UNIVERSIDADE DE LISBOA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO...professores de Matemática para a promoção de...
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UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
Práticas letivas promotoras da regulação da
aprendizagem matemática pelos alunos
Paulo Jorge Ribeiro Dias
DOUTORAMENTO EM EDUCAÇÃO
Didática da Matemática
2013
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UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
Práticas letivas promotoras da regulação da
aprendizagem matemática pelos alunos
Paulo Jorge Ribeiro Dias
DOUTORAMENTO EM EDUCAÇÃO
Didática da Matemática
Tese orientada
pela Professora Doutora Mª Leonor de Almeida Domingues dos Santos
2013
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AGRADECIMENTOS
À Professora Doutora Leonor Santos, pela confiança, pela disponibilidade e pelo
interesse manifestados na orientação do estudo e pelo incentivo que me concedeu.
Aos professores e aos alunos participantes, pelo entusiasmo e disponibilidade
incondicional com que trabalharam.
À minha mulher e aos meus filhos, pelo estímulo e pela paciência com que
aceitaram a privação das nossas horas de convívio.
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RESUMO O propósito deste estudo era compreender e aprofundar práticas avaliativas de
professores de Matemática do ensino secundário que contribuíssem para a promoção de
uma atitude autorreguladora do aluno, face à sua aprendizagem matemática. A atenção
dada à autorregulação da aprendizagem matemática justifica-se pela relevância que
apresenta na aprendizagem, em particular, no sucesso nas tarefas matemáticas que o
professor propõe. Para tal, foram formuladas as seguintes questões: Qual a natureza e as
características das práticas avaliativas de professores de Matemática, trabalhadas num
contexto de trabalho de natureza colaborativa, que procuram promover a autorregulação
da aprendizagem? De que forma os professores de Matemática procuram integrar as
práticas avaliativas para promover a autorregulação no quotidiano da sala de aula? De
que modo as práticas avaliativas desenvolvidas contribuem para promover a
autorregulação das aprendizagens matemáticas? Que constrangimentos encontram os
professores de Matemática para a promoção de atitudes autorreguladoras da
aprendizagem matemática? Como procuram ultrapassá-los? O contexto de trabalho de
natureza colaborativa, durante dois anos letivos, consistiu na planificação, concretização
e reflexão de duas práticas avaliativas: a interação professor – alunos na aula e o
relatório escrito em duas fases. Numa perspetiva interpretativa, a metodologia
qualitativa permitiu aceder à realidade observada, na qual participei. Foram estudados
dois professores de Matemática, como estudo de casos. A recolha de dados incluiu a
observação de sessões de trabalho e de aulas, a entrevista e a recolha documental. A
análise de dados decorreu de forma integrativa, analítica, criadora e intuitiva. Das
principais conclusões, destaco: nas práticas avaliativas verificam-se evoluções para uma
perspetiva de avaliação centrada no aluno, assumindo uma abrangência que ultrapassa a
autoavaliação; a autorregulação desenvolve-se ao longo do tempo através de práticas
avaliativas que privilegiam a avaliação formativa; não se identificam diferenças
significativas na promoção da autorregulação em Trigonometria, em Geometria ou em
Funções; os professores apresentam dificuldades na atribuição de feedback e na sua
diversificação; o recurso a uma tabela de descritores ajuda à responsabilização dos
alunos e favorece a atribuição de feedback.
Palavras-chave: práticas avaliativas; autorregulação; aprendizagem matemática; ensino
secundário e trabalho colaborativo.
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ABSTRACT The purpose of this study was to understand and deepen the assessment practices
of Mathematics teachers at a high school level that would contribute to the promotion of
an auto-regulatory attitude from students, when dealing with learning mathematics. The
focus on the development of self-regulation of learning mathematics is justified by the
relevance that has on learning, particularly in success in mathematical tasks that the
teacher proposes. This study was guided by questions: What is the nature and the
characteristics of the assessment practices of Mathematics teachers, crafted in a
collaborative nature project, seeking to promote self-regulated learning? In what way do
Mathematics teachers seek to integrate these assessment practices to promote self-
regulation daily in classrooms? In what way do, those assessment practices, contribute
to promote self-regulation in the learning of Mathematics? What sort of constraints do
Mathematics teachers find in promoting self-regulatory attitudes of Mathematics
learning? How can these be overcome? In a work context of collaborative nature, over
two years of teaching and consisting of planning, execution and reflection of two
assessment practices: the teacher - student interaction in class and in the two phased
written report. In an interpretative perspective, the qualitative methodology allowed
access to the observed reality, in which I took part in. Two Mathematics teachers were
used as case studies. Data collecting included observation, work sessions and classes,
interview and document gathering. The data analysis was held in an integrative,
analytic, creative and intuitive way. The main findings, highlight: in assessment
practices there are developments for a prospective student-centered assessment,
assuming a scope that goes beyond the self-assessment; not identify significant
differences in the promotion of self-regulation in Trigonometry, Geometry or Functions;
self-regulation develops up over time through assessment practices that focus on
formative assessment; teachers have difficulties in assigning feedback and
diversification; the use of a table of descriptors aid accountability and fosters students'
assignment feedback.
Key words: assessment practices; self-regulation; mathematics learning; secondary
school; collaborative work.
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ÍNDICE AGRADECIMENTOS ................................................................................................... i RESUMO .................................................................................................................... iii ABSTRACT ................................................................................................................. v ÍNDICE ...................................................................................................................... vii ÍNDICE DE FIGURAS ................................................................................................ xi ÍNDICE DE QUADROS ............................................................................................ xiii CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
Motivações pessoais .................................................................................................. 1
Problema e questões do estudo .................................................................................. 4
Enquadramento do problema ..................................................................................... 5
Organização do estudo .............................................................................................. 8
CAPÍTULO 2 – PRÁTICA LETIVA NO ENSINO DA MATEMÁTICA ................... 11
Planificação ............................................................................................................ 11
Propósitos na construção e/ou seleção das tarefas ................................................ 11
Seleção de estratégias de avaliação ...................................................................... 16
Síntese ................................................................................................................ 19
Concretização na sala de aula .................................................................................. 20
Comunicação na aula de Matemática ................................................................... 20
Métodos de trabalho ............................................................................................ 24
Processos na atividade da aula de Matemática ..................................................... 27
Avaliação integrada no processo ensino aprendizagem ........................................ 30
Síntese ................................................................................................................ 32
Prática reflexiva e colaboração ................................................................................ 33
O professor como praticante reflexivo ................................................................. 33
O conceito de colaboração ................................................................................... 36
Síntese ................................................................................................................ 39
CAPÍTULO 3 – A AVALIAÇÃO REGULADORA EM MATEMÁTICA .................. 41
O conceito de avaliação reguladora em Matemática ................................................ 41
Significado e adequação à aprendizagem ............................................................. 41
Natureza .............................................................................................................. 44
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Princípios e constrangimentos ............................................................................. 47
Funções ............................................................................................................... 51
Autorregulação .................................................................................................... 53
Avaliação, ensino e aprendizagem ....................................................................... 59
Síntese ................................................................................................................ 62
Práticas avaliativas na sala de aula .......................................................................... 63
A observação ...................................................................................................... 63
Explicitação/negociação dos critérios de avaliação .............................................. 64
Abordagem positiva do erro ................................................................................ 65
Interações professor – aluno ................................................................................ 66
Refletir antes de agir ........................................................................................... 68
Feedback ............................................................................................................. 69
Recurso a instrumentos alternativos para a avaliação ........................................... 72
Síntese ................................................................................................................ 73
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA ............................................................................. 77
Opções Metodológicas ............................................................................................ 78
Natureza do estudo .............................................................................................. 78
Design do estudo ................................................................................................. 79
Papel do investigador .......................................................................................... 79
Contexto de trabalho de natureza colaborativa ..................................................... 81
Participantes ............................................................................................................ 84
