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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ MICHAEL RIBEIRO AZEVEDO DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE Tijucas 2009

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

MICHAEL RIBEIRO AZEVEDO

DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE

Tijucas

2009

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MICHAEL RIBEIRO AZEVEDO

DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas. Orientador: Prof. Esp. Aldo Bonatto Filho

Tijucas

2009

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MICHAEL RIBEIRO AZEVEDO

DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE

Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e

aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.

Área de Concentração/Linha de Pesquisa: Direito Privado

Tijucas, 3 de dezembro de 2009.

Prof. Esp . Aldo Bonatto Filho Orientador

Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

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DEDICATÓRIA

A meus filhos Davi e Vitor. A vocês, dedico este trabalho.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, fonte suprema de todo saber.

Em especial aos meus pais, Antonio e Terezinha, que me forneceram amparo emocional e

material para que essa trajetória fosse realizada com êxito.

À minha amada esposa Carla Bianca, pela felicidade que proporciona à minha vida.

Aos meus filhos, Davi e Vitor, maior razão da minha vida, fonte infinita de alegria e amor,

que com muita paciência contavam os dias para ver o papai terminar esta pesquisa.

Ao Professor Orientador, Aldo Bonatto Filho, norte seguro na orientação deste trabalho, por

ter sido presente e acessível no decorrer desta pesquisa, exemplo de Professor e Advogado,

Mestre e Amigo.

Aos Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, campus Tijucas, que

muito contribuíram para a minha formação jurídica.

Aos que colaboraram com suas críticas e sugestões para a realização deste trabalho.

Aos amigos de classe, pelos momentos que passamos juntos e pelas experiências trocadas.

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta pesquisa.

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EPÍGRAFE

“A ingratidão é um direito do qual não se deve fazer uso.”

Machado de Assis

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca

do mesmo.

Tijucas, 3 de dezembro de 2009.

Michael Ribeiro Azevedo Graduando(a)

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RESUMO

Este trabalho monográfico tem como objetivo analisar a sucessão hereditária do cônjuge supérstite em face do Código Civil, Lei 10.406, de janeiro de 2002. Antes da abordagem específica do assunto, será apresentada a sucessão geral e sua evolução histórica, em seguida será apresentada a natureza jurídica do casamento e os regimes de bens existentes, sendo que o regime de bens tem grande influência no direito sucessório do cônjuge sobrevivente, direito este que foi alvo de grandes modificações com o passar do tempo, modificações estas de relevância e impacto na sociedade, uma vez que com a inclusão do cônjuge sobrevivo na ordem de vocação hereditária, como herdeiro necessário, concorrendo em certas situações com descendentes e ascendentes, de acordo como o disposto no artigo 1.829 do Código Civil vigente. Esta inovação gerou divergências doutrinárias e jurisprudenciais diante das restrições impostas pelo legislador para acolher o cônjuge como herdeiro. Essas restrições controvertidas residem principalmente no regime da comunhão parcial de bens, onde o legislador impõe como requisito para que o cônjuge venha a suceder, que o de cujus tenha deixado bens particulares. Por fim, verificou-se que no caso de não haja ascendentes e descendentes, a herança será deferida por inteiro ao cônjuge sobrevivente, desde que este não esteja separado judicialmente ou incorrendo, ou, ainda esteja separado de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornará impossível sem culpa do sobrevivente, requisito este causador de desconforto entre os doutrinadores pela questão subjetiva da culpa. Palavra-chave: Sucessão. Cônjuge. Concorrência Sucessória.

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SYNTHESIS

This monograph work has the purpose to examine the hereditary succession of the survivor spouse and face of the civil code, law 10.406, from janurary 2002. Before the specific approach of the subject, will be introduce to a juridical character of the marriage and the assets social system existents, been that the assets social system has big influence in the right of the successor surviving consort , right this that was target of big modifications that with the time going by ,this modifications have importance and impact in the partnership with the inclusion of the surviving spouse in order of the hereditary vocation, like necessary inheritor, into concord with certantys situations with descedants and ascendants in agreement like the article 1.829 from the civil code in effect. This innovation generate doctrinal disagreement with the common law in front of the impose restriction through by who impose the law to protect the consort like an inheritor. This controversy restrictins reside mainly in the partial assets of the community property social system by who impose the law like a requisite for the consort cmome to succed, for what whose have left specific assets. At the end we found out that the case doesen’t have ascendants and descendants, and the inheritance will be whole unfurly to surviving spouse, as long as his it isen’t legally a part or to incur or is in fact a part for more than two years, safe evidence, in this case, that this companionship become impossivel whihout fault from the surviving, the causer requisite for discomfort among the teachers for the subjective question for the fault. Key Word: Succession. Spouse. Successory Bidding.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Ago. Agosto Ampl. Ampliada Atual. Atualizada art., arts. Artigo, artigos CC Código Civil ed. Edição Esp. Especialista Jul. Julho Mar. Março Msc. Mestre n. Número Out. Outubro p. Página Prof. Professor rev. Revista Set. Setembro STJ Superior Tribunal de Justiça STF Supremo Tribunal Federal vol. Volume

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LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS

Lista de categorias1 que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho,

com seus respectivos conceitos operacionais2.

Casamento

“O Casamento é um vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio mútuo

material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma

família”3.

Direito

“Palavra plurívoco-analógica, derivado do latim, directu, que substitui o termo jus, do latim

clássico, por ser mais expressiva. O jus era o conjunto de normas formuladas pelos homens,

destinadas a dar ordem à vida em sociedade. Em Roma havia também o faz, cuja aplicação

cabia aos pontífices. Remotamente a palavra Direito significa conduzir, guiar. Porem hoje em

dia, Direito traduz o conjunto de normas de conduta impostas para regularizar a convivência

humana”4.

Direito das Sucessões

“O Direito das Sucessões se apresenta como o conjunto de princípios jurídicos que

disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus sucessores”5.

1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, v 5. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 39. 4 GUIMARÃES, Torrieri. Dicionário Jurídico / organizador Deocleciano; coordenadora Sandra Julien Miranda. 3. ed. São Paulo: Rideel, 1999. – (Coleção de Leis Rideel. Série Compacta), p.66. 5 OLIVEIRA, Euclides Benedito de; AMORIM, Sebastião Luiz. Inventário e Partilhas Direito das Sucessões. 20. ed. rev. e. atual. em face do novo Código Civil - São Paulo: LEUD, 2006. p. 30.

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Herança

“[..]é o conjunto de direitos e obrigações que se transmitem, em razão da morte, a uma pessoa,

ou a um conjunto de pessoas, que sobreviveram ao falecido”6.

Herdeiros necessários

“é o descendente, ascendente sucessível ou desde que preenchdas certas condições (CC, art.

1.829, I), o cônjuge do de cujus”7.

Ordem de Vocação Hereditária

“A ordem de vocação hereditária é a relação preferencial, estabelecida pela lei, das pessoas

que são chamadas a suceder o finado”8.

Sucessões

“A idéia de sucessão sugere, genericamente, a de transmissão de bens, pois implica a

existência de um adquirente de valores, que substitui o antigo titular. Assim, em tese, a

sucessão pode operar-se a título gratuito ou oneroso, inter vivos ou causa mortis”9.

Sucessão Legítima

“É aquela que ocorre em virtude da morte de alguém, sendo chamados para suceder ao

falecido, no que diz respeito ao seu patrimônio (herança), aqueles que a lei designa

especificamente”10.

6 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. 9. ed. São Paulo: Atlas S.A, 2009, p. 6. 7 DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 14. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1331. 8 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. v.6: direito das sucessões. 25. ed. atualizada de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002, com a colaboração de Zeno Veloso - São Paulo: Saraiva, 2002, p. 94. 9 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, v.6: direito das sucessões, p.03. 10 OLIVEIRA, Euclides Benedito de; AMORIM, Sebastião Luiz. Inventário e Partilhas Direito das Sucessões. 20. ed. rev. e. atual. em face do novo Código Civil. São Paulo: LEUD, 2006, p.67.

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Supérstite

Expressão que denomina o cônjuge sobrevivente, empregada especialmente no direito

sucessório e, neste, quanto a meação dos bens deixados pelo de cuju11.

11 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Básico de Direito Acquaviva. 5. ed. Atual., rev e atual de acordo com o novo código civil. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004, p. 265.

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SUMÁRIO

RESUMO................................................................................................................................... 5

SYNTHESIS.............................................................................................................................. 6

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ............................................................................. 7

LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS.............................. 8

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13

2 O DIREITO DAS SUCESSÕES E SUAS GENERALIDADES...................................... 16 2.1 DEFINIÇÃO DA PALAVRA SUCESSÃO ......................................................................16 2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DAS SUCESSÕES........................................18 2.3 SUCESSÃO GERAL .........................................................................................................20 2.3.1 Espécies e Efeitos da Sucessão........................................................................................21 2.3.2 Abertura da Sucessão e Transmissão da Herança ...........................................................23 2.3.3 Aceitação e Renúncia da Herança ...................................................................................26 2.3.4 Herança e Meação ...........................................................................................................29 2.4 A VOCAÇÃO HEREDITÁRIA.........................................................................................30

3 DO CASAMENTO .............................................................................................................. 34 3.1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DO CASAMENTO..........................................34 3.1.1 Conceito de Casamento ...................................................................................................35 3.1.2 Natureza Jurídica ............................................................................................................35 3.2 DO REGIME DE BENS ENTRE OS CÔNJUGES ...........................................................37 3.2.1 Regime da Comunhão Parcial .........................................................................................39 3.2.2 Regime da Comunhão Universal de Bens. ......................................................................43 3.2.3 Regime de Participação Final nos Aqüestros. .................................................................48 3.2.4 Regime da Separação de Bens.........................................................................................51 3.3 A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS.................................................................54

4 SUCESSÃO DO CONJUGE .............................................................................................. 56 4.1 VOCAÇÃO HEREDITÁRIA DO CÔNJUGE ..................................................................56 4.2 CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTES...................................................................59 4.2.1 Comunhão Parcial de Bens..............................................................................................60 4.2.1.1 Corrente “A” (bens particulares) ..................................................................................60 4.2.1.2 Corrente “B” (bens particulares + meação do falecido) ...............................................61 4.2.1.3 Corrente “C” (bens comuns).........................................................................................62 4.2.2 Participação Final de Aquestos .......................................................................................63 4.2.3 Separação de Bens ...........................................................................................................64 4.2.3.1 Separação Convencional de Bens.................................................................................64 4.2.3.2 Separação Obrigatória de Bens ....................................................................................65 4.2.4 Comunhão Universal de Bens .........................................................................................67 4.3 CONCORRÊNCIA COM ASCENDENTES .....................................................................68 4.4 SUCESSÃO LEGÍTIMA DO CÔNJUGE .........................................................................69 4.4.1 Sucessão do cônjuge sobrevivente ..................................................................................69 4.5 Sucessão no direito real de habitação .................................................................................71

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 73

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 77

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objeto12 o estudo do direito sucessório do cônjuge

supérstite sob a égide do atual Código Civil.

A importância deste tema reside em demonstrar a nova ordem de vocação hereditária

do cônjuge sobrevivente em concorrência com os demais herdeiros, especialmente

correlacionado ao regime de bens adotado pelos nubentes ao contrair o matrimônio.

Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito

na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem

colaborar para o conhecimento de um tema que, apesar de não poder ser tratado como

novidade no campo jurídico, na dimensão social-prática ainda pode ser tratado como elemento

novo e repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos.

A escolha do tema é fruto do interesse pessoal do pesquisador em demonstrar os

requisitos para que o cônjuge receba o direito de suceder ao consorte, seja como único

herdeiro, seja como concorrente de seus ascendentes e descendentes, assim como para instigar

novas contribuições para estes direitos na compreensão dos fenômenos jurídicos-políticos,

especialmente no âmbito de atuação do Direito das Sucessões.

Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho é

analisar o direito sucessório do cônjuge supérstite em face do de cujus.

O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel

em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,

campus de Tijucas.

Como objetivo específico, pretende-se apresentar noções gerais sobre o direito das

sucessões e suas generalidades, desde a apresentação da definição da palavra sucessão, sua

evolução histórica, a sucessão geral e a vocação hereditária; apresentar o conceito e natureza

12 Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.

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jurídica do casamento, bem como os regimes de bens existentes, uma vez que o regime

adotado pelos cônjuges é que faz a distinção do direito sucessório do cônjuge supérstite; e por

fim apresentar o regramento e as posições doutrinárias a cerca dos direitos do cônjuge

sobrevivente, especialmente com relação a sua posição na ordem da vocação hereditária, a

concorrência com descendente e ascendentes, bem como as diferenças existentes entre os

regimes de bens relacionados com os direitos sucessórios.

Não é o propósito deste trabalho atribuir uma resposta linear ou pacífica sobre quando

e como se da o direito sucessório do cônjuge supérstite. Por certo não se estabelecerá um

ponto final em referida discussão. Pretende-se, tão-somente, aclarar o pensamento existente

sobre o tema, e de forma coesa e amparado na pesquisa jurídica apresentar um

posicionamento em relação ao instituto.

Para o desenvolvimento da presente pesquisa foram formulados os seguintes

questionamentos:

a) O cônjuge sempre terá direito a sucessão do de cujus?

b) Eventual direito sucessório do cônjuge supérstite está vinculado ao regime de

casamento adotado?

Já as hipóteses consideradas foram as seguintes:

a) Não, pois havendo descendentes do de cujos dependerá do regime de bens adotado

pelos cônjuges no casamento, neste caso, dependendo do regime cônjuge não terá direito

algum a herança ou concorrerá com os descendentes, na falta de descendentes concorrerá com

os ascendentes e na falta destes terá direito a todo acervo hereditário;

b) Sim, pois no regime da comunhão universal não haverá o direito de herdar, bem

como nos demais regimes, pela corrente majoritária a qual nos filiamos diante do estudo

proferido, dependerá da existência de bens particulares do de cujus,.

O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,

delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira, atinente a sucessão geral e

sua evolução histórica; a segunda, concernente a natureza jurídica do casamento e os regimes

de bens existentes; e, por derradeiro, a vocação hereditária do cônjuge sobrevivente e a

respectiva concorrência com demais herdeiros de acordo com a vocação hereditária.

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Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado

o método dedutivo, e, o relatório dos resultados expresso na presente monografia é composto

na base lógica dedutiva13, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se

posições científicas que os sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a

prevalência, ou não, das hipóteses elencadas.

Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente, da categoria,

do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica14.

Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa

e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e

seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais

aprofundados no corpo da pesquisa.

A estrutura metodológica e as técnicas aplicadas nesta monografia estão em

conformidade com o padrão normativo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)

e com as regras apresentadas no Caderno de Ensino: formação continuada, Ano 2, número 4;

assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas

úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco Colzani, Guia para redação do trabalho

científico.

A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são

apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos

estudos e das reflexões sobre o tema abordado.

Com este itinerário, espera-se alcançar o intuito que ensejou a preferência por este

estudo: demonstrar que o direito sucessório do cônjuge supérstite está presente no

ordenamento jurídico, no entanto há diversos posicionamentos doutrinários a cerca do tema,

uma vez que a leitura literal da lei, traz dúvidas a cerca de sua aplicação, sendo necessário

buscar na doutrina e na jurisprudência as respostas necessárias para ao menos apaziguar as

dúvidas que insurgem quando da aplicação da norma em concreto.

13 Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125. 14 Quanto às “Técnicas” mencionadas, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 61-71, 31- 41, 45- 58, e 99-125, nesta ordem.

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2 O DIREITO DAS SUCESSÕES E SUAS GENERALIDADES

O direito das sucessões nada mais é do que um “conjunto de normas que disciplinam a

transferência do patrimônio” de uma pessoa, “depois de sua morte, ao herdeiro”, na forma da

lei ou de testamento15.

