).

Dentro desse objetivo geral que norteará toda a problemática da

pesquisa de campo, buscaremos como objetivos mais específicos analisar tanto a

representação social que a telenovela veicula sobre a inclusão social; bem como as

representações sociais dos alunos sobre os personagens com deficiência.

Assim, o presente trabalho pretende identificar qual é a representação

social acerca da deficiência que possuem os colegas de alunos deficientes que

vivenciam o processo de inclusão social dentro de uma classe regular de ensino,

utilizando como mediadora deste estudo a recepção da telenovela “América”, para

considerar também o acesso e permanência desses alunos nessas classes

identificando fatores como: representação da inclusão e da pessoa com

deficiência.

23

Na construção dos conceitos, o grande desafio

“Você não sabe o quanto eu caminhei pra chegar até aqui! Percorri milhas distantes... Eu não cochilei...” (Cidade Negra)

24

Este estudo concentra-se na análise da realidade da escola que busca

inserir crianças com deficiências no sistema regular de ensino, por meio dos

aspectos culturais ou socialmente construídos, acerca da representação social de

seus alunos sobre a “deficiência” nesse contexto. Utilizaremos como mediadora

dessa discussão a telenovela América.

Para melhor compreensão deste trabalho, necessita-se o estudo dos

conceitos tanto da “Teoria das Representações Sociais” de Moscovici já que esta

representa a verbalização das concepções que temos do mundo que nos cerca e

também podemos identificar aqui os valores e os aspectos fundamentais para a

compreensão de nossos comportamentos sociais; bem como os fundamentos da

“Concepção Sócio-Histórica” cunhada por Vygotsky como forma de conhecer a

constituição histórico – cultural dos sujeitos e sua influência na construção dessas

representações sociais.

Desta forma, nosso trabalho tem por objetivo identificar o impacto

da telenovela América nas representações sociais dos sujeitos sobre a inclusão

social de Alunos Deficientes e como essas representações articulam-se entre si e

determinam a atitude das pessoas frente a essa construção.

Moscovici um psicólogo romeno naturalizado francês, nascido em

1925 em seu estudo pioneiro sobre a psicanálise introduziu o conceito de

representação social relatado em sua obra original “La psycanalise son image et

son public” (primeiro publicada na França em 1961 e ganhando uma segunda

edição em 1976) sendo que essa representação diz respeito a teorias ou ciências

coletivas destinadas a interpretação do real e vão além do que é imediatamente

dado na ciência ou na filosofia, da classificação de fatos e eventos. Representar

socialmente uma coisa não consiste em desdobrá-lo, repeti-lo ou reproduzi-lo;

seria reconstituí-lo, retocá-lo, modificar-lhe o texto.

As representações sociais são abordadas na psicologia social no

âmbito do seu campo, seu objeto de estudo – a relação indivíduo- sociedade – e de

um interesse pela cognição, ainda que não esteja situado no paradigma clássico da

psicologia, pois ela reflete sobre como os indivíduos, os grupos, os sujeitos

sociais, constroem seu conhecimento a partir de sua inserção social e cultural por

25

um lado, e como a sociedade se dá a conhecer e constrói esse conhecimento com

os indivíduos por outro.

Na teoria da representação social o próprio conceito de representação

possui um sentido mais dinâmico, referindo-se tanto ao processo pelas quais as

representações são elaboradas, como às estruturas de conhecimento que são

estabelecidas. Partem da premissa de que existem formas diferentes de conhecer e

de se comunicar, guiadas por objetivos diferentes. Moscovici define uma

representação social como:

Um sistema de valores, idéias e práticas, com uma dupla função:

primeiro estabelecer uma ordem que possibilitará às pessoas orientar-

se em seu mundo material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar,

possibilitar que a comunicação seja possível entre os membros de

uma comunidade, fornecendo-lhes um código para nomear e

classificar, sem ambigüidade, os vários aspectos de seu mundo e da

sua historia individual e social (1976; 2005, p.21).

Ao argumentar que “o propósito de todas as representações é tornar

algo não-familiar, ou a própria não-familiaridade, familiar”, Moscovici apóia essa

idéia em dois processos básicos: a objetivação e a ancoragem. Objetivar é

transformar uma abstração em algo quase físico. A objetivação é um processo

decomposto em três fases: construção seletiva, esquematização estruturante e

naturalização, no qual as duas primeiras manifestam o efeito da comunicação e

das pressões ligadas ao pertencimento social dos sujeitos acerca da escolha e da

organização dos elementos constitutivos da representação. Desta forma cristaliza-

se uma representação de modo que as noções abstratas são transformadas em

imagens cujo conteúdo interno após descontextualizar-se forma um núcleo

figurativo para, por fim, transformar as imagens em elementos da realidade.

Importante também é salientar que para qualificar uma representação como social

é preciso definir o agente que a produz e enfatizar que a representação tem como

função contribuir exclusivamente para os processos de formação de condutas e de

orientação das comunicações sociais.

Ancorar é trazer para categorias e imagens conhecidas o que não está

ainda classificado e rotulado, enraizando a representação a seu objeto numa rede

26

de significações que permite situá-los em relação aos valores sociais e dar-lhes

coerência. Nas palavras de Jodelet (2001, p.39) “por um trabalho da memória, o

pensamento constituinte apóia-se sobre o pensamento constituído para enquadrar

a novidade a esquemas antigos, ao já conhecido”. É transformar o que é estranho

em algo familiar, ou seja, ancorar o desconhecido em representações já existentes.

Assim, o novo objeto da representação ganha sentido; o que é novidade passa a

ser parte integrante e enraizada no sistema de pensamento ou em outras

representações e, por sua vez, passa a fazer parte do sistema de integração entre o

indivíduo e o mundo social porque o que é comum ao grupo permite compartilhar

comunicação e influenciar a ação. Serve para a instrumentalização do saber

conferindo-lhe um valor funcional para a interpretação e a gestão do ambiente

dando assim, continuidade à objetivação.

Ao tornar o não-familiar em algo familiar nossas representações

sociais acionam a memória que nos impede de sofrer súbitas modificações por um

lado e de fornecer a dose certa de independência dos atuais acontecimentos. Para

Moscovici:

Ancoragem e objetivação são, pois, maneiras de lidar com a memória.

A primeira mantém a memória em movimento e a memória é dirigida

pra dentro, está sempre colocando e tirando objetos, pessoas,

acontecimentos, que ela classifica de acordo com um tipo e os rotula

com um nome. A segunda, sendo mais ou menos direcionada para

fora (para outros), tira daí conceitos e imagens para fazer as coisas

conhecidas a partir do que já é conhecido (2005, p.78).

Na tentativa de recuperar historicamente o conceito de representações

sociais, Moscovici afirma que este passou por diversas fases, sendo que os

estudiosos de seu período inicial estavam mais preocupados com o caráter

coletivo das representações do que com seu conteúdo ou dinâmica. Destaque para

Dukheim (1895; apud Moscovici, 2005) que foi o primeiro a propor a expressão

“representação coletiva” como forma de designar a especificidade do pensamento

social em relação ao pensamento individual. Mas para Moscovici (2005, p.62)

esse modelo estático foi superado a partir do momento em que as representações

coletivas cederam espaço às representações sociais havendo a valorização da

diversidade de origem desses conceitos tanto nos grupos como nos indivíduos,

27

reconhecendo-se assim, que as representações sociais “são ao mesmo tempo,

construídas e adquiridas, tirando-lhes esse lado preestabelecido, estático, que as

caracterizava na visão clássica”.

E apesar de evidente essa influência de Durkheim na noção de

representações sociais, Moscovici (2005, p.49) caracteriza sua noção de

representação social como “fenômenos específicos que estão relacionados com

um modo particular de compreender e de se comunicar – um modo que cria tanto

a realidade como o senso comum”.

Aqui o senso comum abrange o que Moscovici chama de universo

consensual, em oposição ao universo reificado no qual através das ciências nós

obtemos a compreensão do mundo que nos cerca. A compreensão das

representações não necessita de nenhum conhecimento especializado, pois elas

“restauram a consciência coletiva e lhe dão forma, explicando os objetos e

acontecimentos de tal modo que eles se tornam acessíveis a qualquer um e

coincidem com nossos interesses imediatos” (Moscovici, 2005; p. 52). A chave

para a compreensão das representações sociais está no senso comum.

O estudo das representações sociais dentro da Psicologia Social

transformou-se num campo de muitas convergências entre seus pesquisadores

(Coldol, 1969; Farr, 1977,1984 e 1987; Herzlick, 1972; Harré, 1984; Jodelet,

1984; Potter e Litton, 1985) resultando num espaço de estudo multidimensional.

De acordo com Jodelet (2001, p.17) as representações são criadas

sempre que existe a necessidade de informação acerca do mundo à nossa volta,

pois, além de nos ajustar a ele, precisamos saber como nos comportar, dominá-lo

física ou intelectualmente e ainda, identificar e resolver os problemas que se

apresentam. São as representações sociais que nos guiam no modo de nomear e

definir conjuntamente os diferentes aspectos da realidade diária, no modo de

interpretar esses aspectos e tomar decisões.

A análise das representações que um indivíduo tem do mundo exige a

captação da visão que este tem de seu mundo e onde tal visão dependerá do lugar

ocupado pelo indivíduo em relação aos outros. Esta relação é tanto objetiva como

28

subjetiva, existindo a confrontação de um com o outro e, ao mesmo tempo, com a

imagem que elabora do outro. A sociedade além de ser composta por indivíduos,

é composta também por fatos sociais de diferentes maneiras, inclusive como

fenômenos abstratos de consciência coletiva e sua manifestação constituindo-se

também a partir das experiências, dos conhecimentos, informações e modelos de

pensamentos transmitidos, cotidianamente, através da tradição, educação e

comunicação social. Toda representação define-se por seu conteúdo, o qual tem

como elementos conceitos e imagens criadas por alguém a respeito de um objeto,

de forma a se relacionar com outras pessoas.

Dessa forma, os processos de construção da representação de si

através do encontro com o outro é a representação da alteridade conceituada nas

palavras de Arruda (2002, p.60), como o produto de um duplo processo de

construção e de exclusão social, pois sua abordagem deve compreender, de

maneira conjunta, os níveis interpessoal e intergrupal. Corroborando com esse

pensamento, Jovchelovitch afirma que a consciência do outro em sua alteridade,

ou seja, a consciência da diferença é um problema de proporções históricas e de

contínua importância na vida de grupos e de comunidades, haja vista que sem o

reconhecimento do outro6, a produção de sentido e seus correlatos seriam

inexistentes. Para ela, o outro não está lá simplesmente, mas emerge enquanto tal

quando é reconhecido, referindo-se nesse sentido a tudo que se torna um objeto do

conhecimento, inclusive no momento em que o eu torna-se um objeto para si

mesmo.

Não basta, portanto, admitir a realidade do outro. É necessário

reconhecê-la como a realidade de um sujeito legítimo, que não possui apenas o

papel de me constituir enquanto eu, que não está lá simplesmente esperando para

ser reconhecido pelo sujeito do saber. Ao contrário, o outro está lá, ele próprio,

enquanto eu, com projetos, desejos e perspectivas que lhe são próprias. Não sendo

redutível ao que o eu pensa ou sabe sobre ele, sendo este, de acordo com

Jovchelovitch (2002) irredutível na sua alteridade.

6 Para a autora outro aqui se refere a objetos humanos e não – humanos, uma vez que eles se tornam reconhecidos como objetos do conhecimento.

29

Ao estudar as representações sociais, estudamos como o ser humano

procura compreender o mundo e não como ele se comporta. Para Moscovici

(2005) a compreensão é uma faculdade inerente ao ser humano, mas antes se

acreditava que ela fosse advinda do mundo externo, mas que agora se acredita que

a comunicação social possui importância fundamental nesta construção da

compreensão do mundo. Para o autor:

A compreensão é a faculdade humana mais comum. Acreditava-se

antigamente que esta faculdade fosse estimulada, primeira e

principalmente, pelo contato com o mundo externo. Mas aos poucos

nós fomos dando conta que ela na realidade brota da comunicação

social (Moscovici, 2005; p.43).

Moscovici (2003) considera que nunca podemos obter nenhuma

informação que não tenha sofrido distorções devido a essas representações, cuja

primeira função é convencionalizar objetos ou pessoas. Essa forma convencional

facilita a compreensão e o encaixe em categorias predeterminadas. Para o autor,

“nenhuma mente está livre dos efeitos dos condicionamentos anteriores que lhe

são impostos por suas representações, linguagem ou cultura” (Moscovici,

2003:35). Tais convenções, no entanto, costumam ser inconscientes e dificilmente

temos noção delas – e esse é, justamente, seu principal trunfo, pois tendemos a ver

o mundo representado como o natural, a realidade única, a verdade por excelência.

A segunda função das representações é funcionar com força prescritiva, ou seja,

como uma noção de continuidade, de algo que já existia antes de nós e que

continuará a existir depois de nós, conforme podemos observar adiante:

Todos os sistemas de representações, todas as imagens e todas as

descrições que circulam dentro de uma sociedade, mesmo as

descrições científicas, implicam um elo de prévios sistemas e

imagens, uma estratificação na memória coletiva e uma reprodução

na linguagem que, invariavelmente, reflete um conhecimento anterior

e que quebra as amarras da informação presente (MOSCOVICI,

2003:37).

As representações sociais são autônomas e nos pressionam a vê-las

como realidades incontornáveis. Para Moscovici (2003), elas podem até ser

comparadas a um objeto material, tamanho seu peso, ou mesmo como algo mais

30

pungente ainda. “Talvez seja uma resistência ainda maior, pois o que é invisível é

inevitavelmente mais difícil de superar do que o que é visível” (MOSCOVICI,

2003:40). Quanto mais a representação se distancia do convencionalismo de suas

origens, mais se parece fossilizada e imutável. Dessa forma, como já foi sugerido

anteriormente, mais influentes se tornam quanto menor é nossa consciência delas.

Moscovici argumenta que os meios de comunicação de massa

aceleraram a crescente penetração das representações sociais na vida cotidiana e

se tornar parte da realidade comum, multiplicando tais mudanças e aumentando a

necessidade de um elo entre o conhecimento do senso comum com nossas

atividades concretas como indivíduos sociais. Desta forma a televisão tem uma

capacidade peculiar de captar, expressar e atualizar representações através de uma

comunidade nacional imaginaria, sendo a telenovela o programa de maior

popularidade e lucratividade da televisão brasileira.

Exercendo um papel de fundamental importância na representação da

sociedade frente ao meio televisivo, a telenovela torna presente através de formas

e figuras um mundo real ou possível, da experiência direta e concreta ou mesmo

da fantasia, quando de sua abordagem sobre temáticas contundentes se firma

como um dos espaços mais amplos e importantes acerca da problematização do

Brasil. Ela estabelece padrões que servem como referência legítima para o

posicionamento do telespectador dando assim visibilidade aos assuntos,

comportamentos e produtos que se queiram enfatizar.

De acordo com Wolton (1998, p. 157), “a televisão é um fator de

identidade cultural e de integração social, devido à dupla condição de ser uma

televisão assistida por todas as classes sociais e de ser um espelho da identidade

nacional”.

Embora tenha se iniciado na área da Psicologia Social, o campo de

estudos das representações sociais tornou-se interdisciplinar ao qual se associam

pesquisadores das áreas das Ciências Sociais e Humanas entre eles os educadores,

assistentes sociais e outros. Hoje a teorização proposta por Moscovici recebe

contribuição de várias tendências na abordagem desse fenômeno socialmente

31

produzido, que é o saber do senso comum, e que constitui o objeto de estudo da

teoria das representações sociais.

No Brasil têm-se acentuado o interesse dos pesquisadore da área da

educação pelas Representações Sociais pois, de acordo com Viana (2003,p.21),”as

perspectivas de pesquisa mostraram que os grandes sistemas de significações que

constituem as Representações Sociais são úteis para compreender o que ocorre na

sala de aula” haja visto que essas representações são resultado das interações

ocorridas entre professor e alunos sendo importante identificar como esses

sujeitos compreendem não somente a deficiência, mas também o processo pelo

qual ocorre a inclusão de crianças consideradas como pessoas deficientes no

cotidiano escolar.

A temática da constituição do sujeito vem se caracterizando como

objeto de discussões em diferentes orientações teórico-metodológicas e é

importante na medida em que problematiza tanto o objeto dessa ciência como a

forma com que é abordado. Aqui neste trabalho a temática é discutida tendo como

referencial os aportes teóricos de L.S.Vygotsky; que na sua perspectiva nos diz

que a especificidade humana decorre da dupla relação que se estabelece com a

realidade, ou seja, via atividade na qual o ser humano se apropria da cultura e

concomitantemente nela se objetiva, constituindo-se assim como sujeito.

Para L.S.Vygotsky a dimensão do outro, ou melhor, a relação com um

outro é uma constante, pois, nas explicações do autor a constituição do psiquismo

humano é cultural e os elementos mediadores desta relação fundam-se no

pressuposto de que sua origem acontece no contexto das relações sociais. Ao

referir-se à Tese VI sobre Feuerbach, Vygotsky (1995, p. 151) encontra a

formulação de sua psicologia histórico – social ao destacar: "Modificando a

conhecida tese de Marx, poderíamos dizer que a natureza psíquica do homem vem

a ser o conjunto de relações sociais transladadas ao interior e convertidas em

funções da personalidade e em formas de sua estrutura". E nas palavras de

Teixeira (2005, p.26): vendo nessa tese a expressão mais completa de todo o

resultado da história do desenvolvimento cultural, seu significado é o de que todo

o conteúdo da mente humana é um produto social que pertence, tal como o

individuo, a uma forma determinada de sociedade.

32

Seguindo a tradição marxista Vygotsky afirma ser através da atividade

humana caracterizada pelo trabalho social que o ser humano transforma o

contexto social no qual se insere e nesse processo constitui a si mesmo como

sujeito, ou seja, constitui o seu psiquismo; e a origem de novas formas de

comportamento deixa de ser independentes dos motivos biológicos elementares e

passam a ser por motivos sociais. A história do desenvolvimento da sociedade e

de cada pessoa, portanto, está diretamente relacionada às transformações da

atividade humana e dos motivos que a impulsionam.

É precisamente na relação com todos esses fatores que no homem

criam-se novos motivos complexos para a ação e se constituem essas formas de

atividade psíquica específicas. Nestas, os motivos iniciais e os objetivos originam

determinadas ações e essas ações se levam a cabo por meio de correspondentes

operações especiais. Dai para Vygotsky, a psique humana não é dada; esta se

constitui num processo social cuja origem é marcada tanto pelas conquistas

históricas do gênero humano quanto pelas marcas singulares que socialmente

produzimos.

A característica demarcadora da atividade humana, entendida como

categoria explicativa para o desenvolvimento tanto filo quanto ontogenético que

nos permite afirmar que a psique humana é social em sua origem, é o fato de ser

mediada, assim sendo, esta atividade encontra nos signos as ferramentas

simbólicas responsáveis pelas especificidades do psiquismo humano e sua

condição essencialmente mediada (Vygotski 1991, 1992, 1995,1996).

Ao considerá-los como instrumentos psicológicos, Vygotsky (1991)

refere-se aos signos como “... dispositivos sociais para o domínio dos processos

próprios ou alheios" (p. 65), ou seja, como instrumentos responsáveis pela

reorganização da operação psíquica na medida em que possibilitam a regulação da

própria conduta. Assim, permitem a inserção do homem na ordem da cultura e o

estabelecimento de relações qualitativamente diferenciadas com a realidade

passando de diretas e imediatas, para mediadas pelos signos e pela cultura.

Consistindo os signos em formas de linguagem, estabelece-se assim a

relação entre linguagem e consciência:

33

(...) se a linguagem é consciência que existe na prática para os demais

e, por conseguinte, para si mesmo, é evidente que a palavra tem um

papel destacado não só no desenvolvimento do pensamento, mas

também no da consciência em seu conjunto... A consciência se

expressa na palavra assim como o sol se expressa em uma gota

d'água. A palavra é para a consciência o que o microcosmo é para o

macrocosmo, o que a célula é para o organismo, o que é o átomo para

o universo. É o microcosmo da consciência. A palavra significativa é

o microcosmo da consciência humana. (Vygotsky, 1992, pp. 346-347)

Os signos são particularmente apropriados justamente por serem

produzidos coletivamente e, ainda que tornados próprios tragam a marca do

contexto, da época e do grupo social em que se originam. Se a consciência se

caracteriza pelo fato de ser semioticamente mediada, sua origem social é

explicada pela dimensão inexoravelmente social dos signos. Estes resultam da

atividade humana conjunta e sua origem remonta aos primórdios da nossa

civilização, quando a luta pela sobrevivência demandou a comunicação entre os

próprios homens. Os signos, portanto, relacionam sujeito e sociedade, eu e outro

fato este explicado por Bakhtin (1990) ao referir-se à palavra:

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada

tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para

alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte.

Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. Através da palavra,

defino-me em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à

coletividade. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se

ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra se apóia sobre o meu

interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor. (p. 113)

Neste sentido, Oliveira (2004, p.17) ressalta que na prática educativa a

relação com o outro se dimensiona em uma tensão sociocultural; pois, no processo

de comunicação com o outro, a linguagem simbólica manifesta a história cultural

da sociedade significando que valores, crenças, conceitos e atitudes são

assimilados e construídos de acordo com essas representações sociais.

34

Assim, acredita-se que a formação de conceitos acerca da deficiência a

partir dos princípios que regem a dialogia (Bakhtin, 1999) encontra tanto no

desenvolvimento como na organização dos significados que formam tal conceito,

sua preconização pela negociação dos significados, definida pela interação entre

os indivíduos e os contextos histórico e cultural em que vivem.

Desta forma, a opção pelo estudo da representação social dos sujeitos

acerca da deficiência utilizando a concepção histórico – cultural justifica-se pelo

fato de que esta apresenta uma visão otimista em relação ao desenvolvimento do

deficiente, pois, Lev Semiónovic Vygotsky (1896-1934) foi o autor que inovou

teoricamente os estudos sobre deficiência ao apresentar seu referencial teórico

sobre o desenvolvimento atípico das crianças denominadas socialmente de

deficientes, em seu livro “Fundamentos da Defectologia” (1989).

Defectologia é um termo soviético para a disciplina que estuda uma

desvantagem e sua contribuição é a de possibilitar à psicologia uma base teórica

para a compreensão do desenvolvimento psicológico de criança em desvantagem.

Para Vigotsky, a atividade do homem é constituída nas condições culturais e

históricas concretas de sua vida social.

Vygotsky (1989) defende “que a criança cujo desenvolvimento está

complicado por um defeito não é simplesmente uma criança menos desenvolvida

que seus coetâneos normais, desenvolvendo-se de outro modo” (p.03). Para ele, o

processo de desenvolvimento da criança com defeito é um processo diferente,

realizado de outro modo, de forma peculiar. As regularidades do desenvolvimento

atípico e do típico, que são comuns, apresentam expressão concreta singular.

Para Vygotsky (1989):

as leis que regem o desenvolvimento tanto da criança normal quanto

anormal são, fundamentalmente, as mesmas, assim como as leis que

governam a atividade vital são as mesmas, sejam normais ou

patológicas as condições de funcionamento de qualquer órgão ou do

organismo em seu conjunto (p.05).

35

Essa abordagem redimensiona a questão da deficiência onde esta

passa da esfera biológica para a esfera social e a disfunção biológica apresentada

pela pessoa é vista como uma barreira social determinando à deficiência o

impacto social gerado pelo defeito e não a sua mera presença, já que o defeito

provoca uma reação social frente ao sujeito que o possui. Na sua teoria, Vygotsky

dá ênfase no processo, no modo como o individuo reage ao defeito. Essa situação

pode criar-lhe a necessidade da superação, ou seja, o defeito pode se transformar

numa mola propulsora, numa força motriz para o seu desenvolvimento. Por isso, a

tese central da defectologia é a de que todo defeito pode gerar uma compensação.

Ao atribuir ao defeito apenas uma limitação e não necessariamente

uma incapacidade, Vygotsky nos diz que a criança deficiente busca novas formas,

dentro das relações no seu meio social, para se apropriar de sua cultura. Assim, o

objeto de estudo da defectologia é a reação do organismo e da personalidade da

criança em relação ao defeito. Daí a necessidade de se criarem às condições que

abrem os caminhos para essa compensação e de se valorizarem as possibilidades

para superação do defeito. O que se busca valorizar são as possibilidades e,

valendo-se destas, ver o individuo como alguém que tem uma forma peculiar de

desenvolvimento. Para Vygotsky (1989), a criança que apresenta um

desenvolvimento alterado por um defeito é uma criança que se desenvolve por um

caminho diverso das crianças normais. Daí a importância do papel da escola para

as crianças na busca da superação das barreiras impostas pelo defeito.