A escola .............................................................................................................. 84
Os professores ..................................................................................................... 85
O professor José .............................................................................................. 86 A professora Maria .......................................................................................... 87
Os alunos ............................................................................................................ 88
Recolha de dados .................................................................................................... 90
Observação ......................................................................................................... 90
Entrevista ............................................................................................................ 94
Recolha documental ............................................................................................ 95
Análise de dados ..................................................................................................... 97
Procedimento ...................................................................................................... 97
Categorias ........................................................................................................... 98
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CAPÍTULO 5 – O TRABALHO DE NATUREZA COLABORATIVA ................... 105
O grupo ................................................................................................................. 105
Constituição ...................................................................................................... 105
Caracterização dos professores .......................................................................... 106
O trabalho do grupo .............................................................................................. 107
Motivação ......................................................................................................... 107
Organização e funcionamento ........................................................................... 108
Os temas tratados .............................................................................................. 111
O trabalho realizado .......................................................................................... 114
Reflexão do grupo sobre o projeto ..................................................................... 130
CAPÍTULO 6 – JOSÉ .............................................................................................. 135
Apresentação......................................................................................................... 135
Experiência profissional .................................................................................... 136
Práticas avaliativas ................................................................................................ 143
A interação professor - alunos na aula (IP-A) .................................................... 144
Antes da aula ................................................................................................. 144 Durante a aula ............................................................................................... 153 Depois da aula ............................................................................................... 176
O relatório escrito em duas fases (RE) ............................................................... 182
Antes da aula ................................................................................................. 182 Durante a aula ............................................................................................... 192 Depois da aula ............................................................................................... 214
Constrangimentos ................................................................................................. 219
Síntese .................................................................................................................. 222
CAPÍTULO 7 – MARIA .......................................................................................... 225
Apresentação......................................................................................................... 225
Experiência profissional .................................................................................... 226
Práticas avaliativas ................................................................................................ 233
A interação professor - alunos na aula (IP-A) .................................................... 234
Antes da aula ................................................................................................. 234 Durante a aula ............................................................................................... 242 Depois da aula ............................................................................................... 264
O relatório escrito em duas fases (RE) ............................................................... 271
Antes da aula ................................................................................................. 271 Durante a aula ............................................................................................... 278
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x
Depois da aula ............................................................................................... 291 Constrangimentos ................................................................................................. 294
Síntese .................................................................................................................. 297
CAPÍTULO 8 – CONCLUSÕES .............................................................................. 299
Síntese do estudo................................................................................................... 299
Conclusões do estudo ............................................................................................ 302
Natureza e características das práticas avaliativas promotoras da autorregulação da
aprendizagem Matemática ................................................................................. 302
Integração ensino, aprendizagem e avaliação na aula de Matemática ................. 310
Comportamento autorregulado dos alunos em Matemática ................................ 314
Constrangimentos à promoção da autorregulação e formas de os ultrapassar ..... 318
Considerações finais.............................................................................................. 322
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 325 LEGISLAÇÃO REFERIDA ..................................................................................... 343 ANEXOS .................................................................................................................. 345
Anexo 01: Grelha de observação de aula ............................................................... 347
Anexo 02: Guião da primeira entrevista a professores ........................................... 350
Anexo 03: Guião da segunda entrevista a professores ............................................ 352
Anexo 04: Programação da 2.ª fase do trabalho de natureza colaborativa .............. 353
Anexo 05: Tarefa T1 – Triângulos ......................................................................... 354
Anexo 06: Tarefa T2 – Eratóstenes........................................................................ 355
Anexo 07: Tarefa T3 – Periélio (Terra) ................................................................. 356
Anexo 08: Tarefa T4 – Círculo trigonométrico ...................................................... 357
Anexo 09: Tarefa T5 – Cone ................................................................................. 358
Anexo 10: Tarefa T6 – A Maria vai sempre de Carro ............................................ 359
Anexo 11: Tarefa T7 – Escrever no computador .................................................... 360
Anexo 12: Tarefa T8 – Nódoa circular .................................................................. 361
Anexo 13: Guião analisado pelo grupo de trabalho colaborativo ............................ 362
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ÍNDICE DE FIGURAS FIGURA 1: JORNAL "PÚBLICO" DE 27/08/2001 .............................................................. 50
FIGURA 2: 1.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T2 ..................................................... 192
FIGURA 3: 2.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T2 ..................................................... 193
FIGURA 4: 1.ª FASE DO PRODUTO DE MAGDA NA T2 – ITEM 4. ...................................... 193
FIGURA 5: 2.ª FASE DO PRODUTO DE MAGDA NA T2 – ITEM 4. ...................................... 194
FIGURA 6: 1.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T4 – ITEM 1.1., COM FEEDBACK .......... 196
FIGURA 7: 1.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T4 – ITENS 2.1. E 2.2., COM FEEDBACK 197
FIGURA 8: 2.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T4 - ITENS 2.1. E 2.2. .......................... 197
FIGURA 9: 2.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T4 - ITEM 1.1. .................................... 198
FIGURA 10: 1.ª FASE DO PRODUTO DE MAGDA NA T7 ................................................... 198
FIGURA 11: 2.ª FASE DO PRODUTO DE MAGDA NA T7 ................................................... 199
FIGURA 12: 1.ª FASE DO PRODUTO DE RUTE NA T7....................................................... 200
FIGURA 13: 2.ª FASE DO PRODUTO DE RUTE NA T7....................................................... 200
FIGURA 14: 1.ª FASE DO PRODUTO DE MAGDA NA T2- ITEM 5. ...................................... 201
FIGURA 15: 2.ª FASE DO PRODUTO DE MAGDA NA T3 ................................................... 202
FIGURA 16: 1.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T4, COM FEEDBACK ......................... 203
FIGURA 17: 1.ª FASE DO PRODUTO DE RUTE NA T2- ITEM 4. ......................................... 204
FIGURA 18: 2.ª FASE DO PRODUTO DE RUTE NA T2- ITEM 4. ......................................... 204
FIGURA 19: 1.ª FASE DO PRODUTO DE ALEXANDRE NA T4 ............................................ 205
FIGURA 20: 2.ª FASE DO PRODUTO DE ALEXANDRE NA T4 ............................................ 206
FIGURA 21: 1.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T7, COM FEEDBACK ......................... 207
FIGURA 22: 2.ª FASE DO PRODUTO DE DAVIDE NA T7 ................................................... 207
FIGURA 23: 1.ª FASE DO PRODUTO DE CARLOS E JOANA NA T1 ..................................... 263
FIGURA 24: 1.ª FASE DO PRODUTO DE ANDREIA E PATRÍCIA NA T1 ............................... 263
FIGURA 25: 1.ª FASE DO PRODUTO DE CARLOS E JOANA NA T6 ..................................... 263
FIGURA 26: 1.ª FASE DO PRODUTO DE ANDREIA NA T2 ................................................. 279
FIGURA 27: 1.ª FASE DO PRODUTO DE CARLOS NA T2 .................................................. 280
FIGURA 28: 2.ª FASE DO PRODUTO DE CARLOS NA T2 .................................................. 280
FIGURA 29: 1.ª FASE DO PRODUTO DE JOANA NA T3 ..................................................... 281
FIGURA 30: 1.ª FASE DO PRODUTO DE PATRÍCIA NA T6................................................. 282
FIGURA 31: 2.ª FASE DO PRODUTO DE PATRÍCIA NA T6................................................. 282
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FIGURA 32: 1.ª FASE DO PRODUTO DE ANDREIA NA T6 ................................................. 284
