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ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DA PRODUÇÃO EM PROCESSOS DE UMA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA TRABALHO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO ANA CLAUDIA MOUTTE DE LIMA Orientador: Wilson Kendy Tachibana São Carlos, 10 de novembro de 2010.

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ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DA PRODUÇÃO EM PROCESSOS DE UMA INSTITUIÇÃO

FINANCEIRA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO

ANA CLAUDIA MOUTTE DE LIMA

Orientador: Wilson Kendy Tachibana

São Carlos, 10 de novembro de 2010.

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ANA CLAUDIA MOUTTE DE LIMA

O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DA PRODUÇÃO EM PROCESSOS DE UMA INSTITUIÇÃO

FINANCEIRA

Trabalho de conclusão de curso, apresentado como parte das atividades, para obtenção do título de bacharel em Engenharia de Produção Mecânica da Escola de Engenharia de São Carlos – UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO.

Profº Orientador:

Wilson Kendy Tachibana

São Carlos, 2010

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LIMA, Ana Claudia Moutte de

O processo de negociação: uma ferramenta de gestão da produção em processos de uma

instituição financeira

Trabalho de conclusão de curso, apresentado como parte das atividades, para obtenção do título de bacharel em Engenharia de Produção Mecânica da Escola de Engenharia de São Carlos – UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO.

Aprovado em:

Banca Examinadora:

__________________________ Prof. Wilson Kendy Tachibana Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo

__________________________ Prof. Marcel Andreotti Musetti Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo

__________________________ Doutoranda: Catarina B. Careta Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo

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RESUMO

Esse texto propõe-se a ressaltar a importância crescente que o tema negociação vem

assumindo nos dias de hoje e mostrar como o conhecimento e a utilização dos estilos de

negociação e dos diferentes perfis de negociadores podem auxiliar no encaminhamento e na

resolução de conflitos. No passado a negociação era ganha-perde, visava atender apenas as

suas próprias necessidades. Hoje, a negociação ganha-ganha é a busca de um relacionamento

duradouro, que leva a novas negociações no futuro e que mantenha, ou melhore, o contato

entre as partes envolvidas. Esse estudo foi realizado em uma instituição financeira, onde

foram coletados dados e analisados com um comparativo com o método teórico de

negociação do Projeto de Negociação de Harvard. Tal projeto diz que o problema da

negociação está na barganha pelas posições, a alternativa que ele propõe é o método da

negociação dos méritos. O principal resultado foi a dificuldade encontrada em aplicar esse

método na prática dessa instituição.

Palavras-chave: negociações, negociação ganha-ganha, Projeto de Negociação de Harvard

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SUMÁRIO

1.INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 1

1.1.RELEVÂNCIA DO TEMA PROPOSTO ......................................................................... 1

1.2.DEFINIÇÃO DO PROBLEMA ....................................................................................... 4

1.3.OBJETIVOS .................................................................................................................... 4

1.3.1.Objetivo Geral ............................................................................................................... 4

1.3.2.Objetivos Específicos .................................................................................................... 4

2. METODOLOGIA DE PESQUISA ..................................................................................... 5

2.1. MÉTODO DE ABORDAGEM ....................................................................................... 5

2.2. MÉTODO DO PROCEDIMENTO ................................................................................. 6

3. NEGOCIAÇÃO ................................................................................................................. 8

3.1. CONCEITOS .................................................................................................................. 8

3.1.1. Negociação voltada exclusivamente para obter vantagem ............................................ 8

3.1.2. O uso da informação e do poder ................................................................................... 8

3.1.3. Importância da comunicação ........................................................................................ 8

3.1.4. Busca do acordo ........................................................................................................... 9

3.1.5. Negociação como instrumento de satisfação das necessidades ...................................... 9

3.1.6. Negociação e relacionamento humano .......................................................................... 9

3.1.7. Busca de interesses comuns .......................................................................................... 9

3.1.8. Todos negociamos sempre .......................................................................................... 10

3.1.9. Uso da barganha no processo de negociação ............................................................... 10

3.2. PROJETO DE NEGOCIAÇÃO DE HARVARD .......................................................... 11

3.2.1. Separe as pessoas do problema ................................................................................... 12

3.2.1.1. Os negociadores são pessoas ................................................................................... 12

3.2.1.2. Todo negociador tem dois tipos de interesse: substância e relação ........................... 12

3.2.1.3. A reação tende a confundir-se com o problema ........................................................ 12

3.2.1.4. A barganha posicional põe o relacionamento e a substância em conflito .................. 13

3.2.1.5. Separe a relação da substância ................................................................................. 13

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3.2.1.6. Percepção ................................................................................................................ 13

3.2.1.7. Ponha-se no lugar do outro ...................................................................................... 14

3.2.1.8. Não deduza as intenções do outro a partir de seus próprios medos ........................... 14

3.2.1.9. Não culpe o outro por seu problema ........................................................................ 15

3.2.1.10. Discuta as percepções de cada um ......................................................................... 15

3.2.1.11. Certificando-se de que o outro lado tenha interesse no resultado ............................ 15

3.2.1.12. Torne suas propostas compatíveis com os valores dos outrosa ............................... 16

3.2.1.13. Emoção ................................................................................................................. 16

3.2.1.14. Reconheça e compreenda as emoções .................................................................... 16

3.2.1.15. Explicite as emoções e reconheça-lhes a legitimidade ............................................ 16

3.2.1.16. Deixe que o outro lado desabafe ............................................................................ 17

3.2.1.17. Não reaja às explosões emocionais ........................................................................ 17

3.2.1.18. Use gestos simbólicos ............................................................................................ 17

3.2.1.19. Comunicação ......................................................................................................... 17

3.2.2. Concentre-se nos interesses, não nas posições ............................................................ 20

3.2.2.1. Os interesses definem o problema ............................................................................ 20

3.2.2.2. Valorize seus interesses ........................................................................................... 21

3.2.2.3. Reconheça os interesses dos outros .......................................................................... 22

3.2.2.4. Olhe para frente e seja flexível ................................................................................ 22

3.2.2.5. Seja rigoroso com o problema e não com as pessoas ................................................ 22

3.2.3. Invente opções de ganhos mútuos ............................................................................... 22

3.2.3.1. Separe as alternativas das decisões .......................................................................... 23

3.2.3.2. Amplie suas opções ................................................................................................. 23

3.2.3.3. Observe através dos olhos de diferentes especialistas ............................................... 24

3.2.3.4. Invente acordos de alcance e pesos diferentes .......................................................... 24

3.2.3.5. Procure ganhos mútuos ............................................................................................ 24

3.2.3.6. Harmonize os interesses diferentes .......................................................................... 25

3.2.3.7. Indague sobre as preferências dos outros ................................................................. 25

3.2.3.8. Facilite a decisão do outro ....................................................................................... 25

3.2.4. Critérios Objetivos ..................................................................................................... 25

3.2.4.1. Elabore critérios objetivos ....................................................................................... 26

3.2.4.2. A negociação com critérios objetivos....................................................................... 26

3.2.4.3. Táticas traiçoeiras .................................................................................................... 27

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3.2.4.4. Fraude deliberada .................................................................................................... 27

3.2.4.5. Táticas de pressão posicional ................................................................................... 27

3.3. COMUNICAÇÃO ........................................................................................................ 28

3.4. FATORES QUE INFLUEM A NEGOCIAÇÃO ........................................................... 29

3.4.1. Poderes Pessoais ........................................................................................................ 30

3.4.2. Poderes circunstanciais ............................................................................................... 31

3.4.3. Tempo ........................................................................................................................ 34

3.4.4. Informação ................................................................................................................. 35

3.5. PRINCÍPIOS DO GANHA-GANHA ............................................................................ 35

3.6. ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES ..................................................................................... 37

3.6.1. Critérios para a tomada de decisões éticas .................................................................. 39

3.6.2. Fatores que afetam as decisões éticas ......................................................................... 39

3.6.2.1. Características Demográficas ................................................................................... 39

3.6.2.2. Fatores Situacionais ................................................................................................. 40

4. ESTUDO DE CASO ........................................................................................................ 41

4.1. A EMPRESA ............................................................................................................... 41

4.2. LEVANTAMENTOS DE DADOS ............................................................................... 41

4.3. A NEGOCIAÇÃO ........................................................................................................ 44

4.4. IDENTIFICAÇÃO DE PROBLEMAS .......................................................................... 45

4.5. ENTREVISTA .............................................................................................................. 47

4.6. CONFLITO DE INTERESSES ..................................................................................... 49

4.7. ANÁLISE DOS DADOS .............................................................................................. 50

4.7.1. Pessoas ....................................................................................................................... 50

4.7.2. Interesses ................................................................................................................... 50

4.7.3. Opções ....................................................................................................................... 51

4.7.4. Critérios ..................................................................................................................... 51

4.8. ÉTICA .......................................................................................................................... 52

5. CONCLUSÕES ............................................................................................................... 53

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 55

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1. INTRODUÇÃO

1.1. RELEVÂNCIA DO TEMA PROPOSTO

As pessoas negociam o tempo todo. Amigos negociam para decidir onde jantar. Crianças

negociam para decidir a que programa de televisão assistir. Empresas negociam a compra e

venda de seus produtos. Advogados negociam acordos sobre processos legais. Nações

negociam para abrir suas fronteiras ao livre comercio. A negociação não é um processo

reservado apenas ao diplomata habilidoso, ao melhor vencedor ou a um ótimo advogado: é

algo que todos fazem, quase diariamente. Embora os interesses não sejam tão importantes

quanto acordos de paz ou fusões de grandes empresas, todos negociam. A estrutura e o

processo de negociação são fundamentalmente os mesmos tanto em nível pessoal quanto em

termos diplomáticos e corporativos.

A necessidade de se tratar condições contratuais, compatibilizar fases de empreendimentos,

assegurar prazos de entrega, garantir níveis e padrões de qualidade, assim como tantas outras

variáveis, tem feito com que o perfil dos técnicos, engenheiros e arquitetos responsáveis por

tais empreendimentos venha se modificando drástica e rapidamente.

As observações e artigos recentes indicam características como liderança, comunicação,

fluência, e negociação sendo de capital importância na composição do perfil profissional.

Com a modernização das relações de trabalho entre profissionais e empresas, bem como

devido à crescente complexidade dos projetos que exigem cada vez mais a participação de

diversos profissionais especializados, a negociação se tornou, entre todas, uma habilidade

mais crítica e desejada dos administradores e executivos destes projetos.

O bom negociador não é aquele que "arrasa" o oponente, derrota, supera, impõe a sua posição,

mas aquele que consegue vencer junto com o outro lado, tirar o máximo de proveito da

negociação sem esquecer-se de preservar o relacionamento, ou até mesmo acrescentar mais

confiança neste relacionamento, aumentando a disposição das partes para negociações futuras.

O estilo “durão” na negociação pode ter seus aspectos positivos, mas sem dúvidas estes

estarão ligados a resultados no curto prazo. A objetividade e a determinação na obtenção dos

resultados são características muito desejáveis e normalmente estão presentes no estilo durão.

Por outro lado o estilo “bonzinho”, que à primeira vista aparenta debilidade, insegurança e

fraqueza, em médio prazo adquire força extraordinária ao desenvolver relacionamentos de

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confiança entre as partes permitindo negociações cada vez mais significativas para o conjunto

como um todo.

Assim fica o dilema: qual estilo é o melhor? A maioria das vezes que esta questão tem sido

colocada nos cursos de negociação as respostas vêm precedidas de um "depende". Depende

das circunstâncias, depende do que se negocia, depende da importância e das conseqüências

de cada negociação, e assim por diante. Se para cada situação deveríamos adotar um estilo

diferente, então estaríamos diante de um problema com infinitas soluções, e sem uma

orientação mais genérica que nos permitisse aprender negociação.

Na verdade deve-se adotar uma postura que incorpore as vantagens de cada um dos estilos, ou

seja, ser duro com os problemas e suave com as pessoas. Esta postura consiste em enxergar

negociação sob um novo prisma, um novo paradigma.

O que as partes colocam logo no início de uma negociação normalmente é a sua posição e não

seu real interesse. O interesse é o que as pessoas querem, o que elas realmente precisam, ou o

que elas temem, o que realmente desejam evitar. A posição apresentada é a fachada, o

interesse real está sempre um pouco mais para dentro, e precisa ser descoberto, entendido e

mesmo sentido, sob pena de se perder totalmente o sentido da negociação.

Nos projetos de engenharia, por exemplo, as especificações consistem em posições bem claras

a serem atendidas pelas partes, e os interesses reais normalmente estão por traz dos números,

limites e condições estabelecidas, e não são na maioria das vezes tão claros assim. Quando se

especifica a espessura de uma camada de tinta, isto é apenas a posição, o interesse real é, por

exemplo, proteção ou durabilidade. Quando se especifica o consumo mínimo de cimento em

determinado traço de concreto isto é mais uma vez apenas a posição, o interesse real será

durabilidade ou resistência a algum meio especialmente agressivo.

Negociar com base nas posições, inevitavelmente não explora todo o potencial do negócio,

deixa de considerar aspectos importantes, tanto da outra parte como até mesmo dos próprios

interesses, uma vez que se está focado na fachada e não no centro das questões. Desta maneira

o resultado final consistirá em forçar as pessoas a aceitarem algo que na melhor das hipóteses

atende parcialmente os interesses, ou seja, está-se sendo “duro” com as pessoas e “bonzinho”

com os problemas. Exatamente o contrário do que se procura.

Qualquer tipo de negociação pode ser julgado por três critérios: deve produzir um acordo

sensato; deve ser eficiente; deve aprimorar, ou não interferir e prejudicar o acordo entre as

partes. O que se pode chamar de acordo sensato seria um acordo em que atende aos interesses

de ambas as partes na medida do possível, resolve os interesses, tem um longo período de

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duração e leva em conta os interesses da comunidade envolvida. Quando é tomada posição

numa negociação pode se chegar a acordos aceitáveis, mas pode-se chegar a esses fins de

outras maneiras. A barganha posicional não preenche os critérios básicos de produzir um

acordo prudente, de maneira eficiente e amistosa.

À medida que se presta maior atenção às posições, menor atenção fica voltada ao atendimento

dos interesses das partes. Dessa maneira o acordo torna-se menos provável. Qualquer acordo

obtido pode refletir uma divisão mecânica da diferença entre as posições finais, em vez de

uma solução cuidadosamente elaborada para atender aos interesses legítimos das partes. O

resultado é, com freqüência, um acordo menos satisfatório do que poderiam ter sido para

ambos os lados.