Porém, a compreensão deste trabalho também necessita de

esclarecimentos acerca da utilização da telenovela América através de uma breve

explanação sobre a importância da televisão e seu processo mediador no estudo

das representações sociais das crianças sobre o tema pesquisado.

A televisão como objeto de estudo causa inúmeros desentendimentos

entre pesquisadores, justamente por ser tanto perturbadora como intrigante. Seu

estudo oscila entre duas correntes: os que atribuem ao seu conteúdo e suas

mensagens um poder ideológico; e os que acreditam nos receptores como uma

massa passiva e alienada frente a este meio; mas existe um consenso quando todos

ficam impressionados com o poder que,dizem, estes meios possuem na sociedade.

36

Adquiriu tanta importância ao longo dos anos que hoje, a televisão

está mais presente que o rádio ou a geladeira nos domicílios urbanos. Bucci

(2004, p.31) reforça seu pensamento através da seguinte afirmação: “Às vezes

tenho a sensação de que, se tirássemos a TV de dentro do Brasil, o Brasil

desapareceria”.

Nesse contexto, a mídia televisiva passa a fazer parte do dia a dia de

milhares de pessoas que por seu intermédio adquirem informações, constroem

conceitos e modificam comportamentos. Assim, presente em todos os espaços

sociais, a TV desafia também a escola a incorporar essa nova linguagem para que

possa compreender-lhe todos os seus aspectos e dimensões. Para Carneiro (1999)

deve-se abordar a relação televisão – educação a partir de três perspectivas

complementares: educação para o uso seletivo da TV; educação com a TV;

educação pela TV.

Para Tornero (1984, p.24) a educação para os meios ou como prefere

o autor, a alfabetização mediática compreende a capacidade de analisar

criticamente os meios e de conseguir além de expressar-se, produzir mensagens a

partir destes. Trata-se, porém, da capacidade de compreender sua linguagem; suas

estruturas e sua tecnologia; não bastando apenas assimilá-la. Este processo inclui

ainda a capacidade de usar a televisão como meio expressivo de comunicação

tendo-se a possibilidade de criticar suas mensagens.

A televisão expõe as crianças desde que abrem os olhos ao mundo dos

sons, das cores e das imagens. Para os autores Martín – Barbero e Rey (2002,

p.55) sua compreensão torna-se mais fácil, já que não depende de um complexo

código de acesso – como o livro – utilizando o lúdico e o emocional para prender-

lhe a atenção.

Muitos estudos sugerem que a infância de hoje seja a “infância da

mídia”, autores como Buckingham (1990); Vilches (1993); Carneiro (1999) e

Carlsson (2002) consideram a mídia como elemento essencial da vida das

crianças, pois a partir do entendimento da linguagem audiovisual, elas são capazes

de desenvolverem habilidades e capacidades necessárias para sua compreensão.

37

No entendimento de Angeles-Bautista (2002) existe hoje uma

necessidade de proporcionar às crianças uma orientação apropriada sobre o que

elas já sabem a respeito das mídias para que não fiquem totalmente hipnotizadas

ou indefesas frente a ela.

De acordo com Vilches (1999, p. 72) as investigações sobre televisão

– criança realizadas durante os anos 70 e 80 demonstraram quão importante eram

os estudos sobre os códigos, linguagem e formas do audiovisual; desviando o foco

do estudo apenas dos efeitos. Neste contexto, o plano educativo foi afetado pelos

resultados de quantidades expressivas de experiências e de indagações acerca da

representação formal dos programas televisivos e de como estes influenciam na

atenção e compreensão das crianças, bem como estas podem aprender a usar essas

mesmas formas de linguagem televisiva para a realização de suas representações

mentais e cognitivas, que podem ser aplicadas a situações em sala de aula.

Desta forma, Fischer (2003) considera fundamental para a educação

discutir e pensar sobre o quanto os professores sabem a respeito das profundas

transformações que têm ocorrido nos modos de aprender de seus alunos que

crescem influenciados por um ambiente mediatizado. Portanto, a educação com,

pela e para a mídia torna-se essencial na transformação da TV em objeto de

estudo, ampliando-lhe as efetivas possibilidades de criativamente experimentar na

escola, formas de fruir e pensar a televisão.

Essa necessidade de incorporar a televisão ao cotidiano escolar,

justifica-se principalmente pelo fato de que esta pode ser considerada o “espelho

da sociedade” (Wolton, 1984; p. 124); ou seja, é através TV que as pessoas se

vêem refletida e criam assim, além de uma imagem, uma representação7 de si

mesmas. Estabelece-se desta maneira o que Wolton (1984) chama de “laço social”

uma vez que ao estarem assistindo a um mesmo programa, os espectadores

agregam-se simultaneamente, formando uma espécie de laço invisível.

Cabe salientar que o surgimento dos meios de comunicação de massa

de acordo com Moscovici (2003, p. 48) aumentou a necessidade de um elo entre

7 Para Moscovici (2003, p. 20) “o propósito de todas as representações é tornar algo não-familiar, ou a própria não-familiaridade, familiar”.

38

nossas ciências e crenças gerais – antes puramente abstratas – com nossas

atividades concretas como indivíduos sociais numa prática contínua de re-

construir o “senso comum” aqui entendido como um conjunto de conhecimentos

originados na vida cotidiana tendo por objetivos comunicar, estabelecer relações

entre grupos sociais e embutir sentido no comportamento, para tornar essas

relações estáveis e eficazes. A esse conjunto de conhecimentos, o autor o chamou

de “representação social”, responsável na ajuda para a decodificação da vida

humana, tornando possível atribuir a toda figura um sentido e a todo sentido uma

figura.

No entendimento de Silverstone (2002) o estudo das mídias, desta

forma, precisa ser realizado para que haja compreensão dos processos de

mediação8, de como surgem os significados e quais as suas conseqüências;

examinando-as como um processo em curso com diferentes níveis de informação

e entretenimento.

Historicamente, grande parte das pesquisas na área de comunicação

relacionadas à recepção dos meios de comunicação de massa foi fundamentada no

referencial difusionista concebendo o receptor como objeto de persuasão ou de

influências das mensagens. De acordo com Lopes (1990), a constituição de uma

nova corrente de estudos de recepção dos meios massivos a partir dos anos 80

dentro do paradigma crítico apresenta como ponto divergente a ruptura com a

concepção do “consumo como pólo sempre determinado e, portanto passivo em

relação aos pólos de produção da mensagem e do meio massivo”. O que se busca

nos atuais estudos da recepção, é muito mais; é afirmar uma ação protagônica, do

sujeito livre, nos processos comunicativos.

Dentro dessa perspectiva, destaca-se na América Latina a formação

em diversos países de equipes de pesquisa que trabalharam em projetos integrados

e multidisciplinares como no caso da Colômbia com seus projetos sobre

telenovela (Martín-Barbero e Munhoz, 1992) e no México (González, 1991), o

Chile com a recepção ativa (Fuenzalida, 1987) e novamente o México com o de 8 O conceito de mediação foi inicialmente proposto pelo investigador madrilenho Manuel Martín Serrano descrito por Orozco como uma teorização “nacionalista e sistêmica” (1996). Depois, Martín-Barbero aplicou parte da conceituação de Serrano a sua visão da mediação em seu clássico “Dos meios às mediações” e em outras publicações (Dorneneles, 2003).

39

crianças e televisão (Orozco, 1992). A perspectiva das mediações por nós adotada

no presente estudo de recepção de telenovela enfoca as abordagens de Martín –

Barbero e Orozco por conceberem a relação entre o emissor e o receptor como um

processo onde entram em jogo as mediações, considerando que a mediação se dá

numa instituição, na situação e nos grupos. Estas são instituições mediadoras que

geram traços. Portanto, na relação com a comunicação faz-se o seguinte

raciocínio: resgatar o lugar da mediação é resgatar o lugar da cultura, ou seja, esta

abordagem se firma como renovadora em virtude de que a noção de mediação do

autor emerge de uma visão (re) integradora dos fenômenos de comunicação por

meio do binômio comunicação – cultura pretendendo esta perspectiva integrar

todos os âmbitos da comunicação, da produção, como do produto e a recepção.

Não existe emissor/receptor indivíduo. Nas palavras de Gomes (1998, p.27)

estamos vivendo o isolamento, a época da simulação. O problema está na

estrutura. Por isto, o lugar da cultura é como se fosse o lugar da identidade. Ela é

o pivô reestruturador do lugar político. É a visão da cultura como mediação.

Na concepção de Martín-Barbero (1987), as mediações são

concebidas como os lugares onde se pode perceber e compreender a interação

entre os espaços da produção e da recepção. Assim, podemos afirmar que as

mediações se distinguem por uma multiplicidade de estratégias e técnicas de

registro e mediação, de interação com os sujeitos pesquisados, de observação de

seus espaços escolares e contextos socioculturais, de tratamento dos textos

televisivos – os capítulos – e dos resultados de entrevistas e observações desses

sujeitos.

Orozco (1991, 1996, 2001) tem focado seus estudos na relação

televisão – audiência – educação contribuindo de forma significativa para os

estudos de recepção; o que resulta no modelo das “Múltiplas Mediações” que

parte do estudo das articulações que se dão entre as práticas de comunicação e os

movimentos sociais, considerando as diferentes temporalidades e as pluralidades

das matrizes culturais. Para este autor a relação receptores – televisão é

necessariamente mediatizada de forma que essa relação nunca é direta e unilateral

como costumava abordar alguns pesquisadores, mas acontece num ambiente

40

multilateral e multidimensional realizando através do que o autor chama de

“múltiplas mediações”.

Para Buckingham (2004) é importante lembrar que as crianças fazem

parte da cultura da televisão, elas têm essas referências em comum, vêem TV em

casa durante horas. No seu entendimento, se todas as crianças na sala viram a

mesma telenovela na noite anterior, por que não transformar o assunto em tema de

discussão? A escola pode ser um espaço onde os alunos podem elaborar essa

experiência em comum.

Cabe salientar que os conceitos de audiência, recepção e mediação são

primordiais para o entendimento da proposta apresentada por este trabalho. Nas

palavras de Lopes (2002):

A mediação no processo de recepção de telenovela deve ser entendida

como processo estruturante que configura e reconfigura tanto a

interação dos membros da audiência com os meios, como a criação

por parte deles dos sentidos dessa interação, sendo necessária a

decupagem desses conceitos (p.40).

Assim sendo, Orozco (2001, p.23) defini audiência como um conjunto

segmentado a partir de suas interações mediáticas de sujeitos sociais, ativos e

interativos, que não deixam de ser o que são enquanto estabelecem alguma relação

sempre situada com o referente mediático, seja esta direta, indireta ou diferida.

Para o autor ser audiência significa para os sujeitos sociais uma

transformação substancial em suas estruturas que agora se definem muito mais

por uma espiral de mediações responsáveis por modificar seus vínculos com a

sociedade à sua volta, com os acontecimentos e com as fontes tradicionais de

informação do que com as divisões tradicionais antes definidas por critérios como

gênero, idade, classe social ou etnia.

Desta forma, os encontros pessoais são reduzidos e aumentam os

contatos virtuais e as experiências vicárias (através da TV e da tecnologia). Para

Orozco a contrapartida desta situação encontra-se no fato de que a representação

mediática e seu simulacro de realidade continua seu crescimento vertiginoso e se

41

consolida duplamente como produto e processo uma vez que como mediação

privilegiada para conhecer, sentir e gostar.

Recepção é entendida como uma interação sempre mediada a partir

de diversas fontes e contextualizada material, cognitiva e emocionalmente, que se

realiza ao longo de um processo complexo e não de um momento, situado em

vários cenários e que inclui estratégias e negociações dos sujeitos com o referente

mediático do qual resultam apropriações variadas que vão desde a mera

reprodução até a resistência e a contestação. Lopes (2002) enriquece esse conceito

ao afirmar que o sentido primeiro apropriado pelo receptor é por este levado a

outros “cenários” chamados de grupos de participação.

Por fim, a mediação é um processo estruturante que configura e

orienta a interação das audiências e cujo resultado é o estabelecimento de sentido

por parte destas aos referentes mediáticos com os quais interagem.

Segundo Orozco (2003, p.40) um primeiro conjunto de mediações

provêem do âmbito individual dos sujeitos – audiência, portanto sujeitos

particulares, com características próprias, produto de suas heranças genéticas, de

seu desenvolvimento e trajetórias pessoais, bem como de seus aprendizados

anteriores e experiências; para além da televisão. Esses sujeitos individuais

concretizam o que o autor denomina de “estratégias televisivas” inspiradas

primeiramente no que os caracterizam como indivíduos, para em seguida

concretizar também os “contratos de vidência” quando se conectam com os

outros, formando “comunidades de apropriação e interpretação” dos referentes

televisivos.

Portanto, por mais individualizada que pareçam, as “vidências

contratuais” não acontecem num vazio sociocultural, pois estão mediadas por

negociações e capacidade de respostas carregadas geográfica e historicamente de

significado, sofrem regras e variam de cultura, de país, de região e de época

(Orozco, 2003, p.41). Martín-Barbero corrobora com essa perspectiva ao afirmar

que para construir essa caracterização, as mediações transformam-se em lugar de

onde se outorga sentido ao processo de comunicação, e para ele, este lugar recebe

42

o nome de cultura, ou seja, o autor propõe o deslocamento dos meios às

mediações.

As telenovelas parecem ser o gênero que mais oferece elementos e

informação para o debate sobre temas ligados ao comportamento, como a inclusão

social de pessoas deficientes, constituindo, a partir daí, toda uma dimensão

educativa. Acresente-se aqui a própria mediação videotecnológica9 da televisão

enquanto meio de comunicação, que permite uma aproximação mais intensa com

os fatos, além de atribuir um maior grau de verossimilhança aos acontecimentos.

Essa mediação segundo Lopes, Borelli e Resende (2002) é pensada a partir da

tensão/imbricação entre a matriz industrial do texto telenovelístico – as lógicas

econômicas e organizacionais da produção que constroem as dinâmicas de criação

argumentativa e estética –; os diversos modelos de texto audiovisual, que enredam

o mundo da produção com o “palimpsesto10 do receptor” – analisados, segundo as

autoras, nos seus distintos planos de imagem, sonoridade e texto verbal; e por fim,

as operações de sentido presentes na telenovela, mas ativadas pelas competências

de leitura inerentes aos receptores (naturalização realista, metaforização,

verossimilhança, etc.).

Os depoimentos dos alunos sobre suas experiências de

telespectadores da novela “América” exibida pela Rede Globo na época das

entrevistas, é revelador dessa relação estabelecida com a TV.

9 Orozco (1991) ressalta que a televisão, além de ser uma instituição, é também um meio técnico de comunicação, contando com uma série de recursos videotecnológicos efetivos que possibilitam à televisão mediar à apresentação da realidade ao sujeito receptor. 10 É uma página manuscrita, pergaminho ou livro cujo conteúdo foi apagado (mediante lavagem ou raspagem) e escrito novamente, normalmente nas linhas intermediárias ao primeiro texto ou sentido transversal. Deriva do antigo grego cuja etimologia é: palim – “de novo” e psesto – “raspar”, ou seja, riscar de novo. Retirado do site www.pt.wikpedia.org.

43

Revisitar as páginas da história

“A vida tem sons que pra

gente ouvir, precisa

aprender a começar de

novo...” (Roupa Nova).

44

O objetivo desta breve análise histórica acerca da deficiência é

provocar a reflexão acerca da relação entre o que se pensa sobre a condição de

deficiente e as atitudes que são assumidas frente aos seus portadores. Aqui

também vale ressaltar que muitas dessas concepções históricas continuam

presentes de forma latente no mundo atual, configurando-se dessa forma a

necessidades dessa revisita.

Ao se realizar o estudo da evolução histórica da representação da

deficiência, podem-se encontrar diversos trabalhos que abordem as principais

questões das teorias e interpretações sobre essa evolução (Mendes, 1985; Omote,

1996; Ferreira e Guimarães, 2003), mas adotam-se aqui, inicialmente os estudos

de Pessotti (1984) que estabelece quatro fases de mudanças tanto nas idéias como

nas atitudes perante as pessoas deficientes:

De acordo com Pintner (apud Pessotti1983), na Antigüidade clássica

os filhos disformes ou anormais estavam associados a condições de incapacidade

generalizada, à idéia de dependência e inutilidade e por isso era simplesmente

abandonados ou mortos ao nascer, o que correspondia perfeitamente à ética das

sociedades que educavam seus filhos para a guerra, o lazer, a perfeição atlética,

num sistema econômico escravagista, oligárquico e elitista.

Na Roma antiga as crianças com deficiências eram afogadas por

serem consideradas anormais e débeis. Já na Grécia antiga, Platão, relata no livro

“A República” que as crianças eram sacrificadas ou escondidas pelo poder

público.

Com a difusão do Cristianismo no mundo ocidental, particularmente

durante a Idade Média, as deficiências recebem um outro tipo de explicação,

especificamente no aspecto das teorias da causalidade. Passando a deficiência a

ser atribuída aos desígnios de entidades sobrenaturais. Surge uma religião de

redenção, de escravos e desprotegidos, tratando a deformidade ou deficiência

como marginalização e exposição a graves riscos. O deficiente agora passa a ter

alma e deve de algum modo ser socorrido. Também passam a ser considerados

como “eleitos ou anjos de Deus”, “receptáculos dos castigos divinos” ou

“possuídos pelo demônio”. As explicações sobre deficiência mental eram no

45

mínimo contraditórias nesse momento. Tais suposições supersticiosas deram

origem a atitudes ambivalentes de proteção e maus tratos dependendo da teoria

assumida; eram por vezes imorais ou anormais, mas sempre incômodos seres

predestinados muitas vezes a uma condenação divina ao fogo eterno.

O deficiente deixa de ser morto ao nascer, mas passa a ser

estigmatizado como sinônimo de pecado.

Porém, após sucessivas epidemias de lepra, a cultura medieval cristã

aprendeu a livrar-se dos leprosos sem trair a caridade, confinando-os, levando-os a

outro mundo. Quando acabou a epidemia, os leprosários foram utilizados para

receber e confinar os loucos, mutilados, mendigos, prostitutas, dementes e todos

os considerados incapacitados para a vida social, manifestando assim uma

46

punição para a imoralidade que representavam ou estavam expiando, como no

caso dos dementes, que pagavam pecados pelos seus pais ou avós.

Com o advento da Reforma Protestante, Lutero traça um dogma

infundado sobre a natureza do deficiente mental, segundo o qual esse ser é

sobrenatural e morre, graças ao efeito de muitas orações. É essa a forma para que

Deus expulse dele o demônio. Agia-se como se nessa pessoa faltasse a razão e a

ajuda divina. É a época dos açoites e das algemas. Trata-se de uma concepção

fanática e metodológica do deficiente mental.

Com a Reforma Protestante o deficiente deixa de ser só repulsivo e

castigado por Deus para ser também castigado pelos homens, vítimas de torturas,

exorcismos e flagelação.

47

No Renascimento surgem ciências com concepções racionais,

buscando explicar as causas das deficiências, e estas passam a ser consideradas sob o

ponto de vista médico como doença de caráter hereditário, males físicos ou mentais. É o

predomínio de concepções baseadas no organicismo radical; e, para equacionar o

problema da deficiência foram instalados asilos e grandes instituições para confinar seus

portadores, especificamente para aqueles com níveis mais severos de deficiências, onde

os internos recebiam cuidados médicos e um treinamento em habilidades básicas para

serem menos dependentes.

48

Ainda dentro desta contextualização histórica da deficiência, dois são

os fatores de destaque para mudar atitudes com relação à pessoa deficiente: a

revolução industrial e as duas Guerras Mundiais.

Com a primeira, surgiu a necessidade de mão de obra mais

especializada, o que provocou a institucionalização da escolaridade obrigatória;

fazendo surgir assim, a conscientização de que existiam pessoas que mesmo sem

sinais aparentes de anormalidade, não conseguiam adquirir habilidades

acadêmicas, provocando uma mudança no conceito predominante de deficiência;

agora não mais restrito aos casos de incapacidades mais severas e generalizadas, e

sim, incluindo indivíduos com incapacidades menos perceptíveis que não

apresentam anormalidades orgânicas comprovadas, mas que serão classificados

com base em critérios ditados pelas normas culturais. De acordo com Mendes

(2001, p.58), “estava lançada à base para o aparecimento do atual conceito das

chamadas “necessidades educacionais especiais”“.

As duas Guerras Mundiais produziram desdobramentos muito graves

para as sociedades de suas respectivas épocas. Surgiram os deficientes

incapacitado-mutilados decorrentes das amputações geralmente provocadas pelos

ferimentos ou acidentes nos campos de batalha. Embora ainda permaneça a

deficiência sob a ótica médica, com destaque para o estudo da deficiência física e

suas diversas patologias relacionadas ao movimento motor; para Ferreira e

Guimarães (2003, p.92) começa-se a aparecer um avanço considerável na

educação dos alunos com deficiência.

Mendes (2001, p.58-59) destaca a Segunda Guerra Mundial como o

grande fato responsável por mudanças significativas no clima sócio-cultural do

mundo ocidental, fazendo com que surgisse uma filosofia mais humanista que

atribuiu ao deficiente uma maior valorização. Para a autora “a guerra tornou

muitas pessoas deficientes e a sociedade teve que rever suas posições frente à

deficiência em função da volta de seus heróis mutilados”.

A preocupação com a guerra chega ao Brasil no Governo Vargas e

este, cria o plano de organização de um Serviço Nacional de Assistência a

mutilados. Também em decorrência da preocupação com os deficientes, o

49

governo brasileiro dividiu o antigo Ministério da Educação e Saúde Pública em

dois órgãos ministeriais, de competências específicas.

Segundo Mazzota (2003) o Brasil foi influenciado por experiências

concretizadas na Europa e nos Estados Unidos, sendo iniciativa de alguns

brasileiros no século XIX, organizando serviços para atendimento a cegos, surdos,

deficientes mentais e deficientes físicos. Estas iniciativas oficiais e particulares

partiram de educadores interessados no atendimento a pessoas com deficiências.

Porém a Educação Especial, também chamada de “Educação de

Deficientes” ou “Educação de Excepcionais” na política educacional brasileira

ocorreu somente no final dos anos 50 e início da década de 60, no século XX.

Primeiro Período – de 1854 a 1956

No Brasil, o atendimento escolar especial às pessoas com deficiência

teve seu início em 12 de outubro de 1854, quando D. Pedro II, através do decreto

imperial nº. 1428 fundou, na cidade do Rio de Janeiro, o “Imperial Instituto de

Meninos Cegos”.

Em 17 de maio de 1890, no Governo Republicano, o chefe do governo

provisório, Marechal Deodoro da Fonseca e o Ministro da Instituição Pública,

Correios e Telégrafos, Benjamim Constant Botelho de Magalhães, assinaram o

decreto nº. 408, mudando o nome dessa instituição para Instituto de Cegos. Mais

tarde, em 24 de janeiro de 1891, pelo decreto nº. 1320, a escola passou a

denominar-se “Instituto Benjamim Constant” (IBC), e tem o mesmo nome até os

dias atuais.

Em 1857 D. Pedro fundou no Rio de Janeiro o “Imperial Instituto de

Surdos e Mudos” que após cem anos de existência, passaria a denominar-se

“Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES”. Ainda no Segundo Império,

existem registros de ações voltadas para o atendimento pedagógico e liberação de

verbas destinadas à formação superior de professores.

50

Em 1950, existiam 54 estabelecimentos de ensino especializado,

destinados às pessoas com necessidades educacionais especiais. Dentre eles, a

Sociedade Pestalozzi do Estado do Rio Janeiro criada em 1948 e a Escola

Estadual Instituto Pestalozzi, criada em 1935 por influência dos trabalhos da

Professora Helena Antipoff.

Segundo Período – 1957 a 1993

O segundo período é marcado por campanhas voltadas para o

atendimento a pessoas com necessidades educacionais especiais, comumente

chamadas na época de excepcionais. Tais campanhas ocorreram em nível

nacional, por iniciativa do Governo Federal. Foram muitas as campanhas que

marcaram a história da Educação Especial Brasileira, dentre as quais se destacam:

- CESB: Campanha para Educação do Surdo Brasileiro (1957);

- CNEC: Campanha Nacional de Educação de Cegos (1960);

- CADEME: Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de

Deficientes Mentais (1960).

