UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Alan Cristiano...
Transcript of UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALIsiaibib01.univali.br/pdf/Alan Cristiano...
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
CRIMES NA LICITAÇÃO
ALAN CRISTIANO ZIMMERMANN
Orientador: MSc Natan Ben-Hur Braga
Itajaí (SC), novembro de 2008
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
CRIMES NA LICITAÇÃO
ALAN CRISTIANO ZIMMERMANN
Monografia submetida à Universidade
do Vale do Itajaí – UNIVALI , como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Orientador: MSc Natan Ben-Hur Braga
Itajaí (SC), novembro de 2008
ii
Meus Agradecimentos:
A Deus, pela saúde e a dádiva da vida.
Ao meu pai , minha mãe Veneranda
Hostin Zimmermann, pela educação e o
amor a mim dedicados.
A minha esposa Gisele, pelo apoio
incondicional e compreensão nos
momentos difíceis.
Ao meu orientador Prof. MSc. Natan Ben-
Hur Braga, pelo incentivo e atenção.
iii
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de
Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela
graduando Alan Cristiano Zimmermann, sob o título CRIMES NA LICITAÇÃO,
foi submetida em 18 de novembro de 2008 à Banca Examinadora
composta pelos seguintes Professores: MSc Natan Ben-Hur Braga
(Orientador e Presidente da Banca) e MSc Emerson de Moraris Granado
(Membro) e aprovada com a nota (_________).
Itajaí (SC), 18 de novembro de 2008.
Prof. MSc Antônio Augusto Lapa Coordenação de Monografia
Prof. MSc Natan Ben-Hur Braga Orientador e Presidente da Banca
Prof. MSc Emerson de Morais Granado Membro
iv
DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total
responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho,
isentando a Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI, a Coordenação do
Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer
responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), 06 de novembro de 2008.
Alan Cristiano Zimmermann Graduando
v
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ART. Artigo
DEC - LEI Decreto Lei
N. Número
OAB/SC Ordem dos Advogados do Brasil Seção de Santa Catarina
CP Código Penal
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
CEJURPS Centro de Ciências Jurídicas Políticas e Sociais
LLC Lei de Licitações e Contratos
CF Constituição Federal
vi
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................. VIII
INTRODUÇÃO.........................................................................................................1
Capítulo 1 ..................................................................................................................3
NOÇÕES DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA..............................................................3
1.1 ESTADO.............................................................................................................3
1.2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ...................................................................................6
1.3 CONCEITO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ...................................................8
1.4 ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA..........................................9
1.5 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA ...........................................10
1.6 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA................................................11
1.7 CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO ................................16
1.8 PRINCÍPIOS DO SERVIÇO PÚBLICO ..............................................................22
1.9 DIREITOS DO USUÁRIO...................................................................................25
1.10 FORMAS E MEIOS DE PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO........................27
Capítulo 2 ................................................................................................................30
ASPECTOS GERAIS DA LICITAÇÃO.....................................................................30
2.1 CONCEITO .....................................................................................................30
2.2 PREVISÃO LEGAL ...........................................................................................32
2.3 PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO...........................................................................33
2.4 OBJETO DA LICITAÇÃO.................................................................................37
2.6 MODALIDADES DE LICITAÇÃO .....................................................................39
vii
2.7 FASES DA LICITAÇÃO....................................................................................42
Capítulo 3 ................................................................................................................49
CRIMES NA LICITAÇÃO.......................................................................................49
3.1 LEI FEDERAL DAS LICITAÇÕES E CONTRATOS ..............................................49
3.2 CONCEITO E ESPÉCIES DE CRIME .................................................................51
3.3 ELEMENTO SUBJETIVO DO CRIME: DOLO E CULPA ......................................56
3.3 CRIMES PREVISTOS NA LEI DE LICITAÇÃO....................................................58
3.4 DA TENTATIVA E MOMENTO CONSUMATIVO NOS CRIMES LICITATÓRIOS 72
3.5 EXCLUSÃO DA CRIMINALIDADE...................................................................74
3.6 PROCESSO ADMINISTRATIVO E JUDICIAL NOS CRIMES LICITATÓRIOS......76
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................78
REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS ..................................................................80
viii
RESUMO
A presente monografia trata dos crimes previstos na lei
de licitações e contratos administrativos. Para tanto, primeiramente
elaborou-se um breve estudo sobre os aspectos gerais da Administração
Pública e do procedimento licitatório. A expressão Administração Pública,
subordinada aos rigores da lei licitatória, engloba todos os poderes,
legislativo, executivo e judiciário, nas três esferas de governo. A previsão
de condutas criminosas em processos de Licitação, não estão descritos no
Código Penal, mas sim, na Lei Federal de Licitações n. 8666/93, nos artigos
89 a 99, em seção especial que trata dos crimes e das penas. Faz parte do
cotidiano da sociedade brasileira, acompanhar através de imprensa
escândalos envolvendo agentes públicos em desvio de verbas públicas,
mas, infelizmente, impera absoluta a impunidade. Em obediência ao
primordial objetivo desse trabalho, através de estudo da legislação e da
doutrina, verificou-se os tipos penais previstos na lei de licitações.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objeto tecer
Considerações Sobre os Crimes na Licitação, e, como objetivos:
institucional, produzir uma monografia para obtenção do grau de
bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; geral,
elaborar um breve estudo dos aspectos gerais da Administração Pública e
dos procedimentos licitatórios e abordar os crimes previstos na lei de
licitações; específicos, determinar o conceito de Estado; buscar a
evolução histórica da Administração Pública; determinar o conceito de
Administração Pública; verificar os princípios da Administração Pública;
determinar o conceito e buscar a classificação de Serviço Público;
verificar os princípios do Serviço Público; determinar o conceito de
Licitação; verificar os princípios da Licitação; determinar o conceito e
buscar as espécies de crimes; verificar os crimes e as penas previstas na lei
de licitações.
O tema é atual e relevante, pois, já faz parte do
cotidiano da sociedade brasileira, acompanhar através da imprensa,
escândalos envolvendo agentes públicos em desvio de verbas e
infelizmente não vimos esses agentes sofrerem punições adequadas,
apontando para o fato de que algumas condutas criminosas, previstas na
lei, não estão atendendo aos anseios de justiça da sociedade.
Para encetar a investigação adotou-se o método
indutivo, operacionalizado com as técnicas do referente, da categoria,
dos conceitos operacionais e da pesquisa de fontes bibliográficas. Para
relatar os resultados da pesquisa, empregou-se o modo de relato
descritivo, em conjunto com as técnicas propostas por Colzani [in Guia
para redação do trabalho científico, 2001].
A pesquisa foi desenvolvida tendo como base as
2
seguintes hipóteses: a) a Administração Pública rege-se por princípios e
regras do Direito Público e supletivamente pelas regras de Direito Privado;
b) as licitações devem seguir os princípios constitucionais que norteiam o
desenvolvimento das suas atividades, sob pena de restar ferido o Interesse
Público como meta principal de todos os anseios dos administrados; c) as
sanções de direito substancial previstas na Lei das licitações, são
convenientes e adequados aos tipos penais por ela enumerados.
O trabalho foi dividido em três capítulos. No Primeiro
Capítulo aborda-se as noções elementares da Administração Pública e do
Serviço Público.
O segundo Capítulo, trata-se dos aspectos gerais da
Licitação, seus objetivos, modalidades e fases.
No terceiro e último capítulo, estuda-se os Crimes na
Licitação, com uma abordagem individual de todos os artigos que tratam
dos Crimes na Licitação.
Nas considerações finais apresenta-se breves sínteses
de cada capítulo e demonstra-se se as hipóteses básicas da pesquisa
foram ou não confirmadas.
3
Capítulo 1
NOÇÕES DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
1.1 ESTADO
O conceito de Estado tem sugerido as mais variadas
definições, segundo a ótica da ciência que o procura definir.1
A Teoria Geral do Estado, no entanto, registra quatro
posições distintas sobre o Estado, conforme dispõe Pereira2:
Primeira, a Teoria do Direito Divino, em que o Estado surge
como ato da vontade de Deus. O poder real é fruto da
vontade divina; revoltar-se contra o rei equivale a revoltar-
se contra Deus; segunda, a Teoria Naturalista, que sustenta
ter o Estado origens na própria natureza; terceira, a Teoria
da Força, na qual se concebe o Estado por meio da
violência; e, quarta, a Teoria Contratualista, que prega ser o
Estado uma criação deliberada dos homens.
Para Meirelles3, o conceito de Estado varia segundo o
ângulo em que é considerado.
Do ponto de vista sociológico, é corporação territorial
dotada de um poder de mando originário (Jellinek); sob o
aspecto político, é comunidade de homens, fixada sobre
um território, com potestade superior de ação, de mando e
de coerção (Malberg); sob o prisma constitucional, é
pessoa jurídica territorial soberana (Biscaretti di Ruffia); na
conceituação de nosso Código Civil, é pessoa jurídica de
Direito Público Interno (art. 41, I).
Como ente personalizado, o Estado tanto pode atuar
1 PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Reforma administrativa, p. 15.
2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 60.
3 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 60.
4
no campo do Direito Público como no Direito Privado, mantendo sempre
sua única personalidade de Direito Público, pois a teoria da dupla
personalidade do Estado acha-se definitivamente superada.4
Segundo Meirelles5, esse é o Estado de Direito, ou seja,
o Estado juridicamente organizado e obediente às suas próprias leis.
São apontados três elementos existenciais do Estado:
território, povo e governo, os quais Pereira6, ensina.
Território é a fração delimitada em que o Estado se
mantém, com a sua população e seus órgãos
competentes. A população é o agrupamento de indivíduos
(nacionais ou não) que vivem dentro de suas fronteiras. A
população pode ser entendida em dois conceitos: o
demográfico e o político. Aquele prende-se ao número de
indivíduos que vivem nos limites territoriais do Estado. Esse,
ao conjunto de homens unidos ao Estado por vínculo
jurídico-político: nacionalidade. Governo é a organização
política permanente, ou seja, é a autoridade a que se acha
submetida à população estabelecida no território do
Estado.
Para Meirelles7, o Governo soberano é o elemento
condutor do Estado, que detém e exerce o poder absoluto de
autodeterminação e auto-organização emanado do Povo.
O Estado é instituição que concentra poder e que o
exerce sobre pessoas e bens. A soma dos poderes reunidos no Estado
denomina-se poder estatal, que, por atender a serviços públicos, também
se denomina poder público.8
4 MEIRELLES, Hely Lopes. et al. Direito administrativo brasileiro, p. 60.
5 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 60.
6 PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Reforma administrativa , p. 16.
7 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 60.
8 CARLIN, Volnei Ivo. Direito Administrativo, p. 40.
5
Não há, nem pode haver Estado independente sem
Soberania, isto é, sem esse poder absoluto, indivisível e incontrastável de
organizar-se e de conduzir-se segundo a vontade livre de seu Povo e de
fazer cumprir as suas decisões inclusive pela força, se necessário.9
A atividade do Estado se processa mediante o pessoal
(governantes e agentes públicos de diversas espécies) e os recursos a ela
destinados. Para remunerar os indivíduos a seu serviço e manter os serviços
públicos de sua competência, o Estado precisa de recursos regulares,
obtidos dos cidadãos por meio de tributos.10
Para Pereira11, sendo a própria nação politicamente
organizada, representa o Estado o órgão normativo, disciplinador de
elementos sociais.
O Estado é então o meio pelo qual a nação procura atingir
seus fins. Não pode possuir fins outros que não sejam os da
nação que lhe dá causa. Os fins do Estado são os da
comunidade, e o Estado não é um fim em si mesmo, nem
pode ter objetivos próprios por ele mesmo estabelecidos em
discrepância com os fim almejados pelo agrupamento
humano.
Assim, o Estado não é o fim do homem; mas sua missão
é ajudar o homem a conseguir o seu fim.12
9 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 60.
10 PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Reforma administrativa, p. 33.
11 PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Reforma administrativa , p. 33.
12 PEREIRA, Cláudia Fernanda de Oliveira. Reforma administrativa , p. 34.
6
1.2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
De acordo com os ensinamentos de Cretella Júnior13:
A administração existe desde os primórdios da humanidade,
porque não há grupo algum sem chefe ou líder que exerce
o papel de subordinante sobre um conjunto de
subordinados. Administração no entanto, não se confunde
com direito administrativo, do mesmo modo que o objetivo
de uma ciência não se confunde com a própria ciência.
Ora, a atividade, a tarefa de administrar é tão velha como
a Humanidade, mas a disciplina que trata dessa atividade
não conta com mais de 150 anos.
Conforme também ensina Friede14:
O Estado evoluiu da Antigüidade onde era detectada a
presença do governo único, Antigüidade oriental, Império
persa; o surgimento das cidades-Estados, Antigüidade
clássica, Império grego; e o início do desenvolvimento da
administração estatal, Antigüidade ocidental, Império
romano, passando pela Idade Média marcada pelo regime
feudal, pelo surgimento das comunas e cidades, pela
concentração de riquezas e pelo predomínio do direito
romano.
Segundo Cretella Júnior15, na Grécia antiga, existiam
instituições destinadas à proteção da ordem interna e externa e, dos
interesses coletivos dos mais importantes cidadãos. Então, havia um direito
administrativo na Grécia, embora não houvesse uma conscientização
desse direito administrativo.
De acordo com Cretella Júnior16, se costuma dizer que
13 CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito administrativo, p. 25-26.
14 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 1.
15 CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito administrativo, p. 26.
16 CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito administrativo, p. 27.
7
os romanos foram os pigmeus do direito público, e gigantes do direito
privado. As institutas de Justiniano tratam, dentre outros temas de direito
público, dos terrenos de marinha, dos acrescidos aos de marinha, das
coisas comuns, das coisas públicas, das obras públicas, dos ofícios
públicos e dos curadores.
A Administração Pública na Idade Média,
denominada, sem razão, de à noite de mil anos é o período que vai desde
476 depois de Cristo até a data simbólica de 1453, ano que
Constantinopla foi tomada pelos turcos. 17
Para Cretella Júnior18, o Direito Administrativo na Idade
Média é divido em dois períodos, o período feudal e o período comunal:
No período feudal prevaleceu o governo arbitrário e
patrimonial, não oferecendo condições para o
funcionamento de sistema governado por leis
administrativas. A autoridade central era desorganizada
administrativamente e não mantinha relações com as
autoridades vizinhas. O período comunal surgiu no
despontar do século XII, com a revolução das comunas ou
municípios. Por influência dos burgueses e das corporações
de artes e ofícios, os municípios ou burgos cresceram e
organizaram uma administração pública democrática, cuja
estruturação correspondia à importância da comuna.
Muitas alianças foram feitas, objetivando os interesses
regionais ou provinciais.