Como se trata de relação entre pessoas, ter posições opostas pode gerar desavenças. Cada um

dos lados tenta, através da mera força de vontade, forçar o outro a alterar a sua posição,

gerando, freqüentemente, raiva e ressentimento. A tarefa de ter uma resposta aceitável tende a

transformar-se numa batalha, onde ambos querem as suas vontades satisfeitas. Por esses

motivos o resultado de muitas negociações destrói o relacionamento existente entre as partes.

E alguns desses relacionamentos são afetados para sempre.

A dificuldade de negociação aumenta junto com o número de pessoas envolvidas em uma

barganha. Se duas pessoas em uma negociação já tomam partidos opostos, mais pessoas

tornam mais graves os inconvenientes da barganha posicional. Quando ocorre esse tipo de

negociação com mais pessoas, a barganha posicional fica de certa maneira impossível. Tendo

muitas pessoas num grupo é mais difícil chegar a um acordo comum. E quando definem um

acordo comum, torna-se praticamente impossível a mudança posterior. As concessões

recíprocas são mais difíceis, pois o número de apoiadores de uma opinião pode ser maior do

que de outra e assim podem querer ceder menos, ocasionando mais conflitos.

Por reconhecem os problemas elevados de se fazer uma barganha com rígidas posições,

muitos adotam o estilo gentil de negociação. Ao contrário de ver o negociador como

“inimigo”, que tem pretensões diferentes, vê o outro negociador como um “amigo”. E ao

invés de terem o objetivo da vitória, priorizam a necessidade de se chegar a um acordo. Essa

maneira de negociar é vista como afável. Além do estilo afável de negociação há o áspero,

que vê os participantes como adversários e não é flexível com o resultado da barganha, quer

sempre a vitória. De maneira mais curta e objetiva, afável é flexível e concessor, e áspero é

rígido e inflexível. Em uma negociação com pessoas de cada um dos estilos, a negociação fica

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tendenciosa, favorecendo o que joga duro, o áspero. Produzindo assim um acordo, mas talvez

não sendo o mais sensato.

1.2. DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

Existem diferentes métodos que colaboram para que as negociações aconteçam da melhor

forma. O método de negociação ganha-ganha é citado na maioria das vezes que se estuda

negociação, pois o objetivo do estudo é obter sempre um resultado favorável para todos, na

medida do possível, em cada situação onde existe conflito de interesses. Porém, ao lidar-se

com negociações no dia a dia percebe-se que não é tão simples chegar a um acordo bom para

ambos os lados. Com todos os métodos que existem, funcionários treinados, ainda assim o

interesse individual prevalece. Assim, o problema básico desse trabalho é verificar como o

processo de negociação, em uma instituição financeira fica próxima do método ganha-ganha.

1.3. OBJETIVOS

1.3.1. Objetivo Geral

o Analisar processos de negociações e identificar onde a teoria encontra dificuldades

na prática.

1.3.2. Objetivos Específicos

o Estudar métodos de negociações e fatores que influenciam nelas

o Analisar as negociações de uma área de negociações de um banco e identificar as

dificuldades desses processos através de um estudo de caso

o Identificar o confronto entre teoria e prática e identificar a razão disso

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2. METODOLOGIA DE PESQUISA

2.1. MÉTODO DE ABORDAGEM

Neste estudo, o método de abordagem que foi utilizado é o qualitativo. De acordo com

Minayo (2000, p.21), a pesquisa qualitativa trabalha com “um espaço mais profundo das

relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de

variáveis”.

O método qualitativo oferece uma perspectiva integrada dos fenômenos, que podem ser mais

bem compreendidos no contexto em que ocorrem e do qual fazem parte, levando ao

entendimento da dinâmica de suas relações (GODOY, 1995).

Assim, tal método foi escolhido como referência para a elaboração do estudo por oferecer a

possibilidade de um nível maior de detalhe ao descrever os processos que ocorrem durante as

fases de negociações entre uma instituição financeira e seus clientes.

Desse modo acredita-se que a realidade pode ser melhor descrita por meio de um

entendimento mais sistêmico das relações existente entre as variáveis, proporcionando assim

uma maior validade a pesquisa.

Para a classificação da pesquisa, o presente estudo utilizou a classificação de Roesch (1999),

que categoriza uma pesquisa quanto aos fins e quanto aos meios.

Quanto aos fins, esta pesquisa pode ser classificada, num primeiro momento, como

exploratória num segundo momento, como descritiva.

Exploratória porque passou pela etapa de escolha do tópico de investigação, de delimitação do

problema, de definição do objeto e dos objetivos, de construção do marco teórico conceitual e

dos instrumentos de coleta de dados (MINAYO, 1996).

Descritiva porque expõe características de determinada população ou de determinado

fenômeno, do mesmo modo que estabelece correlações entre as variáveis em estudo

(VERGARA, 2000).

Assim, a presente pesquisa pode ser caracterizada como exploratória-descritiva, pois tem

como objetivo descrever um dos processo de negociações que acontecem em um banco como

forma de trazer maior validade a este, além de contribuir para teoria estratégica em geral.

Quanto aos meios, esta pesquisa utilizou a ferramenta do estudo de caso em virtude da

profundidade de análise que este método oferece.

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De acordo com Vergara (2000), um estudo de caso deve estar circunscrito a uma ou poucas

unidades de estudo e tem caráter de profundidade e detalhamento.

Tal método tem sido preferido quando os estudos procuram responder questões “como” e o

“porquê” de certos fenômenos ocorrem, quando há pouca possibilidade de controle sobre os

eventos estudados e/ou quando o foco de interesse é sobre fenômenos atuais, que só poderão

ser analisados dentro de algum contexto da vida real (GODOY, 1995).

Os estudos de caso levam consigo um caráter particular, ou seja, que suas conclusões não se

aplicam necessariamente a outros casos (BRUYNE et al, 1977).

2.2. MÉTODO DO PROCEDIMENTO

O método de procedimento busca responder detalhadamente como será realizada a pesquisa e

quem são os sujeitos da mesma.

Para tanto, aqui serão descritos os processos de escolha e desenvolvimento das técnicas de

coleta de dados, o tratamento e análise dos dados coletados e quem são os sujeitos da

pesquisa.

Sendo que a escolha dos instrumentos e técnicas de coleta de dados deve ser influenciada pelo

tipo de estudo e seus objetivos, buscou-se escolher aquelas que melhor se adaptam ao estudo

de caso.

Dessa forma, Yin (2001) aponta seis fontes de evidências para pesquisas em forma de estudo

de caso: a documentação, os registros em arquivos, a entrevista, a observação direta, a

observação participante e os artefatos físicos.

De acordo com Roesch (1999), os dados de uma pesquisa podem ser divididos em primários e

secundários.

Os primeiros são colhidos diretamente pelo pesquisador, por diferentes métodos de coleta, ao

passo que os do segundo tipo são os dados que não são obtidos diretamente pelo pesquisador,

por exemplo: os arquivos, os bancos de dados e os relatórios. Dessa forma, os métodos de

coleta de dados nesta pesquisa devem ser utilizados de acordo com sua fonte de origem:

(a) Dados primários: Coletados por meio de entrevista semi-estruturada e observação

direta ou livre;

(b) Dados secundários: Coletados por meio da documentação, de registros em arquivos e

bases de dados e da pesquisa bibliográfica.

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Dentre as técnicas de coleta de dados que se pretende utilizar neste estudo, foram utilizados

principalmente os dados secundários, visto que a área possui algumas bases de dados que

poderão ser utilizadas, porém a observação é muito importante, muitas informações só foram

obtidas pela experiência e convivência dentro da área do estudo de caso. Além disso, uma

entrevista foi feita para obter-se informações de outras perspectivas.

Como afirma Triviños (1987) sobre a entrevista semi-estruturada, “o mesmo tempo em que

valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o

informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação."

Para o tratamento dos dados coletados para este estudo, utilizou-se a técnica da análise de

conteúdo. Segundo Bardin (1977, apud MINAYO, 1996), a análise de conteúdo é um

conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando, por procedimentos sistemáticos e

objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, obter indicadores quantitativos ou não,

que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção

destas mensagens.

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3. NEGOCIAÇÃO

3.1. CONCEITOS

3.1.1. Negociação voltada exclusivamente para obter vantagem

“Negociação é um campo de conhecimento e empenho que visa à conquista de pessoas de

quem se deseja alguma coisa” (Cohen, 1980:13)

Essa definição demonstra o desejo de negociar com pessoas visando o interesse de conseguir

algo da outra parte. Nesse caso o objetivo da negociação é obter vantagem. Nota-se a

condução da negociação para um lado que proporcione ao outro prejuízo, obtendo ganhos e

vantagens específicas. Aparentemente, este conceito estaria se encaminhando para uma

negociação “ganha-perde”.

3.1.2. O uso da informação e do poder

“Negociação é o uso da informação e do poder, com o fim de influenciar o

comportamento dentro de uma rede de tensão” (Cohen, 1980:14)

Neste conceito, a informação é um aspecto fundamental no processo de negociação já que

poderá influir decisivamente na direção seguida pela negociação.

Quanto ao poder, este se divide em vários tipos que podem ser utilizados individual ou

simultaneamente, dependendo do momento e do desenrolar da negociação e das pessoas

envolvidas.

3.1.3. Importância da comunicação

“Negociação é um processo de comunicação bilateral, com o objetivo de se chegar a

uma decisão conjunta” (Fisher & Ury, 1994:30)

A comunicação nunca é fácil e, para que a negociação seja bem sucedida, existem algumas

condições que devem ser atendidas: escutar atentamente e registrar o que está sendo dito, falar

para ser entendido (não somente aquilo que pensa, mas certificar-se de que se está fazendo

compreender), falar sobre você e não sobre o outro e falar com objetivo.

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Pela definição de Fisher e Ury (1994), percebe-se outro fator fundamental para o processo de

comunicação, o fato de ela ser bilateral, ou seja, uma negociação ideal deve satisfazer ambos

os lados envolvidos.

3.1.4. Busca do acordo

“Negociação é o processo de comunicação com o propósito de atingir um acordo

agradável sobre diferentes idéias e necessidades” (Acuff, 1993:21)

Pela definição, há uma grande preocupação com a comunicação no processo de negociação,

sendo que a negociação está mais relacionada com a persuasão do que com a utilização do

poder. A negociação visa fazer o outro lado sentir-se bem com o resultado da negociação.

Acuff afirma também que “negociação é uma coleção de comportamentos que envolve

comunicação, vendas, marketing, psicologia, sociologia e resolução de conflito (Acuff, 1993).

Nota-se, portanto, uma nova variável, o comportamento.

3.1.5. Negociação como instrumento de satisfação das necessidades

Acuff afirma que o objetivo principal de uma negociação é o de “ajudar a pessoa a conseguir

o que se pretende”, ou seja, “negociação é vista como um instrumento de satisfação das

necessidades básicas das pessoas.”

3.1.6. Negociação e o relacionamento humano

Nierenberg (1981:3) afirma na primeira edição do seu livro em 1968 que: “Negociação é uma

atividade que pode afetar profundamente qualquer tipo de relacionamento humano e

produzir benefícios duradouros para todos os participantes”.

Segundo o autor, todo desejo que demanda satisfação é, pelo menos potencialmente, uma

oportunidade para as pessoas iniciarem o processo de negociação. Sempre que pessoas trocam

idéias com a intenção de formar relacionamentos, independentemente de chegar a um acordo,

elas estão negociando.

3.1.7. Busca de interesses comuns

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Segundo Matos (1989:240): “Negociação importa em acordo e, assim pressupõe a existência

de afinidades, uma base comum de interesses que aproxime e leve as pessoas a conversarem”.

Aqui observa-se a importância do diálogo, do relacionamento e da existência de interesse

comuns para que se possa chegar a um acordo. Sem conversação não se pode negociar e esta,

para ser eficaz, não se improvisa, mas nasce do hábito. Quem nunca conversou, ou não se

dispõe a conversar ou a ouvir, trocar opiniões e experiências, não tem condições de se sentar a

uma mesa para negociar, pois lhe falta tradição e credibilidade, não existindo confiança.

O que reúne pessoas à mesa de entendimentos são motivos comuns que induzem à

convergência de interesses, base das negociações.

3.1.8. Todos negociamos sempre

Segundo Mills (1993 apud Martinelli, 1997), “todos nós negociamos, pois a negociação é

simplesmente um modo muito eficiente de conseguir aquilo que queremos; negociamos para

resolver nossas diferenças e negociamos por interesse próprio, para satisfazer nossas

necessidades”.

A negociação só tem sentido se ambos os lados estiverem presentes, pois os dois têm

interesses em comum e interesses conflitantes. É interessante ressaltar que se todos os

interesses são em comum a negociação perde o sentindo e sua razão de ser, por outro lado, se

os interesse forem conflitantes, fica praticamente impossível negociar, pois os lados buscam

sempre atingir o mesmo objetivo.

3.1.9. Uso da barganha no processo de negociação

“Negociação envolve a tentativa, por parte de duas ou mais partes, de completar uma

transação por meio do uso da barganha”

Esta visão é, sem dúvida, uma das mais comuns. Nela está implícita a idéia de obter o que se

pretende dando algo em troca. Essa possibilidade é fácil numa negociação, porém não implica

a busca de interesses comuns que fortaleceria a negociação.

Todas as definições apresentadas mostram apenas uma visão do problema de negociação. Na

verdade, essas definições se completam, cada uma apresenta um ponto de vista do problema.

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11

Portanto, uma negociação exige diferentes enfoques, além do tratamento mais abrangente do

processo. (Figura 1)

Finalmente, "Negociação é um processo em que duas ou mais partes, com interesses comuns e

antagônicos, se reúnem para confrontar e discutir propostas explícitas, com o objetivo de

alcançarem um acordo" (David Berlew,1990 apud Martinelli ,1997).

Entradas (Influências)

NEG

OCIAÇ

ÃO

Saídas (Resultados)

Diferenças individuais Conquista das pessoas

Valores pessoais envolvidos Concessões

Interesses comuns Persuasão

Relacionamento humando Satisfação das Necessidades

Participacao no processo Decisão conjunta

Uso de informacao Acordo

Comunicacao bilateral Solucao de conflitos

Barganha Beneficios duradoures

Flexibilidade Visão estratégica

Figura 1 - Processo de negociação

3.2. PROJETO DE NEGOCIAÇÃO DE HARVARD

O Método teórico que será utilizado para as análises do estudo de caso e para a conclusão é o

método descrito por Fisher e Ury, (1994), baseado no Projeto de Negociação de Harvard.

No Projeto de Negociação de Harvard foi elaborada uma alternativa à barganha posicional:

um método de negociação destinado a obter resultados sensatos, eficientes e amistosos,

chamado de negociação baseada em princípios ou negociação dos méritos. Pode ser resumido

em quatro pontos fundamentais.

o Pessoas: Separe as pessoas do problema.

o Interesses: Concentre-se nos interesses, não nas posições.

o Opções: Crie uma variedade de possibilidades antes de decidir o que fazer.

o Critérios: Insista em que o resultado tenha por base algum padrão objetivo.