Mas como bem nos lembra Damiliano (2001), estas campanhas

duraram até 1972 e foram extintas pelo próprio governo; no mesmo ano, a

Educação Especial passou a ter prioridade no I Plano Setorial de Educação e

Cultura, e o presidente Médice, em 1973, criou o Centro Nacional de Educação

Especial (CENESP). Este órgão por sua vez foi extinto no governo de José Sarney

(1986/1990) e foi criada a Secretaria de Educação Especial (SEESPE).

Dando um salto na cronologia, hoje nosso sistema educacional tão

excludente ao longo de toda a sua história, depara-se com um novo paradigma: o

da inclusão.

51

Instrumentos de mudança

“Tenho um coração

dividido entre a esperança e

a razão...” (Fagner).

52

Antes de abordarmos o acesso do aluno com deficiência à escola é às

classes comuns da rede regular de ensino, é importante pensar a diferença entre os

princípios da integração e o conceito de inclusão.

Os vocábulos Integração e Inclusão, no âmbito do ensino, para

Werneck (2000), encenam uma mesma idéia, para ela é a inserção da pessoa com

necessidades educativas especiais na escola.

Na busca pela inserção de pessoas com deficiência nos sistemas

sociais (educação, trabalho, família e lazer), a discussão da idéia de integração

torna-se responsável pela mudança do paradigma da exclusão social a partir do

final da década de 60 (Ferreira e Guimarães (2003, p. 109)).

Essa prática da integração baseou-se no “modelo médico de

deficiência, onde era preciso modificar (habilitar, reabilitar, educar) a pessoa com

deficiência para que esta pudesse satisfazer os padrões aceitos no meio social”.

Isso ocorre principalmente nos anos 1960 e 1970.

Embora já existissem experiências isoladas desde 1960, a integração

escolar ganha força no Brasil na década de 1980. Sassaki (1997) faz distinção

conceitual entre os dois termos do ponto de vista operacional: a integração

“envolvia preparar o aluno para ser inserido na escola regular”, o que implicava

um conceito de “prontidão” do aluno. Também Mantoan (1997) acredita que a

integração tem sua ênfase centrada na deficiência e não no aluno. Para ela, “essa

abordagem sugere o atendimento às diferenças individuais nas classes especiais,

salas de recursos ou serviços itinerantes, mediante a preparação gradativa do

indivíduo no ensino regular”. Dessa forma, é o aluno que deve adaptar-se à escola,

e não há necessidade de que a escola deva mudar para resolver a diversidade de

alunos.

A inclusão escolar de alunos com deficiência é entendida como parte

de um contexto mais abrangente de reivindicações sociais, especialmente, de

todas as minorias. É na Itália que em 1977, uma lei passou a obrigar a inserção de

todas as crianças na escola, na perspectiva da escola para todos.

53

Segundo Santos e Mendes (2001) “embora se tenha conhecimento de

iniciativas que contemplam os princípios da escola inclusiva datem da década de

50 em países desenvolvidos, a discussão em torno dos seus resultados é fruto da

década de 90”. No Brasil, segundo Sassaki (1997), o movimento de inclusão

escolar do aluno deficiente começou o crescimento nesta década.

Essa filosofia da inclusão é decorrente da chamada inclusão total

(tradução do termo inglês full inclusion) que apregoa a necessidade de fusão da

Educação Especial com a Educação Comum. Seus principais representantes são

Stainback e Stainback (1999) apregoando que o resultado dessa nova fusão

resultaria num sistema novo e único, capaz de responder às necessidades de todos

os alunos incorporando o melhor dos dois sistemas.

Assim, ao final dos anos 90 temos acompanhado debates realizados

em diversos eventos acadêmicos – congressos, seminários – o crescimento

significativo de produções que tratam da inclusão das pessoas com necessidades

educacionais na rede regular de ensino (Werneck, 1997; Mantoan, 1997;

Carvalho, 1998; Sassaki, 1998; Ferreira e Guimarães, 2003) responsáveis por

reflexões acerca dos rumos deste processo no contexto brasileiro.

Ainda na década de 90, a democratização da política educacional

brasileira tentou oferecer a todos a oportunidade de acesso à escola pública. De

acordo com Mazzota (1996) “ganha força à educação da criança no ensino

regular, tendo em vista a igualdade e a justiça social”. Com isso, o modelo

médico, clínico e terapêutico adquire uma abordagem social e cultural onde existe

a valorização da diversidade na aprendizagem.

É neste período que acontece uma transformação nos principais

referenciais em que se fundamenta a Educação Especial e, a educação em

ambientes restritivos – como em Centros de Ensino Especiais – começa a ser

questionada mediante a compreensão da necessidade de promover o ensino desses

alunos com necessidades educacionais especiais em ambientes comuns,

compartilhados com alunos comuns.

54

Para Vygotsky (1983) em seus “Fundamentos da Defectologia” –

obra cujo referencial teórico ajudou nos estudos do desenvolvimento de pessoas

com vários tipos de deficiência – concebe o postulado de que a educação das

crianças deficientes não se diferencia da educação das crianças ditas normais, pois

os primeiros podem perfeitamente assimilar os conhecimentos e desenvolver

habilidades de maneira semelhante aos seus pares. Ainda de acordo com o mesmo

autor, “as crianças deficientes devem educar-se da forma mais semelhante às

crianças normais e, inclusive, educar-se conjuntamente, o qual ajuda a

desenvolver o psíquico, o físico e a compensação e correção de seus defeitos”.

Para Saint-Laurent (1997), nos anos 90 a idéia de Integração Escolar

total para todos os alunos se populariza cada vez mais (Falvey, 1995; Stainback e

Stainback, 1996). Trata-se do modelo de inclusão significando que as respostas às

necessidades pedagógicas de todos os alunos aconteçam no mesmo contexto

através de atividades comuns, embora adaptadas.

Como já visto anteriormente, o princípio da integração intensificou-se

a partir de 1981 quando a Assembléia geral das Nações Unidas instituiu aquele

ano como o Ano Internacional das Pessoas com Deficiência. Para Carvalho (2004)

foi a partir daí que a presença de portadores de deficiência nas escolas comuns

começou a ser defendida insistentemente por seus pais e educadores, através de

movimentos em prol de sua integração na escola e na ordem social.

A partir desse novo paradigma, Mader (1997) o considera como

aquele onde “a diferença acontece como algo inerente na relação entre os seus

humanos”. Desta forma, a diversidade esta cada vez mais sendo vista como algo

natural e a sociedade busca se orientar para que cada membro, com sua

singularidade possa usufruir o bem coletivo. Nesse contexto, surgiu o movimento

de autodefesa e de luta pelos direitos humanos na Europa, discutindo-se a criação

de um novo conceito, denominado inclusão – termo encontrado para definir uma

sociedade que considera todos os seus membros como cidadãos legítimos.

Em consonância com essa perspectiva, o princípio da inclusão

preconizado por vários autores (Sassaki, 1997; Freitas e Guimarães, 2003 e

Carvalho, 2004) baseia-se fundamentalmente, no modelo social da deficiência, de

55

acordo com o qual para incluir todas as pessoas, a sociedade deve ser modificada,

a partir do entendimento de que é ela que precisa ser capaz de atender às

necessidades de seus membros.

A diferenciação básica entre as duas correntes, a partir do momento

em que a política de inclusão escolar, diferentemente da política de integração,

coloca o ônus da adaptação na escola e não no aluno, o que implica um total

remanejamento e reestruturação da dinâmica da escola, com o intuito de atender a

todos, sem distinção.

O trabalho que ora se apresenta trabalha com dois conceitos – chaves

abordados por Sassaki (1997) assim entendida:

A inclusão social (pensando a inclusão escolar num conceito mais

amplo) é:

O processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em

seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e,

simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na

sociedade. A inclusão social constitui então um processo bilateral no

qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade buscam, em parceria,

equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação

de oportunidades para todos (p. 41).

A inclusão escolar é o processo de adequação da realidade das escolas

à realidade do alunado que, por sua vez, deve representar toda a diversidade

humana. Nenhum tipo de aluno poderá ser rejeitado pelas escolas. As escolas

passam a ser chamadas inclusivas no momento em que decidem aprender com os

alunos o que deve ser eliminado, modificado, substituído ou acrescentado nas seis

áreas de acessibilidade (arquitetônica, atitudinal, comunicacional, metodológica,

instrumental e programática) a fim de que cada aluno possa aprender pelo seu

estilo de aprendizagem e com o uso de todas as suas inteligências (p. 34).

Em seu texto, Carmo (2001, p.99) apresenta duas vertentes como

predominantes quando se discute a inclusão escolar. Segundo o autor, “a primeira,

que passa aqui a ser denominada como inclusivista, formada por aqueles que

respaldam a inclusão em bases legalistas do “direito de todos” e dever do Estado.

56

A segunda, na qual a inclusão está atrelada à adaptação da escola em seu caráter

aparente e que poderiam ser denominados de “adaptadores” sociais ou reformistas

escolares da educação”.

Seja qual for à corrente adotada, o importante é compreender que a

idéia de inclusão não visa atender somente às crianças rotuladas de deficientes, e

sim uma representação do avanço nas relações até hoje estabelecidas na escola

regular. Haja vista que todos os princípios desta escola terão que ser revistos e

superados, uma vez que a grande barreira existente contra a inclusão, aqui

entendida através das palavras de Carmo (2001) “como possibilidade ampla e

universal de acesso e permanência na escola” é principalmente a obsoleta

estrutura escolar. Sem essas mudanças, toda e qualquer tentativa de inclusão

acabará por ser frustrada.

Para tanto, contamos com as leis que significam a concretização da

concepção de justiça de uma sociedade, representando um equilíbrio entre os

diferentes interesses existentes. Reforçando esse conceito, as palavras de Ferreira

e Guimarães (2003, p.83) afirmam que “as leis regulamentam o comportamento

das pessoas, compelindo-as a praticar ou não determinados atos”.

Os direitos fundamentais de toda pessoa estão quase todos na

Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovadas pela Organização das

Nações Unidas (ONU) e datada de 1948, estes direitos apesar de históricos,

decorrem de lutas travadas gradualmente em nome de sua emancipação e das

transformações ocorridas em sua vida.

Para o deficiente, a luta pelo reconhecimento de seus direitos

enquanto cidadão vem de longa data, contando de várias intervenções e

intercorrências no seu percurso.

Entre os instrumentos normativos internacionais é válido ressaltar na

opinião de Ferreira e Guimarães (2003) a; Declaração dos Direitos das Pessoas

com Retardamento Mental, de 1971; a Declaração dos Direitos da Pessoa Surda e

Cega, de 1971; Declaração dos Direitos do Impedido, de 1975; as Resoluções da

57

Organização Mundial de Saúde para a prevenção de Deficiências e Reabilitação,

de 1976; a Declaração dos Direitos da Criança, de 1979, as Normas Internacionais

do Trabalho sobre a readaptação profissional, publicada em 1984, pela OIT; a

Declaração de Cartagena das Índias sobre as políticas integrais para as pessoas

portadoras de deficiência, na região ibero-americana, de 1992; a Declaração de

Manágua, para um novo modelo de desenvolvimento de política para crianças e

jovens portadores de deficiência e suas famílias, de 1993; a Primeira Conferência

Internacional de ministros responsáveis pela atenção de pessoas portadoras de

deficiência, de 1992.

Existem ainda outros documentos que complementam as bases

filosóficas de políticas mundiais acerca do direito das pessoas com deficiência:

Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saúde promovida

pela Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2001, que substitui a Classificação

Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades / OMS de 1980 e a

Convenção Internacional para a Proteção e Promoção dos Direitos e Dignidade

das Pessoas com Deficiência promovida pela ONU em 2003. Para enriquecer as

informações sobre os direitos dessas pessoas, Sassaki (2003) relaciona mais

alguns documentos de outros organismos mundiais: Declaração de Vancouver,

1992; Declaração de Maastricht, 1993; Carta para o Terceiro Milênio, 1999;

Declaração de Washington, 1999; Declaração de Pequim, 2000; Declaração de

Manchester sobre Educação Inclusiva, 2000; Declaração Internacional de

Montreal sobre Inclusão, 2002; Declaração de Madri, 2002; Declaração de

Sapporo, 2002; Declaração de Caracas, 2002; Declaração de Kochi, 2003 e

Declaração de Quito de 2003.

O Relatório ou Informe Warnock é um documento publicado em

1978, coordenado por Mary Warnock a respeito de uma investigação de quatro

anos acerca das condições da educação especial inglesa, nos anos 70.

Neste documento ocorre a introdução do conceito de necessidades

educacionais especiais substituindo as categorias deficiência ou desajustamento

social e educacional, sendo este seu aspecto-chave.

58

A busca por uma escola inclusiva, que tenha a premissa de atender a

todos de acordo com as políticas públicas em educação foi documentada pela

primeira vez no ano de 1979, no México, onde um grupo de países, coordenados

pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

(UNESCO), assinou o Projeto Principal de Educação que tinha por objetivo

definir e adotar algumas medidas capazes de combater nos países da América

Latina a elitização da escola.

Em 1981 foi instituído o Ano Internacional das Pessoas Deficientes

(AIPD) onde a Organização das Nações Unidas (ONU), oficializou o único do

conceito de sociedade inclusiva.

Em 1981, no Equador, um Seminário sobre Educação Especial

promovido pela Organização das nações Unidas para a Educação (UNESCO) deu

origem a Declaração de Ciência estabelecendo recomendações acerca de atitudes

com relação à pessoa com deficiência, destinada tanto a América Latina como ao

Caribe.

A Espanha realiza ainda em 1981 a Conferência Mundial sobre Ações

e Estratégias para a Educação, Prevenção e Integração dos Impedidos,

contemplando a Educação Especial e resultando na Declaração de Sunderberg.

De 1983 a 1992, acontece a Década das Nações Unidas para Pessoas

Portadoras de Deficiência considerando princípios éticos, filosóficos e políticos

responsáveis pelas mudanças legislativas mundo afora.

O Programa Mundial de Ação Relativa às Pessoas com Deficiência

adotado pela Assembléia Geral da ONU em 3 de dezembro de 1982 e publicado

no ano seguinte foi o primeiro documento a oficializar o conceito de equiparação

de oportunidades para todos.

Neste documento, a ONU conceitua equiparação de oportunidades

como “processo através do qual diversos sistemas da sociedade e do ambiente,

tais como serviços, atividades, informação e documentação, são tornados

disponíveis para todos, particularmente para pessoas com deficiência”.

59

A ONU organizou na Finlândia, no período de 7 a 11 de maio de

1990, uma reunião para avaliar a Década das Nações Unidas para a Pessoa com

Deficiência, onde os peritos decidiram que a equalização de oportunidades para

essas pessoas deveria ser prioridade na formulação de ações de longo prazo,

visando a uma sociedade para todos. Sendo assim, em 14 de dezembro de 1990, a

Assembléia Geral da ONU, através da resolução de nº. 45/91 deu ênfase às

necessidades das pessoas com deficiência nos países em desenvolvimento.

Ao final da Década das Nações Unidas para Pessoas Portadoras de

Deficiência em 20 de dezembro de 1993, a Assembléia Geral da ONU assinou a

resolução de nº. 48/96 que adotou o documento Normas sobre a Equiparação de

Oportunidades para Pessoas com Deficiência, dando forma às idéias do programa

de 1982.

A Declaração Mundial de Educação para Todos, aprovada na

Conferência Mundial de Educação para Todos – Satisfação das Necessidades

básicas de aprendizagem, realizada entre os dias 5 e 9 de março de 1990 em

Jomtiem, na Tailândia, é apontada como o grande marco na formulação de

políticas governamentais para educação, indicando para os países populosos,

principalmente, as bases dos planos decenais de educação. Nas palavras de

Werneck (2000), nesta conferência, “garantia-se a democratização da educação,

independentemente das diferenças particulares dos alunos”.

Essa conferência foi promovida pelo Banco Mundial (BIRD), pelo

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), pela Organização

das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e pelo Fundo

das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).

Em 16 de dezembro de 1993, a Declaração de Nova Déli constitui um

compromisso internacional e reafirma o compromisso dos governantes presentes

com a oferta da educação básica com eqüidade à população de seus países.

Nessa linha de raciocínio, de acordo com Lopes (2005) a Declaração

de Salamanca realizada entre os dias 7 e 10 de junho de 1994 na Espanha, apoiada

pela UNESCO e aprovado na Conferência Mundial sobre Necessidades

60

Educativas Especiais: Acesso e Qualidade. Teve como compromisso reafirmar o

direito de todas as pessoas à educação, conforme já preconizada a Declaração

Universal dos Direitos Humanos de 1948 e ratificar o empenho da comunidade

internacional em cumprir o estabelecido na Conferência Mundial de educação

para Todos em 1990.

Segundo Werneck (2000, p.49), a autêntica base da Declaração de

Salamanca estava grifada nas diversas declarações das Nações Unidas que

culminaram justamente no documento Normas Uniformes sobre a Igualdade de

Oportunidades para Pessoas com Deficiência, assinado em 1993 e publicado em

1994. “De acordo com essas normas, os estados são obrigados a garantir que a

educação de pessoas com deficiência seja parte integrante do sistema educativo”.

E assim, como objetivo de promover uma educação para todos, a

Conferência de Salamanca foi representada por mais trezentos participantes de

noventa e dois governos e vinte e cinco organizações internacionais. Embora

tenha sido convidado oficialmente, o Brasil não esteve presente, mas a

Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência

(CORDE), vinculada à Secretária Nacional de Direitos Humanos, do Ministério

da Justiça, manifestou apoio e divulgou o documento aprovado.

A declaração de Salamanca e Linhas de Ação sobre Educação para

Necessidades Especiais, incluindo princípios, política e prática nesta área, formula

o conceito de escola integradora, que é caracterizada como uma escola que acolhe

a toda e qualquer criança e aponta que todos os alunos devem ser recebidos em

todas as escolas.

Recomenda ainda que as escolas se ajustem às necessidades dos

alunos quaisquer que sejam suas condições físicas, sociais, e lingüísticas,

incluindo aquelas que vivem nas ruas, as que trabalham as nômades, as de

minorias étnicas, culturais e sociais, além das que se desenvolvem a margem da

sociedade.

Este documento estabelece a urgência de ações que transformem em

realidade uma educação capaz de reconhecer as diferenças, promover a

61

aprendizagem e atender às necessidades de cada criança individualmente. Para

tanto, utiliza-se de diversos termos relacionados à inclusão. Entre eles, educação

inclusiva, princípios de inclusão, escolaridade inclusiva, políticas educacionais

inclusivas, provisão inclusiva às necessidades educacionais especiais, inclusão na

educação e no emprego e, também, sociedade inclusiva.

No Brasil, similar ao que ocorre em outros países, a abordagem da

questão ligada ao tema “deficiência” é respaldada nos Direitos Humanos, onde se

procura expressar a importância da promoção e do reconhecimento da pessoa

deficiente, na condição plena de exceder seus direitos enquanto cidadão. E a partir

de todos esses documentos internacionais, nosso país construiu as Bases Legais

que norteiam a educação inclusiva em seu sistema de ensino.

A discussão sobre a universalização da educação, o direito de todos à

cidadania e a inclusão do aluno deficiente na escola comum da rede regular

constitui-se um desafio político que reflete a postura atual na busca pela qualidade

de vida das sociedades contemporâneas.

No Brasil, no que se refere às leis, quando se fala em inclusão temos

como marco a Constituição Brasileira promulgada em 1998.

O inciso III do artigo 208 da Carta Magna fundamentada a educação

no Brasil e faz constar à obrigatoriedade de um ensino especializado para crianças

portadoras de deficiência. Sendo este o texto:

“O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a

garantia de”:

“III – Atendimento educacional especializado aos portadores de

deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”.

No artigo 205 defende o direito à educação para todos, visando ao

“pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua

qualificação para o trabalho”.

62

Todavia, no nosso país, a matrícula de crianças excepcionais, termo

que era utilizado na época no sistema geral de educação, era anunciada pela nossa

primeira Lei de Diretrizes e Bases – LDB, a Lei nº. 4024 de 1961 que tinha como

objetivo “integrá-los na comunidade” (Art. 88). De acordo com Lopes (2005)

“essa legislação favoreceu a ampliação de uma prática que já se instalava de

maneira tímida”.

No sistema educacional brasileiro, a política da Educação Inclusiva foi

introduzida por meio da Política Nacional de Educação Especial, PNEE (1994),

da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDBEN (lei nº.

9394/96), do Parâmetro Curricular Nacional, PCN – de Adaptações Curriculares

para a Educação de alunos com necessidades educacionais especiais (1999), da

Portaria nº. 1679 (1999) e do Plano Nacional de Educação, PNE (2001).

A Política Nacional de Educação Especial (PNEE) situa a Educação

Especial no Brasil, faz uma revisão conceitual da terminologia e traça objetivos

para a política de Educação Especial referente à inclusão de alunos. Mas este

documento ainda não determina o comprimento das ações para o alcance desses

objetivos oficialmente. Infelizmente, enfatiza o atendimento educacional dos

“alunos com deficiência”, apresentando o caráter assistencialista e terapêutico da

Educação Especial.

A Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional – LDBEN, nº.

9394/96 dedica um capítulo exclusivo à Educação Especial (cap. V), o que não

acontece nas leis de Diretrizes e Bases da Educação anteriores (Lei 4024/61 e a

Lei 5.692/71).

O artigo 58 da LDBN 9394/96 utiliza a expressão necessidades

especiais, referindo-se ao alunado da educação especial. Esta expressão, nas

palavras de Carvalho (2004) “tornou-se mais abrangente aplicando-se, não só aos

alunos com deficiência, como também a todos aqueles “excluídos” por diversas

razões que os levam a ter necessidades especiais, em várias dimensões da vida,

particularmente a escola”.

63

Para melhor entendimento, o uso do termo “necessidades especiais”

significa que a presença da deficiência não implica, necessariamente, dificuldades

de aprendizagem, ressaltando ainda que, muitos alunos apresentam distúrbios de

aprendizagem e nem por isso são pessoas com deficiência. O que ambos os grupos

têm em comum, são as necessidades educacionais especiais, exigindo recursos

educacionais que não são utilizadas na “via comum” da educação escolar. Para

Carvalho (2004) “dessa forma a ênfase desloca-se do “aluno com defeito” para

situar-se resposta educativa da escola” (p. 40).

Sendo assim, no entendimento de Sassaki (2003) “o termo

necessidades educacionais especiais foi adotado pelo Conselho Nacional de

Educação/ Câmara de Educação Básica (Resolução nº. 2, de 11-09-01, com base

no Parecer CNE/CEB nº. 17/2001, homologado pelo MEC em 15-08-01). Esta

Resolução explica que as necessidades especiais decorrem de três situações, uma

das quais envolvendo dificuldades vinculadas a deficiências e dificuldades não-

vinculadas a uma causa orgânica”.

O Plano Nacional de educação (PNE), Lei nº. 10.172, publicado em

11/01/2001 no Diário Oficial da União, de duração plurianual, visa à articulação e

ao desenvolvimento do ensino em seus níveis e à integração das ações do Poder

Público que conduzam aos eixos norteados pela constituição do analfabetismo, a

universalização do atendimento escolar, a melhoria da qualidade de ensino, a

formação para o trabalho, a promoção humanística, científica e tecnológica do

país. Esses eixos, no entanto, não são mencionados no PNE.

O Governo Federal, por meio do Ministério de Educação,

representado pela Secretária de Educação Especial e pela Secretária de Educação

Fundamental, publicou, em 1999, o documento intitulado Parâmetros

Curriculares, que traz de maneira específica, nas palavras de Albuquerque (2005),

“sugestões de adaptações curriculares de pequeno e grande porte que podem e

devem ser tomadas para permitir a inclusão do aluno com necessidades

educacionais especiais em sala de aula regular”.

Segundo Carvalho (2004, p.116) atualmente dispomos de um texto

oficial contendo as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação

64

Básica, decorrente do Parecer CNE / CEB nº. 17 de 2001 e que inspirou a

Resolução nº. 2, de 11 de setembro de 2001, que substituiu o documento da

Política Nacional de Educação Especial. Seu alunado expandiu-se, podendo ser

constatado pelo texto do Artigo 5 da supra citada Resolução nº. 2:

Consideram-se educandos com necessidades educacionais especiais os

que, durante o processo educacional, apresentarem:

I- dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo

de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades

curriculares, compreendidas em dois grupos:

a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica;

b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou

deficiências;

II- dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos

demais alunos, demandando a utilização de linguagem e códigos aplicáveis;

III- altas/ habilidades/ superdotação, grande facilidade de

aprendizagem que os leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e

atitudes.