FIGURA 33: 2.ª FASE DO PRODUTO DE ANDREIA NA T6 ................................................. 284
FIGURA 34: 2.ª FASE DO PRODUTO DE JOANA NA T2 ..................................................... 285
FIGURA 35: 1.ª FASE DO PRODUTO DE CARLOS NA T3 .................................................. 286
FIGURA 36: 1.ª FASE DO PRODUTO DE PATRÍCIA NA T3................................................. 286
FIGURA 37: 2.ª FASE DO PRODUTO DE PATRÍCIA NA T3................................................. 287
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ÍNDICE DE QUADROS
QUADRO 1: FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO FORMATIVA ....................................................... 52
QUADRO 2: CARATERÍSTICAS DE UM MODELO AVALIATIVO CENTRADO NO ALUNO ......... 66
QUADRO 3: CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DOS PROFESSORES - CASOS ..................................... 87
QUADRO 4: CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DOS ALUNOS DO 10.º P ........................................... 89
QUADRO 5: CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DOS ALUNOS DO 10.º A .......................................... 90
QUADRO 6: CALENDARIZAÇÃO DAS AULAS OBSERVADAS .............................................. 91
QUADRO 7: AULAS ASSISTIDAS E ANALISADAS DE CADA PROFESSOR E RESPETIVAS
TAREFAS .............................................................................................................. 91
QUADRO 8: QUESTÕES DE INVESTIGAÇÃO E GRELHA DE OBSERVAÇÃO DE AULAS ........... 92
QUADRO 9: QUESTÕES DE INVESTIGAÇÃO E ASPETOS OBSERVADOS NAS SESSÕES DE
TRABALHO ........................................................................................................... 94
QUADRO 10: CATEGORIAS DE ANÁLISE DO MOMENTO ANTES DA AULA ........................ 100
QUADRO 11: CATEGORIAS DE ANÁLISE DO MOMENTO DURANTE A AULA (IP-A) ........... 102
QUADRO 12: CATEGORIAS DE ANÁLISE DO MOMENTO DURANTE A AULA (RE) ............. 102
QUADRO 13: CATEGORIAS DE ANÁLISE DO MOMENTO DEPOIS DA AULA ....................... 103
QUADRO 14: TRABALHO DESENVOLVIDO PARA A 1.ª FASE DE TRABALHO DE NATUREZA
COLABORATIVA.................................................................................................. 110
QUADRO 15: TRABALHO DESENVOLVIDO PARA AS 2.ª E 3.ª FASES DE TRABALHO DE
NATUREZA COLABORATIVA ................................................................................ 112
QUADRO 16: CARATERIZAÇÃO DAS TAREFAS - IMPROVE .......................................... 121
QUADRO 17: RESUMO DA APLICAÇÃO DO MÉTODO IMPROVE ÀS TAREFAS ................. 122
QUADRO 18: CLASSIFICAÇÃO DAS TAREFAS QUANTO À SUA NATUREZA ....................... 124
QUADRO 19: TAREFA/OBJETIVO GERAL/MÉTODO DE TRABALHO EM IP-A (JOSÉ) .......... 153
QUADRO 20: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE JOSÉ PARA A AUTORREGULAÇÃO DA RESPOSTA
EM IP-A ............................................................................................................. 169
QUADRO 21: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE JOSÉ PARA A AUTORREGULAÇÃO DO
DESEMPENHO EM IP-A........................................................................................ 175
QUADRO 22: DIFICULDADES QUE AFETARAM A PRÁTICA IP-A (JOSÉ) .......................... 181
QUADRO 23: RUBRICA PARA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS DE MATEMÁTICA NÃO
ESTRUTURADOS.................................................................................................. 185
QUADRO 24: TAREFA/OBJETIVO GERAL/MÉTODO DE TRABALHO EM RE (JOSÉ)............. 191
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QUADRO 25: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE JOSÉ PARA A AUTORREGULAÇÃO DA RESPOSTA
EM RE ............................................................................................................... 208
QUADRO 26: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE JOSÉ PARA A AUTORREGULAÇÃO DO
DESEMPENHO EM RE ......................................................................................... 214
QUADRO 27: DIFICULDADES QUE AFETARAM A PRÁTICA DE FEEDBACK ESCRITO DE JOSÉ
.......................................................................................................................... 218
QUADRO 28: TAREFA/OBJETIVO GERAL/MÉTODO DE TRABALHO EM IP-A (MARIA) ...... 242
QUADRO 29: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE MARIA PARA A AUTORREGULAÇÃO DA
RESPOSTA EM IP-A ............................................................................................. 256
QUADRO 30: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE MARIA PARA A AUTORREGULAÇÃO DO
DESEMPENHO EM IP-A........................................................................................ 264
QUADRO 31: DIFICULDADES QUE AFETARAM A PRÁTICA IP-A (MARIA) ....................... 270
QUADRO 32: TAREFA/OBJETIVO GERAL/MÉTODO DE TRABALHO EM RE (MARIA) ......... 278
QUADRO 33: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE MARIA PARA A AUTORREGULAÇÃO DA
RESPOSTA EM RE ............................................................................................... 287
QUADRO 34: TIPO(S) DE INTERVENÇÃO DE MARIA PARA A AUTORREGULAÇÃO DO
DESEMPENHO EM RE .......................................................................................... 291
QUADRO 35: DIFICULDADES QUE AFETARAM A PRÁTICA DE FEEDBACK ESCRITO DE MARIA
.......................................................................................................................... 294
QUADRO 36: CARATERÍSTICAS DAS PRÁTICAS DE JOSÉ E MARIA EM IP-A (SÍNTESE)..... 305
QUADRO 37: CARATERÍSTICAS DAS PRÁTICAS DE JOSÉ E MARIA EM RE (SÍNTESE) ....... 308
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CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO
Motivações pessoais
A minha inquietude acerca dos processos, recursos, erros e dificuldades com que
os alunos se confrontam no processo de aprendizagem e das consequências que as
mesmas têm para o seu percurso escolar, levaram-me a refletir sobre a avaliação no
ensino secundário, em Matemática, e a procurar aprofundar os meus conhecimentos
acerca desta problemática. Ao questionar a minha prática, como professor de
Matemática do ensino secundário, levou-me a procurar explicações e a refletir sobre a
natureza dos problemas para compreender e mudar. A minha necessidade de
conhecimento advém de procurar incluir na avaliação os progressos que verifico nos
alunos, ao nível das aprendizagens, a compreensão das dificuldades e dos raciocínios
erróneos com que os alunos se confrontam e a valorização dos conhecimentos,
capacidades e atitudes transversais que os alunos adquirem ao longo do seu percurso
escolar e de vida.
Enquadrando-me numa perspetiva de que o conhecimento sobre os diferentes
aspetos do processo de aprendizagem ajudam o aluno a tornar-se num elemento
autónomo e impulsionador do seu próprio conhecimento, procurei saber mais para
concretizar uma avaliação reguladora eficaz no favorecimento da aprendizagem. Mas,
para tal, era necessário investigar os processos e as interações que os alunos
desenvolvem quando se confrontam com as diferentes tarefas matemáticas. Reforçar o
papel do aluno na aula de Matemática passa, necessariamente, por ajustar as formas de
avaliação às experiências de aprendizagem.
Na investigação que realizei para obter o grau de mestre estudei os processos que
os alunos, do ensino secundário, usam como forma de dar resposta às dificuldades,
obstáculos e aos raciocínios erróneos com que se confrontam nas investigações
matemáticas. Nesse trabalho, relato os processos de interpretação, os processos de
desenvolvimento, os recursos, a função dos erros e a reflexão que os alunos do ensino
secundário desenvolvem quando se confrontam com investigações matemáticas, num
contexto de sala de aula. Esse estudo, proporcionou-me várias aprendizagens ao nível
do conhecimento das formas de enfrentar e analisar situações que se colocam na sala de
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aula, dos contextos criados para a aprendizagem e avaliação, do caráter único, incerto e
de conflito do processo ensino aprendizagem e da necessidade de assumir valores,
opções e estratégias de ação com vista a resolver problemas. Ainda, considero que foi
uma oportunidade de contribuir para o conhecimento da problemática da avaliação e
para a compreensão de que os professores de Matemática, no desenvolvimento da sua
atividade, têm um papel determinante no seu próprio desenvolvimento profissional.
Na procura de um maior equilíbrio entre a avaliação com as funções de
certificação e de regulação, em 2005, preconizava o reforço do papel do aluno no
processo ensino aprendizagem e, necessariamente, o ajuste das formas de avaliação às
experiências de aprendizagem:
É sabido que o currículo português tem evoluído no sentido de valorizar a integração da avaliação no processo ensino aprendizagem, em particular da avaliação formativa, mas é necessário investigar para saber até que ponto as orientações curriculares emanadas pelos programas de Matemática A, Matemática B e Matemática Aplicada às Ciências Sociais, que entraram em vigor em setembro de 2004, estão a ser concretizadas. Sem compreender a forma como os professores percecionam as orientações curriculares, como as colocam em prática e como ultrapassam as dificuldades que surgem na concretização da avaliação reguladora não é possível intervir no processo ensino aprendizagem. (Dias, 2005, p. 225)
Partindo desse pressuposto, em que os alunos podem em qualquer momento
melhorar a sua eficácia matemática, e que esse processo passa por uma autoconsciência
de atuação do próprio aluno, preconizei a minha intervenção através do projeto AREA1,
que servisse a autorregulação das aprendizagens. Para capacitar os alunos é muito
importante a partilha de opiniões, e ouvir a opinião de professores exteriores mas no
mesmo contexto (Boavida, 2005; Stein & Smith, 1998). Essa foi uma das vantagens de
fazer parte da equipa do projeto AREA. Usufrui da possibilidade de contactar com
professores e investigadores dos vários níveis de ensino. Esse trabalho colaborativo
permitiu-me conhecer as dificuldades que os professores e os alunos sentem, numa faixa
etária diferente ou na mesma daquela em que leciono, e confrontar as dificuldades
desses professores com as que eu encontro. Também, procurei saber a opinião das
pessoas sobre as minhas dificuldades, o que me ajudou a renovar as metodologias que
podem contribuir para ajudar os alunos a ultrapassar dificuldades, obstáculos e
1 Avaliação Reguladora no Ensino e Aprendizagem: projeto financiado pela FCT, nº PTDC/CED/64970/2006.
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raciocínios erróneos – a autorregularem-se. As opiniões diversificadas serviram para
aprofundar o meu conhecimento sobre os dilemas que enfrento e, também, para
compreender a natureza dos problemas dos professores e dos alunos na aula de
Matemática. Outras vertentes interessantes do projeto AREA foram a possibilidade que
os professores tinham de aceder a bibliografia sobre a temática da regulação da
aprendizagem e estudar a aplicação de práticas avaliativas. As atividades de reflexão e
investigação, em que me envolvi, podiam contemplar o saber teórico, mas para o
aprofundar e encontrar formas de o tornar operacional foi necessário equacionar o
retorno da sua aplicação no contexto da sala de aula.
Hoje, acredito de forma fundamentada que a avaliação reguladora fornece ao
professor e aos alunos o nível de concretização das aprendizagens e o que é necessário
fazer para corrigi-las ou melhorá-las. Permite conhecer os saberes, as capacidades e as
atitudes, fazendo o ponto da situação e tornando conscientes as diferenças entre os
desempenhos dos alunos e os critérios de avaliação, para que se possam aproximar
(Andrade & Valtcheva, 2009).
