UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ENGENHARIA … · importante na evolução das plantas que...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE ENGENHARIA DE LORENA
Mônica Pinheiro da Silva
Estudo da constituição da parede celular de algas com enfoque na biossíntese
de lignina
Lorena
2016
Mônica Pinheiro da Silva
Estudo da constituição da parede celular de algas com enfoque na biossíntese
de lignina
Lorena
2016
Monografia apresentada à Escola de
Engenharia de Lorenada
Universidadede São Paulo como
requisito para obtenção do título de
Engenheira Bioquímica.
Orientador: ElissonAntonio da Costa
Romanel
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR
QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA,
DESDE QUE CITADA A FONTE
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, a Deus, pelo cuidado com a minha vida e por ter
me sustentado até aqui, sempre provendo tudo, em quaisquer que fossem as
situações.
Aos meus pais, Jair e Iolanda, pelo amor, apoio, incentivo e, por, desde
sempre, acreditarem em mim. Por serem minhas melhores referências na
vida,ensinando-me a ser forte, a ter fé sempre e nunca desistir.
A todos meus amigos, pois sempre estiveram ao meu lado durante essa
trajetória. Principalmente, Israel Martins, pela força, apoio e atenção com que pude
contar desde o primeiro semestre de faculdade.
À Universidade, pela oportunidade de aprendizado, pelas portas que aqui se
abriram.
Ao grupo do laboratório de Genética e Biologia Molecular, por toda ajuda que
sempre tive.
Ao meu orientadorProf. Dr. Elisson Romanel, por toda dedicação, paciência e
incentivo, também, por todo conhecimento que me foi passado durante este
trabalho, bem como, durante a Iniciação Científica.
“Não te mandei eu? Esforça-te, e tem
bom ânimo; não te atemorizes, nem te
espantes; porque o senhor teu Deus
está contigo, por onde quer que
andares.“
(Josué 1:9)
RESUMO
SILVA, M.P. Estudo da constituição da parede celular de algas com enfoque na biossíntese de lignina. 2016. 31p. Monografia (Graduaçãoem Engenharia Bioquímica) – Escola de Engenharia de Lorena,Universidade de São Paulo, Lorena, 2016.
Esse trabalho visa estudar a constituição da parede celular de algas,
principalmente a biossíntese de compostos fenólicos, como lignina ou ainda
lignanas, os quais estão presentes em algumas espécies de algas.
As análises filogenéticas dos genes envolvidos na via de biossíntese de
lignina entre angiospermase algas evidenciarama existência de transferência
horizontal e convergência estrutural da sequências dos genes estudados.Estas
análises revelaram que o surgimento da via de biossíntese de lignina é anterior às
plantas terrestres, uma vez que os alcoóis p-cumarílico, coniferílico e sinapílico,
estão presentes na alga vermelha Calliarthroncheilosporioides
Palavras-chave: Algas.Calliarthron cheilosporioides. Lignina.
ABSTRACT
SILVA, M.P.Study of the algae cell wall constitution focusing on lignin biosynthesis.2016. 31p. Monograph (Graduation Biochemical Engineer) – Escola de Engenharia de Lorena,Universidade de São Paulo, Lorena, 2016.
This paper intend to study the algae cell wall constitution,mainly the
biosynthesis of phenolic compounds, as lignin or yet lignans, which are present in
some species of algae.
The Phylogenetic analysis of genes involved in angiosperms between lignin
biosynthetic pathway and algae showed the existence of horizontal transfer and
structural convergence of sequences of the genes studied. These analyzes revealed
that the appearance of the lignin biosynthetic pathway is earlier to terrestrial plants.