A Lei Federal nº. 7.853/89 (que dispõe sobre a Política Nacional para

a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência), mais tarde regulamentado pelo

Decreto Federal nº. 3.298/99, trata da questão da criminalização do preconceito e

de acordo com seu teor, nenhuma escola ou creche pode recusar, sem justa causa

o acesso da pessoa com deficiência à escola nem impedi-la de ocupar cargos e

empregos públicos ou privados ou negar-lhe atendimento médico-hospitalar. A

pena para o infrator é de um a quatro anos de reclusão além de multa.

Segundo Werneck (2000, p.83) a polêmica sobre a obrigatoriedade da

escola brasileira em aceitar alunos com necessidades especiais se acirra quando

estudamos essa Lei, uma vez que “ela dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras

de deficiência e sua integração social, institui a tutela jurisdicional de interesses

65

coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público,

define o preconceito como crime, além de dar outras providências”.

Não se pode esquecer que o Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA) de 1990 também apresentou inegáveis avanços rumo ao processo

inclusivo; que em seu Título I – Das Disposições Preliminares – destaca a criança

com deficiência: no § 1º do Art. 11 refere-se ao atendimento médico; no item III

do Art. 54, no que diz respeito ao dever do Estado de assegurar atendimento

educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino e no Art.

66, que faz alusão ao trabalho protegido (Carvalho, 2004; p.20).

A titulo de curiosidade, a Lei Federal 8.069, do ECA, diz que a não

realização do teste do pezinho pode punir com pena de detenção de seis meses a

dois anos médico, enfermeiro e dirigente de estabelecimento que não providenciar

a coleta de sangue do recém-nascido objetivo objetivando este teste, uma vez que

este pode detectar algumas patologias que se não forem tratadas logo de início,

podem desencadear deficiências (Werneck, 2000; p. 252).

O modelo de sociedade inclusiva não é um projeto

descontextualizado, sendo uma exigência social e política, mais do que isso é a

tradução dos valores da democracia, da justiça social e da solidariedade que vêem

progressivamente, impondo o reconhecimento do direito de todos à educação e à

cidadania. Para tanto, não bastam apenas criação de leis, mas principalmente, uma

mudança significativa nos paradigmas atuais, sejam eles políticos, sociais ou

educacionais. Nas palavras de Lopes (2005) “a verdadeira inclusão não é ou que

esta operacionalizada nas leis, mas a que diz respeito às relações, o que depende

da pessoa que vai receber o aluno deficiente”.

66

A construção do roteiro da pesquisa

“...lembrar você: um sonho

a mais não faz mal...”

(Roupa Nova)

67

Pretendemos neste capitulo evidenciar os percursos metodológicos

utilizados para a produção de nossa pesquisa; apresentando e discutindo os

caminhos delineados, as escolhas realizadas, o campo de estudos, o foco da

pesquisa, os conceitos, a pesquisa de campo, a produção de dados, ou seja, os

elementos que constituíram nossos modos de fazer esta pesquisa. Pois de acordo

com Lopes (2002) toda pesquisa é resultado de um conjunto de decisões e opções

tomadas pelo investigador ao longo do processo de investigação e que marcam

todos os níveis e etapas desse processo. Segundo ela, pesquisas:

São decisões e opções de caráter epistemológico, teórico,

metodológico e técnico, e incidem seja sobre a construção do

objeto,seja sobre sua observação e análise, sendo que o quadro teórico

– metodológico da pesquisa vai se construindo em processo e não

fixado a priori (p.25).

Lembramos que as realizações de cada etapa da pesquisa nos levam

pelos mais variados caminhos... E como nos ensina Pirsig (2004) “o mais

importante é aprender a não se perder” então iniciei minha viagem na base da

intuição e da dedução a partir do que ia sendo encontrado. Por isso, entrar em

campo foi antes de tudo uma permissão para olhar de outros modos

acontecimentos contextualizados nas práticas escolares, mas que nem por isso

tornou mais fácil o ato da pesquisa. Deparamo-nos então com escolhas bem

difíceis, pois, ao termos em mãos variadas fontes de registros e de informações,

começa o processo de escolha acerca do que é necessário e importante para os

objetivos da pesquisa.

Esta pesquisa analisa as representações sociais de estudantes acerca

dos personagens da telenovela América com deficiência e como o processo de

inclusão social de alunos com deficiência está representado por estes; para tanto,

selecionamos uma escola pública da rede regular de ensino da cidade satélite de

Ceilândia/DF que possuía alunos deficientes inseridos em alguma de suas

turmas.Os sujeitos da pesquisa são alunos com deficiência e seus colegas.

Tomamos como base os princípios da investigação qualitativa,

priorizando a interpretação dos dados em uma pesquisa exploratória, adotando-se

como procedimento para a coleta de dados a prática da observação participante,

68

entrevistas conduzidas como diálogos (mais flexíveis) e utilização de grupo focal

para ampliar a participação dos pesquisados. Ressaltamos que tais procedimento

serão melhor descritos mais adiante neste capítulo.

Importante explicar que a adoção da pesquisa exploratória neste caso

justifica-se por ser esta a que apresenta menor rigidez em seu planejamento – mas

nem por isso menos trabalhosa – tendo como objetivo esclarecer conceitos e

idéias com fins a proporcionar uma visão mais próxima acerca do fato escolhido

para estudo.

Para a compreensão das representações sociais sobre deficiência no

contexto da sala de aula pesquisada, utilizamos uma abordagem qualitativa do tipo

estudo de caso por acreditarmos que este “se constitui numa unidade dentro de

um sistema mais amplo, capaz de focar nosso interesse naquilo que ele tem de

único, de particular que tem valor em si mesmo” (Lüdke e André, 2004; p.17).

Segundo Yin (apud Gil,1999; p.73) o estudo de caso é um estudo que

investiga um fenômeno atual dentro do seu contexto de realidade. No caso desta

pesquisa, este estudo procura descrever a situação do contexto da sala de aula

mediada pela análise dos personagens com deficiência da telenovela América

influenciando nas representações sociais dos alunos pesquisados.

Nossa opção metodológica em limitar a pesquisa aos alunos de uma

sala de aula justifica-se pela necessidade de aprofundamento do estudo

considerando o contexto escolar bem como suas diversas relações e interações.

Esta pesquisa situa-se na perspectiva sócio – histórica de acordo com

Vygotsky (1984,2001) que estabelece o desenvolvimento da criança através de

suas interações sociais vivenciadas desde seus primeiros anos, aonde os

significados do mundo para elas vão constituindo-se aos poucos se tornando

assim, essencial o reconhecimento da dimensão histórico cultural na sua

constituição enquanto sujeito.

A concepção sócio – histórica apresenta uma visão otimista em

relação ao desenvolvimento do deficiente. Lev Semiónovic Vygotsky (1896-

1934) foi o autor que inovou teoricamente os estudos sobre deficiência ao

69

apresentar seu referencial teórico sobre o desenvolvimento atípico das crianças

denominadas socialmente de deficientes, em seu livro “Fundamentos da

Defectologia” (1989).

Freitas (2003, p.26) considera a perspectiva sócio-histórica um

“caminho significativo” para produzir conhecimento em ciências humanas:

Ao compreender que o psiquismo é constituído no social, num

processo interativo possibilitado pela linguagem, abre novas

perspectivas para o desenvolvimento de alternativas metodológicas

que superem as dicotomias externo/interno, social/individual. Ao

assumir o caráter histórico-cultural do objeto de estudo e do próprio

conhecimento como uma construção que se realiza entre sujeitos, essa

abordagem consegue opor aos limites estreitos da objetividade uma

visão humana da construção do conhecimento.

Bakhtin dentro dessa abordagem sócio – histórica amplia o leque de

perspectivas acerca de estudos educacionais mediante sua teoria enunciativa da

linguagem quando este considera a pesquisa como uma interação entre sujeitos,

assumida como essencial no estudo dos fenômenos humanos – como é o caso das

representações sociais. Para ele o sujeito é percebido em sua singularidade, ao

mesmo tempo em que é situado em sua relação com o contexto histórico – social.

Assim, a perspectiva sócio-histórica considera alguns fatores que

contribuem para a formação e manutenção das representações sociais, tais como:

valores, modelos, cultura, comunicação de massa, contexto social, econômico e

histórico, inserção social e dinâmica da instituição.

Desta forma, conceber a pesquisa do fenômeno das representações

sociais a partir da perspectiva sócio – histórica implica compreendê-la como uma

relação entre sujeitos possibilitada acima de tudo, pela linguagem.

A coleta dos dados utilizou três estratégias metodológicas:

1. A observação participante conceituada por Gil (1999, p.113), como aquela

que consiste na participação real do conhecimento na vida da comunidade,

assumindo o observador o papel de um membro do grupo. É uma técnica pela

70

qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele

mesmo; constituindo-se no estudo do sujeito em seu próprio contexto

permitindo a obtenção do maior número de informações sobre o cotidiano em

estudo e os indivíduos aí inseridos.

Souza e Zioli (2003) consideram a observação participante como parte

essencial do trabalho de campo na pesquisa qualitativa, pois suscita uma

variedade de situações ou fenômenos que não são obtidos por meio de perguntas,

favorecendo inclusive uma melhor compreensão do cotidiano dos sujeitos.

De acordo com Freitas (2003, p. 33) a observação numa pesquisa de

abordagem sócio – histórica se constitui em um encontro de muitas vozes, de

forma que são os discursos responsáveis por refletirem e refratarem a realidade da

qual os sujeitos fazem parte construindo o que à autora denomina de “uma

verdadeira tessitura da vida social”.

Mais do que participante, durante minhas observações para a

realização da pesquisa, procurei estabelecer uma dimensão alteritária, pois ao

mesmo tempo em que me constituí como parte do evento observado; também

mantive certa posição distanciada para que esta me possibilitasse o encontro com

o outro, procurando construir em meus textos o conhecimento produzido na

investigação mediante a revelação de outros contextos criados a partir da

circulação de discursos não restringindo a observação apenas à descrição de

eventos, mas sim procurando suas possíveis relações de integração entre o

individual com o social.

Utilizamos esta técnica como alternativa às tradicionais de

levantamento quantitativo – estatístico das audiências, e em orientar a pesquisa do

consumo dos meios, principalmente da televisão para o seu contexto natural, ou

seja, a sala de aula. Entretanto, como nos alerta Silverstone (1996, apud Lopes

2002, p.54), esse consumo não deve ser visto apenas em seu aspecto material, mas

também como sendo eminentemente simbólico (cultural), além de ser uma pratica

contextualizada.

71

Essas observações foram registradas num Diário de Campo que serviu

de recurso para a produção de dados uma vez que este agrupa um conjunto de

anotações realizadas durante todos os momentos em que o pesquisador esteve

presente no ambiente escolar registrando falas, situações vivenciadas e/ou

observadas, descrição de lugares e pessoas, reflexões e questões pessoais e

dúvidas. Todas essas anotações hoje se convertem no que Barbosa e Carvalho

(2005) chamam de dados da memória em relação ao que foi pesquisado; definindo

aquilo que seria realmente importante para a pesquisa.

Nosso objetivo ao utilizarmos esse instrumento é o de compreender

como os sujeitos envolvidos na pesquisa representam socialmente a deficiência

em suas relações cotidianas de sala de aula, observadas nas interações professor-

aluno e aluno-aluno. Atitudes estas demonstradas antes de assistirem aos capítulos

da telenovela América abordando seus personagens deficientes.

2. A entrevista semi-estruturada que, de acordo com Lüdke e André (2004,

p.34), se desenrola a partir de um esquema básico, mas que não é aplicado

rigidamente, permitindo ao entrevistador realizar as devidas adaptações.

Nas palavras de Rey (2002; p.89), “a entrevista, na pesquisa

qualitativa, tem sempre o propósito de converter-se em um diálogo, em cujo curso

as informações aparecem na complexa trama em que o sujeito às experimenta em

seu mundo real”. Aqui, a entrevista semi - estruturada é tomada no sentido amplo

da comunicação verbal e, no sentido restrito de coleta de informações.

Corroborando com esta concepção, Freitas (2003) considera que a

entrevista no âmbito da pesquisa qualitativa de cunho sócio – histórico por

acontecer entre duas ou mais pessoas; tem a particularidade de ser compreendida

como uma produção de linguagem haja vista que ela acontece numa situação de

interação verbal e tem por objetivo a mútua compreensão.

Segundo Lopes (2002) diferentes tipos de situação interativa entre

pesquisador e informante produzem diferentes tipos de materiais, pois, a situação

de entrevista é marcada por um crescimento na inter – relação que permite o

acercamento a questões de maior privacidade. De acordo com a autora, após um

72

reconhecimento inicial do ambiente, as entrevistas passam gradativamente as

temáticas para que as pessoas falem sobre a telenovela. São essas entrevistas

focalizadas no tema as próprias mediações, haja vista que o roteiro de assuntos

tratados foi pensado de modo a informar as relações entre a realidade vivida e a

realidade construída na telenovela com ênfase na questão da inclusão social de

pessoas deficientes. Para Lopes (p.58) esses assuntos funcionaram como “campos

de sentido” e foram sendo definidos na medida em que se revelaram significativos

na trama da telenovela e também no cotidiano das crianças.

Neste ponto, a cada nova entrevista ia crescendo o grau de

compreensão das crianças sobre o que realmente pretendíamos com a pesquisa, ou

seja, encontrar nas falas dos sujeitos as marcas de suas representações sociais

acerca da deficiência através dos personagens da telenovela América e como estas

questões se refletem no processo de inclusão dessas pessoas em suas vidas.

3. Por fim, utilizamos capítulos reeditados da telenovela (TVN-R) América na

busca da reelaboração da fala dos sujeitos da pesquisa a respeito de suas

concepções acerca da deficiência aplicando o grupo focal. Para Cotrim (1996;

p.286):

O grupo focal pode ser considerado uma espécie de entrevista de

grupo, embora, não no sentido de ser um processo onde se alternam

perguntas do pesquisador e respostas dos participantes.

Diferentemente, a essência do grupo focal consiste justamente em se

apoiar na interação entre seus participantes para colher dados, a partir

de tópicos que são fornecidos pelo pesquisador. Uma vez conduzido,

o material obtido vai ser a transcrição de uma discussão em grupo,

focada em um tópico específico (por isso grupo focal).

Seguindo uma metodologia aplicada pela pesquisadora Maria

Immacolata Vassalo Lopes e sua equipe do Núcleo de Pesquisa de Telenovela da

Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP) o

corpus dessa pesquisa foi constituído pela gravação completa em vídeo dos

capítulos da telenovela América exibidos entre os dias 12 e 16 de abril de 2005,

bem como os exibidos entre os dias 09 e 13 de maio do mesmo ano. Desta

gravação foi extraído um corpus menor formado pela seqüência escolhida pela

73

pesquisadora, o qual constituiu a telenovela reeditada (TVN-R), como já dito

anteriormente, utilizada nas discussões do grupo focal. Nosso trabalho de campo

também recolheu a sinopse produzida pela TV Globo e o clipping (matérias da

mídia sobre a telenovela).

A associação da TVN-R juntamente com o grupo focal resultou numa

discussão que provocou inúmeros debates alimentados principalmente pela

convergência e pelos conflitos de opiniões dos participantes. Reunimos os alunos

pesquisados para assistirem, conjuntamente, um vídeo que continha a seqüência

selecionada pela pesquisadora. O grupo focal foi usado estrategicamente no

sentido de não ter sido estimulado por nós, mas pela telenovela que o próprio

grupo havia refeito de memória. Pelo fato de não estar mais sendo exibida, este

recurso permitiu que não ficássemos no efeito imediato da telenovela, na reação

que se segue à cena no ar, proporcionando que sua repercussão fosse filtrada pela

memória das crianças dando assim um maior poder de alcance desta estratégia.

Desta forma, parte-se do pressuposto de que a análise dessas falas,

juntamente com os demais instrumentos de coleta de dados nos aproxima da

dimensão acerca dos múltiplos aspectos inerentes ao cotidiano do sujeitos e do

levantamento de informações complementares, as quais dizem respeito a sua

dinâmica social, possibilitando a identificação das representações sociais sobre a

deficiência, assim como dos elementos políticos, culturais e econômicos que

permeiam o contexto no qual são produzidas socialmente.

74

Contextualizando a pesquisa

“Aqui nesse mundinho

fechado ela é incrível...”

(Skank)

75

A seleção da turma que participou da nossa pesquisa teve como

critério ser uma classe de ensino regular composta também por alunos deficientes,

caracterizando assim uma sala de aula inclusiva. Optamos pela Escola Classe 08

localizada no endereço EQNN 05/07 na cidade satélite de Ceilândia – DF que foi

fundada em 28 de fevereiro de 1972. Possui 20 salas de aulas distribuídas em 4

blocos das quais 17 são destinadas às classes escolares; as demais foram ocupadas

pela biblioteca, sala de apoio ao professor e a sala dos auxiliares em educação.

Possui também uma sala de professores, uma sala para a Equipe de Apoio à

Aprendizagem, uma secretaria, uma sala para a coordenação pedagógica e um

laboratório para pequenas experiências. Continuando a descrição física da escola,

existem três banheiros femininos e três masculinos; um parque, uma quadra de

esportes, uma cantina e um pátio interno.

Para iniciar a coleta de dados, procuramos a diretora da escola que,

diante do esclarecimento sobre o objetivo da pesquisa se colocou à disposição

para que pudéssemos realizar o trabalho. Pediu apenas que apresentássemos um

encaminhamento da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e em

seguida encaminhou-me à coordenadora que então fez a indicação da turma da

professora Betânia, que recebeu-nos muito bem e demonstrou total

disponibilidade e disposição para colaborar na realização do trabalho.

Combinamos a freqüência e o inicio das observações.

Esta turma foi escolhida por apresentar o maior número de alunos em

processo de inclusão. Trata-se de uma classe da terceira etapa do Bloco de

Iniciação a Alfabetização – BIA possui vinte e um alunos, sendo três

diagnosticados pela equipe de Apoio e Aprendizagem como Alunos com

Necessidades Educacionais Especiais. A turma é denominada “integração

inversa”, definida pela Secretaria de Educação do Distrito Federal, dentro da

política de inclusão escolar e deve apresentar um número reduzido de alunos, até

vinte, dentre os quais até três alunos com diagnostico de deficiência e se destina,

exclusivamente, à Educação Infantil e à 1ª série do Ensino Fundamental.

Apesar de possuir a opção do anonimato, tanto a professora Betânia

como os pais de seus alunos consentiram na utilização de seus nomes verdadeiros.

76

Os dados, as observações, as conversas mantidas com a professora, as

entrevistas realizadas com os alunos bem como as discussões realizadas após a

exibição de cada capítulo de América, onde a pesquisadora instigava os

participantes a expressarem suas opiniões acerca do tema foram anotados no

diário de campo. A utilização de gravações foi extremamente importante para

registrar conversas e entrevistas a fim de analisá-las posteriormente com intuito de

captar as representações sociais dos sujeitos pesquisados sobre a deficiência.

O seu quadro administrativo conta com 3(três) pessoas na equipe da

direção (diretora, vice-diretora e assistente), 17 professores no matutino e o

mesmo quantitativo no vespertino e 3(três) coordenadores. Os auxiliares em

educação compreendem 4(quatro) cantineiras responsáveis pelo preparo do

lanche, 4(quatro) auxiliares de limpeza no matutino e 3(três) no vespertino, 3(três)

vigias, 2(dois) porteiros e um secretário e seu assistente.

A escola possui um total de 963 alunos distribuídos em 17 turmas no

matutino e o mesmo número de turmas no vespertino; essas turmas possuem 30

alunos quando definidas como ensino regular e 15 quando denominada inclusiva,

ou seja, possuem alunos deficientes em processo de inclusão. Existe uma turma

com essa característica no matutino e mais duas no vespertino.

77

Análise da representação social da telenovela acerca da inclusão social

“...é que a televisão me deixou burro,muito burro demais; e agora todas as coisas que eu penso me parecem iguais... fala pra mãe, que tudo que a antena captar meu coração captura... ”(Titãs)

78

Glória Perez é uma autora pioneira em incluir suas tramas o chamado

merchandising social11. Em “Carmem” (1987) na extinta TV Manchete, ela

utilizou pela primeira vez uma personagem aidética para debater esta questão e

esclarecer as pessoas sobre o HIV. Em “América” não poderia ser diferente, pois

ela aborda cinco histórias que proporcionam muita reflexão e debate. Uma das

principais características que comprovam o estilo contemporâneo de Glória Perez

ao escrever América é o fato da novela contar várias e importantes histórias ao

mesmo tempo – todas muito fortes e polêmicas. Discussão sobre imigração ilegal,

a dura vida dos imigrantes clandestinos, a infidelidade, a pessoa cleptomaníaca, os

bastidores dos rodeios, crises conjugais, homossexualidade e principalmente as

dificuldades e superações da pessoa deficiente, fazem com que os personagens

assumam papéis que revelam um convívio mais próximo à nossa realidade.

Além da dura vida dos deficientes visuais, aborda a questão da

imigração ilegal para os EUA, na qual a personagem Sol (Deborah Secco)

acreditando não ser possível vencer no Brasil após nascer e crescer numa favela

da cidade do Rio de Janeiro sonha em se mudar para os EUA e alcançar o

famigerado “sonho americano”. No entanto, tem seu visto negado e como

milhares de outros latino-americanos que não conseguem sua entrada no país de

forma legal, apela para outra estratégia que, além de fora-da-lei é extremamente

perigosa: a travessia pela fronteira levada pelos “coiotes”. Ao conhecer Tião

(Murilo Benício) acredita ter encontrado seu amor, mas viverá um sério conflito,

pois este acredita que pode alcançar êxito em seus sonhos aqui mesmo no Brasil e

essa incompatibilidade de sonhos atrapalhará o romance do casal.

Existe a história do marido infiel vivido por Glauco (Edson Celulari)

que apesar de ser rico, ter uma filha linda e uma esposa invejável possui uma

amante, Nina (Cissa Guimarães) sua advogada a qual vive enganando com

promessas de um divórcio que nunca acontece. Esse triângulo amoroso ganha

11Estando inserida num meio de comunicação como produto da indústria cultural a telenovela pode, através de sua mensagem, difundir idéias e/ou valores que tenham sobre o público algum efeito. A este processo dá-se o nome de merchandising social.

79

mais um vértice e torna-se assim um quadrado, pois ele ainda envolve-se com a

amiga de sua filha, a ninfeta Lurdinha (Cléo Pires) gerando muita confusão.

Piorando a sua situação, sua esposa Haydée (Cristiane Torloni) é cleptomaníaca, o

que lhe causa várias situações constrangedoras.

O mundo dos rodeios é apresentado na forma do personagem Tião

(Murilo Benício) que cresceu no meio do gado e sempre teve vocação para pião

de rodeio sonhando em ser campeão desse esporte, vencer na vida e ajudar a

família, principalmente depois da morte de seu pai. Sua carreira começa em sua

cidade natal, Boiadeiros, e tudo o que ganha de premiação transforma em gado

para aos poucos realizar o desejo de seu pai quando vivo. Mas seu grande objetivo

é vencer o maior rodeio do Brasil realizado na cidade de Barretos – SP e assim se

consagrar como um dos melhores em sua categoria, ganhando fama, prestígio e

dinheiro. Vive um romance tumultuado com Sol e não aceita que esta queira viver

longe dele na América. Em Barretos conhece Sol e se descobre apaixonado, mas

decepciona-se ao saber que o grande sonho de sua amada é ir embora para os

EUA ganhar dólares e nunca mais voltar; diferentemente dele que nem pensa em

abandonar os rodeios e nem deixar para trás sua mãe e seu avô que tanto precisam

dele.