Levar à prática a concretização da avaliação reguladora, passa por ajustar de forma
mais sistemática e individualizada as intervenções do professor e as situações didáticas,
de forma a rentabilizar as aprendizagens. Isso exige que a avaliação usada durante o
processo ensino aprendizagem seja orientada para a regulação, na assunção de que todos
os alunos aprendem, embora de uma forma diferenciada. Privilegiando a vertente
formativa da avaliação, o conhecimento dos diversos processos que os alunos usam na
interpretação e desenvolvimento dos recursos que procuram quando sentem
dificuldades, a função que atribuem aos raciocínios erróneos e como refletem sobre a
aprendizagem matemática e reorientam o seu trabalho com vista ao sucesso,
autorregulando as aprendizagens, levou-me a procurar, nesta área, uma formação
aprofundada ao nível da investigação em educação.
Assim, tendo em conta as minhas reflexões, decidi, desenvolver em contexto de
trabalho colaborativo, este estudo para procurar compreender as práticas letivas dos
professores de Matemática e a forma como se relacionam com o desenvolvimento da
capacidade de autorregulação da aprendizagem da Matemática no 11.º ano, em
Trigonometria, Geometria e Funções. Um maior conhecimento nos modos de avaliação
autorreguladora das aprendizagens matemáticas contribui para um maior conhecimento
acerca da didática da Matemática, da prática letiva dos professores e da compreensão
das atitudes dos alunos.
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Problema e questões do estudo
Com este estudo analiso para compreender práticas avaliativas de professores de
Matemática do ensino secundário que contribuam para a promoção de uma atitude
autorreguladora do aluno, face à sua aprendizagem Matemática. O enfoque no
desenvolvimento da autorregulação da aprendizagem matemática justifica-se pela
relevância que apresenta para a aprendizagem, em particular, no sucesso nas tarefas
matemáticas que o professor propõe (Santos, 2002; Schunk, 2005). Trata-se da
capacidade do aluno avaliar a execução de uma tarefa e fazer correções quando
necessário. É um conjunto de ações, que o aluno desenvolve, para efetuar a
monitorização do seu trabalho (Schunk & Zimmerman, 1998). Inclui a autoavaliação,
por ultrapassar uma apreciação realizada tendo em conta um conjunto de critérios
implícitos ou explícitos, e por dar atenção ao envolvimento do aluno nas tarefas, à
compreensão, à eficácia, e à busca de recursos para a melhoria das aprendizagens. Por
outras palavras, a autorregulação é todo o processo em que o aluno, após o
estabelecimento de metas que interagem com as suas expectativas, desenvolve as
estratégias necessárias para alcançá-las, criando condições para que a sua aprendizagem
se efetive (Bronson, 2000; Pintrich, 2000; Simão, 2002, 2005, 2006; Zimmerman,
2000).
Para essa promoção, dois professores (casos) e eu (investigador) envolvemo-nos
num contexto de trabalho de natureza colaborativa. A partir da seleção de tarefas e de
práticas avaliativas, que incluem a sua planificação, concretização e reflexão,
desenvolvi o estudo tendo em conta as seguintes questões orientadoras:
1. Qual a natureza e as características das práticas avaliativas de professores de
Matemática, trabalhadas num contexto de trabalho de natureza colaborativa, que
procuram promover a autorregulação da aprendizagem?
2. De que forma os professores de Matemática procuram integrar as práticas
avaliativas para promover a autorregulação no quotidiano da sala de aula?
3. De que modo as práticas avaliativas desenvolvidas contribuem para promover a
autorregulação das aprendizagens matemáticas?
4. Que constrangimentos encontram os professores de Matemática para a promoção de
atitudes autorreguladoras da aprendizagem matemática? Como procuram
ultrapassá-los?
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Enquadramento do problema
Segundo Ponte (2002a) o ensino da Matemática desenvolve-se em torno de um
triângulo cujos vértices são a Matemática, o aluno e o professor. Este triângulo não é
estático nem existe no vazio. Existe num dado contexto social e institucional (a
sociedade, a comunidade a que o aluno pertence com a sua cultura própria, a instituição
escolar…) e tem a sua dinâmica associada aos objetivos curriculares visados pelo
professor. Por estes e outros fatores, o ensino da Matemática depende muito da prática
letiva que o professor promove e, em consequência disso, da postura do aluno perante a
aprendizagem da matemática. O professor interpreta o currículo, planifica a sua
concretização, pesquisa e constrói tarefas, implementa-as e avalia, à luz das suas
convicções e daquilo que são os seus atributos profissionais. Mas, na dinâmica da aula,
há outros fatores a considerar, entre eles, os que estão relacionados com os alunos, as
atitudes em relação à Matemática, os conhecimentos, as capacidades, as experiências de
trabalho matemático e as vontades de aprender Matemática.
O estudo da prática de ensino do professor de Matemática ganha relevância na
procura de entendimento para a sua atuação na sala de aula (Ponte & Chapman, 2006).
Para além dos conhecimentos e crenças, o conhecimento do sentido dado às decisões
que toma contribui para aprofundar a compreensão sobre o modo como o professor de
Matemática atua na sala de aula. As práticas de ensino da Matemática são descritas à luz
da tentativa de conciliação das abordagens de cunho cognitivista e de cunho
sociocultural, tendo em conta os motivos do professor, o contexto social e o contexto
educativo, o contexto turma, o conhecimento profissional do professor, o saber-fazer do
professor e a capacidade reflexiva do professor (Ponte, Quaresma & Branco, 2012).
Na prática de ensino desenvolvida pelo professor, a prática avaliativa assume
especial relevância. É através da avaliação que o professor recolhe a informação que lhe
permite apreciar o progresso dos alunos na disciplina e, em particular, diagnosticar
problemas e insuficiências no desenvolvimento da aprendizagem e no seu trabalho,
verificando da necessidade (ou não) de alterar a sua planificação e a sua ação didática
(Pinto & Santos, 2006). A avaliação deve, por isso, fornecer informações relevantes e
substantivas sobre o estado das aprendizagens dos alunos, no sentido de ajudar o
professor a gerir o processo ensino aprendizagem (Stiggins, 2004). Trata-se de uma
perspetiva de avaliação ao serviço da aprendizagem (Keitel, 2005; Santos, 2008), isto é,
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uma avaliação que não se identificando com uma medida, seja sobretudo encarada como
uma interação social (Pinto & Santos, 2006).
A avaliação faz parte dos processos de regulação do ensino e da aprendizagem e,
por isso, denominada por avaliação reguladora, por fornecer ao professor e aos alunos
informação relevante sobre o nível de concretização das aprendizagens. Assim, a prática
avaliativa deverá melhorar o ensino e a aprendizagem de diversas maneiras: as tarefas
utilizadas na avaliação poderão transmitir aos alunos algumas informações sobre que
tipo de conhecimento e desempenho matemático é valorizado (processo de regulação);
os comentários às tarefas de avaliação ajudarão os alunos na determinação dos
objetivos, assumindo a responsabilidade da sua própria aprendizagem e aprendendo de
forma mais independente (processo de feedback); as discussões de turma, onde os
alunos apresentam e avaliam diferentes tipos de resolução de problemas complexos,
poderão estimular a sua perceção da diferença entre uma resposta excelente e uma
medíocre (processo de regulação); e através de tarefas adequadas e da discussão de
critérios de avaliação poderá ser desenvolvida a autoavaliação (processo de feedback)
(Lew et al., 2010; Santos, 2002; Rust, Price & Donovan, 2003; NCTM, 2007),
considerando a autoavaliação como uma reflexão sobre o trabalho desenvolvido,
baseada em critérios implícitos ou explícitos, e que toma em linha de conta os
referenciais envolvidos para a concretização da tarefa.
Nesse sentido, o aluno deve ser envolvido na sua própria avaliação como sujeito
ativo de forma a tornar-se consciente e a gerir a representação que tem dos
conhecimentos e capacidades a desenvolver. Não é suficiente avaliar se os alunos
dominam factos e algoritmos ou a listagem de atitudes, capacidades e conhecimentos
preconizadas nos currículos e programas. É necessário que a avaliação reflita o ensino e,
nesse sentido, as questões têm de ser construídas para que, quando se analisam as
respostas dos alunos se tenha uma ideia de como eles organizam a informação (Price et
al., 2010). A atribuição de uma maior visibilidade ao papel que o aluno tem na
construção do próprio conhecimento passa por o professor dar uma atenção especial aos
processos de feedback, de regulação, de autoavaliação e de autorregulação das
aprendizagens (Lew et al., 2010; Santos, 2002).
A regulação da aprendizagem nas tarefas matemáticas, entendida como
autorregulação quando é efetuada pelo próprio, refere-se ao envolvimento do aluno nas
tarefas, promovendo a compreensão, a eficácia, e a busca dos recursos necessários à
construção de respostas adequadas. Essas aprendizagens podem ser influenciadas por
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fatores externos ao processo ensino aprendizagem. Em determinados contextos de
trabalho, os professores podem promover o desenvolvimento de estratégias de resposta,
estimular as condições metacognitivas do aluno, as habilidades e as motivações. Tanto a
metacognição, referida por Santos (2002), como a autorregulação, destacada por
Zimmerman (2000) e Schunk (2005), são processos que promovem a aprendizagem
matemática. Abrangem uma ação do aluno suscitada a partir das intenções e dos
objetivos da prática letiva, dos meios usados e do seu alcance.