Passando o Estado da Idade Média e :
Chegando a Idade Moderna, onde se deu a evolução do
Estado Absolutista, caracterizado pelo poder ilimitado do
rei, com a organização das primeiras regras administrativas;
para o Estado liberal, caracterizado pela sujeição do Estado
ao império da lei e criador do direito administrativo, e para
o Estado intervencionista, onde o desenvolvimento do
17 CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito administrativo, p. 27.
18 CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito administrativo, p. 28.
8
direito administrativo se acelerou em face das múltiplas
atividades que o Estado passou a exercer.19
Segundo Friede20, no Estado contemporâneo, o poder-
dever integrou a essência do Estado, ao lado do cidadão, titular de
direitos, cabendo ao direito administrativo como regramento para a
Administração Pública a busca do equilíbrio harmônico entre deveres do
Estado de um lado e os direitos do cidadão de outro.
1.3 CONCEITO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A Constituição de 1988, em seu artigo 37, estabelece
os princípios que a Administração Pública deverá seguir no
desenvolvimento das suas atividades:
A Administração Pública direta e indireta de qualquer
dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência, também ao seguinte.21
A expressão Administração Pública22 no dispositivo
constitucional denota sentido amplo e é dirigida aos três poderes,
legislativo, executivo e judiciário.
Administração Pública, para Friede, à luz do direito
administrativo, é exatamente o de atividade que o Estado desenvolve, por
19 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 1-2.
20 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 2.
21 BRASIL. Constituição da república federativa do Brasil, p. 48.
22 No Direito Administrativo, o termo Administração Pública tem a mesma acepção do vocábulo Administração, corresponde exatamente ao vocábulo Administração Pública, sendo, para efeitos do direito administrativo sinônimos, abrangendo aqui a categoria Estado.
9
meio de seus órgãos, para a consecução do interesse público.23
Di Pietro24, entende que o termo Administração
Pública, tanto abrange a atividade de planejar, dirigir, comandar, como
atividade subordinada de executar.
Em sentido material ou objetivo, a Administração Pública
pode ser definida como a atividade concreta e imediata
que o Estado desenvolve, sob regime jurídico de direito
público, para a consecução dos interesses coletivos. Em
sentido subjetivo, como o conjunto de órgãos e pessoas
jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função
administrativa do Estado.25
Segundo Di Pietro26, são dois os sentidos em que mais
se utiliza a expressão Administração Pública: a) em sentido subjetivo,
formal ou orgânico; b) em sentido objetivo, material ou funcional.
1.4 ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A Constituição de 1988 trata da organização da
Administração Pública nos artigos 37 a 43.
Para Gasparini27 , a organização do Estado é matéria
constitucional, cabendo ao Direito Constitucional discipliná-la, enquanto a
criação, estruturação, alteração e atribuições das competências dos
órgãos da Administração Pública são temas de natureza administrativas,
cuja normatização é de alçada do Direito Administrativo.
23FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 15.
24 DI PIETRO,Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 53.
25 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 61 - 62.
26 DI PIETRO,Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo , p. 54.
27 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 41.
10
De acordo com Carlin28 , o texto constitucional é que
determina as atribuições e os caracteres, em matéria administrativa, de
cada esfera do poder. Desta forma, os Estados são regidos por um sistema
criado pela lei, mediante poderes delegados pela União, de natureza
política, econômica e legislativa.
Segundo Gasparini29, a instituição, estruturação,
alteração e atribuição de competência aos órgãos da Administração
Pública só podem ser alcançadas por lei.
Conforme Carlin30 , o Decreto-Lei n.200/67 objetivou
fixar diretrizes e princípios que propiciem funcionalidade e dinamismo à
Administração Pública federal. Classifica a Administração em direta e
indireta, estruturando a primeira.
1.5 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA
O Dec-Lei nº 200, de 25.02.67, modificado pela Lei
Federal 8.029/90, que dispõe sobre a Reforma Administrativa da União,
dividida em Administração Direta e Indireta.
Na Administração Pública direta, o Estado é identificado
como uma efetiva pessoa administrativa (possui a condição
de sujeito ativo da função administrativa). A organização
estatal, em particular, tem conotação típica, respaldando-
se, em essência, no princípio maior da hierarquia, que
vincula, em patamares diversos órgãos administrativos.31
28 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 86 - 87.
29 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 41.
30 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo , p. 87.
31 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 128.
11
Para Carlin32, a direta consiste dos serviços integrados
na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios,
atualmente regulamentada pela Lei n. 9.649/98, bem como da
organização das esferas estaduais, municipais e do Distrito Federal.
No entendimento de Friede33,
Na Administração Pública indireta, diversamente da
Administração Pública direta, vamos detectar a existência
de pessoas administrativas, dotadas de sua própria
personalidade jurídica e que atuam iure próprio, integrando
relações jurídicas e não se confundindo com a pessoa
estatal criadora. Tais entidades são autônomas, vinculando-
se à Administração direta por uma espécie de ponte,
percorrida pela Administração Pública com o objetivo de
supervisão e acompanhamento e por isso sem tônica do
autoritarismo.
De acordo Friede34, a Constituição de 1988, art. 37 XIX,
criou as pessoas jurídicas que constituem a Administração Pública indireta;
as autarquias, que têm personalidade de direito público, as fundações
que a sua constituição legal pode ter personalidade jurídica de Direito
Público ou Privado, as empresas públicas e as sociedades de economia
mista, que têm personalidade de direito privado.
1.6 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O já citado art. 37 da Constituição de 1988, relaciona
os princípios da Administração Pública.
Além dos princípios relacionados na Constituição de
32 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo , p. 87.
33 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 128.
34 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 129.
12
1988, a doutrina acrescenta outros de fundamental importância, que
colaboram para que a atividade administrativa seja o mais transparente e
idônea possível.
Elabora-se um breve comentário sobre cada um dos
princípios da Administração Pública:
a) Princípio da legalidade – a legalidade é a projeção
administrativa do princípio do Estado de Direito. Quem administra densifica
a lei. A lei é o suporte e o limite do exercício administrativo.35
Fazzio Júnior36, também ensina:
Em síntese, governam as leis. Por isso, quem administra só
pode fazer o que a lei determina. O secundum legem é a
norma. Em outras palavras, materializar a vontade da lei é a
vocação congênita da Administração, em todos os níveis. A
legalidade preside tanto a atividade administrativa típica
(direta e indireta do Executivo) como a atípica (Legislativo e
Judiciário). Desse princípio deriva a presunção relativa de
legalidade dos atos praticados pela Administração Pública.
b) Princípio da impessoalidade – Para Gasparini37, a
atividade administrativa deve ser destinada a todos os administrados,
dirigida aos cidadãos em geral, sem determinação de pessoa ou
discriminação de qualquer natureza.
Segundo Fazzio Júnior38, o princípio da impessoalidade
determina que:
Os atos praticados pela Administração Pública sejam
abstratamente genéricos e isonômicos, sem consagrar
privilégios ou situações restritivas injustificadas; e por outro
lado, devam ser sempre atribuídos à entidade ou órgão que
35 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 18.
36 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 18 - 19.
37 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 8.
38 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo , p. 21.
13
os titula, não ao agente público que os pratica.
c) Princípio da moralidade – Segundo Gasparini39, o
ato e a atividade da Administração Pública devem obedecer não só a lei,
mas à própria moral, porque nem tudo que é legal é honesto.
A moralidade administrativa está intimamente ligada ao
conceito do bom administrador, aquele que, usando de sua
competência, determina-se não só pelos preceitos legais
vigentes, como também pela moral comum, propugnando
pelo que for melhor e mais útil para o interesse público.40
d) Princípio da publicidade – De acordo com Di
Pietro41, o princípio da publicidade exige ampla divulgação pela
Administração Pública, ressalvas as hipóteses de sigilo previstas em lei.
Conforme Gasparini42, este princípio torna obrigatória à
divulgação de atos, contratos e outros instrumentos celebrados pela
Administração Pública direta e indireta, para conhecimento, controle e
início de seus efeitos.
e) Princípio da finalidade – Os atos da Administração
Pública devem objetivar o interesse público, o bem comum.
Por esse princípio impõe-se à Administração Pública a
prática, e tão-só essa, de atos voltados para o interesse
público. O afastamento da Administração Pública da
finalidade do interesse público denomina-se desvio de
finalidade. [...] Assim, o ato que favorece ou persegue
interesses particulares é nulo por desvio de finalidade ou por
propugnar fim diverso daquele previsto.43
39 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 9.
40 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 9.
41 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 75.
42 GASPARINI, Diogenes. . Direito administrativo , p. 10.
43 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 13.
14
f) Princípio da continuidade – Para Gasparini44, os
serviços públicos não podem parar, porque não param os anseios da
coletividade. Os desejos dos administrados são contínuos. Daí dizer-se que
a atividade da Administração Pública é ininterrupta.
De acordo com o princípio da continuidade, para
Fazzio Júnior45, a atividade encetada pelo Poder Público não deve sofrer
solução de continuidade, a fim de não prejudicar o interesse maior da
sociedade.
g) Princípio da indisponibilidade – O patrimônio público
deve ser preservado e sua gestão obedece aos ditames da lei.
Não se acham, segundo esse princípio, os bens, direitos,
interesses e serviços públicos à livre disposição dos órgãos
públicos, a quem apenas cabe curá-los, ou do agente
público, mero gestor da coisa pública. O detentor dessa
disponibilidade é o Estado. Por essa razão há necessidade
de lei para alienar bens, para outorgar concessão de
serviço público, para transigir, para renunciar, para
confessar, para revelar a prescrição e para tantas outras
atividades a cargo dos órgãos e agentes da Administração
Pública.46
h) Princípio da autotutela – Segundo Gasparini47, a
Administração Pública está obrigada a policiar, em relação ao mérito e à
legalidade, os atos administrativos que pratica.
Para Friede48, as autoridades administrativas
concentrarão seus esforços no sentido do policiamento dos próprios atos e
dos bens públicos.
44 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 15.
45 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 26.
46 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 16.
47 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 17.
48 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 17.
15
i) Princípio da supremacia do interesse público –
Segundo Di Pietro49, este princípio serve de fundamento para todo o
direito público e vincula a Administração em todas as suas decisões, os
interesses públicos têm supremacia sobre os individuais.
Conforme Gasparini50, a aplicabilidade desse princípio,
por certo, não significa o total desrespeito ao interesse privado, já que a
Administração deve obediência ao direito adquirido, à coisa julgada, e
ao ato jurídico perfeito.
j) Princípio da igualdade - O art. 5º. da Constituição de
1988, estabelece que, sem distinção de qualquer natureza, todos são
iguais perante a lei.
De acordo com Gasparini51, todos os iguais em face
da lei também o são perante a Administração Pública. Todos, portanto,
têm o direito de receber da Administração Pública o mesmo tratamento,
se iguais. Se iguais nada pode discriminá-los. Impõe-se aos iguais, por esse
princípio, um tratamento impessoal, igualitário ou isonômico.
k) Princípio da eficiência – Pela Emenda constitucional
19/98, esse princípio ganhou status constitucional.
Para Gasparini52, o princípio da eficiência impõe à
Administração Pública direta e indireta a obrigação de realizar suas
atribuições com rapidez, perfeição e rendimento, além, por certo, de
observar outras regras.
l) Princípio da motivação – Este princípio apresenta-se
de suma importância para o administrado e, impõe ao agente público,
49 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo , p. 69.
50 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 18.
51 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 18.
52 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo , p. 19.
16
uma correta justificação acerca dos atos e atividades concretizadas.
O princípio da motivação exige que a Administração
Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas
decisões. Ele está consagrado pela doutrina e
jurisprudência, não havendo mais espaço para as velhas
doutrinas que discutiam se a sua obrigatoriedade
alcançava só os atos vinculados ou só os atos
discricionários, ou se estava presente em ambas as
categorias.53
Como exemplo, se para aquisição de determinado
bem ou serviço, for dispensada a Licitação, essa deverá ser
fundamentada rigorosamente nas possibilidades descritas no texto do art.
24 da Lei 8.666/93.
1.7 CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO
A Constituição Federal dispõe expressamente que
incumbe ao Poder Público, na forma da lei, a prestação de serviços
públicos.54
Art. 175 - Incumbe ao Poder Público, na forma da lei,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,
sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
A doutrina oferece uma série de definições para
Serviço Público, que variam conforme o critério em que estão baseadas.55
Segundo Meirelles56, não é uniforme o conceito de
53 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 82.
54 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro ,p. 328.
55 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 147.
56 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro ,p. 329.
17
Serviço Público:
O conceito de Serviço Público não é uniforme na doutrina,
que ora nos oferece uma noção orgânica, só considerando
como tal o que é prestado por órgãos públicos; ora nos
apresenta uma conceituação formal, tendente a identificá-
lo por características extrínsecas; ora nos expõe um
conceito material, visando a defini-lo por seu objeto.
De acordo com Meirelles57, Serviço Público é todo
aquele prestado pela Administração Pública ou por seus delegados, sob
normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou
secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado.
Di Pietro58, define Serviço Público como toda atividade
material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por
meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às
necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público.
Para Figueiredo59, Serviço Público é toda atividade
fornecida pelo Estado, ou por quem esteja a agir no exercício da função
administrativa, se houver permissão constitucional e legal para isso, com o
fim de implementação de deveres consagrados constitucionalmente
relacionados à utilidade pública, que deve ser concretizada, sob regime
prevalente do Direito Público.
Levando-se em conta a essencialidade, a adequação,
a finalidade e os destinatários dos serviços, podemos classificá-los em:
públicos e de utilidade pública; próprios e impróprios do Estado;
administrativos e industriais; uti universi e uti singuli.60
57 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro ,p. 329.
58 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo , p. 98.
59 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo ,p. 71.
60 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro ,p. 330.
18
Conforme leciona Meirelles61, serviços públicos
propriamente ditos:
São os que a Administração presta diretamente à
comunidade, por reconhecer sua essencialidade e
necessidade para a sobrevivência do grupo social e do
próprio Estado. Por isso mesmo, tais serviços são
considerados privativos do Poder Público, no sentido de que
só a Administração deve prestá-los, sem delegação a
terceiros, mesmo porque geralmente exigem atos de
império e medidas compulsórias em relação aos
administrados. Exemplos desses serviços são os de defesa
nacional, os de polícia, os de preservação da saúde
pública.
Para Friede62, são considerados indelegáveis, portanto,
os serviços públicos propriamente ditos (serviços públicos próprios), que
recebem do Estado o atributo da essencialidade, uma vez que são
entendidos como vitais à sobrevivência da comunidade, recebendo a
alcunha de serviços pró-comunidade.
Os Serviços de utilidade pública, de acordo com
Meirelles63 são:
Os que a Administração, reconhecendo sua conveniência
(não essencialidade, nem necessidade) para os membros
da coletividade, presta-os diretamente ou aquiesce em que
sejam prestados por terceiros (concessionários,
permissionários ou autorizatários), nas condições
regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco
dos prestadores, mediante remuneração dos usuários. São
exemplos dessa modalidade os serviços de transporte
coletivo, energia elétrica, gás, telefone.