Este capítulo tem como objetivo apresentar noções gerais sobre o Direito das

Sucessões, definindo e conceituando a palavra “sucessão”. Tratar desde o momento da

abertura da sucessão a efetiva transmissão da herança ao cônjuge, quando titular do direito,

seja ele legítimo ou não, expondo a natureza e os fundamentos jurídicos para tanto, iniciando

pela Sucessão Geral e finalizando na Vocação Hereditária.

2.1 DEFINIÇÃO DA PALAVRA SUCESSÃO

A palavra sucessão em sentido amplo é a substituição de uma pessoa por outra em

determinada situação jurídica, substituindo o titular de determinados bens. Numa compra e

venda, por exemplo, o comprador sucede o vendedor. O direito das sucessões disciplina a

transmissão do patrimônio do de cujus (autor da herança) a seus sucessores16.

Abordando sobre as formas de sucessão em relação ao vocábulo, ensina Venosa que:

No direito, costuma-se fazer uma grande linha divisória entre duas formas de sucessão: a que deriva de um ato entre vivos, com um contrato, por exemplo, e a que deriva ou tem com causa a morte (causa mortis), quando os direitos e obrigações da pessoa que morre transferem-se para seus herdeiros e legatários17.

15 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v.6: direito das sucessões. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 3. 16 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, v.7. Direito das Sucessões 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1. 17 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 1.

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Ainda podemos verificar a palavra sucessão em sentido amplo em vários ramos do

Direito Civil, para tanto Rizzardo diz que:

Também há sucessão no direito das obrigações, onde encontramos instituto como a cessão, a sub-rogação, e igualmente a transmissão das obrigações de um sujeito a outro; no Direito das Coisas, com o significado de tradição; e no Direito de Família, quando o poder familiar sobre os filhos, exercido por um dos cônjuges, se transmite a outro18.

Para Diniz, o vocábulo sucessão na acepção jurídica em sentido amplo é

[...] todos os modos derivados de aquisição do domínio, de maneira que indicaria o ato pelo qual alguém sucede a outrem, investindo-se, no todo ou em parte, nos direitos que lhe pertenciam. Trata-se da sucessão inter vivos, pois o comprador sucede o vendedor, o donatário ao doador, tomando uns o lugar do outro [...]19.

No entanto o sentido da palavra sucessão proveniente dos Direitos das Sucessões ou

em sentido estrito, está diretamente ligada a transmissão em decorrência da morte, ou seja,

causa mortis.

Neste esteio, Monteiro num sentido estrito do vocábulo, traz o seguinte ensinamento:

No direito das sucessões, entretanto, emprega-se o vocábulo num sentido mais restrito, para designar tão somente a transferência da herança, ou do legado, por morte de alguém, ao herdeiro ou legatário, seja por força de lei, ou em virtude de testamento (hereditas nihil aliud est quam successio in universum jus, quo defunctos habuit)

20.

Na mesma linha de pensamento, porém com uma visão científica jurídica, Venosa,

muito propriamente coloca que

Quando se fala, na ciência jurídica, em direito das sucessões, está-se tratando de um campo específico do direito civil: a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte. É o direito hereditário, que se distingue do sentido lato da palavra sucessão, que se aplica também a sucessão entre vivos21.

18 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 2. 19 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 13. 20 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, v. 6. 36. ed. rev. e atual. por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. São Paulo: Saraiva, 2008, p 1. 21 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 1.

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Da mesma forma nos ensina Gonçalves, se referindo ao vocábulo sucessão em sentido

estrito:

No direito das sucessões, entretanto, o vocábulo é empregado em sentido estrito, para designar tão somente a decorrente da morte de alguém, ou seja, a sucessão causa mortis. O referido ramo do direito disciplina a transmissão do patrimônio, ou seja, do ativo e do passivo do de cujus, ou autor da herança a seus sucessores22.

Como vimos, o vocábulo sucessão está presente em vários ramos do direito civil, uma

vez que, na sucessão, existe uma substituição do titular de um direito, seja por ato entre vivos

ou por morte causa. A terminologia Direito das Sucessões, portanto, não se confunde com as

sucessões operadas em vida, pelos titulares dos direitos, pois trata das regras de transmissão

de direitos e obrigações em razão da morte do seu titular23.

2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DAS SUCESSÕES

O direito das sucessões foi um dos ramos do direito civil que mais passou por

mudanças, com relação ao direito moderno. Em Roma inicialmente o herdeiro continuava a

personalidade do falecido, uma vez que o herdeiro deveria dar continuidade ao culto familiar

atinente a religião24.

Por testamento, de forma rígida como era a estrutura da família, o pai escolhia o

herdeiro mais habilitado para exercer o comando da família, ficando este com o encargo de

realizar as práticas religiosas domésticas, em favor do falecido, além de administrar o

patrimônio existente25.

Outro ponto de grande mudança, é que o direito sucessório beneficiava

preferencialmente os filhos homens, como nos mostra Monteiro:

[...]Se o finado deixa simultaneamente filhos e filhas, estas não herdavam. Sua exclusão era ditada porque a lei assim determinava, ou em virtude de renúncia, que lhes impunha, forçadas a aceitação de um simples dote. A Lei

22 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p 2. 23 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 2 24 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 3 25 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões, p. 2

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Sálica, que apenas contemplava os varões na distribuição da propriedade imobiliária, constituía exemplo típico dessa injustiça social [...]26.

No mesmo sentido, Rizzardo em sua obra, explica que trata-se de uma característica

comum dos povos primitivos:

Em todos os povos primitivos, de modo geral, havia características comuns: os direitos patrimoniais não se partilhavam, mas pertenciam à família. Com a morte do pai, a administração passava ao filho primogênito, sempre do sexo masculino. E nestes sistemas (em que só o filho primogênito herdava), ficava o patrimônio nas mãos do um ramo familiar. O primogênito tronava-se opulento. Os demais filhos trabalhavam para aquele, a quem ficavam subordinados, e numa situação econômica inferior. A Bíblia traz exemplos de privilégios em favor da primogenitura27.

Leite, ao descrever a origem dos direitos das sucessões, evidenciando os aspectos

religiosos, nos ensina que:

Desde a Antiguidade (grega ou romana) a sucessão privada se justificava por considerações religiosas. O culto familiar, ou seja, o culto dos ancestrais consistia em oferecer ai morto oferendas fúnebres e sacrifícios sobre seu túmulo. Este culto era celebrado na casa familiar onde os mortos eram enterrados. Assim, para assegurar a necessária continuidade do culto, era fundamental que os encarregados da cerimônia recolhessem a propriedade do morto. Os herdeiros homens eram os sacerdotes deste culto justificando a transmissão apenas pela linha masculina, aos agnados. Istoé, a herança se transmitia ao primogênito varão. Os direitos de progenitura e varonia, como manifestação veemente da política patriarcal, mantinha a família poderosa, e impedia a divisão da fortuna. Herança e obrigação religiosa achavam-se permanentemente vinculadas28.

O direito romano em sua evolução, passou a permitir que a mulher fosse chamada

sucessão, de acordo com o que nos coloca Venosa:

No Direito Romano, não havia propriamente sucessão do cônjuge, já que a transmissão se efetuava pela linha masculina. Apenas na última fase do Direito Romano, já com Justiniano, é que se permitiu à mulher suceder nos bens do marido, estabelecendo-se uma possibilidade de usufruto, concorrendo com os filhos29.

26 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Sucessões, p 2. 27 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões, p. 5 28 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 25 29 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 126

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Por fim, com advento do Código Napoleão, passamos a ter a igualdade entre os

herdeiros do mesmo grau, além de restringir o círculo de sucessíveis, uma vez que no antigo

direito inexistia qualquer limitação, de forma a manter o patrimônio mais próximo a origem

familiar, conforme com muita propriedade coloca Monteiro:

[...]O Código Napoleão começou, no entanto, restringir o círculo dos sucessíveis, fixando no 12º grau (art. 755). O Código Italiano de 1865 baixou-o para o 10º grau (art. 742). Os Códigos posteriores promulgados delimitaram-no ainda mais, havendo alguns, como o da România, Bélgica e Países Escandinavos que o situaram no 4º grau, para não se mencionar a Rússia, que só admite à Sucessão parentes até o 3º grau. O Código Civil Brasileiro de 1916, por sua vez, posteriormente, restringiu para o 6º grau a ordem de vocação hereditária, mas por força do estatuído no Decreto-lei n. 9461, de 15 de julho de 1946, não ia além do 4º grau, na linha colateral ou transversal. O Código Civil de 2002 manteve essa gradação, como se percebe do disposto no art. 1829, n. IV, combinado com o art. 183930.

Diante de tais considerações acerca da evolução do Direito das Sucessões, verificou-se

no direito antigo, a sucessão restringia-se a linha masculina, e em não havendo filho, adotava-

se um herdeiro, com o uso do testamento, outra questão em que houve grande mudança é que

a mulher era discriminada, não herdando sequer por morte do marido. Tais costumes se

davam para manter o grupo familiar forte evitando a divisão da fortuna entre vários filhos,

inclusive com relação aos cultos religiosos.

2.3 SUCESSÃO GERAL

Tendo-se evidenciado a definição do vocábulo “sucessão”, bem como a evolução

histórica do Direito das Sucessões desde o direito romano, passamos a tratar do Direitos das

Sucessões no ordenamento jurídico de forma específica.

Gonçalves, nos ensina que:

A Constituição Federal assegura, em seu artigo 5º, XXX, o direito de herança. E o Código Civil Brasileiro disciplina o direito das sucessões em quatro títulos, eu tratam respectivamente, da sucessão em geral, da sucessão legítima, da sucessão testamentária e do inventário e partilha31.

30 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p 3-4. 31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p 11.

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2.3.1 Espécies e Efeitos da Sucessão

A Sucessão pode se dar de forma legítima ou ab intestato e testamentária. A sucessão

legítima deriva imediatamente da lei, ao contrário da sucessão testamentária que resulta, na

forma da lei, de uma declaração de última vontade, denominada testamento32.

O artigo 1.786 do Código Civil Brasileiro, prevê duas formas de sucessão no direito

brasileiro: “A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade” 33.

Segundo Leite, a Sucessão Legítima, que á a resultante de lei. “Ocorre sempre que o

autor da herança morre sem deixar disposição de última vontade; diz –se sucessão ab intestato

(art. 1788). A sucessão legítima prevalece em todos os casos e sobre todos os bens, quando

não há testamento. Nesse sentido é que se diz que ela é residual”34.

Prescreve o art. 1.788 do Código Civil:

Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo35.

Portanto, morrendo uma pessoa sem deixar testamento, sua herança será transferida

aos herdeiros legítimos, de acordo com o expresso em lei.

Gomes, conceitua herdeiro legítimo “a pessoa indicada na lei como sucessor nos casos

de sucessão legal, a quem se transmite a totalidade ou quota-parte da herança” 36.

Para Leite, a Sucessão Testamentária, que á a resultante da vontade do testador.

“Deriva do testamento, isto é, da manifestação de vontade do testador que, além da legítima,

abre espaço à vontade soberana do testador, quanto à cota disponível”37.

32 GOMES, Orlando. Sucessões. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p.39. 33 BRASIL. Códigos civil; comercial; processo civil; constituição federal. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto; Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt; Lívia Céspedes. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 465. 34 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 37. 35 BRASIL. Código civil, p. 465. 36 GOMES, Orlando. Sucessões, p.40. 37 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 38.

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Com relação a “vontade soberana” do testador, Monteiro destaca que:

Importa frisar, para logo, que absoluta não é a liberdade de testar, como outrora sucedia no direito romano. Atualmente, pelo nosso direito, se o testador tem herdeiros necessários, isto é, descendentes, ascendentes e cônjuge sucessíveis (art. 1845), somente poderá dispor da metade de seus bens (art.1.789)38.

Gomes, conceitua herdeiro testamentário a pessoa “que é o sucessor a título universal

nomeado em testamento” 39.

Gonçalves ao analisar a falta de utilização de testamento na prática, no Brasil, aduz

que:

A Sucessão Legítima foi a mais difundida no Brasil. A escassez de testamento entre nós é devida a razão de ordem cultural ou costumeira, bem como o fato de o legislador brasileiro ter disciplinado muito bem à sucessão ab intestato, chamando a suceder exatamente aquelas pessoas que o de cujus elencaria se, na sua ausência de regras, tivesse de elaborar testamento.40

Desta forma verifica-se ainda, que o Código Civil de 2002, ao incluir o cônjuge

supérstite no rol dos herdeiros necessários, determinando que concorra com os herdeiros das

classes de descendentes e ascendentes e que faça parte da terceira classe, com exclusividade,

nos demonstra motivo pelo qual, reduziu ainda mais o interesse de as pessoas utilizarem o

testamento41.

Quanto aos feitos a sucessão pode ser ainda classificada a Título Universal e a Título

Singular.

Segundo Leite, na sucessão a Título Universal, “a transmissão do patrimônio opera-se

como um todo orgânico, compreendendo ativo e passivo. O sucessor universal substitui

integralmente o de cujus, sub-rogando-se em seus direitos e obrigações. Por isso quem sucede

a título universal é herdeiro”42.

38 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p. 10. 39 GOMES, Orlando. Sucessões, p.40. 40 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 24. 41 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 24. 42 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 41.

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Para Leite, na sucessão a Título Singular, “a transmissão de bens limita-se a coisa

certa e determinada não implicando em qualquer responsabilidade pelas dívidas do falecido

(salvo, se o de cujus tiver onerado o legado). Por isso quem sucede a título singular é

legatário”43.

Por fim, com relação às espécies de sucessão, no direito das sucessões, verifica-se que

a sucessão legítima, aplica a regra descrita na lei. Refere a transmissão da herança às pessoas

constantes da ordem de vocação hereditária, por direito próprio ou por direito de

representação, já a sucessão testamentária contém prescrições relativas à transmissão de bens,

causa mortis, por ato de última vontade, estando o testador limitado, caso haja herdeiros

necessários. Da mesma forma que o herdeiro é em regra indicado por lei (art. 1.829) e o

legatário é o designado pelo testador no ato de ultima vontade.

2.3.2 Abertura da Sucessão e Transmissão da Herança

Dispõe o art. 1.784 do Código Civil: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde

logo aos herdeiros legítimos e testamentários”44.

Como já vimos, a sucessão hereditária advêm do fato “morte”, que determina a

transferência da “herança” aos herdeiros legítimos e testamentários na forma da lei, a morte é

o fato jurídico, que indica a abertura da sucessão, pois neste momento ocorre a transmissão

imediata do acervo aos herdeiros, sendo importante a fixação exata do tempo da morte45.

Dias, ao comentar sobre a “sucessão causa mortis” e a abertura da sucessão assim

lecionou:

A existência da pessoa natural termina com a morte (CC 6º)46, sendo desnecessário o reconhecimento judicial deste fato. Ainda que não faça parte do fenômeno sucessório, a morte é pressuposto para a sucessão. Com a morte ocorre o que se chama de abertura da sucessão: cessa a capacidade jurídica de uma pessoa e começa a de outro em relação aos seus bens47.

43 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 41. 44 BRASIL. Código civil, p. 465. 45 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 11. 46 Art. 6º. A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva. 47 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 94.

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Gomes, é objetivo ao falar sobre a abertura da sucessão com relação ao termo “causa

mortis”:

A abertura da sucessão é efeito instantâneo da morte de alguém. Não se confunde, portanto, com sua causa. Deriva do fato jurídico stricto sensu com o qual coincide cronologicamente, mas, do ponto de vista lógico, sucede a morte do auctor successiones. Não se identifica, numa palavra 48.

Por outro lado, conforme artigo 1.785 CC, a abertura da sucessão, em termos técnicos,

se da no lugar de último domicílio do falecido.

Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido49.