Uma forma rica de a desenvolver é permitir que o aluno aperfeiçoe uma primeira
versão de um trabalho realizado, permitindo-lhe assim repensar a situação. Para que
esse trabalho possa ser mais formativo, o professor deverá comentar uma primeira
versão – feedback. Assim, o feedback é uma componente central para essa avaliação e
para a promoção da autorregulação das aprendizagens (Wiliam, 1999; Hattie &
Timperley, 2007; Semana & Santos, 2008; Santos et al., 2010). Mas, importa saber o
que caracteriza esse processo.
O professor tem um papel na criação de contextos que facilitem, nos seus alunos,
o desenvolvimento de atitudes de autorregulação (Santos, 2002). Para além do incentivo
à autorregulação (Brookhart et al., 2004), existem outras práticas que podem contribuir
para a concretização destas intenções (processos de regulação e de feedback): a
abordagem positiva do erro (Hadji, 1994); o questionamento (Mason, 2000; Santos,
2002; Roullier, 2004); a explicitação/negociação de critérios de avaliação (Alves, 2004;
Bobb-Wolff, 2002); o recurso a instrumentos alternativos de avaliação (Santos, 2005;
Santos & Menino, 2004); o feedback e a escrita avaliativa (Wiliam, 1999; Hattie &
Timperley, 2007; Semana & Santos, 2007); e o refletir antes de agir (Dias & Santos,
2008a).
Em Portugal, não existe uma grande tradição no desenvolvimento de estudos da
autorregulação das aprendizagens. Mas, existe evidência da importância que o processo
tem para a prática de ensino e aprendizagem (Simão, 2002; 2005; Santos et al.; 2010;
Rosário, Núñez, & González-Pienda, 2006). A literatura, quer portuguesa (Santos,
2002), quer estrangeira (Schunk, 2005), sugere que o sucesso nas tarefas que o
professor propõe passa, assim, pela capacidade de, usando os espaços formais e
informais de aprendizagem, promover nos alunos a autonomia, a eficácia e a capacidade
de trabalharem por si mesmos, por outras palavras, promover a aquisição, a utilização e
o desenvolvimento de estratégias de autorregulação da aprendizagem. Black e Wiliam
(1998), Gardner (2006) e Fernandes (2006a) referem que a avaliação pedagógica, em
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que se destaca a preocupação com o funcionamento e a regulação dos processos de
interação pedagógica e de comunicação que se estabelecem nas salas de aula, é
determinante na melhoria dos resultados dos alunos.
A prática avaliativa inclui a ação do professor para a recolha de informação para
apreciar o desenvolvimento da aprendizagem, e para averiguar da existência de
problemas e insuficiências no seu trabalho. Essa prática inclui planificação,
concretização e reflexão por ser necessário recolher informação útil para o professor, e
para o aluno, e ser necessário equacionar alterações e adequações na ação didática. É
uma avaliação reguladora do ensino e da aprendizagem. Os professores podem usar
processos de regulação e de feedback. Para os processos de regulação contribui, por
exemplo, a seleção das tarefas, a organização de formas de trabalhos, o estímulo às
estratégias individuais e o apelo à articulação de ideias próprias pelos alunos. Dos
processos de feedback fazem parte os critérios de avaliação, as tabelas de descritores, o
questionamento, e a escrita avaliativa, entre outros. Mas, quando essa monitorização da
aprendizagem é concretizada pelo próprio aluno – autorregulação – inclui-se a reflexão
sobre o trabalho desenvolvido e as expectativas e estratégias desenvolvidas para alterar
um determinado estádio.
Organização do estudo
Para compreender as práticas avaliativas dos professores de Matemática que
procuram promover a autorregulação da aprendizagem matemática, dos alunos,
apresenta-se este trabalho organizado em oito capítulos.
Para além do capítulo 1, que introduz o estudo, no Capítulo 2, destacam-se os
pressupostos teóricos que suportam as práticas de ensino do professor de Matemática,
em que se descrevem os motivos do professor contextualizados na planificação, o
contexto, o conhecimento profissional, e o saber-fazer na concretização na sala de aula,
e a capacidade reflexiva na prática reflexiva e na reflexão.
No Capítulo 3, sobressaem o conceito de avaliação reguladora em Matemática e
possíveis formas de operacionalização – práticas avaliativas.
No Capítulo 4, descrevem-se as opções metodológicas e caracterizam-se os
participantes, a recolha e a análise de dados.
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No Capítulo 5, contextualiza-se a dinâmica de trabalho de natureza colaborativa
que suportou este estudo. Em particular, caracterizam-se o grupo e o trabalho
desenvolvido.
Nos Capítulos 6 e 7, apresentam-se os professores casos. Depois da apresentação
de cada um dos casos, as duas práticas avaliativas concretizadas encontram-se descritas
tendo em conta os momentos antes da aula, durante a aula e depois da aula.
No capítulo 8, apresentam-se as conclusões do presente estudo.
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CAPÍTULO 2 – PRÁTICA LETIVA NO ENSINO DA MATEMÁTICA
Neste estudo, a prática de ensino de Matemática é descrita à luz da tentativa de
conciliação das abordagens de cunho cognitivista e de cunho sociocultural, tendo em
conta os motivos do professor, o contexto social e o contexto educativo, o contexto
turma, o conhecimento profissional do professor, o saber-fazer do professor e a
capacidade reflexiva do professor (Ponte, Quaresma & Branco, 2012). O estudo das
práticas do professor de Matemática ganha relevância na procura de entendimento para
a sua atuação na sala de aula (Ponte & Chapman, 2006). Para além dos conhecimentos e
crenças, este estudo contribui para aprofundar a compreensão sobre o modo como o
professor de Matemática atua na sala de aula. Os princípios e as normas para a
matemática escolar (NCTM, 2007) referem que o ambiente de aprendizagem da sala de
aula marca decisivamente a Matemática que os alunos aprendem, o que aprendem sobre
ela e a sua relação com a disciplina. A dinâmica da aula resulta de muitos fatores
(Giménez, Santos & Ponte, 2004). Depende, em primeiro lugar, das tarefas matemáticas
propostas pelo professor e dos materiais que o aluno utiliza para as resolver (Ponte,
Brocardo, & Oliveira, 2003). Outros fatores podem ainda ser acrescentados, o professor,
o seu conhecimento e competência profissional, e o modo como propõe as tarefas e
apoia os alunos (Scheerens, 2004). Também Even e Tirosh (2002) referem que a cultura
da sala de aula é inseparável da aprendizagem da Matemática, uma vez que a
aprendizagem ocorre sempre num contexto sociocultural específico.
Planificação
Propósitos na construção e/ou seleção das tarefas Para o ensino secundário, o Decreto – Lei nº 74/2004, de 26 de março, com as
alterações introduzidas pelo Decreto – Lei nº 24/2006, de 6 de fevereiro e atualizado
pelo n.º 139/2012, de 5 de julho, estabelece os princípios orientadores da organização e
da gestão do currículo, bem como da avaliação das aprendizagens. A par do combate ao
insucesso e abandono escolares, o documento refere como opção estratégica nacional
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promover o aumento da qualidade das aprendizagens, indispensável à melhoria dos
níveis de desempenho e qualificação dos alunos e ao favorecimento da aprendizagem ao
longo da vida.
Assim, sobressai a importância das atividades a selecionar, as quais deverão
contribuir para o desenvolvimento do pensamento científico, levando o aluno a intuir,
conjeturar, experimentar, provar, avaliar e ainda para o reforço das atitudes de
autonomia e de cooperação (Ministério da Educação, 2001). Cabe ao professor, de
acordo com o contexto da turma, encontrar o equilíbrio entre o número de trabalhos
individuais, trabalhos de grupo, trabalhos de projeto e atividades investigativas, a
realizar dentro e fora da aula, assim como o espaço para a sua própria intervenção:
dinamizando, questionando, fazendo sínteses, e facultando informação. Para a
valorização desta vertente formativa da disciplina, é destacado o fomento de uma
atitude positiva do aluno face à Matemática e a adoção de estratégias que impliquem o
aluno na aprendizagem e desenvolvam a iniciativa (Ryve, Nilsson, & Mason, 2012).