Keywords: Algae.Calliarthron cheilosporioides.Lignin.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Representação dos eventos-chave que ocorreram durante a evolução das
plantas ...................................................................................................................... 16
Figura 2: Representação das camadas da parede celular........................................ 19
Figura 3: Estrutura da celulose ................................................................................. 19
Figura 4: Estrutura dos monossacarídeos ................................................................ 20
Figura 5: Unidades de fenilpropano precursores da lignina ...................................... 21
Figura 6: Desidrogenação enzimática do álcool coniferílico para a formação de
radicais fenólicos ...................................................................................................... 22
Figura 7: A lignina é polimerizada à partir dos três ácidos hidroxicinâmicos ............ 22
Figura 8: Via da biossíntese dos monolignois ........................................................... 24
Figura 9: Estruturas de Lignanas, Neolignanas ........................................................ 27
Figura 10: Via Biossintética dos Monolignois por diferentes espécies ...................... 28
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 13
2. IMPORTÂNCIA ECONÔMICA E APLICAÇÕES BIOTECNOLÓGICAS DA LIGNINA ............ 15
2.1. EVOLUÇÃO, SISTEMÁTICA DAS PLANTAS E FENILPROPANÓIDES .............................................................. 15
2.2. ESTRUTURA, COMPOSIÇÃO E GENÉTICA DA BIOSSÍNTESE DE LIGNINA EM PLANTAS SUPERIORES ......... 17
2.2.1. Parede celular em plantas terrestres .............................................................................................. 17
2.2.1.1. Celulose e Hemicelulose .............................................................................................................. 19
2.2.1.2. Lignina ............................................................................................................................................ 21
2.3. BIOSSÍNTESE DA LIGNINA ......................................................................................................................... 23
3. ESTRUTURA, COMPOSIÇÃO E GENÉTICA DA BIOSSÍNTESE DA LIGNINA EM ALGAS . 25
3.1. A PAREDE CELULAR EM ALGAS ................................................................................................................. 25
3.2. A ALGA VERMELHA CALLIARTHRON CHEILOSPORIOIDES ......................................................................... 25
3.3. LIGNINA E LIGNANA................................................................................................................................... 26
3.4. BIOSSÍNTESE DE LIGNINA EM ALGAS ........................................................................................................ 27
4. CONCLUSÃO ....................................................................................................................................... 29
REFERÊNCIAS .................................................................................................................................................. 30
13
1. Introdução
As plantas terrestres e algas, espécies filogeneticamente distantes que
evoluíram há cerca de 475 milhões de anos a partir de um ancestral comum, são
constituídas de paredes celulares compostas de carboidratos (celulose e
hemicelulose) e lignina. As paredes celulares lignificadas são consideradas como
principais inovações na evolução das plantas terrestres a partir de ancestrais
aquáticos ao longo de aproximadamente 475 milhões de anos (MARTONE et al.,
2009).A presença de lignina na parece celular não está restrita às plantas terrestres,
sendo encontrada em algumas espécies de algas, como na alga vermelha
Calliarthron cheilosporioides (Corallinales, Rhodophyta) (MARTONE et al., 2009).
A lignina é formada quando se tem uma reação de polimerização radicalar
partindo dos alcoóis p-cumarílico, coniferílico e sinapílico. Há uma enorme variação
em sua composição, uma vez que, após a abstração de um próton e um elétron por
ação enzimática, o radical formado vai sofrer acoplamento de um segundo
monolignol. O acoplamento posterior ocorrerá de forma aleatória devido ao efeito de
ressonância molecular. Desta forma, os monolignóis não formam um padrão, pois há
a formação de diversos tipos de ligações entre suas estruturas como pode ser visto
na Figura 6 (FENGEL; WEGENER, 1989).
Devido ao crescente interesse industrial na utilização dos componentes da
parede celular, houve um aumento no número de plantas e algas cujas paredes
celulares estão sendo estudadas em diversas áreas do conhecimento, como na
química, bioquímica e genética (POPPER; RALET; DOMOZYCH, 2014).
A composição da parede celular de algas possui uma considerável
diversidade em sua estrutura e composição química. O fato da alga vermelhaC.
cheilosporioides ser capaz de produzir lignina, e esta espécie compartilhar um
ancestral comum com plantas vasculares há mais de 1 bilhão de anos na evolução,
não implica que a lignina seja, de fato, verdadeira, pois ser idêntica estruturalmente,
não é suficiente, é necessário confirmar que sua via biossintética seja a mesma
(POPPER et al., 2011).
14
A ocorrência de lignificação em algas vermelhas e briófitas sugere que os
genes necessários para a biossíntese e deposição de lignina tenham evoluído de um
ancestral comum antes da divergência das linhagens específicas, e posteriormente
perderam-se em algumas linhagens, como em algas verdes e musgos.