Por fim através do casal Neto (Rodrigo Faro) e Heloísa (Simone

Spoladore), a autora desenvolve temáticas como a crise no casamento gerada por

causa da ida do casal para os EUA e a pedofilia na internet ocorrida com o filho

deles, Rique (Matheus Costa). Desempregado no Brasil Neto um médico recém-

formado ganha uma bolsa de estudos para fazer uma especialização nos EUA o

que obriga sua esposa Heloísa a abandonar no Brasil sua sociedade numa firma de

advocacia e mudar-se juntamente com seu filho de cinco anos para outro país. Lá

a experiência só é boa para Neto que passa muito tempo ocupado com o curso,

enquanto Heloísa vive dias de tédio sem exercer sua profissão que tanto adora e

com isso arrepende-se de ter acompanhado o marido. Não bastasse tudo isso, o

pobre Rique apresenta dificuldades de adaptação frente às diferenças culturais que

existem entre brasileiros e americanos. O que deveria unir a família acabou

justamente por separá-los, pois não agüentando mais tanto ócio e solidão, Heloísa

pede o divórcio e volta para o Brasil com seu filho.

80

A escolha de “América” deve-se ao fato de ser esta a primeira novela

que tem por um dos temas centrais da trama, a história de dois deficientes visuais

e suas lutas pela inclusão social. O conceito de inclusão com o qual estamos

trabalhando é o definido por Sassaki (1998, p.22) como:

O processo pelo qual a sociedade se adapta pra poder incluir, em

seus sistemas sociais gerais; pessoas com necessidades especiais e,

simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na

sociedade, na equiparação de oportunidades para todos.

O destaque da trama, a ser analisada, centra-se na história do

deficiente Jatobá (Marcos Frota) e sua luta para exercer seus direitos enquanto

cidadão. Essa é a primeira vez na história das telenovelas que essa temática ganha

destaque como enredo principal. Nas palavras da autora:

A função da novela é colocar o assunto em discussão e dar voz aos

deficientes. Espero que ela estimule projetos que viabilizem sua

inclusão social”, afirmou Gloria Perez, ressaltando que a campanha

social de “América” não vai se restringir aos deficientes visuais,

falando de todos que tenham alguma deficiência física. “Espero que

as instituições e a sociedade continuem pensando nos deficientes

depois que a novela acabar que não fique só no modismo, salientou

Gloria.

De acordo com Márcio Schiavo (1995) o merchandising social

repercute no telespectador na intenção de incutir-lhe uma idéia. Ainda de acordo

com o mesmo autor “é o conceito que se deseja transmitir, aquilo que se procura

transformar na conduta da audiência”. No caso da telenovela América um dos

principais objetivos era o de “divulgar” a lei que permite o uso do cão – guia em

todos os lugares públicos.

Nas palavras do ator Marcos Frota: “O Jatobá está no colo do povo e

esse é o melhor trabalho de inclusão social que se poderia ter. A missão da novela

é divertir, mas se conseguir educar e passar alguns princípios morais, melhor

ainda” destaca.

Segundo Marcos Frota, com a novela as pessoas estão começando a

descobrir que tem lei que protege a presença do cão-guia em lugares públicos. As

81

pessoas cegas estão começando a criar mais coragem para experimentar esse tipo

de apoio.

Em entrevista ao jornal da AME (Amigos Metroviários dos

Excepcionais), o ator Marcos Frota comenta sobre a contribuição da novela para a

sociedade:

A novela não tem a pretensão de nada mais que divertir e servir como

base de informação. Novela é produto de entretenimento, de lazer,

que tem como objetivo maior provocar emoção e não uma reflexão

mais profunda. Mas a gente sabe a força que uma novela tem. O

grande ganho que a novela provoca é o diálogo. Está todo mundo se

movimentando a esse respeito, os movimentos artísticos ligados a

pessoas com deficiência estão mais entusiasmados. O cego está na

moda. Não dá para resolver o problema, mas dá para jogar luz e

provocar diálogos. .

Acrescenta ainda: “É uma alegria saber que nosso trabalho está tendo

esse desdobramento, poder ajudar as pessoas no exercício de ator. Tenho recebido

muito carinho do público. Se Jatobá está chegando ao coração das pessoas, isto se

deve muito a Gloria Perez”, explicou o ator. Ele acrescentou: “Me sinto um

soldado participando dessa luta dos deficientes”. .

Para a autora Glória Perez, “as pessoas com deficiência visual estão

sendo vistas como cidadãs iguais a quaisquer outras. O próprio presidente do

Conade (Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência) nos

disse que” América “conseguiu mais por essas pessoas do que em 40 anos de luta,

mostrando do que elas são capazes, mostrando que elas merecem respeito. Coisas

assim não têm preço”.

Ao discutir questões acerca da dura vida dos deficientes, Glória Perez

trouxe de forma contundente na novela “América” a divulgação da lei que apóia

deficientes visuais a entrarem em qualquer estabelecimento com seu cão – guia. A

campanha aconteceu de maneira tão incisiva que os alunos, ao serem perguntados

quais cenas lembravam o personagem Jatobá, deram, os seguintes depoimentos:

82

“Ele tinha um cão, pra onde ele ia o cão ia também guiando ele. Ele

fazia caminhada com o cachorro”. Gabriel – 8 anos

“Ele andava com o cachorro assim (imita o personagem) e ele era cego.

Era engraçado porque ele andava com o cachorro no meio da rua e

quando eles entrava pra dentro da casa. Ele brincava muito com ele

(cachorro), ele gostava muito dele e o dono gostava muito dele e eles

eram o melhor amigo”. Fabrício – 9 anos

“Ele era cego, fazia papel de cego, andava com um cachorro, um dia

ele tava numa praça e veio o homem e queria matar ele”. Taís – 8 anos

“Ele andava com uma bengala e tinha um cachorro. Um dia tinha um

sinal de trânsito, ele botava a mão e o carro parava”. Renata – 8 anos

“Ele era cego e pra onde ele ia, ele levava o cachorro”.

“O Jatobá sempre fazia a caminhada e encontrava seus amigos e ia

correndo e falando com seu cão”. Gabriel – 8 anos

“Ele era cego, ele andava com um cachorrinho”. Úrsula – 9 anos

“Ele era cego, ele tinha um cachorro que todo lugar que ele ia, o

cachorro ia pro lugar e ele sabia pelo cachorro quem era”. Raquel

Silvestre – 9 anos.

Ao elegerem essas duas características, a cegueira e o cão – guia para

expressarem suas representações sociais acerca do personagem Jatobá, elas

reforçaram a teoria de Moscovici (2005) quando este\afirma que “no processo de

comunicação social as representações sociais circulam, cruzam-se e se cristalizam

incessantemente, através de uma fala, um gesto, um encontro, em nosso universo

cotidiano” (apud Martins – et al. – 2006 p.99) construindo assim suas próprias

representações.

Schiavo em sua tese de livre-docência (1995) aponta que o

merchandising social não envolve custos, mas possui sim um compromisso

ideológico com o pensamento do autor ou da emissora de televisão. Em

83

levantamento feito durante seus estudos identificou duas origens como

oportunidade para a inserção de temas nas telenovelas. O primeiro seria o

Levantamento de Oportunidades (LEVOPS) e segundo acontece a partir da

vontade do autor de discutir temas sociais.

Tanto para os autores quanto para o departamento de merchandising

que é o substrato narrativo do mesmo são as cenas da telenovela, as que

representam a reconstrução da realidade pela reprodução do cotidiano. Schiavo

(1995) então identifica que o objetivo da ação de merchandising é estimular o

mecanismo empático, identificatório com a realidade reproduzida na telenovela, o

que proporciona uma forma de manipulação da opinião pública, pois o público

passa a crer e fazer uso dos valores transmitidos pela telenovela, incorporando-os

no seu dia- a -dia.

Reafirmando a importância da telenovela, Lopes (2002, p.23) entende

a telenovela como um construto que ativa na audiência uma competência cultural

e técnica em função da construção de um repertório comum, que passa a ser um

repertório compartilhado de representações identitárias, sejam estas sobre a

realidade social ou mesmo sobre o próprio indivíduo.

Schiavo corrobora com Glória Perez ao concluir que “o

merchandising em telenovela tem um forte poder de comunicação, em virtude da

força de influência e ao sucesso que as telenovelas possuem na sociedade

brasileira”.

Em América, temos dois pólos: de um lado, o vibrante Jatobá, um

sujeito que poderia ter se deixado levar pela depressão quando ficou cego já em

idade avançada. Mas, em vez de se revoltar, se imbuiu de coragem e

determinação. Jatobá não tem pena de si mesmo, faz questão de se posicionar em

igualdade de condições com quem não tem deficiência de espécie alguma. Por

meio de cenas protagonizadas por Frota e seu bem treinado cão-guia, o labrador

Quartz, o grande público entra em contato com os obstáculos enfrentados por

deficientes visuais, como mobilidade, emprego, saúde e, principalmente, a falta de

conscientização da sociedade. Do outro lado está Maria Flor. Frágil e desorientada

foi criada confinada em sua casa, afastada da realidade, por Islene, a mãe

84

superprotetora. Nada pior para o desenvolvimento de uma criança do ponto de

vista de vários especialistas no tema.

Ao contrário do personagem Jatobá, Maria Flor despertou nas crianças

inicialmente sentimentos de pena que poderia ser explicado ao se adotar a visão

que a difusão do cristianismo trouxe na Idade Média acerca do deficiente, ou seja,

eram “anjos de Deus” e dignos de compaixão. Prova disso são esses depoimentos

quando são perguntados sobre o que lembravam da Flor:

“Flor era uma menininha ceguinha igual ao Jatobá”. Jéssica – 8 anos

“Ela guiava o pai dela e ela era um pouco feliz (quando perguntada por

que respondeu) porque ela não enxergava muito”. Adriele Lira – 10

anos

“Ela era uma menina que era cega também”. Fabrício – 9 anos

Reafirmando o impacto que causou a novela “América” temos os dois

depoimentos que se seguem. O primeiro é da doutoranda em Literatura

Comparada, a deficiente visual Carlota Pires; e o segundo é o radialista, também

deficiente visual, Beto:

Eu me sinto o próprio Jatobá”, brinca Carlota. “O preconceito ainda

existe, mas já sinto na pele as diferenças. Nas ruas, no táxi, no metrô,

todos falam comigo, puxam assunto, se interessam. Não ficam mais

me tratando como coitadinha”, conta à doutoranda, que chega a se

emocionar. “Acho que a Glória Perez (autora da trama), através dos

personagens Jatobá e Flor, vai conseguir mudar o conceito de

educação especial no país.

Tanto ela como Beto concordam que a novela já está mudando a

forma como a sociedade encara a questão da deficiência visual.

O deficiente pode fazer o que quer, precisa somente do apoio da

família. Não precisa se fechar em guetos pode estudar em colégios

85

regulares, praticar esportes normalmente. Basta que haja assistência

de alguma instituição ou instrutor, explica ele.

Algumas crianças da pesquisa são solidárias em relação às opiniões de

Carlota e Beto quanto à capacidade do deficiente e sua condição de ter uma vida

mais próxima do normal quanto possível, bastando apenas aceitação e apoio por

parte de toda a sociedade. A verdadeira inclusão acontece quando as pessoas se

preparam para conviver com o deficiente, e não o contrário. Simplificando, o

vínculo tanto social, como das capacidades intelectuais e afetivas começa seu

desenvolvimento quando o indivíduo percebe que outro tem uma significação no

seu próprio mundo interior, ou seja, o indivíduo sabe assumir o papel do outro

quando imita, brinca ou quando reflete (Moscovici, 1998, p.7). As crianças são

categóricas quando perguntadas o que uma pessoa deficiente pode fazer:

“Sendo cega pode andar”. César 8 anos

“O surdo pode olhar, pode dirigir, pode falar em surdo (LIBRAS)”.

Gabriel 8 anos

Também encontramos crianças que não partilham de uma visão tão

otimista da pessoa deficiente e encontramos em seus discursos uma visão clássica

e muito difundida acerca da incapacidade do deficiente, especialmente na

Antiguidade e reforçada mais tarde no período do Renascimento quando surge a

concepção organicista radical onde além de doente, o deficiente era dependente.

Para essas crianças suas representações sociais de deficiência reforçam o estigma

de inutilidade e dependência ao serem perguntados sobre o que uma pessoa

deficiente pode fazer:

“Nada”. Raquel 8 anos

“Alguém tem que ficar com ele”. Úrsula 8 anos

“Não pode brincar nem pode enxergar”. César 8 anos

“Não pode andar, não pode enxergar, não pode ouvir. Ele não pode

ficar andando muito rápido se não o carro chega e (imita o barulho de

uma batida de automóveis)”. Igor 11 anos

86

“Não pode andar, só pode andar de cadeira de rodas”. Raquel 9 anos

“Não pode andar na rua sozinho, não pode ficar sozinho”. Úrsula 9

anos

Para demonstrar a importância da temática acerca da deficiência e a

escolha desta novela como mediação para a discussão, o gráfico a seguir mostra a

participação dos personagens Jatobá (Marcos Frota) e Flor (Bruna Marquesini) na

trama:

Logo, para confirmar esta estrutura de narrativa voltada para a

temática da pessoa deficiente como preocupação central da autora, bem como

desenvolver o objetivo específico da pesquisa de analisar a representação social

que a telenovela América veicula sobre a inclusão social além do quadro

acima, foram analisados os capítulos exibidos nos dias 09, 10, 11,12 e 13 de maio

de 2005(ver anexo I).

Tendo como objetivo suscitar na sociedade uma discussão

aprofundada sobre a questão da pessoa deficiente e sua inclusão social, Glória

Perez apresenta os principais personagens desta trama inseridos em situações

cotidianas onde desenrolam seus conflitos e discutem entre si questões ligadas ao

nosso dia a dia. Jatobá foi um personagem criado para mostrar que o deficiente

visual pode ter uma vida independente e também para ser porta-voz das

reivindicações dessas pessoas; seu contraponto é a menina Maria Flor que vive

isolada do mundo e não sabe nada a respeito da vida até conhecer Jatobá e tornar-

87

se independente. Nossa pesquisa faz aqui um recorte da temática para dessa forma

reconhecer quais as representações sociais apresentadas e trabalhadas para seus

expectadores.

No capítulo exibido na segunda-feira dia 09 de maio de 2005, o

personagem de Islene (Paula Burlamaqui) reage mal quando Feitosa (Ailton

Graça) propõe colocar Flor (Bruna Marquesini) na escola. Nascida cega, a menina

encontra na mãe seu maior obstáculo para uma vida normal, pois ao não saber lhe

dar com a deficiência da filha, Islene possui uma representação social de que um

cego não pode ter uma vida como qualquer pessoa e passou a vida toda

escondendo Flor do convívio social acreditando que dessa forma poderia protegê-

la de todos os perigos. Numa análise mais detalhada desta representação social

acerca da deficiência, podemos perceber uma visão encontrada na Antiguidade

Clássica onde a mesma era sinônima de incapacidade generalizada, dependência e

inutilidade, mas diferentemente das pessoas daquela época que matavam esses

deficientes, Islene optou por uma superproteção ao confiná-la em casa de onde só

saía para ir ao médico. Pode-se observar que na construção dos sentidos expressos

pela personagem Islene, fica revelada a dificuldade da mãe com respeito à

independência da filha.

Talvez seja possível que a história de vida dessa mãe na relação com a

filha deficiente possa tê-la levado ao seu receio, talvez a mãe tenha sofrido

algumas frustrações frente a determinadas atitudes da filha ou tenha introjetado

estereótipos sociais a respeito da capacidade do deficiente, e conseqüentemente

das possibilidades da filha em relação a uma vida mais independente, foram

construídas nas interações sociais ao longo de sua vida que segundo Camargo

(2005) representações essas iniciadas antes do nascimento dessa filha, no

momento em que lhe foi revelada a deficiência, no decorrer do desenvolvimento,

tanto nas conquistas como nas frustrações, bem como a partir dos olhares

preconceituosos do grupo social. Desta forma, a mãe elaborou tudo isso pela

linguagem fazendo com que esta construísse tal imagem de sua filha.

Algumas das crianças ficaram tão preocupada com a postura da

personagem Islene – mãe de Maria Flor – constantemente atormentada por sua

superproteção e total falta de informação acerca deficiência da filha que disseram:

88

“Os deficiente pode brincar, porque tem umas mãe que tem o filho

deficiente e não deixa os filho brincar”. Gleicy 9 anos

“Ele (o deficiente) tem que brincar um pouquinho”. Adriele Lira 10

anos

“Pode brincar, pode correr, pode pular”. Rebeca 9 anos

Na seqüência, o capítulo de terça-feira dia 10 de maio de 2005 retoma

a discussão entre Islene e Feitosa e mais uma vez esta argumenta que Flor não

precisa sair de casa para ser feliz. Numa representação social de deficiência

baseada na incapacidade do cego, a mãe mais uma vez demonstra total ignorância

com relação à deficiência de sua filha e diz que ela não está preparada para o

mundo, necessitando de cuidados e muita atenção de sua parte, pois ela teme que

Flor sofra ainda mais ao estar exposta na sociedade.

Demonstrando que esta ainda é uma visão muito recorrente em nossa

sociedade e revelando uma concepção de descrença em relação às possibilidades

dos deficientes, algumas crianças apresentam uma representação social da

deficiência consonantes com a da personagem Islene, como mostra os fragmentos

abaixo:

“Não pode fazer o que a gente faz... Não pode correr não pode brincar.

Que nem meu tio, ele anda mancando, ele não pode correr”. Raquel

Silvestre – 8 anos

“Não pode ficar na rua de noite senão os maloqueiros mata mais

ainda”. Luana 9 anos

A visão de impossibilidade do deficiente jamais realizar sua vida

como os normais é um argumento reiterado por algumas crianças quando estas

transformam através de suas representações sociais o processo de diferenciação,

em processo de exclusão de forma que o outro está, num certo sentido, ausente,

invisível, negado enquanto tal. Aqui a alteridade não existe, pois os entrevistados

trabalham com o discurso que para ser aceito, o deficiente precisa aprender ações

pertencentes aos designados normais, ou seja, vemos nitidamente estampada a

89

visão de integração onde é a pessoa deficiente responsável por se adequar à

sociedade, contrapondo por completo a concepção de inclusão social já definida

anteriormente. Eis os fragmentos:

“A pessoa tem que aprender a andar e olhar e andar de cadeira de

rodas”. Raquel Silvestre – 8 anos

“A pessoa não pode andar, tem algumas que não pode andar enxergar

não, pode andar assim (imita um deficiente físico) tem que aprender a

andar e enxergar tem que aprender”. Raquel – 8 anos

“Se ele puder sair da cadeira de rodas, sei lá; ajudava ele e ele parava

de andar de cadeira de rodas e andava normal como todo mundo”.

Renata 8 anos

A questão do despreparo da sociedade para realizar a inclusão social

de pessoas deficientes é abordada no capítulo de quarta-feira dia 11 de maio de

2005, onde Jatobá (Marcos Frota) comenta com Gomes que os restaurantes

deveriam ter o cardápio em Braille. Dentre as inúmeras dificuldades típicas

encontradas pelos cegos, Jatobá além dos problemas específicos de comunicação,

encontra ainda o total descaso dos projetos urbanísticos que ignoram a existência

de pessoas deficientes e dificultam ainda mais sua locomoção pelas ruas da

cidade.

É interessante ressaltar que o Decreto nº. 5.296, de 2 de dezembro de

2004 em seu Capítulo III trata Das Condições Gerais da Acessibilidade:

Art. 8º Para fins de acessibilidade, considera-se:

I – acessibilidade: condição para utilização, com segurança e

autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos,

das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de

comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com

mobilidade reduzida;

90

II – barreiras: qualquer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o

acesso, a liberdade de movimento, a circulação com segurança e a possibilidade

de as pessoas se comunicarem ou terem acesso à informação, classificadas em:

a) barreiras urbanísticas: as existentes nas vias públicas e nos

espaços de uso público;

b) barreiras nas edificações: as existentes no entorno e interior das

edificações de uso público e coletivo e no entorno e nas áreas internas de uso

comum nas edificações de uso privado multifamiliar.

O Capítulo IV Da Implementação da Acessibilidade Arquitetônica

e Urbanística em sua Sessão I trata Das Condições Gerais:

Art. 10. A concepção dos projetos arquitetônica e urbanística deve

atender aos princípios do desenho universal12 tendo como referências básicas às

normas técnicas de acessibilidade da ABNT (Associação Brasileira de Normas

Técnicas), a legislação especifica e as regras contidas neste decreto. Este debate

apareceu logo nos primeiros capítulos da novela América quando ao andar pela

rua com sua bengala, o personagem Jatobá bate com a cabeça num orelhão e

comenta com as pessoas que passam da importância de projetos urbanísticos

adequados, ou seja, da implantação do desenho universal.

Esses e outros obstáculos têm representado sérios entraves para o

acesso, ingresso e permanência de pessoas deficientes na sociedade, infringindo

seus direitos de ir e vir, criando barreiras à sua participação no exercício de sua

cidadania plena. Demonstrando um esforça enorme em debater a questão, a autora

busca em cenas simples do cotidiano de todos nós suscitar uma reflexão acerca de

nosso papel frente ao deficiente, mas sabemos que esse é um pequeno passo, pois

há muito que ser feito para realizarmos a inclusão social de TODOS.

Para Carvalho (2004, p.60) reconhecer direitos de acessibilidade – em

seu mais amplo sentido -, traduzi-los sob a forma de textos – legislativos

12 Concepção de espaços, artefatos e produtos que visam atender simultaneamente todas as pessoas, com diferentes características antropométricas e sensoriais, de forma autônoma, segura e confortável, constituindo-se nos elementos ou soluções que compõem a acessibilidade. Acessibilidade, Decreto Lei nº. 5.296/2004, Lei nº. 10.048/2000, Lei nº. 10.098/2000. Senado Federal Presidência p. 12/13.

91

normativos ou de outros teores – é da maior relevância, embora não signifique,

necessariamente, que serão concretizados em ações que garantam e assegurem a

todos a mobilidade com autonomia e segurança.

A eliminação dos obstáculos arquitetônicos existentes na sociedade

depende do grau de conscientização dos governantes frente ao significado desses

obstáculos e das atitudes decorrentes para sua superação, ou seja, não basta apenas

vontade política é preciso disposição para captar recursos e boa vontade para usar

os existentes e disponíveis para esse fim.

No dia seguinte, durante a exibição do capítulo da quinta-feira 12 de

maio de 2005 a autora retrata muito bem a dificuldade do processo de inclusão

social da pessoa deficiente quando Islene vai ver algumas escolas para Flor e em

uma delas a diretora reage mal ao perceber que a criança é deficiente, sem contar

o preconceitos dos outros alunos que riem da forma como ela anda. Amedrontada

Flor agarra Feitosa, e Islene lhes diz que não há vagas na escola partindo o mais

rápido possível para longe daquele pesadelo. Na vida real não é diferente... Como

professora do Ensino Especial muitas vezes me deparo com a mesma situação na

hora de encaminhar um aluno para o Ensino Regular e saber que ainda temos

profissionais que temem o diferente e apresentam uma representação social da

deficiência ainda ligada à incompetência e improdutividade acadêmica. A escola

para TODOS ainda esbarra na ignorância e no preconceito das pessoas frente à

diversidade.

É reconfortante perceber que as crianças – as que são responsáveis

pela inclusão de seus colegas – apresentam representações sociais mais positivas

quando o assunto é deficiência. Ao serem perguntadas sobre o que fariam se a

personagem Flor viesse estudar em sua escola, responderam:

“Nóis ia ajudar ela e não ia ficar brigando”. Igor 11 anos

“Nóis ia ajudar ela no dever, nóis ia brincar com ela todo dia”. Jéssica

9 anos

“Ajudaria, a gente ajudaria levando ela pro lugar que ela quisesse.

Ajudaria nos dever dela”. Débora 9 anos

92

“Ela ia ficar feliz, ia ajudar ela a fazer os dever se ela não saber,

mostrar a escola toda pra ela”. Luana 10 anos

“Ajudava ela a andar, brincava com ela”. Taís 9 anos

“Ela não conseguia enxergar no quadro e tinha que ajudar ela falando a

palavra”. Raquel 9 anos

Ainda neste mesmo capítulo, Jatobá reconhece Vera na rua que fica

assustada quando este lhe diz que cada pessoa tem um clima, um cheiro e uma

energia o que para Vygotsky em seus “Fundamentos da Defectologia” é chamado

de compensação do defeito. Isso significa que a compensação do defeito

acontece por uma via indireta muito complexa, de caráter social e psicológico

geral, de acordo com o autor (1989) não se trata do cego ver através dos dedos, do

tato, mas sim da formação de mecanismos psicológicos que permitem através

desta via compensar a falta de visão. Reforçando esta teoria temos a palavra do

personagem cego: “os olhos atrapalham essa percepção”.