É fundamental compreender o modo como o professor se relaciona com estes
documentos oficiais (Ponte, Quaresma & Branco, 2012) mas, quando se quer ter a
compreensão global da educação, eles estão longe de representar toda a realidade
curricular (Canavarro & Ponte, 2005). O professor tem de interpretar, gerir, planear e
pôr em prática as suas opções curriculares. Ao fazê-lo, faz intervir as suas conceções, o
seu saber e o seu conhecimento didático. A planificação é esse conjunto de opções
(curriculares) influenciado por aspetos inerentes à escola e ao professor:
Francisca viu-se perante uma situação incómoda de lidar com o desvirtuamento de uma sua ideia através da planificação coletiva realizada pelo grupo de colegas com que trabalha. Por um lado, custa-lhe não adotar a estratégia que acabaria por resultar do grupo, correspondente a uma face do currículo moldado coletivamente. Mas por outro lado, não consegue adaptá-la, pois a simples utilização do material elaborado por um dos colegas faz com que se perca aquilo que considera essencial: a possibilidade de os alunos descobrirem por eles próprios o conhecimento em causa. (Canavarro & Ponte, 2005, p. 85)
Canavarro e Ponte (2005) afirmam que é necessário dar atenção a todo o trabalho
de construção curricular em que se envolve o professor, nomeadamente o currículo em
ação, aquele que põe em prática na sala de aula, em interação com os alunos, para
compreender as suas ações.
Ponte (2005a) distingue dois níveis principais de planificação: nível macro,
planificação da prática letiva por ano, por período ou por unidade didática; nível micro,
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que corresponde à realização na unidade letiva básica, a aula. A gestão curricular inclui
finalidades, objetivos de conteúdos, objetivos transversais, alunos, materiais, condições
e recursos e fatores de contexto escolar e social e pode ser feita de modo determinante
para toda a unidade ou então semana a semana ou mesmo aula a aula. Cada professor
escolhe o estilo que melhor se lhe adapta, filtrado pelo seu conhecimento profissional,
sendo certo que um protagonismo curricular efetivo exige uma atenção tanto ao nível
macro como micro, bastante planeamento e reflexão e ajustamentos em função do
desenvolvimento do trabalho (Ponte, 2005a). Para cada aula, o professor estabelece, de
modo explícito ou implícito, um plano de trabalho que concretiza alguns dos aspetos
previstos para a unidade.
A gestão curricular feita aula-a-aula não é uma simples atividade de aplicação e
concretização do trabalho de acordo com o plano estabelecido. O trabalho do professor
na preparação de cada aula é um trabalho criativo e ainda de gestão curricular, onde
explora as situações e as experiências que se desenvolvem, e reformula os objetivos e as
estratégias, em função dos acontecimentos (Ryve, Nilsson, & Mason, 2012).
No processo ensino aprendizagem, geralmente, são utilizadas tarefas
matemáticas para introduzir conceitos matemáticos e para envolver e desafiar
intelectualmente os alunos (Brunheira & Fonseca, 1996). As tarefas são as situações que
o professor propõe na sala de aula, a partir das quais a atividade se realiza. As tarefas
Matemáticas podem ser problemas, investigações, exercícios, projetos, construções,
jogos, apresentações orais, relatórios, composições escritas, etc…Constituem o ponto de
partida para o desenvolvimento da atividade Matemática do aluno (Christiansen &
Walther, 1986). A atividade do aluno, tanto física, como mental, diz respeito àquilo que
ele faz num dado contexto (Christiansen, 1997). Qualquer atividade inclui a execução
de numerosas ações. O objetivo da atividade é precisamente a tarefa, algo exterior ao
aluno. Uma tarefa tem de ser interpretada pelo aluno e pode dar origem a atividades
muito diversas, ou a nenhuma atividade, conforme a sua disposição e o ambiente de
aprendizagem da sala de aula.
A seleção de tarefas adequadas poderá despertar curiosidade e envolver os alunos
na Matemática. Tarefas significativas, só por si, não são suficientes para um ensino
eficaz. Os professores devem, também, ser capazes de responder adequadamente a
questões, tais como: determinar quais os aspetos a realçar numa dada tarefa? Como
organizar e orientar o trabalho dos alunos? Que perguntas fazer para desafiar os
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diversos níveis de competência dos alunos? Como apoiá-los, sem interferir no seu
processo de pensamento eliminando, desta forma, o desafio? (NCTM, 2007).
Em Portugal, vários estudos de natureza qualitativa dão indicações sobre as tarefas
e os materiais usados pelos professores de diversos níveis de ensino (Bandarra, 2006;
Dias, 2005; Pires, 2001; Rocha, 2002). Nos programas faz-se apelo às dimensões que
Ponte (2005a) sugere como características fundamentais nas tarefas, o grau de desafio e
o grau de estrutura. O grau de desafio matemático, que varia entre desafio reduzido e
elevado, relaciona-se com a perceção da dificuldade de uma questão e constitui uma
dimensão usada para graduar as questões que se propõem aos alunos, tanto na sala de
aula, como em momentos especiais de avaliação, como testes e exames. O grau de
estrutura, aberto ou fechado, é uma dimensão que comporta um grau de indeterminação
significativo no que é dado, no que é pedido, ou em ambas as coisas. Outras dimensões
a ter em conta, sugeridas pelo mesmo investigador, são a duração e o contexto.
Segundo Stein, Remillard, e Smith (2007), a seleção das tarefas é uma questão
central no ensino da Matemática. A aprendizagem da Matemática é sempre produto da
atividade, e se esta se reduz, por exemplo, à resolução repetitiva de exercícios para
aplicação de certas fórmulas, é exatamente isto que se aprende e vai perdurar, enquanto
ficar a memória das fórmulas. Do ponto de vista de Stein e Smith (1998), as tarefas que
envolvem os alunos na execução de um procedimento memorizado, de maneira
rotineira, representam um tipo de oportunidade para os alunos pensarem, tarefas que
exigem que os alunos pensem conceptualmente e os estimulem a estabelecer conexões
representam outro tipo diferente de oportunidade. O efeito cumulativo, dia após dia, de
exploração na sala de aula, de diferentes tipos de tarefas conduz ao desenvolvimento de
ideias implícitas nos alunos sobre a natureza da Matemática e sobre se a Matemática é
algo de que eles podem pessoalmente compreender o sentido e quão longa e arduamente
devem trabalhar para o conseguir.
Este é, por exemplo, o caso da resolução de problemas que desempenha um papel
essencial na aprendizagem dos conteúdos matemáticos em geral, e na Trigonometria, na
Geometria e nas Funções em particular, e ajuda os alunos a estabelecerem conexões
entre estes e os conteúdos das diversas disciplinas. Este tipo de abordagem aos
conteúdos revela a Matemática enquanto disciplina com sentido, pela via da
compreensão, em vez de uma disciplina composta por regras para exercícios, dadas pelo
professor, para serem memorizadas e usadas pelos alunos (Chapin, O'Connor &
Anderson, 2009; NCTM, 2007). Os problemas são geralmente apresentados na forma de
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uma sentença linguística. O aluno, para além da capacidade de ler e interpretar o texto
do problema para o resolver, deve ser capaz de relacionar a linguagem materna e a
linguagem matemática, distinguir o essencial do acessório e mobilizar os recursos
apropriados à resolução do mesmo. Na aplicação de problemas, o professor deverá,
também, ser reflexivo de modo a criar um ambiente no qual os alunos se sintam com
disposição para refletirem sobre o seu trabalho à medida que se envolvem nele.
Assim, a natureza das atividades a propor aos alunos e o papel do professor são
elementos vitais na construção do ambiente de aprendizagem, mas a estratégia a adotar
na organização do trabalho com os alunos também é fundamental (Godino, Batanero &
Font, 2004). Sendo importante considerar a diversidade de experiências de
aprendizagem que podem ser facultadas aos alunos, é necessário, também, dar atenção à
reflexão sobre a atividade desenvolvida. Os alunos aprendem não tanto a partir das
atividades práticas, mas a partir da reflexão que realizam sobre o que fizeram durante
essas atividades práticas (Ponte, 2005a). Também, Ertmer e Newby (1996) entendem
que a reflexão, nos processos de aprendizagem, é o ingrediente essencial para o
desenvolvimento dos alunos. Estes autores estudaram como os sujeitos utilizam o
conhecimento que têm sobre si próprios enquanto alunos, sobre as exigências das
tarefas e sobre os métodos utilizados conscientemente para selecionar, controlar e
monitorar as estratégias necessárias para alcançar uma aprendizagem significativa.
Baseados nesses estudos, estes autores criaram um modelo de aprendizagem que mostra
como o conhecimento metacognitivo das estratégias, consideradas cognitivas,
motivacionais e ambientais, é traduzido em termos de controlo autorregulador dos
processos de aprendizagem, por meio do pensamento reflexivo. O modelo de Ertmer e
Newby (1996) inclui os processos de planear, controlar e refletir, destacando, sobretudo
o caráter consciente desses processos. Na aprendizagem, o aluno estaria consciente de
um conhecimento específico, dos objetivos a alcançar, das estratégias necessárias para
alcançá-los, assim como do próprio processo no momento de seu acontecimento. Essa
atividade online, como muitos autores a caracterizam utilizando a metáfora
computacional (Santos, 2003a), traz como consequência o processo autorregulador. Os
indivíduos, hábeis meta-cognitivamente, teriam a capacidade de incorporar e aplicar
vários conhecimentos para aperfeiçoar o desempenho académico, transformando-se em
“bons alunos”. Seriam, por exemplo, capazes de saber o que sabem (conhecimento
declarativo), como utilizar o que sabem (conhecimento processual) e por que, onde e
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quando utilizar o que sabem (conhecimento condicional, contextual), aplicando as
estratégias relevantes ao objetivo da atividade cognitiva.
