UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, … · pelos colegas de Pós-Graduação Amanda Cseh,...

300
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SUSTENTABILIDADE FLÁVIO BORDINO KLEIN Por dentro da caixa-preta das políticas municipais de resíduos sólidos urbanos: os arranjos institucionais e a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos São Paulo 2017

Transcript of UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, … · pelos colegas de Pós-Graduação Amanda Cseh,...

  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    ESCOLA DE ARTES, CINCIAS E HUMANIDADES

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SUSTENTABILIDADE

    FLVIO BORDINO KLEIN

    Por dentro da caixa-preta das polticas municipais de resduos slidos urbanos: os

    arranjos institucionais e a implementao da Poltica Nacional de Resduos Slidos

    So Paulo

    2017

  • FLVIO BORDINO KLEIN

    Por dentro da caixa-preta das polticas municipais de resduos slidos urbanos: os

    arranjos institucionais e a implementao da Poltica Nacional de Resduos Slidos

    Dissertao apresentada Escola de Artes,

    Cincias e Humanidades da Universidade de

    So Paulo como parte dos requisitos para a

    obteno do ttulo de Mestre em Cincias do

    Programa de Ps-graduao em

    Sustentabilidade.

    Verso corrigida contendo as alteraes

    solicitadas pela comisso julgadora em 06 de

    outubro de 2017. A verso original encontra-se

    em acervo reservado na Biblioteca da

    EACH/USP e na Biblioteca Digital de Teses e

    Dissertaes da USP (BDTD), de acordo com

    a Resoluo CoPGr 6018, de 13 de outubro de

    2011.

    rea de concentrao: Gesto Ambiental.

    Orientadora: Prof. Dr. Sylmara Lopes

    Francelino Gonalves Dias.

    So Paulo

    2017

  • Autorizo a reproduo e divulgao total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrnico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

    CATALOGAO-NA-PUBLICAO (Universidade de So Paulo. Escola de Artes, Cincias e Humanidades. Biblioteca)

    Klein, Flvio Bordino

    Por dentro da caixa-preta das polticas municipais de resduos slidos urbanos : os arranjos institucionais e a implementao da Poltica Nacional de Resduos Slidos / Flvio Bordino Klein ; orientadora, Sylmara Lopes Francelino Gonalves Dias. So Paulo, 2017

    298 p. : il

    Dissertao (Mestrado em Cincias) - Programa de Ps- Graduao em Sustentabilidade, Escola de Artes, Cincias e Humanidades, Universidade de So Paulo

    Verso corrigida

    1. Resduos slidos. 2. Resduos urbanos. 3. Polticas pblicas. 4. Sustentabilidade. I. Dias, Sylmara Lopes Francelino Gonalves, orient. II. Ttulo

    CDD 22.ed. 363.7285

  • Nome: KLEIN, Flvio Bordino.

    Ttulo: Por dentro da caixa-preta das polticas municipais de resduos slidos urbanos: os

    arranjos institucionais e a implementao da Poltica Nacional de Resduos Slidos

    Dissertao apresentada Escola de Artes,

    Cincias e Humanidades da Universidade de

    So Paulo como parte dos requisitos para a

    obteno do ttulo de Mestre em Cincias do

    Programa de Ps-graduao em

    Sustentabilidade.

    rea de concentrao: Gesto Ambiental.

    Orientadora: Prof. Dr. Sylmara Lopes

    Francelino Gonalves Dias.

    Aprovado em: 06/10/2017

    Banca Examinadora

    Profa. Dra. Suely Mara Vaz

    Guimares de Arajo

    Instituio: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

    e dos Recursos Naturais Renovveis

    (Ibama)

    Prof. Dr. Fernando Coelho Instituio: Escola de Artes, Cincias e

    Humanidades. Universidade de So

    Paulo (EACH/USP)

    Profa. Dra. Snia Seger Mercedes Instituio: Instituto de Energia e Ambiente.

    Universidade de So Paulo

    (IEE/USP)

  • A Paula Cristina Queiroga, por todo amor e

    apoio ao longo desses anos.

  • AGRADECIMENTOS

    professora Sylmara Lopes Francelino Gonalves Dias, pela orientao e incansvel apoio

    ao longo desse trabalho. Pelas suas constantes sugestes, crticas e puxes de orelha, sempre

    me incentivando na difcil tarefa de ser menos descritivo e mais analtico.

    Snia Seger Mercedes, pelas crticas e contribuies durante minha qualificao, e durante

    minha passagem no IEE quando fiz a disciplina Resduos Slidos Urbanos e seus Impactos

    Socioambientais, com a participao das professoras Sylmara e Maria Cecilia Loschiavo dos

    Santos colaborando, inclusive, com sugestes e referncias que me ajudaram no

    desenvolvimento de artigo cientfico.

    Ao professor Fernando Coelho, pelas crticas e sugestes durante minha qualificao, e pelas

    referncias sugeridas que me ajudaram a entender melhor sobre a capacidade estatal e as

    discusses entre as reformas administrativas e inovaes locais.

    professora Helene Mariko Ueno, ao professor Marcelo Pereira de Souza e Grace Tibrio

    Cardoso de Seixas, durante a realizao da disciplina Metodologias de Pesquisa em

    Sustentabilidade. As sugestes no projeto de mestrado e os ajustes metodolgicos foram

    muito teis no desenvolvimento desse trabalho. Tambm agradeo aos professores Srgio

    Pacca e Waldir Mantovani, pelo incentivo nas leituras e anlises dos artigos cientficos

    durante a realizao da disciplina Sustentabilidade.

    professora Ceclia Olivieri e ao professor Martin Jayo, do curso de Gesto de Polticas

    pblicas, pelo aprendizado desenvolvido nas disciplinas que me estimularam a entender mais

    sobre o universo fascinante das polticas pblicas.

    Ao Encontros de Sustentabilidade, pela oportunidade de apreciar importantes pesquisas de

    meus colegas de Ps-Graduao e pelas crticas endereadas minha pesquisa.

    Aos participantes do Ncleo de Pesquisa em Organizaes, Sociedade e Sustentabilidade

    NOSS, pelas calorosas discusses cientficas protagonizadas pelos professores Alexandre

    Toshiro Igari, Andr Felipe Simes, Sylmara Gonalves Dias e Tania Pereira Christopoulos, e

    pelos colegas de Ps-Graduao Amanda Cseh, rico Pagotto, Gabriel Trettel Silva, Joo

    Marcos Mott Pavanelli, Natalia Molina Cetrulo, Laysce Rocha de Moura, Mnica Bierwagen

    e Vivian Fernandes Marinho Ferreira.

    Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CAPES, pela concesso

    da bolsa de mestrado, sendo fundamental e imprescindvel para que eu tivesse dedicao

    exclusiva no desenvolvimento dessa pesquisa.

    Aos gestores da Diretoria de Gesto de Servios da AMLURB, pela realizao improvisada

    da entrevista.

    Secretaria de Servios Urbanos de Mogi das Cruzes, por responder algumas perguntas do

    questionrio enviado por email.

    Aos funcionrios da Hiplan Construes e Servios de Manuteno Urbana Ltda, pela

    realizao da entrevista improvisada, aberta e descontrada, mas que me revelaram

    importantes fatos empricos sobre a limpeza urbana de So Paulo.

  • A venda de lixo sempre foi e continua a ser

    motivo de renda crescente. Dela se aproveita

    tudo: detritos orgnicos, trapos e latas velhas,

    ossos e at cacos de vidro. Tudo sempre

    aproveitado. Qualquer quantidade

    imediatamente vendida, tal a procura pelos

    chacareiros, industriais, agricultores, etc.

    Alm da riqueza fertilizante, esse adubo

    elemento mais ou menos isento de focos

    infecciosos, por causa da fermentao que

    sofre antes de ser entregue ao comprador. O

    local ou os locais em que o lixo dever sofrer

    essa transformao tm que ficar situados na

    parte baixa da cidade, preferencialmente s

    margens do Tiet, pois, uma vez retificado, o

    mesmo, grande percurso do transporte,

    poder ser feito pelo meio mais barato que a

    gua.

    Mensagem do prefeito Fbio Prado Cmara

    Municipal de So Paulo em 1936 (apud

    OGATA, 1983, p. 57).

    O que percebo uma forma moderna, com

    tecnologia avanada, no tratamento dos

    resduos domiciliares e industriais, trazendo

    uma grande segurana em termos ambientais

    quando h a necessidade do rgo ambiental

    aprovar o transporte e a disposio de

    resduos neste local.

    Declarao do presidente da CETESB, Otvio

    Okano, durante visita no dia 31/10/2006

    Central de Tratamento de Resduos da empresa

    Essencis Solues Ambientais S.A, localizada

    em Caieiras: maior aterro de resduos

    domsticos e industriais (perigosos) da

    Amrica Latina (CETESB, 2006a).

  • RESUMO

    KLEIN, Flvio Bordino. Por dentro da caixa-preta das polticas municipais de resduos

    slidos urbanos: os arranjos institucionais e a implementao da Poltica Nacional de

    Resduos Slidos. 2017. 298 f. Dissertao (Mestrado em Cincias) Escola de Artes,

    Cincias e Humanidades, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2017. Verso corrigida.