Neste sentido, Rizzardo nos ensina a importância de se proceder a abertura da

sucessão no último domicilio do finado, como vemos:

O lugar da abertura da sucessão será o do último domicílio do finado, de acordo com o art. 1.785, reeditando o art. 1.578 do Código revogado: “A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido”. No centro dos interesses do de cujus deve-se processar a apuração do seu patrimônio. Não se mostra relevante a localidade onde ocorreu o falecimento, ou se o autor da herança residia em local distinto. Importa levar em conta onde estavam situados seus principais interesses ou concentrava-se a administração e as decisões do falecido. O domicílio, pois, determinará o foro do processamento do inventário. Além disso, a previsão do art. 96 de Código de Processo Civil permite duas exceções, em seu parágrafo único: no caso de não possuir o autor da herança domicílio certo, quando então se processará o feito no foro da situação dos bens; e na hipótese de existirem bens em lugares diversos, sem o domicílio certo, em que se firma a competência pelo lugar da ocorrência do óbito50.

Portanto, com a abertura da sucessão, ou seja, momento da morte do de cujus,

acontece imediatamente a transmissão da posse e da propriedade aos herdeiros legítimos e

testamentários, sem a necessidade de qualquer manifestação dos mesmos51.

Gonçalves, ao fazer um comparativo com Código Civil de 1916, assim nos esclarece:

O diploma de 2002 aperfeiçoou a redação do dispositivo, não mais falando em transmissão do “domínio e posse da herança”, como o fazia o art. 1572

48 GOMES, Orlando. Sucessões, p.13. 49 BRASIL. Código civil, p. 465. 50 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões, p. 24. 51 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 34.

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do Código de 1916 52. O vocábulo “domínio” tem acepção restrita aos bens corpóreos, enquanto a palavra “herança” tem maior amplitude, abrangendo o patrimônio do de cujus, que não é constituído apenas de bens materiais e corpóreos, como um imóvel ou um veículo, mas representa uma universalidade de direito, o complexo de relações jurídicas dotadas de valor econômico (CC, art.91.)53.

Com o advento do Código Civil de 2002, entende-se que herança compreende o ativo

e o passivo (CC, arts. 1.792 e 1.997), ou seja, o herdeiro recebe os bens e as dívidas, os

direitos e as obrigações54.

No direito brasileiro aplica-se o método saisine, conforme registra Dias:

No momento da morte ocorre a sucessão hereditária. O acervo patrimonial do falecido transmite-se aos herdeiros independentemente de qualquer formalidade (CC 1.984). Isto decorre do chamado principio saisine, palavra de origem francesa que significa agarrar, prender, apoderar-se. Claro que este princípio consagra uma ficção: a imediata transferência de pleno direito dos bens quando da abertura da sucessão. Representa uma apreensão possessória. Nada mais do que a faculdade de alguém entrar na posse de bens alheios. Isso tudo para que bens, direitos e obrigações não se extingam com a morte de seu titular. São inegáveis as vantagens da adoção do princípio da saisine: evita o estado de acefalia do patrimônio, a jazer sem titular; dispensa a ficção jurídica de emprestar personalidade jurídica ao espólio; propicia a qualquer herdeiro o manejo das ações possessórias55.

Por fim, verifica-se que a herança transfere-se ao herdeiro do de cujus

automaticamente no momento em que este se passa e não com a emissão da partilha feita no

inventário, da mesma forma que a base de cálculo para o pagamento do imposto causa mortis,

é o instante da morte, quando se dá o fato gerador, sendo que a abertura da sucessão deve ser

processada em regra geral, no último domicílio do falecido, onde se dá o foro competente para

o inventário56.

52 Art. 1.572. Aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. 53 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 14. 54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 14. 55 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, p. 101. 56 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 29.

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2.3.3 Aceitação e Renúncia da Herança

Tendo-se evidenciado a abertura da sucessão e sua transferência, passamos a adentrar

em um tema de suma importância para a efetiva transferência da herança, qual seja, a

aceitação ou a renuncia da herança.

Monteiro, ao fazer referência ao Código Civil, leciona que a aceitação da herança é ato

imprescindível, pois constitui espécie de condição, imposta pela lei, para que o herdeiro possa

suceder. Ato este pelo qual o herdeiro demonstra a vontade de receber a herança transmitida

por ocasião da abertura da sucessão. É o ato pelo qual a pessoa chamada a suceder declara se

quer ou não ser herdeira e recolher a herança57.

O Código Civil em seu artigo 1.804 prevê:

Aceita a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, desde a abertura da sucessão. Parágrafo único. A transmissão tem-se por não verificada quando o herdeiro renuncia à herança58.

Diniz conceitua a aceitação da herança como:

A aceitação, ou a adição da herança, vem a ser o ato jurídico unilateral pelo qual o herdeiro, legítimo ou testamentário, manifesta livremente sua vontade de receber a herança que lhe é transmitida, visto que ninguém pode ser herdeiro contra a sua vontade, em razão da parêmia invito non datur beneficium

59.tem efeito meramente confirmativo da aquisição ipo jure da

posse e da propriedade do acervo hereditário. Aceita a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, desde a abertura da sucessão (CC, art.1.804)60.

A aceitação da herança pode ser marcada por várias características, como nos ensina

Rizzardo:

A aceitação não é um ato simples, mas complexo, com várias características. Primeiramente, é um ato que exige a manifestação da vontade, de modo expresso ou tácito. Mesmo que nenhuma manifestação explícita se exija, há, no entanto, elementos que levam a induzir a aceitação, como a não recusa quando chamado o herdeiro a participar do inventário. Por outras palavras, a

57 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p. 51. 58 BRASIL. Código civil, p. 467. 59 “Não se faz beneficio ao que não quer” 60 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 67.

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omissão de qualquer ato contrário à sua participação na relação dos herdeiros conduz a concluir pela aceitação61.

Na compreensão quanto à forma de aceitação da herança, Gonçalves, para tanto evoca

três formas:

Quanto à sua forma, a aceitação pode ser expressa, quando é manifestada mediante declaração escrita (CC, art. 1.805, caput); tácita, quando resulta de conduta própria de herdeiro (art. 1.805, caput); e presumida, quando o herdeiro permanece silente, depois de notificado, nos termos do art. 1.807, para que declare, em prazo não superior a trinta dias, a pedido de alguém interessado – geralmente o credor – se aceita ou não a herança62.

Desta forma preceitua o art. 1.805 do Código Civil:

Art. 1.805. A aceitação da herança, quando expressa, faz-se por declaração escrita; quando tácita, há de resultar tão-somente de atos próprios da qualidade de herdeiro.

§ 1º Não exprimem aceitação de herança os atos oficiosos, como o funeral do finado, os meramente conservatórios, ou os de administração e guarda provisória.

§ 2º Não importa igualmente aceitação a cessão gratuita, pura e simples, da herança, aos demais co-herdeiros.63.

Por outro lado, se a aceitação não requer formalidade especial, tal não ocorre com a

renúncia da herança, a renúncia, a exemplo da aceitação, é declaração unilateral de vontade,

só que necessita de vontade expressa, portanto a renúncia deverá constar expressamente de

escritura pública, ou termo judicial (art.1.806). A escritura pública por sua vez, deve ser

levada aos autos de inventário, o termo perante o juízo de inventário64.

Diniz leciona, que a renúncia é ato importantíssimo, uma vez que efetivada, o herdeiro

deixa de herdar; daí a necessidade, para a sua configuração dos seguintes requisitos

essenciais:

1º)Capacidade jurídica plena do renunciante[...]; 2º) Forma prescrita em Lei pois é ato solene [...]; 3º) Inadmissibilidade de condição ou termo [...]; 4º)

61 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Sucessões, p. 67. 62 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 71. 63 BRASIL. Código civil, p. 467. 64 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 23.

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Não-realização de qualquer ato equivalente à aceitação de herança [...]; 5º) Impossibilidade de repúdio parcial da herança [...]; 6º) Objeto lícito, pois proibida está a renúncia contrária à lei, ou conflitante com direito de terceiros [...]; e 7º) Abertura da Sucessão [...]65.

Ainda Diniz, nos ensina que “a renúncia, uma vez formalizada, passa a produzir os

seguintes efeitos, por retroagir ao tempo da abertura da sucessão”:

1º) Renunciante é tratado como se nunca tivesse sido chamado a sucessão [...]; 2º) O quinhão hereditário do repudiante, na sucessão legítima transmite-se ipso iure aos outro herdeiros da mesma classe (direito de acrescentar) [...]; 3º) Descendentes do renunciante não herdam por representação na sucessão legítima; porém se ele for o único da classe ou se os demais desta também repudiarem a herança, seus filhos poderão ser chamados a sucessão, por direito próprio ou por cabeça [...]; 4º) Nas sucessão testamentária, a renúncia do herdeiro, torna caduca a disposição de última vontade que a beneficie, a não ser que o testador tenha indicado substituto (CC, art.1947) ou haja direito de acrescer entre os herdeiros (CC, art. 1943); 5º) O que repudia herança não está impedido de aceitar legado (CC, art. 1.808, §1º; e 6º) O renunciante pode administração e ter usufruto dos bens que, em razão de seu repúdio, forem transmitidos a seus filhos menores sob poder familiar66.

Com relação irrevogabilidade dos atos de aceitação ou renúncia, o Código Civil,

afirma em seu artigo 1.812, que:

Art. 1.812. São irrevogáveis os atos de aceitação ou de renúncia da herança67.

Neste sentido, aduz Leite que:

A renúncia, uma vez feita, torna-se irretratável, mas poderá a vir a ser anulada – como de resto ocorre como todos os atos jurídicos em que houve vício na manifestação de vontade (art. 171 II, do CC) – promovendo-se a respectiva ação anulatória, pela qual se provará o vício alegado68.

Por fim, entende-se que assim como a aceitação, a renúncia é irrevogável, não

havendo portanto liberdade de revogá-la69.

65 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 76-78. 66 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 79-80. 67 BRASIL. Código civil, p. 468. 68 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 87-88. 69 GOMES, Orlando. Sucessões, p.25.

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2.3.4 Herança e Meação

Para um bom entendimento desta pesquisa, é de grande importância esclarecer uma

confusão comum que ocorre entre herança e meação, uma vez que se tratam de institutos

diversos, sendo o primeiro relacionado ao direito sucessório e o segundo relacionado ao

direito de propriedade, condicionado ao direito de família70.

Diniz ensina que “[...] A herança é, portando, o patrimônio do falecido, ou seja, o

conjunto de bens materiais, direitos e obrigações (CC, arts. 91 e 943) que se transmitem aos

herdeiros legítimos ou testamentários[..]”71.

Dias, ao se reportar a extensão da herança diz que:

[...] é necessário identificar se o patrimônio é todo do falecido ou se parte dele pertence ao cônjuge sobrevivente. É o que se chama de meação: metade dos bens, cuja dimensão depende do regime de bens do casamento. Ainda que não integre ao acervo hereditário, necessariamente acaba fazendo parte do inventário, pois a separação dos bem que integram a meação do cônjuge sobrevivente ocorre quando da partilha (CPC 1.023 II)72.

Neste sentido, Venosa leciona:

Portanto, ao se examinar uma herança no falecimento de uma pessoa casada, há que se separar do patrimônio comum (portanto, um condomínio) o que pertence ai cônjuge sobrevivente, não porque seu esposo morreu, mas porque aquela porção ideal do patrimônio já lhe pertencia. O que se inserirá a porção ideal da meação segue as regras da partilha. Excluída a meação, o que não for patrimônio do viúvo ou da viúva compõe a herança, para ser dividida entre os descendentes ou ascendentes, ou cônjuge, conforme o caso73.

Para se identificar a meação, ou seja, a metade ideal de bens comuns dos cônjuges,

pertencente a cada um deles, é preciso primeiramente saber qual o regime de bens vigente,

pois é o regime de bens que permite verificar se há patrimônio em comum, que enseja em

70 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, p. 50. 71 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 38. 72 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, p. 50. 73 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 127.

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meação. Uma vez verificado o regime de bens, será possível identificar o patrimônio a ser

dividido ao meio, daí “meação” 74.

Portanto, conforme demonstrado, a distinção entre herança e meação, uma vez que tal

discernimento é de relevante importância para o bom entendimento da pesquisa, passaremos

agora à análise da vocação hereditária de acordo com o Código Civil brasileiro.

2.4 A VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

Neste subtítulo será apresentado quem são os chamados herdeiros legítimos e sua

vocação hereditária na forma prevista lei, objetivando o aclaramento da vocação hereditária

relacionada ao cônjuge sobrevivente.

Como vimos, a sucessão hereditária surge com o evento morte, neste viés

primeiramente verifica-se, se o falecido deixou declaração de última vontade indicando como

deverá ser partilhado seu patrimônio. Não havendo declaração de última vontade, ou seja,

testamento, ou em havendo este sendo ineficaz ou nulo ou, ainda, mesmo havendo testamento

há de se respeitar a quota reservatória75 destinada à legítima quando então a lei promoverá a

distribuição do patrimônio do de cujus, que se denomina ordem de vocação hereditária. Em

todas essas hipóteses ter-se-á sucessão legítima, que nada mais é do que a distribuição do

patrimônio de acordo com a vontade da lei76.

Neste sentido Dias, ao comentar sobres os legitimados a receber a herança, nos ensina

que:

A lei elege os legítimos para receber a herança: todos os parentes, bem como o cônjuge e o companheiro. Daí a expressão: herdeiros legítimos” (CC 1.829). A preferência é pelos parentes em linha reta: descendente e ascendente (CC 1.591). Tanto eles como o cônjuge são considerados herdeiros necessários (CC 1.845). Fazem jus ao que se chama de legítima, que compreende a metade da herança77.

74 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 201. 75 BRASIL. Código civil, p. 465. “Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.” 76 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 101. 77 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, p. 127.

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Necessário portanto, citar o previsto no artigo 1.798 de nosso Código Civil, como nos

ensina Monteiro:

De acordo com o que preceitua o art. 1.798, legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão. Cuida-se de princípio de notável importância, uma vez que esta se rege pela lei em vigor no momento do óbito do autor da herança, tornando-se definitivo o título de herdeiro, a qualidade de necessário, o valor do monte-mor, da porção disponível e da legítima78.

Seguindo essa linha de pensamento, Monteiro afirma que “para que exista o direito

sucessório, além do passamento do autor da herança, obviamente, é que o herdeiro exista e

sobreviva à aquele, ou esteja ao menos concebido.” Estando desta forma garantido os direitos

do nascituro previsto no artigo 2º do Código Civil79.

Oliveira e Amorim, ao se reportarem ao nascituro, ensinam que “de qualquer forma,

seja considerado como pessoa desde a concepção, ou como spes homini, pessoa em formação,

o certo é que o nascituro tem assegurados todos os direitos fundamentais da personalidade na

sua mais larga acepção”80.

O artigo 1.829 do CC determina a ordem pela qual os herdeiros são chamados a

suceder.

Pelo citado artigo, a sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais81.

78 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p 40. 79 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p 41. 80 OLIVEIRA, Euclides Benedito de; AMORIM, Sebastião Luiz. Inventário e Partilhas Direito das Sucessões. 20. ed. rev. e. atual. em face do novo Código Civil - São Paulo: LEUD, 2006. p. 43. 81 BRASIL. Código civil, p. 470.

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Leite, aponta a intenção do legislador quanto ao critério da ordem da vocação

hereditária:

O critério da vocação é a da proximidade do vínculo familiar. Por isso, em Direito de Família, as relações de parentesco são tão importantes. O grau de parentesco indica a proximidade (dos parentes próximos) ou remoticidade (parentes distantes) e estes elementos produzem importantes efeitos no direito sucessório. Isto é, os herdeiros mais próximos excluem os mais remotos (salvo hipótese de representação) e os herdeiros de grau igual, quando herdam em nome próprio, recebem uma cota igual da herança82.