São considerados delegáveis, por outro lado, os
61 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 330.
62 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 148.
63 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p 330 - 331.
19
serviços públicos chamados de utilidade pública (serviços públicos
impróprios), que tanto podem ser executados pelo Estado como por
particulares, visto não merecerem a qualidade de essenciais,
reconhecendo-se apenas a sua conveniência para os membros da
comunidade.64
Conforme Meirelles65, os serviços próprios do Estado:
São aqueles que se relacionam intimamente com as
atribuições do Poder Público (segurança, polícia, higiene e
saúde públicas etc.) e para a execução dos quais a
Administração usa da sua supremacia sobre os
administrados. Por esta razão, só devem ser prestados por
órgãos ou entidades públicas, sem delegação a
particulares. Tais serviços, por sua essencialidade,
geralmente são gratuitos ou de baixa remuneração, para
que fiquem ao alcance de todos os membros da
coletividade.
No mesmo sentido, Meirelles66, dispõe que os Serviços
impróprios do Estado:
São os que não afetam substancialmente as necessidades
da comunidade, mas satisfazem interesses comuns de seus
membros, e, por isso, a Administração os presta
remuneradamente, por seus órgãos ou entidades
descentralizadas (autarquias, empresas públicas,
sociedades de economia mista, fundações
governamentais), ou delega sua prestação a
concessionários, permissionários ou autorizatários. Esses
serviços, normalmente, são rentáveis e podem ser realizados
com ou sem privilégio (não confundir com monopólio), mas
sempre sob regulamentação e controle do Poder Público
competente.
No que concerne a sua finalidade, pode-se classificar
64 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo , p. 149.
65 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 331.
66 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 331.
20
os serviços públicos em serviços administrativos e serviços industriais.67
De acordo com Friede68, serviços administrativos são
aqueles direcionados à execução de atividades internas da
Administração, tendentes a satisfazer suas necessidades ou àqueles que
visem a serem prestados ao público.
Para Meirelles69, serviços administrativos são os que a
Administração executa para atender a suas necessidades internas ou
preparar outros serviços que serão prestados ao público, tais como os da
imprensa oficial, das estações experimentais e outros dessa natureza.
Já os serviços industriais são os serviços impróprios do
Estado, prestados, normalmente, por particulares, visto referirem-se a
atividades econômicas, geradoras de renda a seus prestadores. Sua
remuneração é fixada pelo Poder Público, e recebe a denominação de
tarifa (preço público).70
No entendimento de Meirelles71, os serviços industriais
são:
Os que produzem renda para quem os presta, mediante a
remuneração da utilidade usada ou consumida,
remuneração, esta, que, tecnicamente, se denomina tarifa
ou preço público, por ser sempre fixada pelo Poder Público,
quer quando o serviço é prestado por seus órgãos ou
entidades, quer quando por concessionários, permissionários
ou autorizatários. Os serviços industriais são impróprios do
Estado, por consubstanciarem atividade econômica que só
poderá ser explorada diretamente pelo Poder Público
quando necessária aos imperativos da segurança nacional
67 FRIEDE, R. Lições objetivas de Direito Administrativo , p. 149.
68 FRIEDE, R. Lições objetivas de Direito Administrativo , p. 149.
69 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 331.
70 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 149.
71 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 332.
21
ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei
(CF, art. 173).
Quanto a seus destinatários, os serviços públicos
podem ser classificados em serviços uti universi (fruição coletiva) e serviços
uti singuli (fruição individual).72
Serviços uti universi ou gerais segundo Meirelles73:
São aqueles que a Administração presta sem ter usuários
determinados, para atender à coletividade no seu todo,
como os de polícia, iluminação pública, calçamento e
outros dessa espécie. Esses serviços satisfazem
indiscriminadamente a população, sem que se erijam em
direito subjetivo de qualquer administrado à sua obtenção
para seu domicílio, para sua rua ou para seu bairro. Estes
serviços são indivisíveis, isto é, não mensuráveis na sua
utilização. Daí por que, normalmente, os serviços uti universi
devem ser mantidos por imposto (tributo geral), e não por
taxa ou tarifa, que é remuneração mensurável e
proporcional ao uso individual do serviço.
Para Di Pietro74, os serviços uti universi são prestados à
coletividade, mas usufruídos apenas indiretamente pelos indivíduos.
Nesse sentido, também ensina Friede75:
Os serviços uti universi são aqueles destinados a servir a
coletividade como um todo, não podendo, pois, ser
mensurados na utilização individual de seus membros. Esses
serviços não podem ser reclamados por qualquer
administrado no sentido de obtê-los, para si ou para certo
local, através de exigência à Administração, pelo simples
fato de não gerarem qualquer direito subjetivo à sua
obtenção, esvaziando, conseqüentemente, uma possível
via judicial de cobrança. São exemplos de serviços uti 72 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 150.
73 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 332.
74 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 105.
75 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 150.
22
universi os serviços de iluminação pública e de polícia, que,
em regra, deverão ser mantidos por impostos (tributos).
Serviços uti singuli são aqueles que têm por finalidade a
satisfação individual e direta das necessidades dos cidadãos.76
Por sua vez, Friede77 ensina que os serviços uti singuli:
são aqueles que podem ser mensurados na sua utilização,
dada a possibilidade de se determinar seus usuários, sendo
certo, nesse aspecto, que, quando implantados, um
administrado, que esteja em local de sua prestação e
satisfaça as exigências relativas ao seu fornecimento,
poderá reclamá-los para si, valendo-se da ação de
preceito cominatório previsto no art. 287 do Código de
Processo Civil, considerando constituírem atividades
geradoras de direito subjetivo à sua obtenção, observável
nos serviços de água, telefone e energia elétrica domiciliar.
São sempre serviços de utilização individual, facultativa
e mensurável, pelo quê devem ser remunerados por taxa (tributo) ou tarifa
(preço público), e não por imposto.78
1.8 PRINCÍPIOS DO SERVIÇO PÚBLICO
No desempenho de sua função congênita de servir, a
Administração Pública deve ter em vista três princípios reitores, a saber:
indisponibilidade do interesse público; continuidade na prestação dos
serviços; e aperfeiçoamento de sua execução.79
A indisponibilidade do interesse público é ínsita,
76 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 104.
77 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 150.
78 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 332.
79 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 110.
23
indispensável à própria função administrativa, também é essencial à
atividade de prestação de utilidade pública fruível pelo administrado. Não
pode a Administração omitir-se de sua competência.80
Para Friede81, os princípios informativos do Serviço
Público são os da continuidade, da generalidade e do aperfeiçoamento.
O princípio da continuidade do Serviço Público, em
decorrência do qual o serviço público não pode parar, tem aplicação
especialmente com relação aos contratos administrativos e ao exercício
da função pública.82
Para Figueiredo83, é o princípio da continuidade, que
não suporta interrupções ou suspensões. Este princípio, sem sombra de
dúvida, estaria a conflitar aparentemente com o direito de greve
estabelecido no texto constitucional.
Já o princípio da generalidade resume-se na
prestação igualitária dos serviços a todos os membros da coletividade.
Para isso, deve tornar-se acessível, através da modicidade de seus preços,
para que sejam utilizados por quem quer que deles necessite.84
Segundo Di Pietro85, é pelo princípio da igualdade dos
usuários perante o Serviço Público, desde que a pessoa satisfaça às
condições legais, ela faz jus à prestação do serviço, sem qualquer
distinção de caráter pessoal.
Finalmente, o princípio do aperfeiçoamento
fundamenta-se na necessidade de se reverter os avanços da tecnologia
80 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo, p. 74.
81 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 152.
82 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 105.
83 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo, p. 74.
84 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 152.
85 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 102.
24
em prol da coletividade, fazendo com que seus benefícios seja absorvidos
pelo Serviço Público constantemente, afastando, assim, o perigo de se
tornarem obsoletos.86
O princípio da mutabilidade do regime jurídico ou da
flexibilidade dos meios aos fins autoriza mudanças no regime de execução
do serviço para adaptá-lo ao interesse público, que é variável no tempo.87
Para Meirelles88, os requisitos do Serviço Público ou de
utilidade pública são sintetizados, modernamente, em cinco princípios que
a Administração deve ter sempre presentes, para exigi-los que quem os
preste:
o princípio da permanência impõe continuidade no serviço;
o da generosidade impõe serviço igual para todos; o da
eficiência exige atualização do serviço; o da modicidade
exige tarifas razoáveis; e o da cortesia traduz-se em bom
tratamento para com o público.
Na prestação dos Serviços Públicos, tanto a
Administração direta como a indireta devem atentar para algumas
características de adequação, tais como a regularidade, a segurança, a
modernidade, a generalidade e, principalmente, a modicidade na
estipulação de preços públicos. É que o usuário tem o direito de receber
serviços adequados.89
86 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 152.
87 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 101.
88 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 334.
89 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 110.
25
1.9 DIREITOS DO USUÁRIO
Para que se possa conhecer os direitos dos usuários,
faz-se necessário à conceituação de serviço adequado.
Para Fazzio Júnior90, serviço adequado é o que satisfaz
às condições de regularidade, continuidade, eficiência, atualidade,
generalidade, cortesia em sua prestação e modicidade das tarifas. Toda
concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao
pleno atendimento dos usuários.
Os direitos do usuário são, hoje, reconhecidos em
qualquer Serviço Público ou de utilidade pública com fundamento para a
exigibilidade de sua prestação nas condições regulamentares e em
igualdade com os demais utentes.91
Segundo Fazzio Júnior92, são direitos e obrigações dos
usuários:
receber serviço adequado; receber do poder concedente
e da concessionária informações para a defesa de
interesses individuais ou coletivos; obter e utilizar o serviço,
com liberdade de escolha entre vários prestadores de
serviços, quando for o caso, observadas as normas do
poder concedente; levar ao conhecimento do poder
público e da concessionária as irregularidades de que
tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado;
comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos
praticados pela concessionária na prestação do serviço;
contribuir para a permanência das boas condições dos
bens públicos por meio dos quais lhes são prestados os
serviços.
90 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 112.
91 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 334.
92 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 112.
26
Para Meirelles93, não só a obtenção do serviço, como
também, sua regular prestação constituem direito do
usuário. Desde que instalado o equipamento necessário,
responde o prestador pela normalidade do serviço e se
sujeita às indenizações de danos ocasionados ao usuário
pela suspensão da prestação devida ou pelo mau
funcionamento.
Tratando-se de serviço prestado diretamente pelo
Poder Público, responde a entidade prestadora pelos prejuízos
comprovados, independentemente de culpa de seus agentes, visto que a
constituição vigente estabelece a responsabilidade objetiva pelos danos
causados pela Administração aos administrados.94
Quanto aos que realizam serviços por delegação do
Poder Público, incumbe-lhes também as mesmas obrigações de
prestação regular aos usuários e, conseqüentemente, os mesmos
encargos indenizatórios que teria o Estado se os prestasse diretamente,
inclusive a responsabilidade objetiva pelos danos causados a terceiros.95
Segundo Meirelles96, essa responsabilidade é sempre
da entidade (autárquica ou paraestatal), da empresa ou da pessoa física
que recebeu a delegação para executar o serviço (concessionário,
permissionário ou autorizatário), sem alcançar o Poder Público, que
transfere a execução com todos os seus ônus e vantagens.
93 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 335 - 336.
94 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 336.
95 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 336.
96 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 336.
27
1.10 FORMAS E MEIOS DE PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO
A prestação dos Serviços (Públicos ou de utilidade
pública) poderá ter, em princípio, a forma centralizada e descentralizada,
e, quanto ao meio de execução, poderá ainda ser direta e indireta.97
Conforme Meirelles98, serviço centralizado é o que o
Poder Público presta por seus próprios órgãos em seu nome e sob sua
exclusiva responsabilidade. Em tais casos o Estado é, ao mesmo tempo,
titular e prestador do serviço, que permanece integrado na agora
denominada Administração direta.
O serviço centralizado poderá ser concentrado ou
desconcentrado. O primeiro se verifica quando a prestação do serviço se
dá por apenas um órgão. Já o serviço desconcentrado, visando a
simplificação e aceleração na sua prestação, é distribuído por vários
órgãos da mesma entidade.99
Serviço descentralizado é todo aquele em que o Poder
Público transfere sua titularidade ou, simplesmente, sua execução, por
outorga ou delegação, a autarquias, fundações, empresas estatais,
empresas privadas ou particulares individualmente e, agora, aos
consórcios públicos.100
Há outorga quando o Estado cria uma entidade e a
ela transfere, por lei determinado serviço público ou de utilidade
pública.101
97 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 153.
98 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 340.
99 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 153 - 154.
100 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 340.
101 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 341.
28
Já o Serviço Público delegado é aquele transferido
através de ato administrativo bilateral (concessão) ou unilateral (permissão
e autorização), motivo pelo qual poderá ser revogado, modificado ou
anulado, e onde sua transferência tem sempre caráter temporário.102
Conforme ensina Meirelles103:
A delegação é menos que outorga, porque traz uma
presunção de definitividade e aquela de transitoriedade,
razão pela qual os serviços outorgados o são, normalmente,
por tempo indeterminado e os delegados por prazo certo,
para que ao seu término retornem ao delegante. Mas em
ambas as hipóteses o serviço continua sendo público ou de
utilidade pública, apenas descentralizado, contudo sempre
sujeito aos requisitos originários e sob regulamentação e
controle do Poder Público que os descentralizou.
Os serviços centralizados, descentralizados ou
desconcentrados admitem execução direta ou indireta, porque isto diz
respeito à sua implantação e operação, e não a quem tem a
responsabilidade pela sua prestação ao usuário.104
Segundo Friede105, a execução direta do Serviço
Público realiza-se quando os meios utilizados para a sua prestação
pertencem àquele responsável pelo seu oferecimento.
A execução indireta do Serviço Público, conforme
Friede106 ensina:
por sua vez, realiza-se quando os meios utilizados para a sua
prestação pertencem a terceiros que, através de contrato
com o prestador do serviço, oferecem atendimento ao
102 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 156.
103 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 342.
104 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 342 - 343.
105 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 155.
106 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 155.
29
público. Assim sendo, tanto a Administração direta quanto a
Administração indireta (autarquias, empresas públicas e
sociedades de economia mista) poderão executar serviços
indiretamente. Essa possibilidade estende-se aos entes de
cooperação (serviços sociais autônomos, entre outros),
empresas privadas e particulares.
No entanto, não são todos os serviços que podem ser
executados indiretamente.107
A possibilidade de execução indireta depende,
entretanto, da natureza do serviço, pois alguns existem que não admitem
substituição do executor, como por exemplo, os de polícia, e para outros
a própria outorga ou delegação proíbe o traspasse da execução.108
Assim, a Administração Pública para desempenhar
suas funções, necessita de modo direto ou indireto para adquirir bens,
alienar coisas, conceder e permitir obras e serviços, os quais não podem
ser desenvolvidos senão mediante procedimento formal, ou seja, por
Licitação, nos limites impostos aos atos administrativos como um todo.