    A aprovao da Lei Federal n 12.305, de 02 de agosto de 2010 Poltica Nacional de

    Resduos Slidos (PNRS) tem como uma das diretrizes fundamentais a gesto integrada,

    que inclui a ordem de prioridade ou hierrquica na gesto dos resduos slidos e a incluso

    dos catadores de materiais reciclveis. Considerando que a consolidao dessas diretrizes

    demanda colocar a PNRS na agenda governamental e, ainda, da capacidade estatal para a

    implementao de polticas pblicas, o objetivo deste trabalho foi analisar a inter-relao dos

    arranjos institucionais municipais das polticas de resduos slidos urbanos (RSU) e a

    implementao da PNRS. A estratgia metodolgica adotada incluiu a pesquisa bibliogrfica

    e documental sobre o contexto histrico nacional e local das polticas de resduos slidos e

    saneamento bsico. Tambm foram analisadas as transferncias voluntrias de recursos fiscais

    do governo federal para aes sobre resduos slidos, por meio da consulta de fontes como

    Portal da Transparncia e dos Planos Plurianuais da Unio. Para a anlise da implementao

    da PNRS no nvel local, utilizou-se estudo de casos mltiplos em Salespolis, Mogi das

    Cruzes e So Paulo. A coleta de dados secundrios incluiu os Planos de Gesto Integrada de

    Resduos Slidos (PGIRS), leis, documentos e dados oficiais. Para a obteno de dados

    primrios, foram utilizados questionrio, realizao de entrevistas e registros fotogrficos,

    posteriormente analisados por meio de indicadores sobre os resultados e desempenho das

    polticas pblicas de limpeza urbana e gesto de resduos slidos, luz das diretrizes da

    PNRS. Os principais limites capacidade estatal na implementao da PNRS revelaram-se

    em Salespolis pela restrio oramentria e baixa densidade populacional, enquanto que em

    Mogi das Cruzes e So Paulo esses limites esto diretamente associados com a transferncia

    do manejo de RSU para o setor privado. Ao mesmo tempo, esses arranjos municipais

    apontam, em maior ou menor escala, para a consolidao do aterro sanitrio como destinao

    prioritria dos RSU, uma tendncia nacional. Entretanto, justamente a dependncia

    tecnolgica da soluo pelos aterros sanitrios tem se mostrado como a principal barreira no

    cumprimento da ordem hierrquica da gesto de resduos slidos postulada pela PNRS.

    Palavras-chave: Arranjos institucionais. Capacidade estatal. Implementao de polticas

    pblicas. Poltica Nacional de Resduos Slidos. Resduos slidos urbanos (RSU).

  • ABSTRACT

    KLEIN, Flvio Bordino. Inside the black box of municipal solid waste policies: the

    institutional arrangements and implementation of the Nacional Policy Solid Waste. 2017. 298

    f. Dissertao (Mestrado em Cincias) Escola de Artes, Cincias e Humanidades,

    Universidade de So Paulo, So Paulo, 2017. Verso corrigida.

    The enactment of Federal Law No. 12,305, August 2, 2010 Nacional Solid Waste Policy

    (NSWP) has the fundamental principle of integrated management, which includes the order

    of priority or hierarchy for solid waste management and inclusion of collectors of recyclable

    materials in partnership with the government. Considering that the consolidation of these

    guidelines demands to regard NSWP in the governmental agenda and of the state capacity for

    the implementation of public policies, the objective of this work was to analyze the

    interrelationship of the municipal institutional arrangements of municipal solid waste (MSW)

    policies and the implementation of NSWP. The methodological strategy adopted included

    bibliographical and documentary research on the national and local historical context of solid

    waste and basic sanitation policies. Voluntary transfers of fiscal resources from the federal

    government to actions on solid waste were also analyzed, through the consultation of sources

    such as the Transparency Portal and the Pluriannual Plans of the Union. For the analysis of

    the implementation of the NSWP at the local level, a multiple case study was used in

    Salespolis, Mogi das Cruzes and So Paulo. Secondary data collection included the

    Integrated Solid Waste Management Plan (ISWMP), laws, documents and oficial data. To

    obtain primary data, questionnaire, interviews and photographic records were used, later

    analyzed through indicators on the results and performance of the public policies of urban

    cleaning and solid waste management in light of NSWP guidelines. The main limits on state

    capacity in implementation of the NSWP were revealed in Salespolis by budget constraint

    and low population density, while in Mogi das Cruzes and So Paulo these limits are directly

    associated with the transfer of MSW management to the private sector. At the same time,

    these municipal arrangements point, to a greater or lesser degree, to the consolidation of the

    landfill as a priority destination for MSW, a national trend. However, the technological

    dependence of the solution by the landfills has proved to be the main barrier in the

    hierarchical order of solid waste management postulated by the PNRS.

    Keywords: Institutional arrangements. State capacity. Implementation of public policies.

    Nacional Solid Waste Policy (NSWP). Municipal solid waste (MSW).

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Diagrama dos captulos da dissertao ................................................................... 26

    Figura 2 Modelo de implementao integrada ...................................................................... 39

    Figura 3 Modelo analtico sobre arranjo institucional ........................................................... 44

    Figura 4 Modelo de avaliao de desempenho das polticas pblicas .................................. 61

    Figura 5 Hierarquia dos resduos slidos definida pela Unio Europeia .............................. 76

    Figura 6 Modelo de gesto integrada de resduos slidos ..................................................... 87

    Figura 7 Formas de destinao e tratamento dos resduos slidos em So Paulo entre 1940 a

    1975 ........................................................................................................................................ 147

    Figura 8 Principais eventos na trajetria institucional do saneamento bsico e,

    especificamente, na gesto de resduos slidos urbanos no Brasil e So Paulo ..................... 151

    Figura 9 Valores das transferncias voluntrias liberados e atualizados para os municpios

    do Alto Tiet (em R$) ............................................................................................................. 153

    Figura 10 - PIB per capita dos municpios do Alto Tiet beneficiados pelos repasses do

    governo federal comparados com a mdia nacional (em R$) ................................................ 155

    Figura 11 Distribuio dos repasses do governo federal por grupo de municpios de acordo

    com a renda per capita ........................................................................................................... 156

    Figura 12 Distribuio dos setores da agropecuria, indstria, servios, administrao

    pblica e impostos no PIB de Salespolis em 2014 ............................................................... 165

    Figura 13 Foto de um estaleiro usado pelos moradores das reas rurais de Salespolis para o

    armazenamento temporrio dos resduos domsticos ............................................................ 166

    Figura 14 Distribuio dos setores da agropecuria, indstria, servios, administrao

    pblica e impostos no PIB de Mogi das Cruzes em 2014 ...................................................... 177

    Figura 15 Distribuio dos setores da agropecuria, indstria, servios, administrao

    pblica e impostos no PIB de So Paulo em 2014 ................................................................. 196

    Figura 16 Foto da calada com resduos descartados irregularmente ao lado do Rio

    Pinheirinho em Perus So Paulo .......................................................................................... 214

    Figura 17 Foto dos resduos descartados irregularmente na calada e na margem interna do

    Rio Pinheirinho em Perus So Paulo ................................................................................... 214

    Figura 18 Fluxo dos resduos slidos domsticos passveis de ocorrncia em Salespolis,

    Mogi das Cruzes e So Paulo ................................................................................................. 231

    Figura 19 Categorias de resduos originados da limpeza urbana e as alternativas possveis

    para o tratamento e destinao................................................................................................ 234

  • Figura 20 Taxa de internaes hospitalares, para cada 100 mil pessoas, para doenas

    causadas por vetores transmissores em Salespolis, Mogi das Cruzes e So Paulo .............. 247

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Quantidade diria de resduos slidos urbanos em todo o pas

    encaminhados para diferentes formas de destinao nos anos 2000 e 2008 ..... 83

    Tabela 2 Quantidade de municpios que dispunham os resduos slidos em

    lixo, aterro controlado ou aterro sanitrio entre os anos de 1989, 2000 e

    2008 ......................................................................................................................................... 84

    Tabela 3 Propriedade das empresas de servio de limpeza pblica e coleta de lixo nos

    estados da federao e no Brasil em 1972 .............................................................................. 121

    Tabela 4 Aes profilticas e casos de febre amarela no Brasil entre 1949 a 1990 ............ 125

    Tabela 5 Aes profilticas e casos de peste no Brasil entre 1944 a 1986 .......................... 126

    Tabela 6 - Lucro lquido da empresa SABESP entre 2009 a 2013 (em R$ milhes) ............. 131

    Tabela 7 - Formas de execuo dos servios de limpeza urbana e coleta de resduos na RMSP

    em 1972 e 2000 ...................................................................................................................... 138

    Tabela 8 Evoluo da atuao privada nos servios de limpeza urbana e coleta de resduos

    slidos no Brasil em 1972, 2000 e 2008 ................................................................................. 138

    Tabela 9 Abrangncia da coleta seletiva nos municpios e Grandes Regies do Brasil em

    2015 ........................................................................................................................................ 157

    Tabela 10 Anlise gravimtrica dos resduos das reas urbana e rural de Salespolis ....... 167

    Tabela 11 Comparao entre a quantidade de resduos slidos domsticos e a populao das

    reas rural e urbana de Salespolis ......................................................................................... 168

    Tabela 12 Formas de destinao dos resduos midos respondidas pela populao de

    Salespolis .............................................................................................................................. 169

    Tabela 13 - Gastos com limpeza urbana, gesto de resduos slidos urbanos e dos resduos dos

    servios de sade em Salespolis ........................................................................................... 172

    Tabela 14 - Informaes do PGIRS e do SNIS para a quantidade de resduos slidos

    domsticos, coleta seletiva e resduos recuperados aps triagem em Mogi das Cruzes ........ 179

    Tabela 15 - Indicadores sobre a variao da quantidade de resduos domsticos, coleta

    seletiva, materiais recuperados e rejeitos no municpio de Mogi das Cruzes ........................ 181

    Tabela 16 Valores contratados pela prefeitura de Mogi das Cruzes para a coleta seletiva e

    disposio de resduos em aterro sanitrio ............................................................................. 183

    Tabela 17 - Gastos com limpeza urbana, gesto de resduos slidos urbanos e dos resduos dos

    servios de sade em Mogi das Cruzes .................................................................................. 189

  • Tabela 18 Quantidade de resduos domsticos e da coleta seletiva informados pela

    AMLURB e pelo SNIS em So Paulo .................................................................................... 198

    Tabela 19 Indicadores sobre a quantidade de resduos reciclados, nmero de cooperativas e

    catadores conveniados com o municpio de So Paulo .......................................................... 202

    Tabela 20 Quantidade anual de resduos reciclveis recebida nas unidades de triagem de So

    Paulo ....................................................................................................................................... 205

    Tabela 21 Divergncias nas informaes enviadas ao SNIS sobre a varivel coleta seletiva

    em So Paulo .......................................................................................................................... 207

    Tabela 22 Tipo, origem e quantidade de resduos de natureza indivisvel gerados no

    municpio de So Paulo .......................................................................................................... 211

    Tabela 23 Valor gasto em 2012 pela Prefeitura de So Paulo para a coleta, remoo,

    transporte e disposio final de resduos dos pontos viciados e ecopontos ........................... 216

    Tabela 24 Identificao do oramento previsto e liquidado para os programas e aes que

    compem a administrao e execuo dos servios pblicos de limpeza urbana e gesto dos

    resduos slidos no municpio de So Paulo .......................................................................... 220