Alternativamente, as algas vermelhas podem ter evoluído, de forma independente, a
sua via de biossíntese de lignina(XU LI; CHAPPLE, 2010).
Além disso, os componentes da parede celular, um tema ativo de pesquisa,
tem aplicações biotecnológicas, tais como na indústria de alimentos, produção
decombustível, produtos farmacêuticos, fibras que podem ser usadas para produtos
têxteis e de papel, materiais de construção (POPPER et al., 2011).
O objetivo das indústrias que realizam processos de polpação é a extração e
obtenção da celulose. No entanto, a lignina que é utilizada como fonte de energia
para a própria indústria a partir de sua queima, também pode ser usada a partir da
sua estrutura aromática para produzir uma variedade de produtos químicos com
maior valor agregado (VANDERGHEM, 2011).
Atualmente, alignina tem sido usada como matéria-prima em diferentes tipos
de processos industriais e sua crescente aplicação na indústria é devido à suaalta
versatilidade. Por exemplo, na produção de compósitos avançados, fibras de
carbono e nanomateriais.Dentro deste contexto, destaca-se também, o uso recente
desse polímero como adsorventes, floculantes, adesivos, entre outros. A ampliação
de sua aplicabilidade em diferentes processos passou a oferecer benefícios
econômicos e ambientais(TEN; VERMERRIS, 2015).
15
2. Importância econômica e aplicações biotecnológicas da lignina
A lignina é um polímero aromático presente em 15% a 30% na parede celular
de plantas,desempenhando um importante papel na sobrevivência das plantas,
facilitando o transporte de água, aumentando a rigidez e agindo na defesa contra
patógenos. Todavia, asindústrias que utilizam biomassa para a produção de
biocombustíveis possuem maior interesse nos polissacarídeos presentes na parede
celular, tal como a celulose. Logo, a lignina é obtida em larga escala como co-
produto, sendoqueimada para gerar energia ou ainda em outros processos gerando
produtos de baixo valor agregado no caso quando o destino é a queima, ou ainda
produtos que possuem maior valor no mercado (TEN; VERMERRIS, 2015).
Porém, tem-se visto que a lignina é muito versátil devido às suas
características químicas que conferem propriedades de interesse industrial em
diversos setores. A aplicabilidade da ligninagerabenefícios tanto econômicos, quanto
ambientais. Essas aplicações são possíveis após a purificação da lignina que foi
gerada durante o processo Kraft, que ocorre por meio de um processo denominado
“LignoBoostprocess” tornando a lignina uma matéria-prima para eventuais processos
posteriores(TEN; VERMERRIS, 2015).
2.1. Evolução, sistemática das plantas e fenilpropanóides
As plantas terrestres (embriófitas), possivelmente, evoluíram a partir de algas
presentes em água docerelacionadas com o grupo existente das
CharophytaCharales ou Coleochaetales. Plantas terrestres e Carófitas formam um
grupo denominado Streptophytes, oqual é o grupo maispróximo das algas verdes
denominadas clorofíceas (Figura 1) (PIRES; DOLAN, 2012).
16
Figura 1 - Representação dos eventos-chave que ocorreram durante a
evolução das plantas
(PIRES; DOLAN, 2012)
Ao longo da evolução foi possível a conquista do ambiente terrestre, onde tais
plantas desenvolveram uma série de características que as possibilitaram se adaptar
ao meio terrestre. Desenvolveu-se um sistema de fixação ao substrato terrestre,
caule para a sustentação do corpo vegetal, tecidos condutores (xilema e floema)
para levar substâncias nutritivas e água para toda a planta, e também o surgimento
de uma cutícula que evita a perda excessiva de água para o ambiente, entre outras
características que tornaram possível a adaptação ao meio terrestre
(RAVEN;EVERT; EICHHORN, 2007).
A comparação genômica entre algas unicelulares, musgos e angiospermas
mostra que as alterações genômicas ocorreram concomitantes com a adaptação ao
meio terrestre, incluindo uma maior complexidade dentro das famílias de genes,
como também a perda de alguns genes associados ao ambiente
aquático(RENSING; LANG; ZIMME, 2009).