Essas características definem uma forma direta de negociação que pode ser usado em

qualquer situação e que foi utilizado como metodologia desse trabalho.

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12

3.2.1. Separe as Pessoas do Problema

Todos sabem como é difícil lidar com um problema sem que as pessoas se interpretem mal,

zanguem-se ou fiquem irritadas e tomem as coisas em termos pessoais. A seguir estão os

passos propostos para manter o negócio separado do pessoal

3.2.1.1. Os negociadores são pessoas

Não são representantes abstratos do "outro lado", mas sim seres humanos com emoções,

valores profundamente enraizados e diferentes antecedentes e pontos de vista; e são

imprevisíveis. Esse aspecto humano da negociação pode ser útil ou desastroso. O processo de

elaborar um acordo pode produzir um compromisso psicológico com um resultado

mutuamente satisfatório. Uma relação de trabalho em que a confiança, a compreensão, o

respeito e a amizade se constroem no tempo pode tornar cada nova negociação mais tranqüila

e mais eficiente.

As pessoas encaram o mundo a partir de sua própria perspectiva pessoal e freqüentemente

confundem suas percepções com a realidade. Os mal-entendidos reforçam o preconceito e

levam a reações que produzem reações contrárias, num círculo vicioso; a investigação

racional das soluções possíveis torna-se inviável e a negociação fracassa. Deixar de lidar com

os outros de maneira sensível, como seres humanos propensos a reações humanas, pode ser

desastroso para a negociação.

3.2.1.2. Todo negociador tem dois tipos de interesse: na substância e na relação

Todo negociador quer chegar a um acordo que satisfaça seus interesses substantivos.. No

mínimo, o negociador quer manter uma relação de trabalho suficientemente boa para produzir

um acordo aceitável, caso ele seja possível, dados os interesses de cada lado. Em geral, há

mais coisas em jogo. A maioria das negociações ocorre no contexto de um relacionamento

contínuo em que é importante conduzir cada negociação de maneira a que ajude, e não

prejudique as relações futuras e as futuras negociações, o relacionamento contínuo é muito

mais importante do que qualquer negociação em particular.

3.2.1.3. A relação tende a confundir-se com o problema.

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13

Tendemos a tratar as pessoas e o problema como se fossem uma coisa só. Os egos tendem a

ser envolvidos nas posições substantivas. Outra razão pela qual as questões substantivas

confundem-se com as questões psicológicas é que as pessoas extraem dos comentários sobre a

substância deduções infundadas, às quais passam então a tratar como verdades sobre as

intenções e atitudes de outrem em relação a elas. Se não formos cuidadosos, esse processo

será quase automático: raramente percebemos que outras explicações seriam igualmente

válidas.

3.2.1.4. A barganha posicional põe o relacionamento e a substância em conflito

A barganha posicional lida com os interesses do negociador, tanto pela substância como pelo

bom relacionamento, colocando um contra o outro. Ou, se você se importar mais com uma

solução favorável do que com ser respeitado ou querido pelo outro lado, poderá tentar trocar o

relacionamento pela substância. E, no entanto, ceder num ponto substantivo talvez não

garanta nenhuma amizade; talvez não faça mais do que convencer o outro lado de que você

pode ser manobrado.

3.2.1.5. Separe a relação da substância

Lidar com um problema substantivo e manter uma boa relação de trabalho não precisam ser

metas conflitantes, caso as partes estejam empenhadas e psicologicamente preparadas para

tratar cada um desses objetivos separadamente, segundo seus próprios méritos legítimos.

Lide diretamente com os problemas das pessoas; não tente solucioná-los através de

concessões substantivas. Para lidar com problemas psicológicos, use técnicas psicológicas. Se

as percepções forem inexatas, procure meios de esclarecê-las. Se as emoções se

intensificarem, encontre meios para que cada pessoa envolvida possa extravasá-las. Se houver

mal-entendidos, trabalhe no sentido de aprimorar a comunicação.

Todos os diversos problemas das pessoas recaem em uma dessas três categorias básicas:

percepção, emoção e comunicação. Ao negociar, você deve lidar não apenas com os

problemas pessoais dos outros, mas também com os seus. As técnicas que se seguem aplicam-

se igualmente a seus problemas pessoais e aos do outro lado.

3.2.1.6. Percepção

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14

As diferenças são definidas pela diferença entre seu pensamento e o dele, que é o problema.

As pessoas tendem a supor que aquilo que precisam conhecer melhor é o objeto ou o

acontecimento. Em última instância, porém, o conflito não está na realidade objetiva, e sim na

mente das pessoas.

A verdade é apenas um argumento a mais, bom ou não, para lidar com a diferença que existe

por existir no pensamento das pessoas. Os medos, ainda que infundados, são medos reais e

precisam ser abordados. As esperanças, mesmo que não sejam realistas, podem provocar uma

guerra. Os fatos, mesmo que bem estabelecidos, podem não contribuir em nada para

solucionar um problema. Por mais útil que seja buscar a realidade objetiva, é a realidade tal

como cada lado a vê que, em última instância, constitui o problema de uma negociação e abre

caminho para uma solução.

3.2.1.7. Ponha-se no lugar do outro

O modo como você vê o mundo depende do lugar onde você se encontra. As pessoas tendem

a ver aquilo que querem ver. Cada lado de uma negociação pode ver apenas os méritos de sua

situação e apenas as falhas do outro lado.

Ver a situação como o outro a vê é uma das mais importantes habilidades de um negociador e

não basta saber que eles vêem as coisas de maneira diferente, terá que se pôr no lugar do outro

para mais fácil influenciá-los. Compreender o ponto de vista deles não equivale a concordar

com ele. Entender o pensamento do outro pode levar a reflexões de seu próprio pensamento.

Mas esse não é o ônus de compreender o ponto de vista de outrem, e sim o benefício. Ele lhe

permite reduzir a área de conflito e também contribui para que você promova seus próprios

interesses recém-esclarecidos.

3.2.1.8. Não deduza as intenções do outro a partir de seus próprios medos

As pessoas tendem a pressupor que o que quer que temam é o que o outro lado pretende fazer,

hábito de atribuir a pior das interpretações ao que o outro lado diz ou faz. E isso parece ser a

coisa mais "segura" a fazer. Mas o preço de interpretar qualquer coisa que eles digam ou

façam sob a ótica mais sombria é que as novas idéias no sentido de um acordo são

desprezadas e as mudanças sutis de posição são ignoradas ou rejeitadas.

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15

3.2.1.9. Não culpe o outro por seu problema

É fácil incorrer no modelo da atribuição de culpa, especialmente quando se acha que o outro

lado é realmente responsável. Contudo, ainda que a atribuição de culpa seja justificada, ela é

geralmente contraproducente. Colocado sob ataque, o outro lado torna-se defensivo e resiste

ao que você tem a dizer, deixando de ouvir, ou então procurando retaliar com seu próprio

ataque. Atribuir culpa enreda firmemente as pessoas no problema.

3.2.1.10. Discuta as percepções de cada um

Uma da formas de lidar com percepções diferentes consiste em explicitá-las e discuti-las com

o outro lado. Desde que isso seja feito de maneira franca e honesta, sem que qualquer dos

lados responsabilize o outro pelo problema tal como cada um o vê, essa discussão pode

fornecer a compreensão de que ambos precisam para levar-se mutuamente a sério.

Comunicar em voz alta e de modo convincente as coisas que você se dispõe a dizer e que eles

gostariam de ouvir é um dos melhores investimentos que você pode fazer enquanto

negociador.

3.2.1.11. Certificando-se de que o outro lado tenha interesse no resultado

Quando você quer que o outro lado aceite uma conclusão desagradável, é crucial que o

envolva no processo de chegar a essa conclusão, se não for envolvido, é muito pouco provável

que o outro aprove.

Isso é precisamente o que as pessoas tendem a não fazer. Quando se tem um problema com

que é difícil lidar, há um impulso para deixar a parte mais árdua para o fim. O acordo torna-se

mais fácil quando ambas as partes sentem-se donas das idéias. Cada crítica feita aos termos e

sua mudança subseqüente, cada concessão é uma marca pessoal que o negociador deixa na

proposta. Desenvolve-se assim uma proposta com sugestões suficientes de ambos os lados

para que cada um deles a considere sua.

Para compromissar o outro lado, faça com que ele se envolva desde o começo. Peca-lhe

orientação. Dar crédito às idéias generosamente, sempre que possível, fornece a ele um

interesse pessoal em defender essas idéias diante de terceiros. À parte os méritos substantivos,

o sentimento de participação no processo talvez seja, isoladamente, o fator mais importante da

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16

determinação da aceitação de uma proposta por um negociador. Em certo sentido, o processo

é o produto.

3.2.1.12. Torne suas propostas compatíveis com os valores do outro

Salvar as aparências reflete a necessidade que uma pessoa tem de conciliar a postura que

assume numa negociação ou num acordo com seus princípios e com suas afirmações e ações

passadas. Muitas vezes, numa negociação, as pessoas continuam a resistir não porque a

proposta sobre a mesa seja intrinsecamente inaceitável, mas simplesmente por quererem

evitar o sentimento ou a aparência de se estarem curvando ao outro lado. Se a substância

puder ser redigida ou conceituada em termos diferentes, de tal modo que o resultado pareça

justo, elas o aceitarão.

Salvar as aparências envolve a conciliação de um acordo com os princípios e a auto-imagem

dos negociadores. Sua importância não deve ser subestimada.

3.2.1.13. Emoção

Numa negociação, particularmente numa disputa acirrada, os sentimentos podem ser mais

importantes do que as palavras. Talvez as partes estejam mais preparadas para uma batalha do

que para elaborarem conjuntamente uma solução para um problema comum. Freqüentemente,

as pessoas entram numa negociação conscientes de que os riscos são altos e sentindo-se

ameaçadas. As emoções de um lado geram emoções no outro. O medo pode gerar raiva, e a

raiva, medo. As emoções podem levar rapidamente a negociação a um impasse ou ao fim.

3.2.1.14. Reconheça e compreenda as emoções, tanto do outro quanto as suas.

Ao lidar com negociadores que representam organizações, é fácil tratá-los como meros porta-

vozes desprovidos de emoções. E é importante lembrar que também eles, como você, têm

sentimentos pessoais, medos, esperanças e sonhos. Talvez haja questões com respeito às quais

eles sejam particularmente sensíveis, e outras de que se sintam especialmente orgulhosos.

3.2.1.15. Explicite as emoções e reconheça-lhes a legitimidade

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17

Converse com as pessoas do outro lado sobre as emoções delas. Fale sobre as suas.

Transformar seus sentimentos ou os deles num foco explícito de discussão não apenas

sublinhará a gravidade do problema, como também tornará as negociações menos reativas e

mais "proativas". Liberadas do fardo das emoções não exprimidas, as pessoas têm maior

probabilidade de trabalhar no problema.

3.2.1.16. Deixe que o outro lado desabafe

Um modo eficaz de lidar com emoções negativas das pessoas consiste em ajudá-las a

liberarem esses sentimentos. As pessoas obtêm uma descarga psicológica pelo simples

processo de relatar suas queixas. O desabafo pode tornar mais fácil falar racionalmente mais

tarde. Portanto, em vez de interromper os discursos polêmicos ou as retiradas do outro lado,

você pode optar por controlar-se, ficar em silêncio, manter-se sentado e permitir-lhes que

despejem suas queixas sobre você. Desse modo, você dá pouco apoio à substância inflamada,

oferece ao orador todo o incentivo para que se expresse livremente, e deixa pouco ou nenhum

resíduo que possa causar exasperação.

3.2.1.17. Não reaja às explosões emocionais

A liberação de emoções pode revelar-se arriscada se levar a uma reação emocional. Se não for

controlada, poderá resultar numa violenta discussão.

3.2.1.18. Use gestos simbólicos

Em muitas ocasiões, um pedido de desculpas pode atenuar as emoções, mesmo quando não se

reconhece a responsabilidade pessoal por uma ação ou se admite qualquer intenção de

prejudicar. A desculpa é um dos investimentos menos dispendiosos e mais recompensadores

que se podem fazer.

3.2.1.19. Comunicação

Sem comunicação não há negociação. A negociação é um processo de comunicação bilateral

com o objetivo de se chegar a uma decisão conjunta.

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18

Há três grandes problemas na comunicação. Primeiro, os negociadores podem não falar um

com o outro, ou, pelo menos, não de maneira a serem entendidos. Freqüentemente, cada um

dos lados já desistiu do outro, e não mais tenta qualquer comunicação séria com ele. Em vez

de tentarem conduzir a negociação em direção a um resultado mutuamente agradável, tentam

fazê-lo dar um passo em falso em vez de convencer o parceiro a dar um passo mais

construtivo.

Mesmo quando se fala direta e claramente com o outro, talvez ele não escute. Esse constitui o

segundo problema da comunicação. Numa negociação, você pode estar tão empenhado em

pensar no que vai dizer a seguir, em como irá responder àquela última colocação ou em como

irá estruturar seu próximo argumento, que se esquece de escutar o que o outro lado está

dizendo agora. Se você não ouvir o que o outro lado está dizendo, não haverá nenhuma

comunicação.

O terceiro problema da comunicação são os mal-entendidos. O que um diz pode ser mal

interpretado pelo outro. Mesmo quando os negociadores acham-se na mesma sala, a

comunicação de um para outro pode assemelhar-se ao envio de sinais de fumaça numa forte

ventania. Quando as partes falam línguas diferentes, a probabilidade de erros de interpretação

se multiplica.

O que se pode fazer acerca desses três problemas da comunicação?

Escute: A necessidade de escutar é óbvia, mas, apesar disso, é difícil escutar bem,

especialmente sob a tensão de uma negociação em curso. Escutar permite que você

compreenda as percepções do outro, sinta suas emoções e ouça o que ele está tentando dizer.

As técnicas padronizadas da boa escuta consistem em prestar estreita atenção ao que é dito,

pedir à outra parte que explicite com cuidado e clareza exatamente o que pretende dizer, e

pedir que as idéias sejam repetidas quando houver qualquer ambigüidade ou incerteza. Ao

escutar, faça com que sua tarefa seja não a de formular mentalmente uma resposta, mas sim a

de compreender o outro tal como ele se vê. Leve em conta as percepções, necessidades e

limitações dele.

A menos que você reconheça o que ele está dizendo e demonstre compreendê-lo, ele poderá

acreditar que você não o ouviu. Assim, quando você tentar explicar outro ponto de vista

diferente, ele suporá que você ainda não captou o sentido dele e explicará novamente.

Portanto, mostre que o entende.