    Tabela 25 Comparao entre o oramento total previsto e liquidado para a gesto dos

    resduos slidos urbanos em So Paulo .................................................................................. 223

    Tabela 26 Gastos com limpeza urbana, gerenciamento de resduos slidos urbanos e dos

    resduos dos servios de sade em Salespolis, Mogi das Cruzes e So Paulo ..................... 230

    Tabela 27 Comparativo entre volume de resduos domsticos gerados e renda mdia per

    capita em Salespolis, Mogi das Cruzes e So Paulo ............................................................ 237

    Tabela 28 - Indicadores sobre a variao do volume de vendas do comrcio varejista e no

    setor especfico de produtos alimentcios ............................................................................... 245

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 Principais tipos e caractersticas dos instrumentos de polticas pblicas .............. 48

    Quadro 2- Alguns dos princpios que devem nortear os custos dos servios pblicos ............ 56

    Quadro 3 Relao entre as leis nacionais de sade, saneamento e meio ambiente com os

    princpios e objetivos previstos na PNRS ................................................................................ 78

    Quadro 4 - Enfermidades relacionadas com os resduos slidos e as formas de transmisso

    pelos vetores ............................................................................................................................. 91

    Quadro 5 Sntese dos principais conceitos-chave abordados na reviso da literatura e a

    relao com o estudo emprico ................................................................................................. 92

    Quadro 6 Informaes dos municpios da Bacia Hidrogrfica do Alto Tiet sobre PGIRS,

    existncia de coleta seletiva, outros servios pblicos, populao e PIB per capita ............... 96

    Quadro 7 - Objetivos dos programas descritos nos PPAs sobre resduos slidos e as

    respectivas aes oramentrias do Governo Federal ............................................................ 100

    Quadro 8 Informaes verificadas no Portal da Transparncia do Governo Federal, no Portal

    da Caixa e no Portal do Convnios ......................................................................................... 101

    Quadro 9 Identificao e seleo das variveis ou conceitos nos objetivos dos Programas

    dos PPAs e a definio operacional para mensur-las ........................................................... 102

    Quadro 10 Roteiro bsico com base nos aspectos gerais inerentes gesto de resduos

    slidos: monitoramento, fiscalizao, remunerao e execuo ............................................ 107

    Quadro 11 Anlise interpretativa da PNRS em conjunto com outras leis e atos normativos

    sobre os tipos de resduos, geradores e responsveis pelo gerenciamento ............................. 108

    Quadro 12 Fluxo das informaes e indicadores para analisar os resultados, desempenho e

    impactos da PNRS nos municpios estudados ........................................................................ 111

    Quadro 13 - Formas de execuo e destinao dos resduos slidos na Regio Metropolitana

    de So Paulo (RMSP) em 1972 .............................................................................................. 120

    Quadro 14 Informaes sobre as transferncias voluntrias e os municpios beneficiados da

    Bacia Hidrogrfica do Alto Tiet ........................................................................................... 152

    Quadro 15 - Descrio dos custos para construo de galpo de triagem, aquisio de

    equipamentos e capacitao.................................................................................................... 159

    Quadro 16 Descrio dos valores, componentes e produtividade previstas para galpo de

    triagem de grande ou mdio porte .......................................................................................... 161

    Quadro 17 Informaes sobre a quantidade, formas de tratamento e destinao dos resduos

    slidos urbanos, RCC e resduos volumosos de Salespolis .................................................. 171

  • Quadro 18 Indicadores sobre resultados e desempenho das polticas de resduos slidos

    urbanos em Salespolis .......................................................................................................... 174

    Quadro 19 Informaes sobre a quantidade, formas de tratamento e destinao dos resduos

    da limpeza urbana, RCC e PEVs de Mogi das Cruzes ........................................................... 187

    Quadro 20 Contedo dos objetivos no PPA 2010-2013 e PPA 2014-2017 de Mogi das

    Cruzes para aes relacionadas limpeza urbana e gesto dos resduos slidos ................... 191

    Quadro 21 indicadores sobre resultados e desempenho das polticas de resduos slidos

    urbanos em Mogi das Cruzes..................................................................................................193

    Quadro 22 Alguns indicadores de impacto para programas e aes sobre RSU em Mogi das

    Cruzes antes/aps a PNRS......................................................................................................194

    Quadro 23 Identificao das empresas contratadas para os servios de limpeza urbana e

    manuteno dos sistemas de drenagem na subprefeitura de Perus So Paulo..................... 215

    Quadro 24 - Objetivos e valores previstos para os programas e aes sobre resduos slidos

    urbanos nos PPAs do municpio de So Paulo ....................................................................... 222

    Quadro 25 Indicadores sobre resultados e desempenho das polticas de resduos slidos

    urbanos em So Paulo ............................................................................................................ 225

    Quadro 26 Alguns indicadores de impacto para programas e aes sobre RSU em So Paulo

    antes/aps a PNRS .................................................................................................................. 228

    Quadro 27 Comparao da oferta de PEVs e resduos coletados entre Mogi das Cruzes e

    So Paulo ................................................................................................................................ 235

    Quadro 28 - Execues oramentrias identificadas para a CS Brasil em 2010 .................... 238

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ABLP: Associao Brasileira de Resduos Slidos e Limpeza Pblica

    ABNT: Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ABRELPE: Associao Brasileira de Empresas de Limpeza Pblica e Resduos Especiais

    AEB: Anurio Estatstico do Brasil

    AMLURB: Autoridade Municipal de Limpeza Urbana

    ARES: Associao dos Recicladores de Salespolis

    ASMARE: Associao dos Catadores de Papel, Papelo e Material Reaproveitvel

    BNDES: Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social

    BNH: Banco Nacional de Habitao

    CESBs: companhias estaduais de saneamento

    CETESB: Companhia Ambiental do Estado de So Paulo

    CGU: Controladoria-Geral da Unio

    CLT: Consolidao das Leis de Trabalho

    CMT: central mecanizada de triagem

    COMASP: Companhia Metropolitana de guas de So Paulo

    Comlurb: Companhia de Limpeza Urbana

    CONAMA: Conselho Nacional de Meio Ambiente

    COOPAMARE: Cooperativa de Catadores Autnomos de Papel, Papelo, Aparas e Materiais

    Reciclveis

    CRUs: controladorias regionais da Unio

    CTR: Controle de Transporte de Resduos

    DATASUS: Departamento de Informtica do SUS

    DLU: Diretoria de Limpeza Urbana

    DOU: Dirio Oficial da Unio

    Ensp: Escola Nacional de Sade Pblica

    FAT: Fundo de Amparo ao Trabalhador

    FINBRA: Finanas do Brasil

    FISLURB: Taxa de Fiscalizao dos Servios de Limpeza Urbana

    FMLU: Fundo Municipal de Limpeza Urbana

    Funasa: Fundao Nacional de Sade

    Gegran: Grupo Executivo da Grande So Paulo

    IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

  • ICs: instrumentos de comando e controle

    IDH: ndice de Desenvolvimento Humano

    IEs: instrumentos econmicos

    IMs: instrumentos de mercado

    IPCA: ndice Nacional de Preos ao Consumidor Amplo

    Ipea: Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    IPTU: Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana

    LDNSB: Lei de Diretrizes Nacionais para o Saneamento Bsico

    LDO: Lei de Diretrizes Oramentrias

    LEVs: locais de entrega voluntria

    LIMPURB: Departamento de Limpeza Urbana

    LOA: Lei Oramentria Anual

    Loga: Logstica Ambiental de So Paulo S/A

    MCidades: Ministrio das Cidades

    MDS: Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome

    MESP: Ministrio da Educao e Sade Pblica

    Minter: Ministrio do Interior

    MMA: Ministrio do Meio Ambiente

    MNCR: Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Reciclveis

    MNPR: Movimento Nacional da Populao de Rua

    MS: Ministrio da Sade

    MTE: Ministrio do Trabalho e Emprego

    ONGs: organizaes no governamentais

    OGU: Oramento Geral da Unio

    PEVs: pontos de entrega voluntria

    PGIRS: Plano de Gesto Integrada de Resduos Slidos

    PGRS: Plano de Gerenciamento de Resduos Slidos

    PIB: produto interno bruto

    Planasa: Plano Nacional de Saneamento

    Plansab: Plano Nacional de Saneamento Bsico

    PMDI: Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado da Grande So Paulo

    PNMA: Poltica Nacional de Meio Ambiente

    PNRS: Poltica Nacional de Resduos Slidos

    PNSB: Pesquisa Nacional de Saneamento Bsico

  • PPA: Plano Plurianual

    PPP: princpio do poluidor pagador

    RAE: Repartio de gua e Esgotos

    RCC: resduos da construo civil

    RMs: regies metropolitanas

    RMSP: Regio Metropolitana de So Paulo

    RSU: resduos slidos urbanos

    SAAEs: Servios Autnomos de gua e Esgotos

    SABESP: Companhia de Saneamento Bsico do Estado de So Paulo

    SANESP: Companhia Metropolitana de Saneamento de So Paulo

    SESP: Servio Especial de Sade Pblica

    SFC: Secretaria Federal de Controle Interno

    SFH: Sistema Financeiro de Habitao

    SFS: Sistema Financeiro de Saneamento

    SIAFI: Sistema Integrado de Administrao Financeira

    SIDRA: Sistema IBGE de Recuperao Automtica

    Sinapi: Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e ndices da Construo Civil

    SINIR: Sistema Nacional de Informaes sobre a Gesto dos Resduos Slidos

    SISNAMA: Sistema Nacional de Meio Ambiente

    SNES: Secretaria Nacional de Economia Solidria

    SNIS: Sistema Nacional de Informaes sobre Saneamento

    STN: Secretaria do Tesouro Nacional

    SVMA: Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente

    TCE-SP: Tribunal de Contas do Estado de So Paulo

    TCU: Tribunal de Contas da Unio

    TRSD: Taxa de Resduos Slidos Domiciliares

    TRSS: Taxa de Resduos Slidos de Servios de Sade

    UNEP: Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ................................................................................................................... 21