Da mesma forma, ocorreu aquisição de genes que conferiram a capacidade
de tolerar situações típicas do ambiente terrestre, tais como, perda de água para o
17
meio, maior variação de temperatura, entre outras situações adversas (RENSING;
LANG; ZIMME, 2009).
O desenvolvimento de diferentes vias metabólicas secundárias foi uma parte
importante na evolução das plantas que estavam se adaptando ao meio terrestre.
Dentre elas, destaca-se via dos fenilpropanóides, a qual fornece compostos
essenciais, tais como a lignina e flavonóides.
Considera-se que o surgimento das plantas terrestres tenha sido um
acontecimento chave na história da evolução do planeta, uma vez que, a partir
desse evento houve a evolução dos ecossistemas terrestres. Possivelmente, a via
fenilpropanóide levou um tempo para ser elaborada pelas plantas e apresentou uma
vantagem seletiva, o que consistiu em manter o gene que codifica a enzima PAL, o
qual teria sido transferido horizontalmente e então, permanecido nas plantas
superiores(EMILIANI et al., 2009).
O estudo em genômica comparativa, baseado nos genomas disponíveis de
plantas, indica que a via completa de lignina, com exceção para a enzima F5H,
apareceu primeiro em fungos, mas está ausente em algas verdes(VANHOLME et al.,
2010).
A descoberta de parede celular secundária em algas vermelhas
(Calliarthron cheilosporioides), bem como a presença de lignina, levanta questões
sobre a convergência,entre algas vermelhas e plantas vasculares(MARTONE et al.,
2009).
2.2. Estrutura, composição e genética da biossíntese de lignina
em plantas superiores
2.2.1. Parede celular em plantas terrestres
A parede celular de plantas terrestres é composta por um arranjo de
compostos químicos, a maneira como estes compostos estão distribuídos podem
variar bastante entre espécies. Os principais constituintes são: celulose,
hemicelulose e lignina.
18
Tabela 1: Características dos compostos da parede celular
(FENGEL; WEGENER, 1989)
Sendo a parede celular composta por diferentes camadas, a camada primária
formada durante a divisão celular e uma segunda camada é depositada após a fase
de alongamento celular se completar. Há uma área rica em lignina, denominada
lamela média, que pode ser identificada por microscopia convencional.
Na parede primária (P) as fibrilas de celulose estão arranjadas em finas
camadas que se cruzam, adquirindo um aspecto de rede. A parede primária é a
primeira camada depositada durante o crescimento da célula, a quantidade de
celulose é muito limitada e contém, também em sua estrutura, polioses
(hemiceluloses), pectina e proteína imersos em uma matriz de lignina(FENGEL; e
WEGENER, 1989).
A parede secundária é considerada a camada mais espessa da parede da
célula, sendo depositada após a parede primária. Morfologicamente as camadas S1
e S3 não são consideradas constituintes da parede secundária, mas sim, unidades
morfológicas separadas. Pode-se encontrar a S1 definida como camada de
transição e a camada S3 como parede terciária (FENGEL; WEGENER, 1989).
Na Figura 2, pode-se observar a lamela média (ML), onde ocorre maior
acúmulo da lignina e as paredes: Primária (P), Secundária (S1, S2) e Terciária (T, ou
ainda S3).
19
Figura 2: Representação das camadas da parede celular
(FENGEL; WEGENER, 1989)
Quanto ao processo bioquímico de lignificação, este compreende desde a
formação dos monolignóis, álcool p-cumarílico, álcool coniferílico, álcool
sinapílicoaté a polimerização da lignina na parede celular.Os vários tipos de ligninas
diferem em sua estrutura molecular, considerada complexa, pois, há uma grande
variação na sua composição.
2.2.1.1. Celulose e Hemicelulose
A celulose,sendo umhomopolissacarídeo, temsuas unidades de glicose que
estão unidas por ligações glicosídicas β(1→4), entre os grupos hidroxilícos (OH) do
carbono 1 (C1) e do carbono 4 (C4)havendoa eliminação de uma molécula de água,
uma vez que, duas extremidades adjacentes são ligadas como pode serobservado
na figura 2 mostrada a seguir.