Ao repetir o que entendeu do que lhe disse o outro lado, formule positivamente as colocações

do ponto de vista dele, deixando clara a força da argumentação do outro. Pode-se, ao mesmo

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19

tempo, compreender perfeitamente e discordar completamente do que o outro lado está

dizendo. Entretanto, a menos que possa convencê-lo de que você realmente apreende o modo

como ele vê a situação, talvez você não consiga explicar-lhe seu próprio ponto de vista. Se

você conseguir formular os argumentos da outra parte melhor do que ela a depois refutá-los,

estará maximizando a probabilidade de iniciar um diálogo construtivo sobre os méritos e

minimizando a probabilidade de ela acreditar que você a entendeu mal.

Fale para ser entendido: Fale com o outro lado. Por vezes, é fácil esquecer que a negociação

não é um debate, nem um julgamento. Portanto, é pouco persuasivo responsabilizar a outra

parte pelo problema, trocar desaforos ou elevar a voz. Ao contrário, será benéfico reconhecer

explicitamente que ela vê a situação de maneira diferente, e tentar seguir adiante como

pessoas que têm uni problema em comum.

Para reduzir o efeito dominador e dispersivo que têm a imprensa, as platéias domésticas e os

terceiros, convém estabelecer meios privados e confidenciais de comunicação entre os dois

lados. Também é possível aprimorar a comunicação limitando o tamanho do grupo que se

reúne. Não importa quantas pessoas estejam envolvidas numa negociação, as decisões

importantes são tipicamente tomadas quando não mais do que duas pessoas se acham na sala.

Fale sobre você mesmo, e não sobre outro: Em muitas negociações, cada uma das partes

explica e condena longamente as motivações e intenção da outra. Se você fizer uma afirmação

sobre os outros que eles acreditem não ser verdadeira, eles irão ignorá-lo ou aborrecer-se; não

irão concentrar-se em sua preocupação. Mas uma afirmação sobre como você se sente é difícil

de questionar. E você transmite a mesma informação sem provocar uma reação defensiva que

os impeça de acolhê-la.

Fale com um objetivo: Por vezes, o problema não é a falta de comunicação, mas a

comunicação excessiva. Há alguns pensamentos que é melhor não verbalizar. Em outras

ocasiões, a revelação total de sua flexibilidade pode tornar mais difícil a obtenção de um

acordo, e não mais fácil. A moral é: antes de fazer uma declaração significativa, saiba o que

você deseja comunicar ou descobrir e saiba para que fim aquela informação se prestará.

A prevenção é o que funciona melhor: As técnicas que acabamos de descrever para lidar com

problemas de percepção, emoção e comunicação geralmente funcionam bem. Contudo

momento de lidar com os problemas das pessoas é antes deles se tornarem problemas

pessoais.

Estabeleça uma relação de trabalho: Conhecer pessoalmente o outro lado é algo que realmente

ajuda. Quanto mais depressa você puder transformar um estranho em alguém a quem conheça,

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20

mais fácil tenderá a tornar-se a negociação. Você terá menos dificuldade em compreender de

onde parte o outro. Terá uma base de confiança em que se apoiar numa negociação difícil.

Terá rotinas serenas e familiares de comunicação. É mais fácil desfazer a tensão através de

uma piada um aparte informal.

A época de desenvolver tal relacionamento é antes de iniciar-se a negociação. Conheça as

pessoas do outro lado, suas preferências e antipatias, como encontrá-las informalmente. Tente

chegar cedo para conversar antes do horário marcado para o começo da negociação e fique

mais um pouco depois que ela terminar.

Enfrente o problema, não as pessoas: Quando os negociadores se encaram como adversários

num confronto pessoal cara a cara, difícil separar seu relacionamento do problema

substantivo. Cada um dos lados tenderá a tornar-se defensivo e reativo e a ignorar por

completo os interesses legítimos da outra parte.

Um modo mais eficaz de as partes pensarem em si mesmas é como parceiros numa busca

obstinada, lado a lado, de um acordo justo e vantajoso para ambos.

Os negociadores podem começar por ver um ao outro como adversários. Cada qual vê no

outro um obstáculo. Terão que identificar as necessidades de cada um e tratar o conjunto delas

como um problema comum. Por mais difíceis que possam ser as relações pessoais entre nós,

você e eu nos tornaremos mais aptos a chegar a uma conciliação amigável de nossos vários

interesses quando aceitarmos essa tarefa como um problema comum e a enfrentarmos juntos.

Você pode começar a tratar a negociação como um processo colateral e, através de suas ações,

tornar desejável para os outros juntarem-se a ele, tornando o acordo a satisfazer ambos os

lados. É útil sentar-se literalmente do mesmo lado de uma mesa e colocar diante dos olhos o

contrato, o mapa, o bloco de papel em branco ou o que retrate o problema. Se vocês tiverem

estabelecido uma base de confiança mútua, tanto melhor. Contudo, por mais precário que seja

seu relacionamento, tentem estruturar a negociação como uma atividade lado a lado, na qual

vocês dois — com seus interesses e percepções diferentes com seu envolvimento emocional

— enfrentarão juntos uma tarefa comum.

3.2.2. Concentre-se nos interesses, não nas posições

Para chegar a uma solução sensata, concilie interesses, e não posições. A diferença entre

interesses e posições é crucial.

3.2.2.1. Os interesses definem o problema.

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21

O problema básico de uma negociação é um conflito entre necessidades, desejos, interesses e

temores de cada lado. A conciliação dos interesses, em vez de posições, funciona por dois

motivos. Primeiro, para cada interesse, existem diversas posições possíveis capazes de

satisfazê-lo. Segundo, por trás das posições opostas, há muito mais interesses em comum do

que conflitantes

Por trás das posições opostas, há interesses comuns e não só conflitantes. Um exame

criterioso dos interesses subjacentes revela a existência de um número muito maior de

interesses comuns ou compatíveis.

Como se identificam os interesses? As posições tendem a ser concretas e explicitas; os

interesses subjacentes a elas bem podem ser não-expressos, intangíveis e talvez incoerentes.

Pergunte “por quê”. Coloque-se no lugar do outro. Examine cada posição que ele assumir e

pergunte a si mesmo: Por quê? Qual é a preocupação fundamental dele?

Pergunte “por que não?”. Pense na escolha do outro. Identificar a decisão básica que as

pessoas do outro lado provavelmente acham que você está pedindo, e então perguntar a si

próprio por que elas não tomaram tal decisão. Quais dos interesses delas funcionam como

obstáculos?

Aperceba--se de que cada lado tem interesses múltiplos. Um erro comum no diagnóstico

consiste em supor que cada uma das pessoas do outro lado tem os mesmo interesses.

Os interesses mais poderosos são as necessidades humanas básicas. As necessidades humanas

básicas incluem: segurança, bem-estar econômico, um sentimento de pertença,

reconhecimento, controle sobre a própria vida.

Faca uma lista. Ajudará a recordá-los, permitirá aprimorar a qualidade da sua avaliação, situar

os interesses numa ordem estimada da importância, e estimular idéias

O objetivo de qualquer negociação é atender aos interesses das partes e a comunicação eficaz

aumenta a probabilidade de que isso ocorra no final. Se você quer que o outro lado leve em

conta seus interesses, você precisa explicá-lo de uma forma que ele entenda.

3.2.2.2. Valorize seus interesses

Parte da tarefa de convencer o outro lado de seus interesses consiste em estabelecer a

legitimidade desses interesse. Seja específico, pois os detalhes concretos não só dão

credibilidade a sua descrição, como também acrescentam impacto. Desde que não pareça

implicar que os interesses do outro lado são sem importância ou ilegítimos, você pode

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permitir-se adotar uma posição firme ao expor a gravidade de suas preocupações. Convidar o

outro lado a “corrigir-me se eu estiver errado”mostra sua abertura, e, se a outra parte não o

corrigir, isso implica que ela aceita sua descrição da situação. Se você quer que alguém escute

e compreenda seu raciocínio forneça primeiro seus interesses e razões e, mais tarde, suas

conclusões ou propostas.

3.2.2.3. Reconheça os interesses dos outros

As pessoas ouvem melhor quando sentem que você as compreende. Há um princípio da

reciprocidade no processo de reconhecimento dos interesses. Portanto, se você quer que o

outro lado reconheça seus interesses, comece por demonstrar que reconhece os dele.

3.2.2.4. Olhe para frente e seja flexível

Em lugar de discutir com a outra parte sobre o passado, fale sobre o que você gostaria que

acontecesse no futuro. Em vez de pedir-lhe que justifique o que fez ontem, pergunte: “Quem

deve fazer o quê amanhã?”. Numa negociação, você precisa saber onde quer chegar, mas

permanecer aberto às novas idéias. Para manter a sua flexibilidade, trate cada opção que

formular como simplesmente ilustrativa. Pense em termos de mais de uma opção que atenda a

seus interesses. Você deve entrar numa reunião tendo não apenas uma ou mais opções

específicas capazes de satisfazer seus interesses legítimos, mas também com a mente aberta.

3.2.2.5. Seja rigoroso com o problema e não com as pessoas

Uma regra empírica consiste em dar às pessoas do outro lado um apoio positivo de

intensidade igual ao vigor com que você enfatiza o problema.Essa combinação de apoio e

ataque é incoerente. Em termos psicológicos, as pessoas não gostam da incoerência e agem no

sentido de eliminá-la. Ataque o problema sem culpar as pessoas. Vá ainda mais longe e dê seu

apoio pessoal: escute o outro com respeito, seja cortês, expresse sua consciência do tempo e

do esforço dele e assim por diante.

3.2.3. Invente opções de ganhos mútuos

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23

Por mais valioso que seja contar com muitas opções, as pessoas envolvidas raramente sentem

necessidade delas. Há quatro obstáculos fundamentais que inibem a invenção de uma

multiplicidade de opções:

o Julgamento prematuro: Inventar opções não é algo que ocorra naturalmente. Nada é

tão prejudicial quanto o senso critico pronto a investir contra as desvantagens de

qualquer idéia nova. Sob pressão, seu senso critico tende a aguçar-se. Sua criatividade

pode enrijecer-se ainda mais com a presença das pessoas do outro lado.

o A resposta única: As pessoas consideram que sua tarefa é estreitar o hiato entre as

posições, e não ampliar as opções disponíveis.

o A pressuposição de um bolo fixo: Cada um dos lados encara a situação como

essencialmente excludente.

o Pensar que “resolver o problema deles é problema deles”: Preocupação exclusiva de

cada um dos lados com seus próprios interesses imediatos.

3.2.3.1. Separe as alternativas das decisões

Invente primeiro, decida depois. Separe o processo de discussão de soluções possíveis do

processo de seleção entre elas. O primeiro processo é divergente e criativo, enquanto que o

segundo é convergente e deliberativo.

Conduza uma sessão de brainstorm. Antes da sessão, defina seu objetivo; escolha os

participantes; vá para outro ambiente; planeje uma atmosfera informal; escolha um facilitador.

Durante a sessão de brainstorm: diminua as barreiras psicológicas; esclareças regras básicas;

faça sugestões livres; registre as idéias à vista de todos.

Depois da sessão: classifique as idéias mais promissoras; construa sobre as idéias; estipule um

prazo para avaliar e decidir.

Considere a possibilidade de fazer uma sessão de brainstorm com o outro lado. A fim de

proteger-se, distinga-a explicitamente de uma sessão de negociação em que as pessoas

formulam opiniões oficiais e fazem declarações públicas.

3.2.3.2. Amplie suas opções

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24

A sessão de brainstorm libera as pessoas para pensarem criativamente. Uma vez liberadas,

elas precisam de modos de refletir sobre seus problemas e gerar soluções construtivas. A

tarefa de inventar opções envolve quatro tipos de raciocínio.

Etapa 1. PROBLEMA: O que está errado na vida real

O que está errado? Quais são os sintomas atuais? Quais são os fatos que não agradam, em

contraste com uma situação preferível?

Etapa 2. ANÁLISE: O que está errado na teoria

Diagnostique o problema. Distribua os sintomas em categorias. Sugira causas. Observe o que

falta. Assinale as barreiras à resolução do problema.

Etapa 3. ABORDAGENS: O que pode ser feito na teoria

Quais são as estratégias ou recomendações possíveis? Quais são alguns modelos teóricos?

Gere idéias amplas sobre o que poderia ser feito.

Etapa 4. AÇÃO: O que pode ser feito na vida real

Que poderia ser feito? Que providências específicas poderiam ser tomadas para lidar com o

problema?

3.2.3.3. Observe através dos olhos de diferentes especialistas

Considere, alternadamente, como cada especialista diagnosticaria a situação, que tipo de

abordagens cada um sugeriria e quais as sugestões práticas que decorreriam dessas

abordagens.

3.2.3.4. Invente acordos de alcance e pesos diferentes

Se você e o outro lado não puderem chegar a um acordo de primeira linha, conseguirão, em

geral, chegar a um acordo de segunda ordem – isto é, poderão concordar naquilo que

discordam. Considere a possibilidade de variar não apenas o peso do acordo, mas também seu

alcance.

3.2.3.5. Procure ganhos mútuos

Como negociador, você terá sempre que buscar soluções que satisfaçam também ao outro

lado. Há três aspectos dos interesses comuns.

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25

o Interesses comuns são latentes: Como não podem ser imediatamente evidentes,

pergunte a si mesmo: será que temos um interesse comum em preservar nosso

relacionamento? quais são as oportunidades de cooperação e benefício mútuo?

o Interesses comuns são oportunidades: É conveniente explicitar o interesse comum e

formulá-lo como uma meta comum. Faça dele algo concreto e voltado para o futuro.

o Interesses comuns amenizam os conflitos: Enfatizar em interesses comuns torna a

negociação mais serena e amistosa.

3.2.3.6. Harmonize os interesses diferentes

Duas irmãs brigavam por uma laranja. Uma queria a fruta para comer e a outra apenas a casca

para fazer um bolo. Os tipos de diferenças que mais se prestam a serem harmonizadas são as

diferenças de interesses, crenças, valorização do tempo e a aversão ao risco.

3.2.3.7. Indague sobre as preferências do outro

Você estará querendo saber o que é preferível, e não necessariamente o que é aceitável. A

seguir, poderá tomar essa opção, trabalhá-la um pouco mais e novamente apresentar duas ou

mais variantes, indagando qual delas a outra parte prefere. Procure elementos que representem

um custo baixo para você e uma grande vantagem para o outro, e vice-versa.

3.2.3.8. Facilite a decisão do outro

Visto que seu sucesso numa negociação depende de o outro lado tomar a decisão que você

quer, você deve fazer o possível para tornar fácil essa decisão.