Venosa, ressalta a exceção a essa regra geral onde o mais próximo exclui o mais

remoto, quando se trata do cônjuge sobrevivente:

A regra geral estabelecida no ordenamento jurídico é que os mais próximos excluem os mais remotos, ou seja, havendo descendentes do falecido, não serão chamados os ascendente, e assim por diante. Tal regra veio a sofrer algumas exceções, com leis posteriores ao Código de 1916, como veremos. O atual diploma cível introduz a posição de vocação hereditária concorrente do cônjuge em propriedade, justamente com os descendentes sob determinadas condições e juntamente com os ascendentes83.

Importante para este estudo faz-se o esclarecimento de Oliveira acerca da posição do

cônjuge sobrevivente na ordem de vocação hereditária em comento:

Situa-se, o cônjuge, em terceiro lugar na ordem da vocação hereditária. Recebe a totalidade da herança, na falta de descendentes ou ascendentes. Sua posição é sensivelmente reforçada por ter participação concorrente com os herdeiros de primeira classe, dependendo do regime de bens adotado no casamento, e também com os herdeiros de segunda classe, independente do regime de bens. Acrescenta-se, ainda, que o cônjuge passo a categoria de herdeiros necessários (Art. 1845 do Código Civil), o que significa direito assegurado à legítima84.

Mais tarde o autor assevera, sobre a situação do companheiro na ordem de vocação

hereditária, como segue:

É inevitável, não obstante, que o companheiro integre a ordem de vocação hereditária, nas condições previstas no citado art. 1.790, comportando análise conjunta com os direitos dos descendentes, ascendentes e colaterais,

82 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado: direito das sucessões, p. 133. 83 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 112. 84 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 92.

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com os quais o companheiro sobrevivente concorre na sucessão relativamente aos bens adquiridos a título oneroso durante o tempo de vida em comum com a pessoa de cuja herança se trata. A demonstrá-lo, a citação do companheiro, ao lado do cônjuge e de parentes sucessíveis, no art. 1.844 do Código Civil, que cuida da devolução da herança ao ente público85.

Diante de tais considerações, e após ter apresentado a parte inicial desta pesquisa,

passaremos então a ingressar no estudo específico sobre o casamento e os respectivos regimes

de bens, com o intuito de melhor compreende-los para então adentrar no foco principal deste

estudo qual seja o direito sucessório do cônjuge supérstite.

85 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão, p 141.

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3 DO CASAMENTO

No escopo de desenvolver uma seqüência coesa à presente pesquisa, apresenta-se

neste capítulo, depois de ter abordado, na parte anterior deste trabalho, o direito das

sucessões e suas generalidades, desde a apresentação da definição da palavra sucessão, sua

evolução histórica, a sucessão geral, e finalizando com a vocação hereditária, sempre

correlacionando a sucessão com o direito sucessório do cônjuge sobrevivente, neste capítulo

será apresentado desde uma breve definição sobre o casamento e sua evolução, bom como os

regimes de bens existentes, um vez que o regime adotado pelos cônjuges é que faz a distinção

do direito sucessório do cônjuge supértice.

3.1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DO CASAMENTO

O Casamento, com a evolução dos povos, passa por modificações decorrentes da

mudança de comportamento da sociedade em geral, podendo ser considerado um dos

institutos do direito privado mais discutido. Neste sentido, verifica-se um posicionamento

disperso, onde para uns, o casamento, trata-se do “fundamento da sociedade, base da

moralidade pública e privada ou a grande escola fundada pelo próprio Deus para a educação

do gênero humano” como que para outros, “casar é perder a metade de seus direitos e duplicar

seus deveres”86.

Diniz, faz referência ao casamento como sendo “ [...] a mais importante e poderosa de

todas as instituições de direito privado, por ser uma das bases da família, que é a pedra

angular da sociedade”87.

86 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, v.6. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 21. 87 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, v 5. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 39.

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3.1.1 Conceito de Casamento

O conceito de casamento, é definido de várias maneiras, devido ao fato de o instituto

permitir reflexões históricas, políticas e sociológicas, não havendo porquanto, “uniformidade

nas legislações e na doutrina”88.

Pereira, ao fazer referência ao conceito de casamento, nos ensina que “de casamento

há numerosas definições que não se limitam às vezes a conceituá-lo, porém refletem

concepções originais ou tendências filosóficas. Posto que todos os sistemas o disciplinem,

inexiste uniformidade na sua caracterização”89.

Barros, aduz que casamento “é o vínculo entre o homem e a mulher, firmado perante o

Estado, com o intuito de constituição de uma família. A satisfação sexual e a prole comum

são apenas conseqüências do casamento, e, por isso, não devem integrar o seu conceito” 90.

Dias, na tentativa de conceituar o casamento, apresenta outros fatos importantes

relacionados a criação do conceito de casamento como vemos:

Com o casamento ocorre a alteração do estado civil dos consortes, que, de solteiros, passam a condição de casados. O casamento é uma relação complexa, assumindo o par direitos e deveres recíprocos que acarretam seqüelas não só no âmbito pessoal. A identificação do estado civil serve para dar publicidade à condição pessoal e também à situação patrimonial, destinando-se a proporcionar segurança a terceiros91.

Por fim, Diniz, ao conceituar casamento, assevera que casamento “é o vinculo entre o

homem e a mulher que visa o auxilio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma

integração fisiopsíquica e a constituição de uma família 92.

3.1.2 Natureza Jurídica

A natureza jurídica do casamento é uma questão muito discutida e com muitas

opiniões doutrinárias, uma vez que o casamento por uns é tratado como um contrato e por

88 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, v 6. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 24. 89 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, v4. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 51. 90 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, v4. 2. ed. São Paulo: Método, 2006, p. 25. 91 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, p. 140 . 92 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 39.

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outros tratado como uma instituição. “Em uma síntese das doutrinas, pode-se afirmar que o

casamento-ato é um negócio jurídico; o casamento-estado é uma instituição” 93.

Segundo nos leciona Diniz, “a concepção contratualista originária do direito canônico

que coloca em primeiro plano o consentimento dos nubentes, deixando a intervenção do

sacerdote, na formação do vínculo, em posição secundária[..]”94.

Posteriormente o supradito autor anota que, “o matrimônio é um contrato civil, regido

pelas normas comuns a todos os contratos, ultimando-se e aperfeiçoando-se apenas pelo

simples consentimento dos nubentes, que há de ser recíproco e manifesto por sinais

exteriores95.

Há no entanto, aqueles que defendem uma concepção institucionalista, tendo o

casamento como uma grande instituição social, neste sentido verifica-se os ensinamentos de

Pereira, acerca do tema:

Para uns, o casamento é “uma instituição social”, no sentido de que reflete uma situação jurídica, cujas regras e quadros se acham preestabelecidas pelo legislador, com vistas à organização social da união dos sexos. Dentro da sociedade, a família é um organismo de ordem natural com a finalidade de assegurar a perpetuidade da espécie humana, e bem assim o modo de existência conveniente às suas aspirações e a seus caracteres específicos. Em face disto, o casamento é o conjunto de normas imperativas cujo objetivo consiste em dar à família uma organização social moral correspondente às aspirações atuais e à natureza permanente do homem96.

Com esteio nessa corrente, verifica-se que o casamento constitui “uma grande

instituição social, que, de fato nasce da vontade dos contratantes”, contudo, está subordinado

as formas e os efeitos prescritos em lei, e, por mais que venha nascer da espontânea e

individual vontade de cada parte, sempre estará sujeita a determinação imperativa da lei97.

Em razão dos objetivos traçados para este trabalho, evidenciar-se-á seguidamente os

possíveis regimes de bens entre os cônjuges, pois é do regime de bens que nasce a diferença

no direito sucessório entre os cônjuges.

93 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 25-26. 94 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 42. 95 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 43. 96 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 57. 97 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p 25.

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3.2 DO REGIME DE BENS ENTRE OS CÔNJUGES

Para se adentrar ao direito sucessório do cônjuge sobrevivente, necessário se faz uma

apreciação inicial dos regimes de bens do casamento, uma vez que é no regime de bens que

residem as variáveis que definem o direito sucessório no caso concreto.

O Código Civil, prevê quatro tipos diferentes de regime de bens, o da comunhão

parcial (arts. 1.658 a 1.666), o da comunhão universal (arts. 1.667 a 1.671), o da participação

final dos aquestos (arts. 1.672 a 1.686) e o da separação (arts. 1.687 a 1.688). Os nubentes

tem a faculdade de escolher qualquer desses regimes, para disciplinar suas relações

econômicas durante a vigência vida da conjugal, salvo algumas situações previstas no artigo

1.641 do Código Civil, que determina ser obrigatório o regime da separação de bens98.

Diniz, ao conceituar o “regime matrimonial”, traz o seguinte posicionamento:

[...] o regime matrimonial de bens é o conjunto de normas aplicáveis às relações e interesses econômicos resultantes do casamento. É constituído, portanto, por normas que regem as relações patrimoniais entre marido e mulher, durante o matrimônio. Consiste nas disposições normativas aplicáveis à sociedade conjugal no que concerne aos seus intereces pecuniários. Logo, trata-se do estatuto patrimonial dos consortes99.

Para Barros, o regime de bens “é o estatuto que rege os interesses patrimoniais dos

cônjuges durante o casamento100.”

O Código Civil em seu artigo 1.639, define que é livre aos cônjuges a escolha do

regime de bens que achar conveniente, prevê inclusive a alteração do regime pós casamento,

como vimos a seguir:

Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

§ 1º O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento.

98 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família. 38ª Ed., rev., e atual. Por Regina Beatriz Tavares de Silva de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002). São Paulo: Saraiva, 2007, p 183 – 184. 99 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 145. 100 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, p. 61.

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§ 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros101.

No entanto, não fazendo a devida escolha do regime de bens, ou sendo ela nula ou

ineficaz, o referido diploma legal em seu artigo 1.640 determina que vigorará o regime da

comunhão parcial de bens, com a exceção da obrigatoriedade prevista no artigo 1.641,

concernente ao regime da separação de bens:

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II - da pessoa maior de sessenta anos;

III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial102.

A escolha de regime diverso da comunhão parcial de bens ou da separação obrigatória

de bens previsto no artigo supra citado, importa na realização do contrato de pacto ante

nupcial, que deve ser revestido de forma pública, através de escritura pública, como

prescreve o artigo 1.653 do Código Civil, in verbis:

Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento103.

Neste sentido, ao analisar a vigência do regime de bens, verifica-se de acordo com o

artigo acima citado que “ nenhum regime matrimonial poderá iniciar-se em data anterior ou

posterior à do ato nupcial, pois, por imposição legal, começa a vigorar a partir do dia das

núpcias104.

Ante o exposto, verifica-se que o regime de bens entre os cônjuges, está regulado

pelos artigos 1.639 e seguintes de Código Civil, sendo livre aos cônjuges a sua escolha,

podendo inclusive fazer um misto dentre os pré existentes, os quais passaremos a estudar

individualmente a seguir.

101 BRASIL. Código civil, p. 447. 102 BRASIL. Código civil, p. 448. 103 BRASIL. Código civil, p. 449. 104 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 152.

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3.2.1 Regime da Comunhão Parcial

O regime da comunhão parcial de bens, como já apontado anteriormente, verificou-se

ser aquele, que no silêncio dos nubentes, ou estando o pacto ante nupcial, em descordo com a

legislação civil, passa a vigorar por força do artigo 1.640105 do Código Civil.

Pereira, ao mencionar o artigo supra citado, o define como “o regime legal”,

afirmando que: “ O Código Civil, tal como fizera a Lei do Divórcio (Lei nº 6.515, de 1977),

considerou a comunhão parcial como regime legal (art. 1.640). Caracteriza-se este regime

pela comunicação do que seja adquirido na constância do matrimônio106.”

Nesse norte, Gonçalves assevera que:

O regime da comunhão parcial é o que prevalece se os consortes não fizerem pacto antenupcial, ou, se o fizerem, for nulo ou ineficaz (CC, art. 1.640, caput). Por essa razão, é chamado também de regime legal ou supletivo, como já mencionado. Caracteriza-se por estabelecer a separação quanto ao passado (bens que cada cônjuge possuía antes do casamento) e comunhão quanto ao futuro (bens adquiridos nas constância do casamento), gerando três massas de bens: os do marido, os da mulher e os comuns107.

Tais ensinamentos, vem a confirmar o previsto no artigo 1.658 do Código Civil, com

relação a comunicação dos bens:

Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes108.

Nessa trilha, Barros nos ensina que: “ No regime da comunhão parcial, comunicam-se

os bens adquiridos durante o casamento, independentemente do esforço comum dos cônjuges.

Os bens anteriores ao matrimônio são incomunicáveis109.”

105 BRASIL. Código civil, p. 448. 106 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 213. 107 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p, 420 – 421. 108 BRASIL. Código civil, p. 450. 109 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, p. 67.

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No tocante aos bens incomunicáveis ou que são excluídos da comunhão parcial, nosso

Código Civil, estabelece o seguinte, in verbis:

Art. 1.659110. Excluem-se da comunhão:

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III - as obrigações anteriores ao casamento;

IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;

VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII - as pensões111, meios-soldos112, montepios113 e outras rendas semelhantes114.

Desta forma, verifica-se quais bens são excluídos da comunhão, sendo que tais bens

são incomunicáveis entre os cônjuges, de modo que torna-se imutável a propriedade dos bens

pré-existentes ao casamento. Contudo, os bens adquiridos na constância do casamento, a título

oneroso, farão parte, em regra, da comunhão dos bens do casal. Verifica-se portanto que os

bens existentes anteriormente ao casamento são considerados bens particulares de cada

cônjuge115.

110 BRASIL. Código civil, p. 450. 111 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p 199. “Pensão, no sentido jurídico, é a quantia em dinheiro para mensalmente a um beneficiário em virtude de lei, de sentença, de contrato ou de disposição de ultima vontade.” 112 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p 199. “Meio-soldo, como o próprio nome indica, é a metade do soldo que o Estado paga a seus servidores, sobretudo das classes armadas.” 113 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p 199. “Montepio é a soma que, por óbito de seus funcionários, em atividade ou não, paga o Estado aos respectivos beneficiários” 114 BRASIL. Código civil, p. 450. 115 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 329.

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Por outro lado, os bens que ingressam na comunhão estão identificados no artigo

1.660 do CC, como segue:

Art. 1.660. Entram na comunhão:

I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;

II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;

III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;

IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;

V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão116.

Neste artigo verifica-se, entre outras algumas particularidades, como o previsto no

inciso II, que insere como bem comum, aqueles que provierem de fato eventual, como loteria,

sorteio, jogo, aposta, descobrimento de tesouro, não havendo necessidade sequer de verificar

qual dos cônjuges suportou a despesa117.

Já Pereira, evidencia que os “dois últimos incisos refletem a essência do regime da

comunhão parcial de bens, ou seja, entram no patrimônio do casal os acréscimos advindos da

vida em comum”118.

Por conseguinte volta o Código Civil a mais uma possibilidade de incomunicabilidade

dos bens, que é a prevista no artigo 1.661 do CC, preceitua que:

Art. 1661. São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento119.

Como exemplo de fato congênere ao artigo supra mencionado, temos a aquisição da

propriedade de um imóvel através de escritura pública e o respectivo registro na constância do

116 BRASIL. Código civil, p. 450. 117 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 420 – 421. 118 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 217. 119 BRASIL. Código civil, p. 450.

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casamento, porém o imóvel havia sido adquirido mediante compromisso de compra e venda

antes do casamento120.

Outrossim, presumem-se adquiridos na constância do casamento os bens móveis,

quando não se provar que foram adquiridos em data anterior, como assevera o artigo 1.662 do

Código Civil.

Já o artigo 1.663 estabelece que a administração do patrimônio comum compete a

qualquer dos cônjuges.

[...] § 1º As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido.