Figura 3- Estrutura da celulose
Fonte: Modificada deFengel e Wegener (1989)
20
Embora existam outros grupos hidroxílicos na mesma molécula, esses grupos
que se encontram nas extremidades da cadeia possuem comportamentos
diferenciados. A hidroxila presente no C1 é um aldeído hidratado, oriundo da
formação do anel pela ligação hemiacetal intramolecular, que por sua vez, apresenta
propriedade redutora, diferentemente da hidroxila presente no C4, a qual é uma
hidroxila com caráter alcoólico (FENGEL; WEGENER, 1989).
A hemicelulose é um polissacarídeo, composta por diferentes unidades de
monossacarídeos, por exemplo, pentoses, hexoses, ácidos- hexurônicos e
desoxihexoses. A cadeia principal da hemicelulose pode ser composta porapenas
um tipo de monossacarídeo, um homopolímero, ou por mais tipos, sendo, neste
caso, um heteropolímero(FENGEL; WEGENER, 1989).
Na figura 3, mostrada abaixo, tem-se as estruturas dos monossacarídeos que
podem estar presentes na cadeia de hemicelulose, podendo variar a composição da
cadeia conforme a espécie de planta(HALTRICH et al, 1996).
Figura 4: Estrutura dos monossacarídeos
(FENGEL;WEGENER, 1989)
21
2.2.1.2. Lignina
Lignina é um heteropolímero fenólico, formada por três tipos de monômeros
(monolignois), os alcoóis p-cumarílico, coniferílico e sinapílico, os quais são
sintetizados no citoplasma. Esses monolignois devem ser transportados para que
sejam oxidados e inicie a polimerização para formar a lignina. Para as
angiospermas, a via da biossíntese foi elucidada, e isso tem sido usado para uma
abordagem da engenharia genética, a fim de modificar a lignina presente em
algumas espécies (FENGEL; WEGENER, 1989)
A lignina é uma macromolécula orgânica amorfa, possui uma estrutura
tridimensional, com caráter hidrofóbico e é altamente ramificada. Possui um arranjo
irregular dentre as unidades de fenilpropano, podendo conter grupo hidroxila e/ou
metoxila como substituintes no anel aromático, como é mostrado a seguir na Figura
5 (FENGEL; WEGENER, 1989)
.
Figura 5: Unidades de fenilpropano precursores da lignina
(FENGEL; WEGENER, 1989)
Essas unidades possuem dois tipos de ligações entre si: ligações éter, sendo
as mais comuns as nomeadas β-O-4 e α-O-4, que ocorrem entre o oxigênio da
hidroxila presente no anel aromático, e ligações diretas, sendo elas carbono-carbono
(BOERJAN; RALPH; BAUCHER, 2003)
22
Os diferentes tipos de ligações influenciam a estrutura da molécula, uma vez
que, as ligações tipo éter conferem uma estrutura mais aberta, enquanto que as
ligações carbono-carbono,diminuem a distância entre os monômeros tornando a
lignina mais condensada, e isso altera a reatividade da molécula.
Para a formação da macromolécula de lignina é necessária a primeira etapa
que é a uma desidrogenação enzimática dos álcoois p-hidroxicinâmicos para a
formação de radicais fenoxílicos estabilizados por ressonância, como é ilustrado na
figura abaixo, utilizando o álcool coniferílico como exemplo.
Figura 6: Desidrogenação enzimática do álcool coniferílico para a formação de radicais fenólicos
(FENGEL e WEGENER, 1989)
Então, a lignina é polimerizada principalmente a partir do álcool
hidroxicinâmico, tipicamente, álcool p-cumarílico, coniferílico e sinapílico, uma vez
que radicais dos monômeros são formados, logo são acoplados à molécula, como é
mostrado na Figura 7.
Figura 7: A lignina é polimerizada à partir dos três ácidos hidroxicinâmicos
23
(WENG; CHAPPLE, 2010)
2.3. Biossíntese da Lignina
A biossíntese da lignina começa com a via geral fenilpropanóica que sintetiza
muitos precursores de um grupo diversificado de compostos, incluindo os
flavonóides, cumarinas, quinonas e monolignóis (LABEEUW et al., 2015).
Todo processo bioquímico de lignificação compreende desde a formação dos
monolignóis H, S e G até a polimerização da lignina na parede celular.Os vários
tipos de ligninas diferem em sua estrutura molecular, devido à variação na sua
composição.