Vera também foi muito lembrada pelas crianças por ser a namorada do

personagem Jatobá, o que os deixou surpresos (as crianças), mas não lhe negaram

o direito enquanto deficiente visual de ter uma vida normal, incluindo aí uma

namorada. Entre risos nervosos e bochechas vermelhas de vergonha, os alunos

abordaram a sexualidade dos personagens, mas como era de se esperar, a versão

que prevalece é a de que a sexualidade só se legitima se associada ao amor, à

ternura, às tramas da afetividade e acontece no interior das relações minimamente

estabelecidas e institucionalizadas como no caso de namoros e casamentos. O

casal é assim representado socialmente em seus discursos:

“Ele não conseguia olhar, era apaixonado pela mulher e ele ia sendo

atropelado até que o Farinha salvou ele. Ele tinha uma namorada e ele

tinha um cachorro, o Quartz”. César – 8 anos

“Era um homem cego que era namorado da Vera, tinha um cachorro e

a Flor”. Jéssica – 8 anos

93

“AH”! Que ele até se apaixonou por uma mulher. O cara mandou dá

um murro, bater nele”. Paulo Ricardo – 9 anos.

“Ele ficava com a Vera e ele ficava andando com um cachorro bem

assim (imita o personagem)”. Jéssica – 8 anos

A mesma idéia de privilegiar a discussão sobre a inclusão social de

pessoas deficientes no sistema de ensino, ou seja, a educação inclusiva torna-se

visível na exibição do capítulo de sexta-feira dia 13 de maio de 2005 quando

Feitosa conta à Jatobá que Flor não foi aceita na escola o que provoca sua

indignação e um discurso incisivo acerca da inclusão dessas crianças que não

difere da Teoria sócio-histórica de Vygotsky quando diz que as pessoas são fruto

de suas interações sociais e para seu desenvolvimento pleno, crianças deficientes

devem conviver com aquelas ditas “normais” sem distinção de tratamento e

educação. Jatobá ressalta ainda a importância do convívio de Flor com outras

crianças para que sua vida seja a mais normal possível dentro de suas limitações.

E como repete sempre o personagem de Marcos Frota: “Mas quem não tem

limitações?”.

Em uma publicação própria cujo título é “Rede Globo - Balanço

Social – 2005” a emissora apresentou todas as suas ações relacionadas ao tema,

com destaque para as páginas 15 e 16 que trazem a seguinte matéria:

“Merchandising Social – Educação por meio do entretenimento”

Inspiradas na realidade e na cultura brasileiras, as novelas da Rede

Globo servem como veículo para a transmissão de mensagens educativas, difusão

de conhecimento, promoção da crítica social e incentivo à mudança de

comportamento e ao debate a respeito de questões fundamentais para a sociedade.

É o merchandising social. Em 2005, as novelas da Globo apresentaram mais de

1.500 cenas de conteúdo socioeducativo, sem contar as abordagens em outras

produções de teledramaturgia, como as séries e os infantis. Ao enfocar a

deficiência visual, a novela América, de Glória Perez, contribuiu para o

aprofundamento do debate em todo o país acerca dos direitos das pessoas com

deficiências. Questões ligadas à acessibilidade (como a lei que garante a

94

permanência de cães – guia em coletivos e espaços públicos), à educação

inclusiva e iniciativa reais relacionada aos diferentes tipos de deficiências foram

apresentadas na história do cego Jatobá, levando o assunto para o dia-a-dia da

população.

Conforme a mesma publicação (p.16), a novela “América” teve 396

cenas de conteúdo socioeducativo no ano de 2005 apresentando temas como:

deficiência visual, acessibilidade, educação inclusiva, cleptomania,

homossexualidade, pedofilia, etc.

A preocupação em exibir conteúdo socioeducativo virou marca

registrada no quadro fictício dentro da própria novela América chamado de “É

Preciso Saber Viver”. Idealizado por Glória Perez para ser apenas uma

participação especial do filho de Roberto Carlos, Dudu Braga (também deficiente

visual) que entrevistaria Jatobá divulgando assim as conquistas e superações dos

deficientes, acabou tornando-se um quadro semanal mediante os pedidos do

público. Com isso, fica bastante evidente nas palavras de Artur da Távola (1985)

o quanto à teledramaturgia da Rede Globo diferencia-se das demais ao se

preocupar com a opinião de seus expectadores (citação completa na página... deste

trabalho). Ao entrevistar pessoas deficientes que se destacam nas mais variadas

profissões, Dudu – que além de radialista e produtor musical, toca violão e bateria

– tornou-se âncora da campanha a favor dos direitos da pessoa deficiente.

Para debater as dificuldades da pessoa cega, além do personagem

Jatobá, o programa trouxe a história real do radialista Manoelzinho dos Santos

mostrando sua habilidade em identificar os valores das cédulas apenas pelo tato,

sendo ele uma notável exceção, pois normalmente os cegos não conseguem fazer

o mesmo. Segundo Manoelzinho as cédulas de real não apresentam qualquer

peculiaridade que possa ser reconhecida pelas pessoas que não enxergam. São

muitos anos de luta para mudar essa realidade e com isso facilitar a vida de 10%

da nossa população. Na entrevista ele dá algumas sugestões do que poderia ser

mudado no dinheiro:

95

(...) se cada cédula tivesse um tamanho ou uma textura diferente, o

problema seria resolvido. Relevos tridimensionais, que pudessem ser

identificados pelo tato, também seria uma opção. Estampar os valores

em braile nas notas, ao contrário do que muita gente pensa, não é a

solução ideal, porque nem todo cego sabe ler desta forma. Além

disso, o papel utilizado nas cédulas de real não são adequados para

impressões em braile.

Diabético desde os três anos de idade, Marco Antônio de Queiroz, o

MAQ13, jamais poderia pensar que isso resultaria na sua falta de visão

permanente. Seu depoimento é um clássico da representação social que a maioria

das pessoas têm acerca dos deficientes: “Para superar o trauma, tive que driblar

minha família também! Todos ficavam muito preocupados e não me deixavam

sair na rua. E isso é um dos maiores problemas enfrentados por deficientes como

eu”, diz. Categórico quanto à sua participação na novela, ele afirma:

Divulgação é o principal. É isso o que queremos. Precisamos mostrar

que as pessoas com deficiência são muito mais capazes do que se

acredita. Não é preciso viver enfurnado dentro do quarto com medo

que alguma coisa lhe aconteça. Seria muito bom se todos soubessem

que é perfeitamente possível para um cego ser alpinista, por exemplo.

O outro entrevistado de Dudu Braga é mesmo polivalente; compositor,

arranjador, intérprete, tecladista, produtor e escritor Sérgio Sá completou em

agosto o trigésimo sexto ano de uma vida marcada por êxitos e realizações, que

inclui até uma gravação feita pelo rei Roberto Carlos de uma de suas

composições. E esta lançando seu livro, intitulado “Ecos do Amanhã”, que

consiste em uma ficção filosófica sobre um ruído que toma conta integralmente do

planeta. Quanto a sua participação na novela foi enfático ao dizer: “Saí de alma

lavada. Divulgação é a chave. Temos que mostrar ao mundo que somos tão

capazes quanto qualquer um!”, completa.

A próxima entrevistada do programa pode ser chamada de uma grande

mulher, cujas conquistas, garra e determinação são admiráveis. Ethel Rosenfeld

13 Para saber mais sobre o MAQ, visite seu site: www.bengalalegal.com

96

ficou cega aos 13 anos, quando foi submetida a uma punção para a retirada de um

pseudotumor do cérebro e por um erro médico, a agulha utilizada na cirurgia

atingiu seu nervo ótico que ocasionou a perda da visão para sempre. Seu primeiro

emprego foi como professora de inglês num curso audiovisual. “As pessoas

estranham que um cego dê aula com recursos audiovisuais, mas essa é a melhor

opção para os professores que não enxergam, porque dispensa o uso do quadro

negro, por exemplo,”, ela explica.

Pioneira na luta pelos seus direitos, em 1973 foi à primeira professora

cega a ingressar oficialmente no magistério do extinto Estado da Guanabara, atual

cidade do Rio de Janeiro, o que na época lhe rendeu até reportagem no

“Fantástico”. Ela relembra:

A lei não permitia que deficientes visuais fossem admitidos no

serviço público. Mas eu queria ser professora e levei minha

reivindicação ao secretário de educação. Em outubro, eu fui

contratada. Dois meses depois, fui aprovada em concurso público, o

primeiro a aceitar inscrições de pessoas com deficiência.

Como professora do município, lecionou para crianças cegas na rede

regular de ensino durante os 15 anos seguintes e depois, por mais dez anos,

comandou uma seção de reabilitação de pessoas que ficam cegas na idade adulta.

Muito ativa hoje ela exerce um cargo de coordenação na Funlar (Fundação

Municipal Lar Escola Francisco de Paula), instituição de referência da Prefeitura

do Rio de Janeiro voltada para a assistência de pessoas com deficiência em geral.

Também presta consultoria, sobretudo a empresas de transporte, como ônibus,

metrô e companhias aéreas, ensinando seus funcionários a lidar com passageiros e

colegas que tenham algum tipo de deficiência. “Com a ajuda de um fisioterapeuta,

eu explico, por exemplo, como um comissário deve tirar alguém da cadeira de

rodas sem lesionar sua própria coluna nem prejudicar o deficiente”, ela conta.

Foi ela também a primeira pessoa a usar o cão – guia de cegos no Rio

de Janeiro, e graças a sua incansável luta desde 1998 quando foi impedida de

entrar no Teatro Municipal acompanhada de seu cão labrador Gem conseguiu a

aprovação da Lei Federal nº. 11.126 de 27 de junho de 2005, assinada pelo

presidente Luís Inácio Lula da Silva autorizando em todo o país a entrada e

97

permanência de cegos acompanhados de cães – guia em ambientes públicos e

privados de uso coletivo. Sua experiência inspirou a autora Glória Perez a fazer

uma cena onde Jatobá foi expulso do teatro gerando muita discussão entre os

telespectadores.

Encerrando sua participação no programa, Ethel foi incisiva ao

afirmar que é preciso esclarecer o potencial e as reais limitações das pessoas com

deficiência, pois, a deficiência não incapacita o ser em sua totalidade, apenas o

limita em alguns aspectos, argumenta.

Destaque também no programa o Mestre João Kanoa, 40 anos, perdeu

a visão quando tinha 32 após um choque térmico provocado pelo calor de 35

graus ao sair de uma câmara frigorífica cuja temperatura era de 40 graus

negativos. Hoje ele brilha como professor de capoeira e até fez uma participação

na novela, ao lado de Marcos Frota. Como acontece com toda pessoa que perde a

visão, ele ficou deprimido e temeu pelo seu futuro. Quando ficou cego João já era

mestre em capoeira, que ele pratica desde os 10 anos. Toda essa experiência foi

fundamental para que ele pudesse seguir trabalhando no ramo. E endossando a

teoria da compensação elaborada por Vygotsky, ele diz:

Aprendi que todos os seres vivos têm reflexos. Tudo que fazemos por

instinto é puro reflexo. Quando você enxerga, você não se dá conta

disso, porque você vê tudo. Mas é possível perceber os obstáculos à

sua volta sem vê-los, usando os outros sentidos, que ficam

extremamente aguçados.

Pode-se dizer, portanto, que o trabalho de adaptação à cegueira fez de

Kanoa um mestre de capoeira ainda mais experiente. Afinal de contas, quantas

pessoas são capazes de jogar capoeira sem enxergar? Ele foi obrigado a

desenvolver sua percepção num nível que a maioria das pessoas não precisa

alcançar. E isso faz toda a diferença.

O programa também abriu espaço para as crianças e trouxe para

representá-las o pequeno Gabriel Gitahy da Cunha, o Gabrielzinho do Irajá, com

apenas 9 anos está acostumado a comandar rodas de samba pelo Rio de Janeiro.

Sua cegueira não o impede de ser ator - com duas peças de teatro no currículo -

98

fazer aulas de natação, partido alto e canto. Já compôs dois sambas. E consegue

conciliar tudo isso com ótimas notas na segunda série do Ensino Básico. Nasceu

prematuro de sete meses tendo que ficar umas dez semanas na incubadora sofreu

várias paradas respiratórias e precisou receber muito oxigênio o que o levou a

desenvolver um problema que é comum em quem passa por isso: retinopatia da

prematuridade.

Os telespectadores de América foram surpreendidos pela presença de

outros cegos na trama. Na verdade, por cegas: Maria, Regina e Conceição

Barbosa. Três irmãs. Praticamente cegas de nascença, vindas de Campina Grande,

na Paraíba. Cantoras de coco, de embolada, formas musicais típicas do

cancioneiro nordestino. Três feras.

O cineasta Roberto Berliner há cerca de oito anos, quando em visita a

trabalho na cidade das três irmãs ficou impressionadíssimo, não só pela música,

mas pela história de vida delas, foi fulminado pela idéia de fazer um filme que

contasse a trajetória delas, que viveram toda sua vida cantando em troca de

esmolas nas cidades e feiras do Nordeste do Brasil. E fizesse mais: que mostrasse,

valendo-se de formato inovador, o cotidiano delas, suas estratégias de

sobrevivência, seus dramas, misérias, amores e arte. Dessa idéia, nasceu o

documentário “A pessoa é para o que nasce”.

Acompanhando a repercussão do quadro nos telespectadores, tanto

através da medição do IBOPE (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e

Estatística) como pelas pesquisas da própria emissora, a autora ampliou a

participação dos deficientes e trouxe pessoas como Clodoaldo Silva que durante o

parto teve paralisia cerebral, por falta de oxigênio e ficou com o movimento das

pernas comprometido, de modo que precisa de uma cadeira de rodas para se

locomover. Seu destaque se deve ao fato de ser ele o maior atleta que a natação

paraolímpica brasileira já teve, disputa as provas de 50m, 100m e 200m livre;

150m medley, 50m costas, 50m borboleta e 50m peito.

A jovem Paula Werneck, de 19 anos nasceu com síndrome de Down e

está acostumada a aparecer na mídia. Tanto que sua participação em “América” é

apenas mais uma no seu currículo. Realizou trabalhos como uma pequena

99

aparição na extinta série “Mulher”; um pequeno papel na novela “Coração de

estudante”, reportagens no “Fantástico” e destaque nas peças publicitárias da

campanha “Ser diferente é normal”. Mas foi no documentário “Do luto à luta”, de

Evaldo Mocarzel, que a autora Gloria Perez ficou conhecendo Paula e a luta de

sua mãe Helena pela disseminação da informação sobre as pessoas com

deficiência mental. Ela explica: “Decidida a combater o preconceito, eu fundei

uma ONG chamada Instituto Metasocial, cujo objetivo é divulgar o máximo de

informação sobre o assunto. E falar disso na novela das oito foi uma oportunidade

sem igual”.

Numa visão ancorada no pensamento de Adler (apud Vygotsky, 1989,

p.09) defensor da luta contra o sentimento de menosvalia como ponto

fundamental da educação do deficiente, a idéia da autora ao trazer essas pessoas

para a mídia é mostrar que elas podem fazer muito mais do que se imagina. A

deficiência pode ser apenas detalhe em suas vidas, embora a maioria não pense

assim, por pura falta de informação.

Outra participação que só reforça, ainda mais essa representação

social da novela de que deficiência não impede a realização de nenhuma atividade

(apenas algumas limitações) é a de Ana Paula de Araújo Alves que encara a vida e

a atual realidade com serenidade. Vítima de um atropelamento aos 19 anos, teve

suas duas pernas amputadas quase que instantaneamente o que não a impediu de

ser fisioterapeuta e professora universitária e ainda arrumar tempo para atuar na

seleção feminina de basquete em cadeira de rodas participando de várias

competições internacionais. Suas palavras reforçam a necessidade de uma

mudança urgente nas representações sociais que as pessoas têm do deficiente:

A gente não pode desistir desse milagre que é a vida. Eu só tenho a

agradecer a iniciativa da Glória Perez, que vem divulgando o papel

que várias pessoas deficientes desempenham com sucesso dentro da

sociedade. Temos de mostrar a esse povo que os desafios devem ser

encarados de frente, por mais que seja difícil a situação. O mais

importante de tudo é a divulgação, conclui.

Destaque também no programa fictício de Dudu Braga, David Valente

é Brasileiro, natural de Fortaleza-Ceará. Graduado em Filosofia pela Universidade

100

Estadual do Ceará (UECE), tem se revelado no meio artístico como cantor,

compositor, músico, arranjador e produtor musical. Nada de mais, a não ser pelo

fato ser ele portador de uma deficiência físico-motora congênita que o

impossibilita de usar suas mãos normalmente e com a ajuda de profissionais, o

apoio dos familiares, amigos, e, sobretudo por uma enorme força de vontade,

transferiu toda a coordenação motora para seus pés conseguindo desenvolver,

naturalmente, habilidades tais como: escrever, digitar no teclado do computador,

tocar o teclado musical.

O bailarino surdo Cacau Mourão teve uma participação muito

significativa na novela. Acompanhado de uma intérprete de Libras (Língua

Brasileira de Sinais) ele contou um pouco de sua história com a dança e

incentivou todas as pessoas a aprenderem essa linguagem. A presença da

intérprete possibilitou a entrevista, pois Dudu Braga é cego e Cacau surdo o que

de outra forma teria sido impossível a realização deste programa.

Vivemos num momento político em que apesar das discussões sobre a

universalização da educação, do direito de todos à cidadania e sobre a inclusão do

aluno deficiente na escola comum da rede regular de ensino; a pessoa deficiente

ainda não é aceita como cidadã legitimada por seus direitos e encontra-se

associada a uma visão construída de modo a ressaltar sua deficiência e não suas

possibilidades, colocando-as assim num sistema paralelo e segregador.

O sistema capitalista desde o seu surgimento, por volta do final do

século XVIII, até os dias atuais, é marcado pela exclusão social, dada à

exploração do trabalho humano e a apropriação dos bens produzidos pela maioria

por uma classe que detém o controle dos meios de produção. A classe dominante

cria, então, mecanismos políticos e jurídicos para assegurar o poder e a

continuidade da exploração (Lopes, 2005, p.38).Pensar em inclusão dos

deficientes na sociedade pós – moderna, onde a imagem impera e o mundo virtual

é muitas vezes mais presente que o real, pode parecer um esforço em vão. Mas

ações de especialistas e a força de vontade dos cegos provam que é possível, por

exemplo, que eles freqüentem o cinema, participem de cursos de fotografia e

façam uso do computador por meio de programas especiais.

101

A autora também se preocupou com a inclusão digital através da

internet, pois todo o site da novela (www.america.globo.com) foi desenvolvido de

forma que o internauta cego também tivesse acesso ao seu conteúdo . Para o

departamento de Internet da TV Globo não foi uma tarefa fácil, mas segundo seus

idealizadores o esforço valeu a pena. Nas palavras de um deles:

Afinal, não faria sentido a novela falar dos deficientes visuais na TV

e ignora-los na internet. Esse trabalho, no entanto ainda não terminou

– em breve, haverá muito mais conteúdo disponível para nossos

internautas que não enxergam.

Para o encerramento do fictício “É Preciso Saber Viver” o estúdio de

"América" recebeu cerca de 200 pessoas, entre portadores de deficiência e seus

acompanhantes, para a gravação do último programa, um especial apresentado por

Dudu Braga para fechar a trama. Eles participaram de cenas que foram ao ar no

último capítulo da novela, na sexta-feira, dia quatro de novembro, como uma

consagração da campanha promovida por "América" em prol das pessoas com

deficiência. A autora Gloria Perez acompanhou a gravação e mostrou-se feliz por

ter contribuído para uma significativa mudança de olhar em relação aos

deficientes.

A gravação contou também com a participação dos personagens

Jatobá (Marcos Frota), Flor (Bruna Marquesini) e Islene (Paula Burlamaqui), de

Gabrielzinho do Irajá e de vários convidados que foram entrevistados no fictício

programa de Dudu Braga, como a professora cega Ethel Rosenfeld, que gravou

acompanhada de seu cão-guia, Gem. Através de Jatobá e de seu cão-guia Quartz,

"América" também levantou a bandeira da permissão para que os deficientes

visuais pudessem entrar em estabelecimentos públicos acompanhados de seus

cães.

Durante os cinco blocos da novela aqui apresentados para análise,

mais o registro dos participantes do fictício programa de Dudu Braga “É Preciso

Saber Viver”; foi possível perceber a preocupação da autora em realmente discutir

o papel da sociedade na inclusão social de pessoas deficientes e desta forma

durante as entrevistas realizadas com as crianças desta pesquisa, fica bem claro o

102

impacto desta telenovela na representação social delas acerca dos personagens

com deficiência, tema este retratado no próximo capítulo do trabalho.

103

Análise da representação social dos alunos acerca dos

personagens deficientes da telenovela América

“Eu fico com a pureza da

resposta das crianças, é a

vida; é bonita e é

bonita!Viver e não ter a

vergonha de ser

feliz,cantar a beleza de ser

um eterno aprendiz...”

(Gonzaguinha)

104

A realização de entrevistas e do grupo focal após a exibição de cada

capítulo permitiu observar uma significativa diversidade na representação social

dos alunos acerca dos personagens deficientes apresentados na novela América,

onde se percebe uma forte ligação das crianças entre história de vida, narrativas e

a construção de suas representações sociais. Isto ocorre porque de acordo com a

teoria cunhada por Moscovici, as representações sociais são constituídas no grupo

do qual o indivíduo que a possui faz parte, sendo este grupo o responsável por dar

significado àquilo que é considerado como deficiência.

A temática constituição do sujeito vem se caracterizando como objeto

de discussões em diferentes campos teórico-metodológicos e é importante na

medida em que problematiza tanto o objeto da ciência como a forma com que é

abordado. Discuto aqui a temática também tendo como referencial de base os

aportes teóricos de Vygotsky, que traz na sua perspectiva a especificidade humana

decorrente da dupla relação que se estabelece com a realidade: via atividade, o ser

humano se apropria da cultura e concomitantemente nela se objetiva,

constituindo-se assim como sujeito. Desse modo, para Zanella (2005) a dimensão

singular é inexoravelmente constituída e constituidora do social, o que pode ser

tematizado como alteridade, como a dimensão de um outro ou das relações com

outros.

Para Gusmão, (1999, p. 44-45; apud Zanella, 2005) no passado o

outro era de fato diferente, distante e compunha uma realidade diversa daquela de

meu mundo, hoje, o longe é perto e o outro é também um mesmo, uma imagem do

eu invertida no espelho, capaz de confundir certezas pois, não se trata mais de

outros povos, outras línguas, outros costumes. O outro hoje, é próximo e familiar,

mas não necessariamente é nosso conhecido.

Ao se constituírem como sujeitos nas inúmeras interações e nos mais

diversos espaços discursivos, para Bakhtin (1997) este é sempre resultado de um

passado e uma expectativa do que pode vir a ser no futuro uma vez que as

relações são sucessivas e infinitas não se tendo nunca um sujeito absoluto.

Semelhante ao pensamento de Moscovici e Bakhtin, Vygotsky

(1984,1987) atribui que todas as funções especificamente humanas são

105

constituídas através da vida social, envolvendo tanto a linguagem como a

dimensão histórico – cultural.

Ao discorrer sobre a questão da deficiência, Vygotsky aborda a

importância do recorte do mundo feito para a criança deficiente por seus pais e

pela sociedade como um todo. Camargo (2005) esclarece bem esta afirmação

quando nos diz que são as significações e ressignificações feitas pelos seus pares

sociais que os constituem enquanto sujeito, desta forma, um individuo com

limitações e com um potencial biológico diferente dos demais pode ter o rumo de

seu desenvolvimento alterado em função do modo como o seu meio social o

encara e em função das expectativas existentes em relação a ele.

Para efetivar nosso estudo construímos os dados a partir das

interlocuções ocorridas durante os trabalhos de discussão no grupo focal realizada

com as crianças da pesquisa, procurando desta forma identificar quais são as

representações sociais das mesmas acerca dos personagens com deficiência

apresentados na novela “América”.

Ver anexo II, apresentação das sinopses14 dos capítulos da novela

América referentes aos dias 12, 13, 14,15 e 16 de abril de 2005 utilizados nos

procedimentos metodológicos da entrevista semi-estruturada, como também na

realização do grupo focal.