§ 2º A anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns.

§ 3º Em caso de malversação dos bens, o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos cônjuges121.

Preceitua o artigo 1.664 do CC, que “os bens da comunhão respondem pelas

obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às

despesas de administração e às decorrentes de imposição legal”122.

Ainda com relação a administração e disposição dos bens, o artigo 1.665 do citado

código, aduz que “a administração e a disposição dos bens constitutivos do patrimônio

particular competem ao cônjuge proprietário, salvo convenção diversa em pacto

antenupcial”123.

Finaliza o artigo 1.666 do comento código que, “as dívidas, contraídas por qualquer

dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam

os bens comuns”124.

Por fim a verifica-se que comunhão de bens entre os cônjuges, dissolve-se pela morte,

separação, divórcio ou anulação de casamento. Dissolvida a comunhão por qualquer que seja

120 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 220 – 221. 121 BRASIL. Código civil, p. 450 – 451. 122 BRASIL. Código civil, p. 451. 123 BRASIL. Código civil, p. 451. 124 BRASIL. Código civil, p. 451.

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o motivo, cada consorte individualiza os bens particulares de cada qual, e passarão a dividir os

bens pertencentes a comunhão que tenham sido adquiridos na forma prevista nos artigos

1.658 a 1.666 do Código Civil125 .

3.2.2 Regime da Comunhão Universal de Bens.

O regime da comunhão universal, é aquele que importa na comunicação de todos os

bens, direitos e obrigações, adquiridos anteriormente ou posteriormente ao casamento pelos

cônjuges, fazendo parte da comunhão, inclusive os bens recebidos por herança, desde que os

mesmos não estejam excluídos da comunhão nos casos previstos no art. 1.668 deste do

Código Civil.

Gonçalves, ao fazer menção a prioridade da comunicação dos bens na comunhão

universal, aduz que:

No aludido regime predominam os bens comuns, de propriedade e posse de ambos os cônjuges, não importando a natureza, se móveis e imóveis, direitos e ações. O acervo permanece indivisível até a dissolução da sociedade conjugal. Embora tudo quanto um deles adquire se transmita imediatamente, por metade, ao outro cônjuge, podem existir, no entanto, bens próprios do marido e bens próprios da mulher. Exclui-se da comunhão o que a lei ou a convenção antenupcial especialmente mencionam. Inexistindo tal exclusão, não é permitido a um ou outro cônjuge apossar-se de qualquer um dos bens comuns, privando o consorte de igual uso. A ambos, todavia, compete defender a coisa possuída contra vias de fato ou pretensões de terceiros126.

Nesta linha, Venosa ao tratar do regime da comunhão universal, nos ensina que:

No regime da comunhão universal, há um patrimônio comum, constituído por bens presentes e futuros. Os esposos tem a posse e propriedade em comum, indivisa de todos os bens, móveis e imóveis, cabendo a cada um deles a metade ideal. Como conseqüência, qualquer dos consortes pode defender a posse e a propriedade dos bens. Cuida-se de sociedade ou condomínio conjugal, com caracteres próprios. Quanto à administração dos bens, o art. 1.670 determina que se apliquem os princípios à comunhão parcial, que já examinamos. Assim, no que couber, são aplicáveis os dispostos do art. 1663127.

125 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 328 126 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 431. 127 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 334.

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Entretanto Diniz, lembra que, “nenhum dos consortes tem a metade de cada bem,

enquanto durar a sociedade conjugal, e muito menos tem a propriedade exclusiva de bens

discriminados, avaliados na metade do acervo do casal128.

Neste sentido, verifica-se que ao integrar o bem a comunhão, passa a ser do

patrimônio comum automaticamente pelo matrimônio, sendo que não voltará da mesma forma

ao patrimônio individual, com a dissolução da sociedade conjugal129.

Por conseguinte o artigo 1.668 do CC, estabelece que são excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;

III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;

IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade130.

Ao analisar cada inciso do supramencionado artigo, inicialmente verifica-se que no

“inciso I” que o legislador ao determinar que não entram no acervo comum os bens

declarados como “incomunicáveis”, quando advindos por doação ou herança, deixou

evidenciado que tal cláusula deve estar declarada expressamente, entretanto os frutos de tais

bens incomunicáveis poderão ingressar na comunhão se a respectiva cláusula não prever de

forma expressa que os frutos também serão incomunicáveis. Da mesma forma, a

incomunicabilidade, salvo disposição expressa em contrário, transfere-se automaticamente

aos bens que forem sub-rogados no lugar daqueles que inicialmente foram gravados 131.

Ainda com relação ao inciso “I”, vale ressaltar que se o bem estiver gravado com

cláusula de inalienabilidade, implica em incomunicabilidade, entendimento este pacificado

diante da Súmula nº 49 do STF, definindo que “a cláusula de inalienabilidade inclui a

128 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 157. 129 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 157 130 BRASIL. Código civil, p. 451. 131 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 224.

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incomunicabilidade dos bens” 132, mais tarde o atual Código Civil, deixou claro em seu artigo

1.911133 que “a cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica

impenhorabilidade e incomunicabilidade”134.

Gonçalves, enfoca que “embora omissa a lei, não se comunicam também os bens

doados com a cláusula de reversão (CC, art. 547135) , ou seja, com a condição de, morto o

donatário antes do doador, o bem doado volta ao patrimônio deste, não se comunicando ao

cônjuge do falecido136.

Já com relação ao inciso “II” do artigo em comento, este define que estão excluídos da

comunhão os bens que estejam gravados de fideicomisso137 e o direito do herdeiro

fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva, porém consolidando-se a condição

resolutiva em favor do fideicomissário, ou em favor do fideicomisso, por exemplo, se o

fideicomissário renunciar a propriedade dos bens fideicometidos, neste caso, a partir do

momento em que se consolide a propriedade plena em favor de qualquer que seja, o bem

passa a comunicar-se, incluindo-se na comunhão de bens 138.

No tocante a exclusão das dívidas contraídas anteriormente ao casamento, o inciso

“III” deste artigo, fez exceção quando as dívidas surgiram com a preparação do matrimônio

(aprestos) ou quaisquer outras que se revertam ao patrimônio comum, como exemplo “se o

noivo contraiu empréstimo para comprar o anel de noivado, objetivando causar vivíssima

impressão à noiva, o patrimônio comum responderá pela divida correspondente, já que se

qualifica como despesa preparatória do matrimônio139.

132 BRASIL. Código civil, p. 1549. 133 BRASIL. Código civil, p. 478. 134 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 334. 135 BRASIL. Código civil, p. 314. “Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário”. 136 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 432. 137 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2ª Ed. rev., atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 627. “FIDEICOMISSO. Direito civil, Modalidade de substituição hereditária que consiste na instituição de herdeiro ou legatário, designado fiduciário com a obrigação de, por sua morte, a certo tempo, ou sob condição preestabelecida, transmitir a uma outra pessoa, chamada fideicomissário, a herança ou legado”. 138 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, p. 70. 139 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. v.5. São Paulo: Saraiva. 2006, p.77.

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No mesmo norte, assevera Monteiro:

No art. 1.668 III, do Código Civil de 2002, correspondente ao art.263, n. VII, do Código Civil de 1916, esta disposta a incomunicabilidade das dívidas anteriores ao casamento. Por essas dívidas responde exclusivamente o próprio devedor, porque são elas incomunicáveis.

Mas há dívidas anteriores ao casamento que se comunicam: as contrídas com os aprestos do casamento, como a aquisição de móveis, festas e enxoval, e as que tiverem revertido em proveito comum de ambos os cônjuges, como o dinheiro emprestado para a viagem de núpcias ou para a compra de imóvel destinado à residência do futuro casal140.

Neste sentido, denota-se que os bens da comunhão com um todo, só responderão pelos

débitos ocorridos anteriormente ao casamento, caso tais dívidas se originaram dos

preparativos para o casamento ou reverteram-se em favor de ambos os cônjuges.

Na seqüência, verifica-se outra causa de exclusão da comunhão é a prevista no inciso

“IV” do então artigo 1.668 do Código Civil, que trata das “doações antenupciais feitas por um

dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade”141, sendo que esta modalidade

está amparada por todas as hipóteses prevista e estudadas no inciso “I” do mesmo artigo,

ocorre que no presente caso, persiste a incomunicabilidade, ainda que o doador seja o outro

cônjuge142.

Sobretudo, Gonçalves faz a ressalva que “na constância do casamento não cabem

doações de um cônjuge a outro, uma vez que o acervo patrimonial é comum a ambos. Só

podem ser feitas quando envolverem os bens excluídos da comunhão (CC arts. 544 e 1.668).

São vedadas também as doações que envolvam fraude ao regime de separação obrigatória143.

Por fim, passamos a analisar o último inciso do artigo 1.668, que faz referencia aos

bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.

140 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 202 – 203. 141 BRASIL. Código civil, p. 451. 142 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 335 – 336. 143 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 434.

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Referidos incisos tem o seguinte teor:

“[...] V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; VII - as pensões144, meios-soldos145, montepios146 e outras rendas semelhantes.[...]”147.

Portanto, por mais que trata-se do regime de comunhão universal, tais bens são

excluídos por serem considerados de cunho personalíssimo 148.

Entretanto, em consonância com a premissa do regime da comunhão universal, onde a

comunicabilidade é a regra, o artigo 1.669 do Código Civil, esclarece Gonçalves que, “a

incomunicabilidade dos bens enumerados no artigo antecedente não se estende aos frutos,

quando se percebam ou vençam durante o casamento”149, ou seja, os frutos dos bens

incomunicáveis, quando recebidos ou vençam durante o casamento, fazem parte da

comunhão, portanto, comunicam-se.

Já a administração dos bens, de acordo com o artigo 1.670 do código Civil, fica

submetidas “as mesmas condições relativas à administração dos bens adotadas no regime da

comunhão parcial. São aqueles previstos nos arts. 1663 a 1.666”150.

Por fim, o artigo 1.671 do Código Civil, estabelece que “extinta a comunhão, e

efetuada a divisão do ativo e do passivo, cessará a responsabilidade de cada um dos cônjuges

para com os credores do outro por dívidas que este houver contraído”151.

Portanto, verificou-se que no regime da comunhão universal de bens a

comunicabilidade é a regra, tendo suas exceções expressas na lei. No próximo tópico

passaremos a estudar o regime de participação final de aquestos previsto no diploma civil.

144 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p 199. “Pensão, no sentido jurídico, é a quantia em dinheiro para mensalmente a um beneficiário em virtude de lei, de sentença, de contrato ou de disposição de ultima vontade.” 145 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p 199. “Meio-soldo, como o próprio nome indica, é a metade do soldo que o Estado paga a seus servidores, sobretudo das classes armadas.” 146 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p 199. “Montepio é a soma que, por óbito de seus funcionários, em atividade ou não, paga o Estado aos respectivos beneficiários” 147 BRASIL. Código civil, p. 450. 148 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 159. 149 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 436. 150 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 227. 151 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 162.

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3.2.3 Regime de Participação Final nos Aquestos.

O regime de participação final nos aquestos, foi inserido no Código Civil de 2002

pelos artigos 1.672 a 1.686, como uma nova opção para os nubentes, contudo para sua

validade é necessário que a opção seja formalizada por pacto antenupcial, por meio de

escritura pública, conforme preceitua o artigo 1.653 do mesmo diploma legal.

Neste regime, cada cônjuge mantém seu patrimônio próprio enquanto perdura a

sociedade conjugal, tal formato é semelhante ao da separação de bens, porém com o fim da

sociedade conjugal, seja por separação, divórcio ou morte, apura-se os bens adquiridos a título

oneroso na constância do casamento para fazer o cálculo da meação que cada cônjuge tem

direito, com a meação ao final temos uma semelhança agora com o regime da comunhão

parcial de bens152.

Na mesma linha de pensamento, Gonçalves, aduz que:

É na realidade, um regime de separação de bens, enquanto durar a sociedade conjugal, tendo cada cônjuge exclusiva administração de seu patrimônio pessoal, integrado pelos que possuía ao casar e pelos que adquirir a qualquer título na constância do casamento, podendo livremente dispor dos móveis e dependendo da autorização do outro para os imóveis (CC, art. 1.673, parágrafo único). Somente após a dissolução da sociedade conjugal serão apurados os bens de cada cônjuge, cabendo a da um deles ou a seus herdeiros, em caso de morte, como dispões o art. 1.685 a metade dos adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento153.

Contudo, por mais que a administração dos bens seja exclusiva de cada cônjuge,

importante salientar que o parágrafo único do artigo 1.673 deixou claro que, é livre a

alienação dos bens móveis, verifica-se portanto, a necessidade da outorga conjugal quando da

alienação de bens imóveis. No entanto estando expressamente convencionado no respectivo

pacto antenupcial, a autorização para a livre disposição de bens imóveis, desde que

particulares, poderá cada cônjuge deles livremente alienar154.

152 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. v.5. São Paulo: Saraiva. 2006, p.81. 153 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 438. 154 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 230.

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Outrossim, ocorrendo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos

aqüestos, conforme dispõe o artigo 1.674 do Código Civil:

Art. 1.674. Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aqüestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:

I - os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram;

II - os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade;

III - as dívidas relativas a esses bens.

Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos durante o casamento os bens móveis.155

Como vimos, o parágrafo único supracitado, estabelece a presunção de que os bens

móveis foram adquiridos na constância do matrimônio e portanto se submetem a meação. Já

para a proteção de terceiros, de acordo com o artigo 1.680, presume-se que os bens móveis

são de propriedade do cônjuge devedor, salvo se o bem for de uso pessoal do outro, ou

adquirido antes do casamento pelo cônjuge não devedor156.

No entanto, por mais que esteja pré autorizado a livre disposição dos bens móveis na

forma da lei e dos imóveis através do pacto antenupcial de acordo com o artigo 1.656 do

Código Civil157, necessário ainda se faz a autorização em caso de doação, sob pena de tal

doação ser reivindicada pelo cônjuge prejudicado ou seus herdeiros158.

Neste sentido dispõe o artigo 1.675 do nosso código civil:

Art. 1.675. Ao determinar-se o montante dos aqüestos, computar-se-á o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; nesse caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução159.

155 BRASIL. Código civil, p. 452. 156 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 163. 157 BRASIL. Código civil, p. 450. “Art. 1.656. No pacto antenupcial, que adotar o regime de participação final nos aqüestos, poder-se-á convencionar a livre disposição dos bens imóveis, desde que particulares.” 158 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 339. 159 BRASIL. Código civil, p. 452.

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Já o artigo 1.676, prevê a possibilidade de se incorporar ao monte “o valor dos bens

alienados em detrimento da meação, se não houver preferência do cônjuge lesado, ou de seus

herdeiros, de os reivindicar”160.

Pereira esclarece que “no caso deste artigo, compete ao cônjuge lesado optar entre a

reivindicação dos bens em espécie, ou a imputação do valor, prerrogativa que também se

estende aos seus herdeiros”161.

Da mesma forma que o patrimônio é separado na constância do casamento, as

responsabilidades pelas dívidas, também são separadas, mesmo que posteriores ao casamento,

desde que contraídas por somente um dos cônjuges, cabendo exclusivamente ao causador da

dívida a respectiva responsabilidade, salvo prova de terem revertido em proveito do outro,

conforme preceitua o artigo 1.677162. Da mesma forma prevê o artigo 1678163, que se um dos

cônjuges pagou dívida do outro, terá o direito de ter o valor, atualizado, contabilizado no

momento da dissolução 164.

Contudo, em relação a aquisição do patrimônio por esforço comum ou “pelo trabalho

conjunto, terá cada um dos cônjuges uma quota igual no condomínio ou no crédito por aquele

modo estabelecido” 165, conforme prevê o artigo 1.679 do Código Civil.