A atividade enzimática necessária para a deposição de lignina apareceu
gradualmente por meio do processo de Darwinismo de mutação e seleção. As novas
funções enzimáticas, geralmente, surgem após o evento da duplicação de genes.
Pode-se presumir que as formas primitivas do metabolismo de fenilpropanos tenha
surgido a partir de vias metabólicas que acidentalmente foram montadas pela
evolução utilizando genes duplicados que codificam as enzimas metabólicas
primárias, ou enzimas adquiridas a partir de transferência horizontal de
genes(WENG; CHAPPLE, 2010).
A síntese dos monolignois inicia-se a partir do aminoácido fenilalanina,
ocorrendo sua desaminação para a formação do ácido cinâmico, seguido por ácido–
p-cumárico e p-cumaril-CoA. A partir do p-cumaril-CoA ocorre a síntese do
monolignol do tipo mais simples (H), como pode ser observado na Figura 8
(LABEEUW et al., 2015).
24
Figura 8: Via da biossíntese dos monolignois
(WENG; CHAPPLE, 2010)
Essa via da síntese dos monolignois conta com a atuação de pelo menos 10
enzimas, membros de distintas famílias gênicas caracterizadas pelos seus
respectivos domínios, os quais estão listados na Tabela 2.
Tabela 2: Enzimas presentes na via de biossíntese dos monolignois
Enzimas Domínio
4CL AMP- binding PAL Liase-Aromática C3H-C4H-F5H p450 CAD ADH_N/ADH_zinc_N CCoAOMT Methyltransfer_3 CCR Epimerase COMT Methyltranfer_2/Dimerisation HCT Transferase
25
3. Estrutura, composição e genética da biossíntese da lignina em
algas
3.1. A parede celular em algas
O estudo acerca da biossíntese desse composto não está restrito às plantas
terrestres, uma vez que, recentemente, foi descoberta a presença de lignina ou de
seus precursores em algumas espéciesdealgas(LABEEUW et al., 2015).
A maioria dos eucariotos fotossintéticos, incluindo as plantas terrestres e
algas, tem uma parede celular rica em carboidratos. Em algas, a estrutura da parede
celular é semelhante às das plantas terrestres, possuindo uma variação em sua
composição, dependendo de fatores, como, o estágio de desenvolvimento(POPPER
et al., 2011).
Na alga vermelha Calliarthron cheilosporioides, foram encontrados os três
monômeros de lignina H, S e G. Todavia, em outras espécies de algas, foi
encontrada uma lignina diferenciada, denominada lignina-like(MARTONE et al.,
2009).
Entretanto, há mais de 35.600 espécies de algas marinhas e os componentes
de suas paredes celulares exibem uma enorme diversidade (POPPER; MARIA,
2010).
3.2. A alga vermelha Calliarthron cheilosporioides
Há vários cenários evolutivos que poderiamexplicara ocorrência de lignina em
algas vermelhas eplantas vasculares: (1) a lignina poderia ter evoluído de forma
independenteem ambas as linhagens; (2) os genes que são responsáveis pela
biossíntese da lignina em algas foramcarregadosdurante a evolução das plantas
vasculares;(3) a via da biossíntese da lignina pode ter existido antes da divergência
das embriófitase, posteriormente, perdeu-senasalgasverde; (4) os genes para a
biossíntese da ligninapoderiam ter sido transferidos de um organismopara
outro(POPPER; MARIA, 2010).
Dentro do grupo de plantas vasculares, as ligninas em gimnospermas, por
exemplo,são quase inteiramente compostas de unidades guaiacil. No entanto, a
26
lignina presente na alga vermelhaCalliathron pode conter adicionalmente
unidadessiringil (S) de lignina. A lignina tipoS em angiospermas diverge
aproximadamente400 milhões de anos atrás, e é derivada de diferentesvias
biossintéticas, sugerindo que a unidade S evoluiu em ambos os grupos de plantas
através de evolução convergente(WENG; CHAPPLE, 2010).