Por mais complexo que pareça o processo decisório da outra parte, você o compreenderá

melhor se escolher uma pessoa – provavelmente, a pessoa com quem está lidando – e

observar o aspecto do problema segundo o ponto de vista dela.

Poucas coisas facilitam tanto uma decisão quanto os precedentes. Procure por eles. Busque

uma decisão ou uma declaração feita pelo outro lado numa situação semelhante e tente basear

nela sua proposta de acordo.

3.2.4. Critérios Objetivos

Page 33: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Orientador: Wilson Kendy ...

26

Por mais que valorize o relacionamento, você quase sempre enfrentará a dura realidade dos

interesses conflitantes. Tentar conciliar as diferenças de interesse com base na vontade –

barganha posicional – cobra um preço elevado. A solução é negociar numa base independente

da vontade de qualquer dos lados – ou seja, com base em critérios objetivos.

Quanto mais você aplicar padrões de imparcialidade, eficiência ou mérito científico a seu

problema específico, maior será sua probabilidade de produzir uma solução final sensata e

justa.

3.2.4.1. Elabore critérios objetivos

Em geral, você encontrará mais de um critério objetivo disponível como base para um acordo.

Exemplos: valor de mercado, um precedente, reciprocidade, custos, etc. Em termos mínimos,

os critérios objetivos precisam independer da vontade de qualquer dos lados, além de serem

legítimos e práticos. Os critérios objetivos devem aplicar-se, pelos menos na teoria, a ambos

os lados. Assim, você deve usar o teste da aplicabilidade recíproca para verificar se um

critério proposto é imparcial e independente das vontades de qualquer das partes.

A técnica do “um corta, o outro escolhe” consiste em as partes negociarem o que acreditam

ser um acerto justo antes de decidirem seus respectivos papéis nele. Deixar que outra pessoa

desempenhe um papel-chave numa decisão conjunta é um procedimento bem estabelecido,

com variações quase infinitas.

3.2.4.2. A negociação com critérios objetivos

Negociar com base nos méritos tem três elementos básicos.

1º Formule cada questão como uma busca conjunta de critérios objetivos

Discutam o critério justo. Exemplo: “Vamos discutir o preço justo. Que padrões objetivos

seriam mais pertinentes para isso?” Você e a outra parte podem ter interesses conflitantes,

mas agora têm um objetivo comum: determinar os critério do preço justo.

Pergunte “Qual é a sua teoria?”. Se a outra parte informar um preço, indague sobre a teoria

por trás desse preço. Antes mesmo de considerar os termos possíveis, você precisa concordar

quanto ao padrão ou padrões a serem aplicados.

Sua argumentação terá maior impacto se for apresentada em termos dos critérios dele, e ele

sentirá dificuldade em resistir a aplicar seus próprios critérios ao problema.

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27

2º Pondere e seja acessível às ponderações

Insistir que um acordo se baseie em critérios objetivos não significa insistir em que ele se

baseie exclusivamente no critério que você propõe. Um padrão de legitimidade não exclui a

existência de outros. O que o outro lado acredita ser justo talvez não seja o que você acredita

ser justo. Como alternativa, procure chegar a um acordo acerca de alguém a quem você e o

outro considerem imparcial e dê a essa pessoa uma relação dos critérios propostos. Peça-lhe

que determine quais são os mais justos ou os mais apropriados para sua situação.

3º Jamais ceda à pressão, mas tão-somente aos princípios

3.2.4.3. Táticas traiçoeiras

Aprenda a identificar as táticas específicas que indicam a fraude, as que se destinam a

embaraçá-lo e as que fecham o outro lado numa dada posição. Depois de identificá-la, aborde-

a perante o outro lado. Discutir a tática não apenas a torna menos eficaz como pode também

levar o outro lado a preocupar-se com a possibilidade de afastar você por completo. O

objetivo mais importante de explicitar a tática, entretanto, é dar a você mesmo uma

oportunidade de negociar as regras do jogo.

3.2.4.4. Fraude deliberada

Dados falsos: faça com que a negociação transcorra independentemente da confiança. Ela

deve ser baseada nos méritos.

Autoridade ambígua: antes de entrar em qualquer negociação, verifique a autoridade do outro

lado da mesa.

Intenções duvidosas: inclua cláusulas de não-cumprimento no próprio acordo.

Guerra psicológica

Situações com tensão: esteja ciente da escolha do ambiente físico e dos efeitos que pode ter.

Ataques pessoais: abordá-los explicitamente tende a impedir que eles se repitam.

Sequência mocinho/bandido: se puder reconhecê-la, não será enganado.

Ameaças: a melhor resposta a uma ameaça é agir com base em princípios.

3.2.4.5. Táticas de pressão posicional

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28

Recusa a negociar: sugira negociar através de terceiros.

Exigências extremadas: peça uma justificativa da posição da outra parte, com base em

princípios.

Escalada de exigências: faça uma pausa para evitar as reações impulsivas e insista nos

princípios.

O sócio implacável: peça para falar diretamente com o sócio implacável.

O atraso calculado: busque condições objetivas para estabelecer prazos.

“É pegar ou largar”: experimente ignorá-la e volte para os méritos

3.3. COMUNICAÇÃO

A comunicação é vital para todas as atividades dentro da administração, seja em termos de

comunicação formal ou informal, verbal ou não verbal, envolvendo apenas duas ou mesmo

mais pessoas. É interessante observar que os administradores gastam 80% ou mais do seu

tempo em comunicações diretas com outras pessoas. Os 20% restantes do trabalho de um

executivo são feitos na sua mesa, mas frequentemente soa comunicações, nas formas de

leitura e escrita (Martinelli,1997).

Pode-se apresentar o processo de comunicação como sendo constituído de quatro aspectos

básicos:

o Alvo – este deve ser claramente definido. É o propósito da comunicação, o que se

deseja especificamente que o receptor compreenda ou faça como resultado da

comunicação.

o Método (meios) – Deve-se pesar qual o melhor método para se atingir o objetivo

almejado.

o Estrutura – A maneira como se estrutura a comunicação é importante para o resultado

final.

o Feedback – para assegurar se a mensagem foi compreendida e avaliar as emoções do

receptor em relação à ela.

Num processo de comunicação tem-se normalmente os seguintes elementos presentes:

o Transmissor – manda uma mensagem através de um canal, utilizando algum tipo de

comunicação.

o Receptor – recebe a mensagem transmitida, decodificando-a.

o Mensagem – é a formulação tangível de uma idéia para ser enviada a um receptor.

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29

o Canal – é o veículo utilizado para transmitir a mensagem.

o Feedback – é a resposta de um receptor à comunicação de um transmissor.

O feedback pode ser definido como qualquer reação a um determinado estímulo recebido. O

objetivo é proporcionar informações a outra pessoa sobre como percebe o estímulo recebido e

como este afeta o seu comportamento.

Visto que o processo de comunicação normalmente é complexo, as chances de se enviar ou

receber mensagens errôneas são enormes. Além disso, o processo de comunicação depende

excessivamente da questão da percepção, que varia muito de pessoa para pessoa. Várias

vezes, tenta-se transmitir algo e o que é captado pelo receptor é totalmente diferente daquilo

que o transmissor enviou. Trata-se do problema dos ruídos na comunicação, que ocorrem com

muita freqüência e que podem distorcer e alterar ou até invalidar um processo de

comunicação.

Por isso, o feedback é fundamental, de maneira a se poder avaliar e rever aquilo que foi

transmitido e captado, o que ajuda no prosseguimento num processo de negociação e a

obtenção do melhor acordo dentro dos interesses dos envolvidos.

Um bom feedback deve ser simples, constante, positivo, imediato, objetivo, relacionado a uma

meta, permanente, obtido diretamente pelo emissor.

A boa comunicação não deve necessitar de uma amizade ou um contato anterior já

estabelecido. A comunicação efetiva com aqueles com os quais se tem discordâncias

fundamentais pode ser mais difícil, porem, provavelmente, será mais importante do que

aquela com as pessoas com que há uma identificação maior.

A comunicação pobre também é facilmente identificável, através de alguns sintomas claros,

como desinteresse, falta de atenção, olhar distante, perguntas repetitivas ou que voltem a

pontos já discutidos. As pessoas tendem a se sentir desconfortáveis quando isso acontece e

ate a se esquivar ou se omitir no processo de comunicação.

A comunicação pode ser considerada o coração do processo de negociação. Sem

comunicação, a negociação não seria nada mais do que uma série de lances e ofertas entre

partes. Não haveria informações adicionais para dar suporte a um lance ou a uma oferta, nem

haveria informações para justificar porque esse lance ou oferta seria inaceitável. Sem

informações não existiriam razoes, a não ser a passagem do tempo, para as partes fazerem

concessões. Em suma, não haveria negociação.

3.4. FATORES QUE INFLUEM A NEGOCIAÇÃO

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30

“Qualquer que seja o objetivo da negociação, sua importância e oportunidade, haverá três

variáveis básicas que condicionam este processo: poder, tempo e informação” (Martinelli

1997:65). De acordo com Martinelli, para se ter uma negociação efetiva é necessário ter pelo

menos duas das três variáveis presentes e, se possível, interligadas, alem de saber utilizá-las

corretamente.

O poder é uma ferramenta que os negociadores podem usar para obter uma vantagem ou

aumentar a probabilidade de alcançar seus próprios objetivos. Ele dá ao negociador dá uma

vantagem sobre a outra parte.

Quando se reclama do uso do poder, é porque ele não esta sendo usado adequadamente, ou

seja, quando o poder é sobre alguém e não poder de fazer algo. De acordo com Cohen

(1980:52) “o poder não deve ser um objetivo em si, e sim um meio para se chegar a um fim”.

Dentro dos limites razoáveis, é possível conseguir tudo o que se deseja, se se estiver ciente

das opções, testar suposições, correr riscos calculados e basear-se em informações sólidas.

Isto é uma forma positiva de poder que a negociação utiliza, e não o poder negativo, que

prejudica, iludi e humilha.

3.4.1. Poderes Pessoais

São poderes natos, presente em qualquer situação, independente do papel desempenhado, dos

conhecimentos e das habilidades para lidar com pessoas (Martinelli, 1997). Pode-se dividi-los

em:

A. Poder da Moralidade

Este poder está relacionado com a cultura de cada um. Ao se negociar, deve se considerar os

padrões éticos, já que o que tem um significado para alguns pode ter outro significado para

outros. Uma boa maneira de se utilizar o poder da moralidade constitui-se em, ao ser ofendido

ou receber algo que lhe desagrada, perguntar ao outro lado se considera isso justo e direito.

Essa pergunta tende a abalar, visto que a maioria das pessoas com quem se entra em contato é

do nosso próprio meio cultural.

B. Poder da atitude

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31

É importante desenvolver a atitude de não se preocupar demasiadamente com um conflito a

ser resolvido. Essa atitude terá recompensas como: mais energia e disposição para se fazer o

que gosta, menor tensão e obtenção de melhores resultados, transmitindo, assim, confiança.

Deve-se desenvolver a atitude de preocupar-se com os contatos de um modo geral, bem como

com as negociações. Entretanto, essa preocupação não pode tornar-se excessiva. O excesso de

tensão pode colocá-lo em uma posição de enfraquecimento em relação ao outro. Conseguir

separar-se do conflito é colocar em prática o poder de atitude.

C. Poder da persistência

Persistência é diferente de insistência. Esta pode acabar com seu poder, enquanto aquela pode

reforçá-lo. A insistência começa a cansá-lo até o ponto de desistir. A persistência é a certeza

naquilo que se quer, mas buscando com certa paciência e compreensão, envolve perseverança.

Normalmente falta persistência às pessoas, já que tendem facilmente abandonar algumas

atividades, desistindo de tudo que foi conseguido até determinado momento.

D. Poder da capacidade persuasiva

Persuadir pessoas é mostrar-lhes a importância de algum fato que ocorre. Utiliza-se de fatos

comparativos, exemplos, analogias. Como negociador, o objetivo é convencer outras pessoas

que o que se está dando é mais valioso do que eles podem realizar. Esse esforço é usado para

influenciar, ou ate mesmo modificar posições, percepções, opiniões e atitudes, ou seja,

persuadir. O negociador pode ser mais efetivo na persuasão se determinar como desviar-se da

contra-argumentação do oponente; uma boa possibilidade seria distraí-lo com algum outro

fato da negociação, ou mesmo com um assunto alheio ao negócio.

O poder da persuasão pode ser usado também para fazer a outra parte retornar à mesa de

negociação, caso seja necessário. Contudo, deve ser utilizado em pequenas doses, para não se

gastarem alternativas antes de realmente realizar a negociação.

3.4.2. Poderes circunstanciais

Os poderes circunstanciais enfocam a questão da situação, o momento, o tipo de negociação, a

influência do meio na mesma. O ambiente age como influenciador da negociação (Martinelli,

1997).

A. Poder do especialista

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32

Está relacionado com o conhecer o que se negocia e com quem, bem como ter habilidades

para estudar ou preparar uma boa maneira de se negociar. Envolve também experiência. Para

utilizar esse poder de forma eficiente, deve-se apresentar a própria experiência, formação e

credencia logo no começo do encontro, assim, provavelmente, nada do que for dito será

contestado. Muitas vezes as pessoas acham que o negociador possui muito mais

conhecimentos do que ele efetivamente tem. Porém, há o risco de se tornar pretensioso, isso

não pode acontecer.

Ao se defrontar com um grande especialista, uma alternativa é fazê-lo voltar atrás, pedir para

repetir o que disse, explicar melhor. Uma certa inocência, aliada a persistência e cortesia,

pode mudar a atitude do oponente.

B. Poder de investimento

Cohen (1980:73) citou que se ocorrer algo difícil de negociar é preferível deixar para o final

da negociação, após o outro lado ter gasto energia, dinheiro e tempo. Isso pode ser

fundamental para dar-lhe um ultimato, já que não se quer perder tudo o que foi conseguido até

o momento do impasse. Se o assunto é polêmico, deve-se atacar os pontos mais fáceis, pois a

disposição das pessoas em negociar aumenta com as conquistas que representam a

concretização do investimento.

C. Poder da posição

É o poder que o cargo ocupa, juiz, gerente, coronel, pai etc. Este poder é utilizado,

algumas vezes, abusivamente. Nestes casos, a negociação caminha para o lado negativo,

popularmente conhecido como ganha-perde. É um poder que inibe a capacidade de

negociação.

D. Poder da legitimidade

Está relacionado com a legitimidade do que está em questão. Entretanto, como Cohen (1980)

descreve, a legitimidade pode ser questionada e desafiada. Assim, esse poder deve ser usado

quando lhe for vantajoso e questionado quando lhe for conveniente.

Por exemplo, é possível questionar a legitimidade de uma placa que proíba estacionar em uma

rua de uma vila abandonada. Enquanto isso, é muito difícil questionar a mesma sinalização

em uma rua movimentada do centro de São Paulo.