Em princípio o artigo 1.680 do Código Civil, estabelece que “os bens imóveis são de

propriedade do cônjuge cujo nome constar no registro”, no entanto, o parágrafo único traz a

ressalva no sentido que, “impugnada a titularidade, caberá ao cônjuge proprietário provar a

aquisição regular dos bens”166.

160 BRASIL. Código civil, p. 452. 161 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 231. 162 BRASIL. Código civil, p. 452. “Art. 1.677. Pelas dívidas posteriores ao casamento, contraídas por um dos cônjuges, somente este responderá, salvo prova de terem revertido, parcial ou totalmente, em benefício do outro.” 163 BRASIL. Código civil, p. 452. “Art. 1.678. Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro com bens do seu patrimônio, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro cônjuge.” 164 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 231. 165 BRASIL. Código civil, p. 452. 166 BRASIL. Código civil, p. 452.

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Seja qual for a forma de aquisição ou o nome de que estiver o registro da propriedade,

em havendo meação, a mesma “não é renunciável, cessível ou penhorável na vigência do

regime matrimonial”167 é o que dispõe o artigo 1.682 do nosso Código Civil.

Ainda com relação a meação, o artigo 1685 determina que com a dissolução da

sociedade conjugal por morte, “verificar-se-á a meação do cônjuge sobrevivente de

conformidade com os artigos antecedentes, deferindo-se a herança aos herdeiros na forma

estabelecida neste Código”168.

Por fim, definido o valor da meação, atribui-se a cada cônjuge ou a seus herdeiros, a

parte que lhe coube, sendo possível será feito a divisão em bens específicos. No entanto, não

sendo possível a divisão em bens específicos, um dos cônjuges poderá efetuar o pagamento

em dinheiro ao outro em comum acordo, caso contrário, serão vendidos mediante autorização

judicial, quantos bens forem necessários para a liquidação da partilha (CC, art. 1.684 e

parágrafo único). Contudo, as dívidas de cada cônjuge não compromete a meação do outro,

quando superiores a sua meação (art. 1.686)169.

Portanto, verificou-se que no regime de participação final de aquestos, paira um

regime misto onde enquanto durar a sociedade conjugal, quanto aos bens prevalece os

mandamentos do regime de separação de bens, porém quando ocorre dissolução da sociedade

conjugal prevalece os ditames do regime de comunhão parcial de bens, tendo suas exceções

expressas na lei. No próximo tópico passaremos a estudar o último regime previsto no

diploma civil.

3.2.4 Regime da Separação de Bens

O regime da separação de bens enseja em uma total separação do patrimônio dos

cônjuges, uma vez que cada cônjuge permanece na administração exclusiva de seus bens,

podendo inclusive dispor dos mesmos sem qualquer interferência do outro, conforme dispõe o

artigo 1.687 do atual Código Civil:

167 BRASIL. Código civil, p. 452. 168 BRASIL. Código civil, p. 452. 169 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, p.84.

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Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração

exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus

real170.

Gonçalves, assevera que “o Código Civil de 1916 dispensava, no art. 235, a vênia

conjugal somente para a alienação de bens móveis. O novo diploma, ao elencar os atos que

nenhum dos cônjuges pode praticar sem autorização do outro, incluiu o de “alienar ou gravar

de ônus real os bens imóveis” fazendo, porém, a ressalva: “exceto no regime da separação

absoluta” (art. 1647 e I)”171.

Neste sentido, Diniz, aduz que, “não há proibição de gravar de ônus real ou alienar

bens, inclusive, imóveis, sem o assentimento do outro cônjuge. Qualquer dos consortes

poderá, sem autorização do outro, pleitear, como autor ou réu acerca de bens ou direitos

imobiliários, prestar fiança ou aval e fazer doação, não sendo remuneratória (CC, Art.

1.647)”172.

Ao escolher por livre e espontânea vontade o acenado regime, o casamento não

interfere no regime patrimonial dos cônjuges, pois a incomunicabilidade abrange todos os

bens, presentes e futuros, inclusive seus frutos e rendimentos, ficando cada cônjuge com toda

a autonomia sobre a administração de seu patrimônio, ficando cada consorte com a posse e

propriedade dos bens que já possuíam antes do casamento, bem como os que adquirir na

constância do casamento, sempre atendendo as condições do pacto antenupcial173.

Não obstante tais posicionamentos, vale ressaltar que o atual Código Civil, em suas

disposições finais e transitórias, especialmente no artigo 2.039 prescreve que “o regime de

bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1º de

janeiro de 1916, é o por ele estabelecido”174.

Já com relação as despesas, dispões o artigo 1.688 que “ambos os cônjuges são

obrigados a contribuir para as despesas do casal na proporção dos rendimentos de seu trabalho

e de seus bens, salvo estipulação em contrário no pacto antenupcial”175. Desta forma verifica-

170 BRASIL. Código civil, p. 453. 171 GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 442. 172 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família, p. 163. 173 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 237. 174 BRASIL. Código civil, p. 489. 175 BRASIL. Código civil, p. 453.

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se que a contribuição de cada cônjuge deve ser proporcional ao valor de seus bens e de seu

trabalho, porém o pacto antenupcial pode estipular que a mulher tenha que contribuir com

valor superior ao marido176.

Importante se faz, apresentar as formas de separação de bens elencada pela doutrina,

uma vez que o próprio código civil é taxativo ao impor o regime de separação de bens diante

das hipóteses elencadas no artigo 1.641 e ao mesmo tempo proporciona aos nubentes, “antes

de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver”177, ou seja, da

liberdade para os nubentes convencionar o regime de separação de bens. Tal diferença se faz

de suma importância para averiguação do direito sucessório, conforme se verá no capítulo

seguinte.

Neste esteio, Monteiro afirma que o regime de separação é legal ou convencional:

[...] É legal, nas várias hipóteses do art. 1.641 do novo Código Civil. Como dispõe esse artigo, é obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I) das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II) da pessoa maior de sessenta anos; III) de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial178.

[...] Mas a separação pode ser convencional, quando adotada pelos cônjuges em pacto antenupcial (Cód. Civil de 2002, art. 1.639, e Cód. Civil de 1916, art. 256)179.

Posteriormente, o supradito autor apresenta ainda outra divisão: pura e limitada. A

pura é aquela que sobrevém quando os nubentes não colocam termo no pacto antenupcial, é

absoluta e irrestrita, pois abrange todos os bens, presentes e futuros, inclusive seus frutos, já a

limitada quando os nubentes colocam termos específicos no pacto antenupcial, como por

exemplo que comunicam-se exclusivamente os frutos e rendimentos dos bens particulares180.

Ainda com relação ao então regime da separação legal de bens, por se tratar de uma

situação que já existia no Código Civil de 1916, o Supremo Tribunal Federal entendendo que

tal situação restringe a autonomia da vontade, não admitindo a comunhão dos bens adquiridos

176 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, p.64. 177 BRASIL. Código civil, p. 453. “Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.” 178 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 216. 179 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 221. 180 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 221.

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durante a vida em comum, uma vez que sendo o regime da separação de bens, obrigatório,

não dá aos nubentes, a possibilidade de pactuarem quanto aos aquestos, vindo a editar a

Súmula 377181, interpretando que os aquestos se comunicam por terem sido adquiridos na

constância do casamento182.

Na mesma linha de pensamento, Pereira, nos ensina que, “a aplicabilidade, por

eqüidade, da Súmula 377 do STF ao estabelecer que “no regime da separação legal de bens

comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. Note-se que a referida Súmula se

impõe no regime legal de separação para reconhecer a colaboração comum entre os

cônjuges”183.

Por derradeiro, pode-se dizer que após analisar os regimes de bens em vigor,

existentes em nosso ordenamento jurídico e suas peculiaridades, verifica-se que é de suma

importância o intenso conhecimento dos mesmos para um correta interpretação para a

aplicação dos mesmos no direito sucessório e por conseguinte adentrar no direito sucessório

do cônjuge sobrevivente bem como a comparação entre eles.

3.3 A MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS

A mudança de regime de bens, é uma inovação do Código Civil de 2002, uma vez no

Código Civil de 1916 a regra era a imutabilidade do regime de bens.

O legislador ao definir que é livre aos cônjuges a escolha do regime de bens que

acharem conveniente, previu inclusive a alteração do regime pós casamento, neste sentido o

artigo 1.639 do Código Civil em seu parágrafo segundo, assim estabelece:

“[...] mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”184.

181 BRASIL. Código civil, p. 1554. “Súmula 377 - No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.” 182 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, p. 232. 183 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito de família, p. 231. 184 BRASIL. Código civil, p. 447.

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Como visto o legislador não deixou “livre a possibilidade de os cônjuges alterarem o

regime de bens, não se erigindo essa possibilidade em um direito meramente potestativo. A

modificação do regime somente decorrerá de autorização mediante decisão judicial”185.

Neste sentido Monteiro, assevera que “se os nubentes, podem, via de regra, regular o

regime de bens do modo a que lhes aprouver, à época da celebração do casamento, é

adequado facultar-lhes, por pedido conjunto e motivado, a modificação de seus interesses

patrimoniais, que são de ordem privada”186.

Deste modo, importante será verificar os efeitos quanto aos direitos sucessórios com a

modificação do regime de casamento, tarefa esta que fica reservada para o próximo capítulo.

185 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito de família, p. 319. 186 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito de família, p. 188.

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4 SUCESSÃO DO CONJUGE

Este capítulo tem como objetivo apresentar o regramento e as posições doutrinárias a

cerca dos direitos do cônjuge sobrevivente, especialmente com relação a sua posição na

ordem da vocação hereditária, a concorrência com descendente e ascendentes, bem como as

diferenças existentes entre os regimes de bens relacionados com os direitos sucessórios.

4.1 VOCAÇÃO HEREDITÁRIA DO CÔNJUGE

O direito sucessório do cônjuge sobrevivente sofreu grandes mudanças em nosso

direito, inicialmente o cônjuge herdava em quarto lugar na ordem de vocação hereditária,

vindo a ser chamado depois dos colaterais, que à época eram chamados até décimo grau,

tornando-se muito difícil o chamamento do cônjuge a sucessão, com a vinda da Lei

1.839/1907, conhecida como a “Lei Feliciano Pena”, o cônjuge passou a ser chamado a

sucessão antes dos colaterais, ou seja, em terceiro lugar na ordem de vocação hereditária,

posição esta acolhida pelo Código Civil de 1916. Por fim temos o atual Código Civil que

manteve o cônjuge na terceira classe da vocação hereditária, porém dentre as principais

mudanças trouxe o cônjuge sobrevivente, em determinados casos, como concorrente da

primeira e segunda classe da ordem de vocação hereditária, como também passou a ser

considerado herdeiro necessário187.

Monteiro ao fazer menção as mudanças ocorridas protesta que:

Forçoso reconhecer, porém, que tal modificação, que vem a atingir todos os casamentos realizados anteriormente à vigência do Código, pode representar fonte de injustiças, e que não são passíveis de correção, especialmente a hipótese prevista no artigo 1.832, que assegura ao cônjuge sobrevivente,em concorrência com os descendentes, quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo sua parte ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com quem concorrer188.

187 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil, v.6: direito das sucessões / Francisco José Cahali, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 206 – 208. 188 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p. 96.

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Como vimos, no atual Código Civil, o cônjuge passou a ser considerado herdeiro

necessário, juntamente com os descendentes e ascendente, conforme preceitua ao artigo

1.845189, diante desta nova posição do cônjuge, vale ressaltar que o mesmo passa então a ter

pleno direito à legítima de conformidade com o artigo 1.846190.

Neste sentido, oportuno se faz esclarecer novamente, que não se deve confundir

herança com meação, uma vez que além de meeiro, o sobrevivente poderá ser herdeiro,

inclusive com direito a legítima por ser herdeiro necessário191.

Nesta mesma diapasão, Oliveira e Amorim, lecionam:

Apurada a meação, o patrimônio restante, que constitui a herança, caberá ao cônjuge sobrevivo à falta de descendentes ou ascendentes (art. 1.603, inc. III, CC/16). Não interessa o regime adotado, seja o da comunhão de bens ou o da separação, o cônjuge será herdeiro, salvo se, por ocasião da abertura da sucessão, já estivesse dissolvida a sociedade conjugal. É o que estabelece o artigo 1.611 do Código Civil de 1916, com correspondência no artigo 1.838 do novo Código Civil. O regime de bens do casamento, só tem relevância para o fim de se atribuir a meação. Mas, ainda que o regime seja de separação total, não afetará o direito de herança do cônjuge viúvo, o qual, mesmo que estivesse separado de fato do autor da herança (salvo se por mais de dois anos e culposamente, conforme o art. 1.830 do NCC), precede aos colaterais na ordem da vocação hereditária192.

Contudo o chamamento para a percepção da herança obedece classes distintas, que são

excludentes entre si e sucessivas, de forma que a classe mais próxima exclui a mais remota,

com a exceção dos casos de concorrência com cônjuge sobrevivente, em determinados

regimes de bens193.

Esta ordem de vocação hereditária é estabelecida no atual Código Civil no artigo 1.829

deferindo-se a sucessão na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime

189 BRASIL. Código civil, p. 470. “Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.” 190 BRASIL. Código civil, p. 470. “Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.” 191 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 131. 192 OLIVEIRA, Euclides Benedito de; AMORIM, Sebastião Luiz. Inventário e Partilhas Direito das Sucessões, p. 94. 193 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão, p 83.

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da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais194,

Importante evidenciar que “somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge

sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem

separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se

tornara impossível sem culpa do sobrevivente”195.

O cônjuge sobrevivente terá direito ainda, além do que lhe coube ou que venha a

herdar, independentemente do regime de bens adotado no casamento, o direito real de

habitação do imóvel que servia para a residência da família, sendo este o único dessa natureza

que faz parte do monte mor196, conforme previsto no artigo 1.831197 do Código Civil. “ Cuida-

se de direito personalíssimo e vitalício, devendo o beneficiário utilizar o bem exclusivamente

como residência sua, não podendo alugá-lo, ou cede-lo, independentemente de manter-se

viúvo, condição essa que exigia o Código de 1916”198.

Por fim, importante trazer à tona que os bens gravados com cláusula de

incomunicabilidade, não afasta o cônjuge sobrevivente de seus direitos hereditários, inclusive

como herdeiro necessário, neste prisma nos ensina Dias que, “a incomunicabilidade beneficia

os herdeiros do cônjuge que recebeu bens clausulados, seja eles quem forem: descendentes,

ascendentes, e até o cônjuge sobrevivente”199.

Demonstrada vocação hereditária do cônjuge sobrevivente, contudo, o problema está

nas possibilidades de concorrência com descendentes ou ascendentes em face do regime de 194 BRASIL. Código civil, p. 470. 195 BRASIL. Código civil, p. 471. “Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente” 196 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Básico de Direito Acquaviva, p. 191. “MONTE-MOR (Direito das Sucessões) Universalidade dos bens relativos à sucessão causa mortis.” 197 BRASIL. Código civil, p. 471. “Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.” 198 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p. 98. 199 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, 2008, p. 132.

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bens adotado no casamento, desta forma no próximo item será abordado o direito sucessório

do cônjuge diante de cada regime de bem.

4.2 CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTES

O atual Código Civil, em seu artigo 1.829 especialmente no inciso “I”, que trata da

concorrência do cônjuge sobrevivente com descendentes, sendo que neste primeiro inciso

encontra-se muitas divergências doutrinárias, bem como a grande diferença no direito

sucessório do cônjuge sobrevivente entre os regimes existentes no Código Civil de 2002, das

quais passa-se a expor, uma vez que dependendo do regime matrimonial adotado teremos

aplicação diferente a cada caso.

Neste sentido Dias nos ensina que “o critério para afastar o direito do cônjuge é o

regime de bens do casamento. Depois de consagrado o instituto da concorrência, são

identificados os regimes de bens que levam à exclusão do direito. A regra é a concorrência. A

não concorrência é a exceção”200.