    2 O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DAS POLTICAS PBLICAS ............... 30

    2.1 A AGENDA GOVERNAMENTAL E AS INFLUNCIAS NA SELEO DE

    PROBLEMAS E SOLUES ................................................................................................. 32

    2.2 A IMPLEMENTAO DE POLTICAS PBLICAS: ENTRE OS OBJETIVOS E A

    AVALIAO DE RESULTADOS ......................................................................................... 37

    2.2.1 Estudos sobre implementao de polticas pblicas ................................................... 38

    2.2.2 Os arranjos institucionais e a capacidade estatal na implementao de polticas

    pblicas .................................................................................................................................... 41

    2.2.3 Os instrumentos de polticas pblicas .......................................................................... 47

    2.2.3.1 Instrumentos de comando e controle (ICs)................................................................... 49

    2.2.3.2 Instrumentos econmicos (IEs) .................................................................................... 50

    2.2.3.3 Instrumentos informacionais ........................................................................................ 52

    2.2.3.4 Execuo de servios pblicos e os critrios para precificao .................................. 54

    2.3 OS INDICADORES PARA O PLANEJAMENTO E AVALIAO DOS

    RESULTADOS DAS POLTICAS PBLICAS ..................................................................... 57

    2.4DESCENTRALIZAO E A COORDENAO INTERGOVERNAMENTAL NA

    IMPLEMENTAO DE POLTICAS PBLICAS ............................................................... 63

    2.4.1 As transferncias voluntrias do governo federal ...................................................... 68

    3 A POLTICA NACIONAL DE RESDUOS SLIDOS: DESAFIOS DA GESTO E

    IMPLEMENTAO ............................................................................................................. 72

    3.1 A INTERFACE DA PNRS COM AS POLTICAS DE SANEAMENTO, SADE E

    MEIO AMBIENTE .................................................................................................................. 72

    3.2 A GESTO INTEGRADA DE RESDUOS SLIDOS: ORDEM HIERRQUICA E A

    INCLUSO DOS CATADORES ............................................................................................ 80

    3.3 OS IMPACTOS DA LIMPEZA URBANA INADEQUADA ........................................... 88

    4 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS ..................................................................... 94

    4.1 DELIMITAO DO UNIVERSO DA PESQUISA, SELEO DOS MUNICPIOS

    PARA O ESTUDO DE CASOS MLTIPLOS E DAS UNIDADES DE ANLISE ............. 95

    4.2 TCNICAS PARA COLETA DE DADOS ....................................................................... 99

    4.2.1 Objetivo 1: contextualizar, no mbito municipal e nacional, a trajetria histrica e

    institucional das polticas de resduos slidos urbanos e saneamento bsico .................... 99

  • 4.2.2 Objetivo 2: mapear as transferncias de recursos do governo federal para a

    execuo de programas como a coleta seletiva nos municpios da Bacia do Alto Tiet ... 99

    4.2.3 Objetivo 3: identificar os processos de implementao da PNRS no nvel local,

    incluindo os resultados, desempenho e impactos ............................................................... 103

    4.3 ANLISE DOS DADOS E A ELABORAO DE INDICADORES PARA O

    OBJETIVO 3 .......................................................................................................................... 110

    5 DO NACIONAL AO LOCAL: CONTEXTO HISTRICO DOS ARRANJOS

    INSTITUCIONAIS DAS POLTICAS DE RESDUOS SLIDOS E SANEAMENTO

    BSICO ................................................................................................................................. 113

    5.1 DOS TIGRES AO INCIO (FORMAL) DO SERVIO PBLICO: SCULOS XVIII E

    XIX ......................................................................................................................................... 113

    5.2 A ESTATIZAO DOS SERVIOS DE SANEAMENTO BSICO E O MOVIMENTO

    SANITARISTA: INCIO DO SCULO XX AT OS ANOS 1960...................................... 117

    5.2.1 Limpeza urbana e gesto de resduos slidos em So Paulo e outras cidades ....... 117

    5.2.2 A integrao das polticas pblicas de sade e saneamento em mbito nacional .. 122

    5.3 A (RE)TERCEIRIZAO DOS SERVIOS DE LIMPEZA URBANA E

    GERENCIAMENTO DE RESDUOS SLIDOS EM SO PAULO E BRASIL: FINAL DOS

    ANOS 1960 AO PERODO ATUAL ..................................................................................... 128

    5.4 A TRAJETRIA E DEPENDNCIA TECNOLGICA DOS ATERROS EM SO

    PAULO NOS ANOS 1970 AO PERODO ATUAL: MUTUALISMO ENTRE

    EMPREITEIRAS E TECNOBUROCRATAS ESTATAIS ................................................... 138

    6 AS TRANSFERNCIAS DE RECURSOS DO GOVERNO FEDERAL PARA A

    GESTO DE RESDUOS SLIDOS ................................................................................. 152

    6.1 MUNICPIOS DO ALTO TIET BENEFICIADOS E O OBJETO DOS REPASSES .. 152

    6.2 CUSTOS ESTIMADOS PARA INVESTIMENTOS EM GALPES DE TRIAGEM E A

    PRODUTIVIDADE NA RECUPERAO DE MATERIAIS RECICLVEIS COM A

    INCLUSO DE CATADORES ............................................................................................. 158

    7 ANLISE DOS ARRANJOS INSTITUCIONAIS MUNICIPAIS NA

    IMPLEMENTAO DA POLTICA NACIONAL DE RESDUOS SLIDOS .......... 164

    7.1 SALESPOLIS ................................................................................................................ 164

    7.1.1 A situao dos resduos slidos domsticos ............................................................... 165

    7.1.2 Resduos da limpeza urbana, construo civil e resduos volumosos ..................... 169

  • 7.1.3 Indicadores de resultados e desempenho das polticas de resduos slidos urbanos

    de Salespolis ........................................................................................................................ 171

    7.2 MOGI DAS CRUZES ...................................................................................................... 177

    7.2.1 A situao dos resduos domsticos ............................................................................ 177

    7.2.2 Resduos da limpeza urbana, RCC, resduos volumosos e gerenciamento dos PEVs

    ................................................................................................................................................ 186

    7.2.3 Indicadores de resultados, desempenho e impactos das polticas de resduos slidos

    urbanos de Mogi das Cruzes ............................................................................................... 188

    7.3 SO PAULO .................................................................................................................... 195

    7.3.1 A situao dos resduos domsticos ............................................................................ 196

    7.3.2 As centrais de triagem e os limites participao dos catadores na coleta seletiva e

    reciclagem .............................................................................................................................. 201

    7.3.3 Resduos da limpeza urbana, RCC, resduos volumosos e gerenciamento dos PEVs

    ................................................................................................................................................ 210

    7.3.4 Indicadores de resultados, desempenho e impactos das polticas de resduos slidos

    urbanos em So Paulo...........................................................................................................219

    7.4 ANLISE DOS TRS MUNICPIOS: DESEMPENHO, RESULTADOS E OS

    ARRANJOS INSTITUCIONAIS NO PROCESSO DE IMPLEMENTAO ..................... 229

    8 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................ 252

    REFERNCIAS ................................................................................................................... 262

    APNDICE A - Questionrio para coleta de dados quantitativos e qualitativos sobre a

    gesto de resduos slidos urbanos e resduos da construo civil ................................... 282

    APNDICE B - Informaes sobre as transferncias voluntrias e os municpios

    beneficiados da Bacia Hidrogrfica do Alto Tiet ............................................................. 295

    APNDICE C - Informaes sobre os valores dos repasses e vigncia dos

    convnios/contratos de repasse nos municpios beneficiados ........................................... 296

    ANEXO A Mapa da Bacia do Alto Tiet ......................................................................... 298

  • 21

    1 INTRODUO1

    Em 2010, o governo federal sancionou a Poltica Nacional de Resduos Slidos

    (PNRS), a partir da Lei Federal n 12.305 (BRASIL, 2010a). Essa poltica foi fortemente

    influenciada pela legislao da Unio Europeia no trato dos resduos slidos, pela prpria

    legislao brasileira, sobretudo a Poltica Nacional de Meio Ambiente (BRASIL, 1981) e

    pelos movimentos dos catadores de materiais reciclveis que atuam em cooperativas de

    muitas cidades brasileiras (ARAJO, 2012; TEODOSIO; GONALVES-DIAS; SANTOS,

    2014).

    A emergncia da problemtica ambiental (incluindo o descarte de resduos slidos)

    como de interesse pblico tornou-se crescente a partir dos movimentos e eventos

    internacionais, como a Conferncia de Estocolmo em 1972 e a Rio-92, que passaram a pregar

    a necessidade de reduzir os atuais padres insustentveis de consumo de recursos naturais, o

    combate poluio e demais formas de degradao ambiental (CAMARGO; CAPOBIANCO;

    OLIVEIRA, 2004; LE PRESTRE, 2005; VIEIRA; BREDARIOL, 2006).

    A PNRS demanda por mudanas nos atuais sistemas de produo, consumo e descarte,

    colocando como importantes atores os geradores de resduos, catadores de materiais

    reciclveis, empresas e governos. No seu bojo, inclui o principal objetivo relacionado ordem

    hierrquica ou prioritria na gesto e destinao dos resduos slidos, baseando-se na no

    gerao, reduo, reaproveitamento, reciclagem e a disposio somente dos rejeitos nos

    aterros sanitrios. Contempla ainda outros objetivos e instrumentos, como a extino dos

    lixes, a coleta seletiva, a compostagem, a logstica reversa, a responsabilidade

    compartilhada, a educao ambiental, a pesquisa cientfica e tecnolgica, o incentivo e apoio

    s cooperativas de catadores de materiais reciclveis, o monitoramento e fiscalizao

    ambientais. A consolidao da ordem hierrquica e dos demais objetivos depender, pelo

    menos, de dois fatores essenciais: 1) considerar a PNRS como prioridade na agenda

    governamental e 2) a capacidade estatal para a implementao de polticas pblicas.

    Na condio de protetor dos interesses da coletividade, o Estado tem papel primordial

    na definio do interesse pblico. Todavia, a vontade geral no de todos, o interesse pblico

    no a soma dos interesses de cada indivduo. Dessa maneira, a soluo de problemas

    coletivos, a partir das polticas pblicas, ser sempre permeada pelo embate de ideias, valores

    1 As diretrizes usadas para a elaborao da presente dissertao seguiram o padro da Associao Brasileira de

    Normas Tcnicas (ABNT), a partir da verso revisada e disponibilizada pela Universidade de So Paulo (2016).