Logo, a lignina tipoS em Calliathron poderia representar outroexemplo de
evolução convergente, e a dedução das vias de biossíntese de lignina
naCalliathronpode dar suporte a esta teoria. Por outro lado, se a lignina
foidescoberta em outros grupos de algas, que sepode sugerir que a biossíntese
delignina de plantas terrestres temmais um ancestral em comum(WENG; CHAPPLE,
2010).
3.3. Lignina e Lignana
Os compostos fenólicos têm sido caracterizados com base em seu esqueleto
estrutural, então, classificados, por exemplo, como sendo fenóis simples ou
benzoquinonas, ácidos hidroxicinâmicos, flavonóides, lignanas e ligninas. Os
compostos fenólicos de baixo peso molecular podem ser encontrados em maior
parte em plantas superiores(CHEYNIER et al., 2013).
Lignana e neolignana fazem parte de um grande evariado grupo de
compostos fenólicos, sendo produzidas pela dimerização oxidativa de duas unidades
fenilpropanóides, que ocorrem em uma grande variedade de espécies de plantas,
suas possíveis estruturas podem ser vistas na Figura 9. As lignanas são dímeros de
fenilpropanóides,ligadas principalmente através de suas cadeias laterais do lado do
C3 (CHEYNIER et al., 2013).
27
Figura 9: Estruturas de Lignanas, Neolignanas
(CHEYNIER et al., 2013)
3.4. Biossíntese de lignina em algas
A via de biossíntese da lignina tem sido extensivamente estudada em plantas
vasculares, até então, sendo uma marca distintiva deste grupo. Porém, o estudo das
plantas não vasculares revelou que a evolução da biossíntese da lignina vem a ser
anterior do que a origem das plantas superiores(LABEEUW et al., 2015).
Os recentes relatos da presença de lignina em plantas não vascularese algas
vermelhas levantam questões importantes sobre aevolução da lignina, bem como
sugere a identificação de que há rotas alternativaspara a sua biossíntese (XU LI;
CHAPPLE, 2010).
As primeiras três enzimas (4CL, CCR e CAD) são capazes de catalisar
passos consecutivos na biossíntese da lignina e são suficientes para produzir o
álcool p-cumarílico a partir do ácido cumárico, como mostrado na Figura 8
(LABEEUW et al., 2015).
Embora não se encontre, na maior parte das algas e plantas inferiores, a
primeira enzima, a fenilalanina amônia liase (PAL), há uma única enzima tirosina
amônia liase (TAL) envolvida na síntese do ácido p-cumárico, também encontrada
28
apenas em algumas bactérias. Essa enzimaconverte o aminoácido tirosina para
ácido p-cumárico, como é mostrado na Figura 10.
Figura 10 - Via Biossintética dos Monolignois por diferentes espécies
(LABEEUW et al., 2015)
A via específica de lignina, utiliza p-coumaril-CoA para produzir o monolignóis
mais simples, do tipo (H) através de uma série de reações de redução. Enquanto
que a produção estruturalmente mais complexa dos monolignois G e S requer
enzimas adicionais usando intermediários de síntese de monolignóis H como
substratos, que executam O-metilação e hidroxilação em vários locais no anel
fenólico.
29
4. Conclusão
Neste trabalho foi possível entender o atual cenário da importância industrial
no emprego da lignina, bem como, pode-se analisar possíveis vias de obtenção
desse composto partindo das algas, principalmente da alga vermelha
Calliarthroncheilosporioides. Uma vez que, esta espécie indica ser capaz de produzir
os três tipos de monolignois (H, S e G).
Até então, a lignina era conhecida por ser abundante e com alta recalcitrância
em plantas superiores, mas o estudo de plantas não vasculares e algas tem indicado
a presença de lignina, ou ainda, lignana em sua parede celular.Embora a via de
biossíntese de lignina, ou ainda dos monolignois, não tenha sido elucidada
completamente nas algas, mostram-se também evidências de que o surgimento da
lignina é anterior às plantas terrestres.
30
Referências
BOERJAN, W.; RALPH, J.; BAUCHER, M. LIGNIN BIOSYNTHESIS.Plant Biol,
2003.
CHEYNIER, V. et al. Plant Physiology and Biochemistry Plant phenolics : recent
advances on their biosynthesis , genetics , and ecophysiology. Plant Physiology et
Biochemistry, v. 72, p. 1–20, 2013.
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