O inciso “I” do artigo 1.829 do Código Civil, define que sucessão legítima defere-se :

“aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares”201.

Portanto conforme nos ensina Gonçalves, só haverá concorrência do cônjuge

sobrevivente com os descendentes do falecido, se os consortes houverem se casados no

regime de:

a) Comunhão parcial de bens, havendo bens particulares do falecido;

b) Participação final de aquestos;

c) Separação convencional de bens202.

200 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, 2008, p. 154. 201 BRASIL. Código civil, p. 470. 202 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 155.

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4.2.1 Comunhão Parcial de Bens

Neste regime o cônjuge sobrevivente só faz jus a herança do de cujus, se haver bens

particulares do de cujus a serem partilhados entre os herdeiros, dentro desta condição Diniz,

questiona se o cônjuge sobrevivente “terá sua cota, considerando-se todo o acervo hereditário,

ou apenas os bens particulares?”203.

A busca na reposta para este questionamento é motivo para várias interpretações,

sendo que verifica-se a configuração de três correntes com posicionamentos que causa grande

diferença na forma de partilhar, senão veremos:

4.2.1.1 Corrente “A” (bens particulares)

Esta linha de pensamento, afirma que só quando há bens particulares haverá direito

sucessório do cônjuge sobrevivente concorrente com os descendentes, e somente sobre os

bens particulares é que sobrevirá o respectivo direito sucessório.

Nesta linha de pensamento, nos ensina Barros: “[...] quanto ao regime da comunhão

parcial, o cônjuge só concorrerá a com os descendentes em relação aos bens particulares, isto

é, incomunicáveis, deixados pelo de cujus204.

Em vista desta concepção, Oliveira coloca que:

“Mais adequado e harmônico, portanto, entender que a concorrência hereditária do cônjuge com descendentes ocorre apenas quando, no casamento sob regime da comunhão parcial, houver bens particulares, porque sobre este, então sim, é que incidirá o direito sucessório concorrente, da mesma forma que se dá no regime da separação convencional de bens”205.

Venosa, ao se posicionar sobre o tema, contempla ser esta a conclusão mais lógica,

afirmando que, “somente haverá concorrência do cônjuge nessa situação, nos bens

particulares”.

203 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 122. 204 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, p. 209. 205 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão, p. 108.

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Neste sentido, argumenta Coelho, “[...] se o regime do casamento era o da separação

parcial, o cônjuge concorrerá apenas na herança representada pelos bens particulares do

falecido. Se não existiam, não haverá concorrência206.

A doutrina majoritária apresenta entendimento que a razão da proteção sucessória do

cônjuge, foi de privilegiar aqueles carentes de meação, ou seja os filhos do falecido, uma vez

que o cônjuge sobrevivo já teve garantido a meação dos bens comuns adquiridos na

constância do casamento, e por esta razão não deve aquinhoar parte do que é transmitido aos

descendentes como herança, portanto a concorrência deve limitar-se aos bens particulares do

de cujus 207.

4.2.1.2 Corrente “B” (bens particulares + meação do falecido)

Esta corrente é defendida por Diniz, pois no dizer da autora, uma vez havendo bens

particulares, passa-se a considerar todo o acervo hereditário, “porque a lei não diz que a

herança do cônjuge só recai sobre os bens particulares do de cujus e para atender ao principio

da operacionalidade, tornando mais fácil o cálculo para a partilha da parte cabível a cada

herdeiro”208.

Afirma ainda, a referida autora que, “a exigência de tais bens é mera condição ou

requisito legal para que o viúvo, casado sob o regime de comunhão parcial, tenha capacidade

de herdar, concorrendo, como herdeiro, com o descendente”, para tanto aduz que “a herança é

indivisível, deferindo-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros (CC, art.

1791 e parágrafo único).”209.

Neste sentido, assevera Cahali que, a existência ou não de bens particulares, significa

que foi estabelecido um critério de convocação e uma vez preenchido o requisito de haver

bens particulares, passa a concorrer na universalidade do acervo, ou seja, terá direito a ma

parcela sobre toda a herança, passando a ter direito inclusive sobre bens nos quais já possui

meação210.

206 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, p. 261. 207 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 153. 208 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 122. 209 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 122. 210 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil, p. 213.

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4.2.1.3 Corrente “C” (bens comuns)

Esta corrente é sustentada por Maria Berenice Dias, a qual admite que, predomina o

entendimento no sentido de que o direito concorrente do cônjuge sobrevivente sobre os

direitos sucessórios dos descendentes, baseia-se na existência de bens particulares, sobre os

quais recaem o referido direito concorrente. Porém a referida autora sustenta que, “o direito

de concorrência deve ser calculado exclusivamente sobre os bens comuns, ou seja, os

adquiridos durante o casamento”211.

A supradita autora em seu artigo “Ponte e Vírgula”, reforça seus motivos, sobre os

quais sustenta que a concorrência deve ser calculado exclusivamente sobre os bens comuns:

“[...] Quando o regime é o da comunhão parcial e não existem bens particulares, significa que todo o acervo hereditário foi adquirido depois do casamento, ocorrendo a presunção da mútua colaboração, o que torna razoável que o cônjuge, além da meação, concorra com os filhos na herança. No entanto, quando há bens amealhados antes do casamento, nada justifica que participe o cônjuge desse acervo. Tal não se coaduna com a natureza do regime da comunhão parcial, sendo descabido que venha o cônjuge sobrevivente a herdar parte do patrimônio individual, quando da morte do par[...]”212.

Por fim a Justiça Federal, através do Conselho Federal de Justiça emitiu um Enunciado

aprovado pela III Jornada de Direito Cível, sob nº 270, com o intuito de pacificar tais

entendimentos:

“ [...]Art. 1.829: O art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aqüestos, o falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente entre os descendentes”213.

211 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, p. 143. 212 DIAS, Maria Berenice – Ponto e Vírgual. Disponível em <http://www.mariaberenicedias.com.br/site/content.php?cont_id=109&isPopUp=true>. Acesso em 18 out. 2009. 213 BRASIL. CJF – Conselho Nacional de Justiça, Portal da Justiça Federal. ENUNCIADOS APROVADOS. III JORNADA DE DIREITO CIVIL. Disponível em : <http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IIIJornada.pdf>. Acesso em 18 out. 2009.

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Diante das várias posições doutrinárias apresentadas, verificou-se que não se pode

esquecer que a regra é a concorrência, seja sobre os bens particulares, comuns ou ambos,

porém este direito está sujeito a exceções.

4.2.2 Participação Final de Aquestos

O regime da participação final de aquestos, como já vimos, é um regime misto, onde

figura o regime de separação na constância do casamento, comunhão parcial após sua

dissolução, seja por separação, divórcio ou por causa mortis, essa ultima é a que nos interessa.

No regime da participação final de aquesto, não fica fora da regra geral onde, havendo

bens particulares, haverá a concorrência com os descendentes214.

Rizzardo leciona que, neste regime os herdeiros do cônjuge herdam segundo as regras

comum da sucessão, neste sentido necessário se faz verificar o teor do artigo 1.685 do Código

Civil:

“Art. 1.685. Na dissolução da sociedade conjugal por morte, verificar-se-á a meação do cônjuge sobrevivente de conformidade com os artigos antecedentes, deferindo-se a herança aos herdeiros na forma estabelecida neste Código”215.

Diante da similitude entre o regime da participação final de aqüestros, após a

dissolução, com o regime da comunhão parcial de bens, importante se faz, comparar o

dispositivo acima citado com o então controverso artigo 1.829, inciso “I”, após, verifica-se

que no regime da participação final de aqüestos, somente concorre o cônjuge supérstite com

os descendentes do de cujus, nos bens reconhecidos como particulares. No entanto, pelo fato

de o viúvo já haver exercido o direito de meação sobre os aqüestos, não terá direito a

concorrer na herança destes216.

214 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p 156. 215 BRASIL. Código civil, p. 452. 216 OLIVEIRA, Euclides Benedito de; AMORIM, Sebastião Luiz. Inventário e Partilhas Direito das Sucessões, p. 98.

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4.2.3 Separação de Bens

4.2.3.1 Separação Convencional de Bens

Como já foi visto anteriormente a regra estabelecida no artigo 1.829 do Código Civil é

a concorrência do cônjuge com os descendentes, neste dispositivo o legislador se ateve a

enumerar as exceções a regra, sendo que em nenhuma das exceções enumeradas no citado

artigo aparece o regime da separação convencional como exceção a regra geral de

concorrência, podendo-se então verificar que os consortes casados sob as regras do regime da

separação convencional de bens, tem direito a respectiva concorrência 217.

Cahali, indaga que “talvez a intenção do legislador tenha sido dar ao cônjuge uma

participação sucessória sobre os bens nos quais não terá meação pelo regime de bens adotado

no casamento”218.

A Terceira Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo, assim já se manifestou nos autos do Agravo de Instrumento n. 313.414-4/1-00 da

Comarca de Barretos:

INVENTÁRIO - Viúva casada com o autor da herança no regime de separação convencional de bens - Direito à sucessão legítima em concorrência com a filha do falecido – Inteligência do art. 1829, I, do Código Civil - Vedação que somente ocorre, entre outras causas, se o regime de casamento for o de separação obrigatória de bens - Recurso improvido 219.

No caso apresentado a agravante, pretendia ser admitida como a única herdeira do

espólio deixado por seu pai. O recurso foi improvido, levando em conta o julgador, se tratar o

regime de bens dos cônjuges o da separação convencional de bens, razão pela qual deve se

deferida à agravada a sucessão legítima em concorrência com a filha, a agravante.

217 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p 154. 218 CAHALI, Francisco José. Curso Avançado de Direito civil, p. 213. 219 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento n. 313.414-4/1-00, da Comarca de São Paulo. Agravantes : Dilene Borges Faioto Galeti e Outro. Agravado: Nereide Fátima Marin de Oliveira Faioto (Invte.do Espólio). Relator Desembargador Flávio Pinheiro. Julgado em: 14 nov. 2003. Publicado em: 25 de Nov de 2003. Disponível em: <http://esaj.tj.sp.gov.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=3607933>. Acesso em: 20 out. 2009.

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Por derradeiro, com relação ao regime da separação convencional de bens, voltamos a

ressaltar o disposto no enunciado do Conselho Federal de Justiça nº 270, que afirma o

seguinte:

“ [...] o art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aqüestos, o falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente entre os descendentes”220.

A interpretação literal do enunciado acima, não deixa dúvida a cerca da concorrência

do cônjuge sobrevivente em relação aos descendentes, deixando claro que quando casados sob

o regime da separação convencional de bens não haver concorrência

4.2.3.2 Separação Obrigatória de Bens

O artigo 1.829 do Código Civil, dispõe que a sucessão legítima defere-se “aos

descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o

falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,

parágrafo único)[...]”221.

Do referido dispositivo extrai-se através de interpretação literal que a sucessão

legítima defere-se aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, exceto se

casado este com o falecido no regime da separação obrigatória de bens .

Neste sentido Oliveira, ao afirmar que prevalece a interpretação doutrinária e

jurisprudencial, de que a literalidade do artigo 1.829, inciso I, do Código Civil “estabelece

que, com clareza a regra geral da concorrência do cônjuge com os descendentes é somente

como exceção a não concorrência, nas hipóteses expressamente mencionadas de certos

regimes de bens, sem abranger o regime da separação de bens decorrente de pacto

antenupcial, feita por convenção das partes”222.

220 CJF – Conselho Nacional de Justiça, Portal da Justiça Federal. ENUNCIADOS APROVADOS — III JORNADA DE DIREITO CIVIL. Disponível em : <http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IIIJornada.pdf>. Acesso em 18 out. 2009. 221 BRASIL. Código civil, p. 470. 222 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão, p. 105.

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Neste sentido, verifica-se que o texto legal afasta portanto, da concorrência com os

descendentes, o cônjuge sobrevivente casado sob o regime da separação obrigatória de bens,

ao exprimir “[...] salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no

da separação obrigatória de bens[...]”223.

A Quarta Câmara de Direito Civil do Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catariana,

assim já se manifestou nos autos da Apelação Cível n. 2008.025781-6 da Comarca da Capital

/ Distrital do Norte da Ilha:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA. Extinção do processo sem resolução do mérito. Ilegitimidade ativa ad causam. Cônjuge supérstite que não ostenta a qualidade de herdeira. Chamamento dos filhos a suceder. Inexistência de concorrência sucessória entre os descendentes e a consorte. Matrimônio contraído sob o regime obrigatório da separação de bens. Ilegitimidade flagrante. Ausência, outrossim, de interesse processual, na modalidade adequação. Demanda inservível à reivindicação dos aqüestos. Inteligência dos arts. 1.824, 1.829, inc. I, e 1.845, todos do código civil de 2002 c/c arts. 3º e 267, inc. Vi, ambos do código de processo civil. Recurso desprovido.224

Neste julgado destacou-se que a apelante/cônjuge supérstite intentava ser reconhecida

como herdeira, porém o magistrado não acolheu o pedido por ser a apelante casada sob o

regime da Separação Obrigatória de Bens, indo ao encontro com o previsto no inciso I, do

artigo 1.829 do CC, por fim afastou-a inclusive de ter interesse processual, aplicando o

disposto na súmula 377 do STF, uma vez que a apelante ficou casada apenas cinco anos com

o falecido não insurgindo aqüestros.

Dias, afirma que o legislador “ao afastar a participação do viúvo, ouvida-se

completamente o legislador de sua intenção protetiva. Com evidente caráter vingativo, é

eliminando o direito de quem desobedeceu a recomendação legal de não casar”225.

223 BRASIL. Código civil, p. 470. “Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens [...]”. 224 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2008.025781-6, da comarca da Capital / Distrital do Norte da Ilha (Regime Exceção Sucessões e Registros Públicos). Apelante: Marli Maria da Silveira Cardoso. Apelados: Amauri Atanásio Cardoso e outros. Relator Desembargador Eládio Torret Rocha. Julgado em: 23 out. 2008. Publicado em: 25 nov. 2008. Disponível em: <http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pcpoResultadoConsProcesso2Grau.jsp?CDP=01000BQ6R0000>. Acesso em: 20 out. 2009. 225 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, 2008, p. 156.

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Por fim verifica-se que dentro do regime de separação de bens, temos duas situações

extremas, onde na separação convencional não resta dúvida em haver o concurso sucessório,

já no da separação obrigatória ou legal, a lei é taxativa em excluir da concorrência sucessória

as pessoas sujeitas a este regime.

4.2.4 Comunhão Universal de Bens

O regime de Comunhão Universal de Bens é o único do qual a lei é clara não restando

possibilidades de concorrência, talvez porque o cônjuge sobrevivente tem direito a meação

sobre todo acervo patrimonial. Verifica-se que a lei considera que a meação já garante que o

cônjuge supérstite não fique desamparado, neste sentido, se além da meação do total restasse

concorrência com demais herdeiros, seria estar beneficiando excessivamente o cônjuge

sobrevivente226.

Gonçalves ao tratar do assunto, assevera que:

Em regra não há concorrência do cônjuge sobrevivente, com os descendentes do falecido, se o regime de bens no casamento era do da comunhão universal. Entende o legislador que a confusão patrimonial já ocorrera desde a celebração da união nupcial, garantindo-se ao cônjuge sobrevivo, pela meação adquirira, a proteção necessária. De fato, sendo o viúvo ou a viúva titular da meação, na há razão par que seja herdeiro, concorrendo com os filhos do falecido 227.

Como vimos a própria leitura literal da referida norma civil é clara ao excluir os

consortes casados sob o regime da comunhão universal de bens de pleitearem direitos

sucessórios em concorrência com os descendentes.