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33

E. Poder da concorrência

Sempre que se cria disputa por algo que se possui, torna-se esse bem mais valioso.

F. Poder do Precedente

O precedente pode ser usado como pretexto para gerar mudanças. Uma vez que se abriram

precedentes, isso facilita o processo de negociação, torna-se uma boa justificativa para se

conseguir o que deseja.

Porém a questão do precedente não deve limitar os negociadores. O fato de existir um

precedente que seja negativo não deve fazer com que desanime, ou que acredite não ter

chances de negociar de maneira adequada. Além disso, a falta de experiência em determinado

assunto não deve ser uma barreira intransponível. Pelo contrario, deve-se ir alem das próprias

experiências, testando suas suposições.

G. Poder dos riscos

Muitas vezes as pessoas não estão dispostas a corres os riscos que uma negociação envolve,

perdendo, assim, ótimas oportunidades de um acordo melhor.

Segundo Cohen (1980), para correr riscos com inteligências é necessário saber pesar os pros e

contras, alem de ser indispensável saber aceitar uma derrota razoável sem se queixar. O risco

de um retrocesso é o preço que se paga por qualquer progresso.

H. Poder do compromisso

Ao fazer com que ambas as partes envolvidas se comprometam na negociação, é possível

distribuir os riscos, facilitando a exploração de oportunidades favoráveis. A tensão em torno

da negociação é reduzida, a dedicação conjunta transmite confiança, poder. Se há conflitos

entre as partes, sua posição é enfraquecida. O envolvimento gera compromisso, e este gera

poder, fica mais fácil convencer o cliente a aceitar os serviços desta e não daquela empresa.

I. Poder de conhecer as necessidades

Frequentemente, ao se negociar, o objetivo, a necessidade funcamental das partes, é ocultado.

Isto dificulta a finalização de um acordo que satisfaça as necessidades dos envolvidos.

Investigando, analisando, ouvindo e questionando, é possível arrecadar informações valiosas a

respeito das verdadeiras necessidades do oponente, e assim elaborar uma proposta que as

satisfaça.

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34

J. Poder de identificação

Na negociação, fazer com que o oponente se identifique com o outro negociador aumenta a

capacidade de acordo. Para que tal identificação aconteça ao negociar, o profissionalismo e o

bom-senso devem contar totalmente a favor, tendo-se em troca cooperação, lealdade e

respeito.

K. Poder da barganha

Este poder pode ser definido como a capacidade de exercer influência, habilidade da pessoa

em causar mudança na direção desejada, incluindo capacidade de vencer obstáculos e

conquistar objetivos, resultados esperados. Pode-se considerá-lo como a integração do poder

de persuasão e especialização. Depende do ambiente, da situação, do contexto que podem

conter meios e oportunidades para construir um poder de barganha. Por isso, trata-se de um

poder bastante subjetivo.

3.4.3. Tempo

James Walter (apud Cohen, 1980:92) diz que, desde que se chegue antes do fim, nunca será

tarde.

Na negociação o tempo deve ser cuidadosamente analisado, verificando-se como ele afeta o

processo, para evitar problemas. O tempo deve ser o ponto de apoio para se projetar o negócio

e conseqüente satisfação dos envolvidos, além de permitir a conclusão de que é ilimitado,

podendo, entretanto, ser controlado.

O tempo é uma variável essencial no processo de negociação. Alguns, como os britânicos,

levam-no muito a serio, outros, como os brasileiros, não se incomodam muito.

Na verdade, o limite do tempo é definido por quem negocia, tornando-se mais flexível do que

se imagina. Como produto de uma negociação os prazos também podem ser negociados.

é importante ressaltar que todas as partes envolvidas em uma negociação normalmente têm

um prazo limite. Porém, muitas vezes, a outra parte tenta parecer indiferente em relação ao

prazo, o que sempre traz resultados, visto que aumenta a pressão sobre o oponente.

Percebe-se uma importante ligação entre as variáveis tempo e poder. A maneira como se vê e

se utiliza o tempo é essencial para o sucesso, podendo até influenciar em um relacionamento.

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35

3.4.4. Informação

Informação é o efeito de informar-se sobre, alguém, algo, é conhecimento, participação,

instrução, direção, resultante de análise e combinação de vários informes.

Isto tudo permite que a informação seja utilizada na negociação. Com as informações certas a

negociação se desenrolará mais rápido, não criará falsas expectativas, se encaminhara para o

ganha-ganha, permitirá o conhecimentos das partes, garantindo um relacionamento

duradouro, além de caracterizar um certo poder em relação aos demais.

A informação está intimamente relacionada ao poder de conhecer as necessidades, ou seja, ela

pode encaminhar ao sucesso, afetar as decisões que serão tomadas. A busca dessas

necessidades deve ser iniciada antes mesmo de sentar-se a uma mesa para se efetivas o

acordo.

A informação pode mudar o rumo da negociação, porém o tempo que a busca pelas

informações envolve pode favorecer ou não a qualidade das informações conseguidas, é

importante ter persistência e paciência nesses casos.

Um bom negociador consegue captar informações por meio de fator não verbais do oponente.

Assim, durante uma negociação é interessante tentar distanciar-se um pouco, de forma a tentar

ouvir com um “terceiro ouvido” ou observar com um “terceiro olho”.

Outro aspecto importante da informação, é que ela pode geras o poder de especialização.

3.5. PRINCÍPIOS DO GANHA-GANHA

É praticamente voz corrente, nos dias atuais, o fato de que as negociações devem ser

concluídas com situações ganha-ganha, para poderem ser consideradas como negociações

bem-sucedidas. Ou seja, ambos os lados envolvidos na negociação deveriam, ao final dela,

concluir que o resultado obtido representa um ganho para eles.

Porém, para verificar se o melhor resultado de uma negociação deve ser o ganha-ganha, deve-

se avaliar três questões básicas, conforme proposto por Robinson (apud Martinelli,

1997:163):

o Será que todas as negociações realmente devem terminar com um ganha-ganha?

o Será que todos os negociadores devem procurar o ganha-ganha como resultado

final?

o Será que é possível assumir que o oponente está buscando o ganha-ganha?

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Ao avaliar essas questões, é preciso questionar, inicialmente, se vencer realmente é sempre a

melhor opção. Deve-se ter em mente que nem sempre a vitória de curto prazo, levará a vitoria

de longo prazo. Além disso, Robinson pondera que o oponente preocupa-se pouco com a

posição da outra parte, e estará apenas buscando vencer por sua própria conta, logo não é

aconselhável assumir imediatamente que o outro lado está buscando o ganha-ganha.

Não se pode esquecer que um acordo que seja bom apenas para um lado, poderá ser rompido

antes mesmo de ser cumprido, além disso, tem-se que levar em conta que sempre existe a

chance de ter que negociar novamente com essa mesma pessoas, e, nesse caso, a postura e os

resultados da negociação anterior podem ter influências decisivas.

Alguns autores defendem que a preocupação deve ser sempre com a vitória para seu próprio

lado, evidentemente prevalecendo uma postura de longo prazo. Porém, não se deve esquecer

da questão humana e do relacionamento pessoal, bem como das conseqüências que as

negociações podem trazer sobre aspecto humano.

Para obter o ganha-ganha é importante planejar ações que proporcionem oportunidades para o

desenvolvimento de relações positivas, desenvolvendo atividades preferidas por todos, de

modo a promover o relacionamento. Facilita-se, assim, o cultivo de sentimento de confiança

mútua, tratando o outro negociador da maneira como gostaria de ser tratado, com gentileza,

afabilidade, sociabilidade, polidez, honestidade, cumprindo sua palavra. Assim, certificar-se

de que não discutir negócios para valer até ter certeza de que o relacionamento com a outra

parte teve oportunidade de desenvolver-se plenamente, faz parte do acordo ganha-ganha.

Desse modo, é possível que cada parte proponha soluções viáveis, sem desmerecer à outra. E

quando surgirem propostas discordantes, um brainstorming, para buscar soluções criativas e a

confiança na idéia do outro, ajuda muito, resolvendo juntos, enfim, qualquer divergência

remanescente.

É importante ressaltar que o resultado de uma negociação ganha-ganha não é apenas um

acordo ganha-ganha. O fundamental é fazer com que o acordo funcione, pois ele não garante

por si só o desempenho, afinal ele não pode atuar, somente as pessoas é que podem. Cada

negociador deve procurar manter o outro lado empenhado em cumprir sua parte, não

dispersando energia. Um incentivo pode ser uma boa opção. A segurança de eu o negociador

irá cumprir sua parte também é essencial para manter a negociação e o acordo ganha-ganha.

Deve-se, também, haver manutenção dessa relação, deixando espaço para negociações

futuras. A negociação ganha-ganha é um processo contínuo e assim deve ser encarada ao

longo de todo o tempo.

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3.6. ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES

A ética, enquanto disciplina teórica, estuda os códigos de valores que determinam o

comportamento e influenciam a tomada de decisões num determinado contexto. Estes códigos

de valores têm por base um corpo tendencialmente consensual de condutas e princípios

moralmente aceitos, que determinam o que deve ou não deve ser feito em função do que é

considerado certo ou errado. No ambiente organizacional e na gestão em empresas em

particular, a ética estuda os códigos morais que orientam as decisões empresariais, na medida

em que estas afetam as pessoas e a comunidade envolvente. Na negociação a maioria das

questões éticas está relacionada com o grau de honestidade, de abertura e de sinceridade que o

negociador deve ter na sua relação com o seu oponente. O grande problema que se coloca aos

negociadores é saber quais os comportamentos considerados como éticos. Deverão dizer a

verdade sempre, ou há momentos em que não dizer a verdade é uma conduta aceitável (ou

mesmo necessária)?

Há muito discussão quanto a até que ponto se está agudo de madeira ética ou não em uma

negociação. Por exemplo, quando alguém pergunta até que limite se pode chegar em uma

negociação, e não se diz a ele o verdadeiro limite, para ter maior espaço de barganha, até que

ponto esse comportamento pode ser considerado ético e quando ele passa a ser anti-ético?.

Isso depende muito dos valores das pessoas envolvidas na negociação e do ambiente no qual

elas estão inseridas

Conforme foi dito, a informação é uma das principais fontes de poder, especialmente em uma

negociação, pelo seu controle pode-se aumentar o poder do negociador que a possui (Pfeffer,

1993apud Lewicki, Saunders e Minton, 2002). Uma vez que a negociação é um processo de

troca e de comunicação de informação, uma conduta não ética consiste na comunicação

desonesta e enganosa dessa informação à outra parte. No entanto, cabe aos negociadores

perceberem quando podem ou devem ser sinceros e diretos nas suas ações e afirmações e

quando devem proteger o acesso a informação privilegiada. Por exemplo, Carr (1968 apud

Lewicki, Saunders e Minton, 2002) argumenta que as decisões empresariais são análogas às

decisões de um jogo de poker. Para este autor, esconder informação, utilizar o blefe, encobrir

ou exagerar dados e fatos pertinentes são táticas que acontecem nas atividades empresariais.

Carr defende que os executivos que não o façam estão a ignorar as oportunidades permitidas

pelas regras do negócio e, consequentemente, ficam em desvantagem nas suas relações

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empresariais, uma vez que a manipulação da informação é uma maneira legítima para os

indivíduos ou para as empresas maximizarem os seus ganhos. No entanto, vários autores

discordam desta opinião. Para eles, os executivos e as empresas devem ter padrões de conduta

ética mais elevados.

A negociação é uma atividade dependente da informação (Kelley e Thibaut, 1969apud

Lewicki, Saunders e Minton, 2002), isto é, baseia-se na troca de informação sobre as

verdadeiras prioridades e preferências dos negociadores. Para chegar a um acordo que

maximize os resultados totais é necessário que ambas as partes tenham vontade de trocar

informações corretas sobre as suas prioridades, preferências e interesses. No entanto, ao

mesmo tempo, os negociadores podem sentir-se tentados a maximizar os seus interesses

individuais, em detrimento dos interesses contrários, e tentam ocultar o máximo de

informação possível, especialmente quando acreditam que induzir em erro o seu oponente

lhes confere uma vantagem negocial. Esta ambivalência resulta, com refere Kelley (1966

apud Lewicki, Saunders e Minton, 2002) em dois dilemas negociais: (1) o dilema da

confiança e (2) o dilema da honestidade. O dilema da confiança refere-se ao quanto se deve

acreditar no que a outra parte transmite. Se se acredita em tudo, então a outra parte pode

aproveitar-se da situação. Se não se acredita em nada, dificilmente se poderá chegar a um

acordo. O dilema da honestidade refere-se à autenticidade da informação transmitida durante

o processo negocial. Por um lado, se dissermos toda a verdade sobre as nossas prioridades,

interesses e o mínimo que estamos dispostos a aceitar, dificilmente poderemos fazer melhor

que esse mínimo. Por outro lado, se ocultarmos e mentirmos sobre as nossas reais motivações

poderemos chegar a um impasse.

Rubin e Brown (1975apud Lewicki, Saunders e Minton, 2002) sugerem que para manter uma

relação negocial, cada uma das partes deverá selecionar um ponto médio entre os extremos da

completa abertura e do engano. Cada um deverá ser capaz de convencer o outro da sua

integridade, sem, no entanto, pôr em risco sua posição na negociação.

A grande questão que se coloca aos investigadores será a definição das barreiras entre o que é

ético, o que é marginalmente pouco ético e o que é desonesto ou fraudulento. Como já foi

referido, a utilização de táticas negociais pouco éticas têm consequências positivas e

negativas. Dependerá do sucesso da sua utilização e da forma como os negociadores e

terceiros avaliarem a situação. Se algumas táticas podem ser consideradas pouco éticas e por

isso defensáveis em algumas circunstâncias, outras não poderão nunca ser justificadas e têm

consequências não só na negociação e nos negociadores intervenientes, como na relação entre

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39

as partes. Quando os negociadores decidem a utilização de táticas que não são completamente

éticas, avaliam-nas numa escala de “eticamente apropriada” até “eticamente reprovável”. As

táticas num dos extremos desta escala são julgadas como eticamente aceitáveis e apropriadas

em contextos negociais, mesmo que utilizem algum grau de engano ou desonestidade. Por sua

vez, no outro extremo do contínuo as táticas são classificadas como eticamente reprováveis e

difíceis de defender e justificar. Entre estes dois extremos existe uma zona cinzenta, na qual

as táticas são vistas como eticamente duvidosas, justificáveis em algumas circunstâncias, mas

não em outras.

3.6.1. Critérios para a tomada de decisões éticas

Os administradores têm uma serie e dificuldades e dilemas para lidar com as questões

referentes ao aspecto ético. Alguns enfoques ligados à tomada de decisões éticas

proporcionam critérios para o entendimento e a resolução dessas questões.