  • 22

    e aspectos conflituosos entre diferentes interesses, muitas vezes limitando a tomada de

    deciso dos governos. A identificao de problemas ambientais, influenciada por fatores

    geogrficos, histricos, culturais, cientficos, econmicos ou polticos, no tem o mesmo peso

    entre diferentes pases, nem mesmo dentro de um pas. Um problema no existe seno atravs

    do impacto que provoca sobre certos grupos ou atores, isto , da maneira como percebido

    por estes para que seja inserido na agenda poltica. Nessa arena conflituosa entre burocratas

    do Poder Executivo e polticos do Legislativo, grupos de interesse da sociedade civil

    associaes empresariais, sindicatos, entidades corporativas, institutos de pesquisa,

    especialistas, comunidades epistmicas ou meios de comunicao tentaro evidenciar a

    existncia ou relevncia de um problema e influenciar os governos a tomar decises pblicas

    que lhes favoream (KINGDON, 2006a; LE PRESTRE, 2005; OLSON, 2002; SECCHI, 2013;

    SIMEON, 1976; SOUZA, 2007).

    A implementao de polticas pblicas, etapa do processo poltico que visa tornar

    intenes em aes, ou o que ocorre entre o estabelecimento da poltica e os impactos no

    mundo da execuo, leva os gestores pblicos do Poder Executivo a se relacionarem,

    simultaneamente, com os polticos e sistemas de partidos, com a sociedade civil (incluindo

    grupos de interesse) e com os rgos de controle externo (tribunais de contas, Judicirio e

    Ministrio Pblico). A interao entre esses atores, regras formais e relaes informais

    desemboca nos arranjos institucionais que dotam, influenciam e condicionam a capacidade do

    Estado na execuo de seus objetivos no processo de implementao de polticas pblicas.

    Nesse contexto, a capacidade estatal entendida a partir dos componentes tcnico-

    administrativo (conhecimento, habilidade e atitudes) e poltico (autonomia da tomada de

    deciso na negociao com os diversos atores sociais) se torna crucial para o xito na

    execuo dos objetivos, na articulao interorganizacional e intergovernamental, no

    desempenho interno da organizao e na preveno captura por grupos privilegiados e com

    interesses privados (GOMIDE; PIRES, 2014; GRIN, 2012; HILL; HUPE, 2002; OTOOLE,

    2003; WINTER, 2003).

    No Brasil, at o ano de 2008, aproximadamente metade dos municpios ainda

    lanavam resduos slidos em lixes (IBGE, 2010a). No restante, essa forma arcaica de

    disposio final vem sendo substituda pelos aterros controlados e sanitrios2. Apesar destes

    2 H relevantes diferenas, em termos de impactos ambientais, em relao ao uso dos lixes, aterros controlados

    e aterros sanitrios. De acordo com o Cempre (2010, p. 243-244) e Ministrio do Meio Ambiente

    (BRASIL,2012a, p. 15) o lixo uma forma inadequada de disposio final de resduos slidos, baseando-se na

    simples descarga sobre o solo, sem medidas de proteo ao meio ambiente ou sade pblica. Causam diversos

    impactos ambientais como proliferao de vetores transmissores de doenas (moscas, mosquitos, baratas, ratos),

  • 23

    ltimos atenderem, minimamente, os critrios sanitrios na disposio final dos resduos

    slidos, esse procedimento especializado em coletar, transportar e enterrar resduos slidos

    tem ocultado os problemas ambientais decorrentes do consumo e descarte em massa,

    tornando-os alheios sociedade e sendo, justamente, a principal barreira ordem de

    prioridade na gesto e destinao dos resduos slidos postulada pela PNRS. Ao mesmo

    tempo, os rgos responsveis pelas polticas pblicas sobre o manejo de resduos slidos

    urbanos possuem grande controle sobre a informao e podem, atravs desse poder, ocultar o

    agravamento (dominncia) da disposio dos resduos slidos em aterros pois, sem

    indicadores, os problemas no podem ser percebidos e inseridos na agenda governamental. A

    relevncia desses aspectos levou formulao do seguinte problema de pesquisa: como os

    arranjos institucionais dos municpios tem atuado na implementao da Poltica

    Nacional de Resduos Slidos (PNRS)? Para responder indagao proposta, o objetivo

    perseguido na pesquisa foi analisar a inter-relao dos arranjos institucionais municipais das

    polticas de resduos slidos urbanos e a implementao da PNRS.

    Os objetivos especficos desenvolvidos foram:

    1. Contextualizar, no mbito municipal e nacional, a trajetria histrica e institucional

    das polticas de resduos slidos urbanos e saneamento bsico;

    2. Mapear as transferncias de recursos do governo federal para a execuo de

    programas, como a coleta seletiva, dos municpios da Bacia do Alto Tiet;

    3. Identificar os processos de implementao da PNRS no nvel local, incluindo os

    resultados, desempenho e impactos.

    gerao de maus odores e, principalmente, poluio do solo, das guas superficiais e subterrneas pela

    contaminao atravs do chorume. No aterro controlado, tambm considerado como disposio inadequada, o

    nico cuidado realizado o recobrimento da massa de resduos e rejeitos com terra. No obstante, tal como o

    lixo, no dispe de impermeabilizao na base (comprometendo a qualidade das guas subterrneas) nem de

    sistemas de coleta e tratamento do percolado (mistura entre o chorume e a gua de chuva que percorre o aterro).

    Por fim, o aterro sanitrio baseia-se em critrios de engenharia e normas operacionais especficas

    (impermeabilizao do solo, cercamento, ausncia de catadores, sistema de drenagem de gases, guas pluviais e

    lixiviado), permitindo [a priori] um controle da poluio ambiental e proteo sade pblica, incluindo o

    confinamento dos resduos slidos em camadas cobertas com material inerte, geralmente solo, minimizando os

    impactos ambientais.

  • 24

    A estimativa populacional dos 34 municpios da Bacia do Alto Tiet, segundo o

    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE, 2017), era de 20.759.475 habitantes no

    ano de 2014, o que representava cerca de 10,2% da populao total do pas, estimada em

    quase 203 milhes de habitantes. Ao mesmo tempo, esses municpios esto inseridos na

    Regio Metropolitana de So Paulo (RMSP)3, sendo a regio com o maior Produto Interno

    Bruto (PIB) do pas4. No entanto, at 2015 apenas 10 dos 34 municpios possuam o Plano de

    Gesto Integrada de Resduos Slidos (PGIRS), instrumento bsico para o diagnstico sobre

    as polticas municipais de resduos slidos e para a propositura de objetivos condizentes com

    a PNRS, e apresentam baixos indicadores de desempenho para programas como coleta

    seletiva, servio pblico considerado essencial pela PNRS. Alm disso, a maioria dos

    municpios da bacia no possui programas para o gerenciamento ambientalmente adequado

    dos resduos da construo civil (RCC), incluindo locais e equipamentos pblicos para o

    descarte adequado desses resduos atravs dos pontos de entrega voluntria (PEVs)5 ou

    ecopontos. Nos poucos municpios em que existem esses dispositivos, como So Paulo, a

    quantidade e localizao so ainda insuficientes, no conseguindo eliminar a disposio

    irregular desses resduos (BESEN et al., 2014; KLEIN; GONALVES-DIAS; JAYO, 2016).

    A distncia desses municpios, entre os princpios e objetivos das polticas de resduos

    slidos urbanos e a realidade emprica observada apontado, pela literatura nacional e

    internacional, como problemas de implementao (gap entre os objetivos e resultados

    efetivamente alcanados), podendo ser atribudos falta de coordenao intergovernamental

    entre os governos federal e sub-nacionais para polticas de interesse coletivo (ABRUCIO,

    2002; BUNKER, 1972); as disparidades do federalismo brasileiro em termos de recursos

    financeiros, organizacionais e institucionais (ARRECHE, 2006; SILVA, 1997); a cultura

    3 Deve-se salientar que a RMSP possui 39 municpios: destes, 34 so os que se localizam na Bacia Hidrogrfica

    do Alto Tiet. Os cinco municpios que pertencem a essa regio administrativa mas no mencionada bacia

    hidrogrfica seriam Guararema, Juquitiba, Santa Isabel, So Loureno da Serra e Vargem Grande Paulista. 4 Em 2012, o PIB do estado de So Paulo representava 31% de todo o pas (IBGE, 2014) e, de acordo com a

    EMPLASA (2012, p. 44), no ano de 2009 o PIB da RMSP era equivalente a 57% do total do estado. 5 Os PEVs so locais pblicos que disponibilizam gratuitamente equipamentos como caambas para a populao

    descartar adequadamente os resduos da construo civil, resduos volumosos, resduos domsticos da coleta

    seletiva e resduos enquadrados na logstica reversa obrigatria (BRASIL, 2012a e 2012b). Permitem

    transformar resduos difusos em resduos concentrados, reduzindo custos com a limpeza corretiva do descarte

    irregular e, concomitante, promovendo a precauo e a preveno em relao aos impactos socioambientais dos

    diferentes resduos.

    Inicialmente, esses equipamentos eram definidos pela norma brasileira NBR 15112 (ABNT, 2004a) como

    ponto de entrega de pequenos volumes, destinado apenas para RCC e resduos volumosos, buscando

    normatizar as diretrizes da Resoluo CONAMA n 307/02 (BRASIL, 2002a). Com a aprovao da PNRS, o

    Ministrio do Meio Ambiente sugere a ampliao no uso desses equipamentos para a recepo e armazenamento

    dos resduos que contemplam a logstica reversa obrigatria.

  • 25

    administrativa ou organizacional permeada por resqucios de clientelismo, burocracia arcaica

    ou cooptada por interesses privados avessos inovao e melhoria dos servios pblicos

    (FARAH, 2006; NUNES, 1997; OLSON, 2002; POLLITT; BOUCKAERT, 2011); falta ou

    limitado controle sobre a discricionariedade (autonomia na tomada de deciso) de polticos,

    gestores e burocratas (WEATHERLEY; LIPSKY, 1977).

    A estratgia metodolgica adotada para o desenvolvimento da pesquisa, por meio de

    estudo de casos mltiplos em Salespolis, Mogi das Cruzes e So Paulo, lanou mo de

    diversas fontes de dados secundrios, incluindo os PGIRS, leis, documentos e dados oficiais.