Contudo a doutrina tem sustentado a possibilidade de conceder ao cônjuge

sobrevivente o direito de concorrência sobre os bens excluídos na meação, uma vez que não

226 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, 2008, p. 155. 227 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 151.

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se comunicam, os quais acham-se elencados no artigo 1.668228 do Código Civil, sob o

fundamento que sobre estes não ocorre a meação229.

Diante das afirmativas ora apresentadas pelos nobres doutrinadores, passa-se a estudar

concorrência sucessória em face dos ascendentes, com o intuito de verificar se há diferença

entre os regimes de bens.

4.3 CONCORRÊNCIA COM ASCENDENTES

O inciso “II” do artigo 1.829 do Código Civil, define que sucessão legítima defere-se “

aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge”230.

Contudo o citado diploma legal, não traz quaisquer exceções para a configuração da

concorrência em face do regime de bens adotado no casamento, neste sentido Monteiro aduz

que, “em nada interfere o regime de bens do casamento”, porém só há de respeitar os

requisitos previstos do artigo 1.830231 do Código Civil 232.

No mesmo norte, Coelho nos ensina que, “na concorrência do cônjuge com os

ascendentes do falecido, é irrelevante o regime de bens do casamento. Qualquer que tenha

sido o adotado, é idêntico o direito sucessório do viúvo ou viúva”233.

A concorrência com os ascendentes é regulada pelos artigos 1.836 e 1.837 do Código

Civil, in verbis:

Art. 1.836. Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente.

228 BRASIL. Código civil, p. 451. “Art. 1.668. São excluídos da comunhão: I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.” 229 DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, 2008, p. 155. 230 BRASIL. Código civil, p. 470. 231 BRASIL. Código civil, p. 470. “Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.” 232 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p. 97. 233 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, p. 265.

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§ 1o Na classe dos ascendentes, o grau mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção de linhas.

§ 2o Havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade, cabendo a outra aos da linha materna.

Art. 1.837. Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau234.

Resta demonstrar como fica a participação do cônjuge na herança devida aos

ascendentes, vale lembrar que como já foi dito, independe o regime de bens como critério

para haver concorrência, porém não se deve confundir herança com meação como já vimos,

neste sentido, em alguns casos, por exemplo no regime da comunhão universal de bens, o

cônjuge terá direito a meação, ou seja 50% dos bens equivalentes a sua meação e mais 1/3 da

herança (50% da meação do de cujus) em concorrência com os ascendentes do falecido,

totalizando 66,66% dos bens do espólio235.

Já conforme nos ensina Rodrigues, se “ao de cujus, sobreviveu somente o pai, ou

apenas a mãe, ou se possui ascendentes do segundo grau, ou de grau mais elevado, caberá ao

cônjuge a metade da herança”, se por exemplo, o regime adotado era o da comunhão universal

de bens, caberá o cônjuge 75% da herança236.

Desta forma temos a concorrência do cônjuge sobrevivente em concorrência com os

ascendentes, forma esta prevista pelo artigo 1.837237 do Código Civil.

4.4 SUCESSÃO LEGÍTIMA DO CÔNJUGE

4.4.1 Sucessão do cônjuge sobrevivente

No caso em que inexista descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por

inteiro em favor do cônjuge sobrevivente, conforme preceitua o artigo 1.838 do Código Civil:

234 BRASIL. Código civil, p. 471. 235 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão, p. 124. 236 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, v.6: direito das sucessões. 25ª ed. atualizada de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002, com a colaboração de Zeno Veloso - São Paulo: Saraiva, 2002, p. 110. 237 BRASIL. Código civil, p. 471. “Art. 1.837. Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau.”

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“em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge

sobrevivente”238.

Contudo o cônjuge só adquiri a capacidade de herdar se ao tempo da morte do outro

não estavam separados judicialmente, nem separados de fato por mais de dois anos. Em regra

estando separado de fato há mais de dois anos não insurge o direito sucessório, salvo haja

prova que essa convivência se tornou impossível sem culpa do cônjuge sobrevivente,

conforme preceitua o artigo 1.830 do Código Civil239.

Gonçalves, ao fazer relação ao tempo e o efeito da separação ou o divórcio esclarece

que:

O direito sucessório do cônjuge, todavia, só estará afastado depois de homologada a separação consensual ou passada em julgado a sentença de separação litigiosa ou de divórcio direto, que só produz efeitos ex nunc, ou ainda depois de lavrada a escritura pública de separação ou divórcio consensuais, que produz efeitos imediatamente, nos termos do art. 1.124-A do diploma processual civil, com a redação dada pela Lei n. 11.441, de 4 de janeiro de 2007. Morrendo o cônjuge no curso da ação de divórcio direto, de conversão de separação em divórcio ou de separação judicial, extingue-se o processo. Nessa hipótese, o estado civil do outro não será separado judicialmente ou divorciado, mas de viúvo240.

Ainda com relação a separação judicial, pouco importa o motivo ou a forma da

separação, seja ela resultante de processo litigioso ou de mútuo consentimento. No entanto

ocorrendo a reconciliação, na forma da lei, poderá o sobrevivente suceder o de cujus, não

sendo possível no entanto, se a reconciliação for meramente de fato241.

Importante deflagrar que o cônjuge sobrevivente pode herdar, mesmo em hipótese de

anulação do casamento, como podemos verificar nos ensinamentos de Barros:

Na hipótese de anulação do casamento, o cônjuge sobrevivente pode ainda herdar, desde que presentes dois requisitos:

a) reconhecimento judicial de sua boa fé (casamento putativo)

238 BRASIL. Código civil, p. 471. 239 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil: direito das sucessões, p. 135. 240 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 162. 241 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: direito das sucessões, v. 5. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 147.

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b) anulação posterior a morte do outro.

Portanto, no caso de anulação de casamento, para que o cônjuge herde, exige-se o somatório da putatividade e da anulação pós-morte242.

Outro ponto relevante é que o fato de o cônjuge ser herdeiro necessário, implica na

limitação da liberdade de testar do autor da herança, que não poderá dispor em testamento,

mais do que a parte disponível, nem mesmo estabelecer restrições a legítima243.

Por fim verificou-se que sobre a égide do Código Civil, em resumo, são requisitos para

o cônjuge herdar: “a) que não esteja divorciado nem separado, judicial ou

administrativamente; b) que não esteja separado de fato há mais de dois anos do finado, ou c)

que prove ter-se tornado impossível a convivência, sem culpa sua, se estiver separado de fato

há mais de dois anos do falecido”244.

4.5 Sucessão no direito real de habitação

Ao cônjuge supérstite, é assegurado o direito real de habitação, independente do

regime de bens e sem redução aos seus direitos hereditários, no imóvel destinado a residência

familiar, desde que este, seja o único.

Dispõe, com efeito, o artigo 1.831 do Código Civil:

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar245.

Este benefício, não é novidade da atual legislação civil, no entanto o atual Código

Civil além de manter a norma existente, afastou requisitos para a configuração do benefício

relacionados ao regime de bens. Outra novidade é o fato de o novo diploma não mais

condicionar o direito real de habitação à permanência do estado de viuvez do favorecido, ou

242BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: família e sucessões, p. 208. 243 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das sucessões, p. 97. 244 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões, p. 163. 245 BRASIL. Código civil, p. 471.

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seja, o detentor do direito de habitação do imóvel da família, poderá contrair novas núpcias,

sem prejuízo ao benefício246.

O referido direito impede, que os co-proprietários, descendente ou ascendentes do

falecido, possam cobrar qualquer tipo de pecúnia pela utilização do aluído imóvel. Da mesma

forma se, os descendentes ou ascendentes que detenham direito a propriedade do imóvel não

habitavam o mesmo antes da abertura da sucessão, não poderão a vir morar agora junto com o

cônjuge sobrevivente247.

Gomes, faz mister que, “ o direito real de habitação recai em prédio residencial,

contanto que seja o único o único imóvel inventariado. Basta que se destine à residência,

donde se segue que, se nele não esta morando, o gravame não se institui. Se a família reside

em casa própria, mas o falecido era proprietário de outros bens imóveis, o direito real não se

constitui”248.

No entanto, Oliveira chama a atenção para a possibilidade de esse direito se estender a

futuro consorte, caso o então cônjuge sobrevivente venha a contrair novas núpcias, tal

situação é perfeitamente possível, uma vez que se o co-proprietário e detentor do direito de

habitação, ao contrair novas núpcias, vir a falecer antes do novo cônjuge, este passa a exercer

o mesmo direito em razão do novo matrimônio249.

Diante do exposto em relação aos direitos sucessórios do cônjuge supérstite,

especialmente quanto ao direito de habitação verifica-se que poderá haver injustiças, quando o

viúvo ou viúva contrai novas núpcias, podendo o consorte do segundo casamento herdar o

direito de habitação no imóvel de propriedade dos filhos do primeiro casamento do atual de

cujus.

246TARTUCE, Flávio; CASTILHO, Ricardo. Direito Civil: direito patrimonial e direito existencial. São Paulo: Metodo, 2006. p. 889. 247 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, p. 274. 248 GOMES, Orlando. Sucessões, p. 65. 249 OLIVEIRA, Euclides Benedito. Direito de Herança: A Nova Ordem de Sucessão, p. 138.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objeto, o estudo do direito sucessório do cônjuge

supérstite sob a égide do atual Código Civil.

Verificou-se no estudo que a nova ordem de vocação hereditária do cônjuge

sobrevivente, foi objeto de grande mudança na legislação civil, uma vez que inicialmente o

cônjuge herdava em quarto lugar na ordem de vocação hereditária, vindo a ser chamado

depois dos colaterais, o que deixava o cônjuge muito longe de ser chamado a sucessão. Com a

mudança no regramento civil, o cônjuge passou então para o terceiro grau, vindo a ser

chamando antes dos colaterais, já com o advento do Código Civil de 1916.

O atual Código Civil, com relação ao Código Civil de 1916, além de manter o cônjuge

na terceira classe da vocação hereditária, trouxe o cônjuge sobrevivente, em determinados

casos, como concorrente da primeira e segunda classe da ordem de vocação hereditária, ou

seja, com os descendentes e ascendentes, e, também passou a considerar o cônjuge como

herdeiro necessário.

Com relação a concorrência quanto aos descendentes verificou-se que regra é haver a

concorrência. A não concorrência é a exceção. Verificou-se dois critérios principais. O

primeiro critério para afastar o direito do cônjuge é o regime de bens adotado no casamento.

O segundo é que para haver direito ao cônjuge supérstite o autor da herança deve ter deixado

bens particulares.

Diante destas constatações verificou-se então que, só haverá concorrência do cônjuge

sobrevivente com os descendentes do falecido, se os consortes houverem se casado no regime

de: a) Comunhão parcial de bens, havendo bens particulares do falecido; b) Participação final

de aquestos; e, c) Separação convencional de bens.

No regime da comunhão parcial de bens verificou-se que o cônjuge sobrevivente só

faz jus a herança se o de cujus houver deixado bens particulares, porém quanto à forma de

partilhar foram encontradas três correntes distintas:

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A primeira corrente denominada corrente “A” (bens particulares), a qual nos filiamos,

afirma que só quando há bens particulares haverá direito sucessório do cônjuge sobrevivente

concorrente com os descendentes, e somente sobre os bens particulares é que sobrevirá o

respectivo direito sucessório.

A segunda corrente, denominada Corrente “B” (bens particulares + meação do

falecido) afirma que havendo bens particulares, passa-se a considerar todo o acervo

hereditário, ou seja, é somado para compor herança do cônjuge os bens particulares e os bens

que faziam parte da meação do cônjuge falecido, passando a ter direito inclusive sobre bens

nos quais já possui meação.

A terceira e última corrente, denominada corrente “C” (bens comuns), admite que,

predomina o entendimento no sentido de que o direito concorrente do cônjuge sobrevivente

com os direitos sucessórios dos descendentes, baseia-se na existência de bens particulares,

porém esta corrente afirma que o direito de concorrência deve ser calculado exclusivamente

sobre os bens comuns, ou seja, os adquiridos durante o casamento.

No regime da participação final de aquestos, não fica fora da regra geral onde,

havendo bens particulares, haverá a concorrência com os descendentes, porém neste caso

verifica-se pacífico que o cônjuge supérstite somente concorrerá nos bens tidos como

particulares.

Já no regime de separação de bens há uma divisão entre o regime da separação

convencional de bens e o regime de separação obrigatória de bens, sendo que o direito de

concorrência só sobrevêm no regime de separação convencional de bens.

Ainda sobre os regimes de bens, verificou-se por estar expresso na lei que não há

direito concorrente no regime da comunhão universal de bens em relação aos descendentes.

Já o direito concorrente do cônjuge supérstite com o ascendente ocorre

independentemente do regime de bens, ou seja, em nada interfere o regime de bens do

casamento.

Encerrada a questão da concorrência, verificou-se que caso não haja descendente ou

ascendente será considerado único herdeiro, qualquer que seja o regime de bens, porém

somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do

outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos,

salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do

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sobrevivente. A possibilidade de verificar a culpa na separação de fato do casal no direito

sucessório é uma questão que pode gerar grande discussão na doutrina e jurisprudência, posto

que o fato culpa, inspira uma idéia subjetiva, que não deve ser objeto do campo da sucessão,

neste caso deveria ter sua discussão limitada ao direito de família.

Verificou-se também que um das grandes e importantes mudanças foi o fato de o

Código Civil vigente, privilegiar a posição sucessória do cônjuge elevando-o à categoria de

herdeiro necessário, esta previsão legal ficou estabelecida nos artigos 1.829, 1.838 e 1.845 do

referido diploma legal.

O fato de ser considerado herdeiro necessário, garante ao cônjuge o direito a cota parte

na legítima, ficando protegido em caso de testamento, ou em caso de doações, ou seja, o autor

da herança não pode dispor de mais da metade dos bens se for casado, conforme previsto no

art. 1.846 do então Código Civil, nem mesmo estabelecer restrições a cota parte da legítima.

Verificou-se ainda que ao cônjuge supérstite, é assegurado o direito real de habitação,

independente do regime de bens e sem redução aos seus direitos hereditários, no imóvel

destinado a residência familiar, desde que este, seja o único. Este benefício, não é novidade da

atual legislação civil, no entanto além de manter a norma existente, afastou requisitos para a

configuração do benefício relacionado ao regime de bens, como também afastou a

condicionante ao direito real de habitação a permanência do estado de viuvez do favorecido,

ou seja, o cônjuge supérstite poderá contrair novas núpcias, sem prejuízo ao benefício.

Por fim, em resposta as hipóteses apresentadas, verificou-se confirmadas as duas

hipóteses consideradas para os questionamentos formulados, ou seja:

a) O cônjuge sempre terá direito a sucessão do de cujus?

R.: Não, pois havendo descendentes do de cujos dependerá do regime de bens adotado

pelos cônjuges no casamento, neste caso, dependendo do regime cônjuge não terá direito

algum a herança ou concorrerá com os descendentes, na falta de descendentes concorrerá com

os ascendentes e na falta destes terá direito a todo acervo hereditário;

b) Eventual direito sucessório do cônjuge supérstite está vinculado ao regime de

casamento adotado?

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R.: Sim, pois no regime da comunhão universal não haverá o direito de herdar, bem

como nos demais regimes, pela corrente majoritária a qual nos filiamos diante do estudo

proferido, dependerá da existência de bens particulares do de cujus.

O que se pode conferir neste estudo é que muitas são as falhas do atual Código Civil

de 2002 em relação aos direitos sucessórios do cônjuge, especialmente quando relacionados

ao regime da comunhão parcial de bens. Estas falhas, contudo, vêm sendo amenizadas com as

posições jurisprudenciais e doutrinárias.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Básico de Direito Acquaviva. 5. ed. Atual., rev e atual de acordo com o novo código civil. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004.

BRASIL. Códigos civil; comercial; processo civil; constituição federal. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto; Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt; Lívia Céspedes. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

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