Assim, abordaremos o instituto da Licitação como mais
uma das necessidades que o trabalho apresenta.
107 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 155.
108 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 342.
30
Capítulo 2
ASPECTOS GERAIS DA LICITAÇÃO
2.1 CONCEITO
No Brasil, até o ano de 1967, as licitações eram regidas
pelo Código da Contabilidade Pública da União e seu regulamento,
ambos de 1922.
Porém, esses diplomas não eram específicos, isto é,
não tratavam tão somente do instituto Licitação.
A sistemática da Licitação sofreu fundamental
evolução desde seu incipiente tratamento no Código da Contabilidade
Pública da União, de 1922, até o Decreto-lei 200 de 1967, Lei 5.456, de
1968, Lei 6.946, de 1981, e Decreto-lei 2.300, de 1986, ora revogados e
substituídos pela Lei 8.666, de 21.6.93.109
De acordo com Di Pietro110, a grande dificuldade com
que se defrontava o intérprete do Decreto-lei nº 2.300/86 decorria da falta
técnica legislativa, que levou seus relatores a inserirem num texto normas
gerais, de âmbito nacional, e normas especiais, de âmbito federal, sem
qualquer critério orientador que permitisse distinguir umas das outras.
A legislação atualmente em vigor (Lei n. 8.666/93,
alterada pelas Leis n. 8.883/94 e 9.648/98) pode ser considerada um
progresso em relação ao texto anterior. Com efeito, ela foi fortemente
condicionada pelos princípios e normas da Constituição Federal de 1988,
acolheu diversas sugestões da doutrina e incorporou entendimentos
109 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 271.
110 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 350.
31
jurisprudenciais já estabilizados.111
Finalmente, todos foram revogados e substituídos pela
atual Lei 8.666, de 21.06.93, modificada pelas leis 8.883, de 8.6.94 e 9.648,
de 27.5.98, 10.973, de 2.12.2004, 11.079, de 30.12.2004, e 11.107, de
6.4.2005.
De acordo com Gasparini112, o procedimento levado a
efeito para encontrar a melhor proposta, chamado de Licitação, embora
não seja o mesmo para os grupos de obrigados a licitar (pessoas públicas,
pessoas governamentais), é regulado pelo Direito Administrativo.
Conforme Friede113, Licitação é o procedimento
administrativo vinculado pelo qual a Administração Pública seleciona o(s)
interessado(s) em celebrar futuro contrato administrativo cuja proposta
seja, em tese, a melhor.
Para Figueiredo114, Licitação é o procedimento
administrativo formal que visa a selecionar o melhor contratante para a
Administração, que lhe deverá prestar serviços, construir-lhe obras ou
fornecer-lhes bens.
Para Meirelles115, Licitação é o procedimento
administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a
proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse.
A Licitação é, formalmente, um procedimento pré-
contratual, preliminar de um negócio público. Consiste em um conjunto
de atos administrativos em seqüência dirigidos à eleição de contratante
que ofereça as condições mais vantajosas em negócio que a 111 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 8.
112 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 427.
113 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 81.
114 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo, p. 402.
115 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 272.
32
Administração deseja celebrar, como fase necessária do processamento
da despesa pública.116
A Licitação nada mais é do que uma sucessão
ordenada de atos que se desenrolam, para o público, a partir do edital de
concorrência e se concluem com a adjudicação de seu objeto ao
vencedor, sempre garantindo rigorosamente a igualdade entre os
interessados.117
2.2 PREVISÃO LEGAL
O artigo 22, inciso XXVII da Constituição de 1988, prevê
a competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de
licitação e contratos administrativos:
Art. 22 - Compete privativamente à União legislar sobre:
[...]
XXVII – normas gerais de Licitação e contratação, em todas
as modalidades, para as administrações públicas, diretas,
autarquias e funcionais da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, obedecido o dispositivo no art. 37, XXI, e para as
empresas públicas e sociedades de economia mista, nos
termos do art.173,§ 1º, III.
A Constituição de 1988 também estabelece a
obrigatoriedade da Licitação pela Administração Pública em seu art. 37,
XXI:
[...]
XXI –ressalvados os casos especificados na legislação, as 116 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 69.
117 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 151.
33
obras, serviços, compras e alienações serão contratados
mediante processo de Licitação pública que assegure
igualdade de condições a todos os concorrentes, com
cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento,
mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da
lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação
técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações.
Conforme dispõe Gasparini118,
A União, ao editar a Lei federal n. 8.666, de 21.6.93, que
regulamenta o inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal,
foi muito além, desconhecendo, como se verifica no seu art.
1º, a atribuição dos demais entes federados para estatuir
legislativamente, nessas áreas, as competentes normas
particulares. Acabou, assim, por editar referida lei com a
pretensão de submeter todas as unidades da Federação ao
mesmo regime licitatório.
De acordo com Friede119, a base legal da Licitação se
encontra registrada na Lei n. 8.666/93, que revogou expressamente os
Decretos-Leis n. 2.300/86, 2.348/87, 2.360/87, a Lei n. 8.220/91 e o art. 83 da
Lei n. 5.194/66 (art. 126 da Lei n. 8.666/93).
2.3 PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO
Não há uniformidade entre os doutrinadores na
indicação dos princípios informativos da Licitação.120
Para Gasparini121, são notadamente nos termos do art.
118 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 451.
119 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 94.
120 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 294.
121 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 429.
34
3º da Lei federal n. 8666/93; princípios da Licitação: 1º) legalidade; 2º)
impessoalidade; 3º) moralidade; 4º) igualdade; 5º) publicidade; 6º)
probidade administrativa; 7º) vinculação ao instrumento convocatório; 8º)
julgamento objetivo; 9º) fiscalização da licitação pelos interessados ou
qualquer cidadão.
Para Meirelles122, os princípios que regem a Licitação,
qualquer que seja a sua modalidade, resumem-se nos seguintes preceitos:
procedimento formal; publicidade de seus atos; igualdade
entre os licitantes; sigilo na apresentação das propostas;
vinculação ao edital ou convite; julgamento objetivo;
adjudicação compulsória ao vencedor. O Estatuto
acrescentou, agora, dentre os princípios básicos da
Licitação, o da probidade administrativa (art. 3o).
O princípio do procedimento formal pode ser definido
como o princípio que torna obrigatória a vinculação de todo o
procedimento licitatório ao preceito imposto pela norma legal.123
Para Di Pietro124, o princípio da publicidade, que diz respeito
não apenas à divulgação do procedimento para
conhecimento de todos os interessados, como também aos
atos da Administração Pública praticados nas várias fases
do procedimento, que podem e devem ser abertas aos
interessados, para assegurar a todos a possibilidade de
fiscalizar sua legalidade.
A igualdade entre os licitantes é princípio impeditivo
da discriminação entre os participantes do certame, quer através de
cláusulas que, no edital ou convite, favoreçam uns em detrimento de
outros, quer mediante julgamento faccioso, que desiguale os iguais ou
122 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 272.
123 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 88.
124 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 298.
35
iguale os desiguais.125
De acordo com Friede126, a igualdade é um dos pilares
de nosso ordenamento jurídico. O princípio da igualdade das partes
licitantes é definido pelo princípio basilar do direito que tem por finalidade
afastar qualquer possibilidade de diferenciação entre as partes na
Licitação.
O princípio do sigilo na apresentação das propostas
corresponde ao impedimento imposto a todos os licitantes quanto ao
conhecimento da proposta de qualquer um deles, antes da data da
abertura dos envelopes que contêm as propostas, conforme preceito
registrado no art. 3o, § 3o da Lei n. 8.666/93.127
Para Meirelles128, a vinculação ao edital, é o princípio
básico da toda Licitação. Nem se compreenderia que a Administração
fixasse no edital a forma e o modo de participação dos licitantes e no
decorrer do procedimento ou na realização do julgamento se afastasse
do estabelecido, ou admitisse documentação e propostas em desacordo
com o solicitado.
Di Pietro129, também ensina que, trata-se de princípio
essencial cuja inobservância enseja nulidade do procedimento. Além de
mencionado no artigo 3o. da Lei n. 8.666, ainda tem seu sentido
explicitado no artigo 41, segundo o qual a Administração não pode
descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente
vinculada.
125 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 272.
126 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 88.
127 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 89.
128 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 274.
129 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 299.
36
Para Meirelles130, o princípio do julgamento objetivo:
é o que se baseia no critério indicado no edital e nos termos
específicos das propostas. É princípio de toda Licitação que
seu julgamento se apóie em fatores concretos pedidos pela
Administração, em confronto com o ofertado pelos
proponentes dentro do permitido no edital ou convite. Visa
a afastar o discricionarismo na escolha das propostas,
obrigando os julgadores a aterem-se ao critério pré-fixado
pela Administração, com o quê se reduz e se delimita a
margem de valoração subjetiva, sempre presente em
qualquer julgamento.
Para fins de julgamento objetivo, o mesmo dispositivo
estabelece os tipos de Licitação: de menor preço, de melhor técnica, de
técnica e preço e o de maior lance ou oferta.131
O princípio da adjudicação compulsória ao vencedor
pode ser traduzido pelo preceito que tem por escopo impedir que a
Administração, terminado o procedimento licitatório, qualifique o objeto a
outro licitante que não seja o vencedor do procedimento.132
A adjudicação ao vencedor é obrigatória, salvo se
este desistir expressamente do contrato ou não o firmar no prazo
prefixado, a menos que comprove justo motivo. A compulsoriedade veda
também que se abra nova Licitação enquanto válida a adjudicação
anterior.133
Em verdade, a expressão adjudicação compulsória é
equívoca, porque pode dar a idéia de que, uma vez concluído o
julgamento, a Administração está obrigada a adjudicar; e isto não ocorre,
130 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 275.
131 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 300.
132 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 89.
133 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 275.
37
porque a revogação pode ocorrer em qualquer fase da Licitação.134
A probidade administrativa é dever de todo
administrador público, mas a lei a inclui dentre os princípios específicos da
Licitação (art. 3o.), naturalmente como uma advertência às autoridades
que a promovem ou a julgam.135
Para Meirelles136, a probidade na Administração é
mandamento constitucional (art. 37, § 4o.), que pode conduzir a
suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a
indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e
gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
2.4 OBJETO DA LICITAÇÃO
Objeto da Licitação é a obra, o serviço, a compra, a
alienação, a concessão, a permissão e a locação que, afinal, será
contratada com o particular.137
Sobre objeto da Licitação Gasparini138, ensina que:
Podem ser objeto de Licitação, por exemplo, uma obra
pública (construção de uma cadeia), um serviço
(manutenção de máquinas e equipamentos), uma compra
(material de consumo), uma alienação (de bem público),
uma locação, um arrendamento, uma concessão ou
permissão de uso de bem público ou de Serviço Público
desejado pela entidade obrigada a licitar.
134 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 301.
135 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 275.
136 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 275.
137 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 276.
138 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 446.
38
Segundo Friede139, o objeto da Licitação, em termos
próprios, é exatamente a obra, o serviço, a compra, a alienação ou a
concessão que deve ser contratada com o particular.
De acordo com Meirelles140,
A finalidade precípua da Licitação será sempre a obtenção
de seu objeto nas melhores condições para a
Administração, e, para tanto, esse objeto deverá ser
convenientemente definido no edital ou no convite, a fim
de que os licitantes possa atender fielmente ao desejo do
Poder Público. Licitação sem caracterização de seu objeto
é nula, porque dificulta a apresentação das propostas e
compromete a lisura do julgamento e a execução do
contrato subseqüente.
A definição do objeto, ou seja, sua descrição com todos os
dados necessários ao seu perfeito entendimento, tais como
o anteprojeto e as respectivas especificações, no caso de
obra, é condição de legitimidade da Licitação, salvo
quanto aos objetos padronizados por normas técnicas, para
os quais basta sua indicação oficial, porque nela se
compreendem toda as características definidoras.141
Para Carlin142, o objeto do procedimento licitatório será
o que a Administração deseja contratar. A lei dispõe que a licitação pode
ter por objeto serviços, obras, compras, alienações, concessões,
permissões e locações, evitando-se, assim, irregularidades e inadimplência
em sua execução.
139 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 93.
140 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 276.
141 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 276.
142 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 151.
39
2.6 MODALIDADES DE LICITAÇÃO
A Licitação compreende as seguintes modalidades:
concorrência, tomada de preços, convite, concurso, leilão e pregão.
Licitação, portanto, é o gênero, do qual as modalidades são espécies.143
Conforme Gasparini144, essas modalidades formam dois
grupos:
O primeiro composto pelas três primeiras indicadas,
chamamos de grupo das modalidades sem finalidade
específica, vez que qualquer delas pode levar à
contratação de uma obra, um serviço, um fornecimento ou
alienação. O segundo, formado pelas duas últimas das
mencionadas modalidades, denominamos grupo das
modalidades com finalidade específicas, pois somente se
prestam: o concurso, para a escolha de trabalho técnico,
científico ou artístico, e o leilão, para alienação.
Conforme Gasparini145, as modalidades de licitações
relacionam-se com o valor estimado do contrato, enquanto os tipos
relacionam-se com o julgamento.
De acordo com Fazzio Júnior146, a lei as define, mas as
modalidades licitatórias devem observar os valores limites admissíveis para
cada espécie.
Concorrência é a modalidade de Licitação entre
quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar,
comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital
143 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 312.
144 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 496.
145 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 497.
146 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 74.
40
para execução de seu objeto.147
Concorrência é a modalidade de Licitação própria
para contratos de grande valor, em que se admite a participação de
quaisquer interessados, cadastrados ou não, que satisfaçam as condições
do edital, convocados com antecedência mínima prevista na lei, com
ampla publicidade pelo órgão oficial e pela imprensa particular. 148
A tomada de preços, diferentemente da
concorrência, é de âmbito menor, restringindo-se aos interessados do
ramo, já previamente inscritos no cadastro de qualquer unidade
administrativa, ou que atenderem a todas as condições exigidas até o
terceiro dia anterior à data do recebimento da proposta.149
O que a caracteriza e distingue da concorrência é a
existência da habilitação prévia dos licitantes através dos
registros cadastrais, de modo que a habilitação preliminar
se resume na verificação dos dados constantes dos
certificados de registro dos interessados e, se for o caso, se
estes possuem a real capacidade operativa e financeira
exigida no edital.150
De acordo com Friede151, o convite é o tipo de
Licitação típica para contratos de pequeno porte. O procedimento do
convite consiste, fundamentalmente, em o administrador enviar cartas-
convites a três interessados, no mínimo, registrados ou não, com o objetivo
de selecionar futuro contratante com a Administração Pública.
O convite não exige publicação, porque é feito
diretamente aos escolhidos pela Administração através de carta-convite.
A lei, porém, determina que cópia do instrumento convocatório seja
147 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 74.
148 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 313.