Com uma capacidade peculiar de captar, expressar e atualizar

representações sociais, a televisão fornece um repertório por meio do qual as

pessoas se posicionam sobre os mais diferentes assuntos. Não por acaso, o

programa que consegue atingir tal objetivo; seja por causa de sua popularidade ou

mesmo de sua lucratividade é a telenovela. Esta exerce um papel de fundamental

importância na representação social dos brasileiros, onde de modo geral é capaz

de tornar algo presente, mediante imagens abstratas ou concretas, de conteúdo

mental, de discursos e de outros meios, mas sem superar a ausência material, ou

seja, a telenovela possui a capacidade artística de tornar presente, através de

14 Material de divulgação da novela América cedido pelo Centro de Documentação da Rede Globo de Televisão (Cedoc/ TV Globo), disponível no site www.globo.com/america.

106

formas e figuras, um mundo real ou possível, da experiência direta e concreta ou

até mesmo da fantasia.

A abordagem de temáticas fortes e contundentes fez com que esse

gênero – a telenovela – se firmasse como um dos mais importantes e amplos

espaços para problematização e discussão do cotidiano brasileiro, que servem

como referência legítima para que as pessoas se posicionem e, desta forma, dêem

visibilidade a certos assuntos, comportamentos e produtos.

Para Lopes (2004, p.298) telenovelas são uma fonte de

entretenimento, significado social, cultural e até mesmo político, pois muitas

vezes a telenovela prova ter maior significado e relevância do que as notícias do

jornal da noite, ou seja, ela adquire reconhecimento como uma parte importante

da cultura contemporânea.

Moscovici (2005, p. 48) afirma que os meios de comunicação

aceleraram e multiplicaram a necessidade contínua de re-construir o “senso

comum” ou a forma que cria o substrato das imagens e sentidos, sem a qual

nenhuma coletividade pode operar. Para o autor nossas coletividades não

poderiam funcionar se não se criassem representações sociais baseadas no tronco

das teorias e ideologias que elas transformam em realidades compartilhadas

relacionadas com as interações entre pessoas. Desta forma Jodelet (2001, p. 30)

afirma que a comunicação social, sob seus aspectos interindividuais, institucionais

e midiáticos, aparecem como condição de possibilidade e de determinação das

representações e do pensamento sociais.

Apoiadas no processo de ancoragem, dentro da Teoria das

Representações Sociais, as crianças adquirem coerência em suas representações e

as incorporam numa rede social de valores cumprindo assim o real sentido desta

teoria que é o de tornar o não – familiar, ou a própria não – familiaridade,

familiar. É o caso destes depoimentos:

“Meu primo é surdo e mudo, mas ele desenha bem”. Débora 8 anos

107

“Meu tio tem (deficiência), meu tio tem uma perna pequena e outra

grande, ele tem problema no pé, ele tem um pé pequeno e um pé

grande. Mas ele anda pra todo lado”.Raquel Silvestre 9 anos

“Minha vó não tá mais andando, ela não quer usar cadeira de rodas, ela

tem uma cadeira de rodas que o homem deu pra ela novinha, mas ela

anda com um pau assim (imita o andar)”. Fabrício 9 anos

Desta forma, as crianças trazem para sua representação social algo que

até agora só havia sido discutido utilizando os personagens da telenovela

“América”. O que parecia apenas abstrato e distante, é percebido como parte do

seu dia a dia e elas descobrem que conhecer pessoas deficientes na vida real, as

aproximam dos personagens Flor e Jatobá.

Débora por exemplo ressalta uma visão otimista da deficiência de seu

primo quando faz questão de ressaltar que mesmo sendo surdo e mudo, ele

desenha bem. Já Raquel fica bem séria na hora de descrever a deficiência do tio,

mas pouco depois abre um sorriso de orgulho ao relatar que este “defeito” (como

ela mesma diz) não o impede de ser uma pessoa “quase normal” – suas palavras.

Ao ser perguntado por que a avó não utiliza a cadeira de rodas, Fabrício é

categórico: “Ela tem muita vergonha tia, as pessoa pode chamar ela de alejada”.

Existem ainda crianças que associam deficiência a incapacidade – não

fugindo da visão equivocada da maioria das pessoas – e desta forma representam

socialmente o deficiente como um “coitado”:

“As pessoas do Lar dos Velhinhos que não tem braço anda de cadeira

de rodas e tem deles que fica passando fome e fica pedindo na rua e a

gente ajuda”. Raquel 9 anos

“Eu já vi uma pessoa assim que não consegue nem olhar, fica cega e

passa perto da nossa casa e fica pegando o lixo e fica nem olhando”.

Luana 10 anos

“Tem um homem ali (perto de sua casa) que só vive na cadeira de

rodas”. Igor 11 anos

108

Na relação com o outro as crianças em seus discursos demonstram

sempre que iniciam suas frases com o pronome pessoal “eu”, exercer um papel

mediador de ação entre elas e o deficiente sobre o mundo exterior quando

perguntadas sobre o que fariam por um colega deficiente:

“Eu ia ajudar”. César

“Eu ia ajudar, ajudar ele a andar, fazer os dever, fazer amizade”.

Jéssica

“Ajudar ele a fazer as coisa. Ensinar os dever como é que era,explicar

direitinho,sentar perto dele”.Igor

Ao analisar esses fragmentos, pudemos constatar que estas crianças

apresentaram representações sociais a respeito da deficiência que refletem os

esteriótipos e os preconceitos enraizados em nossa cultura, onde certamente, tais

concepções foram constituídas no grupo social do qual fazem parte, tendo em

vista que, como apontado por autores como Vygotsky (1983), Bakthin (1995) e

Rey (2002) o processo de subjetividade decorre das interações estabelecidas com

os pares, não havendo, portanto, uma unicidade do sujeito e sim uma

reconstituição constante a partir das interações verbais. Dessa forma, essas

crianças foram construindo seus conceitos a respeito do sujeito deficiente ao

longo de suas experiências e histórias de vida.

Também encontramos crianças como Débora que convive com um

parente deficiente e ao ser perguntada sobre o que faria se tivesse um amigo

deficiente respondeu: “Ia ser bom porque nóis gosta de gente assim”. Sua

representação social resulta de sua familiaridade com a questão e demonstra o

quanto sua família possui uma visão positiva da deficiência. Jéssica é outra

criança que em vários momentos da entrevista relata sua proximidade com

crianças deficientes e quando recebe a mesma pergunta feita à colega dispara: “Eu

também. É porque nóis acha tão legal pra poder brincar com a pessoa”.

Como categoria deslocada do contexto especifico da psicanálise, o

outro representa mais do que uma pessoa ou um objeto: é princípio instaurador da

personalidade humana, base da diferenciação eu/ não-eu (Lopes, Borelli e

109

Resende; p.189). Numa tentativa de modificar essa relação com o outro, a

professora da turma pesquisada procura criar em sua sala um ambiente mais

propício à inclusão, indo desde a posição das carteiras (em grupo) até na

repreensão de atitudes preconceituosas, como mostra o diálogo das crianças

registrado durante as entrevistas quando perguntados se eles tinham algum colega

deficiente:

“Acho que o João tem, não tem?”. Christian

“Tem!” Luana

“Qual João? O João da nossa sala? Tem! Porque ele anda assim” (imita

o colega). Fabrício

“Ele tem no pé, um pé é alto e o outro é baixo. E o pé dele é bem assim

emendado, emendadinho”. Luana

“Ele não dá conta nem de andar...” Fabrício

“Aí um dia né tia (pesquisadora) o Christian chamou ele de aleijado e a

tia (professora) deu uma bronca nele”.Luana

Luana pergunta por Christian:

“Se acontecesse com tu, você ia achar bom é?”

“A tia deu uma bronca no Christian”. Fabrício

No entendimento das autoras Lopes, Borelli e Resende (2002, p.180)

o enfoque da mediação da subjetividade no estudo da recepção da telenovela

introduz nova perspectiva de investigação ao campo das ciências psicológicas.

Assim como outras ciências, a psicologia está em busca de novos paradigmas que

possam dar conta de questões desafiadoras, que emergem do cotidiano da

sociedade, que nas palavras das autoras “é marcada por constantes e rápidas

transformações, para as quais o atual sistema de comunicações muito tem

contribuído”.

110

Ainda para as mesmas autoras (p.217) a compreensão do processo

pelo qual a vida das pessoas atravessa e é atravessada pela telenovela requer que

se identifiquem os aspectos subjetivos envolvidos nesta relação que se estabelece

através do acompanhamento dos capítulos. E o diálogo acima registrado,

protagonizado por Christian, Luana e Fabrício demonstra que após debates sobre

algumas cenas exibidas da novela, Luana e Fabrício não admite do colega uma

postura preconceituosa com relação ao amigo de classe deficiente; o contato com

os temas debatidos no texto da telenovela passou a fazer parte de suas

experiências.

Aqui se percebe a importância dos colegas para a socialização e

inclusão de crianças deficientes em classes do ensino regular. Mas esses

companheiros não são importantes apenas nas tarefas de classe; fazem-se

fundamentais também quando o assunto é: brincadeiras. Estudos feitos nas áreas

de Psicologia Social e do Desenvolvimento apontam a brincadeira como fator

fundamental para a socialização de crianças. Os autores Batista e Enumo (2004)

realizaram pesquisa demonstrando que não são os pais os principais protagonistas

na determinação da personalidade adulta de seus filhos – apesar de serem os

principais agentes socializadores – aqueles que mais precocemente atuam sobre a

criança; afirmando –se desta maneira a importância do grupo no processo de

socialização.

Diante do exposto, pressupõe-se que a proposta de inclusão social de

crianças deficientes deva evitar os danos causados pelo isolamento social dos

mesmos, criando oportunidades para interação entre os alunos, inclusive como

forma de diminuir o preconceito. Os depoimentos que se seguem ilustram muito

bem esse pensamento; quando as crianças são perguntadas se já brincaram com

alguma criança que apresentasse deficiência.

“Eu brinco com o João, sou amigo dele”. César

“Brinco com o João de ratinha e de lutinha”. Christian

“Eu já,ele era cego e ficava num carrinho de roda. Eu ajudava ele no

dever de casa e da escola. Tia,eu também conheço dois com a cadeira

111

de rodas e um que é todo torto que era lá do Gama (cidade satélite do

DF)”.Jéssica

“Eu já, ela tinha o braço aleijado ela jogava só com esse braço (mostra

o braço esquerdo) nóis brincava de queimada e de três cortes”. Raquel

“Eu brincava de escolinha. Não sei a deficiência, mas eu sei que ele

babava muito. Brincava eu e a irmã dele”. Gleicy

“Eu já,um bem grandão mas eu não sei a deficiência dele”.Paulo César

Na concepção dos autores citados, uma vez que as crianças tomam

para si as normas do grupo, é interessante estudar a presença de alunos com

deficiência no ambiente regular de ensino, bem como as interações sociais que

ocorrem naturalmente entre esses alunos e os demais, focalizando o papel do

outro como mediador de sua interação com a sociedade.

112

À Guisa de Conclusões

“... hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe? Eu só carrego a certeza de que muito pouco eu sei, que nada sei...” (Almir Sater).

113

A preocupação em sugerir, em vez de delinear, e de ilustrar; em vez

de afirmar, pauta a realização deste trabalho, que deveria, por isso, ser entendido

não só como uma teorização prévia, mas principalmente um convite à reflexão

para aqueles que se interessam em desenvolver estudos e pesquisas sobre a

inclusão social de alunos deficientes no sistema regular de ensino.

Buscamos, na medida do possível, ir além do que se possa considerar

como a simples presença de crianças deficientes dentro da sala de aula regular e

procuramos compreender como essa deficiência é pensada e representada

socialmente na construção de uma sociedade inclusiva.

Ressaltamos que o foco deste estudo concentrou-se não só na

representação social acerca de personagens deficientes da telenovela “América”,

mas também no estudo das transformações decorrentes destas representações e

seus desdobramentos no campo da educação, por meio de reflexão sobre o

significado pedagógico tanto da exclusão como da inclusão de criança deficientes

a partir da visão de seus pares.

Após análise dos discursos, percebemos três situações interessantes

acerca da representação social das crianças acerca da deficiência: primeiro,

notamos na fala dos alunos uma mudança em suas representações sociais quanto à

capacidade do deficiente em realizar atividades cotidianas, ou seja, antes

apresentavam uma visão consoante com as representações sociais da antiguidade

em que o deficiente era um ser digno de piedade e incapaz de qualquer ação;

segundo, aquelas crianças que nunca haviam convivido com algum deficiente,

expressaram suas primeiras representações sociais acerca dos mesmos, afirmando

que ao encontrarem uma pessoa assim, procurariam tornassem amigas mostrando-

lhe todas as coisas que fossem interessantes. Por fim, nas crianças que já

possuíam uma representação social da deficiência mediante a presença de parentes

em seu convívio, reforçaram ainda mais a idéia de superação e capacidade de

pessoas deficientes serem incluídas na sociedade sem nenhum problema,

demonstrando muito orgulho com os feito de seus entes queridos.

Nosso interesse não está, portanto, apenas no modo como os alunos

representam socialmente a deficiência; mas também num ensaio de explorar a

114

maneira como essas representações sociais servem de semente para uma possível

mudança social.

Destacamos que neste trabalho não se tentou reconciliar nem ao

menos procurar um meio-termo entre posições controvertidas acerca da

representação social da deficiência. Nem pretendemos apontar um modelo “ideal”

de inclusão – tarefa difícil e problemática – mas buscamos sim, tornar o termo

“inclusão” menos multiforme, descrevendo suas características essenciais e

procurando sintetiza-lo transformando-o num instrumento que possa contribuir

para elucidar e ampliar “os olhares” para as diversas interações na sala de aula.

Nosso maior desafio foi o de identificar, apreender e compreender as

representações sociais acerca da deficiência relatadas pelas crianças – muitas

vezes camufladas por associações aparentes – ,e tentar substituí-las por

percepções e reflexões vivenciadas em nossa prática profissional, somadas às

idéias dos autores que nos forneceram o aporte teórico para tratar tanto a questão

da deficiência, como da inclusão aqui abordados.

Ao elegermos a telenovela como mediadora da discussão acerca da

representação social das crianças sobre deficiência, concordamos com Lopes,

Borelli e Resende (2002, p.181) quando afirmam ser a televisão – veículo dos

mais significativos – capaz de intervir de modo decisivo no processo de interação

entre individuo e grupo social. Ainda para as mesmas autoras, a telenovela é uma

opção privilegiada entre telespectadores, de forma que sua presença no cotidiano

de milhares de pessoas revela o fenômeno cuja principal característica é a de

desencadear o processo simultâneo de representação e incorporação das relações

sociais.

Este trabalho teve como ponto de partida duas questões fundamentais:

a representação social que a telenovela apresenta acerca da inclusão social e a

representação social das crianças acerca dos personagens da novela América

com deficiência. Neste cenário encontramos discussões muito ricas para debater a

inclusão social de pessoas deficientes cuja preocupação da autora foi demonstrar

as capacidades dessas pessoas, bem como seus direitos enquanto cidadãs. A

novela buscou ainda propiciar debates e reflexões acerca de nossa posição quanto

115

à construção de uma sociedade mais inclusiva e menos segregadora mediante

situações cotidianas recheadas de temas polêmicos sobre a difícil vida do

deficiente. Encontramos também durante a realização da pesquisa com as crianças

representações sociais não só marcadas por estigmas e discriminações em torno de

suas limitações; mas visões positivas da deficiência ancoradas por personagens da

vida real mostrados durante a novela em questão.

Nesta turma não observamos o que Oliveira (2006, p.104) chama de

inclusão marginal, ou seja, a criança deficiente está na escola, mas de forma

excludente, isolada. Ainda que algumas crianças apresentem uma representação

social consonantes com a maioria das pessoas acerca da incapacidade dos

deficientes, na prática de sala de aula tratam todos os colegas de forma

homogênea, incluindo os colegas que apresentam tais limitações. Desta forma, as

interações com o outro são benéficas para todos os alunos o que maneira

contrária, dificultaria a concretização do processo de inclusão.

Temos claro que são muitas as dificuldades encontradas nas escolas

para atender crianças deficientes – falta não só de informação, mas também de

compromisso ético e político tanto dos profissionais como dos governantes,

materiais adequados, resistência e desinformação das famílias, metodologias

inadequadas,etc. – contudo, acreditamos na possibilidade que as representações

sociais apresentadas pelas crianças pesquisas possa servir como instrumento para

dinamizar a prática e promover uma educação que possibilite às pessoas

deficientes a oportunidade de avançarem no desenvolvimento de suas capacidades

e potencialidade, com vistas ao exercício de sua cidadania plena.

Em termos da mediação da telenovela como fio condutor das

representações sociais da inclusão, bem como para analisar a representação social

das crianças acerca dos personagens deficientes fez com que a exploração

metodológica nos permitisse uma rica composição do objeto empírico a partir do

material coletado. Ao propor uma agenda temática que por diferentes mecanismos

insere-se no cotidiano dos telespectadores, a telenovela aborda questões que

passam a ser consideradas de interesse público. No caso de América, a

problemática da pessoa deficiente, a partir de vários personagens, situações e

116

conflitos foi tratada de forma a questionar a sociedade preconceituosa e mostrar as

potencialidades dessas pessoas.

Para Lopes, Borelli e Resende (2002) esses temas expressam a

presença do social – real na telenovela ainda que estes sejam interpretados pelos

receptores de diferentes maneiras – seja uma representação social da deficiência

positiva, seja ela negativa – fazendo com que desta forma, o uso da telenovela

dependa da dimensão simbólica configurada por cada grupo e cada sujeito, ou

seja, a telenovela mostra aspectos e questões da realidade que são apropriadas

pelos receptores a partir de seus próprios repertórios.

O corpus da pesquisa é um contínuo dinâmico, cujo acabamento,

mesmo que visível, é sempre inconcluso. Nessa perspectiva, o que fizemos foi

abrir a discussão, ampliando o conceito de representação social. Os conceitos por

trás das teorias de Vygotsky, Moscovici e Bakhtin, confirmam nosso

questionamento de que os meios audiovisuais, especificamente a televisão, têm

capacidade de provocar mudanças nas novas formas de conceber e vivenciar da

questão da inclusão social.

No processo de coleta e análise dos dados, percebi como as

representações sociais das crianças acerca da deficiência são temáticas que

merecem ser aprofundadas. Continuamente essas representações sociais

convergem para muitas outras questões dentro da escola, assumindo uma

complexidade semântica, ética, político pedagógico de abrangência desafiante

quanto a seus efeitos na história dos envolvidos. Compreender estas bifurcações

pode significar mais uma contribuição para construir avanços das práticas de

inclusão social.

Recomendo uma análise dessas representações sociais acerca da

inclusão social não somente com outros olhares, mas principalmente em outros

segmentos da comunidade escolar, partindo tanto da análise de conteúdo, como da

análise dos discursos que permearam a pesquisa, considerando que as

representações sociais também fazem parte do campo educacional e sua

construção está diretamente ligada às relações que os membros escolares

estabelecem entre si.

117

A realização desta pesquisa conduziu-me a perceber a necessidade da

sua continuidade, de modo a se investigarem, dentre outros, os seguintes itens:

1. A representação social que as demais crianças da escola possuem acerca de seus

colegas deficientes incluídos na mesma unidade escolar. Há que se investigar

como esses alunos representam socialmente os colegas com deficiência, haja vista

que não apresentam um convívio mais próximo dentro da sala de aula.

2. Como os professores que não trabalham com turmas inclusivas representam

socialmente alunos com deficiência. A noção de como esses profissionais

construíram suas representações sociais acerca da pessoa deficiente (formação

profissional, convívio social) são fundamentais para o comprometimento deste

para com a implantação da sociedade inclusiva.

3. A representação social que pais e familiares tanto de crianças deficientes, bem

como daquelas que convivem com as mesmas representam socialmente a

deficiência e o convívio de seus filhos nestas classes inclusivas.

4. A compreensão da representação social dos demais membros profissionais da

escola (secretário, auxiliares de limpeza, porteiro) para avaliar como são tratadas

as crianças com deficiência fora da sala de aula auxilia na construção de um

ambiente de apoio a esses alunos.

5. E por fim, como diretores e assistentes de direção representam socialmente a

deficiência, analisando desta formas quais estratégias educacionais estão

implementando no sentido de tornar o ambiente escolar menos segregador e mais

inclusivo.

Por todas essas questões levantadas, nosso trabalho buscou contribuir

para um mundo no qual as diferenças sejam aliadas na construção de uma

sociedade mais inclusiva e solidária.

118

119

Dicionário de Quintana

• DEFICIENTE é aquele que não consegue modificar sua vida, aceitando as

imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que

é dono do seu destino.

• LOUCO é quem não procura ser feliz com o que possui.

• CEGO é aquele que não vê seu próximo morrer de frio, de fome, de miséria. E só tem

olhos para seus míseros problemas e pequenas dores.

• SURDO é aquele que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo

de um irmão. Pois está sempre apressado para o trabalho e quer garantir seus tostões

no fim do mês.

• MUDO é aquele que não consegue falar o que sente e se esconde por trás da máscara

da hipocrisia.

• PARALÍTICO é quem não consegue andar na direção daqueles que precisam de sua

ajuda.

• DIABÉTICO é quem não consegue ser doce.

• ANÃO é quem não sabe deixar o amor crescer. E, finalmente, a pior das deficiências é

ser miserável, pois

• MISERÁVEIS são todos que não conseguem falar com Deus. Mário Quintana

120

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129

Anexo I

09/05/2005

Sol se refugia no depósito. Ariovaldo se irrita com uma entrevista de

Gil. Tião se impressiona com a braveza de Bandido. Neuta concorda que Creusa

durma em sua casa. Sol se esconde debaixo do balcão ao ver Nick entrar na

lanchonete. Mari reclama com Odaléia que ela está trabalhando muito, e ela diz

que não pode deixar faltar os remédios de Mariano; ele ouve escondido, e fica

acabrunhado. Sol recebe menos que as outras empregadas, mas economiza 100

dólares. Creusa fala sensualmente com Tião, mas se faz de inocente para Neuta,

que proíbe o peão de falar com a moça. Laerte se enfurece porque Carreirinha

monta o seu touro e joga beijos para a platéia: para ele, é uma desmoralização.

Glauco se perturba ao ver Lurdinha deitada em sua cama. Murilinho pede

desculpas a Nina pela bola ter batido nela, e a advogada acha que ele seria uma

ótima vingança contra Glauco. Junior admira Tião, que domina o seu boi.

Bandido derruba um peão na arena; Acácio aparece para Tião e diz que aquele é

seu boi. Ed conta a May que não conseguiu patrocínio. Consuelo e Geraldito

ficam pasmos com a peruca loura de Mercedes. Nina e Murilinho estão em um

bar, Irene e Haydée entram neste local, mas não vêem Nina. Laerte pede a Paulo

Emílio que leve Tião para Miami, mas que o peão não saiba desse pedido. Dinho,

Tião e Carreirinha se alegram com as fivelas que ganharam. Tião fica furioso ao

saber que Gil vendeu suas ovelhas. Mazé conta que deu as ovelhas para que Gil o

deixasse em paz. Ellis elogia Tião para Junior. Tião vai ao pasto ver Bandido.

Islene reage quando Feitosa propõe colocar Flor na escola. Radar pergunta a Vera

se Nina tem um caso com Glauco; Vera desmente e pede que nada seja comentado

com Raíssa. Haydée furta uma caneta em uma livraria, que é de Tony. Os dois

ficam cara a cara. Creusa provoca Tião. Odaléia se emociona ao receber carta de

Sol contendo dinheiro.

10/05/2005

Mari vibra com os 100 dólares enviados por Sol. Mariano se recusa a

tomar os remédios comprados com dólares cuja procedência desconhece. Sol

130

combina com Ju um “bico” aos domingos em um posto de gasolina. Tony

relembra o fim de seu namoro com Haydée e conta que mora em Miami, é

especialista em línguas latinas e tem vários livros publicados. Haydée fica

tumultuada quando Tony pergunta se ela é feliz no casamento. Nina diz a Glauco

que vai cuidar de sua vida. Haydée flagra Glauco segurando Nina pelos braços, e

ele inventa que a advogada se sentiu mal. Feitosa insiste para que Islene

matricule Flor em uma escola. Odaléia coloca a pílula que Mariano se recusa a

tomar em um copo de vitamina. Tião e Creusa ficam juntos. Laerte tenta comprar

Bandido de Neuta, mas ela não aceita. Gil provoca Tião, que não reage. Simone

conta a Tião que ele vai montar em Miami. Sol dança samba no palco da boate.