    Para a obteno de dados primrios, foram utilizados questionrio, realizao de entrevistas e

    registros fotogrficos. Sendo organizados e categorizados pelo referencial terico e

    bibliogrfico, esses dados puderam ser analisados por meio de informaes e indicadores

    sobre os resultados e desempenho das polticas pblicas de resduos slidos urbanos (RSU),

    comparados com as diretrizes da PNRS. Os arranjos institucionais e a transferncia da

    execuo desses servios ao setor privado so, de fato, os principais elementos decisivos

    sobre os resultados, evidenciando os problemas de implementao da PNRS observados

    nesses municpios. Esses arranjos, inseridos dentro do contexto socioeconmico e

    demogrfico, com a disputa pela alocao do oramento pblico e a omisso da informao,

    apontam para a consolidao do aterro sanitrio. Sendo conveniente para empresas privadas e

    no cumprimento s regras legais e sanitrias, essa consolidao justamente a principal

    barreira gesto integrada, ordem de prioridade da gesto dos resduos slidos e incluso

    dos catadores, postuladas pela PNRS.

    A pesquisa est estruturada em oito captulos, incluindo esta introduo e os objetivos

    j apresentados. No captulo 2, o processo de desenvolvimento das polticas pblicas

    analisado com nfase na abordagem sobre os valores, ideias, estruturas de poder e tendncias

    de conflito que permeiam a formulao das polticas pblicas (agenda, seleo de alternativas

    e a tomada de deciso). Na etapa de implementao, so identificados o papel da burocracia

    do Poder Executivo e as capacidades estatais necessrias para a execuo dos objetivos, bem

    como os dilemas entre os efeitos sinrgicos e refratrios dos arranjos institucionais

    incluindo os sistemas poltico, rgos de controle externo e grupos de interesse sobre as

    capacidades estatais. A ltima parte discute a descentralizao de polticas pelo federalismo

    brasileiro, o processo de coordenao intergovernamental e as transferncias fiscais

    discricionrias (voluntrias) do governo federal. O diagrama apresentado pela figura 1 mostra

  • 26

    a organizao dos captulos da dissertao na compreenso sobre os arranjos das polticas de

    RSU e a inter-relao com a PNRS.

    Figura 1 Diagrama dos captulos da dissertao

    Fonte: elaborao prpria

    Uma das setas, que parte do retngulo tracejado do captulo 2, relaciona-se com o

    processo de descentralizao e coordenao intergovernamental e possui conexo com o

    captulo 3. Neste captulo, a reviso da literatura trata sobre a legislao ambiental brasileira,

    com nfase para a Poltica Nacional de Meio Ambiente e as resolues do Conselho Nacional

    de Meio Ambiente (CONAMA) que, em conjunto com a legislao da Unio Europeia,

    influenciaram na arquitetura da Poltica Nacional de Resduos Slidos. Tambm so tratados

    os conceitos sobre gesto integrada, a ordem hierrquica na destinao dos resduos slidos, a

    interface com as polticas de sade, saneamento bsico e meio ambiente, e a relevncia na

    incluso dos catadores de materiais reciclveis.

    A outra seta que parte do captulo 2 uma conexo da discusso sobre as

    transferncias voluntrias de recursos fiscais originadas do governo federal que, no captulo 6,

    so analisadas para os programas e aes sobre os resduos slidos nos municpios do Alto

  • 27

    Tiet beneficiados por esses repasses. Nesse captulo, foi possvel observar que o governo

    federal j incentivava os municpios para aes como a coleta seletiva e incluso dos

    catadores no reaproveitamento e reciclagem de resduos antes mesmo da aprovao da PNRS

    em 2010. Essas transferncias foram executadas a partir da aprovao de aes oramentrias,

    formuladas nos objetivos dos Planos Plurianuais (PPAs) e Leis Oramentrias Anuais (LOAs)

    da Unio.

    O captulo 4 descreve os procedimentos metodolgicos usados para o cumprimento

    dos objetivos da pesquisa. Sendo uma pesquisa do tipo exploratrio-descritiva, realizada a

    partir de um estudo de casos mltiplos, so descritos os critrios para a escolha dos trs

    municpios (Salespolis, Mogi das Cruzes e So Paulo), a regio onde esto localizados

    (Bacia Hidrogrfica do Alto Tiet), as fontes usadas para a coleta de dados, as formas de

    anlise dos dados, incluindo a elaborao de indicadores para verificar o desempenho, os

    resultados e impactos das polticas pblicas de limpeza urbana e resduos slidos pelos

    municpios.

    A implementao da PNRS analisada no captulo 7, a partir dos arranjos

    institucionais dos trs municpios selecionados para o estudo de casos. O recorte analtico

    desses arranjos baseou-se nas polticas pblicas de resduos slidos urbanos (RSU), a partir da

    diviso conceitual entre resduos domsticos (divisveis e coletados porta a porta) e resduos

    indivisveis que integram a limpeza urbana.

    Buscando responder a pergunta de pesquisa, os principais conceitos, fenmenos e

    aspectos discutidos nos captulos anteriores so direcionados para o captulo 7 (representado

    pelas setas da figura 1), com destaque para a ruptura dos arranjos institucionais no perodo

    militar, o processo de terceirizao dos servios de manejo de resduos slidos urbanos

    ocorrido em So Paulo e a emergncia no uso dos aterros sanitrios (destacados no retngulo

    tracejado do captulo 5); a descentralizao de polticas pblicas, as relaes

    interorganizacionais, os conflitos entre grupos de interesse e os limites capacidade estatal na

    agenda e implementao de polticas pblicas (contribuies principais do captulo 2); e os

    critrios e beneficiados das transferncias voluntrias do governo federal para programas e

    aes sobre os RSU (captulo 6).

    Este estudo parte de uma abordagem institucionalista para compreender os arranjos

    institucionais e a capacidade estatal na implementao de polticas pblicas, apoiando-se no

    modelo conceitual de Gomide e Pires (2014), alm das contribuies de Grin (2012) e Pires et

    al. (2005). Outras importantes referncias tambm contriburam para a construo deste

  • 28

    estudo: a influncia na ao dos governos por grupos de interesse privados (OLSON, 2002);

    as adaptaes e mudanas similares que ocorrem no mbito das organizaes, tratadas por

    DiMaggio e Powell (2005) como isomorfismo institucional; a relevncia da informao para a

    tomada de deciso (ARROW, 1974); a agenda governamental (KINGDON, 2006a e 2006b);

    as interconexes entre as etapas de formulao, implementao e avaliao de polticas

    pblicas (WINTER, 2003; SIMEON, 1975); os critrios para a avaliao das polticas

    pblicas (DRAIBE, 2001; HEINRICH, 2003; POLLITT; BOUCKAERT, 2011).

    A pesquisa buscou abrir e compreender a caixa-preta6 das polticas e gesto de

    resduos slidos urbanos (RSU). Os municpios possuem, aparentemente, arranjos e rotinas

    similares para promover as mesmas etapas bsicas do gerenciamento de resduos slidos

    (coleta, transporte, tratamento e disposio). Sendo a populao a principal geradora de

    resduos, ela simplesmente deposita uma confiana e submisso nos tecnoburocratas ou

    sistemas peritos7, sem qualquer questionamento dos mtodos, custos, procedimentos adotados

    e resultados obtidos. Seja por inscincia ou inacessibilidade informao, a sociedade e o

    cidado comum no compreendem o que ocorre no interior dessa caixa-preta: interessa-lhes

    apenas o que se coloca nela (os resduos) e o produto que dela se tira (destinao para longe

    de seus olhos).

    No entanto, no so apenas os resduos que so colocados nessas caixas-pretas. H

    volumes de recursos para o custeio desses servios aprovados pelos oramentos municipais e

    que so endereados para diferentes grupos (uns ganham mais e outros menos). No interior

    delas, as etapas de gerenciamento, quando observadas de perto, podem variar amplamente

    entre os municpios: os responsveis pela execuo (setor pblico ou privado), os critrios e

    regras de contratao, os mecanismos de controle, as formas de repartio desses servios e as

    relaes intraorganizacionais e interorganizacionais do uma pequena dimenso do que pode

    ocorrer no interior dessas caixas-pretas. Por fim, os produtos ou resultados que saem delas

    podem incluir a coleta seletiva, reaproveitamento e reciclagem de resduos, galpes de

    triagem, varrio de ruas e caladas, capinao de reas verdes, instalao de coletores e

    6 De acordo com Latour (2011, p. 4), a expresso caixa-preta usada em ciberntica sempre que uma mquina

    ou conjunto de comandos se revela complexo demais. Em seu lugar desenhada uma caixinha preta, a respeito

    da qual no preciso saber nada, a no ser o que dela entra e o que dela sai. Isto , por mais controvertida que

    seja sua histria, por mais complexo que seja seu funcionamento interno, a nica coisa que importa o que se

    pe nela e o que dela se tira. Para Sandroni (1999), essa expresso se refere a sistemas cujos mecanismos

    internos no so acessveis observao e compreenso. A expresso pode designar o que ocorre, seja dentro de

    uma empresa, com registros financeiros irregulares, seja em computao, quando um sistema qualquer s

    passvel de ser estudado por meio do que entra e do que sai, e no do que se passa em seu interior. 7 Ver Giddens (1991)

  • 29

    equipamentos pblicos para o armazenamento temporrio de resduos (PEVs, LEVs8, lixeiras,

    cestos, tambores e contineres), coleta de resduos oriundos do descarte irregular e disposio

    em aterros ou lixes.

    O esforo de compreender o interior dessas caixas-pretas, incluindo os arranjos

    institucionais, processos, atores e suas inter-relaes, os recursos pblicos utilizados, a

    quantidade de resduos coletada e as formas de destinao, e seus diversos produtos na forma

    de resultados, desempenho e impactos, pode ser considerado como uma das principais

    contribuies desta pesquisa.

    8 Locais de entrega voluntria (LEVs) so dispositivos contineres, recipientes de plstico, cestos ou outros

    instalados em espaos pblicos ou privados para recebimento de resduos reciclveis (BRASIL, 2012a).