Seleção de estratégias de avaliação É através da avaliação que o professor recolhe a informação que lhe permite
apreciar o progresso dos alunos na disciplina e, em particular, diagnosticar problemas e
insuficiências na sua aprendizagem e no seu trabalho, verificando da necessidade (ou
não) de alterar a planificação e a ação didática. A avaliação deve, por isso, fornecer
informações relevantes e substantivas sobre o estado das aprendizagens dos alunos, no
sentido de ajudar o professor a gerir o processo ensino aprendizagem. Nesta perspetiva
avaliativa, de avaliação formativa (Allal, 1986; Abrecht, 1994; Perrenoud, 2004;
Shepard, 2001; Pinto & Santos, 2006), de regulação do processo ensino aprendizagem,
o professor deve envolver os alunos, auxiliando-os na análise do trabalho que realizam e
na tomada de decisões para melhorarem a sua aprendizagem (Wiliam et al., 2004).
No ensino secundário, em particular nos programas, avaliar os conhecimentos
matemáticos dos alunos significa reunir e analisar dados sobre o que estes sabem a
respeito de conceitos e métodos matemáticos. Estes dados devem ser utilizados, tanto
pelos professores, como pelos alunos. Os professores deverão utilizá-los para ajudar os
alunos a adquirir conhecimentos profundos e ideias claras sobre os conteúdos
matemáticos. Uma vez que a avaliação não se deve restringir a avaliar o produto final,
mas também o processo de aprendizagem, deve permitir que os alunos sejam elementos
ativos, reflexivos e responsáveis pela sua aprendizagem. As formas de avaliação não se
devem reduzir aos testes escritos (ME, 2001), pelo contrário devem focar-se numa
grande variedade de tarefas matemáticas e adotar uma visão holística da matemática, em
vez de focar capacidades específicas, e isoladas, organizadas numa matriz de conteúdos
/ objetivos comportamentais; e recorrer a vários métodos de avaliação, incluindo formas
escritas, orais e de demonstração (e algumas vezes ao uso de calculadoras,
computadores e materiais manipuláveis). Esta perspetiva permite ao professor verificar
a situação de aprendizagem em que se encontra o aluno, de forma a adequar as
metodologias e as atividades apresentadas às suas características.
Coerente com o sustentado por Rosales (1992), a avaliação não deve ocorrer
apenas no final de uma tarefa de aprendizagem, mas também no seu início ou em etapas
intermédias. O principal objetivo será o de verificar o nível de preparação do aluno,
permitindo ao professor antever as dificuldades dos alunos e adequar o seu método de
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ensino aos conhecimentos evidenciados, procurando a ligação entre os novos
conhecimentos e o que o aluno detém (Cobb & Bowers, 1999).
Internacionalmente, Black e Wiliam (1998) publicaram numa meta-análise em que
reviram cerca de 250 estudos e concluíram algumas vantagens para a adoção da
perspetiva formativa da avaliação. Segundo estes investigadores, a aprendizagem dos
alunos, incluindo a dos mais fracos, é geralmente melhor nas turmas em que os
professores dão atenção à avaliação formativa, fazendo juízos acerca do ensino e da
aprendizagem.
Segundo Santos (2005), respeitar o princípio da avaliação como parte integrante
do processo ensino aprendizagem, e simultaneamente desenvolver uma avaliação cujo
enfoque é o que hoje se entende por competência matemática, pode passar pela
aplicação de uma multiplicidade de processos avaliativos. Abrantes (2002), também,
destaca a necessidade de recurso a uma variedade de modos e instrumentos de
avaliação. Para estes investigadores, não há qualquer possibilidade de se progredir
significativamente numa perspetiva integrada de currículo e avaliação se os testes usuais
forem os instrumentos de avaliação usados em exclusivo ou considerados “os mais
importantes”. Nenhum instrumento isolado, só por si, poderá captar toda a informação
sobre as aprendizagens dos alunos. Será necessário recorrer a uma combinação de
práticas avaliativas, adequadas ao trabalho realizado e à natureza das diversas
aprendizagens (Santos, 2005). Só assim, poder-se-á caminhar para um processo de
integração entre o currículo e a avaliação:
Entender currículo e a avaliação como componentes integradas de um mesmo sistema e não como sistemas separados e a considerar que a avaliação envolve interpretação, reflexão, informação e decisão sobre os processos de ensino e aprendizagem, tendo como principal função ajudar a promover ou melhorar a formação dos alunos. (Abrantes, 2002, p. 10)
O recurso a diversos tipos de instrumentos é recorrente e transversal à perspetiva
de avaliação formativa (Pinto & Santos, 2006; Fernandes, 2005; Black et al., 2003).
Para Santos (2005), na seleção de um dado instrumento o professor deverá ter em conta
o que pretende saber (nomeadamente a adequabilidade para certos aspetos da
aprendizagem). O professor deverá garantir que todos os alunos terão oportunidade de
demonstrar clara e completamente o que sabem e o que são capazes de fazer:
Chama-se ainda a atenção para a necessidade de: (i) a avaliação ser um processo contínuo, recorrente, público, participado e dinâmico; (ii) os professores serem apoiados e ser reconhecida a sua competência profissional enquanto principais responsáveis pela avaliação; (iii) serem
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utilizados instrumentos de avaliação múltiplos e complexos, tais como, tarefas de desempenho, projetos, trabalhos escritos, prestações orais e portefólios e (iv) os desempenhos dos alunos não serem comparados entre si, mas antes com critérios de avaliação pré-estabelecidos. (Santos, 2005, p. 171)
A diversificação e articulação de diversas estratégias de avaliação formativa
podem permitir a ultrapassagem das dificuldades, desde que os alunos se envolvam com
seriedade e responsabilidade (Buhagiar & Murphy, 2008). É uma tarefa exigente, para
professores e alunos, onde eles se têm de expor. Para tal, é preciso, por um lado, que lhe
reconheçam significado e, por outro, que haja um ambiente de confiança na interação
professor - aluno. O acréscimo de trabalho para o aluno e para o professor é enorme
(Santos & Pinto, 2010). É necessário dedicar aulas para esse trabalho, criar momentos
diversos de interação professor - aluno, de acompanhar e apoiar os alunos (Santos,
2005). É igualmente necessário, para o bom êxito dessa tarefa, uma certa predisposição
do professor, nomeadamente em aceitar que o aluno possa deter um elevado grau de
liberdade e decisão (Menino, 2004). Como Hadji (1994) e Santos & Pinto (2010)
referem, para realizar a sua função geral de ajudar a promover a aprendizagem, a
avaliação deve: envolver segurança, ajudar a consolidar a confiança do aluno em si
próprio; prestar assistência, marcar etapas, dar pontos de apoio para progredir através de
feedback, dar, o mais rapidamente possível, informação útil sobre as etapas vencidas e
as dificuldades encontradas; e promover um verdadeiro diálogo entre professor e aluno,
fundamentado em dados precisos.
Quando os professores usam práticas avaliativas como a observação, a interação e
o feedback aos relatórios escritos, os alunos tendem a aprender através do processo de
verbalização das suas ideias e de resposta às questões do professor (NCTM, 2007).
Nesse sentido, o aluno deve ser envolvido na sua própria avaliação como sujeito ativo
de forma a tornar-se consciente e a gerir a representação que tem dos conhecimentos e
capacidades a desenvolver. É necessário que a avaliação reflita o ensino e, nesse
sentido, as questões têm de ser construídas para que, quando se analisam as respostas
dos alunos, se tenha uma ideia de como eles organizam a informação (Price et al.,
2010). Só conhecendo os processos de pensamento do aluno é possível modificar o
ensino e criar novas situações didáticas com o fim de ajudar o aluno a aprender melhor.
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Síntese A partir dos documentos curriculares, os professores podem discernir a
valorização que fazem dos diferentes conteúdos, formas de abordagem e modos de
avaliação. Mas, a interpretação não é feita da mesma forma por todos os professores e,
também, o que é transposto para os alunos não é aprendido da mesma forma. Na fase de
planificação, o professor efetua uma seleção de tarefas, estratégias e modos de fazer em
função do contexto turma, do seu conhecimento profissional e do seu saber-fazer
(Ponte, Quaresma & Branco, 2012). Os programas preconizam as finalidades do ensino
da Matemática e os modos de avaliação das aprendizagens. Em qualquer um dos
documentos existem indicações inequívocas do pressuposto de que o aluno é um agente
da sua própria aprendizagem e de que o professor deve proporcionar uma multiplicidade
de tarefas de aprendizagem e modos de avaliação diversificados. Entre eles destaca-se a
necessidade de resolver problemas, realizar atividades de investigação, desenvolver
projetos, usar as tecnologias, efetuar redações e composições, testes em duas fases e
portefólios.