149 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo, p. 412.
150 MEIRELLES, Hely Lopes. . Direito administrativo brasileiro, p. 319.
151 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 99.
41
afixada em local apropriado, estendendo-se automaticamente aos
demais cadastrados na mesma categoria, desde que manifestem seu
interesse até 24 horas antes da apresentação das propostas.152
Para Fazzio Júnior153, concurso é a modalidade de
Licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico,
científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração
aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na
imprensa oficial com antecedência mínima de 45 dias.
Segundo Meirelles154, o concurso é modalidade
especial de Licitação que, embora sujeita aos princípios da publicidade e
da igualdade entre os participantes, objetivando a escolha do melhor
trabalho, dispensa as formalidades específicas da concorrência.
Conforme Di Pietro155, leilão e a modalidade de
Licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis
inservíveis para a Administração ou de produtos legalmente apreendidos
ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis, a quem possa
oferecer o maior lance, igual ou superior ao da avaliação.
De acordo com Meirelles156, a Administração Pública
poderá valer-se de dois tipos de leilão:
o comum, privativo de leiloeiro oficial, onde houver; e o
administrativo propriamente dito. O leilão comum é regido
pela legislação federal pertinente, mas as condições de sua
realização poderão ser estabelecidas pela Administração
interessada; o leilão administrativo é o instituído para a
venda de mercadorias apreendidas como contrabando, ou
abandonadas nas alfândegas, nos armazéns ferroviários ou 152 MEIRELLES, Hely Lopes. . Direito administrativo brasileiro, p. 320.
153 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 74.
154 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 321.
155 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 320.
156 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 321 - 322.
42
nas repartições públicas em geral, observadas as normas
regulamentares da Administração interessada.
Segundo Fazzio Júnior157, o pregão destina-se à
aquisição de bens e serviços comuns, qualquer que seja o valor estimado
da contratação. A competição é feita por meio de propostas e lances em
sessão pública. Poderá ser realizado mediante a utilização de recursos de
tecnologia da informação, conforme regulamentação específica.
Para Meirelles158, como em todas as modalidades de
Licitação, o pregão possui também uma fase preparatória, que se passa
no âmbito interno do órgão ou entidade responsável pela aquisição dos
bens ou serviços desejados.
De acordo com Carlin159 a Medida provisória n. 2.026.
de 04/5/2000 instituiu o pregão como uma modalidade de Licitação, cuja
ementa diz o seguinte: Institui, no âmbito da União, nos termos do art.37,
inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de Licitação denominada
pregão, para aquisição de bens e serviços comuns.
2.7 FASES DA LICITAÇÃO
De acordo com Carlin160, o procedimento licitatório
divide-se em uma fase interna e uma externa. A primeira compõe-se dos
atos iniciais para uma contratação até a publicação do edital ou
expedição da carta-convite e termina com a adjudicação do objeto da
Licitação e sua homologação pela autoridade superior.
157 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 75.
158 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 324
159 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 164.
160 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 160.
43
A fase externa, por seu turno, caracteriza-se pela
publicidade do edital convocatório ou expedição da carta-convite,
passando para o recebimento dos envelopes com a documentação e/ou
proposta e segue-se com a habilitação, julgamento, revogação,
anulação e homologação.161
Segundo Gasparini162, as diversas atividades e atos
costumam ser agrupados pela doutrina em duas partes, uma interna,
também chamada de processo, e outra externa, designada de
procedimento:
A abertura do processo de Licitação, determina-se o
objeto, estabelecem-se as suas condições, estima-se a
eventual despesa e decide-se pela modalidade adequada,
verifica-se a existência de recursos orçamentários, estima-se
o impacto orçamentário-financeiro no exercício em que
deva entrar em vigor, bem como nos dois subseqüentes, e
obtém-se a declaração do ordenador da despesa de que
o aumento tem adequação orçamentária e financeira com
a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano
plurianual e com lei de diretrizes orçamentárias.
Conforme Di Pietro163, o procedimento é mais
complexo na concorrência, tendo em vista o maior vulto dos contratos a
serem celebrados; é um pouco menos complexo na tomada de preços,
em que o valor dos contratos é médio; e simplifica-se ainda mais no
convite, dado o pequeno valor dos contratos.
De acordo com Friede164, as fases da Licitação são:
a)edital; b)habilitação; c)julgamento de idoneidade; d)julgamento de
propostas; e)adjudicação; e f)homologação.
161 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 160.
162 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 523.
163 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 381.
164 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 96.
44
O edital é um ato administrativo vinculado pelo qual o
Estado estabelece as regras da licitação, cujo conteúdo é
de natureza discricionária, ditado pela Administração
Pública. A habilitação consiste na fase da Licitação em que
os interessados se apresentam a Administração Pública. O
julgamento de idoneidade pode ser definido como o
exame dos interessados. O julgamento das propostas é a
escolha da proposta mais vantajosa para a Administração
Pública. A adjudicação consiste no ato da Administração
que confere ao vitorioso a expectativa do direito de
contratar. E a homologação consiste na fase final da
Licitação, onde a autoridade dirigente entende válido todo
o procedimento licitatório e se declara interessada na
celebração do contrato administrativo.
Segundo Meirelles165, o edital deverá indicar,
necessariamente, o critério de julgamento das propostas e os fatores que
serão considerados na avaliação das vantagens para a Administração,
tais como qualidade, rendimento, preço, condições de pagamento,
prazos e outros de interesse do Serviço Público.
A fase da abertura, segundo Gasparini166, encerra-se,
em tese, com o decurso do prazo destinado à apresentação dos
envelopes contendo a documentação e a proposta.
A primeira fase cronológica do procedimento seria a da
abertura da Licitação, que se efetiva com a publicidade do
instrumento de chamamento a eventuais interessados. O
instrumento utilizado para essa manifestação de vontade
pode variar, conforme a modalidade de Licitação que se
pretenda realizar. Basicamente, usa-se a carta-convite para
o procedimento do convite e o edital para as demais
modalidades.167
Para Di Pietro168, a segunda fase do procedimento da
165 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 135.
166 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 528.
167 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 89.
168 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 385.
45
Licitação é a da habilitação, em que há a abertura dos envelopes
“documentação” e sua apreciação, conforme previsto no artigo 43, I.
Segundo Meirelles169, documentação é o conjunto de
comprovantes da capacidade jurídica, da regularidade fiscal, da
capacidade técnica e da idoneidade financeira que se exigem dos
interessados para se habilitarem na Licitação.
Conforme Gasparini170, os habilitados tornam-se iguais
e tem o direito subjetivo público de ver abertos os envelopes contendo as
propostas e, conforme o caso, de ver ou não classificadas as propostas
apresentadas.
Para Dallari171, as propostas formuladas pelos licitantes
habilitados são examinados sob um duplo aspecto: o da viabilidade e o
que diz respeito às vantagens que podem proporcionar à Administração.
Somente as propostas viáveis serão classificadas.
A classificação, para Gasparini172, é o ato
administrativo vinculado mediante o qual a comissão de Licitação acolhe
as propostas apresentadas formalmente e nos termos e condições do
edital ou carta-convite.
De acordo com Di Pietro173, o julgamento das
propostas, que deve ser objetivo e realizado de acordo com os tipos de
Licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de
acordo com os fatores exclusivamente nele referidos.
Conforme Friede174, o julgamento de idoneidade pode
169 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 138.
170 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 530.
171 DALLARI, Adilson Abreu. . Aspectos jurídicos da licitação, p. 129.
172 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo, p. 539.
173 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 389.
174 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 97.
46
ser definido como o exame dos interessados sob o aspecto subjetivo
(personalidade jurídica, idoneidade financeira e fiscal e capacidade
técnica).
O julgamento das propostas é o ato pelo qual se
confrontam as ofertas, classificam-se as propostas e
escolhe-se o vencedor a que deverá ser adjudicado o
objeto da Licitação. O julgamento regular das propostas
gera para o vencedor o direito subjetivo à adjudicação e o
coloca em condições de firmar o contrato com a
Administração Pública.175
Para Fazzio Júnior176, a abertura dos envelopes
contendo a documentação para habilitação e as propostas deve ser
realizada sempre em ato público, previamente designado, do qual, lavra-
se ata circunstanciada, assinada pelos licitantes presentes e pela
comissão de Licitação.
O julgamento de propostas pode ser definido pela
escolha da proposta mais vantajosa para a Administração Pública (deve
ser observado que a expressão proposta mais vantajosa consiste na oferta
de melhor técnica e/ou de menor preço, devendo a Administração
Pública estabelecer no edital o critério prevalente a ser adotado. 177
A homologação, de acordo com Di Pietro178, equivale
à aprovação do procedimento; ela é precedida do exame dos atos que
o integram pela autoridade competente, a qual, se verificar algum vício
de ilegalidade, anulará o procedimento ou determinará seu saneamento,
se cabível. Se o procedimento estiver em ordem, ela o homologará.
Para Meirelles179, homologação é o ato de controle
175 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 301.
176 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 79.
177 FRIEDE, R. Lições objetivas de direito administrativo, p. 97.
178 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 331.
179 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 308.
47
pelo qual a autoridade competente a que incumbir a deliberação final
sobre o julgamento confirma a classificação das propostas e adjudica o
objeto da Licitação ao proponente vencedor (art. 43, VI).
Após a homologação da Licitação, ocorre a
adjudicação. Esta consiste na atribuição, ao vencedor da Licitação, do
objeto da contratação, fundamentada no princípio da adjudicação
compulsória.180
Segundo Di Pietro181, a adjudicação é o ato pelo qual
a Administração, pela mesma autoridade competente para homologar,
atribui ao vencedor o objeto da Licitação. É o ato final do procedimento.
De acordo com Meirelles182, a adjudicação é ato pelo
qual se atribui ao vencedor o objeto da Licitação para a subseqüente
efetivação do contrato, tendo como efeitos jurídicos:
a) a aquisição do direito de contratar com a Administração
nos termos em que o adjudicatário venceu a Licitação; b) a
vinculação do adjudicatário a todos os encargos
estabelecidos no edital e aos prometidos na proposta; c) a
sujeição do adjudicatário às penalidades previstas no edital
e normas legais pertinentes se não assinar o contrato no
prazo e condições estabelecidas; d) o impedimento de a
Administração contratar o objeto licitado com outrem; e) a
liberação dos licitantes vencidos de todos os encargos da
Licitação e o direito de retirarem os documentos e
levantarem as garantias oferecidas, salvo se obrigados a
aguardar a efetivação do contrato por disposição do edital
ou norma legal.
Adjudicação é o último ato de uma Licitação, em que
o primeiro colocado será declarado vencedor do certame para a futura
contratação. Constitui a entrega jurídica do objeto ao vencedor, por meio
180 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo, p. 81.
181 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 331.
182 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 309.
48
da comissão julgadora.183
De acordo com Carlin184, como procedimento
administrativo, a Licitação é passível de anulação e revogação, bastando
que haja motivos legais para tanto, quando será desfeito o certame.
Para Meirelles185, anulação é a invalidação da
Licitação ou do julgamento por motivo de ilegalidade; revogação é a
invalidação da Licitação por interesse público. Anula-se o que é ilegítimo;
revoga-se o que é legítimo mas inoportuno e inconveniente à
Administração.
Quem anula ou revoga é a autoridade superior que
autorizou o procedimento licitatório. Em qualquer caso, o desfazimento se
fará mediante a observância do princípio do contraditório e da ampla
defesa. 186
Estudados os principais aspectos da Licitação,
passamos de agora em diante a analisar os crimes previstos na legislação
licitatória.
Na próxima fase deste estudo procuraremos
compreender os crimes na legislação licitatória, considerando ser o
Código Penal, na sua parte geral, fonte subsidiária da louvável lei.
183 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 161.
184 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 162.
185 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 310.
186 CARLIN, Volnei Ivo. Direito administrativo, p. 162.
49
Capítulo 3
CRIMES NA LICITAÇÃO
3.1 LEI FEDERAL DAS LICITAÇÕES E CONTRATOS
De acordo com Gasparini187, a sociedade de há muito
vinha exigindo uma legislação criminal que apenasse certos
comportamentos havidos, no mínimo, como imorais, relacionados com as
contratações celebradas pela Administração Pública Direta e Indireta das
três esferas de governo.
Segundo Gasparini188, com a sua aprovação pelo
Congresso e sanção presidencial, passou-se a ter a tão desejada
legislação penal incidente sobre comportamentos irregulares e criminosos,
relacionados com as licitações e contratações da Administração Pública.
No entendimento de Rigolin189:
A Lei 8.666 foi ideada e até sua publicação tratada, por
isso, desde sua mais remota origem, como o possível e
heróico remédio contra a falcatrua, o oportunismo
criminoso, os delitos negociais, a personalística improbidade
administrativa no trato do dinheiro público, que todos
ansiavam como a panacéia universal, o bálsamo
miraculoso, curador de todas as mazelas.
Conforme Gasparini190, a Lei Federal das Licitações e
Contratos da Administração Pública, por aplicar-se tanto à Administração
187 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, 2004, p. 1
188 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, 2004, p. 2.
189 RIGOLIN, Ivan Barbosa. Manual prático das licitações, p. 11.
190 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 3
50
Direta (União, Estado-membro, Distrito Federal e Município) como à
Indireta (autarquia, sociedade de economia mista, empresa pública,
fundações públicas e privadas e suas eventuais subsidiárias), é lei
nacional.
De acordo com Justen Filho191, a interpretação das
regras penais da Lei n. 8.666 tem de vincular-se não apenas à construção
dos tipos legais e dos diversos elementos do crime. É imperioso examinar os
dados que evidenciam a reprovabilidade da conduta e que são o único
fundamento que autoriza a punição.
Conforme Gasparini192, a Lei Federal das Licitações e
Contratos da Administração Pública entrou em vigor imediatamente. Sua
vigência teve início com a sua publicação, consoante determinado em
seu próprio texto (art.125), ocorrida em 22 de junho de 1993, no Diário
Oficial da União.Vigente, assim permanecerá até que outra a modifique
ou revogue.
Segundo Gasparini193, a Lei Federal das Licitações e
Contratos da Administração Pública, no que concerne aos crimes
relacionados com contratos e certames licitatórios de responsabilidade da
Administração Pública, regulou toda a matéria penal, acabando por
revogar algumas disposições do Código Penal referentes a esses assuntos.
As regras penais da Lei Federal das Licitações e
Contratos da Administração Pública não são, de modo algum, benéficas,
pois levaram à categoria de crime certos comportamentos antes livres.
Logo, são irretroativas.194
No que concerne aos crimes da Lei Federal das
191JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 579.
192 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 3.
193 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 5.
194 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 8.
51
Licitações , notadamente em relação ao processo, julgamento, recursos e
execução penal, serão observados subsidiariamente o Código de
Processo Penal e a Lei de Execução Penal.195
3.2 CONCEITO E ESPÉCIES DE CRIME
Para Gasparini196, crime é toda ação do homem assim
considerada por lei. Crime, portanto, é conceito legal. É importante
destacar, de um lado, que só o homem pratica crime e, por conseguinte,
ele é o único ente que pode ser criminoso.