  • 30

    2 O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DAS POLTICAS PBLICAS

    Este captulo visa entender as principais etapas que permeiam o processo de polticas

    pblicas, desde a agenda governamental, as solues ou alternativas disponveis para

    determinados problemas, a tomada de deciso sobre a alternativa escolhida, a implementao

    da deciso adotada e a avaliao da implementao. Inclui a discusso sobre o embate de

    ideias, valores e aspectos conflituosos que condicionam as polticas pblicas. Na segunda

    parte do captulo, a relevncia das capacidades estatais analisada nas etapas de

    implementao compreendida como a fase da poltica pblica que visa tornar as intenes

    em aes e na avaliao de resultados. Ao mesmo tempo, so discutidos os principais

    instrumentos de implementao que podem ser utilizados pelos governos. A terceira seo

    analisa os principais aspectos que compreendem o federalismo brasileiro, a coordenao

    intergovernamental para a implementao de polticas pblicas e as transferncias de recursos

    fiscais pelo governo federal que podem servir de incentivo e apoio aos municpios.

    Simeon (1975), ao tratar sobre o policy-making process (processo de polticas

    pblicas), considera-o como um meio sistemtico de buscar apoio, avaliar custos e benefcios

    e implementar escolhas. Destaca que esse processo, ao colocar como atores centrais (embora

    no exclusivos) o sistema poltico (incluindo partidos e coalizes) e a burocracia pblica,

    desenrola-se em uma ampla estrutura poltica, formada e influenciada por valores, ideias,

    estruturas de poder e por tendncias de conflito. As polticas pblicas surgem a partir de

    foras polticas, econmicas e sociais, manifestadas atravs de instituies e processos. No

    significa, portanto, que o processo de poltica pblica buscar a melhor ou mais eficiente

    soluo, ou ainda, que buscar simplesmente resolver algum problema tomado a partir de um

    objetivo.

    Mas, afinal, o que poltica pblica? De acordo com Secchi (2013, p. 2), uma poltica

    pblica uma diretriz elaborada para enfrentar um problema pblico. Possui ao menos dois

    elementos fundamentais: intencionalidade pblica e resposta a um problema que

    considerado como pblico, isto , a soluo de algum problema que coletivamente relevante

    (SECCHI, 2013).

    Essa nfase sobre o papel da poltica pblica apenas na soluo de problemas coletivos

    pode gerar algumas limitaes analticas j que, ao superestimar os aspectos racionais e

    procedimentais das polticas pblicas, desconsidera ou ignora a essncia dos elementos que

    geram as polticas pblicas, sobretudo, pelo embate de ideias e valores, muitas vezes

    contraditrios para o mesmo problema considerado de interesse coletivo. Ao se concentrar

  • 31

    apenas no papel do Estado, essas definies que associam a poltica pblica apenas soluo

    de problemas negligenciam os aspectos conflituosos de interesses e os limites que

    fundamentam a tomada de deciso dos governos (SOUZA, 2007). Essa arena conflituosa no

    processo de gerao de polticas pblicas parece canalizar-se na enxuta definio de Le

    Prestre (2005, p. 67, itlico do autor), ao colocar poltica pblica como sendo [...] antes de

    tudo, o que o Estado, no plano nacional, ou os Estados e atores internacionais, dele emanados,

    no plano internacional, fazem ou no fazem.

    Uma definio um pouco mais abrangente entre a dicotomia fazer ou no fazer pode

    ser depreendida a partir de Saravia (2006, p. 28-29, negrito nosso), definindo poltica pblica

    como:

    [...] um fluxo de decises pblicas, orientado a manter o equilbrio social ou a

    introduzir desequilbrios destinados a modificar essa realidade. Decises

    condicionadas pelo prprio fluxo e pelas reaes e modificaes que elas provocam

    no tecido social, bem como pelos valores, ideias e vises dos que adotam ou influem

    na deciso. [...] Com uma perspectiva mais operacional, poderamos dizer que ela

    um sistema de decises pblicas que visa a aes ou omisses, preventivas ou

    corretivas, destinadas a manter ou modificar a realidade de um ou vrios setores da

    vida social, por meio da definio de objetivos e estratgias de atuao e da alocao

    dos recursos necessrios para atingir os objetivos estabelecidos.

    O processo de desenvolvimento da poltica pblica passa por diversos estgios ou

    etapas e, em cada um deles, os atores, as coalizes, os processos, as nfases e as prioridades

    so diferentes. Para Saravia (2006), essas etapas se dividem entre agenda, elaborao,

    formulao, implementao, execuo, acompanhamento e avaliao. Secchi (2013)

    menciona o ciclo de polticas pblicas como uma forma de organizar o desenvolvimento de

    uma poltica pblica em fases sequenciais e interdependentes, a partir de sete fases principais:

    identificao do problema, formao de agenda, formulao de alternativas, tomada de

    deciso, implementao, avaliao e extino. Souza (2007) retrata como estgios do ciclo de

    polticas pblicas: definio de agenda, identificao de alternativas, avaliao das opes,

    seleo das opes, implementao e avaliao. Draibe (2001, p. 29-30) coloca que a

    formulao compreende a formao da agenda pblica (a introduo do tema ou das

    demandas sociais), a produo e o confronto de alternativas pelos diferentes grupos de atores,

    o processo de filtragem/domesticao da policy por parte dos agentes decorrentes do legado,

    tradio e cultura organizacional , a tomada de deciso e a definio de estratgias de

    implementao. Quanto implementao, inclui as atividades-meio, fundamentais para a

    viabilizao do programa ou poltica, e as atividades-fim, isto , a execuo propriamente

  • 32

    dita. Essas duas etapas formulao e implementao representam as principais no ciclo

    das polticas pblicas (DRAIBE, 2001). Por fim, Le Prestre (2005), define as fases da poltica

    pblica a partir das demandas (definio do problema), colocao do problema na agenda

    poltica, formulao de alternativas e a tomada de deciso, implementao, impactos

    (outcomes ou resultados) e avaliao.

    Apesar de relevante para compreender o processo de poltica pblica, Secchi (2013)

    ressalta que o modelo analtico atravs do ciclo, etapas ou fases raramente reflete a vida real

    de uma poltica pblica, geralmente ocorrendo misturadas e com alternncia da sequncia.

    A prxima seo trata sobre a agenda governamental, sobre como os problemas e

    demandas tornam-se (ou no) prioritrios pelos governos, e as influncias sobre os decision-

    makers (tomadores de deciso). Essas fases, a grosso modo, compreendem o processo de

    formulao das polticas pblicas.

    2.1 A AGENDA GOVERNAMENTAL E AS INFLUNCIAS NA SELEO

    DE PROBLEMAS E SOLUES

    Na condio de protetor dos interesses da coletividade, o Estado ter papel primordial

    na definio do interesse pblico, cabendo-lhe a tarefa de alcanar os fins ltimos da

    coletividade, seja a educao moral dos cidados, como desejado por Plato, a ordem social

    (em Hobbes) ou os direitos individuais (em Locke). Porm, sob diversos enfoques, a primazia

    ao Estado como guardio da coletividade questionada. Delegar a pequenos grupos que

    representam o Estado a aptido exclusiva em definir o interesse pblico, como a tecnocracia

    ou tecnoburocracia9, tende a ser fortemente criticado por substituir a agregao das

    preferncias democrticas pela autoridade do especialista. Os marxistas e diversas

    organizaes no governamentais (ONGs) questionam a atuao do Estado em priorizar os

    interesses de uma pequena elite econmica ou social. Em alguns pases, grupos de interesse

    como ONGs consideram sua legitimidade superior do Estado, proclamando-se de interesse

    pblico e no privado sendo, dessa maneira, supostamente representantes dos interesses no

    econmicos que foram alijados do processo poltico. H ainda associaes ambientais que

    9 Optou-se por utilizar a expresso tecnoburocracia, com base em Bresser-Pereira (1972, p. 102), que assim

    coloca: tecnoburocracia o governo dos tcnicos. o sistema poltico em que o poder est nas mos dos

    tcnicos, sejam eles economistas, engenheiros, administradores pblicos e privados ou militares profissionais.

    Colocada nesses termos, tecnoburocracia seria um tipo de oligarquia: a oligarquia dos tcnicos. Ope-se,

    portanto, a outros sistemas polticos, particularmente democracia. [...] O tcnico assume o poder no em funo

    da vontade do povo, expressa atravs do voto, mas em nome de sua competncia tcnica e organizacional.

  • 33

    menosprezam a legitimidade do Estado como defensor do interesse comum, acusando-o de

    omisso acerca da degradao dos recursos naturais e poluio. Apesar dessas oposies e

    questionamentos, alm de definir o que de interesse comum sob a perspectiva da poltica

    ambiental, cabe ao Estado: i) identificar e definir o problema e os meios de ao; ii) dar

    prioridade aos problemas ambientais na agenda pblica; iii) decidir sobre a repartio dos

    custos e arbitragens aceitveis no intuito de obter o melhor resultado (LE PRESTRE, 2005).

    Ao considerar o interesse pblico como o que permite manter, minimamente, as

    estruturas essenciais da coletividade, no seria difcil supor que no haja unanimidade no seio

    do Estado acerca dos valores que merecem ser perseguidos e sobre os meios a empregar,

    gerando numerosos conflitos (locais, regionais e internacionais), relacionados com o contedo

    do interesse pblico (LE PRESTRE, 2005). Sendo escassos os bens pblicos e, dada (na

    maioria das vezes) a impossibilidade de sua utilizao e distribuio justa entre todos os

    beneficirios, a questo mais relevante nos estudos das polticas pblicas a formulada por

    Lasswell: who gets what, when, and how? (quem ganha o que, quando e por qu?) (SIMEON,

    1975, p. 550). Arretche e Rodden (2004, p. 549), destacam que essa questo de Lasswell

    refere-se s polticas de distribuio [alocao de recursos, bens ou servios pblicos], ao

    indagarem quando o governo usa sua autoridade para taxar, gastar e regular, quem so os

    principais beneficirios?. Sob essa perspectiva, a poltica pblica se torna conflituosa quando

    inclumos nesse processo a tomada de deciso sobre a alocao do oramento pblico,

    formulado a partir do Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Oramentrias e Lei Oramentria

    Anual (PARES; VALLE, 2006).

    A identificao de problemas ambientais, segundo Le Prestre (2005), depende de

    fatores geogrficos, histricos, culturais, cientficos, econmicos ou polticos. Logo, um

    problema ambiental no tem o mesmo peso entre diferentes pases e dentro de um mesmo

    pas. Um problema no existe seno atravs do impacto que provoca sobre certos grupos ou

    atores, isto , da maneira como percebido por estes para que sejam inseridos na agenda

    poltica. Haver sempre diferentes prioridades e interesses em relao aos problemas

    ambientais, conforme estes ocorram na Amrica do Norte ou Europa, num pas rico ou pobre.