Consuelo reprova Mercedes por querer deixar de ser mexicana. Inesita conta que

foi convidada para um date (sair com um rapaz, sem compromisso), mas Consuelo

não aprova. Helô quer saber se Neto dormiu fora enquanto ela estava no Brasil,

mas Consuelo diz não saber de nada. Lurdinha comenta com Manu o caso de

Glauco e Nina. Helinho diz a Vera que sua situação está complicada porque todos

suspeitam dele. May conta a Miss Jane que os exames revelaram que ela pode ter

filhos. O projeto de Ed foi novamente rejeitado; May insiste em lhe emprestar

dinheiro, mas ele não aceita. May se incomoda com a caixa vazia na sala e manda

alguém retirá-la. Irene descobre a caneta de Tony nas coisas de Haydée e pergunta

quem ele é. Neuta conta que Sol não foi presa e está bem, e Tião fica despeitado.

Helinho vê Alex no meio da rua.

11/05/2005

Helinho perde Alex de vista, mas pede que Vera avise ao delegado

que Alex está no Rio. Alex procura saber se sua documentação nova já está

pronta; ele conseguiu os dados do marido de Neuta, Roberto Sinval. Carreirinha

recolhe dinheiro das pessoas que desejam conhecer Bandido. Junior aguarda

ansioso a chegada de Tião. Laerte conta a Glauco que vai afastar Tião de

Boiadeiros. Glauco liga para Geninho, que exulta. Tião sonha em montar bem e

sair nos jornais, para Sol saber que é bem sucedido. Sol diz a Ju que ama Tião e

que gostaria que ele fosse montar em Miami. Ed se chateia porque May jogou fora

a caixa de onde Sol surgiu. May se aborrece com ele e vai embora. Sol entrega

sanduíches e limpa vidraças. Jatobá comenta com Gomes que os restaurantes

131

deveriam ter o cardápio em Braille. Helinho segue a pista de um falsificador.

Haydée mente que não sabe quem é Tony, o dono da caneta. Lurdinha pede uma

carona a Glauco. Haydée se lembra de quando Tony a pediu em casamento.

Lurdinha pergunta a Glauco se ele acha certo um homem casado ter uma amante.

Glauco se perturba e bate no carro que está à sua frente. Neuta diz a Junior que só

confia nele para levar Bandido para o circuito de rodeios. Neuta não aprova a

visitação a Bandido e tira Carreirinha da função de segurança do touro. Tião quer

levar na viagem o chapéu de Acácio, para lhe dar sorte. Zé Higino aconselha

Mazé a se casar de novo; ela retruca que ele também não se casou, e ele se

emociona. Consuelo concorda que Inesita saia com o colega do colégio, mas

garante a Mercedes que o date será à sua moda. Neto pede que Consuelo não

comente mais nada com Helô sobre suas saídas. Rique diz à mãe que não tem

saudades do Brasil. Alex e o falsificador reagem quando batem à porta. Sol se

sente mal e desmaia no trabalho.

12/05/2005

Quando se recupera, Sol confessa que não comeu nada. Ju repreende a

amiga por comer só dois sanduíches por dia. Gil pede a Tião que leve uma fita

dela para os Estados Unidos. Alex vê que é Helinho quem bate à porta. Vera vê

Lurdinha chegar com Glauco e não gosta. Tony e Haydée se encontram no mesmo

lugar no qual costumavam ir no passado, e observam juntos os mergulhadores.

Tony faz perguntas sobre a vida de Haydée. Ela sai correndo, mas ele a convence

a voltar para o restaurante. Haydée confessa que desistiu de sonhar há tempos.

Islene concorda em ver algumas escolas para Flor. A diretora da escola reage mal

ao perceber que ela é cega. As crianças riem do modo de andar de Flor, que se

abraça com Feitosa, amedrontada. Islene diz que não existe vaga na escola.

Haydée diz a Tony que não pode colocar em risco o seu casamento e vai embora.

Sol é despedida porque chegou atrasada. Dinho é convidado para montar em

Miami também. Junior sai com Tião para andar a cavalo. Neuta repara na barriga

de Ellis e tem certeza de que ela está grávida. Vera estranha quando Jatobá a

reconhece na rua; ele garante que cada pessoa tem um clima, um cheiro e uma

energia, e que os olhos atrapalham essa percepção. Vera vê Nina de mãos dadas

com Murilinho. Consuelo se apresenta ao rapaz que vai sair com Inesita, convida-

132

o a entrar em sua casa e lhe oferece tortilla; ele reage com timidez. Neto pede a

Helô que tudo volte a ser como antes. Ju aconselha Sol a conseguir um número

falso da social security (o equivamente ao CPF). Sol dança samba no balcão da

boate. Alex abre o porta-malas do carro e manda Helinho sair. Mariano atende ao

telefonema de Sol e se emociona.

13/05/2005

Mariano não gosta de saber que Sol aceitou qualquer trabalho para

sobreviver, mas decide tomar os remédios comprados com o dinheiro dela.

Helinho pergunta a Alex por que ele virou um criminoso. Helinho decide não

denunciar Alex para a polícia. Consuelo dá um prato cheio de pimenta mexicana

para o colega de Inesita, e ele vai embora correndo. Ed promete a May que não

vai mais pensar na caixa e eles fazem as pazes. Sol confessa para Cidinha que

tinha outra idéia dos EUA. Gil entrega sua fita para Tião levar. Jatobá pergunta a

Vera se ela gosta de Helinho como mulher ou amiga. Vera começa a dizer o que

sente por Jatobá, mas é interrompida pela chegada de Helinho. Jatobá vai embora

chateado e começa a pensar em arrumar outra namorada. Raíssa volta de Miami.

Glauco pede que Lurdinha o chame de Glauco e não de “tio”. Tony diz a Haydée

que ainda a ama e pede que ela fique com ele. Haydée se perturba, mas garante

que ama Glauco. Tião se despede de Mazé e Zé Higino. Neuta exige que Ellis lhe

diga quem é o pai de seu filho. Carreirinha conta que Ellis namorava Waldomiro e

Neuta manda chamá-lo. Ellis diz que o pai não é Waldomiro. Haydée pede que

Irene contrate Feitosa e afirma que vai pagar o salário dele. Feitosa conta para

Jatobá que Flor não foi aceita na escola. Mari é surpreendida por um tiroteio no

meio da rua e entra no carro de Alex para escapar. Geninho aparece na fazenda e

Zé Higino pergunta o que ele faz ali. Sol descobre que Tião vai montar bem perto

de Miami.

133

Anexo II

12/04/2005

Tião segura Sol com força e pergunta se ela queria fazê-lo de bobo

outra vez. Sol se desvencilha e sai correndo. Gomes diz que vai dizer qual foi o

resultado da investigação que Diva pediu que ele fizesse sobre Islene. Islene fica

indignada. Odaléia diz a Mariano que eles vão ter como viver mesmo que ele não

volte ao trabalho, se ele desistir de pagar o dinheiro que Sol pegou de Neuta.

Mariano afirma que vai voltar ao trabalho de qualquer jeito. Gomes fala para Diva

que Islene é uma moça de respeito. Feitosa não gosta de saber que Islene sai sem

ele para dançar e eles brigam. Nick diz a Bóia e Dinho que falou para Sol que

gostava dela. Bóia e Dinho ficam horrorizados e falam que Nick desrespeitou

Tião. Irene garante a Simone que Nick deve estar com outra mulher. Sol fala para

Tião que um homem lhe ofereceu aquela passagem em troca de um trabalho. Tião

pergunta a Sol que trabalho é esse. Sol tenta se esquivar, mas Tião insiste. Inesita

tenta se enturmar no colégio, mas nenhuma das meninas lhe dá bola. Consuelo

descobre que Rosário fugiu. Vera afirma para Helô que ainda não sabe direito o

que sente por Jatobá. Jatobá prepara um jantar romântico para Vera. Lurdinha e

Radar desejam-lhe boa sorte e deixam-no sozinho em casa. Haydée chama Nina

para jantar, pois quer se tornar amiga dela. Nina acha que Haydée descobriu

alguma coisa e aceita o convite. Tião rasga a passagem de Sol, que tenta detê-lo.

Vera fica pasma ao ver o jantar que Jatobá preparou. Neto sai com alguns amigos

e conhece uma menina brasileira chamada Drika. May vê Neto conversando com

Drika e pergunta por Helô, deixando-o sem graça. Neto garante a um amigo que

May tem prazer em atingi-lo. Tião diz a Sol que não vai deixá-la ir embora nunca

mais. Glauco fica nervoso ao saber que Haydée vai sair para jantar com Nina.

Vera e Jatobá dançam como nos velhos tempos. Feitosa e Islene discutem diante

de Flor, que fica nervosa e se afasta. Como sempre acontece nessas situações, a

pequena Flor fica desnorteada. Nervosa, não quer presenciar a briga dos dois e

trata de se afastar dali, tapando os ouvidos, caminhado pela rua sem rumo. Nessa

hora, Islene e Feitosa estão tão preocupados em trocar ofensas que nem se tocam

do acontece. Quando se dão conta, cadê Flor? Sumiu! Sol acorda e percebe que

Tião a trancou dentro de casa.

134

13/04/2005

Sol fica pasma. Tião pede que o padre o case com Sol no dia seguinte

mesmo. Islene se dá conta de que Flor não está ao lado dela e, com Feitosa,

começa a procurá-la, ambos desesperados. Aí bate o desespero. Onde é que essa

menina foi parar? Em pânico, Islene e Feitosa esquecem o motivo da briga e

apelam para todo mundo na tentativa de encontrá-la. Vão ao Gomes, perguntam às

pessoas nas ruas, vão à polícia e nada de Flor. Começa uma caçada enlouquecida,

que Islene teme não ser bem-sucedida.Flor, assustada, ouve a voz da mãe, mas

não a encontra e se mistura a um grupo de crianças de sua idade. Nina e Haydée

se encontram num barzinho. Nina sofre quando Haydée comenta que ela e Glauco

nunca brigaram e se dá conta de que ele mentiu o tempo todo. Islene e Feitosa

pedem a ajuda de Gomes para encontrar Flor. Jatobá e Vera lembram de quando

começaram a namorar. Vera fica enternecida com as memórias. Helinho tenta

ligar para Vera, mas não consegue, pois Jatobá desliga o telefone. Alex garante a

Helinho que Sol vai topar o serviço que ele lhe ofereceu. Sol não decide se quer

ficar com Tião ou ir para os Estados Unidos. Tião comunica a Sol que eles vão se

casar. Flor anda pelas ruas sem rumo e com medo. As afilhadas contam para

Neuta que Sol e Tião vão se casar. Jatobá diz a Vera que sabe que ela está

interessada em alguém. Vera começa a falar animadamente de Helinho, para

decepção de Jatobá. O chapéu de Acácio cai sozinho de cima de um armário e

Tião acha que é um sinal. Jatobá diz a Vera que vai dar uma volta. Gomes, Feitosa

e Islene procuram por Flor junto com uma patrulha. Flor anda até a praia e fica

espantada ao sentir a areia pela primeira vez. Rosário vai até a fronteira de carona

e encontra Fátima. Consuelo sofre por não saber onde Rosário está. Inesita pensa

em usar uma saia curta como a que as meninas americanas usam. Dinho descobre

que Carreirinha vai fazer uma doma para Neuta e lhe oferece uma semana de

refeições grátis para ir ao lugar dele. Geninho volta para casa. Alex diz a Sol que

quer lhe fazer outra proposta. Jatobá dá um mergulho no mar. Deprimido e

frustrado, nem imaginava que sua vida estava prestes a ganhar um novo rumo. O

destino o aproximaria de alguém que muito precisaria dele. Naquele dia, e nos

outros que se seguiriam dali por diante. Na praia, o sol já despontava no

horizonte. O calor da manhã desperta nele uma vontade súbita de sentir a energia

do mar revigorar-se. Vira-se para Quartz, e diz: “amigão... vou dar um mergulho

135

nesse mar”. Tira a camisa e parte para água, decidido. Depois de algumas

braçadas, ouve ao longe um grito de desespero, um pedido de socorro de alguém

que parecia se afogar. Quem seria? Uma criança? De onde viriam os gritos...

“Mamãe... mamãe...”. Não pensa. Nada apenas, guiado pelo grito, aquela voz

fraca. Naquela hora, os dois, Jatobá e Flor, pareciam os únicos seres na imensidão

do mar. A água do mar leva Flor, que grita. Jatobá ouve e vai na direção do som.

Alex pergunta a Sol se ela quer pagar metade do que pagou pela outra travessia e

diz que ela não precisa fazer o serviço.

14/04/2005

Sol fica sem saber o que fazer. Islene não encontra Flor e se

desespera. Vera fica preocupada ao perceber que Jatobá não passou a noite em

casa. Radar conta para Vera que Jatobá está gostando dela e ela se dá conta de que

o decepcionou. Raíssa acusa Manu de ter ficado com Murilinho assim que ela deu

as costas. Manu diz a Raíssa que foi ela quem roubou Murilinho primeiro. Islene

dá queixa do desaparecimento de Flor, mas descobre que precisa esperar passar 48

horas. Jatobá salva Flor, que diz a ele que não enxerga. Tião fala para Geninho

que vai se casar. Nick pergunta a Sol se ela vai para os Estados Unidos. Sol diz a

Nick que recebeu uma proposta e que resolveu não aceitar, pois teria que ser

desonesta. Nick sugere a Sol que ela case com ele e vá para os Estados Unidos.

Neuta avisa a Júnior que já mandou que domassem seu cavalo, deixando-o

nervoso. Graça e Creusa chegam em Boiadeiros. As afilhadas de Neuta estranham

o jeito recatado de Graça. Gomes conta para Islene que Flor foi encontrada e que

está bem. Jatobá explica para Flor que ela pode fazer muita coisa sozinha apesar

de ser cega, deixando-a pasma. Vera confessa para Helô que tem medo de voltar a

se envolver com Jatobá. Haydée fala para Glauco que Nina lhe contou que tem um

caso com um homem casado, deixando-o incomodado. Alex liga para Sol e

pergunta se ela vai aceitar a proposta. Sol desliga o telefone. Dinho vai até a casa

de Neuta domar o cavalo de Júnior. Detinha fica animada ao ver Dinho, mas ele

diz que só vai fazer a doma quando Neuta estiver lá. Ellis percebe que Sol não

parece muito animada com o casamento. Sol confessa que tudo aquilo está

acontecendo rápido demais. Carreirinha conta para Tião que viu Sol e Nick

conversando. Miss Jane diz a May que seu sobrinho Nick vai voltar aos Estados

136

Unidos em breve. Consuelo percebe que Neto está saindo bastante agora que Helô

está viajando. Gil manda Déia perguntar se Tião vai ou não pagar pelo seu

enxoval. Tião pergunta a Sol se ela estava conversando com Nick e ela

confirma. Tião a esbofeteia.

15/04/2005

Tião se dá conta de que o tapa que deu em Sol foi uma visão. Ele se

encontra com ela de verdade, como antevira, e pergunta se ela esteve com Nick.

Sol confirma. Tião pergunta o que ela pensa que está fazendo. Sol fica furiosa.

Tião pede perdão a Sol e diz que ficou nervoso, pois teve um pressentimento de

que ela iria deixá-lo. Sol fica impressionada e se agarra a Tião. Júnior transforma

uma toalha de mesa num vestido de noiva para Sol, deixando pasmas as afilhadas

de Neuta. Sol garante a Tião que jamais vai amar alguém como o ama, mas fica

desanimada ao imaginar que vai ficar em casa cuidando dos filhos, enquanto ele

vai para os rodeios. Rosário diz a Fátima que vai engolir a droga para atravessar

de graça. Irene conta para Kerry que Pimenta vai passar algum tempo na casa

deles. Neuta pergunta a Sol se ela tem certeza de que quer se casar com Tião e se

mudar para Boiadeiros, deixando-a em dúvida. Sol reza para a Virgem de

Guadalupe para saber se está fazendo a coisa certa. Fátima liga para Consuelo e

avisa que Rosário está com ela, pedindo que alguém venha buscá-la. Consuelo

fica radiante por ter encontrado Rosário. Geninho pede a Maria José que venda as

terras da família e pague seus estudos. Maria José fica perturbada. Gomes sente a

falta de Graça, mas não quer dar o braço a torcer. Maria José diz a Déia que eles

não vão pagar nada para Gil. Gil descobre que Tião vai se casar com Sol e fica

arrasada. Mariano fica furioso ao saber que Sol vai se casar longe dele e de

Odaléia. Mari conta para Sol que sua família está fazendo economia para pagar o

dinheiro de Neuta. Raíssa avisa Glauco que Lurdinha vai viajar com eles para a

fazenda de Irene. Glauco fica perturbado. Jatobá conta para Stallone que vai

esperar que Vera se desiluda com Helinho para conquistá-la. Flor diz a Islene que

Jatobá falou que ela pode sair sozinha se quiser. Islene não gosta. Jatobá visita

Flor e Islene fica pasma ao ver que ele é cego. Sol se veste de noiva. Tião a vê.

137

16/04/2005

Tião diz a Sol que ela está linda. Sol coloca o globinho de Nova York

dentro de seu buquê e vai para a igreja. Neuta fala para Graça que acha Creusa

recatada demais e por isso desconfia dela. Déia diz a Gil que Maria José se recusa

a lhe dar dinheiro pelo vestido que ela comprou para se casar. Gil fica furiosa e

presta queixa na delegacia. Neuta dá uma bronca em Dinho por ele não ter

domado seu cavalo, deixando-o arrasado. Ariovaldo se espanta ao ver Creusa em

Boiadeiros. Tião leva Sol até a porta da igreja. Sol não tem coragem de entrar,

larga o buquê e sai correndo com a bolinha na mão. Jatobá diz a Islene que foi ele

quem salvou Flor, deixando-a pasma. Islene não gosta de ver Quartz em sua casa

e se irrita com Jatobá. Jatobá e Islene vão viver momentos de tensão nos próximos

capítulos de América. Que ele foi um herói no episódio em que salvou Flor da

morte por afogamento, ninguém duvida. Muito menos a loura. Ela admite ser

eternamente grata àquele sujeito a quem deve a vida da pessoinha que mais preza

nesse mundo, sua única filha. Não se trata de ingratidão. Mas o que vai incomodar

Islene é o fato de descobrir que, desde aquele episódio fatídico, a menina anda

cheia de novas e mirabolantes idéias - idéias bastante absurdas no seu modo

simplório de pensar. Quem mandou esse tal de Jatobá dizer para pequenina que

ela poderia sair andando sozinha por aí, que podia estudar fazer uma porção de

coisas que ela sempre jurou que a filha não poderia? Quem é ele para tal ousadia?

Só poderia estar brincando aquele “sujeitinho safado! Botar umas besteiras dessas

na cabeça da menina?”. Vera garante a Helô que não quer ficar com Jatobá, pois

não confia nele. Helô aconselha Vera a investir em Helinho. Glauco leva Lurdinha

em casa para pegar roupas para a viagem e dá de cara com Nina. Nina fica

arrasada. Radar diz a Lurdinha que Vera não vai gostar de ela ter viajado sem

avisá-la, mas ela não quer nem saber. Tião corre atrás de Sol. Sol garante a Tião

que o ama, mas explica que não pode desistir de seu sonho por causa dele, pois

precisa ajudar sua família. Tião manda Sol desaparecer de sua vida. O delegado

explica a Gil que ela precisa procurar um advogado para cobrar a dívida de Tião.

Gil cobra a dívida pessoalmente, na igreja. Mariano se lembra com carinho de

quando conheceu Odaléia. Odaléia não consegue ser tão carinhosa quanto

Mariano. Inesita diz a Consuelo que não quer mais que Mercedes vá lhe buscar na

escola, mas Consuelo não deixa. Jatobá leva um livro em braile para Flor e

138

promete que vai visitá-la mais vezes. Islene não gosta. Islene já tem praticamente

uma opinião formada sobre Jatobá antes mesmo de saber que ele era cego.

Quando descobre, toma um susto indescritível. Feitosa se antecipa: “como é

possível... se o senhor não enxerga?“. Naquela sua vibração peculiar, Jatobá

explica o óbvio que nem Islene nem Feitosa querem ver: – “não enxergo, mas

escuto”. Ele traz de presente um livro em Braille como forma de selar o início de

uma bela e promissora amizade. Mas Islene não está bem certa disso. Não quer

Jatobá se envolvendo com a menina, dizendo para ela pode daí pra frente fazer e

acontecer. Tem medo de que o pior aconteça, que ela se perca novamente e não

tenham a mesma sorte desta vez.Só que agora vai ser difícil tirar essa idéia da

cabeça da pequena Flor. Um novo mundo se abriu para ela, um mundo de

possibilidades ilimitadas que ela vai insistir em conhecer. Mas pelo jeito vai ter de

esperar. Da próxima vez que Jatobá aparecer por lá, Islene vai lhe fazer a desfeita

de não abrir a porta.Quando será que nosso herói vai ensinar Islene a enxergar

também? Laerte descobre que Geninho quer vender as terras da família. Todos na

igreja se perguntam onde estarão Tião e Sol. Ariovaldo se esconde de Graça e

Creusa. Gil diz a Tião que quer acertar contas com ele. Sol liga para Alex e diz

que vai para os Estados Unidos.

139

Anexo III Ficha técnica da telenovela “América”

Escrita por Glória Perez

Direção Geral Marcos Schechtman

Direção Marcelo Travesso , Teresa Lampreia , Federico Bonani , Carlo Milani

Pesquisa de Texto Bianca Freire Medeiros , Giovana Manfredi

Cenografia Mario Monteiro , Érika Lovisi , Gilson Santos , Juliana Carneiro , Mônica Aurenção

Cenógrafos Assistentes Ana Paula Lopes , Felipe Serran , Eduardo Pimentel , Diana Domingues , Liane Uderman , Liana Slipoi , Márcia Inoue , Vania Bastos , Claudiney Barino , Celina Bertin , Elisa Araujo , Márcia Bezerra , Adriana Guimarães , Danielle Faria , Patrícia Paranhos

Figurino Marília Carneiro , Maíza Jacobina

Assistentes de Figurino Claúdia Damasceno , Nailze de Sá Marques , Cristiane Rose , Luciana Cordeiro , Antônio Araújo

Equipe de Apoio ao Figurino

Maria Lucia Leite , Marinice Nascimento , Neide Aparecida de Souza , Romilda Messias , Antonio Carlos Ramos de Souza , Marcio Avelino

, Ricardo Ferreira , Ricardo Lago , Toni Lemos , Vania de Lima , Severina da Silva Viana , Aparecida F. Matheus , Rejane Rodrigues

Direção de Fotografia Adriano C. Valentim

Direção de Iluminação Carlos Ribeiro , Roberto Soares do Nascimento , José Luis Fernandes de Souza

Equipe de Iluminação Carlos Eduardo Gomes , Marco Antonio Costa Reis , Elisiário Puríssimo , Jean Carlos , Carlos Roberto de Oliveira , Wander Pereira

Rocha , Marcio Gonçalves , Antonio Carlos Pimentel , Alex Sandro Vallentim

Produção de Arte Tiza de Oliveira , Marco Cortez

Produção de Arte Assistente

Denise Bentes , Fernanda Bedran , Márcia Niederauer , Myrian Mendes , Nininha Médicis

Equipe de Apoio à Arte Adenilson Ligiero , Gerson Peixoto , Hélio Guarilha , Ilbernon Jorge , José Carlos da Rocha , Mauricio Moreira , Roberto Malvino

Produção de Elenco Frida Richter

Instrutores de Dramaturgia Rossella Terranova , Paloma Riani

Produção Musical Marcus Viana

Direção Musical Mariozinho Rocha

Caracterização Marlene Moura

Equipe de Apoio à Caracterização

Rubens Libório , Ancelmo Saffi , Jorge Henrique Monteiro , Mirian Beltrão , Núbia Maisa Silva , Ricardo Sartorio , J. Alves Guedes , Aloir

Thomaz , Maria Lurdes dos Santos , Dirlene Thomaz , Márcia Viera , Lílian Gomes do Amaral

Edição José Carlos Monteiro , Ubiraci de Motta , Alberto Gouvea , Manoel Jorge

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Anexo IV

Referências fotográficas:

• Fotos que iniciam cada capítulo, bem como as que ilustram o final do trabalho e a

poesia de Mário Quintana, foram retiradas do site: www.fotosearch.com.br

• Fotos do capítulo Revisitar as páginas da História, retiradas do livro:

PESSOTI, Isaias. Deficiência Mental: da superstição a ciência. São Paulo: T.A.

Queiroz, 1984.