A avaliação deve fornecer informações relevantes e substantivas sobre o estado
das aprendizagens dos alunos, no sentido de ajudar o professor a gerir o processo de
ensino e aprendizagem (Santos & Pinto, 2010). Por ser necessária uma avaliação
continuada de caráter formativo e regulador, esta deve atender à diversidade de
objetivos curriculares, fazer parte do processo ensino aprendizagem, identificar o que os
alunos não sabem para melhorar a sua aprendizagem, decorrer em clima de confiança,
ser transparente e os erros e as dificuldades encarados como pontos de partida para
novas aprendizagens (Wiliam et al., 2004). Deste modo, são necessários modos de
avaliação adequados àquilo que efetivamente se pretende avaliar e que atendam à
natureza das tarefas propostas.
Para promover a autorregulação - monitorização da aprendizagem efetuada pelo
próprio - a aprendizagem depende de como o aluno aprende a lidar com os processos de
ensino e de aprendizagem ao se confrontar com a necessidade de construir novos
conhecimentos. Ao professor cabe o papel de possibilitar aos alunos esse confronto e
promover a coerência entre as orientações curriculares e as práticas avaliativas. Tal
permite considerar que a avaliação engloba interpretação, reflexão, informação e
decisão sobre o processo ensino aprendizagem. A informação recolhida deverá produzir
efeito na melhoria da aprendizagem. Mas, justifica-se a necessidade de aprofundar o
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conhecimento dessas ações do professor, compreendendo os significados que os
intervenientes atribuem ao que fazem (Ponte & Chapman, 2006).
Concretização na sala de aula
Comunicação na aula de Matemática A importância da comunicação, no contexto específico da sala de aula de
Matemática e nos vários níveis de ensino, tem sido amplamente reconhecida (NCTM,
2007; Brendefur & Frykholm, 2000; Guerreiro, 2011; Menezes, 2004; Ponte & Santos,
1998). A comunicação constitui um processo social onde os participantes interagem
trocando informações e influenciando-se mutuamente (Martinho & Ponte, 2005). De
facto, o fenómeno comunicação abrange o vasto conjunto de processos interativos
desencadeados na sala de aula, na diversidade dos contextos em que ocorrem, das
representações subjacentes e das formas de expressão. Esta perspetiva é suficientemente
abrangente para incluir no estudo da comunicação na aula de Matemática dois aspetos
essenciais claramente identificados na literatura: (i) a interação continuada entre os
intervenientes na sala de aula (Brendefur & Frykholm, 2000; Guerreiro, 2011); e (ii) a
negociação de significados enquanto modo como esses intervenientes partilham entre si
as formas como encaram os conceitos e processos matemáticos, os fazem evoluir e os
ajustam ao conhecimento configurado pelo currículo (Forman et al., 1998).
O professor enquanto facilitador de processos comunicativos na sala de aula tem
um papel fundamental, como é reconhecido na literatura (Menezes, 2004; Ponte et al.,
2007). Ferreira (2005), Menezes (2004) e Wood (1998) agrupam os padrões de
interação na sala de aula em categorias. Por exemplo, o modo tradicional de interação,
padrão de recitação, designado por iniciação-resposta-avaliação (IRA), em que o
professor dá início à interação através da colocação de uma questão, o aluno responde e,
de seguida, o professor avalia essa resposta, observando se está correta (Martinho &
Ponte, 2005); o padrão de discussão, em que os alunos resolvem a tarefa proposta pelo
professor, que solicita a apresentação e a justificação do processo utilizado e da solução
obtida (Lau, Singh & Hwa, 2009); e o padrão da matemática dirigida, em que o
professor apresenta aos alunos uma tarefa e pede para ser resolvida recorrendo a
diferentes abordagens ao nível da Matemática. Depois, reduz o número de
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possibilidades para um determinado modo de abordar a tarefa, forçando os alunos a
seguir a sua própria estratégia de resolução.
Stein (2001) valoriza, também, a comunicação na sala de aula no sentido de que o
professor estimula o interesse dos alunos para enriquecer as interações estabelecidas. Na
verdade, um dos seus papéis enquanto elemento impulsionador da comunicação na sala
de aula é criar oportunidades para a atividade de cada aluno através da interação
(Brendefur & Frykholm, 2000; Menezes, 2004; Guerreiro, 2011), partindo do seu
trabalho, ajudando-o a empenhar-se na própria aprendizagem e a ganhar autoconfiança.
Nas aulas de Matemática, a comunicação desenvolve-se sobretudo pela linguagem
oral, naturalmente complementada pela linguagem gestual. A comunicação pela
linguagem oral serve para que os alunos ouçam o que o professor tem a dizer, exprimam
as suas ideias e confrontem-nas com as ideias dos seus colegas. Segundo Ponte et al.
(2007), a linguagem oral (complementada pela linguagem corporal) serve de suporte ao
pensamento, sendo através dela que se desenvolve o essencial do processo ensino
aprendizagem da Matemática. No entanto, a linguagem escrita (incluindo todo o tipo de
registos escritos, simbólicos e representações icónicas) é uma forma de comunicação
que tem um papel complementar fundamental no processo ensino aprendizagem. A
linguagem escrita serve para que os alunos tenham a oportunidade de expressão das
ideias matemáticas através de registos, no quadro ou no caderno diário.
Segundo Ponte et al. (2007) quer a comunicação em geral, quer a comunicação
matemática em particular, podem ser entendidas segundo diferentes pontos de vista.
Estes autores referem os seguintes: a comunicação como organização e transmissão de
informações; e a comunicação como um processo de interação social.
A comunicação na sala de aula, também, está associada a uma perspetiva sobre a
Matemática e sobre o ensino da Matemática. Como referem Godino e Llinares (2000),
ou se considera a Matemática como um conjunto de verdades objetivas, como algo
existente e documentado de modo independente dos indivíduos (predomina na
perspetiva cognitivista), ou se veem as práticas de sala de aula como um processo de
matematização partilhada, guiadas por regras e normas que emergem da própria prática
(predomina na perspetiva sociocultural). Do mesmo modo, a ênfase na transmissão de
mensagens do professor para os alunos e entre os alunos ou nos processos de interação
professor - aluno sustentam diferentes posicionamentos em relação à comunicação na
sala de aula de Matemática:
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Se se considera que a Matemática é um conjunto de verdades objetivas, é natural que se entenda a comunicação como a transmissão de mensagens entre duas pessoas através de um processo linear e exterior aos indivíduos. (Ponte et al., 2007, p. 42)
A aplicação deste modelo ao contexto educativo centra a comunicação no diálogo
entre o professor e os alunos. Assume-se, então, que a preocupação do professor é
tornar as mensagens emitidas compreensíveis aos alunos, eliminando eventuais
interferências. O professor deve utilizar no seu discurso constantes redundâncias, como
forma de reforçar o conteúdo da mensagem, e assegurar-se dos processos de
transferência da mensagem através de feedback ou através de perguntas cujas respostas
possam evidenciar a aquisição dos conhecimentos transmitidos (Henning et al., 2012).
Trata-se de procurar fechar o fosso entre o que expectável que o aluno faça e aquilo que
efetivamente concretiza (Sadler, 1989). Neste modelo, tudo é redutível à precisão com
que se processa a transmissão de informação entre o professor e os alunos, apenas
limitada pela existência exterior do ruído perturbador da receção.
A valorização dos aspetos de natureza semântica da mensagem pode salientar as
representações simbólicas e os aspetos característicos da linguagem Matemática, cuja
aprendizagem é então encarada como a aquisição de uma organização complexa de
símbolos, signos e representações Matemáticas (Ponte et al., 2007).
Se a Matemática é vista como uma construção cultural partilhada pelos
intervenientes e as aulas são caracterizadas pelos processos de interação social entre o
professor e os alunos, a comunicação pode passar a ser entendida como um processo de
interação social de contextos múltiplos:
Os novos significados e as novas formas de compreensão são construídos e reconstruídos através de processos individuais de gerar sentido e processos sociais de interação das mensagens, das pessoas e dos contextos culturais da sala de aula. A aprendizagem converte-se, assim, num processo de interação e reflexão, onde o professor não se limita à transmissão de um conhecimento matemático estabelecido e objetivamente codificado, mas empenha-se na organização de um conjunto de tarefas diversificadas e não rotineiras que promovam uma variedade de estratégias de resolução de problemas pelos alunos e os levem a partilhar as suas ideias, com vista à negociação de conceitos matemáticos e à construção de novos conhecimentos. Nesta perspetiva, ganham grande importância as práticas discursivas que ocorrem na sala de aula, tendo de se questionar se são de facto promotoras da compreensão dos significados e da linguagem da Matemática (Ponte et al., 2007, p. 42 - 43)
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Finalmente, um último aspeto fundamental respeitante à comunicação, segundo
Ponte et al. (2007), é que esta tem um papel essencial para assistir os alunos no
desenvolvimento dos seus significados matemáticos e na sua compreensão dos
conceitos matemáticos. A construção de significados matemáticos evolui por etapas
sucessivas, através da sua publicitação de forma oral ou escrita por parte dos alunos,
regulados pelo professor. Porém, para que tal aconteça, é necessário que os alunos se
sintam à vontade para partici