    A capacidade de absoro de algum poluente sobre um ecossistema (isto , o parmetro que

    define a sua resilincia) depende no apenas de suas caractersticas e interaes fsicas,

    geolgicas, hidrolgicas ou biolgicas, mas tambm (e talvez principalmente) do nvel de

    poluio que a sociedade concorda em aceitar ou que o rgo ambiental aceite como legal. O

    jogo poltico ter por finalidade engendrar sua prpria definio do problema implicando,

  • 34

    como consequncia, na propositura de solues em conformidade com valores e interesses

    particulares.

    Um problema pblico pode surgir subitamente, como numa catstrofe natural ou por

    um surto epidmico. Um problema pblico pode ganhar importncia gradualmente, como o

    congestionamento nas cidades. Podem ainda ocorrer casos de um problema pblico existir por

    muito tempo mas, historicamente, no receber suficiente ateno simplesmente porque a

    sociedade se conformou a conviver com ele, como o caso da existncia de favelas nas

    grandes e mdias cidades. Os partidos e agentes polticos, burocratas e grupos de interesses

    associaes empresariais, sindicatos, entidades corporativas, institutos de pesquisa,

    especialistas, comunidades epistmicas ou meios de comunicao tentaro evidenciar a

    existncia ou relevncia de um problema, buscando coloc-lo na lista de prioridades: trata-se

    da agenda poltica (KINGDON, 2006b; OLSON, 2002; SECCHI, 2013).

    A agenda pode ser considerada como um conjunto de problemas ou temas entendidos

    como relevantes, podendo adotar a forma de um programa de governo, um planejamento

    oramentrio ou um estatuto partidrio (SECCHI, 2013). A agenda refere-se lista de temas

    ou problemas que so objeto de ateno, seja por parte das autoridades governamentais ou de

    pessoas fora do governo. No setor de transportes, por exemplo, o secretrio ou ministro,

    assessores e congressistas podem estar considerando uma variedade de problemas, como o

    custo de obras para o transporte em massa, a deteriorao de estradas e vias de acesso, as

    ineficincias geradas pela regulamentao de empresas areas ou vazamentos nos tanques de

    grandes navios nos portos do pas. Dentro dos possveis temas ou problemas aos quais os

    governantes poderiam dedicar sua ateno, eles se concentram em alguns e no em outros

    (KINGDON, 2006b, p. 222). Essa lista de temas varia de acordo com os diferentes setores e

    nveis de governo [mbito nacional ao local]. O presidente e seus assessores tm nas suas

    agendas pautas como crises internacionais, iniciativas legislativas de grande porte e grandes

    decises oramentrias. Em cada rea, como sade ou transporte, tambm haver agendas

    especficas e, dentro de uma mesma rea (por exemplo sade), poder existir agendas mais

    especializadas, como pesquisa biomdica ou prestao direta de servios mdicos

    (KINGDON, 2006b). Portanto, em cada nvel de governo haver diferentes agendas, em

    diferentes escalas, definidas pelas atribuies e competncias (legal e institucional) de cada

    rgo.

    Se, por um lado, os problemas ou demandas da sociedade so numerosos, os recursos

    pblicos e a vontade dos Estados em resolv-los so limitados. Antes de imaginar qual

  • 35

    soluo adotar, preciso primeiro que um problema seja reconhecido como problema. O

    processo que inscreve os problemas no debate pblico e os coloca na ordem do dia ou na

    agenda poltica, acaba sendo vinculado a um grau de conflitos, circundado pela atividade de

    grupos de interesse e pela estrutura do sistema poltico-administrativo, que poder facilitar ou

    limitar o surgimento de determinadas questes. O controle da agenda nacional ou

    internacional , portanto, um recurso poltico decisivo (LE PRESTRE, 2005, p. 71). Em

    geral, o processo de colocao de problemas ou demandas na agenda em diversos pases

    poder ocorrer por uma das trs vias abaixo:

    i. Em alguns pases, so as iniciativas externas aos governos que, em geral, influenciam o processo. O surgimento de cidados, que denunciam prticas nocivas ao meio

    ambiente ou que se dedicam defesa de certos valores ecolgicos, algo crescente

    nos ltimos quarenta anos. Tais organizaes, incluindo ONGs, tentam influenciar a

    agenda dos governos.

    ii. Em outros casos, a agenda poltica uma mobilizao gerada no prprio interior do governo. Pode ser a burocracia pblica que identifica um problema e prope solues.

    iii. A agenda pode ser o produto de aes praticadas por indivduos ou grupos que se beneficiam de um acesso privilegiado. Estes grupos propem problemas, buscando

    ampliar sua relevncia e assim atrair o apoio de outros grupos, reforando a presso

    sobre os governos. Diferente do primeiro modelo, neste nenhum esforo feito para

    mobilizar os cidados em geral. Em geral, este o modelo mais comum nos pases em

    desenvolvimento, como decorrncia de instituies democrticas precrias e pela forte

    concentrao de poder e riqueza de grupos econmicos.

    (LE PRESTRE, 2005, p. 73-74)

    No so apenas temas ou problemas que se inserem nas agendas dos governos: um

    conjunto de alternativas de aes governamentais so formuladas como solues. Se o custo

    dos servios de sade um item importante na agenda, as autoridades envolvidas podem

    considerar uma variedade de alternativas selecionadas para solucionar esse problema:

    regulamentao direta dos custos hospitalares, aplicao de incentivos ao sistema para

    estimular a regulao de mercado, o pagamento dos custos dos consumidores atravs de um

    seguro nacional, nacionalizao do sistema em um esquema de medicina socializada ou,

    simplesmente, nada fazer a respeito. Dentre as alternativas disponveis, algumas podem ser

    priorizadas e outras no (KINGDON, 2006a).

    O jogo poltico e o processo de deciso variam conforme a natureza, magnitude e

    impacto do problema ou do pblico-alvo que ser beneficiado por bens pblicos (SIMEON,

    1975). As dimenses e as causas cientficas dos problemas ambientais so difceis de serem

  • 36

    identificadas e seus impactos econmicos e sociais so vagos (LE PRESTRE, 2005). As

    informaes que podem indicar algo de errado muitas vezes no existem, so ambguas ou

    pouco criteriosas, ou ainda so controladas pela burocracia, que em muitos casos detm o

    monoplio da informao e do segredo10. Nesse tipo de situao, improvvel que algum

    problema ou demanda social altere a agenda das organizaes.

    Arrow (1974) afirma que as decises tomadas pelas organizaes ocorrem em funo

    da informao recebida: quando os indicadores permanecem inalterados, a agenda tende a

    permanecer inalterada. Muitas demandas ou problemas sociais sempre existiram, ou existiram

    por um longo tempo, mas quando ocorrem eventos ou crises econmicas repentinas eles se

    tornam mais evidentes e so incorporados agenda governamental ou organizacional. Por

    outro lado, uma organizao pode no monitorar as suas diferentes reas de produo e assim

    no conseguiria identificar algo de errado. Isso pode acontecer porque, segundo Arrow (1974)

    a informao necessria para a tomada de deciso escassa ou tem um custo elevado. Usando

    como exemplo o controle de qualidade, responsvel pelo monitoramento do processo de uma

    indstria, se a qualidade de um produto testada e seus resultados so satisfatrios, nada

    alterado. Caso o resultado seja negativo, a mesma indstria investigaria o que estaria

    prejudicando a produo, com a possibilidade de reparar ou substituir o equipamento. O

    afundamento do Titanic levou patrulha dos icebergs (ARROW, 1974, p. 52, traduo

    nossa).

    A tomada de deciso vista como a etapa que sucede a elaborao de alternativas ou

    de solues, representando [...] o momento em que os interesses dos atores so equacionados

    e as intenes (objetivos e mtodos) de enfrentamento de um problema pblico so

    explicitadas (SECCHI, 2013, p. 51). Entender as influncias sobre os tomadores de deciso

    (decision-makers) (KINGDON, 2006a, p. 219) um foco relevante para Simeon (1976).

    Segundo o autor, a nfase dos estudos sobre polticas pblicas deve ser em analisar as

    influncias que levam s alternativas escolhidas e os tipos de aes tomadas pelos decision-

    makers. H um largo universo de possibilidades de problemas ou questes com os quais os

    decision-makers devem ter ateno e consider-los como relevantes. No entanto, o que se

    identifica na prtica que apenas um pequeno conjunto de problemas e, similarmente, de

    alternativas, so realmente escolhidos e a poltica raramente gera qualquer alterao

    10 Contemplando as reas de Filosofia Poltica, Cincia Poltica e Economia Poltica, o poder da informao

    (gerao, controle ou omisso) e do segredo so tratados por Bobbio (2003) e Motta (2000), a partir da

    compreenso e anlise sobre as formas de poder (poltico, econmico, cientfico e ideolgico), controle e

    dominao exercidos pela burocracia, incluindo o prprio Estado, rgos do Poder Executivo, grandes

    organizaes capitalistas, sindicatos e partidos polticos.

  • 37

    considervel entre um governo e outro. O xito ou fracasso do processo de implementao de

    uma poltica pblica ser uma consequncia do escopo e abrangncia da agenda

    governamental e dos interesses que podem limitar a escolha das alternativas (SIMEON,

    1976).

    As pesquisas sobre polticas pblicas tendem a incorporar os estudos sobre

    implementao nos diferentes estgios do processo poltico, como a formao de agenda,

    formulao da poltica, planejamento da poltica (policy design), implementao, avaliao e

    mudana poltica (WINTER, 2003). A prxima seo discute a fase da implementao e sua

    relao com esses estgios do processo poltico.

    2.2 A IMPLEMENTAO DE POLTICAS PBLICAS: ENTRE OS

    OBJETIVOS E A AVALIAO DE RESULTADOS

    O estudo do processo de implementao considerado por Hill e Hupe (2002) como

    uma sub-disciplina da cincia poltica e da administrao pblica, diferente de Winter (2003)

    que o considera como parte de duas sub-disciplinas da cincia poltica: poltica

    pblica/anlise poltica e administrao pblica. Os estudos sobre implementao tendem a

    ser direcionados para questes bsicas das anlises polticas: quais so o contedo, causas e

    consequncias das polticas