Sobre conceito de crime Mirabete197, ensina:
Em um conceito formal, crime é toda conduta proibida por
lei sob ameaça de pena. No aspecto material, o ilícito
penal pode ser conceituado como conduta definida pelo
legislador como contrária a uma norma de cultura
reconhecida pelo Estado e lesiva de bens juridicamente
protegidos. No aspecto analítico, a doutrina finalista mora-
se conduta típica a ação em sentido estrito ou a omissão,
praticada com dolo ou culpa, que se ajusta ao tipo penal.
Segundo Mirabete198, quanto à forma de ação o crime
pode ser instantâneo, em que , uma vez consumado, está encerrado o
ilícito, pois a consumação não se prolonga por tempo, e permanente, em
que a consumação se protrai no tempo.
Para Gasparini199, instantâneo é o crime em que a
ação criminosa encerra-se com a consumação. Esta, nesses crimes, não
195 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 9.
196 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 13.
197 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 135.
198 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 141
199 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 14.
52
se prolonga. Isto não significa que sua execução seja rápida; que a
infração penal aconteça num átimo. Dessa espécie são os crimes de
homicídio e os da Lei das Licitações e Contratos da Administração
Pública.
No crime comissivo e omissivo Gasparini200 dispõe:
Comissivo é o que exige do autor uma ação, um
comportamento positivo segundo o tipo penal, como
ocorre nos crimes de homicídio (art. 121 do CP) e no crime
de impedir injustamente a inscrição de alguém no registro
cadastral para fins de Licitação (art.98 da LLC), onde são
requeridas, respectivamente, as ações de matar e impedir.
Omissivo é o que não exige do autor qualquer ação ou
comportamento, quando essa ação ou comportamento
estava obrigado por lei, como ocorre no crime de omissão
de socorro e no crime de inexigir Licitação (art.89 da LLC),
onde o criminoso estava obrigado, respectivamente, a
prestar socorro e exigir licitação.
Para Mirabete,201 quanto à forma de ação, o crime
pode ser comissivo, em que se descreve abstratamente na lei uma
conduta de causar, por movimento, um resultado, um fazer, e o omissivo
puro ou próprio em que a lei penal descreve uma conduta de não fazer
algo.
Crime deve ser apresentado em seus conceitos
material e formal. No conceito material crime é a violação de um bem
jurídico protegido penalmente. No conceito formal, somente o
comportamento humano positivo (ação) ou negativo (omissão) pode ser
crime.202
Crime material é o que exige, externamente ao
comportamento criminoso, um resultado. O crime
200 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 15.
201 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 141.
202 DELMATO, Celso. Código penal comentado, p. 18.
53
patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado
perante a Administração Pública, dando causa a
instauração de licitação, previsto no art. 91 da Lei das
Licitações e Contratos da Administração Pública, que exige,
como resultado, a instauração de Licitação. É também
dessa espécie o crime do art. 93 dessa lei, que exige o
impedimento, perturbação ou fraude à realização de
qualquer ato do procedimento licitatório.203
No crime formal a lei prevê um resultado naturalístico,
porém não exige sua concretização para a consumação, embora aquele
seja possível.204
Para Gasparini205, crime formal é o que para sua
caracterização não exige que o desejado pelo autor aconteça ou se
realize. O crime licitatório afastar ou procurar afastar licitante por meio de
violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de todo
tipo (art.95), consuma-se com qualquer desses fatos independentemente
do efetivo afastamento.
De acordo com Mirabete206, crimes de mera conduta,
ou de simples atividade não exigem qualquer resultado naturalístico,
contentando-se com a ação ou omissão do agente e a lesão ou perigo
de lesão ao bem jurídico.
Crime de mera conduta é a infração em que não é
exigido qualquer resultado naturalístico, bastando para caracterizá-lo a
ação ou omissão do agente. Essas infrações, por dita razão, também são
chamadas de crimes de simples atividade. O só comportamento
comissivo ou omissivo, caracteriza o gravame, a ofensa presumida pela lei
203 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 16.
204 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 187
205 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 16.
206 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 142.
54
penal.207
Segundo Meirelles208, crime próprio é o que só pode ser
praticado por determinada pessoa ou por pessoa investidas de função
especial.
Próprio, também chamado de crime especial, é o que
somente pode ser praticado por agente dotado de certa capacidade ou
qualificação profissional. Não há o crime tipo se o agente não possuir tal
requisito. A dispensa de Licitação fora das hipóteses legais (art. 89 da LLC),
somente pode ser executada por servidor público.209
Sobre crime comum Gasparini210, ensina que:
Comum é o crime que pode ser praticado por qualquer
pessoa. Para sua caracterização não é exigida capacidade
do autor. Dessas infrações são exemplos o crime de
homicídio e o crime de afastar ou procurar afastar licitante
por meio de violência, grave ameaça, fraude ou
oferecimento de vantagem de qualquer tipo, previsto no
art. 95 da Lei das Licitações e Contratos da Administração
Pública.
Os ilícitos, quanto ao resultado, podem ser crimes de
dano, em que a consumação implica efetiva lesão ao bem jurídico ou
crimes de perigo, em que é suficiente para a consumação a existência de
perigo concreto ou presumido pela lei. 211
Conforme Gasparini212, na Lei licitatória, entre outros,
são crimes de dano os descritos nos arts. 90 e 92, parágrafo único, onde se
exige, respectivamente, que o comportamento criminoso frustre ou fraude 207 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 16 - 17.
208 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 187.
209 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 17.
210 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 17.
211 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 142.
212 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 17.
55
o caráter competitivo da Licitação ou possibilite uma vantagem ao
contratado.
Na Lei das licitações são exemplos de crimes de perigo
as infrações descritas nos arts. 90 e 95, caput, pois não exige para a
consumação da primeira qualquer prejuízo concreto, nem para a
segunda o efetivo afastamento do licitante.213
Quanto à realização ou não do tipo penal, o crime
pode ser consumado ou tentado. Consumado é o crime onde estão
reunidos todos os elementos de sua definição (art. 14, I, do CP).214
O crime consuma-se quando está inteiramente
realizado, ou seja, quando o fato concreto se subsume no tipo abstrato
descrito na lei penal, ou, como se inscreve na lei, se nele se reúnem todos
os elementos de sua definição legal.215
Para Gasparini216, tentado é o crime que não se
consumou por circunstância alheia à vontade do agente, embora este
tenha iniciado sua execução (art. 14, II, do CP).
Fala-se em duas espécies de tentativa: a tentativa
perfeita, ou crime falho, quando a consumação não ocorre embora o
agente tenha praticado os atos suficientes para a consumação, e a
tentativa imperfeita, quando o sujeito ativo não consegue praticar os atos
necessários à consumação por interferência externa.217
Sobre crime impossível, Mirabete218 ensina:
213 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 18.
214 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 18.
215 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 150.
216 GASPARINI, Diogenes. Crimes na Licitação, p. 18.
217 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 152.
218 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 172.
56
O crime impossível, também denominado de tentativa
impossível, tentativa inidônea, tentativa inadequada e
quase crime, em que o agente, de forma alguma,
conseguiria chegar à consumação, motivo pelo qual a lei
deixa de responsabilizá-lo pelos atos praticados, apresenta-
se em duas espécies diferentes: pela ineficácia absoluta do
meio e pela absoluta impropriedade do objeto.
Segundo Gasparini219, será crime impossível o
devassamento do sigilo de proposta (art.94 da LLC) cuja ação do agente
é dirigida contra invólucro lacrado e entregue, sob protocolo, a servidor
responsável pela sua guarda em processo licitatório, que não contém
proposta alguma.
Em qualquer das modalidades de crime impossível, seu
autor não será punido ou, seu agente será impunível.220
3.3 ELEMENTO SUBJETIVO DO CRIME: DOLO E CULPA
A vontade do sujeito ativo, dirigida ou não, para a
prática do delito é o elemento subjetivo do crime, configurando,
conforme o caso, o dolo ou a culpa. Surgem, assim, o crime doloso e o
crime culposo.221
Dispõe o Código Penal sobre crime doloso:
Art. 18 - Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o
risco de produzi-lo;
O dolo, porém, não inclui apenas o objetivo do
219 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 20.
220 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 20.
221 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 32.
57
agente, mas também os meios empregados e as conseqüências
secundárias de seu comportamento. Daí o conceito legal de dolo,
fundado na teoria da vontade, que inclui não só querer o resultado, mas
também assumir o risco de produzi-lo.222
É, em termos naturais, a alteração do mundo exterior
causada pela ação humana criminosa e voluntária, como é a morte no
crime de homicídio (art. 121 do CP) e o romper do lacre para devassar
sigilo de proposta em processo licitatório (art. 94 da LLC).223
De acordo com Gasparini224, todos os crimes da Lei
Licitatória são dolosos. De fato, são todos dolosos, dada a ausência de
qualquer explicitação quanto a serem puníveis em termos de culpa.
Inexistente, nesse diploma legal, forma culposa, acentuou o Plenário do
Tribunal de Contas da União ao proferir a Decisão n. 807/01.
Sobre crime culposo, dispõe o art. 18 do Código Penal:
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por
imprudência, negligência ou imperícia.
Segundo Mirabete225, o crime culposo é a conduta
voluntária (ação ou omissão) que produz resultado antijurídico não
querido, mas previsível, e excepcionalmente previsto, que podia, com a
devida atenção ser evitado.
O crime culposo, portanto, é decorrência de
comportamento em que o autor do delito age com imperícia (falta de
prática ou ausência de conhecimento), imprudência (falta de atenção,
imprevidência, desatenção) ou negligência (desprezo, descuido), cujo
resultado danoso pudesse, nas circunstâncias em que se encontrava, ser
222 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 181.
223 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 32.
224 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 33 - 34.
225 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado, p. 184.
58
previsto pelo autor.226
Conforme Gasparini227, nenhum dos crimes da Lei
Licitatória é punido a título de culpa. Portanto, se a situação incriminada
acabar acontecendo por imperícia, imprudência ou negligência
(características da culpa) o tipo penal doloso não se realiza e o servidor
não responde por crime licitatório algum.
Para Rigolin 228a Lei 8.666 consigna apenas hipóteses
de crimes dolosos, sejam aqueles passíveis de serem cometidos apenas
por quem desejar fazê-los, ou assumir o risco pela prática, e não, como
nos crimes culposos, por quem os pudesse praticar em virtude de
negligência, imprudência e imperícia.
Ninguém cometerá, com efeito, qualquer dos crimes
previstos nos arts. 89 a 99 da Lei 8.666, culposamente, já que não se
vislumbre a idéia de que possa alguém por imprudência dispensar
Licitação nem fraudar Licitação por negligência, nem ainda obstar a
inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais por imperícia.229
3.3 CRIMES PREVISTOS NA LEI DE LICITAÇÃO
Conforme Meirelles230, uma inovação importante da
Lei 8.666/93 diz respeito aos crimes e às penas relacionados com a
Licitação e o contrato administrativo. Os arts. 89 a 99 tipificam as condutas
criminosas e as respectivas penas, que sempre são as de detenção e de
226 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 33.
227 GASPARINI, Diogenes. Crimes na licitação, p. 33.
228 RIGOLIN, Ivan Barbosa. Manual prático das licitações, p. 84.
229 RIGOLIN, Ivan Barbosa. Manual prático das licitações, p. 84.
230 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 309.
59
multa.
São essas as condutas puníveis, previstas na lei de
Licitação, sob o título Dos Crimes e das Penas, na Seção III do Capítulo IV:
Art. 89 - Dispensar ou inexigir Licitação fora das hipóteses
previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades
pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que,
tendo comprovadamente concorrido para a consumação
da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade
ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.
Conforme Meirelles231, no caput do art. 89 o crime é
formal, consumando-se com a mera dispensa ou inexigibilidade não
autorizada pela lei. O mesmo não ocorre com o subtipo, que prevê,
claramente, para sua consumação, a efetiva contratação com o Poder
Público.
Sobre este artigo Costa Junior232, dispõe:
A primeira modalidade de conduta prevista, dispensar, é de
natureza comissiva. A inexigência será sempre omissiva. O
agente, ao não realizar a Licitação que se lhe impunha
promover, estará infringindo a norma penal. A menos que se
trate de uma das hipóteses prescritas pelo art. 25 desta lei. A
terceira modalidade de conduta preceituada em lei é
igualmente omissiva: deixar de observar formalidades
alusivas à dispensa ou à inexigibilidade previstas,
substancialmente, no art. 26 desta lei.
De acordo com Mukai233, a segunda parte do art. 89
também merece atenção, pois o não cumprimento de simples
231 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 188.
232 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 2.
233 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 136.
60
formalidades pertinentes à dispensa ou a inexigência importará em crime.
Segundo Justen Filho234 entende-se que o crime do
parágrafo único exige dolo específico (consiste no fim de celebrar
contrato com o Poder Público). No tocante ao crime do caput, não
parece viável exigir apenas o dolo genérico.
O legislador houve por bem erigir a co-participação
criminosa em crime autônomo. Assim, aquele que, além de contribuir para
a ilegalidade, beneficiar-se da dispensa ou da inexigibilidade ilegal para
celebrar contrato com Poder Público, responde pelo delito.235
Art. 90 - Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação
ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do
procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou
para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do
objeto da Llicitação:
Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Conforme Mukai236, observe-se que aqui o crime é
doloso, e este exige a vontade consciente de produzir o resultado pela
norma penal. Há que ficar demonstrado que o caráter competitivo do
procedimento licitatório foi, em caso determinado, violentado pelo intuito
de obter, para o agente ou para outrem, vantagem daquele ato.
Segundo entendimento de Meirelles237:
O ajuste ou combinação será, em regra com outro licitante
ou com eventual interessado que poderia ter participado
da licitação, lembrando que a lei abriu norma de reserva,
prevendo que o frustrar ou o fraudar a competitividade
pode decorrer de qualquer outro expediente. É crime
234JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 579.
235 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 23.
236 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 137.
237 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 188.
61
formal, plurissubsistente e unissubjetivo, anotando-se, ainda,
a presença do elemento subjetivo do injusto (dolo
específico, para os causalistas): com o intuito de obter, para
si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação
do objeto da Licitação.
Segundo Justen Filho238, o crime se aperfeiçoa inclusive
quando o acordo se destina a excluir da disputa participantes potenciais
e inexistir uma definição prévia sobre qual dos concertantes será o
vencedor.
Segundo Costa Júnior239, a fraude ou a frustração
serão obtidas mediante a utilização de qualquer expediente, tal como o
ajuste ou a combinação. A enumeração de expediente, como se vê da
locução normativa, é meramente exemplificativa. Qualquer espécie de
expediente poderá ser utilizada para a realização do tipo.