Entre esses critérios que o orientam a tomada de decisões éticas, pode-se citar:

o Enfoque utilitário – é o conceito ético de que comportamentos morais produzem o

maior bem, para o maior numero possível de pessoas.

o Enfoque individualista – trata-se do conceito de que as ações são morais, caso elas

promovam o interesse individual, em termos de longo prazo.

o Enfoque moral – parte do principio de que os seres humanos têm direitos e liberdades

que não podem ser sobrepujados por decisões individuais. Dessa forma, as decisões

morais seriam as que mantêm os direitos das pessoas afetadas por essas decisões.

o Enfoque de justiça – considera que as decisões morais devem ser baseadas em padrões

de equidade, probidade e imparcialidade.

3.6.2. Fatores que afetam as decisões éticas

Investigações recentes sugerem que diversos fatores podem explicar as diferenças nas

percepções, sobre a aceitabilidade da ética negocial, de um conjunto de táticas questionáveis

(Lewicki, Saunders e Minton, 2000). Entre eles podemos referir: (1) as características

demográficas dos negociadores; (2) as características de personalidade e o nível de

desenvolvimento moral; (3) e elementos do contexto social e situacional no qual os

negociadores estão inseridos.

3.6.2.1. Características Demográficas

Page 47: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Orientador: Wilson Kendy ...

40

Diversos estudos têm concluído que as características demográficas desempenham um papel

fundamental na conduta ética dos negociadores. Fatores como a idade, o sexo, a experiência

profissional, a nacionalidade e o nível sociocultural são responsáveis por diferenças nas

percepções dos indivíduos quanto à pertinência e à aceitabilidade de um conjunto de

estratégias e táticas negocias.

3.6.2.2. Fatores Situacionais

O último grupo de fatores com impacto na predisposição para comportamentos eticamente

duvidosos são os fatores situacionais. Assim, a relação com a outra parte, o poder relativo de

cada negociador , pressões e normas do grupo ou da organização e as normas culturais podem

também ter influência na utilização de táticas eticamente questionáveis.

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41

4. ESTUDO DE CASO

4.1. A EMPRESA

A empresa escolhida para o estudo de caso foi uma instituição financeira nacional. Sou

estagiária dessa empresa e que ela é uma ótima referência para o assunto em questão. Dentro

de um banco existe negociações em todas as áreas, tanto na área corporativa quanto na área

comercial. Esse estudo foca na relação entre essas duas áreas.

4.2. LEVANTAMENTO DE DADOS

A área na qual foi focado esse estudo é a Gerência de Negociações de Folhas de

Pagamentos- GNFP.

A GNFP é responsável por negociar folhas de pagamento para o banco, das mais diferentes

formas, como: licitações, isenções de tarifas, doações, patrocínios, etc. E também gerenciar

todos os PABs (Postos de Atendimento Bancário) do Brasil. Um PAB é idêntico a uma

agência, porém encontra-se dentro de uma empresa, portanto seu público são apenas os

funcionários do local.

Obviamente, deseja-se somente negociar para o banco folhas que terão boa rentabilidade e

assim proporcionar maior lucro para a instituição. Para auxiliar as negociações, além do

conhecimento e estratégias dos negociadores, existe a área de Gestão de informações, que é

da mesma diretoria.

A GNFP é composta por três gerentes e dois coordenadores, todos engenheiros, por 8

analistas (diversas formações) e um estagiário. Através da manipulação de inúmeras bases de

dados é possível concluir informações que irão subsidiar as decisões da área de negociação.

Com os dados de resultado de uma empresa, é possível definir estratégias e modelos para

futuras negociações, além de identificar quais os ramos de empresas que são melhores para

serem negociadas.

Através dos dados de resultado de penetração de produtos (LIS, crediário, cartão de crédito,

etc.) é possível definir parâmetros para rentabilizar as folhas que não estão com bons

resultados.

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42

Outra atividade da área é de "precificar" folhas de pagamento, como por exemplo a licitação

da folha de pagamento da Prefeitura de São Paulo. Este, com certeza, foi um dos maiores

trabalho da área, pois precisava-se de informações de todos os dados possíveis.

O gráfico, apresentado na figura 2 a seguir, mostra o número de processos que chegam na

área para ser analisados e as porcentagens de processos que foram dados como “aprovados” e

“negados”.

Figura 1 – Número de processos

Quando um processo é negado, significa que a área não cedeu à negociação, isso é um risco

para a área, pois, o objetivo da área é conquistar Folhas de pagamento de empresas, e negar

algum benefício a uma empresa pode significar não obter a Folha ou perder a Folha. Porém,

aprovar benefícios significa diminuir a receita para o Banco, então o ideal para a área é trazer

Folhas com o mínimo de benefícios possíveis e mantê-las.

Antes de focar no processo de negociação, é interessante entender o fluxo da área.

Primeiramente, os analistas recebem, via OUTLOOK, o Formulário de Solicitação da

negociação preenchido, quem preenche esses formulários são os gerentes, tanto os que lidam

com Pessoas Jurídicas como Pessoas Físicas. Caso este formulário esteja correto, o analista

importa os dados para uma Base de processos da área, e o status do processo entra como “Em

Análise”, se alguma informação está faltando, o analista retorna o formulário.

O próximo passo é a análise do processo. Existem seis tipos de processos, os quatro principais

são:

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43

o Conquista integral da Folha: esse processo aparece quando o Banco não possui a

Folha de pagamento da empresa e a intenção é conceder benefícios para adquirir a

Folha, e trazer todos os funcionários da empresa para o Banco

o Conquista Parcial da Folha: esse processo aparece quando o Banco não possui a

Folha de pagamento da empresa e a intenção é conceder benefícios para adquirir

parte da Folha, trazendo parte dos funcionários para o Banco

o Manutenção da Folha: esse processo ocorre quando a Folha já roda com o Banco,

porém a empresa requisita benefícios para seus funcionários.

o Incremento da Folha: esse processo ocorre quando parte da Folha já roda com o

Banco, e a intenção é conceder benefícios para conquistar o restante da folha. O

incremente pode ser com risco e sem risco, com risco são os casos em que o Banco

pode perder a parte que possui da Folha se os benefícios não forem concedidos.

Com o processo em mãos, o analista precisa levantar dados da empresa em questão. Os dados

mais relevantes são: quantidade de funcionários, salário médio, bancos concorrentes,

benefícios anteriores, turnover (rotatividade da empresa) e ramo de atividade.

o Quantidade de funcionários: é necessário saber para quantas contas será concedido o

beneficio.

o Salário médio: Quanto maior o salário, maior a probabilidade de o cliente adquirir

outros produtos do banco, ou seja, maior a receita para o banco

o Turnover: Sempre que ocorre uma demissão seguida de uma contratação, isso gera um

custo para o banco, pois a abertura da conta é o processo de maior custo.

o Banco concorrente: de acordo com a estratégia do banco, cada concorrente tem seu

valor.

o Ramo de atividade: pelas bases do banco, pode-se saber quais ramos são mais

lucrativos, qual o turnover médio do ramo, salário médio do ramo.

o Benefícios anteriores: interessante saber, pois se a empresa já teve benefícios, pode-se

avaliar qual foi o retorno dessa empresa, se o retorno foi negativo, por exemplo, a

tendência é o beneficio ser negado.

o Folha maturada (Figura 4): se a folha já está maturada, pode-se ver qual está sendo o

retorno da folha e então fazer a análise, se ainda não está maturada, a preferência é dar

o benefício para que a empresa continue no banco até a maturação, e devolva ao banco

o que este investiu nas aberturas das contas

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44

.

Figura 4 – Maturação de uma Folha de pagamento

Com os dados da empresa em mãos, o analista analisa o processo, dá sua sugestão e

encaminha para seu superior, cada processo tem uma política de análise, de acordo com a

importância do processo.

O passo seguinte é conferir em qual política o processo se enquadra. Se ele estiver

enquadrado na política da GNFP, é a GNFP que avalia e responde o processo, oferecendo os

benefícios que julgar cabíveis. Se não, o processo é levado a um Comitê de Folhas. Esse

comitê acontece duas vezes por semanas e é composto pelo gerente da GNFP e por mais dois

Diretores Comerciais. Nesse comitê, os processos são avaliados, já com todos os dados e

informações possíveis, e então se encontra um consenso sobre quais benefícios devem ser

oferecidos a cada empresa.

Para finalizar, cada processo é respondido ao seu gerente solicitante com os benefícios

aprovados ou não. Nos casos que a empresa não concorda com o que foi aprovado, existe a

possibilidade da re-análise, basta o gerente enviar outro formulário com alguma informação

adicional para que outra análise possa ser feita.

4.3. A NEGOCIAÇÃO

No processo descrito, existem duas fases de negociação:

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45

o Gerente x GNFP

o Empresa x Gerente

Em alguns casos a GNFP visita a empresa, então a negociação acontece diretamente Empresa

x GNFP, mas tais casos são exceções.

Percebe-se que a negociação Gerente x GNFP é entre duas partes que pertencem a mesma

instituição financeira. Logo, o objetivo principal dessa negociação deveria ser obter lucro para

o banco, aumentando sua receita. Porém, na prática esse objetivo se perde, o porquê disso será

discutido nos próximos tópicos.

Já a negociação Empresa x Gerente, ocorre entre empresas diferentes, o Banco e a Empresa

cliente, ou seja, essa parte da negociação tenderia a ser o gargalo do processo, pois

normalmente cada parte busca o melhor para si, porém, também não é assim que acontece.

4.4. IDENTIFICAÇÃO DE PROBLEMAS

O estudo do caso em questão começou com um brainstorm de problemas que a GNFP

encontra quando negocia com os gerentes. Seguem os principais pontos discutidos:

o Gerente fornece dados incorretos da empresa em negociação ou deixa de fornecer

alguma informação relevante

o Gerente não tem conhecimento de como é a gestão dos salários da empresa cliente

o Muitas demandas na GNFP

o Gerente passa informações falsas para tentar ganhar a negociação

É na negociação Gerente x GNFP que ocorre o maior conflito de interesses, pois a parte do

Gerente busca os benefícios para agradar o cliente e mantê-lo fiel a ele. Já a GNFP tem como

objetivo manter o cliente com o mínimo de benefícios possíveis.

A GNFP procura responder cada processo no prazo máximo de cinco dias úteis, ou seja, se o

gerente manda o formulário de solicitação em D0, em D5 ele deveria receber uma resposta

dizendo se a solicitação foi aprovada ou não. Porém na realidade isso não está acontecendo. O

primeiro problema listado, fornecimento incorreto de dados pelos gerentes, é um dos motivos.

Sempre que chega um formulário, o analista confere se ele está completamente preenchido,

caso ele não esteja, o processo fica parado até o gerente retornar as informações que faltam.

Além disso, mesmo quando o formulário está todo preenchido, o analista deve conferir as

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46

informações que o gerente lhe passou com as informações que constam nas bases de dados da

área. Caso as informações não coincidam o processo para, então o analista entra em contato

com o gerente para questionar tais divergências.

Na maioria das vezes o próprio gerente não sabe explicar o que lhe foi questionado. Esse é o

segundo problema listado, falta de conhecimento por parte do gerente. O que ocorre é que o

gerente solicita benefícios sem conferir como está a relação da Folha de pagamento da

empresa com o banco. Ou seja, muitas vezes a empresa está pagando seus funcionários

utilizando o sistema errado, ou está pagando de outra forma que não seja com o Sistema de

Pagamento do Banco, e mesmo assim o gerente requer benefícios para essa empresa. Quando

o pagamento dos funcionários da empresa não é feito de forma correta e nem utilizando o

Sistema do Banco, esses créditos não aparecem nas bases da GNFP, logo a GNFP não pode

conceder benefícios para essa empresa sem saber como realmente seus funcionários recebem

seus salários. Essa informação é bastante relevante para a análise, pois caso seja um bom

concorrente que tenha essa Folha, esse processo fica interessante para a GNFP.

O terceiro problema citado é a alta demanda da GNFP. Além de todo o processo de

negociação e análise, a GNFP possui outras demandas. Por ser uma área muito importante

para o banco, frequentemente Diretores e outras áreas solicitam informações à GNFP, com

isso o analista precisa parar seu fluxo natural e atender as demandas prioritárias.

Normalmente essas outras demandas ocupam muito tempo dos analistas, visto que na maioria

das vezes é necessário buscar informações em diferentes bases de dados, as quais possuem

milhões de linhas. Isso acaba atrapalhando o processo de negociação, pois os gerentes acabam

esperando mais do que lhes foi prometido, deixando um clima desfavorável a uma negociação

amigável.

Outro fato muito comum é o gerente passar a informação de que caso o benefício não seja

aprovado, o Banco perderá a Folha da empresa em questão. Muitas vezes essa é uma atitude

antiética do gerente, pois ele afirma isso sem mesmo ter falado com a empresa. Como a

maioria dos processos acompanha essa informação, a GNFP não leva em consideração, o que

é muito arriscado, pois se essa informação é verdadeira ela passa a ser uma valiosa para a

análise.

Resumindo, o processo de negociação de folhas de pagamento deveria seguir o seguinte

fluxo: a empresa solicita ao gerente isenção em certos produtos � gerente encaminha essa

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solicitação à GNFP informando o porquê é interessante conceder esses benefícios à empresa

� GNFP analisa o processo, e envia uma proposta ao gerente � gerente encaminha proposta

à empresa, a qual aceita ou não.

Mas, na maioria das vezes o gerente solicita a isenção de produtos à GNFP porque ele foi

eticamente reprovável e “prometeu” a empresa tal beneficio, antes mesmo de enviar a

solicitação para a área de análise, ou então prometeu o benefício por um período maior

período de tempo do que foi aprovado e envia solicitações de renovação sem mesmo a

empresa saber.

Essa atitude eticamente reprovável gera bastantes conflitos, pois no caso citado acima, onde o

gerente havia prometido isenção por doze meses, e foi aprovado apenas seis meses, no sétimo

mês a empresa é tarifada, o que a deixa bastante descontente com o banco, pois para ela foi

prometido uma isenção de 12 meses.

Mesmo parecendo simples esse processo de negociação, existem diversos fatores que o

impedem de ocorrer de uma maneira amistosa.

4.5. ENTREVISTA

Após o levantamento desses principais problemas que a área encontra na relação com os

gerentes, foi-se atrás do porquê que isso ocorria.

Foram entrevistados dois gerentes de diferentes agências, e duas analistas da GNFP.

As perguntas para os gerentes foram as seguintes:

1) Você busca orientação antes de encaminhar um correio eletrônico para a GNFP?

Se sim, onde.

Se não, por que?

Gerente 1: peço a própria GNFP que me oriente, pois acredito que eles tem mais

conhecimento no assunto.

Gerente 2: para agilizar o trabalho já mando o correio, não dá tempo de ficar lendo

orientações.

2) O que você busca quando encaminha uma solicitação de beneficio à GNFP?

Gerente 1: Conquistar clientes.

Gerente 2: Aumentar minha base de clientes e atingir metas.

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48

3) Você fala com a empresa antes de encaminhar uma solicitação de beneficio? Quais

informações você pede?

Gerente 1: Sim, quando a solicitação está vencendo, aviso a empresa que pedirei a renovação,

e questiono o que ela gostaria.

Gerente 2: Quando é renovação já encaminho direto para não perder tempo, no caso de

conquista eu pergunto a empresa as informações necessárias para preencher o formulário.

4) Para você, qual o objetivo do seu trabalho

Gerente 1: Ganhar clientes

Gerente 2: Trazer novos clientes para o banco.

Para as analistas foi feita apenas uma pergunta:

Por que vocês acreditam que existe esse conflito da GNFP com os gerentes?

Analista 1: O ambiente de uma agência é um outro mundo, é muita correria, o ambiente é

bastante estressante, lá eles só se preocupam com as metas deles, todo mês eles precisam

atingir as metas, eles não vão atrás de informação, para eles é mais rápido nos mandar um

email perguntado toda vez do que ler um manual de duas páginas que explica todo o fluxo. O

que eles não sabem é que só nesse email questionando alguma informação eles podem perder

até dois dias, de acordo com a nossa demanda.

Analista 2: Dentro de uma agência existe competição, existe também competição entre

agências, quando se trabalha em uma agência, seu nome fica sempre exposto, pois existem

relatórios informando os funcionários que atingiram as metas, o ranking deles etc. Por isso o

trabalho do gerente muitas vezes é não ético, nessa pressão ele acaba vendendo produtos de

maneira incorreta à empresa, prometem a ela certo benefícios sem antes passar pela análise de

nossa área. E isso tudo acontece porque na cabeça deles o objetivo é atingir as metas, não

importa como, eles têm certo tempo e tantas metas, e muitos acabam esquecendo o real

motivo que eles estão ali, que é para colaborar com o banco.

Nas entrevistas foi citada a palavra “meta”, a parte comercial do banco, a qual os gerentes

fazem parte, trabalha de acordo com um sistema de metas que lhe são passadas. Assim, o

objetivo de cada funcionário é atingir suas metas, mais pontos mais bônus, menos pontos

menor o bônus.

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49

Existem inúmeras maneiras de atingir as metas, porém nesse estudo específico vale ressaltar

que para os gerentes quanto mais cliente ele traz para a carteira dele, mais pontos ele

consegue para atingir sua meta

4.6. CONFLITO DE INTERESSES

As entrevistas revelam o que realmente acontece na negociação Gerente x GNFP, a qual

deveria possuir um objetivo em comum. Porém, pode-se perceber que o que existe são

interesses distintos.

A área GNFP busca o que é melhor para o banco, não existe competição entre as pessoas que

trabalham nessa área, ela trabalha como um time, um ajudando o outro, na meta de cada

funcionário está o desempenho do grupo, ou seja, o objetivo é que o grupo como um todo

obtenha bom resultado. Do ponto de vista da GNFP, se uma Folha de pagamento com X

funcionários gera custo para o banco, então o melhor é perdê-la.

O gerente busca o que é melhor para ele, ele vive em um ambiente bastante competitivo, onde

quem tiver a melhor meta ganha bônus, prêmios e reconhecimento. Logo, o que lhe interessa

é atingir sua meta, mesmo que os meios para isso sejam eticamente reprováveis. Do ponto de

vista do gerente, se uma Folha de pagamento possui X funcionários, e perdê-la significa

diminuir sua meta em X clientes, o gerente se esforçará para conseguir benefícios para essa

empresa visando manter a Folha com ele, indiferente se ela gera custo ou receita.

Com esse interesse individual do gerente, a negociação Empresa x Gerente passa a não ter

tantos conflitos, pois o gerente está preocupado em agradar a empresa para mantê-la ou

conquistá-la como cliente. O papel da empresa é fazer pressão no gerente para que ele seja o

intermediário da negociação de benefícios, ou seja, na prática podemos dizer que o gerente

está atuando como colaborar da Empresa e não do banco para o qual ele trabalha.

Por isso a importância da GNFP, pois é essa área que realmente analisa os tipos de clientes

que o banco possui, é uma área que não pensa em quantidade de clientes, mas sim em

qualidade de clientes, e são esses clientes, que trazem retorno, que o banco deve agradar com

benefícios.

Certamente o sistema de metas funciona muito bem para o banco, mas no caso dessa

negociação específica, esse sistema está atrapalhando, pois onde duas áreas deveriam estar

trabalhando juntas: uma fornecendo informações relevantes e corretas, e a outra analisando

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50

essas informações e buscando a melhor proposta, o sistema de metas causa um grande conflito

entre elas.

4.7. ANÁLISE DOS DADOS

De acordo com o método teórico descrito no início desse estudo, existem 4 pontos

fundamentais em toda negociação. No estudo de caso podemos analisar como cada um desses

pontos fazem a diferença na prática.

4.7.1. Pessoas

Como citado, a principal negociação acontece entre pessoas que trabalham em uma mesma

instituição, logo as relações pessoais são bastante importantes, pois não interessa a ninguém

criar uma inimizade dentro da mesma empresa, principalmente com pessoas que sempre

estarão trabalhando juntas.

Entretanto, a correria e a pressão as quais o gerente convive fazem com que ele veja a GNFP

como um obstáculo e não como uma parceira. Por isso ele utiliza, muitas vezes, informações

falsas, ele não sabe que essas informações serão conferidas, a intenção é induzir o analista a

aprovar o benefício para a empresa.

O que atrapalha é que existem informações que o analista não tem como conferir, e ele as

utiliza confiando no gerente. Como não existe interação suficiente entre eles, é difícil uma

parte ter alguma percepção da outra, o analista não consegue dizer se o gerente está ou não

sendo honesto, não há troca de emoções.

Seria produtivo se o gerente entendesse o fluxo do processo dentro da GNFP, porém, devido

ao seu ambiente de trabalho, já existe dificuldade para ele entender o seu próprio fluxo.

4.7.2. Interesses

Como o sistema de metas é um sistema do banco, é muito difícil conciliar interesses, pois no

final o importante para o gerente continuará sendo suas metas. O fato de a GNFP ser ciente

dessas metas não ajuda muito, pois se a Folha gera custo, a GNFP não pode ceder o beneficio

só para um gerente atingir sua meta. O que a GNFP faz é tentar ao máximo que o gerente

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51

entenda os motivos desses benefícios serem negados, para isso, sempre que há algum

processo negado a GNFP retornar ao gerente informado o motivo.

Existem sim, muitos interesses em comum, rapidez da negociação, por exemplo, ambas as

partes gostariam que os processos fossem respondidos o mais rápido possível, para isso a

GNFP coloca orientações a disposição dos gerentes, mas conforme dito nas entrevistas, os

gerentes preferem enviar um email à GNFP, questionando o que deve ser feito, do que ler as

orientações em um manual o qual eles têm fácil acesso. Esse ciclo causa desperdício de

tempo, pois enquanto a GNFP está respondendo esse email de questionamento, ela poderia

estar analisando processos.

Nesse caso, o que ajudaria seria um alinhamento de interesses e a elaboração de um plano de

ação que tenha como objetivo otimizar o processo, de acordo com os interesses em comum.

4.7.3. Opções

A GNFP oferece a opção para o gerente pedir uma re-análise do processo, a única solicitação

é que nessa re-análise conste alguma informação adicional, pois senão a mesma não teria

sentido. Essa opção causa uma reação interessante, pois leva o gerente a ir atrás de

informações da empresa, ou seja, algo que ele não levou à GNFP no primeiro momento, ele

leva no segundo momento, porque dessa vez ele está correndo o grande risco de perder

clientes. O gerente não percebe que se ele se dedicasse mais a fornecer informações corretas à

GNFP, essas informações poderiam fazer a diferença em uma análise, que ao invés de ter o

processo negado, o mesmo poderia ser aprovado.

Algo que seria muito interessante nesse caso é uma sessão de sugestões livres entre as partes,

cada área fornece opções de como trabalhar juntos, e sugere como cada uma pode colaborar

com a outra. A intenção é não acomodar, sempre tentar novas opções que ofereçam benefícios

para ambas as áreas, em busca do ganho mútuo.

4.7.4. Critérios

Falta esclarecimento entre as áreas dos critérios que cada uma segue. Como os objetivos

continuarão sendo diferentes, isso pode ao menos facilitar a compreensão entre as áreas e criar

um ambiente mais amistoso e pessoal.

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52

4.8. ÉTICA

Como citado na revisão bibliográfica do trabalho presente, a negociação é uma atividade

dependente da informação. Para maximizar resultados é necessário que as partes tenham

vontade de trocar informações corretas sobre suas prioridades, preferências e interesses. No

caso dos gerentes eles podem querer ocultar certas informações para que o analista não as leve

em consideração na análise.

Aqui podemos perceber o dilema da confiança e o dilema da honestidade, se a GNFP

confiasse no gerente muito tempo seria poupado, pois os analistas não teriam que confirmar

todas as informações passadas com as bases de dados da área. Porém o gerente teme ser dar as

informações corretas, pois tem receio que eles não aprovem os benefícios se souberem de

certas informações da empresa cliente.

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5. CONCLUSÕES

O presente trabalho teve como um dos objetivos revisar conceitos e técnicas de negociação,

além de mostrar a importância da negociação atualmente. O método teórico apresentado e os

conceitos de negociação, ética, comunicação e os fatores que influenciam as negociações,

foram estudado como embasamento para a análise do estudo de caso apresentado.

Para atingir o principal objetivo desse trabalho, que era confrontar a teoria com a prática e

identificar quais as dificuldades de uma negociação considerada ideal na teoria, foi necessário

utilizar algum caso prático que pudesse apontar alguns desses obstáculos.

O estudo de caso foi feito em apenas uma área de uma instituição financeira, ou seja, não há

dúvida de que existem diversas outras dificuldades relacionadas a negociação em todo o

universo empresarial, porém focou-se nos problemas encontrados na área de Negociações de

Folhas de Pagamento (GNFP) do banco.

Mesmo sendo apenas uma pequena área, 14 funcionários, a GNFP lida diariamente com

agências do Brasil inteiro, além das áreas administrativas. Esse fato causa dificuldade em

padronizar o processo de negociação, primeiramente pela enorme diversidade de cultura do

país, e segundo porque há muita troca de cargos dentro dessas agências.

Através de um brainstorm com toda a área, foram levantados os principais pontos

problemáticos da parte de negociação, e seus motivos. Além disso, esses motivos foram

reforçados por meio de entrevistas com analistas e gerentes.

Com os dados obtidos no estudo de caso, percebe-se que para na área comercial do banco (os

gerentes) o que prevalece é o interesse comercial, e que para a área administrativa, no caso a

GNFP, prevalece o interesse comum, do banco. Essa divergência de interesses entre áreas de

uma mesma empresa está relacionada às condições que cada área trabalha. Na área comercial

existe uma concorrência diária entre os funcionários, então eles tendem a agir com foco no

benefício próprio, e não no benefício da corporação. A GNFP possui uma política de trabalho

em equipe muito forte, onde todos têm o mesmo objetivo, que é trazer clientes (Folhas de

empresas) rentáveis para a instituição.

O que era para ser uma negociação rápida, em que ambas as partes deveriam ter os mesmos

interesses, buscando sempre os melhores clientes para o banco, passou a ser uma negociação

difícil e demora devido a divergência incorreta de interesses. Ou seja, o foco deixou de ser no

objeto, que no caso é a rentabilidade do banco, e passou a ser nas pessoas.

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Percebe-se que a negociação é um jogo de interesses. Conhecer os interesses alheios na busca

do interesse em comum é a solução de boa parte dos problemas encontrados na negociação

desse estudo. Ou seja, se fosse claro para os gerentes que todas as informações que eles

passam para a GNFP são confirmadas pelos analistas, os gerentes não enviariam informações

incorretas. Se fosse claro, também, que benefícios só são concedidos para clientes que trazem

rentabilidade para o banco, os gerente não pediriam isenção para clientes que geram custo,

pois saberiam que a mesma seria negada, e que seria perda de tempo, algo que é muito valioso

na área comercial, tempo. Com isso, os gerentes focariam em trazer para o banco apenas

clientes bons (rentáveis), pois teriam certeza que conseguiriam benefícios para esses clientes,

o que facilitaria muito a negociação com a empresa, já que o que a empresa quer é o

benefício. Além disso, o gerente não teria motivos para ocultar da GNFP informações da

empresa, ao contrário, ele passaria todas as informações possíveis para mostrar que a empresa

é rentável, isso otimizaria bastante o processo de análise dos analistas.

Outro ponto importante é que se os gerentes soubessem o tempo que a GNFP gasta apenas

respondendo dúvidas de gerentes, as quais estão explicadas no manual que fica à disposição

de todos, eles evitariam enviar essas perguntas e se preocupariam em ler o manual e entender

o fluxo. A conseqüência seria benéfica para o banco, pois a parte comercial, que sempre se

importou apenas com a quantidade de clientes que o banco possui, começaria a se

comprometer com a qualidade dos clientes, e em longo prazo o número de clientes “bons” no

banco aumentaria, e o de clientes “ruins” diminuiria. E o prazo de análise de um processo, que

hoje leva mais de uma semana, passaria a ser no máximo 4 dias úteis

Portanto, fica claro que, para se chegar a um resultado eficiente e amigável, os gerentes

precisam arrumar meios de enxergarem a GNFP como uma área solucionadora de problemas,

ao invés de uma área adversária, e ambas devem ter interesses convergindo para o interesse da

instituição em que trabalham.

Um processo de negociação ganha-ganha deve ser focado no objeto e não nas pessoas.

Dificuldades sempre irão existir, porém existem aquelas que podem ser resolvidas apenas

fornecendo mais informação e conhecimentos ambas as partes.

Por fim, espera-se que esse trabalho auxilie a todos os negociadores.

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55

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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York:American Management Association, 1993.

BRUYNE, P. et al. Dinâmica da pesquisa em ciências sociais. Os pólos da prática

metodológica. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1997.

COHEN, H. Você pode negociar qualquer coisa. 8ª edição.Rio de Janeiro: Record, 1980.

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Janeiro: Imago, 1994.

GODOY, A. S. Pesquisa Qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de

Empresas. São Paulo, 1995.

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MARTINELLI, D. P., ALMEIDA, A. N. Negociação: como transformar confronto em

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MINAYO, M. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 4.ed. São

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