Ajuste é o concerto, o ajustamento. Combinação é o
acordo, o contrato. As expressões não deixam de ser sinônimas: ajuste é
combinação. Como é princípio de hermenêutica que a lei não deve
abrigar expressões inúteis, entenda-se que ambas se apresentam como
modalidades similares de expedientes fraudulentos.240
Expediente, que vem do latim expediens, entis, é o
emprego de determinado meio para sair de uma dificuldade, ou para
chegar a uma solução. É o modo de vencer uma dificuldade ou um
obstáculo, de sair de um embaraço.241
Não é necessário que haja frustração ou fraude de
eficácia total da Licitação. É suficiente que alguns dos aspectos do
238JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 580.
239 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 25.
240 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 25.
241 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 25.
62
certame sejam atingidos. 242
Art. 91 - Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse
privado perante a Administração, dando causa à
instauração de licitação ou à celebração de contrato, cuja
invalidação vier a ser decretada pelo Poder Judiciário:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
De acordo com Meirelles243, a lei penal pune o servidor
que trai o dever de lealdade à Administração Pública patrocinando,
perante ela, interesse privado que sabe ilegal.
Conforme Costa Júnior244, no presente dispositivo, em
que o interesse patrocinado é sempre ilegítimo, porquanto o contrato
celebrado deverá ser invalidado pelo Judiciário, a pena oscila de seis
meses a dois anos de detenção, a ser aplicada cumulativamente com a
multa, que varia entre 2% e 5% do valor do contrato licitado ou celebrado.
Nos ensinamentos de Mukai245, trata-se de crime para cuja
configuração a lei exige três condições: a) que fique
comprovado que alguém patrocinou direta ou
indiretamente interesse privado perante a Administração; b)
que dessa ação tenha resultado a abertura de uma
licitação ou assinatura de um contrato; c) que tenha parte
legítima ingressado com ação para invalidar o ato ou
contrato e que tal seja julgada procedente.
Segundo Justen Filho246, o patrocínio consiste na
defesa, na persecução, no incentivo, ou na criação de condições para a
vitória de um certo interesse privado. Envolve a prática de condutas que
favorecem um particular relativamente a outros ou, mesmo, quanto à
própria Administração. 242JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 580.
243MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 189.
244 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 30.
245 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 137.
246JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 580.
63
Art. 92 - Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer
modificação ou vantagem, inclusive prorrogação
contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução
dos contratos celebrados com o Poder Público, sem
autorização em lei, no ato convocatório da Licitação ou
nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar
fatura com preterição da ordem cronológica de sua
exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei:
Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incide na mesma pena o contratado que,
tendo comprovadamente concorrido para a consumação
da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia,
injustamente, das modificações ou prorrogações
contratuais.
Para Costa Júnior247, beneficiar-se injustamente das
modificações ou prorrogações contratuais equivale à obtenção de uma
vantagem indevida.
De acordo com Justen Filho248, o contratado será
punido desde que concorra para a consumação da ilegalidade. Não é
suficiente o mero pleito da vantagem nem será ele punido a título de
culpa.
Conforme Mukai249, verifica-se aqui que a tipificação penal
abrange duas situações distintas: a) admitir, possibilitar ou
dar causa a qualquer modificação ou vantagem, em favor
do adjudicatário, durante a execução contratual, sem que
tais modificações ou vantagens estejam autorizadas em lei,
nos atos de convocação da Licitação ou nos contratos,
envolvendo tais modificações, inclusive as prorrogações
contratuais (estas somente são possíveis nas hipóteses
previstas pela lei). b) na mesma pena incorre o contratado
se obtém vantagem indevida ou se se beneficia,
247 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 39.
248JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p.581.
249 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 137.
64
injustamente, das modificações ou prorrogações
contratuais (parágrafo único). A redação da disposição nos
dá a entender que, em ocorrendo o crime do caput,
poderia não ocorrer o fornecimento do contratado, o que
não é o que deva ocorrer. Na verdade, se ocorrer o crime
do caput, automaticamente o contratado deverá estar
incorrendo na pena do parágrafo único.
Para Justen Filho250, o crime não se aperfeiçoa
simplesmente pela presença dos aspectos descumprimento da norma
administrativa e atribuição de vantagem indevida ao licitante. É
necessário que o descumprimento da norma administrativa seja orientado
pelo intento de atribuir vantagem indevida ao licitante.
Segundo Meirelles251, quanto ao crime do parágrafo
único do art. 92, é crime próprio, pois só o contratado pode praticá-lo,
material, plurissubsistente e unissubjetivo. Admite a tentativa somente após
a consumação do ato viciado e antes da obtenção da vantagem.
Art. 93 - Impedir, perturbar ou fraudar a realização de
qualquer ato de procedimento licitatório:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Para Costa Júnior252, o tipo contido no art. 93 é mais
amplo, já que tutela todo o procedimento licitatório e não apenas a
concorrência pública e a venda em hasta pública. Por outro lado, o art.
93 apresenta como crimes consumados situações que, na sistemática do
Código Penal, não passariam de delitos tentados ou de meros atos
preparatórios.
Para Meirelles253, os crimes previstos nos arts. 93, 94 e 95
e seu parágrafo único não trazem qualquer novidade, uma vez que
250JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p.581.
251 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 189.
252 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 43.
253 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 189.
65
descrevem condutas típicas já previstas nos arts. 335, primeira e segunda
partes, e seu parágrafo único, e 326 do Código Penal. Aliás, estes delitos,
tipificados no Código Penal, foram revogados pela Lei de Licitações.
Conforme Justen Filho254, fraudar a realização de ato
indica, no caso, a utilização de artifício para evitar o cumprimento do
requisito legal ou dos efeitos do ato da Licitação. Também abrange os
artifícios de que se vale alguém para ocultar o descumprimento das
exigências relacionadas a um ato específico.
De acordo com Costa Junior255, o crime em epígrafe é
material, de resultado concreto. Exige, para sua configuração, o
impedimento, a perturbação ou a fraude do ato. Não se faz mister,
contudo, indagar se resultou prejuízo para a Administração Pública.
Art. 94 - Devassar o sigilo de proposta apresentada em
procedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo
de devassá-lo:
Pena - detenção, de 2 (dois) a 3 (três) anos, e multa.
Para Mukai256, o art. 94 contempla a hipótese, também
semelhante, mas mais abrangente do que aquela prevista no art. 326 do
código Penal (violação do sigilo de proposta de concorrência).
Segundo ensinamento de Justen Filho257:
Devassar o sigilo de proposta significa examinar o conteúdo
de envelope lacrado apresentado pelo licitante à
Administração. Somente existe esse crime quando a
proposta já tenha sido entregue à Administração, sob cuja
guarda se encontre. Também não haverá esse crime se for
devassado invólucro contendo a documentação para
254JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p.582.
255 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 44.
256 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 138.
257JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p.583.
66
habilitação. A reprovação se volta contra a violação do
sigilo da proposta. O crime não abrange a substituição de
uma proposta por outra, o que seria reprovado em outros
termos.
Para Costa Júnior258, consuma-se o crime com o
devassamento da proposta, ou com a facilitação do devassamento.
Independe o aperfeiçoamento do delito de qualquer dano à
Administração Pública. Ao contrário, poderá suceder que o concorrente,
ao inteirar-se, pela devassa, da proposta apresentada, oferte preço mais
baixo, em benefício do Estado.
Art. 95 - Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de
violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de
vantagem de qualquer tipo:
Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa,
além da pena correspondente à violência.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem se abstém
ou desiste de licitar, em razão de vantagem oferecida.
Conforme Mukai259, a tipificação penal aqui é nova, e
a pena é acrescida da pena correspondente à violência. A desistência
da Licitação é contemplada pela lei, sendo permitida somente antes da
abertura da sessão de habilitação e desde que, por motivo justo, seja
aceita pela comissão.
De acordo com Justen Filho260, a vantagem ofertada
deve ser material e caracteriza o crime desde que seja oferecida como
meio de demover o terceiro da participação na Licitação. Se o sujeito
promete ao outro que a não participação na Licitação assegurar-llhe-á o
ingresso no Reino Divino, não haverá esse crime.
258 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 50.
259 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 138.
260JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 583.
67
Segundo Costa Júnior261, a violência referida em lei
haverá de ser a física, porquanto a norma menciona, logo a seguir, a
grave ameaça, que é a violência moral. A violência física poderá consistir
no emprego de vais de fato, em lesões, até no homicídio, ou mesmo
sequestro.
Não se faz necessário ao aperfeiçoamento do tipo que
o licitante venha a ser efetivamente afastado. Basta a tentativa de
afastamento, para a realização do crime. Já que a figura penal em causa
admitiu como crime a tentativa de afastamento, a infração em tela não
admite o conatus. O crime tentado, por assim dizer, já é o crime
consumado.262
Art. 96 - Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, Licitação
instaurada para aquisição ou venda de bens ou
mercadorias, ou contrato dela decorrente:
I - elevando arbitrariamente os preços;
II - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria ou
falsificada ou deteriorada;
III - entregando uma mercadoria por outra;
IV - alterando substância, qualidade ou quantidade da
mercadoria fornecida;
V - tornando, por qualquer modo, injustamente, mais
onerosa a proposta ou a execução do contrato.
Pena - detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
Segundo Meirelles263, é o estelionato licitatório. A
conduta básica é fraudar. É, portanto, agir por meio de trapaça, de ilusão,
de engano, de artifício ou de ardil na licitação instaurada ou no contrato
261 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 54.
262 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 56.
263 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 190.
68
dela decorrente, para a aquisição ou alienação de bens ou mercadorias,
tudo em prejuízo da Fazenda Pública.
Conforme entendimento de Mukai264:
O art. 96 veio em boa hora, uma vez que, salvo hipóteses
possíveis de serem abrangidas pelo Código do Consumidor
(Lei n. 8.078, de 11-9-1990) a Administração sempre esteve a
descoberto em relação aos maus fornecedores, já que o
legislador nunca se preocupou com a hipótese de entregas
de serviços, obras e fornecimentos fora das especificações,
malfeitas, ou, até mesmo, trocadas as mercadorias.
De acordo com Meirelles265, quanto ao inciso I alguns
podem até entender que a norma é inconstitucional, porque a nossa
ordem jurídica não proíbe a elevação de preços, ainda que
arbitrariamente. No entanto, mister não esquecer que antes a norma
penal exige a conduta de fraudar. Portanto, a lei pune a elevação
arbitrária dos preços mediante fraude.
Segundo Costa Júnior266, trata-se de crime material, de
resultado concreto. Desse modo, sem o prejuízo efetivo da Fazenda
Pública não se realiza o crime. Conseqüentemente, o crime em tela
aperfeiçoa-se com a verificação do prejuízo, que se apresenta ao ensejo
do pagamento da respectiva fatura.
Art. 97 - Admitir à licitação ou celebrar contrato com
empresa ou profissional declarado inidôneo:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que,
declarado inidôneo, venha a solicitar ou a contratar com a
Administração.
264 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 138.
265 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 190.
266 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 61.
69
De acordo com, Justen Filho267, admitir à Licitação
significa permitir a participação em procedimento licitatório. O ato formal
de verificação das condições do licitante é o julgamento da fase de
habilitação, antes disso, a Administração não tem condições de verificar
se o licitante foi declarado inidôneo.
Conforme Mukai268, o art. 97 contempla o crime de
admissão à Licitação ou de celebração de contrato com empresa ou
profissional declarado inidôneo. Como se sabe, a pena de declaração de
inidoneidade é a mais grave que um licitante, na via administrativa, pode
receber.
De acordo com Costa Júnior269, admitir à Licitação
equivale a declarar o concorrente habilitado ou classificado. Celebrar
contrato significa firmar pacto com empresa ou profissional declarado
inidôneo. Licitar é concorrer, é participar da licitação mediante
apresentação de proposta. Contratar é pactuar com a Administração.
O crime é de perigo, consumando-se com a mera
conduta, independente de qualquer resultado material.270
Art. 98 - Obstar, impedir ou dificultar, injustamente, a
inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou
promover indevidamente a alteração, suspensão ou
cancelamento de registro do inscrito:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Segundo Justen Filho271, também nesse caso é
indispensável o intento de prejudicar a Administração ou de produzir
vantagem para si ou para outrem. Porém, o tipo não abrange a hipótese
267JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 585.
268 MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos, p. 139.
269 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 61.
270 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 64.
271JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 586
70
de condicionar a inscrição ou a alteração do registro a uma vantagem
indevida (o que configura o crime de concussão).
Sobre o delito Meirelles272 ensina que:
No delito do art. 98 a norma, ao falar em obstar, impedir ou
dificultar "injustamente" a inscrição ou promover
indevidamente a alteração, suspensão ou cancelamento
de registro do inscrito, deixa patente que exige o elemento
subjetivo do injusto. Assim, o agente deve ter conhecimento
da ilicitude do ato que está praticando. É crime formal, pois
a consumação ocorre com a conduta, sem necessidade
do resultado. Por outro lado, é crime próprio,
plurissubsistente e unissubjetivo.
Para Costa Junior273, obstar, do latim obstare, significa
opor dificuldades ou óbices, dificultar, impedir. Impedir, que provém do
latim impedire, é obstacular, estorvar, dificultar um ato por embaraços,
empecilhos. Dificultar, do latim difficultare, é tornar difícil, opor obstáculos,
estorvar.
Dificultar é menos grave que obstar ou impedir. A ação
de dificultar representa um estágio menos avançado que a ação de
impedir. Esta última equivale ao impedimento absoluto do registro,
enquanto dificultar é torná-lo mais difícil.274
No tocante à primeira parte do dispositivo, consuma-se
o crime com a mera ação de obstar (impedir) ou dificultar. Na segunda
parte do dispositivo, o crime se aperfeiçoa quando a alteração, a
suspensão ou o cancelamento se fizerem no registro cadastral.275
Art. 99 - A pena de multa cominada nos arts. 89 a 98 desta
Lei consiste no pagamento de quantia fixada na sentença e
272 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 190.
273 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 66 - 67.
274 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 68.
275 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 70.
71
calculada em índices percentuais, cuja base corresponderá
ao valor da vantagem efetivamente obtida ou
potencialmente auferível pelo agente.
§ 1o. Os índices a que se refere este artigo não poderão ser
inferiores a 2% (dois por cento), nem superiores a 5% (cinco
por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com
dispensa ou inexigibilidade de licitação.
§ 2o. O produto da arrecadação da multa reverterá,
conforme o caso, à Fazenda Federal, Distrital, Estadual ou
Municipal.
Conforme Justen Filho276, o dispositivo confirma a
interpretação de que a punição penal se vincula, na totalidade dos
crimes arrolados na Lei n. 8.666/93, a uma atuação voltada à obtenção
de vantagem reprovável. A pena de multa será calculada
proporcionalmente ao valor do benefício econômico que o agente
buscou, injustamente, obter.
De acordo com Meirelles277:
Encerrando a parte penal, a lei prevê, no art.99 e seu §1o.,
critérios para a fixação da pena de multa, a ser calculada
em índices percentuais, cuja base de cálculo
corresponderá ao valor da vantagem efetivamente obtida
ou potencialmente auferível pelo agente. O § 2o.
determina, ainda, que o produto da arrecadação da pena
de multa reverta para a unidade da Federação atingida
pela conduta criminosa. Assim é porque as disposições
penais da lei aplicam-se a todas as licitações e contratos
celebrados não só pela União, como pelos Estados,
Municípios e Distrito Federal.
A sentença fixará a multa, que será calculada em
porcentagem variável, calculada sobre o valor da vantagem
efetivamente percebida ou potencialmente auferível. Utilizar-se-ão os
276JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 586.
277 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo, p. 190.
72
critérios usuais para a fixação do montante da multa.278
Se não há como determinar qual a vantagem
efetivamente obtida pelo agente, tampouco será possível estabelecer a
vantagem potencialmente auferível. Desse modo, os cálculos serão
realizados com bases fluidas e hipotéticas, sem o caráter da certeza,
indispensável ao direito penal.279
Para Costa Júnior280, é lamentável que o legislador
penal da década de 1990, uma vez mais, viesse a falhar na sua técnica
jurídica. Não se vê a razão por que não adotou o critério consagrado das
penas de multa do Código Penal (arts. 49 a 52), que possibilita majoração
já suficiente para que cumpra sua finalidade.
3.4 DA TENTATIVA E MOMENTO CONSUMATIVO NOS CRIMES LICITATÓRIOS
A tentativa é a realização incompleta do tipo penal,
pois o agente pratica atos de execução, mas não ocorre a consumação
por circunstâncias alheias à vontade do agente.281
O artigo 83 da lei licitatória prevê sanção penal aos
crimes tentados:
Art. 83 - os crimes definidos nesta Lei, ainda que
simplesmente tentados, sujeitam os seus autores, quando
servidores públicos, além das sanções penais, à perda do
cargo, emprego, função ou mandato eletivo.
Ao lado dos crimes consumados, a Lei federal das
278JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos,p. 586.
279 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 74.
280 COSTA JUNIOR, Paulo José. Direito penal das licitações, p. 74.
281 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado. p. 152.
73
Licitações admite, em algumas de suas hipóteses penais, a tentativa. É o
que acontece com os enunciados, a exemplo de outros, das arts. 90 e 94,
cuja prática permite um iter criminis.282
Não há como configurar a tentativa nos crimes
omissivos, a exemplo do previsto no art. 89, terceira parte (... deixar de
observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade), pois
para sua configuração exige-se uma ação e nessa espécie criminal
inexiste qualquer ação.283
A pena na tentativa, ex vi do parágrafo único do art.
14 do Código Penal, é a do crime consumado, diminuída de um a dois
terços. É adequada dita diminuição, pois o comportamento humano
condenado pelo Direito não se verificou. Como o crime não aconteceu, é
justo que a pena aplicável não seja a do crime consumado, merecendo o
autor da tentativa a mencionada diminuição.284
O crime consuma-se quando está inteiramente
realizado, ou seja, quando o fato concreto se subsume no tipo abstrato
descrito na lei penal, ou, como se inscreve na lei, se nele se reúnem todos
os elementos de sua definição legal.285
Como o momento consumativo não é sempre o
mesmo, Gasparini286 ensina que sua determinação exige que se atente
para as seguintes regras:
A primeira é que nos crimes materiais, de ação e resultado,
o momento da consumação é o em que se verifica o
resultado. São exemplos na Lei das Licitações e Contratos
da Administração Pública os arts. 90 e 96, onde exige-se,
282 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 21.
283 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 21.
284 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 21.
285 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado. p. 150.
286 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 21.
74
como resultado, o ato de dispensa ou de inexigibilidade e o
prejuízo, respectivamente; e a segunda é que nos crimes de
mera conduta, em que o tipo não faz menção ao evento, a
consumação se dá com a simples ação criminosa. Nessa lei
são exemplos os arts. 97 e 98, primeira parte, pois não se
exige qualquer contratação nem a falta de cadastramento,
respectivamente.
A pena aplicável ao crime consumado é, como regra,
a indicada na hipótese penal. Nem poderia ser de outro modo, pois o
comportamento humano, não obstante reprovado pelo Direito, restou
consumado e fez incidir a pena cominada.287
3.5 EXCLUSÃO DA CRIMINALIDADE
Prevê a lei as causas que excluem a ilicitude do fato
típico, chamadas de causas excludentes da criminalidade, ou
excludentes da antijuridicidade, ou excludentes da ilicitude, ou
justificativas, ou descriminantes.288
Dispondo a esse respeito, diz a lei brasileira, no art. 23,
em caráter geral, que não há crime quando o agente pratica o fato em
estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de
dever legal e no exercício regular de direito.289
Para Gasparini290, a Lei licitatória encarregou-se de
mencionar as causas que excluem a criminalidade das suas hipóteses
penais:
287 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 21.
288 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado. p. 208.
289 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado. p. 208.
290 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 35
75
A primeira delas, cremos estar na possibilidade de se
quebrar a estrita ordem cronológica das datas de
exigibilidade dos pagamentos, quando presentes relevantes
razões de interesse público e mediante prévia justificativa
da autoridade competente, conforme permitido pelo art.
5o. da Lei das Licitações e Contratos da Administração
Pública. Outras estão em momentos diversos dessa lei.
Assim, num primeiro momento ditas excludentes de
criminalidade estão arroladas no art. 17, onde os incs. I e II
regulam, respectivamente, a alienação dos bens imóveis e
móveis da Administração Pública, tomada esta expressão
em sentido amplo, ou seja, nos termos do inc. XI da art. 6o.
dessa lei. São as chamadas hipóteses de dispensa.
Enquadrando-se a alienação numa delas seu autor não
incorre em qualquer crime. As hipóteses aí descritas são
taxativas e somente a lei federal pode modificar sua dicção
ou aumentar e seu elenco.
A Lei licitatória estabeleceu outro elenco de eximentes,
referente às contratações sem licitação, consubstanciado nas hipóteses
do art. 24. 291
Num terceiro momento, a Lei das Licitações fixou a
regra que, se reproduzida na realidade, libera a Administração Pública da
realização de prévio processo de Licitação à celebração de contratos de
seu interesse.292
Com efeito, estatui o art. 25 dessa lei que: é inexigível a
Licitação quando houver inviabilidade de competição ... . Em seus três
incisos estão indicados alguns exemplos em que a Licitação é inexigível.293
Como nas demais hipóteses em que a Administração
está liberada da Licitação, aqui também devem ser atendidas as
exigências legais, sob pena de nulidade do ato praticado e
291 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 35.
292 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 36.
293 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 36.
76
responsabilidade, administrativa e civil, e até criminal.294
3.6 PROCESSO ADMINISTRATIVO E JUDICIAL NOS CRIMES LICITATÓRIOS
Conhecidos os fatos envolvendo uma Licitação ou
contratação irregular, imediatamente deve ser instaurado um processo
administrativo punitivo ou inquérito administrativo.295
O processo administrativo punitivo é um procedimento
de natureza administrativa obrigatório, destinado a apurar os fatos havidos
como irregulares e apontar seu autor para lhe ser aplicada a pena
administrativa correspondente.296
De acordo com Gasparini297, a pena é aplicada pela
autoridade competente, que varia de entidade para entidade. É
procedimento que deve ser aberto tanto nas entidades da Administração
Pública Direta (União, Estado, Distrito Federal, Município) como na Indireta
(sociedade de economia mista, empresa pública, fundação, autarquia).
Segundo Meirelles298, todos os crimes são punidos a
título de dolo e a ação penal é pública e incondicionada, aplicando-se,
no que couber,os arts. 29 e 30 do Código Penal. O Ministério Público pode
agir de ofício ou mediante provocação, mas esta não condiciona a sua
atuação. O rito processual é previsto nos arts. 100 a 108 da Lei 8.666, de
1993.
Qualquer pessoa tem a faculdade de comunicar ao
294 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 36.
295 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 41.
296 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 41.
297 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 41.
298 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. p. 187.
77
Ministério Público a ocorrência de ilícito penal. Independentemente da
forma pela qual a notícia chega ao conhecimento do Ministério Público,
terá ele o dever de promover a seqüência às investigações, inclusive
requisitando a abertura de inquérito policial.299
Os crimes licitatórios, observam as regras processuais
da Lei das Licitações, ou seja, o processo que esse diploma legal
estabeleceu, aplicando-se-lhe subsidiariamente o Código de Processo
Penal, conforme expressamente determina essa lei em seu art. 108.300
De acordo com Gasparini301, os crimes licitatórios são
todos da competência do Juiz Singular, salvo se o acusado gozar de foro
privilegiado, como é o caso do Prefeito Municipal. Este, nos termos do art.
29, X, da Constituição Federal, deverá ser julgado pelo Tribunal de Justiça
do Estado, salvo se houver interesse da União, pois nesse caso a
competência é do Tribunal Regional Federal competente.
O Governador beneficiário de igual prerrogativa será
julgado, consoante prescreve o art. 105, I, a, da Lei Magna, pelo Superior
Tribunal de Justiça, e o Presidente da República pelo Supremo Tribunal
Federal (art. 102, I, b, da CF).302
Embora formalmente garantida sua vigência, uma
norma legal pode ser ineficaz quando não possuir capacidade de
produzir efeitos.
Assim, estudados os principais aspectos dos Crimes na
Licitação, passaremos para as considerações finais deste trabalho.
299JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. p.587.
300 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 46.
301 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 51.
302 GASPARINI, Diógenes. Crimes na licitação, p. 51.
78
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo investigar, à
luz da legislação, da doutrina e da jurisprudência nacional, os crimes
previstos na Lei de Licitações, n. 8.666/93.
O interesse pelo tema abordado deu-se em razão de
sua atualidade e pela diversidade de modo que vem sendo abordado no
contexto nacional.
Para seu desenvolvimento lógico o trabalho foi dividido
em três capítulos.
O primeiro tratou de abordar as noções de
Administração Pública e do serviço público; sua evolução, conceitos,
objetivos e princípios.
Conforme disposto naquele capítulo, nos remeteu a
um correto entendimento do termo Administração Pública e Serviço
Público, apresentados como elementos do Direito Administrativo.
O segundo capítulo foi destinado a tratar dos aspectos
gerais da Licitação, sua evolução, conceito, previsão legal, princípios,
modalidades, tipos e fases.
Para encerrar o segundo capítulo, constatamos que as
primeiras regras sobre o tema no Brasil, vieram do Código da
Contabilidade Pública da União de 1922. Hoje temos a Lei federal n. 8.666
de 21.06.1993, que institui normas para Licitações e contratos
administrativos.
No terceiro e último capítulo, estudamos os crimes, seus
conceitos, e as espécies existentes no corpo da Lei das Licitações.
79
A partir do estudo constatamos uma consonância
entre as ações do administrador e seus limites, cujas práticas abusivas
aparecem como tipos penais como forma de coibir possíveis abusos nas
contratações públicas. Conhecemos individualmente todos os delitos
previstos na lei das Licitações, suas penas, as excludentes de
criminalidade, descobrimos que a ação penal é pública incondicionada
e, que serão os infratores julgados por juiz singular. A Lei das Licitações no
tocante aos crimes, tem aplicação subsidiária do Código Penal, Processo
Penal e da Lei de Execução Penal.
Por fim, retomamos as três hipóteses básicas da
pesquisa: a) A Administração Pública na lei das Licitações, rege-se, para
as contratações derivadas da Lei das Licitações, pelas regras de direito
público, jamais podendo abandoná-las, uma vez que estão fundadas em
princípios constitucionais e apenas de modo suplementar por regras de
direito privado, gerindo-se assim para um objetivo de interesse público. b)
As licitações devem seguir os princípios constitucionais que norteiam o
desenvolvimento das suas atividades, sob pena de restar ferido o Interesse
Público como meta primordial de todos os anseios dos administrados. c) As
sanções de direito substancial previstas na Lei das licitações, são
convenientes e adequados aos tipos penais por ela enumerados, uma vez
que apenam os infratores, restando apenas que sua materialização seja
tomada por uma eficácia mais constante, como modo de coibir abusos
mediante a exemplificação da punição corretamente aplicada.
Assim, as três hipóteses levantadas restaram
confirmadas, o que possibilita a conclusão desse breve relato.
80
REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS
BRASIL. Constituição da República federativa do Brasil: promulgada em 5
de outubro de 1988. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
CARLIN, Volnei Ivo. Direito Administrativo: doutrina, jurisprudência e direito
comparado. 3 ed. Florianópolis: OAB/SC editora, 2005.
COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito Penal das Licitações: comentários
aos artigos 89 a 99 da Lei n. 8.666, de 21.06.1993. 2 ed., São Paulo: Saraiva,
2004.
CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de Direito Administrativo: curso moderno
de graduação. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992
DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos Jurídicos da Licitação. 5 ed. São Paulo:
Saraiva, 2000.
DELMATO, Celso. Código Penal Comentado. 3 ed., Rio de Janeiro:
Renovar, 1991.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 12 ed. São Paulo:
Atlas, 2000.
________________. Direito Administrativo. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2006.
FAZZIO JUNIOR, Waldo. Fundamentos de Direito Administrativo. 3 ed. São
Paulo: Atlas, 2003.
FIGUEREDO, Lucia Valle. Curso de Direito Administrativo. 3 ed. São Paulo:
Malheiros editores, 1998.
FRIEDE, R. Lições Objetivas de Direito Administrativo (para concursos
públicos e universitários). São Paulo: Saraiva, 1999.
GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 5 ed, São Paulo: Saraiva, 2000.
________________. Crimes na Licitação. 3 ed, São Paulo: NDJ, 2004.
________________. Direito Administrativo. 10 ed, São Paulo: Saraiva, 2005.
81
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários a Lei de Licitações e Contratos
Administrativos. 9 ed., São Paulo: Dialética, 2002.
MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo: atualizada por
Eurico de Andrade Azevedo e Vera Monteiro. 14 ed, São Paulo: Malheiros,
1990.
____________________. Direito Administrativo Brasileiro: atualizada por Eurico
de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emanuel Burle Filho.
32 ed. São Paulo: Mallheiros, 2006.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado. 3 ed. São Paulo: Atlas,
2003.
MUKAI, Toshio. Licitações e Contratos Públicos: comentários à lei n.
8.666/93, com as alterações da lei n. 9.648/98 e análise das licitações e
contratos na E. C. n. 19/98(reforma administrativa). 5 ed., São Paulo:
Saraiva, 1999.
PEREIRA, Claudia Fernanda de Oliveira. Reforma Administrativa: o estado,
o serviço público e o servidor. 2 ed. Brasília: Brasília Jurídica, 1998.
RIGOLIN, Ivan Barbosa. Manual Prático das Licitações. 3 ed. São Paulo:
Saraiva, 1999.